FGV DIREITO SP MESTRADO PROFISSIONAL DIREITO DOS NEGÓCIOS – TURMA 4 (2016) O ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CONDIÇÃO PRECEDENTE NO DIREITO BRASILEIRO: FUNÇÃO PRÁTICA E REGIME JURÍDICO Felipe Hannickel Souza Projeto de dissertação de mestrado apresentado ao Mestrado Profissional da FGV Direito SP Orientador: Wanderley Fernandes SÃO PAULO 2016 1
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FGV DIREITO SP
MESTRADO PROFISSIONAL
DIREITO DOS NEGÓCIOS – TURMA 4 (2016)
O ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CONDIÇÃO PRECEDENTE NO DIREITO
BRASILEIRO: FUNÇÃO PRÁTICA E REGIME JURÍDICO
Felipe Hannickel Souza
Projeto de dissertação de mestrado apresentado
ao Mestrado Profissional da FGV Direito SP
Orientador: Wanderley Fernandes
SÃO PAULO
2016
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Delimitação do tema e tratamento pretendido
A abertura da economia brasileira na década de 1990 pode ser considerada um
dos fatores responsáveis pelo crescimento do Brasil na era da globalização, verificando-
se um incremento do investimento estrangeiro no País nos últimos anos. Muito do
desenvolvimento da economia nacional se deve ao fluxo de recursos estrangeiros no
mercado1.
Maior eficiência operacional, realinhamento estratégico das atividades, sinergia
nos negócios, ganho de escala na produção ou comercialização de produtos, expansão
dos negócios via acesso de novas tecnologias, aumento da competitividade,
lucratividade e aproveitamento de prejuízos fiscais são motivações frequentes para a
realização de operações societárias por investidores estrangeiros. Independentemente do
formato do negócio a ser estruturado, o investidor pretende minimizar a assunção de
riscos sucessórios decorrentes de eventuais passivos existentes.
De fato, muito dos mecanismos e estruturas jurídicas utilizadas hoje no contexto
jurídico brasileiro de fusões e aquisições2 decorrem do fluxo de investimentos realizado
nas últimas décadas por investidores estrangeiros, essencialmente com base em
mecanismos e modelos norte-americanos e ingleses3. Neste contexto, é comum nos
depararmos em operações de fusões e aquisições, bem como de estruturação de
negócios em geral, com exigências prévias da parte investidora e respectivos assessores
jurídicos quando da implementação da estrutura jurídica a ser adotada ao negócio, com
1 O crescimento do mercado brasileiro de fusões e aquisições contribui para uma maiorespecialização dos profissionais do mercado. Em grandes escritórios do mercado, a formação deprofissionais passou a contemplar uma experiência internacional, com intercâmbio entre escritóriosinternacionais parceiros, bem como pela conclusão de cursos de LLM em universidades de primeira linha,nos EUA e Europa. Além disto, como forma de facilitar o tramite de negociações e captação de clientela,alguns escritórios passaram a firmar parcerias com renomados escritórios internacionais.
2 Conhecidas no mercado como operações de M&A, que significa “mergers andacquisitions”.
3 A estruturação de uma operação de fusão e aquisição pode ser implementadapor diversos tipos de negócios jurídicos, o que inclui formas variadas de reestruturaçõessocietárias (incorporações, cisões, fusões, drop down de ativos, trespasse, aquisição denegócios e/ou controle societário, joint venture) e via aporte de recursos via ingresso defundos de investimento, dentre outras (Management Buy-Out – MBO, ManagementBuy-in – MBI e Leveraged buyout- LBO).
2
importação de modelos e conceitos alienígenas, cuja eficácia e validade, em alguns
casos, podem não ser compatíveis com o ordenamento jurídico brasileiro.4
De toda forma, independentemente da aplicabilidade prática – muitas vezes
ainda não colocada à prova frente ao ordenamento jurídico nacional vigente - é inegável
a influência de conceitos e institutos jurídicos importados do Direito Anglo-Saxão, que
adotam o sistema da Common Law.
Em decorrência disto, muitos dos institutos jurídicos importados pela prática
comercial e incorporados ao contexto jurídico nacional passaram a ser utilizados de
forma generalizada pelos operadores do direito, sem uma análise mais aprofundada do
contexto jurídico nacional que adota o sistema da Civil Law5.
Apesar da aplicabilidade prática de alguns mecanismos, a utilização de conceitos
e cláusulas específicas passou a ser realizada de forma equivocada, sem que as partes
realizassem um juízo crítico e técnico acerca da sua compatibilização com o
ordenamento jurídico nacional, muitas vezes resultando em insegurança jurídica às
partes envolvidas na transação comercial.
O tema da dissertação será a análise das cláusulas designadas “condições
precedentes” no contexto das operações societárias de fusões e aquisições e de
estruturação de negócios em geral, seu enquadramento jurídico no Direito brasileiro,
função prática e consequências na inadequada utilização pelos operadores do Direito.
Muitas obrigações e ou condições estipuladas nestes contratos como “condições
precedentes” podem atribuir um efeito não desejado ao negócio jurídico a depender da
materialização do fato, sendo facultado às partes, inclusive, o direito de não prosseguir
com a conclusão da transação.
A escolha do tema decorre da baixa produção de textos doutrinários nacionais
específicos sobre as “condições precedentes”, com uma análise detalhada acerca do seu
enquadramento jurídico no sistema legal vigente (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de
2002 e demais normas aplicáveis) e consequências na sua inadequada utilização, por
meio de uma avaliação crítica dos reflexos práticos e econômicos envolvidos.
4 Práticas comerciais admitidas pela legislação estrangeira ou precedentesbaseadas no direito casuístico (Common Law).
5 O sistema da Civil Law adota a lei como fonte primeira do direito.
3
A inserção de obrigações contratuais denominadas de forma generalizada como
“condições precedentes” são frequentes em operações societárias, em contrapartida a
outros mecanismos cujos efeitos e aplicabilidade frente ao arcabouço legal brasileiro
outorgam maior segurança jurídica às partes, especificamente no que tange aos efeitos
do cumprimento do contrato.
Em muitos casos a não disponibilização de informações completas ou a ausência
de tempo e recursos (custo de transação com advogados, assessores financeiros, dentre
outros) para a conclusão de uma diligência adequada, farão com que as partes optem
pela inserção de cláusulas gerais na busca de preservação do negócio até a data do seu
efetivo fechamento. Nestes casos, o que se vislumbra é a inserção de deveres às partes,
consistentes em obrigações específicas e acessórias (obrigações de fazer e não fazer),
deveres de diligência ou colaboração (compromissos restritivos ou obrigações de
proteção, tais como os denominados covenants6) e até mesmo de condições suspensivas
e resolutivas, o que impactará diretamente na forma de resolução do contrato e eventual
dever de indenizar.
Apesar da grande utilização das “condições precedentes” nas operações de
fusões e aquisições, muitos operadores do Direito desconhecem a sua origem no direito
estrangeiro, seus reflexos e particularidades.
É comum operações societárias serem estruturadas e concluídas sem que as
partes tenham esgotado todos os pontos jurídicos necessários, que variam desde o
cumprimento de questões regulatórias, administrativas, financeiras e até mesmo
obrigacionais, razão pela qual alguns contratos firmados preveem que os efeitos
jurídicos do negócio estarão pendentes do cumprimento de determinadas obrigações
prévias ou condições. Ocorre que, em muitos casos, as partes envolvidas e respectivos
assessores financeiros e jurídicos utilizam equivocadamente o instituto das “condições
precedentes”, sem avaliar os efeitos decorrentes do inadimplemento contratual pelas
partes.
Historicamente as “condições precedentes” tem origem em princípios e
costumes de países integrantes da Common Law, sendo utilizada em contratos bilaterais
6 São exemplos de covenants: limitação ao grau de endividamento da empresa,impedimento ou limitação na contratação de dívidas bancárias; manutenção de capitalde giro mínimo, prestação regular de informação, escrituração contábil adequada, dentreoutros.
4
como forma de remédio para o descumprimento de obrigações contratuais assumidas, de
forma a suprir a ausência de dispositivos legais positivados.
Via de regra, a rescisão de um contrato geralmente está vinculada ao pleno
desempenho das partes no cumprimento das obrigações contratuais estabelecidas.
Enquanto não ocorre a denúncia do contrato, o contrato produz plenos efeitos às partes.
De todo modo, a possibilidade de materialização de um evento ensejador de uma
rescisão contratual e as consequências decorrentes deste evento poderão variar de
acordo com a construção das cláusulas contratuais.
A adequada utilização de obrigações contratuais como “condições precedentes”
mostra-se relevante para a compreensão dos deveres das partes na execução dos termos
do contrato.
Em determinados negócios, a relação jurídica pactuada somente passa a surtir
efeitos após o implemento de uma determinada “condição precedente”. No entanto,
após assinatura do instrumento contratual, é comum que as partes permaneçam
vinculadas ao acordo mesmo enquanto não haja o implemento de determinada
“condição precedente” e, nestas circunstâncias, as partes estão geralmente obrigadas a
empenhar os melhores esforços para garantir que o evento se materialize, de forma a
evitar uma quebra do contrato. Todavia, é recomendável que o contrato seja claro
quanto às consequências ajustadas para o inadimplemento das referidas “condições
precedentes”, tendo em vista que: a) a violação pode estender-se a todas ou apenas
algumas das obrigações assumidas pela parte inadimplente; b) o inadimplemento de
uma única obrigação ou promessa pode ser substancial ou não para o cumprimento do
contrato e c) a violação de qualquer obrigação pode ocorrer antes que a outra parte
tenha realizado qualquer uma ou algumas das suas obrigações ajustadas.
Em vista do exposto, as cláusulas contratuais devem ser elaboradas de forma
clara e inequívoca, evitando-se ambiguidades e respeitando o ordenamento jurídico
vigente, de forma a tornar a cláusula exequível. Neste sentido, as partes devem evitar a
inserção de cláusulas condicionais apenas na tentativa de limitar a responsabilidade de
uma das partes, ou que possam incentivar a conduta oportunista.
Neste sentido, por não se vislumbrar na doutrina brasileira (ao menos que tenha
sido publicado) estudo relevante acerca do regime jurídico e função prática na utilização
e compatibilização das condições precedentes, a avaliação do enquadramento jurídico
5
desta prática jurídica nas operações de fusões e aquisições e estruturação de negócios
em geral mostra-se relevante e adequada.
2. Formato do trabalho de conclusão
O trabalho terá como foco uma reflexão sobre a prática jurídica e negocial utilizada
pelos operadores do direito no Brasil nos contratos de compra e venda de participação
societária e/ou ativos e outras operações correlatas, especificamente no que tange à
utilização das “condições precedentes”.
Pretende-se mapear o uso das “condições precedentes” nas operações
societárias, com foco em algumas áreas específicas de atuação (M&A, Imobiliário,
Antitruste e Infraestrutura) por meio de entrevista com alguns profissionais renomados
de cada uma das áreas de atuação, tratando, na sequência, do seu enquadramento
jurídico no sistema legal vigente (natureza, espécies e limites), problemas nos usos
funcionais (disfuncionais), analisando os aspectos práticos e consequências atribuídas às
partes em vista da sua inadequada utilização. Ao final pretendo apresentar um desenho
de cláusula contratual como forma de recomendação prática, visando auxiliar os
operadores do direito em geral.
A propósito das entrevistas é identificar as diferentes formas de estruturação
contratual por parte dos profissionais eleitos em mercados distintos, especificamente no
que tange às “condições precedentes”, com enfoque em contextos práticos (negócios
jurídicos implementados), avaliando-se a forma de redação das cláusulas contratuais e o
efeito prático desejado, forma de alocação de risco e eventuais efeitos adversos
constatados.
De forma suplementar, visando avaliar os diferentes usos das “condições
precedentes” neste tipo de operação, realizar-se-á um paralelo com a doutrina
estrangeira, especialmente dos países que utilizam o sistema de Common Law, para
entender o racional da utilização do mecanismo das “condições precedentes”,
especificamente em operações societárias em geral.
Após analisar as diferentes formas de utilização dessas cláusulas, pretendo
criticar os usos indevidos das “condições precedentes” em determinados negócios.
6
O estudo será norteado tanto pela prática jurídica do autor quanto pela
interlocução com colegas advogados com reconhecida expertise nas respectivas áreas de
atuação.
Ao final pretende-se sugerir recomendações de utilização das “condições
precedentes”, por meio de proposta de sistematização nos contratos, de forma a
assegurar segurança jurídica às partes contratantes.
3. Principais questões ou problemas a serem enfrentados
A ausência de técnica adequada na redação de cláusulas contratuais, além de
demandar tempo e custos desnecessários pelas partes contratantes para a posterior
interpretação e execução dos efeitos pretendidos, permite, ainda, a revisão do conteúdo
e limite ajustado entre as partes7.
Muitas vezes, a indevida utilização das condições precedentes decorre de
conduta oportunista das partes.
É comum nas operações de compra e venda de participação societária que as
partes interessadas na conclusão da transação não esgotem com maturidade todas as
fases da negociação, muitas vezes agindo por impulso e pressão de custos, de forma a
não onerar a contratação com discussões pré-contratuais, aceitando os termos impostos
ou optando por cláusulas gerais imprecisas, com redações vagas e genéricas.
Via de regra, as operações de fusões e aquisições são estruturadas em etapas,
sendo frequente que entre a data de assinatura do contrato (“Signing”) e o fechamento
da transação (“Closing”)8, as partes estejam obrigadas ao cumprimento de determinadas
obrigações (de dar, fazer ou não fazer) ou que o negócio fique suspenso por conta do
atendimento de condições prévias ao fechamento (por exemplo a necessidade de
aprovação de terceiros, inclusive CADE, quando exigido).
7 Assim entendida a discussão perante o Poder Judiciário ou Tribunal Arbitral,caso as partes tenham optado pela opção da via arbitral como forma de dirimir eventuaisconflitos.
8 Termos utilizados para identificar as diferentes etapas do negócio, sendo o“signing” o momento da assinatura do contrato e o “closing” o efetivo fechamento donegócio jurídico.
7
O fato é que haverá a continuidade do curso rotineiro dos negócios entre Signing
e Closing, e o não cumprimento das obrigações pelas partes ou o não implemento das
condições suspensivas estipuladas poderá impactar diretamente no plano de eficácia dos
efeitos pretendidos, que poderão variar desde a possibilidade de aplicação de cláusula
penal, execução específica, suspensão dos efeitos pretendidos sem punição da conduta
oportunista e até mesmo a resolução do negócio jurídico, a depender do enquadramento
jurídico de cada uma das cláusulas estruturadas.
As espécies de inadimplemento de uma obrigação podem variar de culpa em
sentido estrito (voluntário) ou hipóteses de caso fortuito ou de força maior
(involuntário), alterando-se os efeitos jurídicos do inadimplemento, podendo, ainda, o
inadimplemento ser considerado absoluto ou relativo9.
Dos Negócios Jurídicos Puros e Simples
O Código Civil vigente delimita em capítulo específico acerca do direito das
obrigações, podendo estas ser classificadas em a) contratos; b) declarações unilaterais
da vontade; c) atos ilícitos e d) lei. O contrato é considerado a principal fonte de
obrigações no direito brasileiro, justificando-se a delimitação do escopo deste estudo.
As obrigações têm como elementos constitutivos (i) as partes (sujeito ativo e
passivo da obrigação) e (ii) o objeto (obrigações de dar, de fazer ou de não fazer),
estando previstas no Código Civil nos seguintes artigos: a) Obrigações de dar (Artigos
233 a 246); b) Obrigações de fazer (Artigos 247 a 249) e c) Obrigações de não fazer
(Artigos 250 a 251).
As obrigações contratuais decorrem de cláusulas do contrato estipuladas pelas
partes no momento da negociação dos termos do negócio jurídico, cujos efeitos e
consequências no seu inadimplemento poderá ser regulado em cláusula penal específica,
além de ensejar a possibilidade de sua execução forçada via ação judicial. De maneira
geral, as obrigações são disponíveis e, portanto, podem ser afastadas ou modificadas
pelas partes contratantes, mas uma vez presentes no instrumento, por vontade das
partes, devem ser cumpridas.
Segundo Washington de Barros Monteiro, a obrigação pode ser definida como
“a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo
9 No inadimplemento absoluto há impossibilidade de prestação da obrigação em momentoposterior e no relativo existe viabilidade de cumprimento da obrigação, ainda que tardiamente.
8
objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo
primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio”10.
Do contrato de compra e venda de participação societária e/ou ativos decorrem
obrigações para ambas as partes no negócio, podendo classificá-las em obrigações
principais e acessórias.
Como obrigação principal ajustada no contrato, a parte compradora obriga-se a
pagar o preço e a parte vendedora a entregar as quotas e/ou ações da Sociedade alvo (a
depender da estrutura societária a ser implementada).
Já as obrigações acessórias, usualmente, surgem concomitantemente com a
principal, e consistem em diversas obrigações específicas e necessárias à conclusão da
transação, variando desde obrigações de melhores esforços, obtenção de licenças e de
financiamento mínimo respeitadas determinadas condições comercias prévias, até com a
manutenção de níveis mínimos de desempenho da Sociedade alvo entre o Signing e
Closing (denominados covenants11) ou a não ocorrência de um efeito adverso relevante
ou a ocorrência de qualquer mudança substancial negativa nos negócios da Sociedade
alvo (Material Adverse Change Clauses - MAC Clauses), a não concorrência da parte
vendedora por determinado período de tempo, dentre outras.
Independente se classificadas como principais ou acessórias, tratando-se de um
negócio jurídico puro e simples, não sujeito a qualquer elemento acidental (condição,
termo ou encargo), reflexos diversos serão vislumbrados pelas partes, especificamente
quanto à conduta decorrente do inadimplemento contratual, gerando efeitos e
consequências imediatas, na medida em que a parte credora de uma obrigação pura e
simples possui o direito de exigibilidade prontamente, com o mero vencimento e/ou
descumprimento da obrigação pela parte devedora.
Neste contexto, é fato que as obrigações contratuais assumidas pelas partes
deverão ser cumpridas nos exatos termos ajustados entre os contraentes, sob pena de
execução específica do contrato e incidência de cláusula penal. Após assinatura do
10 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. vol. 4, 27ª ed.,São Paulo: Saraiva, 1994, p. 8.
11 Trata-se de compromisso ou promessa em contratos (frequentemente emcontratos de dívida), de forma a proteger interesses da parte credora, prevendo as partesdeterminados atos (obrigações positivas ou negativas) e/ou restrições a serem adotadascomo forma de proteção do credor (garantias acessórias).
9
contrato as partes assumem direitos e deveres recíprocos, devendo as obrigações serem
pontualmente cumpridas, estando a parte em mora, se comprovada a culpa ou dolo no
inadimplemento de qualquer obrigação contratada, principal ou acessórias.
Surgindo o contrato para regular os interesses das partes, a legislação permitiu
aos contratantes, por sua livre e espontânea vontade, a prefixação de perdas e danos
como forma de evitar a inexecução culposa de obrigação contratual (total ou parcial),
bem como o seu retardamento, de forma a evitar a conduta oportunista da parte culpada,
a instabilidade do sistema e a segurança jurídica nas relações contratuais, fomentando os
negócios no contexto social.
“Art. 409. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em
ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma
cláusula especial ou simplesmente à mora”.
De forma complementar, facultou o legislador no parágrafo único do artigo 416
da Lei nº 10.406 do Código Civil, que as partes estipulem no contrato a possibilidade de
cumulação de indenização suplementar às perdas e danos prefixados na cláusula penal,
desde que o façam de forma expressa no instrumento contratual. Neste caso a cláusula
penal valerá como uma indenização mínima, podendo o credor da obrigação, se assim
previsto no contrato e desde que demonstre ter suportado prejuízos superiores, ser
ressarcido pelo valor excedente do prejuízo.
“Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor
alegue prejuízo.
Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal,
não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi
convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização,
competindo ao credor provar o prejuízo excedente”.
Neste contexto, tratando-se de um contrato de compra e venda de participação
societária e/ou ativos em que as partes tenham ajustado adequadamente uma obrigação
contratual acessória (de fazer), no caso de inadimplemento da obrigação, poderá a parte
prejudicada, não havendo a cura pela parte inadimplente, optar pela execução ou a
resolução do contrato (conforme ajustado), com aplicação da multa prevista em cláusula
penal (se assim previsto no contrato), como forma de indenização pelos prejuízos
suportados.
10
Dos Negócios Jurídicos Condicionados
A inserção de uma condição como elemento acidental altera a dinâmica de um
negócio jurídico, especificamente no que tange ao plano da eficácia e exequibilidade em
caso de não cumprimento do quanto acordado entre as partes.
Os elementos acidentais inseridos pela vontade das partes podem criar,
suspender ou extinguir os efeitos do contrato até que haja o cumprimento de
determinadas condições previamente acordadas pelas partes.
A condição é considerada uma cláusula acessória, suspendendo os efeitos de
determinado negócio jurídico até que ocorra um evento futuro e incerto (condição
suspensiva) ou estipulando que determinada materialização de evento futuro e incerto
resolva ou extinga um negócio jurídico (condição resolutiva).
O negócio jurídico celebrado mediante condição suspensiva somente produzirá
efeitos quando materializado o evento futuro e incerto, estando preservado os seus
efeitos de existência e validade. Já o negócio jurídico celebrado mediante condição
resolutiva produz efeitos imediatamente, estando o evento futuro e incerto relacionado à
sua ineficácia.
O artigo 121 do Código Civil dispõe que “considera-se condição a cláusula
que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio
jurídico a evento futuro e incerto”,
Para a caracterização da “condição” são elementos fundamentais que haja a
futuridade e incerteza do evento, bem como a voluntariedade das partes, já que pelo
texto legal deve a condição derivar “exclusivamente da vontade das partes”12. Caso
contrário, se o evento for futuro e certo estaremos diante do “termo”.
12 As condições podem ser classificadas em casuais (quando o evento futuro eincerto for desvinculado da vontade das partes), potestativas (implemento da condiçãodepende da vontade das partes) e mistas.
11
Da mesma forma, para a condição suspensiva ser válida e não haver
questionamento deve a mesma ser possível jurídica e fisicamente, sob pena de nulidade
absoluta do negócio jurídico, a teor do quanto disposto no inciso I do artigo 123 do
Código Civil. Tratando-se de condição resolutiva ou condição de não fazer coisa
impossível, havendo impossibilidade física e jurídica, fica preservado o negócio
jurídico, invalidando-se tão somente a condição pactuada.
“Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados:
I - as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas”
(...)
“Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas,
e as de não fazer coisa impossível”.
Dentro do mesmo conceito, as condições ilícitas13 ou de fazer coisa ilícita
também invalidam os efeitos do negócio jurídico, nos termos do inciso II do artigo 123
do Código Civil.
Especificamente no que se refere aos efeitos do implemento das condições
suspensivas e resolutivas, muito comuns nos contratos de compra e venda de
participação societária e/ou ativos e de estruturação de negócios em geral, mostra-se
relevante a avaliação dos reflexos diretos às partes envolvidas, que poderá variar de
acordo com a sua fase, a saber, a) pendência; b) implemento e c) frustração.
Pendência – para as condições suspensivas e resolutivas, até que haja o
implemento ou frustração do evento futuro não existe direito adquirido, mas tão
somente uma expectativa de direito. Nos termos do artigo 130 do Código Civil, é
facultado ao titular do direito eventual praticar os atos necessários à sua conservação,
podendo se valor dos meios judiciais e extrajudiciais para tanto.
13 Condições ilícitas são aquelas em que o evento futuro e incerto constitui umfato ilício, ou seja, contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes. Tambémentendidas como condições imorais ou ilegais.
12
Implemento – para as condições suspensivas, com o implemento do evento
futuro ocorre a aquisição do direito por seu titular. Já para as condições resolutivas, com
o implemento da condição extingue-se o direito.
Frustração – para as condições suspensivas, com o não implemento do evento
futuro e condicionante haverá a extinção do negócio jurídico. Já para as condições
resolutivas, com a impossibilidade de implementação da condição, haverá a
transformação do negócio jurídico em puro e simples.
Em determinados casos é comum vislumbrarmos o não implemento ou a
frustração da condição precedente de forma intencional (dolosa), de modo que não se
possa atingir o objeto pretendido, como forma de conduta oportunista da parte não
interessada na conclusão do negócio jurídico, razão pela qual se mostra de suma
importância a forma de redação das cláusulas contratuais. É comum em algumas
situações que as partes optem, propositalmente, pela manutenção de um regime jurídico
em aberto.
“Art. 129. Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo
implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer,
considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente
levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento”.
Em que pese alguns entendimentos diversos, a grande maioria da doutrina
entende que os elementos acidentais do negócio jurídico não devem ser enquadrados
como duas manifestações distintas de vontade (principal e acessória), sendo o ato
condicionante único. Assim sendo, havendo a decretação de nulidade da condição, o
negócio jurídico como um todo também será considerado nulo.
No mesmo sentido, diferentemente do negócio jurídico puro e simples, não
sujeito a qualquer elemento acidental (condição, termo ou encargo), com o não
implemento do evento futuro e incerto haverá a extinção do negócio jurídico. A
condição suspensiva suspende a eficácia do negócio e, tornando-se impossível a
verificação do evento condicionante, o negócio jurídico jamais poderá produzir os seus
efeitos.
13
Quesitos:
a Qual ou quais o(s) enquadramento(s) das “condições precedentes” no direito
brasileiro?
14
b Qual o fundamento jurídico e prático para a inserção das “condições
precedentes” nos negócios jurídicos em geral, especificamente em operações
societárias? c A inclusão de “condições precedentes” nos contratos de compra e venda de
participação societária e de estruturação de negócios em geral constitui
instrumento legítimo para defesa dos interesses das partes? Cabe execução
específica?d O implemento de uma “condição precedente” pode ser entendido como
elemento de eficácia de um contrato como um todo? Trata-se de uma solução
eficiente do ponto de vista econômico?e Quais as consequências práticas do não cumprimento/implemento das
“condições precedentes” nos negócios jurídicos? f A ausência de mecanismos específicos acerca do não cumprimento de uma
“condição precedente” pode incentivar a conduta oportunista de uma das
partes? Como mitigar este risco?g A qualificação das “condições precedentes” como obrigações principais e
acessórias, ou até mesmo como elementos acidentais do negócio jurídico
(condição suspensiva, termo, condição resolutiva, encargo) não seria mais
adequada?
4. Objetivos pretendidos, perspectivas de análise e resultados esperados
A inserção de cláusulas bem delineadas e adequadas gera um contrato mais
eficiente, com menos margem de condutas oportunistas pelas partes e maior segurança
jurídica às partes contratantes.
Normalmente, dificuldades na interpretação dos contratos podem decorrer de: a)
lacunas e/ou redação inapropriada de cláusulas contratuais; b) ambiguidade de cláusulas
contratuais; c) cláusulas contratuais contraditórias e d) inadequado enquadramento
jurídico de institutos jurídicos frente ao ordenamento jurídico vigente.
O trabalho terá como objetivo avaliar os reflexos práticos na utilização do
instituto das “condições precedentes” no direito brasileiro, especialmente em contratos
de compra e venda de participação societária e operações correlatas, visando uma maior
segurança jurídica às partes envolvidas nestas transações, com a apresentação de
modelo de sistematização de cláusula contratual.
15
5. Justificação da relevância prática e do potencial inovador
O mercado brasileiro de fusões e aquisições apresentou um amadurecimento nas últimas
décadas, gerando um ambiente propício para a expansão e desenvolvimento da atividade
empresarial, permitindo o ingresso de capital estrangeiro.
Dados demonstram que o “crescimento do número de fusões e aquisições no
Brasil acompanhou o processo de liberação econômica, sendo favorecida a partir de
três diferentes perspectivas: (i) a desregulamentação dos mercados locais, associada às
tendências internacionais em direção à globalização, que permitiu que empresas
estrangeiras adquirissem empresas brasileiras; (ii) programas de privatização que
possibilitaram que o capital privado, nacional ou internacional, investissem em setores
anteriormente controlados pelo governo; e (iii) a elevada competição internacional,
associada à acelerada mudança tecnológica, que gerou uma maior busca das
companhias por eficiência e qualidade para sobreviverem vendo nas transações de
F&A uma saída rápida para acompanhar estas alterações”14.
Entretanto, é comum surgirem disputas contratuais em operações societárias
desta natureza por (i) insegurança jurídica e imprevisibilidade na redação dos contratos;
(ii) conduta oportunista de uma das partes envolvidas; (iii) desequilíbrio contratual; (iv)
impossibilidade de cumprimento posterior de obrigações contratuais ajustadas e (v)
interpretação contratual inadequada, especialmente por conta de cláusulas abertas.
A ideia do estudo é avaliar a tipologia das “condições precedentes” no direito
brasileiro e suas variáveis, com foco na sua aplicação prática, de forma a minimizar os
impactos possíveis com a sua inadequada utilização (cláusulas contratuais genéricas),
por meio da sugestão de aplicação de mecanismos e cláusulas específicas a serem
inseridas nas operações societárias desta natureza.
6. Fontes de pesquisa e métodos de investigação
14FERREIRA, Talieh Shaikhzadeh Vahdat e CALLADO, Aldo Leonardo Cunha. “Fusões e Aquisiçõesno Brasil: Reflexões Acerca da Evolução do Volume De Transações”. Página consultada em 08 de julhode 2016, http://www.uff.br/pae/index.php/pca/article/viewFile/463/pdf.