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1 UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SÃO CAETANO DO SUL BACHARELADO EM DIREITO BRUNA LOPES BRUSSO DIREITO DE VIZINHANÇA FRENTE À PERMANÊNCIA DE ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO SÃO CAETANO DO SUL SP 2014
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Dec 16, 2018

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UNIVERSIDADE MUNICIPAL DE SÃO CAETANO DO SUL

BACHARELADO EM DIREITO

BRUNA LOPES BRUSSO

DIREITO DE VIZINHANÇA FRENTE À PERMANÊNCIA DE

ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO

SÃO CAETANO DO SUL – SP

2014

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BRUNA LOPES BRUSSO

DIREITO DE VIZINHANÇA FRENTE À PERMANÊNCIA DE

ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO

Monografia apresentada como requisito

parcial para a obtenção do título de Bacharel

em Direito pela Universidade Municipal de

São Caetano do Sul.

Orientador: Profª. Ms. Cristiane Vieira de

Mello

SÃO CAETANO DO SUL – SP

2014

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BRUNA LOPES BRUSSO

DIREITO DE VIZINHANÇA FRENTE À PERMANÊNCIA DE

ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO

Esta monografia foi julgada e aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul - SP.

São Caetano do Sul, __ de _____ de 2014.

Banca Examinadora

____________________________________

Profª Ms. Cristiane Vieira de Mello

Orientadora

_____________________________________

2º Examinador

_____________________________________

3º Examinador

Nota: _______________

SÃO CAETANO DO SUL – SP

2014

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus e a toda a minha família por acreditarem

em mim e me apoiarem por todo esse ciclo da minha vida.

Agradeço especialmente a minha orientadora Professora Cristiane Vieira de

Mello, por ter me auxiliado nesse projeto que dará ensejo à conclusão da minha

graduação, pelo suporte no pouco tempo que lhe coube, pelas suas correções e

incentivos.

A esta universidade, seu corpo docente, direção e administração que

oportunizaram a janela que hoje vislumbro um horizonte superior, eivado pela

acendrada confiança no mérito e ética aqui presentes.

Agradeço imensamente aos meus pais e minha irmã pelo amor, incentivo e

apoio incondicional.

E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, o

meu muito obrigada.

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“Dedico este trabalho as minhas avós Jovina da Silva Brusso e

Rosa Basseto Rizzo (in memoriam), por terem sido um

exemplo de força e perseverança, nas quais pude me espelhar

e concluir um ato que eu sempre sonhei”.

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RESUMO

O presente trabalho tem como tema o Direito de Vizinhança frente à

permanência de animais em condomínio edilício, estudando as relações de

vizinhança e os problemas daí advindos. Tem como principal foco demonstrar a

importância de uma Lei Federal sob Normas Reguladoras, bem como a importância

de animais na vida de um ser humano. Existem regras, direitos, deveres e

exigências que são inerentes às relações de vizinhança. A aproximação das

propriedades dá ensejo há inúmeros conflitos, em seus mais variados aspectos,

onde surge a necessidade de normas reguladoras para que proprietários

considerados nocivos aos demais condôminos possam ser penalizados. Traz o

direito ao condômino de buscar ao judiciário, quando não for possível a solução

amigável, os seus direitos, de modo a impedir que os condôminos nocivos

atrapalhem sua saúde, segurança e sossego.

Palavras-chave: Vizinhança. Permanência de Animais. Condomínio

edilício

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ABSTRACT

The present work has as its theme the Right Neighbourhood to permanence

of animals in building condominium, studying neighborly relations and the problems

that stem from them. Its main focus is to demonstrate the importance of a Federal

Law on Regulatory Standards as well as the importance of animals in the life of a

human being. There are rules, rights, duties and requirements that are inherent to

neighborly relations. The approach gives rise properties there are numerous conflicts

in its various aspects, where the need arises for regulatory standards that owners

considered harmful to other tenants may be penalized. Brings to the joint owner of

the right to seek justice, if not in the friendly settlement, your rights in order to prevent

the harmful tenants disturb their health, safety and quiet.

Keywords: Neighbourhood. Permanence of Animals. Building

Condominium.

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SUMÁRIO

RESUMO ..................................................................................................................................................... 6

ABSTRACT ................................................................................................................................................... 7

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 9

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA ..................................................................................................................... 10

3. CONCEITO DE PROPRIEDADE ........................................................................................................... 13

3.1 CONCEITO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO NO CÓDIGO CIVIL ............................................................. 15

3.2 DIREITO COMPARADO QUANTO À DENOMINAÇAO DE CONDOMÍNIO ......................................... 16

4. LIMITE AO DIREITO DE CONSTRUIR .................................................................................................. 17

5. CONVENÇÕES DE CONDOMÍNIO E LEGALIDADE DAS LIMITAÇÕES.................................................. 19

5.1 CONDÔMINO E INQUILINO ...................................................................................................... 21

5.2 USO ABUSIVO DA PROPRIEDADE ................................................................................................... 22

5.3 CONDOMÍNIO NOCIVO ................................................................................................................... 24

5.4 PERTURBAÇÃO SONORA – LIMITES E PARÂMETROS ..................................................................... 27

5.5 A LEGISLAÇÃO REGULADORA ......................................................................................................... 28

6. CONCEITO DE DIREITO DE VIZINHANÇA ........................................................................................... 31

6.1 ANIMAIS – Assunto objeto no trabalho ................................................................................... 35

7. JURISPRUDÊNCIAS EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ........................................................................ 42

7.1 JURISPRUDÊNCIAS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA .............................................................. 47

7.2 JURISPRUDÊNCIAS DESFAVORÁVEIS AOS CONDÔMINOS QUANDO PROVADOS OS RISCOS À

SAÚDE, SOSSEGO E HIGIENE DOS DEMAIS CONDÔMINOS – TJSP ....................................................... 49

8. SOLUÇÃO AMIGÁVEL ........................................................................................................................ 50

9. PROCEDIMENTOS JUDICIAIS ............................................................................................................. 51

10. CONCLUSÃO ................................................................................................................................. 52

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... Erro! Indicador não definido.

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1. INTRODUÇÃO

Desde os tempos mais antigos se tem notícia de problemas entre vizinhos. O

assunto já foi objeto de literatura, comédias no cinema, notícias nas páginas policiais

dos jornais e brigas nos tribunais. Não raro, os problemas acabam em tragédia.

No Brasil, até anos atrás, o problema estava restrito às moradias térreas, e aos

conflitos de vizinhança decorrentes de relações, na maioria das vezes, formadas por

duas pessoas: o morador e o vizinho da casa ao lado.

No entanto, em função do crescimento demográfico das grandes cidades, somado à

busca constante por maior segurança, é cada vez maior o número de pessoas que

buscam morar em condomínios.

Se por um lado esta é uma alternativa atraente e que atende às expectativas da

população, por outro traz à tona um novo problema, qual seja: A convivência

harmoniosa entre os vários condôminos, uma vez que terão eles que se submeter

não somente às regras de boa vizinhança, mas também às regras internas do

condomínio, sem as quais torna-se impossível a manutenção da ordem e da

harmonia dentro do conjunto. A situação se agrava pelo fato de a maioria das

pessoas não terem a menor noção de como funciona um condomínio e,

especialmente, dos direitos e obrigações de cada condômino.

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2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Ao iniciarmos nossos estudos é de extrema importância falar sobre os

nômades e a fixação do homem na terra por envolver questões relacionadas à

propriedade.

O Homem possuía no passado a característica de nômade antes do

surgimento da agricultura, deslocava-se para lugares onde havia alimentos, quando

escasso o local onde estava e já não supria mais as suas necessidades alimentícias.

Sua principal atividade econômica era a caça e as incertezas deste modo de

vida o levou a fixar moradia e a domesticar os animais.

Provavelmente a agricultura começou quando as mulheres que colhiam as frutas começaram a perceber que onde jogavam as sementes, posteriormente nascia no local um pé do mesmo fruto. Estudiosos acreditam que elas começaram a armazenar as sementes para plantá-las, iniciando-se assim os primeiros passos da agricultura nos moldes como conhecemos hoje.

1

É de fácil compreensão que, o homem ao nascer sente a necessidade de

lutar, buscar um espaço necessário à sua sobrevivência. O surgimento da

propriedade parece-nos inerente ao homem, surgiu da incerteza e necessidade de

segurança.

Diante dessa fragilidade surgiu a dominação ou dominium das coisas que o

cercavam que eram imprescindíveis a sua manutenção e sobrevivência. A partir daí,

emerge o sentimento de posse, devido ao instinto de sobrevivência.

A medida de suas conveniências, este sentimento tomou conta do homem,

e após este, o sentimento de conservação dentre outros.

Existem países em que a propriedade é praticada desde a antiguidade,

como na Grécia e na Itália. A terra pertencia ao indivíduo, e a colheita para o povo, e

o direito à propriedade é fundado na religião, que garantia que a casa era o lugar

onde os deuses eram invocados devendo aquela propriedade ser isolada.

1http://pt.wikibooks.org/wiki/Civilizações_da_Antiguidade/O_homem_sedentário, acesso em 03.04.2014.

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As populações da Grécia e da Itália, desde a mais alta antiguidade sempre

conheceram e praticaram a propriedade privada.

Há três elementos que, já nas épocas mais antigas encontramos fundadas e solidariamente estabelecidas nessas sociedades gregas e Italianas: a religião doméstica, a família e o direito de propriedade; três dados que guardam entre si, na origem uma relação manifesta e que parecem ter sido inseparáveis.

2

Os Gregos chamavam de ERKOS e os latinos, herctum o espaço fechado e sagrado onde a tribo ou família morava e tinha seu campo de cultura e seus rebanhos, era ocupado pelo lar do deus doméstico que assegurava o direito de propriedade sobre aquela terra.

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Essas velhas regras religiosas fizeram que a vida em comunidade jamais

pudesse estabelecer-se entre os antigos.

Com isso, é possível verificar que a propriedade desde o princípio, tem sua

origem na religião, ou seja, é muito evidente que não foram as leis que garantiram

inicialmente o direito de propriedade e sim a religião e somente depois transformou-

se em uma instituição jurídica.

Coulanges nos ensina que::

“De todas essas crenças, de todos esses costumes, de todas essas leis, decorre claramente que foi a religião doméstica que ensinou ao homem apropriar-se da terra e que lhe garantiu o direito sobre ela.”4

A noção de propriedade na antiga Roma, segundo algumas fontes, surge da

lei das XII Tábuas. Nesse período, o individuo recebia uma porção de terra que

devia cultivar, mas uma vez determinada a colheita, a terra voltava a ser coletiva.

Aos poucos, fixa-se o costume de conceber sempre a mesma porção de terras as

mesmas pessoas ano após ano. A lei das XII Tábuas institui a noção jurídica do

domínio sobre a terra de forma absoluta.

“Permitiram, enfim, vender o terreno, mas para isso ainda eram necessárias formalidades de caráter religioso.”5

Com a Lei das XII Tábuas a venda de propriedade já era permitida, ou seja,

ao deixar ao túmulo o caráter de inalienabilidade, dele liberou o campo, permitiu-se,

em seguida, dividir a propriedade.

2 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis, A cidade antiga, Editora Afiliada, 1990, p.73

3 MOTTA, J.A de Faria, Condominio e vizinhança: direito e ações, Editora Saraiva, 1942, p.14

4 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis, A cidade antiga, Editora Afiliada, 1990, p.81

5 ________________________________, A cidade antiga, Editora Afiliada, 1990, p.83.

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A lei das XII Tabuas foi uma das primeiras leis que ditavam normas eliminando as diferenças de classes, atribuindo a tais um grande valor, uma vez que as leis do período monárquico não se adaptaram à nova forma de governo, ou seja, à República e por ter dado origem ao Direito civil e às ações da lei, apresentando assim, de forma evidente, seu caráter tipicamente romano.

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O artigo da Lei das XII Tábuas se refere ao devedor insolvente, lemos: Si

volet suo vivito, o devedor, portanto, tornado quase escravo, conserva ainda algo de

próprio, a sua propriedade, se a tem, não lhe é tirada.

A partir do século XVIII, a escola do direito natural reclamara leis que

definissem a propriedade. A Revolução Francesa recepciona as idéias romanas, que

somente perdem força no século XIX, com a revolução, o desenvolvimento industrial

e as doutrinas socializantes, alcançando o fim social da propriedade.

Cumpre destacar que, na idade média era bem diferente, haja vista que a

propriedade da terra, seus usos e utilizações constituíram a base de sustentação da

sociedade feudal européia nesse período (V-XV). Durante o feudalismo, quem tinha

posse da propriedade da terra era considerado nobre e os que não tinham posse da

terra ficaram presos a ela sob o regime de servidão.

Grande parte da Europa Ocidental, entre os séculos VIII e XV, se encontrava

em um estreito laço com a terra. As atividades ligadas à agricultura e à posse da

terra regulavam toda a vida econômica e social no período feudal.

Portanto, a posse da propriedade da terra na sociedade agrária medieval era

considerada sinônimo de privilégio. Assim, os senhores feudais, detentores das

terras, dominavam as relações de poder durante a Idade Média.

Podemos compreender que, ao passar dos anos, o termo “propriedade” vem

ganhando novos conceitos e, veremos adiante o significado de propriedade

atualmente de acordo com a lei.

6 GUIMARÃES, Affonso Paulo, Noções de Direito Romano, Porto Alegra, Editora Síntese, 1999

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3. CONCEITO DE PROPRIEDADE

O Código Civil não dá uma definição de propriedade, anunciando os poderes

do proprietário no art. 1.228: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor

da coisa, e o direito de reavê-la de poder de quem quer que injustamente a possua

ou a detenha”.

Para Silvio Rodrigues propriedade significa:

Um direito real, ou seja, um direito que recai diretamente sobre a coisa e que depende, para seu exercício, de prestação de quem quer que seja. Ao titular de tal direito é conferida a prerrogativa de usar, gozar e dispor da coisa, bem como a de reivindicá-la de quem a injustamente a detenha”.

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Conforme preleciona Aldemiro Rezende Dantas Jr:

Embora seja o direito de propriedade amplo, não é absoluto, pois sofre restrições e limitações de diversas ordens, nas quais estão sempre presentes as idéias de proibir os abusos do proprietário, no exercício de seu direito, e de impedir que esse volte a se transformar, como em outros tempos, em instrumento de dominação e de aviltamento à dignidade humana.

8

Ou seja, o homem tem direitos que são concedidos para serem usados

dentro de sua finalidade, dentro de seus limites, existindo, portanto, restrições

quanto ao uso de sua propriedade.

De acordo com Carlos Roberto Gonçalves:

Os elementos usar, gozar dispor da coisa e reavê-la, conforme o caput do artigo 1228 do código Civil, correspondem aos atributos jus utendi, fruendi, abutendi e à reivindicatio, que advieram da propriedade romana, segundo ele, tais elementos constitutivos, quando reunidos estiverem e pertencendo a uma só pessoa, tem esta a titularidade plena de uma propriedade. Todavia, se um ou alguns destes elementos forem exercidos por outro, os poderes sobre a propriedade serão limitados, tal como ocorre com o usufruto, em que os direitos de usar e gozar da coisa ficam a cargo do usufrutuário, e ao nu proprietário cabe somente o direito de dispor e de reivindicar a coisa.

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Desse modo, o direito de usar (jus utendi), primeiro elemento constitutivo da

propriedade, faculta ao dono servir-se da coisa ou utilizá-la da maneira que lhe

convier, não devendo, porém, alterar a sua substância, excluindo, se preferir,

terceiros da mesma possibilidade.

7 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das Coisas. 27ª ed. São Paulo, Editora Saraiva, 2002, p.77

8 JUNIOR, Aldemiro Rezende Dantas, O direito de Vizinhança, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2003, p. 10

9 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 3ª edição, São Paulo: Saraiva, 2008, p.187.

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Tal faculdade é limitada, porquanto o uso deve ser acerca dos limites da lei,

e observar a função social da propriedade, de acordo com a prescrição do §1º do

artigo 1.228 do Código Civil.

O proprietário, em virtude do jus utendi, tem a garantia de manter em seu

poder a coisa, mesmo sem usá-la, apenas para servir-se dela quando bem lhe

convier.

O jus fruendi (direito de gozar ou usufruir) permite a quem o detém, a

percepção dos frutos naturais e civis da coisa, bem como o de tirar proveito

economicamente do que ela produzir.

Pelo jus abutendi (direito de dispor) compreende-se a faculdade de transferir

a coisa, gravá-la de ônus ou aliená-la a outrem, sob qualquer título, não implica, no

entanto, a possibilidade de abusar da coisa, destruindo-a gratuitamente. Considera-

se o mais importante dos direitos já mencionados, porquanto o ato de disposição da

coisa revela a qualidade de dono.

“A interface entre a propriedade e o direito de vizinhança completam o panorama de como se relacionam os cidadãos na sociedade da livre iniciativa privada e institucionalizada.”10

A função social da propriedade está prevista na Constituição Federal de

1988, no capitulo de direitos e garantias fundamentais, que afirmam que todos são

iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade do direito á vida, a

liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade, e no inciso XXIII que prevê que

a propriedade atenderá a sua função social.

Onde há relação humana há condomínio. O novo ramo multidisciplinar do

direito que começa a surgir é o direito de convivência.

10

WAGNER, Michel Rosenthal. Direito imobiliário, Condominial, Urbano e de Vizinhança. Audiolivro. Universidade Falada.

Editora Alyá.

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3.1 CONCEITO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO NO CÓDIGO CIVIL

O Condomínio Edilício é, segundo o Código Civil de 2002, o conjunto de

edificações caracterizado pela existência de partes exclusivas e partes comuns.

De acordo com o Código Civil, o condomínio edilício é tratado em seus

artigos 1331 a 1358.

Como podemos observar, o condomínio edilício não existe somente nas

edificações, mas também no conjunto de edificações, independentemente do

número de pavimentos que o compõem, exigindo somente que existam várias

unidades autônomas, não importando o número de peças e a sua destinação, que

pode ser residencial ou comercial.

Caio Mário aduz que o acontecimento que precipitou o surgimento dos

condomínios edilícios aconteceu:

"(...) em Rennes, em 1720, quando um grande incêndio destruiu parte da cidade e compelidos os habitantes a construírem casas de mais categoria, submetidas à planificação preordenada, adotaram com espontaneidade a elevação de edifícios de três e quatro andares, usados com autonomia"

11

“Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves, o condomínio edilício caracteriza-se pela existência de duas propriedades, uma comum ou indivisa e outra propriedade exclusiva ou divisa”12.

A lei 4.591/64 (art. 12, § 1º) determina que cada condômino concorra no

rateio das despesas do condomínio de forma correspondente à sua fração ideal de

terreno, salvo disposição em contrário na convenção. O novo Código Civil (art.

1.336, I) dispõe como dever do condômino que este contribua para com as

despesas do condomínio na proporção de sua fração ideal. Não especificando, no

entanto, se as frações ideais são as no solo e nas coisas comuns.

“Assim, o condomínio edilício é caracterizado como conjunto integral de área privativa e áreas comuns.”13

11

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. Editora Forense. 10. ed. Rio de Janeiro: 1997. p. 62 12

GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 3ª edição, São Paulo: Saraiva, 2008, p.189-190 13

WAGNER, Michel Rosenthal. Direito imobiliário, Condominial, Urbano e de Vizinhança. Audiolivro. Universidade Falada. Editora Alyá.

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3.2 DIREITO COMPARADO QUANTO À DENOMINAÇAO DE CONDOMÍNIO

Para o desenvolvimento do trabalho no que se refere ao condomínio, se faz

necessária a comparação a respeito da denominação do instituto do condomínio,

uma vez que divergem os doutrinadores.

Com relação aos doutrinadores estrangeiros, Peretti-Griva alude ao “condomínio di case divise in parti” ou “condomínio sui generis”, enquanto Lino Salis refere-se ao “condomínio negli edifici”. Todavia, Carillo, Lassaga e Arcana adotam a denominação propriedade horizontal que é utilizada pelo Código Civil Português, enquanto Racciatti prefere falar em “propriedad por pisos”.

14

Na Itália, o Código Civil, adota a denominação:

“condomínio negli edifici”, mas a doutrina utiliza varias expressões com

“condomínio edilizio” (Benacchio), “condomínio di cae divise per piani” (Peretti-

Griva), dentre outras expressões.”

Na França, é utilizada a expressão “compropriètè dês immeubles bâtis”

regulado pela lei n° 65-557, de 10/07/1965 e Decreto n° 67-223 de 17/03/1967. A

doutrina cita seus objetivos:

“A valorização do patrimônio comum, resguardando os direitos individuais;

preocupação de se evitar litígios; a personificação do “sindicato dos condôminos”.15

A lei estipula aos condôminos no art. 10 vários deveres como participação

nas despesas com serviços coletivos, participação nos encargos relativos à

manutenção, conservação e administração das partes em comum, dentre outras.

Na Espanha, utiliza-se a expressão “propriedad horizontal” ou “propriedad de

casas por pisos”, onde predomina a concepção que a convenção de condomínio tem

caráter convencional e não institucional. 16

A lei Argentina 13.512 de 1948 assegura aos condôminos direito de uso do

bem conforme sua destinação, direito de alienação, etc. Além dos deveres

geralmente impostos a todos como participação nas despesas, proibição de

inovação nas partes comuns, obediência à convenção, prevê no seu art. 6° as

vedações de utilizar o bem de modo contrário a moral e aos bons costumes, ou

diverso do previsto na convenção, perturbar a tranquilidade dos vizinhos.

14

LOPES, João Baptista, Condomínio, 8ª Ed. São Paulo: RT, 2003, p.29 15

__________________ , Condomínio 8ª Ed. São Paulo: RT, 2003, p.30 16

__________________ , Condomínio 8ª Ed. São Paulo: RT, 2003, p.31

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17

No que tange a natureza jurídica, oferece a doutrina algumas divergências.

Caio Mário da Silva Pereira propõe “propriedade horizontal”, Carlos Maximiliano

“condomínio relativo”, e Nascimento Franco “condomínio em edifícios”. O termo

empregado pelo Código Civil Brasileiro referiu a denominação “condomínio edilício”

que é a mais adequada segundo Ruy Barbosa.

Portanto, de modo geral, todos dos países civilizados admitem o instituto da

propriedade horizontal ou condomínio edilício, impondo limites, criando direitos e

deveres entre os condôminos, enfim, regulando a relação entre eles, a fim de evitar

quaisquer transtornos.

4. LIMITE AO DIREITO DE CONSTRUIR

Para que a vizinhança não seja prejudicada, o direito de construir está

sempre limitado a alguma lei ou alguma norma que indique os tipos de autorizações

necessárias para que se adéque à determinada região, pois, as cidades já estão

muito populosas e as construções verticais são as que mais ocorrem nesses últimos

anos, porém, essas construções devem ser normatizadas de modo que não

prejudiquem as demais vizinhanças.

A Limitação ao direito de construir, no Brasil, compete a cada município, mas

essa autorização do Poder Público nem sempre é correta, pois muitas vezes não se

leva em conta o direito de vizinhança e ordem condominial e liberam a obra com

base em apenas dados técnicos, desse modo, após a realização da construção, por

essa indevida autorização, é que o vizinho verifica o dano causado por aquela obra

e a embarga judicialmente.

Devido ao crescimento acelerado da cidade, podemos dizer que o direito de

vizinhança está muito presente em nossas vidas, por isso, seria medida de rigor que

o poder público fiscalizasse corretamente e atenciosamente essas áreas para que

essas questões não acabem no judiciário, pois existe uma quantidade no judiciário

absurda de processos e assim seria mais difícil a resolução desse problema, uma

vez que levaria muitos e muitos anos.

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Diante dos requisitos das limitações de construir, o proprietário pode até

perder uma parte de seu terreno, como é o caso dos loteamentos, em que o

proprietário deve deixar uma área livre como área institucional, tal área servirá para

a prefeitura construir obrar, praças, hospitais, escolas, dentre outros espaços.

Todos os requisitos devem ser atendidos, o artigo 1301 do Código Civil,

estabelece que a distância mínima para abertura de janelas, terraços ou varandas é

de um metro e meio. Tal limite deve ser observado para não provocar ações

judiciais, pois o vizinho que se sentir prejudicado poderá pedir a nunciação de obra

nova quando ela estiver sendo feita descumprindo os limites permitidos em lei, caso

a obra já tenha sido realizada, poderá por meio de ação demolitória pleitear os seus

direitos.

Quando verificada a ilegalidade na obra efetivada, é necessário que o

proprietário vizinho observe o prazo estipulado para ingressar com a ação, pois

passando de um ano e dia não poderá mais solicitar o desfazimento da obra e o

proprietário da obra ilegal terá o direito de continuar com ela caso o proprietário

vizinho fique omisso e não entre com a ação no prazo determinado em lei.

Outro ponto a ser observado é em relação às questões ambientais ou em

áreas de interesse histórico, pois independente de um proprietário ter seu terreno em

um centro histórico de um adequado município, uma vez que irá de encontro aos

interesses públicos, provavelmente ele não poderá realizar construções nesse

determinado espaço.

Pelo que estudado até o momento fica mais uma vez demonstrado que o

proprietário quase não é dono de seu próprio terreno, pois ele pode perder a

qualquer momento parte dele ou também poderá ser proibido de realizar

construções, porém, o interesse individual, não deve ser menos que de toda a

população vizinha e que a ordem se instale nas cidades e que o interesse coletivo

seja preservado, vez que isso se deve ao fato da coletividade.

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5. CONVENÇÕES DE CONDOMÍNIO E LEGALIDADE DAS

LIMITAÇÕES

Para regulamentar o convívio entre os condôminos foram criadas as

convenções de condomínio, para evitar diferenças entre as pessoas e protecionismo

entre elas. Em forma de lei, essas normas já existem, mas como já esclarecido aqui

em alguns pontos anteriores, conforme a população está crescendo absurdamente,

bem como as construções verticais estão se estendendo a cada vez mais,

acreditaram que o melhor a ser feito era criar uma convenção que atenderia a todos,

quer seja proprietários, quer seja inquilinos.

Pelo princípio da supremacia da ordem pública sobre as deliberações

privadas qualquer convenção criada, mesmo que seja de acordo entre as partes,

deve obedecer à lei.

As convenções são institucionais e não contratuais e cabe ressaltar que ela

não será vinculada apenas aos moradores que pertenciam ao condomínio quando

de sua criação, mas sim a todos os que entrarem posteriormente.

De acordo com o artigo 1333 do Código Civil, para a existência de um

condomínio, ele deve ter a convenção constitutiva e deve ser registrada no Cartório

de Registro de Imóveis para que seja regulamentada. Segundo a Súmula 260 do

STJ derrubou o entendimento de que esse registro fosse obrigatório, apenas que a

convenção produza efeitos sobre terceiros também.

Diz a súmula nº 260 do STJ:

“A convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre os condôminos.”

Ou seja, ainda que a convenção condominial não tenha sido registrada em

cartório, produzirá efeitos sob terceiros que venham ingressar posteriormente no

condomínio.

O Código Civil dispõe que todas as convenções além de conter todo o

funcionamento do condomínio, deverão constar: discriminação e individualização

das unidades e das partes comuns, a forma de administração, sanções, regimentos

internos, finalidade ou destinação da unidade e outras. Os familiares, amigos,

empregados também estão sujeitos à convenção.

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Na maioria das vezes quando descumprida uma norma da convenção ou do

regulamento interno, serão impostas multas pecuniárias, como sanções.

A convenção do condomínio é superior, ou seja, é a lei maior na hierarquia

das normas reguladoras do condomínio, portanto, se estiver estipulada uma multa

na convenção e outra no regulamento interno, prevalecerá a multa constante da

convenção condominial. Caso o sancionado continue descumprindo as normas

impostas, o condomínio deverá procurar as medidas judiciais cabíveis para resolver

o conflito.

A maior parte dos condomínios brasileiros proíbe a permanência de

animais em condomínios, essa proibição como veremos mais adiante é ilegal, pois

é possível sim a permanência de animais nos condomínios, com algumas ressalvas.

No que se refere a permanência de animais em condomínios, como veremos

à frente, o Superior Tribunal de Justiça e o Egrégio Tribunal de justiça já se

manifestaram, mostrando uma vez mais a ilegalidade dessa norma nas convenções.

Outro caso de ilegalidade é o da garagem, onde todos os moradores, por

questão de segurança, devem informar os veículos que venham adentrar no

estacionamento do condomínio. Caracteriza a ilegalidade no momento em que fere o

direito de propriedade, já que cada um tem a liberdade de colocar em sua garagem

qualquer carro, seja ele de sua propriedade, ou de parentes e amigos, desde que

autorizado e com identificação completa da pessoa que utilizará a garagem.

Outro exemplo de ilegalidade é a contribuição mensal, pois, uma vez

atrasado o pagamento dessas contribuições, o condômino que atrasou, fica restrito

ao uso de algumas particularidades do condomínio, como por exemplo, a piscina,

salão de festas, quadra de esportes, churrasqueira.

As normas não devem ser abusivas de modo que prejudicara os moradores

de uma certa forma e sim para regulamentar o funcionamento do condomínio, sem

ultrapassar os limites de legalidades, bem como os limites impostos pelas normas de

ordem pública.

Portanto, a convenção serve para estipular regras internas particulares

desde que não se contrarie a legislação.

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Quando lançam condomínio, o incorporador registra, entre outros

documentos, uma minuta de texto da convenção, via de regra, este texto passa a ser

definitivo, mas pode ser a qualquer momento alterado.

O regimento interno em geral, é feito pelos proprietários quando já o estão

usando. Assim, são dois os textos de regras internas de cada condomínio e de forma

assemelhada se repetem nos loteamentos, shoppings Centers, conjunto de flats, etc.

“O Cartório de registro desses materiais é o de registro de imóveis da circunscrição do imóvel, quando falamos em alteração desses textos, é necessário aprovação ou alteração sempre pelos proprietários.”17

No caso das convenções de no mínimo 2/3 das frações ideais e do

regimento interno, da maioria dos proprietários convocados para esse fim.

Segundo a lei, a convenção deve conter temas como a discriminação e a

individualização das áreas das unidades e das partes comuns.

A determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, o fim a que as

unidades se destinam, se residencial, comercial, industrial ou mista, a quota é

proporcional e o modo de pagamento dos encargos, despesas ordinárias e

extraordinárias. A competência nas assembléias, a forma de sua convocação, a

sanção a que estão sujeitas os condôminos ou possuidores.

É muito importante que as convenções tragam os procedimentos e a forma

de aplicações de multa, o trâmite interno das defesas e recursos administrativos.

O regimento interno, por sua vez, é o conjunto de regras que deverá conter o

cotidiano do condomínio, a utilização das áreas comuns, utilização das portarias,

estacionamento dos veículos, uso da piscina, playgrounds, salão de festas, etc.

5.1 CONDÔMINO E INQUILINO

Com embasamento aos assuntos tratados anteriormente, necessário se faz

sabermos se o inquilino pode ser ou não considerado condômino.

17

WAGNER, Michel Rosenthal. Direito imobiliário, Condominial, Urbano e de Vizinhança. Audiolivro. Universidade Falada. Editora Alyá.

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Para Michel Rosenthal Wagner, o inquilino não tem todos os direitos e

deveres do condômino, mas têm alguns:

Ele não é proprietário e assim não tem o dever para com o condomínio do

pagamento de suas despesas, não pode vender nem mesmo alugar, sublocar o

imóvel, tudo isso já é sabido.

Mas por outro lado, é ele que trabalha e que reside no imóvel, e assim, é ele

quem usufrui das coisas boas e das coisas más que estiverem acontecendo no

condomínio.

Como a relação do inquilino com o condomínio é indireta e direta somente

com o proprietário é com ele que devera tratar as questões da locação.

A dúvida que muito de nós questionamos é se o inquilino pode participar de

assembléias, votar ou não votar?

Na prática o inquilino não pode votar, somente se estiver acompanhado de

procuração com poderes específicos para tanto.

5.2 USO ABUSIVO DA PROPRIEDADE

O uso abusivo da propriedade é aquele que causa transtorno para os seus

ocupantes, relacionado à segurança e a saúde, e esses dois aspectos em conjunto

fazem com que atingem à segurança, ao sossego e a saúde, alem de trazer

interferência a outra propriedade.

Ocorre que, mesmo que a propriedade segue as normas estabelecidas no

Código Civil, se causar perturbação inaceitável para o vizinho, se enquadrará no uso

abusivo da propriedade. Podemos colocar como exemplo, uma lanchonete que

obedece todos os requisitos do Código Civil, mas o som abusivo atrapalha o

sossego e à saúde do vizinho, configurará, desde já, o uso abusivo da propriedade.

Entretanto, mesmo que obedecidos todos os requisitos da lei, necessário se

faz observar a questão de prejuízo ou não dos demais habitantes.

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O Artigo 1277 do mesmo diploma legal protege e deixa claro que o direito de

se opor àqueles que exageram no uso de sua propriedade não é somente do

proprietário, mas também dos inquilinos que ali residem, aqueles que possuem o

titulo gratuito ou oneroso, permanente ou transitório.

Importante destacar que os imóveis localizados a uma certa distância um do

outro sofrem com o abuso, ou seja, não só é vizinho aquele imóvel em que é

construído “parede com parede” e sim aquele que pode sofrer repercussão de atos

existentes pelo mau uso da propriedade.

O Código Civil discrimina algumas das principais posturas dos condôminos,

normas que devem ser respeitadas, são elas: não fazer obras que comprometam a

segurança da edificação, não alterar a forma e a cor das partes externas, não alterar

o destino da edificação, não utilizar de forma prejudicial ao sossego, salubridade e

segurança dos possuidores ou aos bons costumes.

A vizinhança nos seus limites pode ou não se dar pela contiguidade.

Vizinhança atualmente pode ser definida quanto à sua amplitude, aos limites do

contato turbador que uma pessoa pode fazer à outra.

É que questões como ruídos ou mesmo poluição de qualquer tipo, podem

exercer a contiguidade das propriedades na perturbação do direito de vizinhança.

Além do direito de fazer cessar o abuso, o erro, é possível e permitida a

turbação em razão do interesse público ou social, de onde decorrerá a obrigação em

indenizar, de reparar o dano, material e moralmente.

As infrações ao bom comportamento para com os vizinhos, como vimos, tem

sido parametrizadas segundo espécies que se relacionam aos três “S” (sossego,

segurança e saúde).

Sossego – direito á tranquilidade tanto nas horas de trabalho como nas

horas de repouso, que todo cidadão pode exigir sem prejuízo da atividade dos

outros.

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Segurança – esse aspecto se relaciona além de questões cotidianas, como

não permitir atividades perigosas da vizinhança, do respeito à segurança do cidadão

em ver respeitada a utilidade de sua propriedade em face, por exemplo, ao estatuto

da cidade, ao plano diretor, que mesmo respeitando o interesse publico, deverá

buscar respeitar, semelhantemente, ao impacto ambiental, o impacto de vizinhança

quando de alterações urbanísticas, como permissão do aumento de verticalização,

implantação de equipamentos sociais, etc.

Saúde - é o bem estar físico ou psíquico das pessoas sujeitas ao efeito dos

atos de vizinhos, mediante atos físicos, químicos, biológicos, como por exemplo,

águas empossadas que resultam em pernilongos e perigos de dengue, hoje em dia,

emissão de ruídos em oficina, emanações toxicas, corrosivas ou mal cheirosas.

As três espécies por vezes, se inter relacionam, por exemplo, a emissão

excessiva de ruídos provoca incômodos no sossego e assim, prejudica a saúde.

5.3 CONDOMÍNIO NOCIVO

O termo “condomínio nocivo” é usado exatamente para aquelas pessoas que

não respeita o sossego e a paz condominial, são comportamentos anti-sociais que

descumprem o exposto na convenção condominial.

Segundo o artigo 1337, caput do Código Civil, é estabelecida uma multa aos

condôminos nocivos, correspondente a cinco vezes o valor da contribuição

condominial. Existe também a multa de até dez vezes o valor da contribuição para o

condômino que voltar a cometer os mesmos atos desse comportamento inadequado,

indicado no artigo 1337, parágrafo único.

A multa aqui informada deve conter nas convenções condominiais e deverão

ser votadas por pelo menos três quartos dos condôminos, pois vincula-se ao direito

de ampla defesa do condomínio infrator.

Após a aplicação da multa, deverá ser convocada uma assembléia para

ratificar a aplicação dessa multa.

Essa multa poderá ser aplicada aos condôminos por todas as vezes que

estes vierem a praticar, isto é, a multa será aplicada por todas as vezes que o

condômino anti-social tiver comportamentos desapropriados.

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Na maioria dos casos, fará estancar esse modo de agir dos condôminos ou

levará a deixar de lá residir.

Em verdade, levando em conta as pesquisas já realizadas, uma das maiores

indagações é saber se o condômino anti-social pode ser expulso.

Em diversos países, como Alemanha, México, Espanha e Argentina,

admitem a exclusão do condômino faltoso e que reiteradamente não cumpre com os

deveres a ele impostos em lei ou na convenção.

Na Alemanha e no México, a alienação é compulsória, ou seja, o condômino

é obrigado a se retirar do imóvel, vendê-lo ou alugá-lo, já na Espanha e na Argentina

a exclusão do condômino infrator é temporária.

No Brasil é diferente, não existe a opção de exclusão do condômino infrator,

o que acontece é que, dependendo do poder econômico desse condômino, essas

multas não terão nenhum efeito em seu comportamento, por serem baixas. Essa

questão em nosso ordenamento jurídico está em debates, pois muitas correntes

doutrinárias são pacificas em criar uma legislação para que mude essa situação e

exclua o condômino nocivo.

Ademais, a exclusão do condômino anti-social contraria o direito de

propriedade que lhe é garantido na Constituição Federal, ou seja, no Brasil, jamais

será retirado o seu direito de propriedade.

Tartuce entende que:

O Código Civil não traz a possibilidade expressa de expulsão do "condômino anti-social", tese defendida por parte da doutrina e com a qual não concordamos, por violar o princípio de proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88) e a solidariedade social (art. 3º, I, CF/88). Assim, para nós, haveria nesse posicionamento violação a preceito máximo, de ordem pública, sob o prisma "civil-constitucional". As sanções pecuniárias, antes visualizadas, existem para ser aplicadas. Mais do que isso seria incompatível com a tendência de valorização da pessoa e da sua dignidade.

18

Para outra parte, caberia a exclusão do condômino anti-social agressivo em

prol da segurança e da tranquilidade do condomínio. Nessa linha, Franceschet

(2007) citando Venosa (2002) ensina que:

18

TARTUCE, Flávio. Das penalidades no condomínio edilício. Análise das inovações do Código Civil de 2002. Encontrado em <http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigos.asp>. Acesso em 06 de agosto de 2014.

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Verifica-se, portanto, que as multas podem atingir valores elevados. Contudo, haverá situações que nem mesmo essa imposição será suficiente para extirpar o problema da vida condominial. Note que essas punições podem atingir não apenas o condômino, em sentido estrito, como qualquer possuidor da unidade, não importando a que título seja essa posse ou mera detenção. Nota-se que o legislador do novo código chegou muito próximo, mas não ousou admitir expressamente a possibilidade de que o condômino ou assemelhado seja impedido definitivamente ou por certo prazo de utilizar a sua unidade. Não temos dúvida, porém, tendo em vista o sentido social do direito de propriedade que ora se decanta na legislação, que essa solução pode e deve ser tomada pela assembléia geral em casos extremos. É de se perguntar se deve o condomínio suportar em suas dependências a presença de um baderneiro contumaz ou de um traficante de drogas. É evidente que a futura jurisprudência deve atentar para essas circunstâncias. Esse é apenas um dos aspectos, dentre tantas questões que afloram quotidianamente no direito condominial. (Publicado no Valor Econômico de 19/02/2002, p. E2)

19

Outrossim, as duas correntes entendem que pela inexistência de previsão

legal, caberá ao juiz, em cada caso concreto, decidir pela exclusão do condômino

anti-social. E a jurisprudência majoritária entende que, pela ausência de previsão

legal, inexiste a possibilidade de exclusão do condômino anti-social. Criticamos essa

linha de decisões, baseado no entendimento de que em inúmeras hipóteses a

aplicação de multas não tem o condão de inibir ou impedir o reiterado

comportamento anti-social de algumas pessoas. E esse pensamento está bem

expressado por Ruggiero (1997), citado por Moraes (2004):

O suplício imposto aos moradores pelo mau uso, sobretudo quando convivem com vizinhos nocivos, escandalosos, imorais, barulhentos, desrespeitosos e loucos, vai continuar, se esse mau vizinho for rico. Em todos os países que cultivam o respeito ao se humano, sobrepujando-o ao da santíssima propriedade, o morador de conduta nociva é desalojado, seja ele proprietário ou não. O projeto foi sensível ao problema, mas adotou solução elitista: o condômino, ou possuidor, que, por causa do seu reiterado comportamento anti-social, tornar insuportável a moradia dos demais possuidores ou a convivência com eles poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo de suas contribuições. Então, aquela „insuportável convivência‟, ditada pelo reiterado comportamento anti-social, passará a ser suportável, com o pagamento do décuplo das contribuições condominiais. Assim, a suportabilidade ou insuportabilidade será uma questão de preço. A multa tornará suportável o que era insuportável.

20

19

VENOSA, Silvio de Salvo. Revista Valor Econômico. 19/02/2002. p. E2 apud FRANCESCHET, Júlio. O condomínio edilício sob a perspectiva civil constitucional.Revista Eletrônica da Faculdade Metodista Granbery. n.3. Jul-dez. 2007.

20

RUGGIERO, Antonio Biasi. Questões imobiliárias. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 90 apud SOARES, Deise Mara.

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5.4 PERTURBAÇÃO SONORA – LIMITES E PARÂMETROS

Existem dois tipos de sons que podem causar perturbações para outras

pessoas, o som humano, como por exemplo, o de gritarias e algazarras, o que é

muito comum acontecer em festas ou casas de jogos, som humano também pode

ser apresentado e transmitido através de aparelhos elétricos e eletrônicos, muito

vistos em cultos religiosos, onde o barulho da cantoria às vezes exagera. O fato

desse som ser proveniente de uma profissão ou culto religioso, não impede a

exclusão da nocividade que ele venha a cometer.

Existem também o som inumano que pode ser feito por instrumentos

musicais, sinos, buzinas, ou de máquinas decorrentes de uma atividade industrial.

A propagação dessas perturbações podem ser feitas por dois meios, através

da ação ou da omissão. Na ação acontece quando o próprio agente é o causador,

como o ato de fazer uma batucada ou aumentar até o último volume do seu som. Na

omissão o agente também é o responsável, mas por permitir por exemplo que seu

cachorro passe todo o dia latindo, ou os sons que seus aparelhos domésticos

emitem por estarem desregulados, ou sons extremamente altos que prejudiquem os

vizinhos, assim também como a omissão de deixar seu filho brincando com um sino

a noite inteira.

Segundo J. Nascimento Franco:

A poluição sonora constitui grave infração dos deveres de vizinhança porque prejudica o sossego e a própria saúde das pessoas. Todos têm o direito de fazer, ou de não fazer, em sua casa o que bem entender, desde que não cause nenhuma intranquilidade ou dano a seu vizinho. Muitos supõem que o barulho deve ser coibido apenas depois das 22 horas. Trata-se de um engano, porque o incômodo aos vizinhos tem de ser evitado em qualquer hora do dia ou da noite e o barulho excessivo impede o trabalho nas horas úteis e o repouso no final do dia. Na medida em que lesa a paz e o sossego alheio, o barulho tem de ser coibido independentemente do horário em que é produzido.

Outro erro muito comum acontece relacionado às áreas industriais ou

comerciais, em que as pessoas pensam que por se tratar dessas áreas, existe um

ônus de arcar com a poluição sonora proveniente das indústrias e comércio. Essas

empresas ou indústrias têm que se adequar à lei para diminuir a poluição sonora

que venha a ser prejudicial às pessoas e o meio ambiente, como explica Gilberto

Passos de Freitas:

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Os ruídos e vibrações anormais, independentemente das atividades desenvolvidas, desde que molestos e prejudiciais à segurança, saúde e sossego dos vizinhos, devem ser reprimidos, mesmo nas chamadas „zonas industriais ou comerciais‟, tais perturbações não podem ser tidas como ônus a que todos devem se sujeitar, devendo as fontes, que as geram, adequar-se às exigências da lei, razão pela qual o Poder Público tem elaborado leis e regulamentos para minimizar os efeitos da poluição sonora nociva ao indivíduo, à coletividade e ao meio ambiente.

Uma dúvida existente em relação aos limites e parâmetros do que é

permitido ou não, ou o que é tolerado pelas pessoas. Se fosse deixar a cargo de

todos essa aferição, muitos conflitos iriam surgir e deixariam a Justiça mais

carregada do que ela já é. Por isso, através de normais legais, foram criados esses

parâmetros para que se possa medir se tais emissões sonoras são ou não

prejudiciais à população. A lei 6.938/1981 criou dois órgãos que competem nesse

assunto: o SINAMA (Sistema Nacional do Meio Ambiente) e o CONAMA ( Conselho

Nacional do Meio Ambiente).

Através do CONAMA, foi criado a Resolução 1, de 8 de março de

1990, em seu inciso II, que indica os ruídos que são prejudiciais à saúde e que são

aceitáveis, conforme a norma NBR 10.151 – Avaliação em Área Habitada visando o

conforto da comunidade, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.

5.5 A LEGISLAÇÃO REGULADORA

São várias as normas que regulamentam a proteção do sossego.

O Código Civil obriga o morador a não utilizar seu imóvel de maneira

prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos demais, sob pena de multa. O

parágrafo único do artigo 1337 dispõe que o condômino ou possuidor que, por seu

reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os

demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa

correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas

condominiais, até ulterior deliberação da assembléia, conforme já comentado

anteriormente.

A Lei 9.605/98 prevê no artigo 54 a pena de reclusão de um a quatro anos, e

multa para quem causar qualquer tipo de poluição que resulte ou possa resultar em

danos à saúde humana.

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A Lei das Contravenções Penais considera contravenção:

"Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheios:

I – com gritaria ou algazarra;

II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

As leis municipais também cumprem papel importante na proteção do

sossego. Como exemplo, a Lei 0071/48 do Município de Belo Horizonte estabelece

no artigo 2º, exemplificativamente, os ruídos e sons que podem incomodar:

Constitui infração da presente lei todo e qualquer som, que, pela duração ou estridência, perturbe o sossêgo público, após as 22 horas, e os excessos, a qualquer tempo, especialmente os provenientes :

a) de motores de explosão desprovidos de abafadores eficientes, bem como de escapamentos abertos; b) de buzinas, claxons, tímpanos, campainhas ou quaisquer outros aparelhos de alerta, propaganda ou chamada; c) de matracas, cornetas e outros instrumentos de convite dos negociantes a ambulantes; d) de bandas, tambores, fanfarras e alto-falantes destinados a propaganda e, quando instalados em veículos, não poderão funcionar em qualquer local da cidade depois das 20 horas e antes das 7 horas da manhã; e) de alto-falantes, rádios, gramofones, radiolas e aparelhos congêneres, seja qual fôr o objetivo do seu emprêgo, mesmo diversão doméstica, desde que se façam ouvir fóra do recinto onde se acham; f) de morteiros, bombas, rojões, foguetes e fogos ruidosos em geral;

g) de apitos, sereias, máquinas e motores que se escutem fora dos respectivos recintos;

g) de cães, pássaros e outros animais que incomodem a vizinhança;

i) de anúncios ou pregões em voz estridente.

Parágrafo único - Fica terminantemente proibido o uso de businas em frente aos estabelecimentos hospitalares e nas suas imediações.".

Interessante notar que a lei proíbe todo e qualquer som que perturbe o

sossego após as 22h, mas proíbe ainda os sons produzidos antes desse horário, se

incômodos. Assim, mesmo antes das 22h não é permitido barulho além de uma

intensidade aceitável, como muitos pensam. O que deve-se levar em conta é o grau

do incômodo e não o horário em que se realiza.

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30

Há, ainda, a NBR 10151/2000 da ABNT, que avalia o nível de ruído em

áreas habitadas para o conforto da comunidade. A referida norma define como limite

para a área urbana estritamente residencial 50 dB (A) durante o dia e 45 dB (A)

durante a noite, e nas áreas mistas predominantemente residenciais sobe para 55

dB (A) durante o dia e 50 dB (A) durante a noite.

Em seu estudo, PIMENTEL-SOUZA21 esclarece quais os níveis de ruído

seriam ideais para uma noite agradável de sono:

já em 1981, Vallet (1982) demonstrou que um índice da qualidade fisiológica para o sono, combinando o tempo total de sono, duração de estágios profundos III, IV e V e tempo passado despertado, só era preservado abaixo de nível médio de 40 dB(A) para ruído de trânsito. Juntando-se ao incômodo e mudanças de estágios por ruído de vôos de aviões este valor caia para 35 dB(A) Vallet (1982), dando origem à primeira recomendação da OMS de que o nível médio (Leq) de ruído para sono de qualidade deveria ser no máximo de 35 dB(A) (WHO, 1980). (...) Pesquisas mais recentes revistas para a OMS chegaram à conclusão que os níveis de ruído nos quartos de dormir deveriam ser ainda 5 dB(A) mais baixos em relação à recomendação anterior, portanto média de 30 dB(A), valor contínuo, e máximo de 45 dB(A) de pico (Bergland & Lindvall, 1995), baseados em trabalhos como de Terzano et al (1990). Estes são valores que deveriam servir de referência para a jurisprudência do código civil, direito de propriedade, das leis de contravenções penais e ambiental no Brasil, para garantir ao cidadão o direito à tranqüilidade no lazer e no trabalho (Muller, 1956; Oliveira, 1995) e para estabelecimento de legislação municipal pertinente e normas expedidas pelo IBAMA, introduzindo conseqüências punitivas intermediárias, como multas crescentes, para garantir recuperação física, mental e psicológica, condições necessárias para potenciar devidamente a capacidade do cidadão para o trabalho moderno.

Alguns ruídos cotidianos foram medidos por Armando Paiva de Lacerda22,

que encontrou: Voz segredada - 10 a 20 db ; Murmúrio - 20 a 30 db; Conversação

corrente - 50 a 60 db; Barulho de rua - 50 a 70 db; Trânsito intenso - 80 a 90 db.

No Brasil, os condôminos anti-sociais estão propensos apenas a multas,

punição irrelevante e sem força educativa, principalmente para os mais abastados. O

Professor João Batista Lopes se posiciona favorável a punições mais severas aos

condôminos anti-sociais.

Ele argumenta que:

“Seria cogitável a inserção de disposições mais rigorosas, a exemplo do que ocorre em outros países, pondo os condôminos a salvo da presença indesejável de indivíduos nocivos à tranquilidade geral”.23

21

SOUZA, Fernando Pimentel. Efeitos do ruído no homem dormindo e acordado. XIX ESBA, SOBRAC, 2000, Belo Horizonte. 22

LACERDA, Armando Paiva de. O ruído e seus efeitos nocivos sobre o organismo humano. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, v.37, 3.ed., set-dez, 1971. 23

LOPES, João Batista. Condomínio. Editora RT. 5. ed. São Paulo: 1996. p. 159

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31

Para Ivan de Hugo Silva:

Havendo utilização da unidade para fim diverso do previsto, sendo usada de forma nociva ou perigosa ao sossego, salubridade e a segurança dos demais condôminos, tanto o proprietário quanto o inquilino podem impedir a violação com força no disposto do artigo 554, do código civil. A ação a ser intentada é sumaríssima, com amparo na letra j, do inciso II, do artigo 275, combinado com o artigo 287, do código de processo civil.

24

O CPC não prevê mais a alínea "j" no inciso II do artigo 275, mas o pedido

de antecipação de tutela que reza o artigo 287 tem aplicação às hipóteses de uso

nocivo da propriedade do condômino, juntamente com o artigo 461, §§ 4º e 5º, que

dispõem que o juiz pode impor multa diária em hipótese de descumprimento da

tutela antecipada e poderá, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas

necessárias ao seu cumprimento, tais como a imposição de multa por tempo de

atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e

impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

6. CONCEITO DE DIREITO DE VIZINHANÇA

A prática da limitação do direito de propriedade é o que vemos no direito de

vizinhança, pois como em todo o direito, o direito de um proprietário acaba quando

começa o direito de outro proprietário.

Silvio Rodrigues conceitua o direito de vizinhança como as limitações

impostas pela lei às prerrogativas individuais e com o escopo de conciliar interesses

de proprietários vizinhos, reduzindo os poderes inerentes ao domínio e de modo a

regular a convivência, nada mais é que um acordo entre os próprios vizinhos de

modo que se resolvam com apenas uma conversação, na qual um entenda o lado

do outro, sem que haja a necessidade de intervenção do poder judiciário.

Já para San Tiago Dantas, são os direitos que tem o proprietário de um

imóvel a que os proprietários dos imóveis vizinhos satisfaçam, em seu favor,

determinando deveres jurídicos, os deveres de vizinhança, expressão que tem

grande força persuasiva, por isso que, como quer Lacerda de Almeida, serve

também para extremar os deveres de vizinhança das servidões.

24

SILVA, Ivan de Hugo. Comentários à lei de condomínio em edificações. AIDE, São Paulo. 1987.

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Podemos verificar com clareza que o interesse coletivo inerente ao

condomínio prevalece sobre o direito da propriedade individual, como a boa

convivência e a conciliação dos interesses desses proprietários. Cada proprietário

tem para com o outro um grande dever jurídico, ou seja, os deveres de vizinhança,

que nada mais é que as limitações do direito de propriedade, como traz os grandes

doutrinadores.

A Ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz (1981, p.249) classifica o direito de

vizinhança em três partes: “restrição ao direito de propriedade quanto à intensidade

de seu exercício, regulando o seu uso nocivo”, essa é a limitação mais comum e

ampla, é a limitação que impõe limites ao uso nocivo da propriedade, que deve ser

usada somente conforme os bons costumes da sociedade; “limitações legais ao

condomínio similares às servidões”, que resulta nas passagens forçadas e águas, e

a ultima parte “restrições oriundas das relações de contigüidade entre dois imóveis”,

que orienta sobre o estado físico da propriedade, como o direito de construir, os

limites existentes entre dois prédios, onde não pode deixar de existir o uso do bom

senso na hora de construir, para que não se deixe invadir a propriedade vizinha.

O direito de vizinhança, com relação à propriedade, pelo que vimos, deriva

do direito de usar, gozar e dispor do bem, portanto, quando esse direito está sendo

violado ou quando existem alguns conflitos de vizinhança, ou um proprietário

exagera no seu direito de propriedade, fazendo repercutir nocivamente na

propriedade vizinha, o termo “propriedade” entra em crise, deixando de existir, pois o

proprietário que causou o conflito não está sabendo exercer esse direito e,

consequentemente, o proprietário que foi afetado com isso não está seguro, bem

como não estão sendo respeitados os seus direitos e a partir daí se torna necessária

uma exigência sócia para o fim de impor limites recíprocos a ambos os proprietários.

Entretanto, o termo “propriedade” desaparece no momento em que o direito

de um dos proprietários vizinhos for afetado pelo outro, que tiver desrespeitado a

propriedade alheia, causando prejuízo a outrem, fazendo com que inicie seu direito

de ir atrás do que é seu, ou seja, ir atrás do seu direito em rever soluções quanto ao

bem que foi violado.

O direito de vizinhança se da também no acesso de outras pessoas a uma

determinada área, em que a propriedade particular esteja no caminho e na

passagem de cabos e tubulações e no direito das águas.

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Em principio, cabe distinguir direito de passagem forçada com o direito de

servidão de transito. O direito de passagem forçada, pertence ao direito de

vizinhança, é a passagem em que a pessoa dona de um determinado imóvel, que se

encontra encravado dentro de outro e que fica impossibilitada de sair, não tendo

acesso às vias públicas.

Como bem explicado por Nequete, os requisitos para a passagem forçada

são :

Não tenha saída para ela (a via publica), nem possa buscar-se uma, ou, podendo, somente a conseguiria mediante uma excessiva despesa; ou a saída de que disponha (direta, indireta, convencional ou mesmo necessária) seja insuficiente e não se possa adaptá-la ou ampliá-la – ou porque isto é impossível, ou porque os reparos (com que se obtivesse uma saída não excessivamente incômoda) requereriam por iguais despesas

desproporcionais.

No que tange a servidão de trânsito, ela ocorre por um acordo entre as

partes, ou até mesmo pela lei, ela ocorre para facilitar o acesso a outras áreas,

mesmo que o imóvel do proprietário que usa a servidão tenha saída e acesso, ele

usa essa servidão por uma simples utilidade, já a passagem forçada fica sem

qualquer acesso.

Quando um imóvel possui acesso à via publica, mas o seu caminho oferece

perigo iminente a qualquer pessoa que passe por ele, como por exemplo, um perigo

de desabamento, esse imóvel também caracterizará imóvel encravado.

Quando não há possibilidade de se fazer a instalação dos cabos e

tubulações ou até mesmo tornando-se oneroso, em outro imóvel, ou na via publica,

surge esse direito de passagem, no qual é usada uma fração da propriedade

particular para que seja possível realizar essa obra de passagem. Cabe ressaltar,

que esse direito não demanda somente do Poder Público e também de empresas de

concessões que levam energia, combustível, água, telefonia para diversos lugares

da região, ou seja, mais uma vez a coletividade fala mais alto quando entra em

conflito com o direito de propriedade. Tal obra deve ser feita de modo que seja

menos prejudicial ao imóvel, pois, caso seja realizada de modo diverso, caberá o

ressarcimento quando, devido aquela passagem, fique configurado perca de valor

do imóvel.

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Em 1934 foi criado o Código das Águas, que regula sobre ilhas, aluvião,

avulsão, álveo e águas, tema muito importante abordado pelo direito de vizinhança,

e mesmo sendo antigo, continua a regular tudo aquilo que não esteja no Código Civil

de 2002.

Conforme expresso no artigo 34 do Código das Águas: “É assegurado o uso

gratuito de qualquer corrente ou nascente de água, para as primeiras necessidades

da vida, se houver caminho público que torne acessível”. Ou seja, com isso, fica

explicita à possibilidade de retirar água, poço, fonte ou rio que pertença à outra

pessoa. Quando não houver caminho publico, essa tirada de água deve ser feita

sem danos à propriedade e caso haja danos ou prejuízos, caberá indenização.

Além disso, existe a tomada de água, que é feita por alguma obra, podendo

ser uma represa, canal ou aqueduto, é um meio mais complexo de retirada de água,

que anteriormente era caracterizada com um simples balde usado para suas

necessidades básicas.

Portanto, são meios para que os vizinhos que não possuem acesso direto a

essas águas possam usar essa servidão para passar a ter acesso a essas águas,

como também, além da retirada e tomada de águas, está presente o aproveitamento

das águas pluviais e das águas dos rios públicos, escoamento de águas estagnadas

e aproveitamento das águas comuns.

O Direito de vizinhança se baseia na noção de comportamento socialmente

aceitável, adequado ao convívio, assim dito, normal para a sociedade e dentro

destes limites e de acordo com as características do imóvel e sua vizinhança

tolerável.

O viver em sociedade exige a compreensão do que, a liberdade de cada um

termina onde começa a do outro.

Os vizinhos são ocupantes de uma posição jurídica que implica em direitos e

deveres recíprocos, uma vez habitar em zonas de mutua influência.

Nesse contexto, é do abuso mediante ações ou omissões do cidadão vizinho

que surge o direito á indenização de eventuais danos e sua obrigação de reparação.

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O código regula ainda a possibilidade de utilização dos bens e a obrigação a

luz do comportamento, ações ou abstenções, justificando-se as restrições impostas

ao direito de propriedade em razão do necessário atendimento ao interesse social

para harmonizar-se com os interesses particulares dos vizinhos.

Afinal, mesmo manifestações cotidianas permeiam a existência de conflitos,

como por exemplo, a emissão de ruídos, odores, animais, infiltrações, etc.

A liberdade individual não pode prejudicar o sossego alheio e as normas de

tolerância, decorrentes da conveniência das pessoas em agrupamentos sociais.

Ultrapassando esses limites, cabem providências administrativas e

jurisdicionais, seja inicialmente através de notificação extrajudicial e posteriormente

mediante ação judicial, para recondução às regras de convivência social.

Ressalta-se que a lei busca proteger os direitos de todos, contando que não

excedam os limites mais comuns de tolerância para o melhor convívio social.

6.1 ANIMAIS – Assunto objeto no trabalho

Após analisarmos assuntos que se fazem necessários, como por exemplo, o

surgimento da propriedade e do direito de vizinhança, vamos ao assunto

predominante em nosso trabalho.

Trata-se de um assunto muito delicado no que se refere à permanência ou

não de animais nos apartamentos, é uma questão muito polêmica na maioria dos

edifícios.

Nas assembléias é bastante frequente essa discussão, na qual cada vizinho

passa a expor sua linha de defesa, bem como sua posição ao referido assunto.

Podemos destacar aqui, por exemplo, a permanência de cachorros, uns tem

maiores afetos, outros não.

De um lado, existem pessoas que tratam seus animais de estimação, como

membro da família, já de outro lado, algumas pessoas os tratam como grandes

inimigos.

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A grande maioria das Convenções de condomínio proíbe a manutenção de

animais nos apartamentos, sejam eles quais forem. E, até alguns anos atrás, tal

cláusula era tida, na maioria das vezes, como válida pelo poder judiciário, que a

interpretava ao pé da letra.

No entanto, o assunto sempre gerou enormes controvérsias, pois se temos,

por um lado, o direito de propriedade do dono do animal, direito este garantido

constitucionalmente, temos, por outro, as normas de boa vizinhança, que também

devem ser respeitadas.

Deste modo, os Tribunais foram flexibilizando as cláusulas proibitivas de

animais em apartamentos, utilizando como critério de hermenêutica a intenção de

tais cláusulas e interpretando-as tendo em vista não o seu sentido literal, mas sim as

normas de boa vizinhança, conforme serão expostas adiante.

Conforme comentado no capítulo IV, o artigo 554 do Código Civil pátrio,

determina que:

“O proprietário, ou inquilino de um prédio tem o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam”.

Este artigo resume, em poucas linhas o que é considerado mau uso da

propriedade (ofensa à saúde, sossego ou segurança).

Assim, na solução de conflitos que envolvam animais em condomínios, a

justiça tem procurado verificar se existe mau uso da propriedade, ou seja: Se a

presença do animal prejudica a segurança, o sossego e a saúde dos demais

condôminos. Caso não ocorra nada disso, é pacífica a jurisprudência atual no

sentido de se permitir a permanência do animal, ainda que na Convenção do

condomínio conste cláusula em sentido contrário.

Temos, portanto, em resumo, o seguinte: A jurisprudência dominante tem

decidido pela permanência do animal, desde que o mesmo seja de pequeno porte e

não ofereça aos demais moradores: Perigo à saúde (animal sem higiene,

transmissor de doenças, pulgas, etc.) risco à segurança (animal agressivo,

perigoso), perturbação ao sossego (latidos frequentes, etc ).

O problema, porém, não termina aí.

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O que é "pequeno porte"? 30 centímetros? 50? peso de 5 kilos? Ou será de

10 kilos?

Que tipo de animal é (ou não é) agressivo e ameaça a segurança dos

demais moradores?

Existem raças de cães extremamente dóceis. Por outro lado, existem aves

de natureza agressiva, e cuja bicada pode causar ferimentos sérios.

Qual o limite de barulho suportável de modo a não causar "perturbação do

sossego"? Um pássaro cantando perturba o sossego? Para muitos sim. Para outros,

é verdadeiro deleite.

Como se vê, estas são questões complicadas, nem sempre passíveis de

respostas objetivas.

A solução na verdade, dependerá do bom senso do juiz e da análise de cada

caso.

Em contrapartida, entende-se que são válidas as restrições quanto ao

trânsito e permanência de cachorros nas áreas comuns. Desta forma, pode o

condomínio, através da Convenção ou do Regulamento Interno, proibir a

permanência no pátio, jardins, quadra, play-ground, etc.

Além disso, admite-se também normatizar o transporte (por exemplo,

utilização do elevador de serviço ou escada para transporte do animal), exigir

comprovação de vacinação do animal, restringir a presença de certos tipos de

animais (cobras, lagartos, animais peçonhentos) e o estabelecimento de outras

regras, que visem não proibir a permanência, mas sim regulamentar o assunto.

A permissão para permanência dos animais de estimação nos apartamentos

vem gerando discussões nos tribunais, mas, como já mencionado, o que prevalece é

sua permanência, desde que, seja usado o bom senso, não ferindo o sossego,

tranquilidade e saúde dos demais moradores, ainda que a Convenção ou

Regulamento Interno do Edifício vede expressamente, admite-se a presença do

animal, pois o princípio de cada condômino usar e fruir sua unidade autônoma,

segundo suas conveniências, é de ordem pública e não pode ser ferido por norma

regulamentar.

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Conforme as cidades vão crescendo, fica raro encontrar espaço no solo para

construir uma propriedade particular, por isso, a criação de condomínios,

principalmente os verticais, estão tão evidentes na nossa vida. Sendo assim, fica

também mais visível a criação de animais domésticos nesses condomínios, porque

praticamente todos nós temos algum animal de estimação.

Não existe no nosso diploma qualquer proibição para a criação de animais

em condomínios, sendo assim, ficaram algumas dúvidas, já que a lei permanece em

silêncio, ficaria uma lacuna para a manutenção indiscriminada de animais, ou se

existiria alguma vedação em outros dispositivos legais.

Existem muitos conflitos porque a maioria das convenções de condomínio

fica expressamente proibida a entrada de animais domésticos. Tem que haver um

entendimento, pois segundo o artigo 19 da Lei 4.591/1964, “os condôminos têm o

direito de usar, fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas

conveniências e interesses, condicionados, umas e outros, às normas de boa

vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar

incômodo aos demais moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das

mesmas partes por todos”, ou seja, não se deve criar verdadeiras feras, ou fazer um

minizoológico em seu apartamento só porque a lei foi omissa em relação à

manutenção de animais em condomínios, como também proibir a entrada de um

animal dócil, inofensivo e silencioso, só porque a convenção dispõe.

Na verdade o que se deve fazer é o uso do digno e bom senso.

Neste sentido, transcrevo trecho da obra de João Batista Lopes:

Suponha-se, por exemplo, que o condômino mantenha, em seu apartamento, animais de pequeno porte, como cães pequineses, aves canoras ou gatos, que incômodo algum ou insegurança possam trazer aos vizinhos. Ou, para usar um exemplo ad terrorem, imagine-se que o condômino possua, em sua unidade residencial, um pequeno aquário ou uma tartaruga de 10 cm. Nesses casos, a invocação da norma proibitiva consistiria injustificável apego ao formalismo (summum jus summa injuria). Como se vê, o só fato da guarda de animais não caracteriza violação à Convenção, impondo-se sempre perquirir sobre a existência de incômodo aos vizinhos ou ameaça à sua segurança. É claro que, se demonstrar, in concreto, que um cão pequinês, por exemplo, compromete a higiene dos condôminos, fazendo suas necessidades fisiológicas nas partes comuns do edifício, sua permanência no local não deverá ser tolerada. O deslinde do problema não está, portanto, no só fato da guarda ou permanência do animal no apartamento, mas sim no incômodo ou ameaça à segurança e higiene dos demais condôminos. Tudo dependerá, pois, da prova de tais

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circunstâncias, não se podendo, a priori, afirmar a prevalência da convenção sobre as peculiaridades de cada caso concreto.

25

Portanto, o Ilustre João Batista Lopes nos traz a idéia de que só haveria

problema para ter um animal de estimação em condomínios caso tivesse eventuais

incômodos ou ameaça à segurança e higiene dos demais condôminos, que em tese,

deverá ser provada.

Nos dizeres de Cabral, Viviane Benini, Advogada Sanitarista- ambiental:

A manutenção de animais em condomínio, pela legislação vigente, só poderia ser vedada ou restringida, em caso de comprovação de importunação ao sossego, à salubridade ou à segurança. A convenção condominial está desautorizada a proibir a permanência dos animais domésticos, uma vez que o direito de propriedade é garantido pela Constituição Federal (cláusula pétria constitucional), assegurando o seu livre exercício. A Constituição Federal é a lei maior do país e todas as demais (federais, estaduais e municipais) devem a ela se sujeitar. A convenção condominial, embora assuma caráter normativo, é documento formulado por particulares, para regrar a convivência social em propriedades em comum. Logo, só pode determinar regras gerais que visem garantir a paz social e a boa convivência e que vigoram entre e para os condôminos. No tocante aos animais deve regrar, à luz da lei, limites à utilização das áreas exclusivas (unidades residenciais) e regrar a utilização das áreas comuns, de que todos são proprietários, com frações ideais,

proporcionais à área que lhes pertence.

Diante disso, uma vez não comprovado o prejuízo que a presença do animal

cause ao sossego, a salubridade ou a segurança fica nítido que a Convenção

condominial nesse aspecto, perde seu objeto, pois, como bem destacado, a

Constituição Federal é a lei maior e deve ser totalmente respeitada, estando

garantido o direito de propriedade exclusivo do individuo.

A Lei 4591/64 em seus artigos 10º e 19, bem como no artigo 1335 do Código

Civil deixa claro que todo condômino tem o direito de usar e fruir de sua unidade

autônoma condicionado ao respeito das normas de boa vizinhança, de forma que

não cause dano ou incômodo aos demais condôminos e desde que não a use de

forma nociva ou perigosa ao sossego, salubridade e a segurança dos demais

condôminos.

Ou seja, manter animais em unidades condominiais é exercício regular do

direito de propriedade (Artigo 1228 e seguintes do Código Civil), o qual não pode ser

glosado ou restringido pelo condomínio. O limite ao exercício do direito de

propriedade é o respeito ao direito alheio ou direito de vizinhança. 25

LOPES, João Batista. Condomínio. Editora RT. 7. ed. São Paulo, 2000. p. 143

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Desta forma, podemos concluir que o morador (condômino ou não) não pode

ter vários animais nas unidades, o que atinge a questão da salubridade, bem como

cães que latem muito. Mas, segundo os entendimentos, independentemente do

tamanho, pois há animais de porte grande que não emitem ruídos e animais de porte

menor que emitem ruídos excessivos.

Existem convenções que determinam que o dono do animal o carregue no

colo nas localidades do condomínio. Imagine um cão, por exemplo, da raça labrador

que pese em média 35 quilos, agora imaginemos uma senhora de aproximadamente

80 (oitenta) anos com um cão desse porte tendo de carregá-lo no colo, é um

absurdo.

Importante trazer a esse trabalho o parecer jurídico elaborado pelo

SECOVI/MS, qual seja:

PROIBIÇÃO DE ANIMAIS EM CONDOMÍNIO – CONVENÇÃO COLETIVA. O SECOVI/MS (sindicato patronal das imobiliárias e dos condomínios) vem recebendo consultas a respeito da utilização de animais em condomínios, sendo que nós, na qualidade de assessor jurídico, estamos emitindo o presente parecer de cunho personalíssimo, que pode não representar necessariamente a opinião da entidade sindical. Portanto, não comprometendo esta.

O tema é deveras importante, polêmico e há de provocar opiniões antagônicas, principalmente daquelas pessoas que têm carinho muito grande a animais, como nós, que direcionam suas opiniões não exatamente na lei, mas buscam brechas nesta, com base no direito de vizinhança, na inviolabilidade da residência, dentre outros, o que compreendemos perfeitamente, na medida que cada um busca atender seus interesses pessoais, fazendo parte do cotidiano. E o advogado, como estudioso do direito, quando incumbido de fazer um parecer jurídico, não deve se deixar levar pela inclinação pessoal, como ora estamos procedendo.

Assim, em decorrência da relevância do tema, fomos buscar subsídio jurídico na doutrina, através dos ensinamentos dos mestres Caio Mário Da Silva Pereira, mentor e criador da Lei nº 4.591/64, a qual sofreu alterações pela Lei nº 4.864/65 e, por último, pelo Novo Código Civil, modificado pela Lei nº 10.406, de 10.01.2002, através dos artigos 1331 a 1358, que trata especificamente do condomínio edilício, além das lições de Sílvio Rodrigues e Carlos Roberto Gonçalves, bem como da jurisprudência.

A Convenção De Condomínio tem sentido normativo, obrigando aqueles que compõem o condomínio e aos que habitam o edifício ou dele se utilizam. É feita de forma escrita e deve constar do registro imobiliário, a fim de assegurar a sua publicidade e sua validade “erga omnes” (a todos).

Cumpre notar que o regulamento de um condomínio estatui restrições à liberdade de ação de cada um em benefício da coletividade, e estabelece regras proibitivas e imperativas a que todos se sujeitam. Essas restrições decorrem da norma genérica do Direito de Vizinhança - art. 554 do Código Civil/1916 e art. 1277 do Novo Código Civil (direito de impedir o mau uso da propriedade vizinha, que possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que habitam determinado prédio), bem como o art. 10, III, da Lei nº 4.591/64.

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Assevera Caio Mario da Silva Pereira que:

“proibindo a convenção a presença de animais, deve ser observada. Não constitui, entretanto, infração, conservar animais que não tragam ocorrência de dano à saúde, ao sossego ou à segurança dos demais condôminos”.

Carlos Roberto Gonçalves, autor da obra Sinopses Jurídicas, Ed. Saraiva, assim se posiciona:

“Com relação à manutenção de animais no prédio, deve haver disposição pertinente na Convenção. Se omissa, não poderá, em princípio, ser censurada. Se a Convenção vedar somente a presença de animais que causem incômodo aos vizinhos ou ameacem sua segurança, as questões que surgirem serão dirimidas em função da prova dessas duas situações de fato”.

Sílvio Rodrigues tem o seguinte entendimento:

“também são freqüentes as questões sobre a manutenção de animais no prédio; nesse caso, para se obter judicialmente a proibição, ou há disposição taxativa na Convenção, sem qualquer ressalva, ou será preciso demonstrar que o animal, de alguma forma, prejudica a saúde, a segurança ou o sossego dos condôminos”.

A jurisprudência posiciona-se também pela validade da Convenção de Condomínio que proíbe animais, em se tratando, restritivamente, das hipóteses de animais que tragam incômodo aos condôminos, sendo possível, pois, a permanência de animais inofensivos aos condôminos (geralmente pequenos animais), respeitando-se, assim o direito de vizinhança, verbis:

Verbete: DIREITO DE VIZINHANÇA - USO NOCIVO DA PROPRIEDADE urbana caracterizado - Remoção de ANIMAL inadequado ao habitat urbano - Obrigatoriedade

Tribunal: TA/PR

Órgão Julgador: 8a. Câm. Cív.

Relator: José Molteni Filho

Procedimento sumaríssimo - Remoção de animais inadequados ao habitat urbano - Direito de vizinhança - Uso nocivo da propriedade - Perigo à salubridade dos moradores lindeiros - Contaminação do meio ambiente com proliferação de insetos - Decisão acertada - Recurso desprovido. (TA/PR - Ap. Cível n. 0104599-0 - Comarca de Curitiba - Ac. 6789 - unân. - 8a. Câm. Cív. - Rel: Juiz José Molteni Filho - conv. - j. em 15.12.97 - Fonte: DJPR, 13.02.98, pág. 95).

Diante do exposto pode-se concluir que são válidas as cláusulas de Convenção de Condomínio que proíbem a permanência de animais que possam causar perigo e incômodo em condomínios (geralmente animais de porte médio e grande), se foram feitas de acordo com os trâmites legais (através de Assembléia Geral, com quorum qualificado, etc)., observando-se o direito de vizinhança e respeitando-se a privacidade das pessoas, já que estas têm o direito de possuir seus bens e animais de estimação.

Na hipótese de inexistência de cláusula expressa na Convenção de Condomínio, uma vez ficando comprovado que a permanência de animais em condomínios está prejudicando o sossego e a saúde dos que o habitam, é válida a intervenção para solicitar a retirada desse animal do prédio.

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Por fim, não pode, data venia dos que pensam diferente, uma Convenção de Condomínio proibir genericamente a permanência de quaisquer animais em condomínios, sem restrição, porque se estaria invadindo a privacidade das pessoas e violando-se o art. 5º, X, da Constituição Federal.

Portanto, em primeiro lugar merece guarida a inviolabilidade da vida privada (possibilidade de permanência de animais inofensivos nos limites do imóvel do condômino), por ser direito constitucional. Em segundo lugar o direito de vizinhança, de tal modo que se o animal causar dano à saúde, ao sossego e a segurança dos demais condôminos, devidamente comprovado, há de ser retirado do condomínio. Para tudo há um limite.

É o nosso entendimento.”

Assim, não é permissivo ao síndico ou a assembléia deliberar em detrimento

ao direito de propriedade. Comparativamente seria o mesmo caso que a assembléia

limitar o tamanho do automóvel que pode ser estacionado na garagem ou limitar a

número de moradores em uma unidade. O direito de propriedade no primeiro caso

permite que dentro dos limites de uma vaga seja estacionado qualquer automóvel,

desde que respeitado a segurança e salubridade. Porém, poderia ser restringida a

guarda de um mini automóvel que estive causando danos a saúde dos demais face

a problemas com emissão de poluente, por exemplo.

Por isso, é que os doutos Desembargadores já firmaram entendimentos que

derrubem o poder da Convenção Condominial nesse sentido.

7. JURISPRUDÊNCIAS EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Como já destacado, são vários os precedentes do Egrégio Tribunal de

Justiça nesse sentido:

CONDOMÍNIO Ação cominatória c.c. anulação de multa e indenização por danos morais - Convenção condominial que veda a manutenção de animais no condomínio Falta de razoabilidade Animal de pequeno porte que não causa desconforto e incômodo aos demais condôminos Autorização de sua permanência no condomínio - Anulação das multas aplicadas Dano moral não caracterizado Ação parcialmente procedente Sucumbência recíproca, mais intensa do réu RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação 0005303-75.2011.8.26.0368, 3ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Alexandre Marcondes, Data do julgamento 08/04/2014)”.

Ação de obrigação de fazer c/c pedido de multa cominatória - Condomínio que pretende o cumprimento de regra prevista na convenção condominial - Proibição genérica da presença de animais - Não demonstrado qualquer incômodo - Configurado cerceamento injustificado ao livre uso da propriedade.- Recurso provido” (Apelação nº 9103208-66.2008.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Coelho Mendes, Data do julgamento 05/03/2013).

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Condomínio - Proibição total à manutenção de animal - Liberdade de condôminos limitada ao dever de respeitar os direitos fundamentais à propriedade e liberdade (art. 5º, inc. XXII e caput, Constituição) - Vedação convencional deve ser compatibilizada com direito de uso livre do condômino (art. 1.335 CC) e restringida para animais nocivos - À falta de evidência de nocividade, proibição exagerada - Recurso improvido” (Apelação nº 0010911-51.2012.8.26.0196, 7ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Luiz Antonio Costa, Data do julgamento 30/01/2013).

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - Pleito ajuizado por condomínio em face de condômina que mantém cão no interior de apartamento, sob o fundamento de que a convenção condominial veda a presença de qualquer animal - Sentença de improcedência - Inconformismo do autor - Cão de pequeno porte e dócil, cuja presença não se mostra nociva ou prejudicial aos demais condôminos -Invocação da norma proibitiva que constitui "injustificável apelo ao formalismo" - Orientação jurisprudencial e doutrinária neste sentido -Manutenção da r. sentença - Apelo improvido”. (Apelação 994.08.043208-0, 6ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Sebastião Carlos Garcia, Data do julgamento 21/10/2010).

TUTELA ANTECIPADA Ação ajuizada pelos condôminos em face do condomínio Proibição da circulação de animais no chão das áreas comuns Prédios residenciais em condomínio, sem elevadores, alguns distantes da rua Condôminos com idade avançada (80 anos) ou com problemas de saúde, e com dificuldade para transportar os animais no colo, como ordenado em circular do síndico Razoabilidade do pedido de que façam o percurso desde as unidades até a rua, com os animais no chão e sob guia Existência de prova inequívoca a autorizar juízo de verossimilhança das alegações Perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, decorrente da eventual e consequente necessidade de desfazimento dos cães por condôminos que os tem como animais de estimação, porque não têm condições de transportá-los no colo por longa distância Questão de fundo a ser dirimida na sentença final da causa principal Decisão que indefere a antecipação de tutela, reformada. Agravo provido. (Agravo de instrumento 2081440-96.2014.8.26.0000, 10ª Câmara de Direito Privado – Rel. Desembargador João Carlos Saletti – Data do julgamento 22.07.2014).

Com relação ao julgado acima citado, é imprescindível juntar aqui o relato do

Exmo. Desembargador a fim de que não pairem quaisquer duvidas acerca do

assunto aqui apresentado:

Em ação declaratória de nulidade de cláusula da convenção de condomínio c.c. obrigação de não fazer, o Juízo indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela porque ausente prova inequívoca da verossimilhança do direito dos autores (fls. 75). Insurgem-se os autores (fls. 1/19). Sustentam: a) são condôminos do Residencial Ametistas, localizado no Bairro Jardim Maricá, Mogi das Cruzes-SP, local onde residem diversas famílias com seus filhos e animais de estimação; b) a decisão do condomínio de proibir o trânsito de animais de estimação pelas áreas comuns mediante simples e irregular circular expedida pelo síndico é arbitrária e sem valor legal; é certo que o condomínio vive com essa situação há tempos, e se quer mudar de uma hora para outra; c) diversos moradores estão doando seus animais em função da situação atual, levados muitas vezes a situações vexatórias, pelo impedimento ao exercício ao direito de propriedade, que precisa ser garantido mesmo que minimamente da porta de sua residência até a rua e vice-versa; d) o prédio onde residem tem 4 andares, e não possui elevadores, além de estar a uma distância média de mais de 100 metros da portaria; e) o réu, sob a fraca alegação de que os animais fazem sujeira em áreas comuns, proibiu o passeio de animais nas áreas comuns do

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condomínio; f) um casal de idosos (80 anos), são moradores da unidade 14 C, Prédio 209, e possuem um cachorro de 7kg; g) a co-autora Maria Aparecida de Bastos Tosetto, tem sérios problemas na coluna; h) obrigar morador que possui um animal de estimação a circular exclusivamente com o mesmo no colo é abuso da função de síndico; i) as normas precisam ser no sentido de proibir que os animais circulem em áreas comuns como parquinhos, halls, etc., mas não que sejam impedidas de serem transportados no chão de suas residências até a rua; j) a decisão do síndico não foi levada ao crivo de uma assembleia. Requereram fosse atribuído efeito suspensivo ao recurso e o seu provimento, reformando a r. decisão agravada, para que possam exercer o seu direito de propriedade de forma plena para transitarem com seus animais de estimação de forma mínima da porta de suas residências até a rua e vice-versa, no chão e com guia. A liminar recursal foi deferida (fls. 113). Deixo de intimar a parte contrária, visto não integrar a lide.

É o relatório.

1. Trata-se de ação declaratória de nulidade de cláusula da convenção de condomínio c.c. obrigação de não fazer. Pleiteiam os autores a antecipação dos efeitos da tutela para que seja garantido o direito dos moradores a realizar o trânsito com seus animais no chão, entre suas unidades até a rua e vice-versa, sem que sejam obrigados a transportá-los no colo, e, ao final, seja a ação julgada procedente para que seja declarada nula a cláusula 9ª, item “n” da Convenção do Condomínio, a qual impede a manutenção de animais no condomínio (fls. 110/111).

O Juízo indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela afirmando o seguinte:

“Considerando que a decisão impugnada está fundamentada em cláusula da convenção de condomínio que poribe (SIC) animais, não há prova inequívoca da verossimilhança do direito dos autores, sendo necessária a prévia manifestação do réu, assim, indefiro a tutela antecipada” (fls. 75).

2. Na letra do artigo 273 do Código de Processo Civil, a antecipação dos efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, a ser acolhido ou negado por ocasião da sentença, reclama exista prova inequívoca a autorizar que o juiz se convença da verossimilhança da alegação. Mais que isso, é preciso haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. A controvérsia é restrita à validade ou não de regra condominial proibitiva da permanência de animais de estimação nas unidades autônomas, e à validade de circular expedida pelo síndico obrigando seus proprietários a transportá-los no colo nas áreas comuns do condomínio.

Segundo entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, a proibição de permanência de animal no interior dos apartamentos precisa ser analisada em cada caso concreto, para apurar se justificável ou não (cf. Resp 12166, rel. Min. Sálvio Figueiredo, j. 7.4.1992):

“Em linha máxima, tendo a Convenção caráter normativo, não se poderia tolerar qualquer infração ou desrespeito às suas disposições, de modo que a guarda de animais em apartamentos, só por si, seria vedada.”

“É que, sob esse prisma, não se poderia sancionar um comportamento que entrasse em conflito com a norma regulamentar proibitiva da permanência de animais de qualquer espécie em apartamentos.”

“Tal interpretação peca, porém, pelo fetichismo normativo, ignorando outros aspectos relevantes para a solução do problema.”

“Suponha-se, por exemplo, que o condômino mantenha, em seu apartamento, animais de pequeno porte, como cães pequinezes, aves

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cantoras ou gatos, que incômodo algum ou insegurança possam trazer aos vizinhos. Ou, para usar um exemplo “ad terrorem” imagine-se que o condômino possua, em sua unidade residencial, um pequeno aquário ou uma tartaruga de 10cm. Nesses casos, a invocação da norma proibitiva constituiria injustificável apego ao formalismo (summum jus summa injuria).”

“Como se vê, o só fato da guarda de animais, não caracteriza violação à Convenção, impondo-se sempre perquirir sobre a existência de incômodo aos vizinhos ou ameaça à sua segurança [...]”.

O caso dos autos não difere das situações aí exemplificadas. A circular questionada não faz distinção entre animais. Proíbe “terminantemente o passeio de animais nessas áreas. Os animais devem ser levados ou conduzidos no colo tanto para entrar como sair deste residencial, assim como acontece em shoppings, lojas, clínicas e afins” (fls. 50).

As áreas mencionadas são “passeios, gramados, playgrounds, escadarias, etc.” (fls. 50).

A motivação constante da circular consiste na “falta de conscientização de alguns moradores, que transformaram as áreas de uso comum (passeios, gramados, playgrounds, escadarias, etc.) em verdadeiros “cocódromos”, causando inúmeros transtornos aos demais moradores”.

O pedido antecipatório dos efeitos da tutela de mérito está limitado à possibilidade, não de transitarem os animais “nas áreas comuns, e sim que tão somente de forma mínima possam sair de suas unidades com coleiras e se dirigir com seus animais no chão até a rua” (fls. 14).

Não se trata, portanto, de discussão em torno da posse e manutenção deles nos apartamentos, objeto do artigo 9º da Convenção de Condomínio:

“Artigo 9º - Constituem obrigações de todos os condôminos:”

“n) não manter quaisquer animais, salvo com concordância expressa da totalidade dos condôminos;”

O Condomínio, ao que parece, não se opõe a que os condôminos tenham animais nas diversas unidades. Só não quer circulem pelas áreas comuns, senão no colo dos proprietários, para evitar que façam suas necessidades fisiológicas nas áreas mencionadas, como vinha sucedendo. O que os condôminos agravantes querem com a medida proposta, portanto, é se permita que caminhem de suas unidades à rua, sem que tenham de transportar os animais no colo durante todo o percurso. Assim pedem, em razão de muitos não terem condições de fazê-lo, porque idosos (80 anos cf. fls. 12) ou com problemas de saúde (na coluna, fls. 9), por exemplo, e porque os prédios, de três andares, não dispõem de elevadores. Além disso, o condomínio é fato constituído por diversos blocos de prédios de apartamentos, alguns deles, evidentemente, distantes da rua (os mais distantes a cerca de cem metros, dizem os agravantes). A medida imposta, por conseguinte, pode mesmo inviabilizar de fato a posse e a criação de animais de estimação, o que configura perigo de dano irreparável ou de difícil reparação para o interesse dos proponentes.

Em hipótese assemelhada, assim decidiu esta Câmara:

Agravo de instrumento. Ação de condenação em obrigação de não fazer. Insurgência contra decisão que indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela. Regulamento interno do condomínio agravado que somente permite a circulação de animais de estimação pelas áreas comuns no colo de seus donos. Autora idosa e com problemas na coluna, estando impossibilitada de observar tal determinação. Demandante que reside no primeiro andar do edifício. Animal adestrado pertencente a raça sabidamente dócil.

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Inexistência, ao menos neste momento processual, de qualquer perigo aos condôminos pelo trânsito do animal, pelas áreas comuns permitidas, fazendo uso de guia e coleira. “Restrições ao direito de propriedade dos condôminos que devem observar a razoabilidade” (AI 2006844-78.2013.8.26.0000, Desembargador VIVIANI NICOLAU). Precedentes desta Eg. Corte. Decisão reformada, recurso provido.” (Agravo de Instrumento nº 2068780-07.2013.8.26.0000, Des. Rel. Cesar Ciampolini, 10ª Câmara de Direito Privado, j. 04/02/2014).

Enfim, todos os fatos e circunstâncias apontados, aliados a que a imposição se deu por intermédio de circular (fls. 50), sem o crivo condominial, autorizam se conclua por ser razoável o pedido formulado pelos agravantes e se antecipe a medida nos termos e para os fins apontados no item 1 (trecho em negrito) deste voto. Isso, sem embargo de que devem os condôminos evitar que os animais façam suas necessidades fisiológicas nas áreas comuns mencionadas, objetivo da imposição. 3. Ante o exposto, dou provimento ao recurso.”

Posto isso, fica evidente que, não só a permanência de animais é permitida

em condomínios, como também a circulação de animais pelas áreas condominiais

sem que o proprietário seja obrigado a carregá- lo em seu colo, devendo, portanto,

observar as cautelas de modo que se evite que os animais façam suas

necessidades fisiológicas nessas áreas, preservando-se o bom senso do

proprietário.

Os termos das convenções condominiais proibindo a presença de animais

devem ser relativizados.

No que se refere à permanência de animais pelo porte, a decisão é unânime

na da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao prover

apelo de moradores de um prédio em Novo Hamburgo, que postularam o direito de

terem no apartamento um cão da raça chow-chow, de porte médio, apesar de as

normas condominiais permitirem somente a permanência de animais de pequeno

porte.

O relator do recurso no TJ, Desembargador José Francisco Pellegrini,

manifestou-se contrário à aplicação literal da convenção, uma vez que o porte do

animal, por si, não define sua periculosidade ou a perturbação que possa trazer ao

condomínio.

APELAÇÃO. CONDOMÍNIO. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. CABÍVEL A PERMANÊNCIA DE ANIMAL DE ESTIMAÇÃO QUE NÃO REPRESENTA QUALQUER RISCO AOS DEMAIS CONDÔMINOS. NECESSIDADE DE RELATIVAÇÃO DA CONVENÇÃO CONDOMINAL. APELO PROVIDO.” (Apelação Cível Nº 70003306156, 18ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Francisco Pellegrini, Julgado em 07/03/2002).

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Como vimos, todos os julgados mencionados articulam que, para que seja

válida a convenção condominial, deve-se demonstrar a ameaça á saúde, higiene,

segurança e sossego dos demais condôminos.

Destarte, são situações dificultosas e peculiares de serem demonstradas,

por isso à necessidade de juntarmos mais um julgado nesse sentido, vejamos:

DIREITO DE VIZINHANÇA AÇÃO COMINATÓRIA, CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ALEGAÇÃO DE USO NOCIVO DA PROPRIEDADE DE APARTAMENTO VIZINHO - PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO QUE SERIA CAUSADA POR EXCESSIVO RUÍDO PRODUZIDO POR CÃO DE ESTIMAÇÃO QUEIXAS APRESENTADAS DE FORMA UNILATERAL PELA AUTORA JUNTO AO CONDOMÍNIO, QUE NÃO FORAM CONFIRMADAS PELAS DEMAIS PROVAS PRODUZIDAS NOS AUTOS PROVA ORAL QUE NÃO LOGROU DEMONSTRAR O RUÍDO EXCESSIVO DEPOIMENTOS DE OUTROS VIZINHOS NO SENTIDO DE QUE EVENTUAIS RUÍDOS NÃO CHEGAVAM A CAUSAR INCÔMODO, DEIXANDO DE ULTRAPASSAR OS LIMITES DO TOLERÁVEL TESTEMUNHAS ARROLADAS PELO AUTOR QUE NÃO PRESENCIARAM OS FATOS PROVA INSUFICIENTE DO ATO ILÍCITO IMPUTADO AO AUTOR OFENSAS RECÍPROCAS ENTRE OS MORADORES, QUE EXCLUEM A CONFIGURAÇÃO DE DANO MORAL INDENIZÁVEL - CONDOMÍNIO QUE ADOTOU AS MEDIDAS CABÍVEIS AO CASO, SENDO INEXIGÍVEL CONDUTA DIVERSA AÇÃO IMPROCEDENTE. - Recurso desprovido.” (Apelação 9077828-41.2008.8.26.0000, 25ª Câmara de Direito Privado – Rel. Desembargador Edgard Rosa – Data do julgamento: 12/09/2012).

Porém, caso não seja demonstrada a perturbação do sossego, segurança e

ameaça à saúde, mesmo que constante expressamente tal proibição em

convenções condominiais, as alegações dificilmente serão providas, pois carecem

de provas.

7.1 JURISPRUDÊNCIAS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Já é pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“DIREITO CIVIL. CONDOMINIO. ASSEMBLEIA GERAL. IMPOSIÇÃO DE MULTA PELA MANUTENÇÃO DE ANIMAL EM UNIDADE AUTONOMA. NULIDADE DA DELIBERAÇÃO. CONVENÇÃO E REGIMENTO INTERNO. PRECEDENTE DA TURMA. RECURSO DESACOLHIDO.

I - AO CONDOMINO ASSISTE LEGITIMIDADE PARA POSTULAR EM JUIZO A NULIDADE DE DELIBERAÇÃO, TOMADA EM ASSEMBLEIA GERAL, QUE CONTRARIE A LEI, A CONVENÇÃO OU O REGIMENTO INTERNO DO CONDOMINIO.

II - A EXEGESE CONFERIDA PELAS INSTANCIAS ORDINARIAS A REFERIDAS NORMAS INTERNAS NÃO SE MOSTRA PASSIVEL DE ANALISE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL (ENUNCIADO N. 5 DA SUMULA/STJ).

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III - FIXADO, COM BASE NA INTERPRETAÇÃO LEVADA A EFEITO, QUE SOMENTE ANIMAIS QUE CAUSEM INCOMODO OU RISCO A SEGURANÇA E SAUDE DOS CONDOMINOS E QUE NÃO PODEM SER MANTIDOS NOS APARTAMENTOS, DESCABE, NA INSTANCIA EXTRAORDINARIA, REVER CONCLUSÃO, LASTREADA NO EXAME DA PROVA, QUE CONCLUIU PELA PERMANENCIA DO PEQUENO CÃO”. (grifos nossos) (Resp 10250/RS, Quarta Turma - Min. Salvio de Figueiredo Teixeira – Data do julgamento: 23/03/1993)

“DIREITO CIVIL. CONDOMINIO. ANIMAL EM APARTAMENTO. VEDAÇÃO NA

CONVENÇÃO. AÇÃO DE NATUREZA COMINATORIA. FETICHISMO LEGAL.

RECURSO INACOLHIDO.

I - SEGUNDO DOUTRINA DE ESCOL, A POSSIBILIDADE DA PERMANENCIA DE ANIMAIS EM APARTAMENTO RECLAMA DISTINÇÕES, A SABER: A) SE A CONVENÇÃO DE CONDOMINIO E OMISSA A RESPEITO; B) SE A CONVENÇÃO E EXPRESSA, PROIBINDO A GUARDA DE ANIMAIS DE QUALQUER ESPECIE; C) SE A CONVENÇÃO E EXPRESSAS, VEDANDO A PERMANENCIA DE ANIMAIS QUE CAUSAM INCOMODO AOS CONDOMINOS.

II - NA SEGUNDA HIPOTESE (ALINEA B), A RECLAMAR MAIOR REFLEXÃO,

DEVE-SE DESPREZAR O FETICHISMO NORMATIVO, QUE PODE CARACTERIZAR O SUMMUM JUS SUMMA INJURIA, FICANDO A SOLUÇÃO DO LITIGIO NA

DEPENDENCIA DA PROVA DAS PECULIARIDADES CADA CASO.” (Resp 12166/RJ, Quarta Turma – Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira - Data do julgamento: 07/04/1992).

Através desses entendimentos, fica evidente notarmos que, uma vez que os

animais não interfiram na via dos demais condôminos, não deve prevalecer a

proibição genericamente estabelecida na Convenção e sim a Lei Federal.

Outrossim, ainda com fulcro nos entendimentos doutrinários e

jurisprudenciais avocados, deve ser tolerada a presença de animais domésticos em

apartamento, desde que não atentem contra a segurança, higiene, saúde e o

sossego dos demais habitantes do prédio, mesmo que contenha expressa e

cláusulas de vedação à permanência de animais de estimação.

Vale transcrever lição de João Batista Lopes, que cuidou com precisão sobre

o tema:

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Em linha de máxima, tendo a convenção caráter normativo, não se poderia tolerar qualquer infração ou desrespeito às suas disposições, de modo que a guarda de animais em apartamentos, só por si, seria vedada. É que, sob esse prisma, não se poderia sancionar um comportamento que entrasse em conflito aberto com a norma proibitiva da permanência de animais de qualquer espécie em apartamentos. Tal interpretação peca, porém, pelo fetichismo normativo, ignorando outros aspectos relevantes para a solução do problema. Suponha-se, por exemplo, que o condômino mantenha, em seu apartamento, animais de pequeno porte, como cães pequineses, aves canoras ou gatos, que nenhum incômodo ou insegurança possam trazer aos vizinhos. Ou, para usar um exemplo ad terrorem, imagine-se que o condômino possua, em sua unidade residencial, um pequeno aquário ou uma tartaruga de 10 cm. Nesses casos, a invocação da norma proibitiva constituiria injustificável apego ao formalismo (summum jus summa injuria). É claro que, se se demonstrar, in concreto, que um cão pequinês, por exemplo, compromete a higiene dos condôminos, fazendo suas necessidades fisiológicas nas partes comuns do edifício, sua permanência no local não deverá ser tolerada. O deslinde do problema não está, portanto, no só fato da guarda ou permanência do animal no apartamento, mas sim no incômodo ou ameaça à segurança e higiene dos demais condôminos. Tudo dependerá, pois, da prova de tais circunstâncias, não se podendo, a priori, afirmar a prevalência da convenção sobre as peculiaridades de cada caso concreto

26.

7.2 JURISPRUDÊNCIAS DESFAVORÁVEIS AOS CONDÔMINOS QUANDO

PROVADOS OS RISCOS À SAÚDE, SOSSEGO E HIGIENE DOS DEMAIS

CONDÔMINOS – TJSP

“EMBARGOS INFRINGENTES. Ação cominatória. Réu que possui

cachorros de grande porte em apartamento pequeno, que ladram

intensamente, causando transtornos aos demais condôminos. Conduta que

fere o direito ao sossego dos demais moradores. Convenção do

Condomínio que proíbe a permanência de semoventes no interior das

unidades autônomas, a ser interpretada em consonância com o art. 1.336,

inciso IV, do Código Civil. Vedação condominial que desloca o ônus da

prova da ausência de prejuízo ao condômino que mantém o animal na

unidade. Deveres dos condôminos. Adoção do padrão de comportamento

do homem médio. Conjunto probatório que demonstra que os latidos são

estrondosos e afetam a tranquilidade do conjunto de moradores. Réus que

deverão retirar os animais do apartamento no prazo de 180 dias contados

na intimação pessoal, pena de incidência de multa cominatória diária.

Embargos infringentes acolhidos.” (Embargos Infringentes 9220254-

42.2009.8.26.0000/50000, 6ª Câmara de Direito Privado – Rel.

Desembargador Francisco Loureiro – Data do julgamento: 05/06/2014).

26

LOPES, João Batista. Condomínio. Editora RT. 10. ed. São Paulo, 2000. p. 166/167

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“Direito de vizinhança. Ação de obrigação de fazer. Tutela antecipada

indeferida. Perturbação do sossego público. Barulho causado por latidos,

em prédio de apartamentos. Multa diária de R$ 100,00. Afastamento dos

animais que se mostra pertinente, diante do Regimento Interno

Condominial. Recurso improvido.” (Apelação 0139492-18.2011.8.26.0100,

27ª Câmara de Direito Privado – Rel. Desembargador Campos Petroni –

Data do julgamento: 21/01/2014).

“Direito de vizinhança. Obrigação de não fazer com indenizatória por danos

morais. Alegação de perturbação do sossego. Barulho excessivo produzido

pelos animais demonstrado por meio de competente prova técnica pericial,

não contrariada por prova idônea. Prova suficiente. Obediência à Lei

Municipal e Convenção de Condomínio, que permitem no local a

permanência de cinco animais. Danos morais reduzidos. Recurso da autora

improvido e provido em parte a da ré.” (Apelação 0004639-

77.2012.8.26.0281, 26ª Câmara de Direito Privado – Rel. Desembargador

Bonilha Filho – Data do Julgamento: 04/12/2013).

Poucos são os julgados desfavoráveis aos condôminos e os julgados

existentes mostram pertinentes a instrução probatória fática, ou seja, se não for

provado, não serão acolhidas as alegações genéricas.

8. SOLUÇÃO AMIGÁVEL

O condomínio em edifícios é uma instituição peculiar. As relações entre os

condôminos, seus direitos e obrigações apresentam, por conseguinte, características

também peculiares, em função da natureza deste tipo de propriedade.

O Síndico hoje é um, amanhã será outro. As empresas que prestam serviço

para o condomínio também. Seus funcionários, a mesma coisa. No entanto, os

condôminos terão de conviver entre si por um longo período de tempo. Às vezes,

durante toda uma vida.

Como toda relação duradoura, o primeiro caminho na solução de problemas

deve ser a conversa. A solução amigável. Espera-se, pelo menos em princípio, que

o ser humano civilizado tenha condições de se entender com o seu semelhante. Se

assim não for, melhor voltarmos aos primórdios da nossa espécie, antes do

surgimento do “ homo sapiens”.

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Nos dias de hoje, todos estão estressados. São problemas no trabalho,

contas para pagar (cujo saldo bancário no final do mês nem sempre é suficiente),

trânsito infernal, problemas de saúde, enfim, a pressão da vida moderna sobre o ser

humano é contínua e poucas são as válvulas de escape. Quando menos se espera,

a pessoa “estoura”. Descarrega seus problemas e frustrações onde lhe parece mais

fácil. Uns praticam esportes, outros fazem meditação, alguns direcionam a energia

para um hobby. Outros, no entanto, descontam em casa. Melhor dizendo, em seu

apartamento. Que, por sua vez, situa-se num condomínio.

Na maioria das vezes, uma conversa resolve. O vizinho incomodado com o

barulho comunica o outro, que entende a situação e diminui o volume da TV. O

Síndico chama o morador para uma palavrinha, e o lembra de que seu filho não

pode andar de skate no pátio do edifício. E assim por diante. A primeira vista, pode

parecer que o número de casos envolvendo conflitos nos condomínios e que vão

parar na justiça é enorme. Realmente o é. No entanto, se considerarmos a coisa sob

o ponto de vista estatístico, descobriremos que o número não é tão grande assim.

Quantas pessoas no Brasil moram em condomínios? Tendo em vista que a

população só tem a crescer e que a maioria dos terrenos vazios estão sendo

ocupados por apartamentos, fica impossível precisar a ideal quantidade, mas de fato

sabemos que é uma quantidade absurda. Levando-se em conta este dado, e

considerando que o condomínio é um caldeirão potencial de conflitos, o número de

casos que precisam do poder judiciário para serem solucionados é muito pequeno.

Ocorre que a sociedade, para ser organizada, precisa de comandos

normativos. Precisa de Leis. Não pode contar somente com o bom senso das

pessoas e com a natureza do ser humano. As Leis mantêm a harmonia e a

tranquilidade social. De outra forma, teríamos a anarquia e, consequentemente, o

caos. No condomínio é a mesma coisa. A “sociedade condominial” possui normas e

as respectivas penalidades em caso de descumprimento.

9. PROCEDIMENTOS JUDICIAIS

Esgotadas as vias internas de solução, restará a via judicial para coibir os

atos ou omissões de condôminos que sejam prejudiciais à vida condominial ou a

determinado morador.

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Dependendo do caso a ação será proposta pelo condomínio, representado

pelo Síndico, ou pelo condômino prejudicado.

Em geral, o procedimento a ser seguido será a ação ordinária de caráter

cominatório, solicitando-se ao Juiz que estabeleça uma multa diária contra o infrator,

multa esta que será revertida em benefício do condomínio. Assim, por exemplo, esta

será a ação para fazer cessar atividades nocivas, desembaraçar áreas comuns

indevidamente ocupadas, obrigar a reparação de vazamentos, etc.

O procedimento cível não anula o criminal, para os casos de infração à

legislação penal. É o caso, por exemplo, da perturbação do trabalho ou sossego

alheio (artigo 42 da Lei das Contravenções penais), que pode condenar o infrator a

pena de prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa.

10. CONCLUSÃO

O que podemos extrair de tudo o que foi explanado, bem como a finalidade

deste trabalho é que muitos guardiões de animais não sabem que todas essas

regras inventadas pelos regimentos condominiais não são constitucionais. É

totalmente permitido ter animais em sua casa e usufruir com eles do que o

condomínio oferece. O que não pode em condomínio é não respeitar a liberdade e o

sossego do vizinho. Se você liga um som alto ou se seu cachorro late, a discussão

é a mesma: há que se atentar ao sossego de todos, mas há também que se dar

liberdade para que tenham seu lazer tolerado.

Outra coisa que não pode é sujar ou depredar áreas comuns. Por exemplo,

se seu cachorro faz xixi no chão do prédio, é sua responsabilidade limpar o mais

rápido possível. O mesmo vale no caso de você derrubar uma lata de cerveja no

local. Sabendo desse risco, o condomínio por acaso o proíbe de tomar cerveja?

Em outras palavras: em condomínios (e em sociedade) vale a convivência

pacífica, a tolerância e o respeito. O abuso contra esses preceitos deve ser evitado,

estejamos falando de animais ou não.

Os condomínios não têm autonomia pra decidir que tamanho de animal você

pode abrigar em casa, o que não pode deixar acontecer é a perturbação ou ameaça

á segurança e higiene dos demais condôminos.

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Qualquer cláusula que proíba animais em condomínios, assim como,

qualquer lei municipal ou estadual com o mesmo teor serão incompatíveis com a Lei

4591/64, com o Código Civil e com a Constituição Federal.

Só pode haver vedações em caso de animais que causem transtornos ao

condomínio e aos condôminos (barulho, agressividade, ameaça à saúde pública),

mediante comprovação.

Outro caso de extrema importância é de pessoas com deficiência visual que

utilizam-se de animais como guia. Tendo em vista que, normalmente esses animais

são de porte grande, até mesmo se fosse de porte médio ou pequeno, uma pessoa

com deficiência visual não teria capacidade de carregá-lo no colo nas vias do

condomínio, trata-se de uma necessidade considerável para sua sobrevivência.

Como a própria Constituição Federal rege pela igualdade entre as pessoas,

não pode tratar os demais de maneira distintas.

É evidente que, automaticamente a permanência de animais selvagens,

como por exemplo, leões e tigres ficam restritas, haja vista que, de acordo com

todos os entendimentos majoritários aqui colacionados, só é permitida a

permanência de animais que não perturbem a saúde, sossego e segurança dos

demais condôminos, já os selvagens não se enquadram nessa permanência, uma

vez que esses animais, alem de provocarem ruídos altos, são perigosos e contém

doenças que poderiam contaminar os demais, podendo levar até a morte.

As Convenções de Condomínio que proíbam a permanência de animais não

podem ser aceitas, caso o animal não apresente nenhuma ameaça.

Quem tem animais sabe que eles são na verdade parte da família, mas

segundo a lei eles são propriedade. E sobre nossa propriedade, ninguém poderá

interferir, a menos é claro, se não estivermos cumprindo leis maiores, como o direito

ao bem estar, pois muitos proprietários doam seus animais de longas datas por

acreditarem ser obrigados a romperem esse vínculo, por mero desconhecimento da

lei.

Os animais foram retirados da natureza por nós e tem todo o direito a

conviverem em sociedade e terem suas necessidades respeitadas.

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