DESEMPENHO, DURABILIDADE E VIDA ÚTIL DAS EDIFICAÇÕES: ABORDAGEM GERAL Edna Possan 1 , Carlos Alberto Demoliner 2 1 Doutora em Engenharia Civil. Universidade Federal da Integração Latino Americana. [email protected]. 2 Engenheiro Civil. Construtora Engenho Brasil. [email protected]. Resumo: O desenvolvimento de novas tecnologias, processos construtivos e materiais de construção associado às exigências competitivas do setor tem fomentado a construção de edificações cada vez mais esbeltas e econômicas. No entanto, com o progresso industrial e o crescimento das cidades, e consequentemente com o aumento da poluição urbana, as edificações passaram a ficar expostas a ambientes extremamente desfavoráveis. Com isso, com o passar do tempo muitas construções começaram a apresentar níveis de degradação superior aos desejados, apresentando problemas relacionados à qualidade e a durabilidade, caracterizados pelo envelhecimento precoce devido, sobretudo, ao aparecimento de manifestações patológicas. Esses problemas afetam a estética, a segurança, a utilização e a durabilidade das construções. Tais fatos têm chamado à atenção da comunidade da construção brasileira para a necessidade do projeto para a durabilidade, do maior controle do projeto e execução de novas edificações e, sobretudo, da necessidade do constante monitoramento e/ou manutenção das construções existentes. Neste sentido, a recém- publicada norma de desempenho (NBR 15575: 2013), tem o intuito de melhorar a qualidade das construções habitacionais. Para isso, leva em conta a durabilidade e a vida útil das estruturas e suas partes, sugerindo a modelagem matemática como ferramenta para as estimativas de vida útil e análise de desempenho. Esse trabalho apresenta uma breve discussão sobre a temática do desempenho, da durabilidade e da vida útil das construções com o objetivo de instigar o engenheiro a produzir edificações de qualidade. Palavras chave: desempenho, NBR 15575, vida útil, durabilidade, qualidade da construção. Abstract: The development of new technologies, construction processes and building materials associated to competitive demands of the industry has fostered the construction of buildings increasingly slender and economic. However, with industrial progress and the growth of cities, and consequently with the increase of urban pollution, buildings began to be exposed to extremely unfavorable environments. Thus, over time many buildings began to show degradation levels higher than desired, presenting problems related to quality and durability, characterized by premature aging, mainly due to the appearance of pathological manifestations. These problems affect the aesthetics, safety, use and durability of buildings. These facts have called the attention of Brazilian constructors to carry out the project for durability, better control of the design and execution of new buildings and, above all, the need for constant monitoring and/or maintenance of existing buildings. In this sense, the recently published performance standard (NBR 15575: 2013), aims to improve the quality of new housing. For this, takes into account the durability and useful life of structures and parts, suggesting the mathematical modeling as a tool for estimating the lifetime and performance
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DESEMPENHO, DURABILIDADE E VIDA ÚTIL DAS EDIFICAÇÕES: ABORDAGEM GERAL
Edna Possan1, Carlos Alberto Demoliner2
1 Doutora em Engenharia Civil. Universidade Federal da Integração Latino Americana. [email protected].
O desenvolvimento de novas tecnologias, processos construtivos e materiais de construção associado às exigências competitivas do setor tem fomentado a construção de edificações cada vez mais esbeltas e econômicas. No entanto, com o progresso industrial e o crescimento das cidades, e consequentemente com o aumento da poluição urbana, as edificações passaram a ficar expostas a ambientes extremamente desfavoráveis. Com isso, com o passar do tempo muitas construções começaram a apresentar níveis de degradação superior aos desejados, apresentando problemas relacionados à qualidade e a durabilidade, caracterizados pelo envelhecimento precoce devido, sobretudo, ao aparecimento de manifestações patológicas. Esses problemas afetam a estética, a segurança, a utilização e a durabilidade das construções. Tais fatos têm chamado à atenção da comunidade da construção brasileira para a necessidade do projeto para a durabilidade, do maior controle do projeto e execução de novas edificações e, sobretudo, da necessidade do constante monitoramento e/ou manutenção das construções existentes. Neste sentido, a recém-publicada norma de desempenho (NBR 15575: 2013), tem o intuito de melhorar a qualidade das construções habitacionais. Para isso, leva em conta a durabilidade e a vida útil das estruturas e suas partes, sugerindo a modelagem matemática como ferramenta para as estimativas de vida útil e análise de desempenho. Esse trabalho apresenta uma breve discussão sobre a temática do desempenho, da durabilidade e da vida útil das construções com o objetivo de instigar o engenheiro a produzir edificações de qualidade.
Palavras chave: desempenho, NBR 15575, vida útil, durabilidade, qualidade da construção.
Abstract:
The development of new technologies, construction processes and building materials associated to competitive demands of the industry has fostered the construction of buildings increasingly slender and economic. However, with industrial progress and the growth of cities, and consequently with the increase of urban pollution, buildings began to be exposed to extremely unfavorable environments. Thus, over time many buildings began to show degradation levels higher than desired, presenting problems related to quality and durability, characterized by premature aging, mainly due to the appearance of pathological manifestations. These problems affect the aesthetics, safety, use and durability of buildings. These facts have called the attention of Brazilian constructors to carry out the project for durability, better control of the design and execution of new buildings and, above all, the need for constant monitoring and/or maintenance of existing buildings. In this sense, the recently published performance standard (NBR 15575: 2013), aims to improve the quality of new housing. For this, takes into account the durability and useful life of structures and parts, suggesting the mathematical modeling as a tool for estimating the lifetime and performance
analysis. This paper presents a brief discussion on the subject of performance, durability and service life of buildings in order to instigate the engineer to produce buildings of quality.
Keywords: performance, NBR 15575, useful life, durability, quality of construction.
1. INTRODUÇÃO
A degradação prematura das edificações ou suas partes, e a consequente redução de
desempenho, é um problema frequente em todo o mundo. Esta deterioração ocorre devido,
sobretudo, ao envelhecimento precoce das mesmas, o qual geralmente é desencadeado
pela baixa qualidade dos materiais de construção empregados, por problemas de projeto e
execução e falta de manutenção.
Essa degradação antecipada das edificações tem influência direta dos custos de
manutenção e reparo das mesmas. No que se refere a sistemas estruturais em concreto
armado e protendido, destaca-se que as atividades relacionadas à manutenção, reparo e
restauração das estruturas e suas partes correspondem a 35% do total do volume de trabalho
do setor da construção civil, e esse número vem aumentando nos últimos anos (GARCIA-
ALONSO et. al., 2007). Mehta e Monteiro (2008) citam que em países industrialmente
desenvolvidos estima-se que 40% do total de recursos da indústria de construção são
destinados a intervenções de estruturas já existentes e menos de 60% em novas instalações.
Segundo os autores o crescimento dos custos envolvendo a reposição de estruturas e a
crescente ênfase no custo do ciclo de vida, mais do que no custo inicial, está forçando os
engenheiros a darem mais atenção às questões de durabilidade. Dados coletados pela
NACE International (2002) mostram que nos Estados Unidos o custo anual relacionado ao
processo corrosivo de infraestruturas civis (pontes, aeroportos, portos, entre outros) é estimado
em US$ 22,6 bilhões. Em estudo realizado no Brasil, Meira e Padaratz (2002) observaram que
os investimentos em intervenções de manutenção, em uma estrutura com alto grau de
deterioração, podem chegar a aproximadamente 40% dos custos de execução do componente
degradado.
Mas, como projetar edificações duráveis, com no mínimo 50 anos de vida útil? Se o
que se vê atualmente nos noticiários é um grande número de desabamentos e colapso de
estruturas ou de suas partes1,2,3,4, onde se verifica que a vida útil das construções está
atingindo valores muito menores do que os previstos em normas (que para a maioria das
estruturas é de 50 anos).
Sinistros ocorridos no Brasil, como o desabamento dos edifícios Palace II5 e Areia
Branca6 e o acidente no estádio de futebol Fonte Nova7, assim como os citados nas notas
1 Desabamento de edifico em reforma, ocorrido em 27 de agosto de 2013, em São Mateus,São Paulo,
SP. Dez mortos e 26 feridos. 2 Desabamento de laje, ocorrido em 11 de fevereiro de 2013, em São João da Barra, RJ. Dez feridos
e duas vítimas fatais. 3 Desabamento de marquise, ocorrido em 14 de fevereiro de 2013, em Belo Horizonte, MG. Uma
vítima fatal. 4 Desabamento de três edifícios, ocorrido em 25 de janeiro de 2012, centro do Rio de Janeiro. Cinco
pessoas morreram. 5 Desabamento, ocorrido em 21 de fevereiro de 1998 no Rio de Janeiro, RJ, vitimando oito pessoas.
de 1 a 4, causaram prejuízos econômicos, sociais e perdas humanas irreparáveis. Essas
ocorrências têm chamado à atenção da comunidade da construção brasileira para a
necessidade do projeto para a durabilidade, do maior controle do projeto e execução de
novas edificações e, sobretudo, da necessidade do constante monitoramento e/ou
manutenção das obras já existentes. Fatores como programação de manutenção, estimativa
de custos ao longo da vida útil e necessidade de se construir edificações mais duráveis
(com maior vida útil) devem ter maior importância nos projetos e gerenciamento de
empreendimentos, considerando também o custo do ciclo de vida (CCV). Em suma, é
necessário melhorar a qualidade das edificações produzidas.
Neste sentido, na última década a comunidade da Engenharia Nacional tem
promovido alguns debates técnicos como “Lições de Areia Branca: acidentes,
responsabilidades e segurança das obras8”, promovido pelo IBRACON (Instituto Brasileiro
do Concreto), ABECE (Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural) e
IBAPE/SP (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo). Em
março de 2007, a ABMS (Associação Brasileira de Mecânica de Solos), o IBRACON e a
ABECE deram início a outro debate, intitulado “O Momento Atual da Engenharia Brasileira9”.
Esse debate culminou na realização de vários eventos sucessivos (nas cidades de: Rio de
Janeiro, RJ; Porto Alegre, RS; Recife, PE e Brasília, DF), visando à discussão e reflexão do
momento histórico da Engenharia Civil brasileira.
Na esfera Internacional, organizações como o ACI (American Concrete Institute), a
fib (Fédération Internationale Du Béton), a RILEM (Reunion Internationale de Laboratoires
D’essais et Materiaux), a ISO (International Standards Organization), entre outras, há anos
têm trabalhado para melhorias deste setor, inserindo novos conceitos na Indústria da
Construção em prol da durabilidade e aumento da vida útil das construções. Vários
documentos publicados por estas instituições têm introduzido, ao longo dos anos, soluções
relevantes tanto do ponto de vista de durabilidade quanto do ponto de vista econômico. Um
destaque especial é conferido ao fib 53 (2010) “Design of durable concrete structures” o qual
tem o intuito de identificar modelos consensuais relacionados à durabilidade e preparar uma
estrutura física voltada à normalização do projeto baseada na aproximação de desempenho.
No Brasil, a Norma de Desempenho (NR 15575), lançada em 2013, constitui-se no
principal documento normativo voltado ao desempenho de edificações habitacionais.
Objetiva estabelecer uma sistemática de avaliação de tecnologias e sistemas construtivos
6 Desabamento, ocorrido em 14 de outubro de 2004, Recife, PE, vitimando quatro pessoas.
7 Ruptura parcial do anel superior da arquibancada, ocorrida em 25 de novembro de 2007, Estádio
Fonte Nova, Salvador, BA, vitimando sete pessoas. 8 Este debate culminou na elaboração de manifesto público cuja segurança das obras civis no Brasil é
abordada e está disponível em http://www.ibracon.org.br/Metro/Manifestopublico.pdf. 9 Informações sobre os temas discutidos e o andamento dos debates estão disponíveis no endereço
Requisitos de desempenho são condições que expressam qualitativamente os atributos que a edificação e suas partes devem possuir, a fim de que possam satisfazer às exigências do usuário (NBR 15575-1:2013).
O conceito de durabilidade associa-se diretamente à vida útil. Refere-se às
características dos materiais e/ou componentes, às condições de exposição e às condições
de utilização impostas durante a vida útil da edificação. Destaca-se que a durabilidade não é
uma propriedade intrínseca dos materiais, mas sim uma função relacionada com o
desempenho dos mesmos sob determinadas condições ambientais. O envelhecimento
destes resulta das alterações das propriedades mecânicas, físicas e químicas, tanto na
superfície como no seu interior, em grande parte devida à agressividade do meio ambiente.
Para Mehta e Monteiro (2008) “uma vida útil longa é considerada sinônimo de durabilidade”.
A durabilidade é essencialmente uma visão retrospectiva do desempenho de uma
estrutura. A expectativa de que uma estrutura pode ser durável ou não só pode ser avaliada
por meio da utilização de modelos que representem os processos de deterioração a que
está suscetível, de forma que, para garantias do projeto, requer-se a utilização de
metodologias de previsão de vida útil (fib 53, 2010).
5. VIDA ÚTIL (VU)
De maneira geral, vida útil consiste em mensurar a expectativa de duração de uma estrutura
ou suas partes, dentro de limites de projeto admissíveis, durante seu ciclo de vida12, sendo
definida pela ISO 13823 (2008) “como o período efetivo de tempo durante o qual uma
estrutura ou qualquer de seus componentes satisfazem os requisitos de desempenho do
projeto, sem ações imprevistas de manutenção ou reparo”. De forma mais simples a NBR
15575 (2013) define vida útil como “uma medida temporal da durabilidade de um edifício ou
de suas partes”.
Enfim, a vida útil é o período de tempo compreendido entre o início de operação e
uso de uma edificação até o momento em que o seu desempenho deixa de atender às
exigências do usuário, sendo diretamente influenciada pelas atividades de manutenção e
reparo e pelo ambiente de exposição.
Na figura 3 pode-se verificar a influência das ações de manutenção em uma
edificação, as quais são necessárias para garantir ou prolongar a vida útil de projeto (VUP).
A Norma de desempenho chama atenção para o fato de que “é necessário salientar a
importância da realização integral das ações de manutenção pelo usuário”, destacando que
se este não realizar a manutenção indicada corre-se o risco de a VUP não ser atingida.
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Corresponde a todos os estágios da vida do produto, no caso o produto é a edificação. Pode abranger desde a concepção passando pela construção, operação, manutenção e reparo até a demolição e destinação dos resíduos.
Nív
eld
ed
esem
pen
ho
[Ba
i xo
•A
lto
]
Nível mínimo de
desempenho
Vida útil SEM manutenção Tempo
Tinicial T1
Vida útil COM manutenção
T2
Ações de manutenção
Incremento de desempenho
Figura 3: desempenho com e sem manutenção
Com isso, destaca-se a importância do manual do usuário no qual devem estar
descritas as atividades e a frequência das ações de manutenção necessárias para a
garantia da VUP da edificação, similar ao já difundido na indústria automobilística, onde ao
se comprar um veículo o proprietário recebe um manual que indica o tempo ou a
quilometragem necessária para cada ação de manutenção. Caso o usuário descumpra
esses limites ele perde a garantia do produto, pois a indústria automobilística entende que
sem as manutenções indicadas não é possível garantir a “vida útil” do automóvel.
Normalmente, a Vida útil é expressa em anos, sendo estabelecida pela maioria das
Normas e Códigos do concreto (ver Tabela 2) uma vida útil de projeto (VUP) mínima de 50
anos para a maioria das estruturas e 100 anos para estruturas civis, como obras de
infraestrutura, pontes, viadutos, barragens entre outras.
Tipo de estrutura
Vida útil de projeto (VUP) mínima
BS 7543
(1992)
ISO 2394 (1998)
Fib 34 (2006) e EN 206-1
(2007)
NBR 15575 (2013)*
Fib 53 (2010)
Temporárias 10 anos
1 a 5 anos
10 anos - -
Partes estruturais substituíveis (Ex.: apoios)
10 anos
25 anos 10 a 25 anos 23 a 20
anos
25 a 30
anos
Estruturas para agricultura e semelhantes
- - 15 a 30 anos - -
Estruturas offshore - - - -
≥ 35 anos
Edifícios industriais e reformas
30 anos
- - - -
Edifícios e outras estruturas comuns
- ≥ 50 anos ≥ 50 anos 50 anos ≥ 50 anos
Edifícios novos e reformas de edifícios públicos
60 anos
- - - -
Edifícios monumentais, pontes e outras estruturas de engenharia civil
120 anos
100 anos
100 anos - ≥ 100 anos
Edifícios monumentais - - - -
≥ 200 anos
Tabela 2: vida útil de projeto (VUP) mínima para várias normas
A recém-lançada Norma de Desempenho brasileira (NBR 15575:2013) indica a VUP
em três níveis: um Mínimo (M); um Intermediário (I); e, um superior (S), sendo o primeiro
obrigatório (Ver representação esquemática na figura 4). Na tabela 3 apresentam-se os
valores de vida útil de projeto (VUP), em anos, especificada pela norma brasileira de
desempenho para cada sistema da edificação para os níveis mínimo (M) e superior (S).
Nível original de desempenho
Nível Superior (S)
Nív
eld
ed
ese
mp
enh
o
est
rutu
ral
[Ba
i xo
•A
lto
]
Nível mínimo de
desempenho
Nível Intermediário (I)
Nível mínimo (M)
Vida útil real
Tempo
Figura 4: nível de desempenho x níveis de vida útil
Sistema VUP (em anos)
Mínima (M) Superior (S)
Estrutura ≥ 50** ≥ 75
Pisos Internos ≥ 13 ≥ 20
Nív
el d
e d
esem
pen
ho
Vedação vertical externa ≥ 40 ≥ 60
Vedação vertical interna ≥ 20 ≥ 30
Cobertura ≥ 20 ≥ 30
Hidrossanitário ≥ 20 ≥ 30
Tabela 3 – vida útil de projeto (VUP) (em anos) especificada na NBR 15575:2013*
* Considerando periodicidade e processos de manutenção segundo a ABNT NBR 5674 e especificados no respectivo Manual de Uso, Operação e Manutenção (Manual do usuário) entregue
ao usuário elaborado em atendimento à norma ABNT NBR 14037.
** Segundo a NBR 8681-2004.
Nota-se que os diferentes tipos de estruturas (tabela 2) ou de sistemas estruturais
(tabela 3) têm vida útil distinta – em geral, as partes substituíveis de uma estrutura, como
apoios, possuem vida útil inferior à estrutura – o que deve ser considerado no projeto e nas
ações de manutenção e reparo da estrutura e, consequentemente, na estimativa de vida útil,
que deve ser conduzida considerando a estrutura e suas partes separadamente, pois os
materiais degradam-se a diferentes taxas.
Neste sentido, a abordagem de desempenho visa à especificação para a
durabilidade (qualidade), ou seja, o profissional e o construtor em conjunto com o
proprietário devem ainda na fase de projeto considerar a vida útil mínima dos elementos ou
sistemas que compõe uma edificação, garantindo que desempenhem suas funções durante
a vida útil mínima especificada.
A vida útil real ou efetiva de uma estrutura pode não ser necessariamente igual à
vida útil de projeto (VUP) originalmente especificada, face às incertezas inerentes ao
processo de degradação da estrutura (como ação dos mecanismos de degradação, cargas,
etc.). Para se ter certeza de alcançar a VUP é necessário considerar uma margem de tempo
ou um nível de desempenho adequado, considerando, para isso, não apenas aspectos do
ponto de vista de engenharia, mas também do ponto de vista econômico e não técnico.
A NBR 15575 (2013) destaca que para se atingir a VUP mínima é necessário atender,
simultaneamente, os cinco aspectos abaixo descritos:
a) emprego de componentes e materiais de qualidade compatível com a VUP;
b) execução com técnicas e métodos que possibilitem a obtenção da VUP;
c) cumprimento em sua totalidade dos programas de manutenção corretiva e
preventiva;
d) atendimento aos cuidados preestabelecidos para se fazer um uso correto do edifício;
e) utilização do edifício em concordância ao que foi previsto em projeto.
Segundo a norma, dentre os aspectos supraditos, os itens “a” e “b” são essenciais para
que o edifício construído tenha potencial de atender integralmente a VUP, sendo que a
implementação destes depende do projetista, incorporador e construtor. Já os itens “c”, “d” e
“e” são essenciais para que se atinja efetivamente a VUP e dependem dos usuários. No
entanto, para que esses itens possam ser cumpridos, é fundamental que estejam
informados no manual de uso, operação e manutenção do edifício, a ser entregue pelo
empreendedor aos usuários.
Na tabela 4 apresenta-se um quadro resumo das incumbências ou responsabilidades de
cada interveniente (responsável) da edificação, mostrando que para se alcançar o
desempenho requerido é necessário que todos os envolvidos na cadeia da construção civil,
do fornecedor de materiais aos usuários da edificação, desenvolvam corretamente seu
papel.
Intervenientes Incumbências (responsabilidades)
Fornecedor de insumo, material, componente e/ou sistemas
˗ Caracterizar o desempenho de acordo com a NBR 15575 (2013) e fornecer produtos que atendam pelo menos a VUP mínima obrigatória.
˗ Informar em documentação técnica específica as recomendações para manutenção corretiva e preventiva necessárias para que a VUP seja atingida.
Projetistas
˗ Estabelecer a Vida útil de projeto de cada sistema da NBR 15575 (2013).
˗ Especificar materiais, produtos e processos que atendem o desempenho mínimo estabelecido na NBR 15575 (2013), com base em normas prescritivas vigentes e com base no desempenho declarado pelo fabricante dos produtos a serem empregados no projeto.
Construtor e incorporador
˗ é da incumbência do incorporador, de seus prepostos e/ou dos projetistas envolvidos, dentro de suas respectivas competências, e não da empresa construtora, a identificação dos riscos previsíveis na época do projeto, devendo o incorporador, neste caso, providenciar os estudos técnicos requeridos e alimentar os diferentes projetistas com as informações necessárias.
˗ elaborar o manual de operação uso e manutenção, ou documento similar, atendendo à NBR 14037 (2011) e NBR 5674 (2012), o qual deve ser entregue ao proprietário da edificação ou unidade habitacional.
Usuário ˗ Realizar as ações de manutenção de acordo com o estabelecido
na NBR 5674 (2012) e o manual de uso, operação e manutenção e recomendações técnicas das inspeções prediais.
Tabela 4 – intervenientes e incumbências descritas na NBR 15575:2013 (item 5)
Com a vigência da norma de desempenho (NBR 15575, 2013), os
proprietários/usuários de imóveis terão uma ferramenta legal para exigir, dos construtores,
que os sistemas que compõem os edifícios, desde instalações hidrossanitárias e pisos a
estruturas, fachadas e coberturas, atendam obrigatoriamente a requisitos mínimos de
desempenho ao longo de uma determinada vida útil (ver tabela 3).
Todavia, o próprio texto da norma de desempenho enfatiza a dificuldade de se
projetar para a vida útil, dada a complexidade dos vários processos de degradação que
afetam, em conjunto ou isoladamente, as edificações. Ainda a norma destaca que para se
atingir a VUP é necessário que o proprietário realize a manutenção prevista no manual de
manutenção, uso e operação da edificação.
Do ponto de vista técnico, é fundamental que a vida útil (VU) seja considerada no
nível do projeto, uma vez que 50% do desempenho dos edifícios dependem do projeto
(BORGES, 2009). Mas como inserir as questões de vida útil na fase de projeto da
edificação? Pois, apesar da vida útil quando definida no nível do projeto tender a diminuir o
custo global, o construtor, para reduzir o custo inicial, tende a construir pelo menor custo de
construção, optando por alternativas que não favorecem a durabilidade e consequentemente
a vida útil da edificação.
Uma alternativa importante para considerar a vida útil no projeto é a análise do Custo
do Ciclo de Vida (CCV) da edificação, onde os fatores intervenientes no projeto, execução e
manutenção são considerados ao longo do tempo incluindo os custos associados,
auxiliando na identificação de alternativas de projeto que possam conduzir a menores custos
de operação, manutenção, reparo e reabilitação, durante a vida útil da construção. Com isso
tem-se uma curva de desempenho e uma de custos ao longo do tempo, conforme
apresentado na figura 5.
Essa análise pode ser usada para justificar altos investimentos iniciais de um projeto,
em razão dos benefícios econômicos advindos ao longo do tempo. Suas vantagens são
mais bem percebidas quando se podem comparar diferentes alternativas de projeto, sendo
que os maiores benefícios desta análise, são alcançados em projetos de novas edificações.
Todavia, não há impedimentos para seu emprego em edificações já existentes.
CCV
Baixo
Custos
1
Confiabilidade Alto
Alt
o
Custo de
aquisiçãoCusto de
manutenção e reparo
Desempenho
Figura 5: relação entre custos de aquisição e custos de manutenção e reparo sobre o ponto do custo do ciclo de vida (CCV)
Ressalta-se que a análise do CCV exige visão sistêmica e multidisciplinar, pois além do
conhecimento em engenharia são necessários conhecimentos básicos em ciência dos
materiais, processos estocásticos e engenharia econômica.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto, a execução, a seleção dos materiais, a caracterização do ambiente de
exposição e as estratégias de manutenção e reparo são de suma importância para a
garantia de durabilidade (qualidade) de uma estrutura ou componente, e
consequentemente, sua vida útil. Qualquer negligência em relação a estes aspectos
torna o desempenho das mesmas insatisfatório quanto à durabilidade, afetando
diretamente a vida útil requerida.
A vida útil de uma estrutura pode ser limitada por aspectos técnicos, funcionais ou
econômicos. Os aspectos técnicos são todos aqueles não relacionados com o uso
da estrutura (requisitos para a integridade estrutural da edificação, capacidade
resistente dos componentes e materiais). Os funcionais referem-se à capacidade de
uma estrutura cumprir com o conjunto principal de funções para a qual foi projetada
(resistir às ações que é solicitada). Já os econômicos são relativos aos custos de
manutenção necessários para que a estrutura siga em uso.
Apesar da avaliação do desempenho econômico ser uma demanda crescente e
necessária, o critério de custo não foi incorporado à normativa de desempenho
brasileira. Em contrapartida, o critério de adequação ambiental foi contemplado,
englobando o projeto e implantação de empreendimentos, a seleção e consumo de
materiais, o consumo de água e deposição de esgotos no uso e ocupação da
habitação e o consumo de energia no uso e ocupação da habitação.
É necessário que os engenheiros saibam conduzir a análise de custo beneficio
(análise do Custo do Ciclo de Vida) a fim de apresentar ao cliente/proprietário
alternativas de projeto, levando em conta o conjunto de fatores que afetam o custo e
a qualidade da edificação a fim de se obter a curva e desempenho e de custos ao
longo da vida útil da edificação.
A qualidade das obras do país precisa com urgência ser melhorada. Inúmeras obras
recém-construídas tem apresentado degradação acentuada, as quais podem não
atingir a VUP, sobretudo sem intervenções de manutenção. Também os proprietários
precisam “entender” a importância e a necessidade das ações de manutenção para a
garantia da vida útil, ou seja, é necessário “criar a cultura da manutenção” das
edificações.
É necessário mudar paradigmas tanto dos construtores quanto dos proprietários a
fim de deixar de se construir pelo menor custo inicial em prol do melhor custo
benefício.
A abordagem de desempenho dada pela “Norma de desempenho” precisa ser
implementada nos novos projetos de engenharia a fim de melhorar a qualidade das
obras do país.
REFERÊNCIAS
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