Giselda Silva, CPF:22797289404 CURSO ON-LINE – PACOTE DE EXERCÍCIOS PARA TÉCNICO DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO www.pontodosconcursos.com.br AULA 01 – CURSO DE TEORIA GERAL DO PROCESSO CONCURSO DA DPE/RJ – EXERCÍCIOS PROFESSORA: MARIA APARECIDA LIMA ALGARTE Olá, pessoal! Fico muito feliz em dar início a este curso de exercícios para técnico da Defensoria Pública do Rio de Janeiro! Na realidade, nós já tivemos um “avant- première” na aula 0, oportunidade em que fizemos uma pequena apresentação do nosso trabalho e do curso, bem como mostramos o programa de nossas aulas. Também em nossa aula 0, vimos que o processo é composto por uma trilogia estrutural: jurisdição, ação e processo. Nosso objetivo de hoje é analisar os dois primeiros elementos dessa trilogia: a jurisdição e a ação. Sobre a jurisdição, nossa tarefa é complementar os temas da aula 0, esmiuçando o estudo sobre os substitutivos da jurisdição e as características da jurisdição contenciosa e da jurisdição voluntária. Logo após, trataremos do segundo aspecto da trilogia estrutural - a ação -, oportunidade em que abordaremos o conceito, as condições e os elementos da ação e, por fim, as espécies de ações ou de processos. Como você pode perceber, estamos dando continuidade ao programa iniciado na aula 0. Por isso, é muito importante que você estude a aula 0, o que garantirá um melhor aproveitamento dos conteúdos de agora em diante. Considerando o conteúdo programático exigido no edital do concurso, e levando em conta, também, que a disciplina “teoria geral do processo” não é tão comum em concursos para nível médio, procuramos elaborar nossas aulas de forma mista, ou seja, aulas com boa carga de teoria e prática, para que o candidato possa entender com clareza os temas propostos, tornando-se, assim, plenamente habilitado a resolver as questões da prova. A partir dessa aula, teremos uma novidade: questões de prova do Concurso da Algarte! São questões cuidadosamente elaboradas pela professora, para complementar os assuntos tratados na aula.
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AULA 01 – CURSO DE TEORIA GERAL DO PROCESSO
CONCURSO DA DPE/RJ – EXERCÍCIOS
PROFESSORA: MARIA APARECIDA LIMA ALGARTE
Olá, pessoal!
Fico muito feliz em dar início a este curso de exercícios para técnico da
Defensoria Pública do Rio de Janeiro! Na realidade, nós já tivemos um “avant-
première” na aula 0, oportunidade em que fizemos uma pequena
apresentação do nosso trabalho e do curso, bem como mostramos o programa
de nossas aulas. Também em nossa aula 0, vimos que o processo é composto
por uma trilogia estrutural: jurisdição, ação e processo.
Nosso objetivo de hoje é analisar os dois primeiros elementos dessa
trilogia: a jurisdição e a ação. Sobre a jurisdição, nossa tarefa é
complementar os temas da aula 0, esmiuçando o estudo sobre os substitutivos
da jurisdição e as características da jurisdição contenciosa e da jurisdição
voluntária. Logo após, trataremos do segundo aspecto da trilogia estrutural -
a ação -, oportunidade em que abordaremos o conceito, as condições e os
elementos da ação e, por fim, as espécies de ações ou de processos.
Como você pode perceber, estamos dando continuidade ao programa
iniciado na aula 0. Por isso, é muito importante que você estude a aula 0, o
que garantirá um melhor aproveitamento dos conteúdos de agora em diante.
Considerando o conteúdo programático exigido no edital do concurso, e
levando em conta, também, que a disciplina “teoria geral do processo” não é
tão comum em concursos para nível médio, procuramos elaborar nossas aulas
de forma mista, ou seja, aulas com boa carga de teoria e prática, para que o
candidato possa entender com clareza os temas propostos, tornando-se,
assim, plenamente habilitado a resolver as questões da prova.
A partir dessa aula, teremos uma novidade: questões de prova do
Concurso da Algarte! São questões cuidadosamente elaboradas pela
professora, para complementar os assuntos tratados na aula.
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Como você já sabe, ao final de cada aula, todas as questões de prova
estudadas serão exibidas em lista, com o respectivo gabarito logo após.
Vamos lá?
Como vimos na aula 0, jurisdição é o PODER que o Estado tem de
decidir imperativamente os conflitos de interesses existentes entre as pessoas
e impor suas decisões aos envolvidos. É, também, FUNÇÃO estatal, encargo do
Estado de promover a pacificação dos conflitos sociais por meio de suas
decisões. Além disso, consiste na própria ATIVIDADE do juiz de conduzir os
processos judiciais na forma estabelecida em lei.
Vimos, também, que a autotutela e a heterotutela consistiram em
formas de resolução de conflitos adotadas anteriormente à criação da
atividade jurisdicional exercida pelo Estado.
O assunto que vamos tratar agora diz respeito aos substitutivos da
jurisdição. Isso significa que, além da jurisdição exercida pelo Poder
Judiciário, existem opções outras, que não a jurisdição, para solucionar as
disputas de interesses entre as pessoas. Essas opções são os chamados
modelos substitutivos à jurisdição. São considerados meios alternativos de
pacificação social, ou seja, soluções não-jurisdicionais de conflitos. Os
defensores desses modelos alternativos alegam que o processo judicial é
muito formal, demorado e caro, motivo pelo qual nem todos os conflitos ou
disputas deveriam passar pelo Poder Judiciário.
Assim, os doutrinadores brasileiros apontam os três principais meios
alternativos de pacificação social, ou seja, modelos de solução de conflitos
em que não há a necessidade de se percorrer todo um processo judicial, ou,
às vezes, nem se precisa ajuizar uma ação perante o Poder Judiciário: a)
conciliação; b) mediação; c) arbitragem.
a) Conciliação:
Observe a seguinte questão:
(Concurso da Algarte – 2010) Podemos entender a conciliação como
um meio substitutivo da jurisdição na solução de conflitos. De acordo com
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esse modelo alternativo de pacificação social, as partes entram em
acordo por si próprias (autocomposição) ou com o auxílio de uma terceira
pessoa (heterocomposição). Além disso, o acordo pode ser obtido dentro
de um processo judicial (conciliação endoprocessual) ou mesmo fora do
Poder Judiciário (conciliação extraprocessual).
Comentários:
A afirmação está correta. Para entendermos o teor da assertiva,
devemos estudar o primeiro modelo alternativo de solução de conflitos: a
conciliação.
Por meio da conciliação, as partes chegam a um acordo e põem fim ao
conflito. Pode-se obter a conciliação mediante autocomposição (ou seja,
composição pelas próprias partes), em que uma ou ambas as pessoas
conflitantes abrem mão de parte de seu interesse, por meio da desistência
(“vou tocar a minha vida, deixa essa briga pra lá! Desisto de disputar com
você!”), submissão (“ok, ok, você venceu! Eu me submeto à sua vontade!”)
ou transação (“eu cedo um pouquinho daqui, você cede um pouquinho daí, e
estamos resolvidos!”). Temos também a heterocomposição, ou seja, o acordo
das partes é obtido com a ajuda de uma terceira pessoa, que pode ser o juiz,
o Ministério Público, um conciliador, um juiz de paz, dentre outros.
A conciliação pode ser alcançada de forma endoprocessual (dentro de
um processo judicial) ou extraprocessual (fora e independentemente de uma
ação judicial). Vejamos: I) endoprocessual: atualmente, existem várias
situações em que as partes conflitantes dão início a um processo judicial,
mas, no curso desse processo, conciliam-se, pondo fim ao processo, o qual,
sem a conciliação, poderia levar anos. Darei alguns exemplos para esclarecer
o assunto: I.a) na Justiça do Trabalho, quando um trabalhador propõe uma
ação trabalhista, ele tem as opções de chegar a um acordo com o empregador
e encerrar o processo rapidamente ou, não aceitando o acordo, continuar com
o demorado processo até o final, o que pode levar vários anos. Para privilegiar
o acordo, ou seja, a conciliação, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT),
nos artigos 846 e 850, prevê dois momentos em que o juiz pode estabelecer a
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conciliação no curso do processo. 1ª oportunidade: artigo 846 (“aberta a
audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação”); 2ª oportunidade:
artigo 850 (“terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais,
em prazo não excedente a dez minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou
presidente renovará a proposta de conciliação, e não se realizando esta, será
proferida a decisão”); I.b) nosso Código de Processo Civil, no artigo 125, diz
que, se a ação judicial versar sobre direitos disponíveis, ou seja, direitos que
podem ser negociados ou disponibilizados livremente pelas partes, o juiz tem
o dever de tentar a solução conciliatória ainda na audiência preliminar, que é
a primeira audiência realizada no processo, antes de iniciar a fase processual
de produção de provas. Além disso, o juiz tentará a conciliação também no
início da audiência de instrução e julgamento, que é a audiência onde são
ouvidas as partes e as testemunhas (artigos 447 e 448 do CPC); I.c) a Lei
9.099/95, que trata dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, determina que,
no processo cível, o juiz somente poderá passar a colher provas após o
esgotamento, sem sucesso, da fase de conciliação. Nessa fase, temos
audiências de conciliação, dirigidas por juízes ou conciliadores, em que as
partes comparecem e tentam chegar a um acordo para extinguir o processo
logo no início (artigos 21 e 22 da Lei 9.099/95); I.d) a tendência à conciliação
chegou também à área criminal: a mesma Lei 9.099/95, ao falar sobre os
Juizados Especiais Criminais, determina que, nas infrações de menor potencial
ofensivo (ou seja, aquelas em que a pena de prisão não ultrapasse dois anos –
artigo 61), o acusado tem oportunidade de chegar a um acordo com a vítima
(composição civil) ou de fazer uma transação penal com o Ministério Público.
Nesses dois casos, o processo criminal nem chega a ser iniciado.
A partir desse momento, pode surgir uma dúvida: oras, mas se a
conciliação é um meio de solução de conflitos alternativo à jurisdição, por
que a professora deu exemplos de conciliações realizadas dentro de um
processo judicial? Bem, pessoal! A jurisdição deve ser entendida, aqui, como o
poder do Estado de dizer o direito, decidindo quem tem ou não razão e
aplicando a lei coercitivamente às partes no processo; pressupõe o trâmite de
toda a ação judicial até a sentença, sempre com as partes em conflito. Por
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sua vez, a conciliação, embora, nos exemplos indicados, seja realizada dentro
do processo judicial, tem um caminho diferente: o autor entra com a ação,
mas as partes chegam a um acordo e extinguem o processo sem a necessidade
de o juiz produzir provas e proferir sentença dizendo quem tem ou não razão.
Nesse caso, as próprias partes determinam a solução de seu litígio, pondo fim
ao processo; o juiz apenas homologa o acordo.
Bem entendido? Então, vamos à segunda espécie de conciliação: II)
extraprocessual, ou seja, fora do processo judicial, a qual pode ser realizada,
por exemplo, por juízes de paz, que possuem atribuição conciliatória, sem
caráter jurisdicional (artigo 98, II, da Constituição Federal). Nesse caso, não
existe ação judicial, e as partes podem celebrar um acordo verbal ou por
escrito.
(OAB 2007 – CESPE) A autocomposição destaca-se como um meio
alternativo válido de solução de conflitos de interesses. Desse modo,
pode essa forma alternativa ser utilizada dentro ou fora da relação
jurídica de direito processual (endo ou extraprocessual).
A questão acima está correta. Como vimos, a autocomposição, como
substitutivo da jurisdição, pode ser obtida dentro ou fora do processo judicial
Além da conciliação, são também considerados meios substitutivos da
jurisdição a mediação e a arbitragem. Vamos estudá-los:
b) Mediação: de acordo com esse meio alternativo de solução de
conflitos, os interessados não procuram o Poder Judiciário, pois chegam a um
acordo com a ajuda de uma terceira pessoa: o mediador. Esse mediador
procurará ouvir as partes e, aplicando técnicas adequadas, oferecerá
diferentes pontos de vista para o conflito, com o objetivo de aproximar as
partes, facilitando, assim, a composição do litígio. Lembre-se de que, na
mediação, as próprias partes, e não o mediador, deverão decidir se entram ou
não em acordo. Qual a diferença entre a conciliação e a mediação? Na
conciliação, o acordo é o objetivo principal da conversa; na mediação, a
finalidade primordial é debater o conflito, surgindo o acordo como mera
conseqüência desse debate. No “frigir dos ovos”, o resultado é o mesmo: as
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partes decidem pôr fim ao conflito. No Brasil, existem muitos centros de
mediação, que desenvolvem o trabalho de mediar conflitos. Podemos citar,
como exemplos, o CBMA (Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem) e o
MEDIARE (Diálogos e Processos Decisórios). Está em andamento no Congresso
Nacional um projeto de lei que objetiva implantar a mediação no sistema do
processo civil (Projeto de Lei nº 4827/1998).
c) Arbitragem: essa modalidade está prevista na Lei nº 9.307/96, e
consiste no julgamento do conflito fora do Poder Judiciário, por uma terceira
pessoa escolhida pelas partes. Nesse caso, diferentemente da mediação,
quem decide o conflito é o árbitro, e as partes se submetem ao que o árbitro
decidir. Vamos entender melhor: quando as partes celebram um contrato
qualquer, podem inserir uma cláusula determinando que qualquer conflito
decorrente do contrato deverá ser resolvido por um árbitro. Essa cláusula é
chamada de cláusula compromissória, e só pode ser incluída no contrato se
as partes contratantes forem maiores de idade e capazes, e se o direito
previsto no contrato puder ser negociado livremente entre elas (direito
disponível).
Por exemplo: em um contrato de compra e venda de um veículo a
prestações, o comprador e o vendedor podem incluir a cláusula
compromissória, dispondo que qualquer problema ou conflito decorrente
desse contrato deverá ser decidido por um árbitro. Assim, se o veículo for
entregue com defeito ou todo amassado, as partes deverão recorrer ao árbitro
para decidir quem tem direito. Esse árbitro pode ser uma pessoa particular ou
uma instituição especializada em arbitragem. Lembre-se de que, se houver
cláusula compromissória no contrato, as partes não poderão discutir o conflito
na Justiça, pois quem deverá dizer quem tem razão ou não é o árbitro, e não
o juiz. Somente se houver problemas formais na decisão arbitral é que as
partes poderão buscar o Poder Judiciário, mas, nesse caso, o juiz poderá
apenas corrigir esse vício de forma, e não “dar pitaco” sobre quem tem razão
no conflito. Isso significa que, se um dos contratantes der uma de
“espertinho” e entrar com uma ação na Justiça querendo discutir o contrato
em que existe cláusula compromissória, a outra parte poderá alegar essa
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cláusula em sua defesa, e aí, o processo é imediatamente extinto (artigo 301,
IX, do Código de Processo Civil). Como veremos mais adiante em nosso curso,
a existência de cláusula de arbitragem constitui um pressuposto processual
negativo do processo, ou seja, para o processo judicial prosseguir, não deve
existir essa cláusula compromissória.
(Concurso da Algarte – 2010) De acordo com a lei da arbitragem (Lei
nº 9.307/96), os pais separados podem celebrar um acordo para
regulamentar a guarda de seus dois filhos, de 6 e 13 anos de idade,
estabelecendo a cláusula compromissória de que, se, no curso do acordo,
houver algum conflito, esse conflito deverá ser resolvido por um árbitro.
A assertiva está errada. Como já estudamos, a arbitragem só pode ser
utilizada se as partes forem maiores de idade e capazes, e se os direitos
estabelecidos no contrato forem disponíveis, ou seja, tiverem valor
econômico e puderem ser livremente disponibilizados, vendidos, doados ou
negociados pelas partes, sem dar satisfação a ninguém. No caso, a guarda dos
filhos não é direito que pode ser negociado livremente pelos pais, pois se
trata de direito de família e de filiação. Assim, todas as questões referentes
aos direitos dos filhos deverão ser tratadas no Poder Judiciário, com
intervenção do Ministério Público, que é o fiscal da lei e defensor dos
interesses dos incapazes.
Ainda sobre o tema “substitutivos da jurisdição”, não podemos deixar
de citar que, atualmente, continua existindo a autotutela, ou seja, um
mecanismo de solução de conflitos utilizado desde a antiguidade, conforme já
estudamos na aula 0.
Por meio da autotutela, o titular do direito pode, à sua própria força,
defender seu direito, se este estiver sendo violado injustamente.
Por exemplo, o artigo 1.210, §1º, do Código Civil, que dispõe sobre o
desforço imediato, ou seja, defesa ou reação imediata, determina que o
possuidor de um bem, por sua própria força, pode impedir atos de
perturbação à sua posse, independentemente de ter que recorrer ao
Judiciário. Veja:
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“O possuidor turbado [perturbado em sua posse] ou esbulhado
[desapossado de sua coisa], poderá manter-se ou restituir-se por sua própria
força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não
podem ir além do indispensável à manutenção ou restituição da posse.”
Podemos, ainda, citar o exemplo do artigo 1.283 do Código Civil, em
que um vizinho pode cortar as raízes de árvores do outro vizinho, se elas
invadirem sua propriedade. Observe:
“As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do
prédio, poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário
do terreno invadido.”
Bom, encerramos o tema “substitutivos da jurisdição”. Agora,
passaremos a estudar uma importante divisão doutrinária da jurisdição:
jurisdição contenciosa e jurisdição voluntária.
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA E JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA: conforme já
estudamos na aula 0, o artigo 1º do Código de Processo Civil fala que “a
jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida por juízes, em todo o
território nacional, conforme as disposições que este Código estabelece”.
Primeiramente, devemos deixar claro que a classificação colocada no artigo,
ou seja, de jurisdição civil, e também de jurisdição contenciosa e voluntária,
obedece a critérios puramente didáticos, pois todas as divisões do exercício
da jurisdição dizem respeito ao mesmo poder jurisdicional do Estado, que é
uno.
Na aula 0, nós já examinamos a classificação da jurisdição em civil e
penal, além das divisões da jurisdição em inferior e superior e em comum e
especial. Hoje, vamos estudar a divisão da jurisdição em contenciosa e
voluntária.
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA: A expressão contenciosa deriva de
“contenda”, disputa, conflito. A jurisdição contenciosa compreende a função
estatal de solucionar os conflitos de interesses, ou seja, os litígios envolvendo
pessoas físicas ou jurídicas. Trata-se da jurisdição que aprecia as causas
instauradas pela parte autora contra a parte ré, visando à declaração de um
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direito, à condenação em uma prestação ou à obrigação de fazer ou não fazer
algo. Percebe-se, claramente, que as partes ocupam posições antagônicas,
são adversárias no processo. Assim, toda vez que falamos em jurisdição
contenciosa, estamos nos referindo àquelas causas mais comuns, ou seja,
onde há uma parte contra a outra. Por exemplo, quando algum motorista
engraçadinho, falando ao celular, não presta atenção no trânsito e bate na
traseira do meu carro, eu posso acionar o Poder Judiciário, valendo-me da
jurisdição contenciosa, para iniciar uma demanda contra o culpado pelo
acidente. Nesse caso, eu serei a parte autora, e o “engraçadinho” será o réu.
Um de nós sairá vencedor da ação, e o outro, perdedor. Instaura-se, portanto,
uma contenda, uma disputa judicial. Em linhas gerais, esse é o sentido da
jurisdição contenciosa.
JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA: a jurisdição voluntária, por sua vez, não
envolve contendas nem disputas. Na realidade, as ações submetidas à
jurisdição voluntária não têm adversários, mas sim interessados, que, juntos,
entram com a ação almejando o mesmo objetivo. Mas por que existe a
jurisdição voluntária? Os interessados não poderiam fazer um acordo fora do
Judiciário para atender aos seus interesses? Na realidade, existem atos da
vida dos particulares que são considerados tão importantes que, além de
interessar aos próprios particulares, interessam também à coletividade. Por
isso, esses atos precisam da intervenção do Poder Público para fiscalizar e
verificar se estão sendo praticados corretamente, ou seja, se os interesses das
pessoas envolvidas estão sendo atendidos, se ninguém está sendo prejudicado.
Esse poder de intervenção estatal nos interesses particulares foi conferido por
lei ao Poder Judiciário, por meio da jurisdição voluntária.
Nas ações propostas em sede de jurisdição voluntária, o Poder
Judiciário é encarregado de fiscalizar a forma e o conteúdo dos atos
praticados pelos interessados, corrigindo eventuais falhas e complementando
o ato, que, após a manifestação do juiz, torna-se completo e acabado. O
contrário também é verdade: se o juiz não autorizar a prática do ato, este
não tem qualquer validade. Em outras palavras, o juiz passa também a
integrar, fazer parte da manifestação de vontade dos interessados. Assim, tais
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atos somente passam a produzir efeitos jurídicos após a fiscalização e
integração da vontade dos interessados pelo Poder Judiciário. Vamos dar um
exemplo para elucidar a questão da jurisdição voluntária: suponhamos que
uma criança de 5 anos recebeu um imóvel de herança de seu falecido avô.
Seus pais também já morreram e ela foi encaminhada aos cuidados de um
tutor. Se esse tutor pretender vender o imóvel da criança, precisará entrar
com uma ação, como representante da criança e em nome dela, e pedir
autorização ao juiz para vender o imóvel. Essa ação obedecerá a
procedimento submetido à jurisdição voluntária. Há provocação do Judiciário,
mas não existem partes conflitantes, e sim, interessados na venda do imóvel.
Nesse caso, a venda do imóvel somente será válida se for acompanhada da
autorização do juiz. A ação é necessária para que a autoridade judicial
verifique se a venda do imóvel trará benefícios ou prejuízos para o menor, já
que a própria criança não tem discernimento, por si só, para decidir a
questão, e muitas vezes seus representantes só querem auferir benefícios
financeiros.
O Código de Processo Civil menciona outras hipóteses de jurisdição
voluntária, como, por exemplo a abertura de testamento (artigos 1.125 a
1.141) e a ação de interdição de pessoas (artigos 1.177 a 1.186).
A jurisdição voluntária possui algumas características peculiares:
a) O Ministério Público poderá entrar com a ação submetida
à jurisdição voluntária, ou seja, poderá ser o autor da ação em defesa
dos interesses de alguém. Por exemplo, a ação de interdição de uma
pessoa com doença mental pode ser proposta pelo Ministério Público ou
pelo pai, mãe ou tutor do doente, ou também por seu cônjuge ou um
parente próximo (artigo 1.177 do Código de Processo Civil);
b) Nas ações em que o Ministério Público não for parte no
processo (no nosso exemplo, se a ação for proposta pelo pai da pessoa
doente), o Promotor de Justiça (representante do Ministério Público)
será sempre intimado a intervir nas ações submetidas à jurisdição
voluntária, conforme dispõe o artigo 1.105 do Código de Processo Civil
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(“Art. 1.105. Serão citados, sob pena de nulidade, todos os
interessados, bem como o Ministério Público.”). É certo que, de acordo
com a letra da lei, se o MP não for parte, ele será citado para intervir
no processo, mas, na realidade, ele não é citado, pois não é parte, mas
sim intimado;
c) o artigo 1.105 do Código também dispõe que todos os
interessados na ação deverão ser citados para falar nos autos, sob
pena de nulidade. Nesse caso, é citação mesmo, para que os
interessados possam vir aos autos se manifestarem sobre o pedido que
foi formulado na ação;
d) na jurisdição voluntária, o juiz tem mais liberdade e poder
para determinar a produção de provas do que na jurisdição
contenciosa. O artigo 1.107 do Código Processual é bastante claro, ao
afirmar que “ao juiz é lícito investigar livremente os fatos e ordenar
de ofício a realização de quaisquer provas”;
e) julgamento por equidade: em linhas gerais, equidade
significa a adaptação, pelo juiz, da lei ao caso concreto, observando-
se os critérios de justiça e igualdade. De acordo com o artigo 127 do
Código de Processo Civil, na jurisdição contenciosa, via de regra “o
juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei”, ou seja, não
pode aplicar a equidade em todos os casos, mas somente naqueles em
que a lei o autorizar. Em se tratando de jurisdição voluntária, porém,
essa autorização é geral, conforme verificamos no artigo 1.109: o juiz
“não é obrigado a observar o critério da legalidade estrita, podendo
adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou
oportuna”;
f) possibilidade de alteração da sentença a qualquer tempo,
havendo fato novo: conforme dispõe o artigo 1.111 do Código de
Processo Civil, a sentença proferida em ação submetida à jurisdição
voluntária sempre poderá ser modificada, no caso de ocorrerem fatos
supervenientes. Por exemplo: se, após a sentença de interdição de
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uma pessoa, verificar-se, por meio de exames, que ela não é mais
incapaz, ou seja, que ela voltou a ser mentalmente saudável, pode-se
propor nova ação visando restabelecer a capacidade da pessoa
interditada. Na jurisdição contenciosa, diversamente, a coisa julgada
material impede o reexame de causas já decididas e não mais sujeitas
a recursos.
g) na jurisdição voluntária, todos os interessados deverão ser
citados para responderem à ação. De acordo com o artigo 1.106 do
Código de Processo Civil, o prazo para resposta é de 10 (dez) dias.
Esse prazo é diferente do prazo para responder previsto nos
procedimentos de jurisdição contenciosa, que, via de regra, é de 15
(quinze) dias (artigo 297 do Código de Processo Civil).
Vejamos a seguinte questão:
(Juiz de Direito/MG – 2003/2004) No procedimento de
jurisdição voluntária, por provocação do interessado:
a) Serão citados, sob pena de nulidade, todos os demais
interessados.
b) Não haverá citação por ser o respectivo ato
incompatível com o procedimento.
c) Serão apenas intimados, por via postal, todos os
interessados.
d) Não haverá citação pelo fato de que todos os
interessados devem constar da inicial.
e) A citação ocorrerá, apenas, se os demais interessados
residirem em outra comarca.
A resposta correta é a letra A, pois, como já estudamos,
esse é o texto da lei (artigo 1.105 do Código de Processo Civil).
Vamos analisar os erros das outras assertivas:
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A letra B está falsa porque o próprio Código de Processo
Civil determina a citação de todos os interessados para os
procedimentos de jurisdição voluntária, não havendo que se
falar em incompatibilidade entre a citação e a jurisdição
voluntária.
A letra C está errada porque, de acordo com a lei, os
interessados passarão a integrar a ação, motivo pelo qual não
devem ser intimados, mas sim, citados para falar nos autos.
A letra D está errada, pois em nenhum momento a lei
autoriza a dispensa da citação se o nome dos interessados
constar na inicial.
A letra E também está falsa, pois o legislador não fez
qualquer distinção entre os interessados residentes na mesma
ou em outra comarca, de forma que todos, indistintamente,
devem ser citados.
(Juiz de Direito/MG – 2007) Quanto aos procedimentos
especiais de jurisdição voluntária, conforme dispõe o CPC, é
INCORRETO dizer que:
a) O Juiz não está obrigado a observar o critério de
legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a
solução que reputar mais conveniente ou oportuna;
b) A sentença poderá ser modificada, sem prejuízo dos
efeitos já produzidos, se ocorrerem circunstâncias
supervenientes;
c) Ao juiz é lícito investigar livremente os fatos e ordenar
de ofício a realização de quaisquer provas;
d) O prazo para responder é de quinze (15) dias.
Primeiramente, devemos ter atenção para o comando da
questão: o examinador pede a resposta errada! E o item incorreto é o
da letra D.
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Vamos aos comentários:
A letra A está correta, pois faz menção ao artigo 1.109 do
Código de Processo Civil, ou seja, diz respeito à possibilidade de o juiz
julgar de acordo com a equidade.
A letra B retrata o artigo 1.111 do Código de Processo, pois faz
referência à possibilidade de modificação da sentença proferida na
jurisdição voluntária.
A letra C também está correta, pois reproduz o disposto no
artigo 1.107 do Código de Processo Civil, que, como vimos, trata de
maiores poderes de instrução probatória do juiz.
A única assertiva errada é a letra D. Como já estudamos, nos
procedimentos de jurisdição voluntária, o prazo para resposta é de 10
dias (artigo 1.106 do Código Processual). O prazo de 15 dias é próprio
dos procedimentos da jurisdição contenciosa.
(OAB 2008 – CESPE) Na chamada jurisdição voluntária, a
composição dos litígios é obtida pela intervenção do juiz, que
substitui a vontade das partes litigantes por meio de uma
sentença de mérito, aplicando, no caso concreto, a vontade da lei.
Essa afirmativa é falsa. Conforme já estudamos na aula 0, a
jurisdição, de fato, tem a característica da substitutividade. De
acordo com essa característica, o juiz, ao proferir a sentença,
substitui a vontade das partes, dizendo quem tem ou não razão e
impondo coercitivamente sua decisão ao vencedor e ao perdedor.
Porém, na jurisdição voluntária, a intervenção do juiz se dá de
maneira diferente: ele não substitui a vontade das partes, mas sim
integra, complementa essa manifestação de vontade. Por isso que se
costuma dizer que, na jurisdição voluntária, a intervenção do juiz é
fiscalizadora e integrativa da vontade das partes.
Ainda sobre jurisdição voluntária, é importante destacar que
existem duas teorias acerca de sua natureza:
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1) teoria clássica ou administrativista, liderada por
CHIOVENDA, segundo a qual a jurisdição voluntária, apesar de se dar
no Poder Judiciário, não seria jurisdição, mas sim uma atividade
meramente administrativa. Para seus defensores, não há lide, pois, na
ação, o Estado Juiz se limita a integrar e fiscalizar a manifestação de
vontade dos particulares, agindo como administrador público dos
interesses privados;
2) teoria moderna revisionista ou jurisdicionalista,
capitaneada por CALMON DE PASSOS e OVÍDIO BAPTISTA, que afirma
que o fato de não existir lide no início da ação não impede a
superveniência de conflito no decorrer do processo. Por exemplo, no
caso da interdição, a pessoa que se pretende interditar pode se
defender, alegando que não está doente, e que os interessados
querem apenas seu dinheiro. Nesse caso, instalou-se um conflito no
curso da ação. Além disso, a ação proposta em sede de jurisdição
voluntária contém partes processuais, aqui entendidas como sujeitos
parciais no desfecho da ação, ou seja, sujeitos que querem que a
sentença decida de acordo com seus interesses. Além disso, mesmo na
jurisdição voluntária, o juiz atua como terceiro imparcial,
particularidade esta própria da atividade jurisdicional, e não da
atividade administrativa.
Acerca desse tema, vejamos a seguinte assertiva:
(OAB/DF – Exame de Ordem – 2006) Sobre a jurisdição
voluntária é possível afirmar que as teorias revisionistas não a
consideram verdadeira jurisdição e sim administração pública de
interesses privados.
A afirmação é falsa, pois, como já estudamos, esse
entendimento pertence à corrente clássica ou administrativista. A
corrente revisionista, mais moderna, entende que a jurisdição
voluntária é, sim, espécie de jurisdição.
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Bom, pessoal! Esgotamos o conteúdo relativo ao primeiro elemento da
trilogia estrutural do processo: a jurisdição. Acredito que, com os conceitos e
exercícios trabalhados na aula 0 e nesta aula 01, estamos “craques” em
jurisdição.
Passemos agora a estudar o segundo elemento da trilogia estrutural do
processo: a ação.
AÇÃO
O que vem a ser ação?
Como nós vimos anteriormente, o Estado tem o poder dever de
solucionar os conflitos de interesses das pessoas, por meio da atividade
jurisdicional. Inversamente, portanto, podemos dizer que as pessoas
envolvidas no conflito têm o direito de invocar o Estado para que suas
disputas sejam resolvidas.
Quem soluciona essas disputas, em nome do Estado? O Poder Judiciário,
por meio de seus juízes. E a esse direito de as pessoas invocarem o Estado,
que nome se dá? Esse direito é chamado de AÇÃO.
Dessa forma, podemos conceituar ação como sendo o DIREITO PÚBLICO
SUBJETIVO, AUTÔNOMO e ABSTRATO de alguém invocar a tutela jurisdicional
para solucionar um conflito.
Vamos dar uma examinada em cada uma das partes desse conceito,
para que fique bem entendido.
1. Por que se fala que ação é um DIREITO PÚBLICO? Porque é
um direito a ser exercido perante órgãos públicos do Poder Judiciário,
um dos poderes do Estado.
2. E por que esse direito é SUBJETIVO? Fala-se em direito
subjetivo porque se trata de uma faculdade, opção de agir (facultas
agendi) conferida à pessoa. Se, por exemplo, o inquilino (locatário) de
um apartamento não está pagando o aluguel mensalmente, o dono do
imóvel tem a opção, a faculdade de ajuizar uma ação de despejo
contra ele, acionando o Estado-juiz para que o inquilino desocupe o
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imóvel. Porém, se o proprietário não quiser ajuizar essa ação,
ninguém poderá obrigá-lo, pois se trata de um direito subjetivo.
3. E AUTÔNOMO por quê? Inicialmente, todo mundo achava
que o direito de ação era o próprio conflito de direito material trazido
a juízo, o próprio direito do autor reagindo a uma violação, ou seja,
pensava-se que o direito de ação era imanente ao direito material.
Esse pensamento deu origem à chamada TEORIA IMANENTISTA (ou
civilista, ou privatista) da ação. No exemplo do aluguel, o direito que
o dono do imóvel tem de receber os aluguéis em dia e expulsar o
inquilino inadimplente do imóvel (direito material) seria inseparável,
imanente ao direito de provocar o Poder Judiciário para solucionar
esse conflito. Assim, entendiam os defensores dessa teoria que não
haveria ação sem direito material, pois o primeiro era dependente do
segundo. Nosso antigo Código Civil de 1916 tinha essa concepção, ao
estabelecer, no artigo 75, que “a todo direito corresponde uma ação,
que o assegura”. O grande defensor da teoria imanentista da ação foi
SAVIGNY.
Porém, ainda nos idos de 1856, alguns doutrinadores
começaram a criticar essa teoria, afirmando que o direito de ação não
poderia ser inseparável do direito material, pois um seria
independente, distinto, AUTÔNOMO em relação ao outro. Menciono
uma célebre polêmica, adorada pelos examinadores de concurso, para
consagrar o conceito de direito de ação como direito autônomo.
Trata-se da famosa polêmica entre os juristas alemães WINDSCHEID e
MUTHER, cujo debate possibilitou a reelaboração do conceito de ação
como direito autônomo em relação ao direito material, ao se concluir
que, com a ação, nascem dois direitos: um contra o ofensor (o
inquilino, no nosso exemplo) e outro dirigido contra o Estado, para
que este preste a tutela jurisdicional. Daí porque não poderia, o
direito material do autor, ser o mesmo direito de ação contra o
ofensor e contra o Estado-juiz.
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4. Por fim, por que se fala em ação como direito ABSTRATO?
Bom, a partir do debate entre Windscheid e Muther, formou-se a
TEORIA AUTONOMISTA DA AÇÃO, que pregou a autonomia do direito de
ação em relação ao direito material do autor, em oposição à teoria
imanentista. Dentro da teoria autonomista, duas correntes se
formaram para explicar a autonomia do direito de ação. De um lado,
ficaram os CONCRETISTAS, cujos principais defensores foram ADOLF
WASH e OSKAR VON BÜLOW, que defenderam o seguinte: tudo bem, a
ação é autônoma em relação ao direito material, mas só haverá ação
quando a sentença for favorável ao autor. Em outras palavras, a ação
seria o direito de se obter em juízo uma sentença favorável. Ou seja,
no nosso exemplo do aluguel, o dono do imóvel, como autor da ação
de despejo, só terá direito de ação se, na sentença, o juiz decidir
favoravelmente a ele, decretando o despejo. Surgiu, então, o
conceito de que o direito de ação seria direito autônomo e concreto.
A partir dessa teoria, CHIOVENDA passou a entender que a ação seria
DIREITO POTESTATIVO de o sujeito (dono do imóvel, no nosso
exemplo) invocar a tutela jurisdicional contra o devedor (inquilino),
que, assumindo a posição de réu na ação, nada poderia fazer, a não
ser se submeter, se sujeitar aos efeitos da sentença.
Porém, os defensores da corrente concretista não tiveram
resposta às seguintes indagações: e se a sentença for desfavorável ao
autor? E naquelas ações meramente declaratórias, em que o autor
sequer tem direito a ser defendido, mas pretende somente que o juiz
declare alguma situação jurídica? Mais ainda, e as ações que são
extintas sem julgamento do mérito? Nesses casos, se não há direito de
ação, como o autor invocou o Poder Judiciário?
Surgiu, então, uma segunda corrente, a dos ABSTRACIONISTAS,
cujos nomes de destaque foram ALEXANDER PLÓSZ e HEINRICH
DEGENKOLB. Disseram esses doutrinadores que o direito de ação é
totalmente distinto do direito material, e existe independentemente
de o autor ter ou não razão, ou seja, o direito de ação é ABSTRATO
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em relação ao direito material. Como ensina Antonio Carlos de Araújo
Cintra, para essa corrente, “a demanda ajuizada pode ser até mesmo
temerária, sendo suficiente, para caracterizar o direito de ação, que
o autor mencione um interesse seu, protegido em abstrato pelo
direito”, estando, nesse caso, o Estado-juiz, “obrigado a exercer a
função jurisdicional” (CINTRA, Antonio Carlos de Araújo e outros.
Teoria geral do processo. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010. P.274).
Posteriormente, foram criadas algumas TEORIAS ECLÉTICAS, dentre as
quais se destaca a de ENRICO TULLIO LIEBMAN, que procurou mitigar, diminuir
o caráter abstrato da ação. Para ele, o direito de ação não estaria vinculado a
uma sentença favorável (teoria concretista), mas também não seria
totalmente independente do direito material (teoria abstracionista). Na
realidade, o reconhecimento do direito de ação, de acordo com LIEBMAN,
depende do preenchimento de algumas condições, às quais ele denominou
CONDIÇÕES DA AÇÃO: legitimidade das partes, possibilidade jurídica do
pedido e interesse de agir. Portanto, segundo o doutrinador, somente se
poderia falar em direito de ação se essas três condições fossem preenchidas;
caso contrário, estaríamos diante da carência de ação.
Ao analisarmos o nosso Código de Processo Civil, pode-se perceber que
o legislador brasileiro adotou a teoria eclética de Liebman, ao estabelecer
que a análise do mérito da ação fica condicionada ao preenchimento das três
condições da ação.
O artigo 267, VI, da nossa lei processual civil, confirma a intenção do
legislador de incluir as três condições da ação em nosso ordenamento jurídico,
pois tal artigo afirma expressamente que o processo será extinto sem
julgamento do mérito “quando não concorrer qualquer das condições da ação,
como a possibilidade jurídica do pedido, a legitimidade das partes e o
interesse processual”.
(Ministério Público/PI – 2002) A existência de relação jurídica
processual, independente da relação jurídica de direito material, retrata
a concepção formulada por Oskar Von Bülow.
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A afirmativa está correta. Oskar Von Bülow, como já estudamos, foi um
dos grandes defensores da teoria autonomista da ação, que concebeu o direito
de ação como direito autônomo e independente do direito material deduzido
pelo autor da ação.
(TRT 5 – Técnico Judiciário – CESPE - 2008) Segundo os postulados
da teoria eclética (Liebmam), adotada pelo CPC brasileiro, o direito de
ação não está vinculado a uma sentença favorável, mas também não está
completamente independente do direito material.
Esse item está correto. Como vimos, a teoria eclética criada por
Liebman veio justamente “temperar” o radicalismo das teorias concretista e
abstracionista, estabelecendo condições para o reconhecimento do direito de
ação.
Observe, também, que o Tribunal Regional Eleitoral do Estado do
Maranhão explorou o mesmo tema em seu concurso:
(TRE/MA – Analista Judiciário – CESPE - 2009) A teoria eclética da
ação – que não é adotada pelo CPC – proclama que a jurisdição só pode
ser acionada se houver o direito material postulado.
A questão está duplamente falsa. Primeiro, porque a teoria eclética
foi, sim, adotada pelo nosso Código de Processo Civil. Segundo, porque o
postulado da teoria eclética não é aquele indicado na questão, mas sim que o
direito de ação é desvinculado do direito material; porém, para ser
reconhecido, devem ser preenchidas as três condições da ação. A afirmação
inserida na assertiva, de que “a jurisdição só pode ser acionada se houver o
direito material postulado” constitui a base da teoria imanentista ou civilista,
e não da teoria eclética.
(OAB 2007 – CESPE) A O Código de Processo Civil brasileiro, Lei n.º
5.869/1973, adotou a teoria da ação como direito autônomo e concreto.
O item está errado. Como já estudamos, o Código de Processo Civil
brasileiro adotou a teoria eclética da ação, sendo a ação um direito autônomo
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e abstrato que poderá ser exercido pelo autor, desde que presentes as
chamadas condições da ação propostas por Liebman.
(TRT 23ª REGIÃO – ANALISTA JUDICIÁRIO – 2007 – FCC) É totalmente
correto afirmar que o direito de ação é um direito
(A) subjetivo, privado, autônomo e concreto.
(B) subjetivo, público, autônomo e abstrato.
(C) objetivo, público e vinculado ao resultado do processo.
(D) objetivo, privado e vinculado ao resultado do processo.
(E) objetivo, privado, concreto e abstrato.
Comentários:
Agora que entendemos os conceitos relacionados ao direito de ação,
podemos responder à assertiva acima, cujo gabarito e a letra B, pois já
estudamos que a ação é direito público subjetivo, autônomo e abstrato.
Bem, pessoal! Avancemos, porque ainda temos bastante conteúdo!
Agora, vamos estudar as condições da ação criadas por Liebman, em sua
teoria eclética.
Como já vimos anteriormente, Liebman estipulou as condições da ação
como requisitos que dão suporte ao autor para requerer a tutela jurisdicional.
Portanto, para que o juiz possa analisar o mérito da ação, ou seja, o
pedido principal formulado pelo autor, deverão estar presentes e
demonstradas as três condições P L I (regrinha mnemônica para Possibilidade
jurídica do pedido, Legitimidade das partes e Interesse de agir):
1. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO: de acordo com essa
condição, o ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, o conjunto de
todas as leis e normas existentes no Brasil, não poderá impedir a
análise do pedido formulado pelo autor da ação. Em outras palavras, o
pedido será juridicamente possível sempre que não existir, no
ordenamento jurídico, nenhuma previsão que proíba ou torne inviável
o direito alegado pela parte. Assim, somente se houver alguma lei
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vedando determinada matéria é que o pedido formulado em uma ação
com fundamento nessa matéria proibida será juridicamente
impossível, ou seja, não poderá ser analisado pelo Poder Judiciário.
Por exemplo: sabemos que, no Brasil, o divórcio é plenamente
admissível. Mas em outros países, em que se proíbe que casais se
divorciem, o ajuizamento de uma ação de divórcio constituiria
hipótese de pedido juridicamente impossível. Outro exemplo: de
acordo com o artigo 814 do Código Civil, “as dívidas de jogo ou de
aposta não obrigam a pagamento”; ou seja, o ajuizamento de ação de
cobrança de uma dívida de jogo será liminarmente extinta, por
impossibilidade jurídica do pedido, pois o nosso ordenamento jurídico
pátrio possui norma que veda expressamente a cobrança de tais
dívidas.
2. LEGITIMIDADE DAS PARTES: também chamada de
legitimidade ad causam, informa essa condição da ação que, via de
regra, as partes no processo deverão corresponder aos mesmos
titulares da relação jurídica de direito material discutida, ou seja, do
conflito que gerou a ação. Portanto, a legitimidade das partes, na
expressão trazida por ALFREDO BUZAID, consiste na PERTINÊNCIA
SUBJETIVA DA LIDE. Por exemplo: eu comprei um sofá na loja CHUCHU
Móveis Ltda., pagando à vista e em dinheiro Porém, o sofá não
chegou, e nenhum dos vendedores ou gerentes quis me dar satisfação
sobre o paradeiro do meu móvel. Nesse caso, eu devo entrar com uma
ação indenizatória contra a loja CHUCHU Móveis Ltda., e não contra o
gerente da loja ou contra a loja Móveis BATATINHA Ltda., pois a minha
disputa foi contra a pessoa jurídica registrada com o nome de CHUCHU
Móveis Ltda., e somente ela tem pertinência subjetiva para fazer
parte da lide processual.
3. INTERESSE DE AGIR: de acordo com essa condição da ação,
para que o autor possa ajuizar uma ação, ele deve ter NECESSIDADE
de invocar a tutela jurisdicional do Estado, ou seja, o réu não
entregou espontaneamente o bem da vida pretendido pelo autor,
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motivo pelo qual o autor tem necessidade de ajuizar a ação para que
ocorra a interferência do Estado na resolução do conflito; a prestação
jurisdicional requerida pelo autor deve ser ÚTIL, pois se o desfecho da
ação não trouxer nenhum resultado prático favorável para sua vida,
não haverá interesse de agir; e ainda, a via processual eleita pelo
autor deve ser ADEQUADA para a obtenção do resultado pretendido.
Assim, como se pode observar, a comprovação do interesse de agir
gira em torno do trinômio NECESSIDADE-UTILIDADE-ADEQUAÇÃO.
As condições da ação foram abordadas no concurso do Tribunal Regional