ANO 20 Nº 5 Maio de 2011 GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL Secretaria do Planejamento, Gestão e Participação Cidadã FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA Siegfried Emanuel Heuser Fernando Maccari Lara (FEE/CEES) As experiências de desenvolvimento do pós Segunda Guerra, que levaram os países hoje considerados avançados a níveis elevados de renda per capita, foram acompanhadas por processos intensos de industrialização, no sentido do aumento da participação das atividades industriais na gera- ção de emprego e na produção do Valor Adicionado (VA). A partir dos anos 70, porém, as parcelas da indústria no empre- go e no VA começaram a declinar naqueles países. Ainda que isso tenha causado preocupação a muitos economistas na época, passou-se a considerar essa desindustrialização como algo “natural”: a partir de certo nível de renda per capita, a participação da indústria passaria a cair, e as parcelas relati- vas aos serviços, a aumentar. Estudos recentes sugerem, entretanto, a existência de importantes assimetrias nesse pa- drão de mudança estrutural. Em muitos países em desenvol- vimento, o processo de desindustrialização começou a ocor- rer em níveis de renda per capita muito inferiores àqueles registrados nos países avançados, enquanto, em outros, a industrialização não foi interrompida. Dados relativos aos países asiáticos no período 1993- -2003, por exemplo, mostram altas taxas de crescimento eco- nômico, ainda acompanhadas de crescimento da parcela da indústria no VA. O contraste dessa situação com a da Améri- ca Latina é bastante evidente, na medida em que não só o crescimento econômico dessa região foi muito menor nessa região no mesmo período, mas também porque o crescimento da produção industrial foi, em geral, menor do que o cresci- mento do PIB, indicando, assim, uma tendência de redução da parcela da indústria no VA. Tomando-se dados relativos ao Brasil, observa-se que, ao longo do período 1994-2010, a taxa de crescimento da produção industrial foi de 1,93% ao ano, em média. Considerando-se somente a indústria de trans- formação, tem-se um crescimento médio um pouco menor, de 1,51% ao ano. Ambas as taxas são inferiores ao cresci- mento médio do VA, que foi de 2,58% ao ano. Tomando-se os dados relativos ao emprego, observa-se que a parcela do emprego industrial em relação ao total do emprego formal ao final de 1994 era de 21,37%, reduzindo-se para 17,86% ao final de 2009. Sob ambos os critérios, portanto, há uma ten- dência de redução da participação da indústria. O período considerado nesses dados compreende os mandatos dos Presidentes FHC e Lula e tem sido considera- do como uma “nova era” na economia brasileira, uma vez que nela vigorou a estabilidade dos preços domésticos, após um longo período de inflação crônica. O fato de essa estabi- lidade ter sido conquistada mediante valorização cambial quase contínua ao longo de todo o período é fundamental para se compreenderem as mudanças no padrão do comér- cio exterior, que aumentaram significativamente a importân- cia das exportações de commodities. Os coeficientes de ex- portação da indústria têm mostrado tendência de queda, ao mesmo tempo em que crescem fortemente os coeficientes de importação, especialmente aqueles relativos a bens in- dustriais de maior conteúdo tecnológico. Os nexos entre a dificuldade de sustentar e diversificar a pauta de exporta- ções industriais e a perda de participação da indústria no emprego e no VA devem ser profundamente investigados, de modo a avaliar-se o papel do regime macroeconômico sobre o padrão de inserção externa e o processo de desindustrialização da economia brasileira. Taxas médias anuais de crescimento dos índices de volume no Brasil — 1994-2010 (%) DISCRIMINAÇÃO FHC E LULA FHC LULA (out.-dez. 1994-2010) (out.-dez. 1994-2002) (out.-dez. 2002-10) Indústria geral (A) .................... 1,93 1,03 2,84 Indústria de transformação (B) 1,51 0,76 2,27 Valor Adicionado (C) ............... 2,58 1,55 3,61 A - C ....................................... -0,65 -0,52 -0,77 B - C ....................................... -1,07 -0,79 -1,34 FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. Desindustrialização no Brasil
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ANO 20 Nº 5Maio de 2011
GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SULSecretaria do Planejamento, Gestão e Participação CidadãFUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICASiegfried Emanuel Heuser
Fernando Maccari Lara (FEE/CEES)
As experiências de desenvolvimento do pós SegundaGuerra, que levaram os países hoje considerados avançadosa níveis elevados de renda per capita, foram acompanhadaspor processos intensos de industrialização, no sentido doaumento da participação das atividades industriais na gera-ção de emprego e na produção do Valor Adicionado (VA). Apartir dos anos 70, porém, as parcelas da indústria no empre-go e no VA começaram a declinar naqueles países. Ainda queisso tenha causado preocupação a muitos economistas naépoca, passou-se a considerar essa desindustrialização comoalgo “natural”: a partir de certo nível de renda per capita, aparticipação da indústria passaria a cair, e as parcelas relati-vas aos serviços, a aumentar. Estudos recentes sugerem,entretanto, a existência de importantes assimetrias nesse pa-drão de mudança estrutural. Em muitos países em desenvol-vimento, o processo de desindustrialização começou a ocor-rer em níveis de renda per capita muito inferiores àquelesregistrados nos países avançados, enquanto, em outros, aindustrialização não foi interrompida.
Dados relativos aos países asiáticos no período 1993--2003, por exemplo, mostram altas taxas de crescimento eco-nômico, ainda acompanhadas de crescimento da parcela daindústria no VA. O contraste dessa situação com a da Améri-ca Latina é bastante evidente, na medida em que não só ocrescimento econômico dessa região foi muito menor nessaregião no mesmo período, mas também porque o crescimentoda produção industrial foi, em geral, menor do que o cresci-mento do PIB, indicando, assim, uma tendência de reduçãoda parcela da indústria no VA. Tomando-se dados relativosao Brasil, observa-se que, ao longo do período 1994-2010, a
taxa de crescimento da produção industrial foi de 1,93% aoano, em média. Considerando-se somente a indústria de trans-formação, tem-se um crescimento médio um pouco menor,de 1,51% ao ano. Ambas as taxas são inferiores ao cresci-mento médio do VA, que foi de 2,58% ao ano. Tomando-seos dados relativos ao emprego, observa-se que a parcela doemprego industrial em relação ao total do emprego formalao final de 1994 era de 21,37%, reduzindo-se para 17,86% aofinal de 2009. Sob ambos os critérios, portanto, há uma ten-dência de redução da participação da indústria.
O período considerado nesses dados compreende osmandatos dos Presidentes FHC e Lula e tem sido considera-do como uma “nova era” na economia brasileira, uma vezque nela vigorou a estabilidade dos preços domésticos, apósum longo período de inflação crônica. O fato de essa estabi-lidade ter sido conquistada mediante valorização cambialquase contínua ao longo de todo o período é fundamentalpara se compreenderem as mudanças no padrão do comér-cio exterior, que aumentaram significativamente a importân-cia das exportações de commodities. Os coeficientes de ex-portação da indústria têm mostrado tendência de queda, aomesmo tempo em que crescem fortemente os coeficientesde importação, especialmente aqueles relativos a bens in-dustriais de maior conteúdo tecnológico. Os nexos entre adificuldade de sustentar e diversificar a pauta de exporta-ções industriais e a perda de participação da indústria noemprego e no VA devem ser profundamente investigados,de modo a avaliar-se o papel do regime macroeconômicosobre o padrão de inserção externa e o processo dedesindustrialização da economia brasileira.
Taxas médias anuais de crescimento dos índices de volume no Brasil — 1994-2010 (%)
Indústria geral (A) ..................... 1,93 1,03 2,84 Indústria de transformação (B) 1,51 0,76 2,27 Valor Adicionado (C) ............... 2,58 1,55 3,61 A - C ....................................... -0,65 -0,52 -0,77 B - C ....................................... -1,07 -0,79 -1,34
FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE.
Desindustrialização no Brasil
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Carta de Conjuntura - Ano 20 nº 5
O coeficiente técnico da produção gaúcha no contexto brasileiro
O canal do crédito e o poder da política monetária
Edison Marques Moreira (FEE/CEES)
Analisando os coeficientes técnicos (CT) — razão entreo consumo intermediário (CI) e o Valor Bruto da Produção(VBP) — de estados e atividades selecionados, observa-seque, em 2008, o CT do RS foi o segundo maior do País (0,57),acima do brasileiro (0,51) e de outros importantes estados,como SP (0,54) e PR (0,56). Isso significa que, para um mesmovalor de produção, a economia gaúcha consome mais bensintermediários. De 2002 a 2008, o coeficiente do RS cresceu7,2%, contra 3,1% do Brasil, sendo o CT do Estado, no míni-mo, o terceiro maior em todos os anos.
O elevado CT gaúcho decorre, por um lado, da importân-cia que a indústria de transformação tem na estrutura produ-tiva do Estado e, por outro, de essa indústria apresentar um
CI proporcionalmente maior do que em outras unidades da Fe-deração. Como resultado, em 2008, 60,1% do CT do RS veio daindústria de transformação. Isso se deve à presença significa-tiva (22,4% do seu VBP em 2008) de duas atividades cujatecnologia é altamente demandante de insumos: refino de pe-tróleo (0,98) e química (0,92).
Como o Valor Agregado (VA) é a diferença entre a produ-ção (VBP) e os insumos (CI), o alto CT gaúcho implica que umestado com o mesmo VBP que o do RS, mas com menor CT,tenha uma maior participação no VA brasileiro. Porém, é impor-tante lembrar que, sem o refino de petróleo e a química, o CTgaúcho seria menor, mas ao custo de um VA também menor.
Pode-se definir o poder da política monetária como ograu de influência que uma alteração na taxa básica de jurostem sobre a atividade econômica e, consequentemente, so-bre a inflação.
No período recente, dois elementos importantes podemter alterado a relevância do mercado de crédito como meca-nismo de transmissão da política monetária. O primeiro é aevolução dos volumes de empréstimos (recursos livres maisdirecionados) na economia brasileira, nos últimos anos. É dese esperar que a importância do canal de crédito seja maior, àmedida que continue o processo de aprofundamento finan-ceiro da economia. O segundo elemento são as operações de
crédito direcionado em geral — e as do BNDES em particular — ,que saltaram, segundo o Banco Central, de 9,8% do PIB emdezembro de 2004 para 16,1% em fevereiro de 2011.
Especificamente, a expansão das operações de créditodirecionado, as quais não são feitas a taxas de mercado, dimi-nuem a importância do canal de crédito como mecanismo detransmissão da política monetária. Isso faz com que a taxa dejuros Selic afete menos o nível de atividade da economia, tor-nando o esforço do Bacen para reduzir a inflação ainda maior,como, por exemplo, reduzir o parcelamento das vendas a prazoe aumentar o depósito compulsório sobre os depósitos à vista.
Evolução da participação do crédito, em relação ao PIB, no Brasil — dez./2004-10 e fev./11 (%)
Coeficiente técnico (CI/VBP), por atividades, em estados selecionados — 2008
ATIVIDADES RS SP RJ MG PR BA BRASIL VA total ....................................................................... 0,57 0,54 0,47 0,51 0,56 0,54 0,51 Agropecuária ............................................................... 0,45 0,66 0,40 0,35 0,56 0,34 0,45 Indústria ....................................................................... 0,76 0,71 0,61 0,68 0,76 0,74 0,70 Serviços ....................................................................... 0,37 0,38 0,35 0,34 0,35 0,35 0,36 Indústria de transformação ...................................... 0,80 0,75 0,73 0,75 0,81 0,83 0,76 Indústria de transformação no CI/VBP total (1) (%) 60,1 56,1 30,5 55,1 58,2 56,0 50,1 FONTE: IBGE/Contas Regionais. (1) Mede o quanto da relação CI/VBP total do Estado é devido à industria de transformação.
FONTE: IPEA. IBGE. Bacen. DIEESE. FGV. IBRE. Macrométrica.(1) Variação percentual acumulada em quatro trimestres. (2) Taxa de investimento acumulada em quatro trimestres. Quociente entre a Formação Bruta de Capital Fixo e o PIB, ambos a preçoscorrentes. (3) Pessoas que procuraram trabalho de maneira efetiva nos últimos 30 dias anteriores ao da entrevista e não exerceram nenhum trabalho. (4) Variação percentual em relação aomesmo mês do ano anterior. (5) R$/cesta de 15 moedas: EUA, Japão, Argentina, China, Países Baixos, Alemanha, México, Itália, Chile, Rússia, Reino Unido, França, Bélgica, Espanha, Coreia doSul. (6) Valor dos últimos 12 meses. (7) Variação percentual acumulada em 12 meses. (8) Variação percentual em relação ao mês anterior. (9) Taxa mensal.
FONTE: FEE. IBGE. MICT. PED-RMPA. Secretaria da Fazenda-RS. IEPE. SINDUSCON. Ministério do Trabalho e Emprego.(1) Refere-se à taxa anual. (2) Base: abr./09 = 100. (3) Inflator utilizado: IPC-IEPE; valores em reais de fev./11. (4) Refere-se à soma do consumode energia elétrica divulgado pelas três principais operadoras do Estado (RGE, AES-SUL e CEEE). (5) Base: média de 2002 = 100. (6) Base: igualmês do ano anterior = 100. (7) Base: igual período do ano anterior = 100. (8) Exclusive os assalariados e os empregados domésticosassalariados que não tiveram remuneração no mês, os trabalhadores familiares sem remuneração salarial e os trabalhadores que ganhamexclusivamente em espécie ou benefício. (9) Exclusive os assalariados que não tiveram remuneração no mês e os empregados domésticos.
Desempenho da ocupação em nível setorial, na RMPA, nos anos 2000
Preços do arroz e do feijão ao produtor e ao consumidor
Vanclei Zanin (FEE/CEES)
Durante os anos 2000, o mercado de trabalho da RegiãoMetropolitana de Porto Alegre (RMPA) refletiu a conjunturafavorável da economia brasileira. Dados da Pesquisa Empre-go e Desemprego (PED-RMPA) mostram que, no período 2000--10, foram absorvidas cerca de 42 mil pessoas por ano naRegião, enquanto, nos anos 90, a média foi de 26 mil. Anali-sando-se a capacidade de absorção de mão de obra atravésda variação do número de ocupados por ramo de atividade,pode-se perceber quais foram os segmentos mais e menosdinâmicos. A primeira constatação é que 56,2% dos ramosidentificados pela PED apresentaram o desempenho acima damédia da RMPA, enquanto 43,8% ficaram abaixo — entre es-ses, estão cinco segmentos que registraram variação ne-gativa.
Os ramos mais dinâmicos foram a indústria eletroeletrônicae de transportes (com 112,5% de aumento), os serviços pes-soais (78,3%), os serviços de comércio, administração de va-lores imobiliários e imóveis (62,5%), a educação (62,1%), asaúde (56,3%), os serviços de diversões, radiodifusão eteledifusão (50,0%), outros serviços (48,8%), os serviçosespecializados (48,0%), o segmento de reformas na constru-ção civil (46,5%) e o comércio atacadista (46,2%). Note-se queos segmentos da atividade produtiva que apresentaram ritmode crescimento mais elevado não constituem, necessariamen-te, os que apresentaram a maior variação em termos absolu-tos, como é o caso da educação, da saúde e dos serviçosespecializados.
Os preços da saca de arroz e de feijão ao produtor no RS,em mar./11 — R$ 21,43 e R$ 71,45 respectivamente —, estavamabaixo dos preços mínimos garantidos pelo Governo Federal(R$ 25,80 e R$ 80,00). Sendo época de safra, pode ser que osmesmos caiam ainda mais. Visando obter um indicativo dospreços para o horizonte próximo, busca-se analisar a evolu-ção dos preços desses dois grãos ao produtor e no varejoentre março de 2010 e março de 2011.
O feijão apresentou um comportamento bastante volátil,tendo-se elevado em 13,10% ao varejo no período, reflexo deum produto produzido em pequena escala, sujeito a variaçõesclimáticas e deficiências de armazenagem. Por outro lado, opreço do arroz teve uma retração de quase 10%. A margemrelativa de comercialização — diferença entre o preço no vare-
jo e o ao produtor dividida pelo preço no varejo — indica que,em ambos os casos, os preços apresentaram um comporta-mento semelhante, ou seja, os preços ao consumidor e aoprodutor tiveram variações similares.
A elevação de preços do feijão foi superior ao IPCA dePorto Alegre (5,09%), ao passo que o arroz, em queda, ajudoua conter o aumento dos preços da cesta básica na Capitalgaúcha. Ademais, por se tratar de época de safra, recorde nocaso do arroz, pelo patamar de taxa de câmbio favorável àimportação e pelo padrão sazonal de movimentação dos pre-ços, parece lícito supor-se que, ao menos no curto prazo, essealimento não apresente grandes elevações ao consumidor. Nocaso do feijão, apesar das oscilações maiores, essa tendênciadeve também ocorrer.
Cabe ressaltar-se que alguns segmentos da atividade pro-dutiva da RMPA apresentaram recuo no contingente deocupados. Entre esses, estão a indústria de calçados (-6,7%),os serviços de utilidade pública (-13,3%), a indústria do ves-tuário (-20,0%) e os serviços comunitários (-22,6%).
Variação do número de ocupados, por ramos de atividade selecionados, na RMPA — 2000-10
FONTE: Emater/Ascar. DIEESE. NOTA: Os índices têm como base março de 2010 = 100.
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Carta de Conjuntura - Ano 20 nº 5
Tiragem: 250 exemplares. Conselho Editorial da Carta: Roberto daSilva Wiltgen (Editor-chefe), Cecilia RutkoskiHoff, Fernando Maccari Lara e Renato Antô-nio Dal Maso.
Núcleo de Dados: Rafael Bernardini San-tos (coordenação) e Ana Maria de OliveiraFeijó.Editoração: Susana Kerschner e Maria InaciaFlôr Reinaldo (revisão), Cirei Pereira daSilveira e Rejane Maria Bondanza Lopes(diagramação).
Presidente: Adalmir Antonio MarquettiDiretor Técnico: André Luis Forti SchererDiretor Administrativo: Roberto Pereira da Rocha
Ricardo Brinco (FEE/CEES)
CARTA DE CONJUNTURA FEE (elaborada com informações até 29.04.11).ISSN 1517-7262A Carta de Conjuntura FEE é uma publicação mensal de responsabilidade dos editorialistas. As opiniões não exprimem um posicionamento oficial da FEE ou daSecretaria do Planejamento, Gestão e Participação Cidadã.
Expansão da frota de veículos e caos urbano
Fundação de Economia e Estatística SiegfriedEmanuel HeuserRua Duque de Caxias, 1691 - Porto AlegreCEP 90010-283E-mail: [email protected]
As vendas de novos veículos automotores no Brasil têmsido marcadas por um impressionante dinamismo nos últimosanos. As bases desse vigoroso e sustentado movimentoexpansionista da frota podem ser encontradas na recomposi-ção do poder de compra dos assalariados e na abertura domercado para consumidores de faixas mais baixas de renda.Colabora também, nesse sentido, a franca opção por um mo-delo de sociedade que tem no automóvel sua escolha modalprivilegiada de transporte.
Tal comportamento é replicado no contexto do Rio Gran-de do Sul, verificando-se também aqui um aumento quase semlimites da frota em circulação e a ocorrência de sucessivosrecordes de vendas. Considerando-se os anos mais recentes,verifica-se que o parque total do Estado cresceu 45,2% entre2004 e 2010, equivalendo a quase um milhão e meio de veí-culos adicionais circulando nas vias públicas. Um desempe-nho dessa ordem foi determinante para que a relação pessoaspor veículo caísse de 3,2 para 2,3 nesse período. Os automó-veis e as caminhonetes, com 70,7% de participação em 2010,formavam o principal contingente motorizado, seguidos pelasmotos, cujo peso relativo ascendeu de 15,4% em 2004 para19,7% em 2010. Tomando-se como indicativo a taxa geométri-ca anual de crescimento do período, da ordem de 6,41%, pode--se esperar a adição de outras 300.000 unidades em 2011, pas-sando o total para pouco mais de cinco milhões.
Porto Alegre concentrava 14,6% dos veículos registradosno Estado em 2010, tendo o parque crescido 30,2% no períodoanalisado (4,49% a.a.). Isso correspondeu à inclusão de quase160.000 novas unidades no tráfego já amplamente congestio-nado da Capital dos gaúchos, fazendo a relação pessoas porveículo diminuir de 2,6 para 2,0.
Um dos principais fatores na origem dos problemas decongestionamento é, precisamente, o aumento incontroladodos automóveis em circulação, levando a uma enorme pres-são sobre o sistema viário e a uma deterioração acentuada dascondições de mobilidade urbana. Uma explicação trivial para ofenômeno remete à não disponibilização de suficiente espaçode circulação adicional, à medida que a população motorizadase expande, com base na crença simplória de que deve haveruma capacidade ilimitada de circulação.
Na verdade, a solução desses desafios passa longe daênfase na realização de grandes obras de engenharia viária, deduvidosa e efêmera eficácia. As melhores alternativas apon-tam ações direcionadas a influenciar a própria demanda deviagens em automóvel, com restrições ao uso deste último, aexemplo da limitação das vagas de estacionamento, sejam
públicas ou privadas, da cobrança pelo ingresso em determi-nadas áreas urbanas, senão de seu virtual banimento, ou dodesestímulo ou da proibição de tráfego em determinados diasou horários. Em qualquer hipótese, a introdução de melhoriasde grande porte nos sistemas de transporte público e a suaefetiva entronização como escolha modal prioritária devemcolocar-se, forçosamente, como a outra face dessa moeda.
Número de veículos em circulação e acréscimo no número de veículos no ano, no Rio Grande do Sul