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DesafiosdasPolíticasMacroeconómicas,MicroeconómicaseEmpresariais
EduardoCatroga
Apandemiaglobal,comoencerramentocompulsivodaactividadeeconómicanas
principaiseconomiasmundiais,provocouumarecessãoeconómicaatravésdeum
“choquedeoferta”quesetransformounum“choquedeprocura”. Asmedidasde
emergênciadosgovernosedosbancoscentraisforamexigidaspelamitigaçãodos
efeitos da paralisação das economias sobre os rendimentos, o emprego e a
deterioraçãoda liquidezdas famílias e empresas. Temos consciência de que tais
acçõestêmefeitoscolateraisrelevantessobreasaúdeeconómicaefinanceiradas
economias, o que motivou uma reflexão sucinta sobre os desafios da política
monetária, política orçamental, políticas estruturais e políticas de gestão
empresarial, na construção de um plano global coerente para uma sustentada
recuperaçãoeconómicaesocial,commedidasacurto,médioelongoprazo.
Nocampodapolíticamonetária,apandemiaimplicouumaumentodaincerteza
comqueosprincipaisbancoscentraisjásedefrontavam.Anormalizaçãodapolítica
monetária expansionista, associada à crise global de 2008, tinha sido, ainda em
2019, interrompida e revertida nos EUA, por força das guerras tarifárias
desencadeadas pela Administração Americana. Por seu turno, o Banco Central
Europeu(BCE)nãorealizaummovimentodeaumentodetaxasdejurodereferência
desde2011,queestãoàvoltadezeroháváriosanos,sendoumadassuastaxasde
referênciamesmonegativadesde2014.
As taxas básicas de juro, tanto nos EUA como na Zona Euro, estão a valores
historicamente baixos (Gráfico 1). Tal é, também, o resultado de mudanças
estruturais na economiamundial, conclusão que é reforçada pela estimativa, ao
redorde0,5%aoano,dachamada taxade juroneutradasprincipaiseconomias
(Gráfico2).
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Gráfico1:Taxabásicadejuros
(Em%aoano)
Fonte:ResearchdoBradesco
Gráfico2:Taxaneutradejurosnasprincipaiseconomias
(Em%aoano)
Fonte:ResearchdoBradesco
Adesignadataxadejuroestruturaléfunçãodaprocura(investimentos)edaoferta(poupança)doscapitaissusceptíveisdeaplicação.Osseusfactoresdeterminantesevoluemlentamente,emhorizontetemporallongo,comoocrescimentopotencialdas economias muito determinado pela capacidade produtiva, produtividade edemografia.
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Em2020-2021, os principais bancos centrais estarão, na prática, amonetizar os
déficespúblicos.Estima-se,naOCDE,umaexpansãodosrespectivosbalanços(base
monetária)daordemdos70%.NaZonaEuro,oBCEcomeçouachamadapolíticade
compra de dívida (“Quantative Easing” – QE) em larga escala a partir de 2015,
contribuindodecisivamentepara a solvabilidade financeiradospaíses altamente
endividados (como Portugal, Itália ou Grécia) e para a baixa da taxa de risco
associada.Ototaldosseusactivosem%doPIBultrapassourapidamenteodoFED
ouodoBancodeInglaterra,atingindo40%doPIBnofinalde2019(Gráfico3).
Gráfico3:Activosdosbancoscentraisem%doPIB
Fonte:FinancialTimes
Entende-se que a política monetária expansionista do BCE dos últimos anos foi
essencialparaadefesadoeuroeparaanão-excessivafragmentaçãodosmercados
financeiros. Mas é claro que se acentuará a discussão sobre se uma política
monetáriaultraexpansionistaécompatívelcomomandatodoBCEecomaproibição
de financiamento monetário. Na prática, a política monetária do BCE está a
monetizarosdéficespúblicoseaimpactarnabaixadataxadejuro(Gráficos4,5e
6).
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Gráfico4:ZonaEuro:Déficespúblicos(%PIB)
Fonte:ResearchNatixis
Gráfico5:ZonaEuro:Basemonetária(milmilhõesdeeuros)
Fonte:ResearchNatixis
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Gráfico6:ZonaEuro:Taxasdejurodasobrigaçõesa10anos(%)
Fonte:ResearchNatixis
Nãonosparece,nestafasedeemergência,queoBCEcorrariscosjurídicos(apesar
dasreservasdealgunsEstados-membros),dadoqueataxadeinflaçãonaZonaEuro
semantémàvoltadezero,abaixodovalordereferênciaprosseguido(aoredorde
2%).OBCEpoderáaindautilizaroutrosargumentoscomo,porexemplo,odeque
as políticas não-convencionais são essenciais para assegurar uma adequada
transmissão dos efeitos de política monetária à Zona Euro, nomeadamente aos
paísesperiféricos.
Noentanto,nãohádúvidadeque,seapolíticamonetáriaexpansionistadoBCEse
prolongarpordemasiadotempo,eàmedidaquefordeixadoparatrásoperíodode
emergência da pandemia global, surgirá uma reação crescente dos críticos,
apontandoosseusefeitoscolateraisnegativospotenciais,quesãoconhecidos:(i)
ausência de estímulo para reformas estruturais dos governos, uma vez que os
défices públicos são facilmente financiáveis no curto prazo, mas impactando
negativamente a taxa de crescimento potencial e a qualidade de alocação de
recursos;(ii)incentivoàtomadaderiscosespeculativosdealavancagemfinanceira,
provocando, a prazo, “bolhas” no preço dos activos (ex.: acções, imobiliário) e
exacerbandoadesigualdadenadistribuiçãodariqueza;(iii)aumentodapoupança
(pressionandoparabaixoataxadejuro),aoinvésdoconsumo,emvirtudedomenor
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valor esperado para os rendimentos futuros dos patrimónios acumulados; (iv)
acréscimo da volatilidade dosmercados emergentes, em particular nas taxas de
câmbio; (v) aprazo, perdade confiançanamoeda, se a “criação” for excessiva e
sobretudosenãoforsimétricaentreosprincipaisespaçoseconómicos;(vi)mesmo
sendosimétrica,riscodefuga,nãoparaoutrasmoedas,masparaoutrosactivosde
refúgioouespeculativos,comooouro,ascriptomoedas,etc.
Poroutro lado,nãopodemosesquecerqueoeuro foi criadoporumcontratode
confiança entre os países aderentes ao projecto da moeda única (Zona Euro),
pressupondoregrasdedisciplinafinanceira.Sãoconhecidasasfragilidadesdasua
arquitectura,queentãofoiapossível,semalgunsdosrequisitosdaschamadaszonas
monetáriasóptimas,lacunasquesósepoderiamcolmatarplenamentenumquadro
de união política e orçamental, com um Tesouro comum, ao lado de um Banco
Central comum. Estamos longe desse modelo, por falta de consenso político
europeu.Háque reconhecer,noentanto,queaarquitectura inicial imperfeitado
euro tem vindo a ser aperfeiçoada em cada crise. São exemplos: a criação do
Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE); a aceitação recente do princípio de
emissão da dívida conjunta por parte da UE, para responder a efeitos da crise
pandémica (que atingiu simetricamente todos os Estados-membros); reforço do
papeldoBCEnasupervisãodosistemabancário;a flexibilização,desde2015,da
políticamonetáriadoBCE,osesforçosdecoordenaçãodaspolíticaseconómicase
financeirasdosEstados-membros.Estasmedidascruciaisparaadefesadoeuroedo
processodeintegraçãoeuropeia.Masosprogressosnosmecanismosexistentesnão
sãoaindasuficientesparaanulartodososriscosqueincidemsobreofuturodoeuro,
nomeadamente o risco da dívida excessiva de Itália, pelo peso relativo da sua
economia(aterceiradaZonaEuro).
No futuro, apolíticamonetáriadoBCEserá condicionadapela Itália,poisnão se
vislumbraumasoluçãofácil:(i)arestruturaçãodadívidaitalianaimplicariacomo
nívelderiquezadas famíliasdetentorasdamaior fatiadessadívida; (ii)aviado
aumentodaprodutividadetemesbarradocombloqueiospolíticosinultrapassáveis
nos últimos 20 anos; (iii) a continuação prolongada de políticas orçamentais
restritivas é inaceitável politicamente e gera o fortalecimento dos movimentos
populistasantieuropeus.Aúnicasoluçãoseriaumapoioespecíficoparaaexecução
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deumconjuntodereformasestruturaisindutorasdemelhoriadoPIBpotenciala
prazo,oqueexigiriaumconsensopolíticointernoeexternodedifícilobtenção,no
quadrodeumconjuntodereformasparaospaísesdaZonaEuromaisafectados
pelascrisesbancárias,commaioresníveisdeendividamentoecomnecessidades
acrescidasderenovaçãodasuaestruturaprodutiva.Onovoplanoderecuperação
europeia, proposto pela ComissãoEuropeia (CE), comuma componente forte de
subvenções,poderáconstituirumprimeiropassoparaumamudançaestruturalna
Itália,seassociadaaprogramaseuropeus,porexemplo:financiamentoconjuntode
investimento empresarial; modernização das empresas; desenvolvimento de
projectosnosdomíniosdaeducação,saúde,transiçãoenergética,inovação,etc.,que
seriam impulsionadores de reformas estruturais de que a Itália carece para
melhoraraprodutividade,ocrescimentoeoemprego.Então,gradualmente,poderia
irdiminuindooseuníveldeendividamento.
A Itália, tal como os países altamente endividados, precisa da actual política
expansionistadoBCEparaevitarpressãosobreastaxasdejuroeoalargamentodos
“spreads”entreospaísesperiféricoseospaíses“core”daZonaEuro(Gráficos7,8e
9).
Gráfico7:TaxasdejurodasObrigaçõesdoTesouroa10anos(em%)
Fonte:ResearchdoNatixis
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Gráfico8:BCE:EvoluçãodaCarteiradeObrigaçõesdoTesouro
(emmilmilhõesdeeuros)
Fonte:ResearchdoNatixis
Gráfico9:“Spreads”faceàAlemanha(em%)
Fonte:ResearchdoNatixis
Atéàcrisede2020,obalançodoFEDeraligeiramentemaispequenoqueodoBCE,
cercade4triliõesdedólaresfacea4,5triliõesdoBCE,tendoesteúltimomaisdo
que duplicado desde 2013. Portanto, o BCE já tinha, antes de 2020, um balanço
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maiordoqueoFED,sendoaeconomiadaZonaEuromaispequenaqueadosEUA
(14triliõesfacea20triliõesdedólares).
Em 2020, o total dos activos do FED está a disparar com os novos estímulos
monetáriosde3triliões(cercade15%doPIB)edeveultrapassaroBCE.
Gráfico10:FEDAssets(embiliõesdedólares)
FedAssets($bn)
Fonte:FED
Porseuturno,oJapãoéumcasodeestudoparadigmático,emqueobalançodoseu
bancocentralrepresentava,jáem2019,àvoltados120%doPIB.
Recordemos que a economia japonesa experimentou uma crise severa em1990,
com“bolhas”nopreçodosactivos,seguidadeumacrisebancáriaem1997-1998.
Nasduasúltimasdécadas,apolíticaorçamental–procurandocompensaraquebra
do consumo das famílias e o fraco investimento empresarial – tornou-se
permanentemente expansionista, levando a défices públicos persistentes e a um
crescimento exponencial da dívida pública (subiu de 90%do PIB em1995 para
240%em2019),financiadaessencialmenteporumafortepoupançainterna.
ApolíticamonetáriadoJapãotambémsetornoucrescentementeexpansionista,ao
pontodeoobjectivoactualdobancocentralsermanterataxadejuroa10anosa
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0%, o que permite um tão elevado nível de dívida pública, levando a sua
monetizaçãoaumaexpansãodabasemonetária;esta,deumvalordaordemdos
20%doPIBnominalnosanos1990,atingiuos120%em2019.
Aeconomiajaponesatemestadoanémicanosúltimos25anos,aomesmotempoque
se verifica uma alocação de recursos pouco eficiente, uma fraca apetência ao
investimento nas empresas e uma distribuição do rendimento nacional em
detrimentodossalários,tudoconduzindoaumafracaevoluçãodaprodutividade,o
que, conjugado com o envelhecimento da população activa, tem impactado
negativamenteocrescimentopotencial.
Na minha perspectiva, o caso japonês ilustra uma situação de uma política
monetária e orçamental simultaneamente expansionistas durante demasiado
tempo, com as implicações negativas referidas. Daí alguns falarem do risco de
“japonização”daseconomiasocidentaisavançadas,oqueterádeserevitadocoma
normalizaçãodaspolíticas,ultrapassadooperíododeemergênciadaactualcrise.
Nos últimos 30 anos, nos países da OCDE, não se tem verificado a correlação
históricaentreovolumedacriaçãodemoedaeainflação.Esta,noentanto,poderá
ressurgir através do aumento de custos unitários em alguns sectores, em
consequência de quebras potenciais da produtividade e dos efeitos da
desglobalizaçãosobreoscustosemcertascadeiasdeprodução.
A chamadaModernaTeoriaMonetária (“ModernMonetaryTheory” –MMT) tem
vindoaganharapoios(ocandidatopresidencialamericanoBidentemumassessor
queéseuacérrimodefensor),preconizandoqueacriaçãodemoedadevefinanciar
os défices públicos até à obtenção de pleno emprego, minimizando os riscos
inerentes sobre os preços dos activos, a distribuição de riqueza, e ignorando a
distinçãoentredéficesconjunturaiseestruturais.
APolíticaOrçamental,porseuturno,deveseguirateoriakeynesianaquedefende,
comosesabe,medidasanticíclicas,gerandoexcedentesorçamentaisnosperíodos
deexpansãoeconómicaedéficespúblicosnas fasesbaixasdocicloeconómico.O
problemaéque,emgeral,temsido,emmuitospaíses,quasesempreexpansionista
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ouultraexpansionista, pondo em causa a sustentabilidadedas dívidas públicas e
afectandonegativamenteascontasexternas.
Nocontextoactual,o funcionamentodosestabilizadoresautomáticoseosapoios
orçamentaisexcepcionaisparadefesadaeconomiaedoempregovãogerarnova
subidadosdéficespúblicosedadívidapública.
O Estado, naminha perspectiva, é o “ressegurador do último recurso dos riscos
sistémicossobreaeconomiaeasociedade”,peloquenãopoderádeixardefinanciar
asconsequênciasfinanceirasnegativasdapresenterecessão,provocadapordecreto
dosgovernos,parasuavizarosefeitossobreasempresas,oempregoeasfamílias.É
evidente,nestasituação,afaltaquefazemcertospaíses(comoPortugal,Gréciaou
Itália) uma boa margem orçamental acumulada, o que é fruto de más políticas
orçamentaisduranteanosedeadequadaspolíticasestruturaisorientadasparaa
produtividadeeacompetitividade.Note-seque,emPortugal,adívidapúblicasubiu
deumvalorde62%doPIB,em1995,para100%doPIBem2010e118%em2019,
apesardasreceitasdasprivatizaçõesdaordemdos30pontospercentuaisdoPIB
nosúltimos25anos.
Eadívidaexternalíquida(PII)estápróximade100%doPIB(6%em1996),apesar
dossaldospositivosdascontasexternasnosúltimosseisanos.Precisamos,talcomo
outros países endividados, da solidariedade europeia para o financiamento da
recuperação.
OplanoderecuperaçãopropostopelaCE,lançadopeloeixofranco-alemão,vaino
bomsentido,prevendoumamutualizaçãoparcialdeemissõesdedívidaeuropeia
justificada pela emergência da crise pandémica que atingiu todos os Estados-
membros.
ACEemitiuumconjuntoderecomendações,porpaís,comorientaçõesemmatéria
depolíticaeconómicapararesponderaosdesafiosdecorrentesdapandemiaeao
relançamento do crescimento sustentável e inclusivo que facilite a transição
ecológicaeatransformaçãodigital.
OprogramaderecuperaçãopropostopelaCEédegrandemagnitudeepermitirá
dinamizaroinvestimentopúblicoeprivadoeestimulararecuperaçãoeconómicae
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oPIBpotencial.Dadaainterdependênciadaseconomias,orelançamentoeconómico
europeu exige um retorno sincronizado da actividade económica dos Estados-
membrosedasprincipaiseconomiasmundiais.
A UE não terá dificuldade no financiamento do programa pois a poupança
excedentária na Zona Euro está hoje a ser aplicada de forma ineficiente em
investimentosoudéficesorçamentaisno“restodomundo”comfracoretorno(como
asaplicaçõesemobrigaçõesamericanas).
Oprogramaconstituiumaacçãoestratégica-chaveparaaconsolidaçãodoprojecto
europeu,existindoaindaodesacordodealgunspaíses,queestãorelutantesquanto
àcomponentesubsídiosa fundoperdido.Anegociaçãoentreosgovernosvaiser
difícileosnovosfundosnãocomeçarãoachegaràeconomiarealantesdosegundo
semestrede2021.Porisso,nospróximosmeses,oapoiodoBCEnaZonaEuroéo
mecanismocrucialparaofinanciamentodospaísesperiféricoscomelevadosníveis
deendividamentoeparaasuavizaçãodosnovosprogramasdeajustamento(oude
austeridade, como lhe queiram chamar), pois, após o período de emergência
financeira,ter-se-áderetomarocaminhodaconsolidaçãoorçamentaledascontas
externas.
O balanço do BCE (base monetária) experimentará, em 2020-2021, um novo
acréscimosignificativo.Devenotar-se, contudo,queumaboaparceladasdívidas
soberanasnapossedoBCEtornar-se-á,naprática,dívidaperpétua.Entendoque
existembonsargumentostécnicosparaqueessaparcelanãosejacontabilizadanos
cálculosdaanálisefinanceiradasustentabilidadedadívidapública.Edeve-seter
presentequeos“lucros”dacriaçãodemoedasãodistribuídosaosEstados-membros
como dividendos que compensarão parcialmente os juros do serviço da dívida
pública.
Nocampodaspolíticasestruturaisemicroeconómicas, saliente-seque, seas
políticas monetária e orçamental são importantes no curto prazo, actuando na
procura agregada (“demand side”), as políticas estruturais serão decisivas na
evoluçãoamédioelongoprazosdaprodutividade,competitividadeeemprego,ou
seja, do crescimento potencial, actuando do lado da oferta de bens e serviços
(“supplyside”).
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Portugal(talcomooutrospaíses),temumaoportunidadeparaarealizaçãode
reformasestruturais, a começarpela reformadaqualidadedadespesapública,
exigindo, nomeadamente, a eliminação de desperdícios, a redução drástica da
burocraciadoaparelhodasAdministraçõesPúblicas,aoptimizaçãodosprocessos
administrativos e uma transformação digital activa. No âmbito da reforma do
Estado, impõe-secorrigirosvíciosestruturaisacumulados:aumentocontínuode
despesa pública primária em termos reais; preferência pela despesa corrente
primáriaemdetrimentodasdespesasdeinvestimento;subidaconstantedacarga
fiscalparaumnívelasfixiantedocrescimentoeconómico;máselecçãonasescolhas
dedespesapública,sematenderàeficiênciaeaoseuimpactonataxapotencialde
crescimento.
Neste período de emergência, importa fazer a distinção entre despesa pública
recorrente e despesa pública extraordinária. Esta subirá temporariamente em
consequência dos apoios excepcionais e do impacto dos estabilizadores
automáticos.Apressãopara aumentosdedespesapúblicanospróximos tempos
seráenormeporpartedosgruposcorporativoseporpartedospopulistas.Agestão
doEstadoemperíododeemergênciadeveráser,maisdoquenuncaeficiente,no
controlodasdespesasfixasquesãorecorrentesenaescolhadasprioridades.
Quantoàfunçãopública,nospróximosanos,entendoqueseriaumaboamedidaa
introduçãodeprémiosdeprodutividade(custovariável)nascarreirasprofissionais,
emvezdesubidasautomáticasdesalários(custosfixos),claroquesemprejuízoda
análise da justiça relativa da grelha de remunerações. Defendo esta medida em
articulaçãocomumprogramadeoptimizaçãodemacroemicroestruturas,demeios
humanosedosprocessosadministrativosatravésdeumautilizaçãointensivadas
novas tecnologias de informação. A transformação digital constitui uma
oportunidade única de desconcentração administrativa, com decisões mais
próximasdoscidadãosedasempresas.
Nãopodemosvoltaracometererrosdopassado.Recorde-seque,emPortugal,no
períodode1995-2010,adespesatotalprimáriasubiude37,5%doPIBpara49%do
PIB,eadespesacorrenteprimáriade31,9%doPIBpara41,8%.Naprimeiradécada
doséculo,adespesatotalprimáriaaumentoude39,7%doPIBpara49%doPIB.E,
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apesardoaumentosubstancialdadespesapública,aeconomiapoucoEcresceu,o
PIB “per capita” não convergiu desde 1995 em paridades de poder de compra,
enquantoaceleravama carga fiscal sobreas famílias e as empresas, osníveisde
endividamento internoe externo, e afrouxavao ritmodo investimentopúblico e
privado.
Em2020,énaturalqueadespesapúblicaprimáriadêumsaltoconjunturaldealguns
pontospercentuaissignificativos.Oqueéessencialéqueesteacréscimoconjuntural
nãosetransformeemdespesaestrutural,devendoaconsolidaçãoorçamentalser
retomadaàmedidadarecuperaçãodaeconomiaedocicloeconómico.
AsreformasdoEstado, inseridasnoquedesignopor“pilarpolítico-institucional”
(umdostrêspilaresestratégicosdeterminantesdodesenvolvimentoeconómicoe
social,apardo“pilareconómico-financeiro”edo“pilarsocial”),deveriamincidir
prioritariamenteemacçõesestruturaiscruciaisparaamelhoriadaqualidadedas
instituiçõesedaspolíticaspúblicas.Nomeadamente,semserexaustivo:(i)reforma
dosistemaeleitoralparamelhoriadaqualidadedademocracia;(ii)funcionamento
dosistemadejustiça,dostribunaiscivisefiscaisedaqualidadedademocracia;(iii)
desenvolvimentodosistemaeducativoetécnico,sobretudonavertentedasescolas
profissionaisedaformaçãodigital;(iv)melhoriadosistemadeconcorrênciaede
regulação dos mercados (corrigindo “falhas de mercado”, mas sem cair nas
chamadas“falhasdeEstado”);(v)melhoriasnofuncionamentoflexíveleequilibrado
dos mercados em geral, como o mercado de arrendamento ou o mercado de
trabalho;(vi)melhoriadosistemadeciênciaetecnologiaorientadoparaomercado,
desenvolvimentode“startups”inovadorasedoscentrostecnológicosviradospara
asempresas.
Tudoistosóserápossívelcomumavontadereformadoraconsistenteecoerente,no
quadrodasopçõesdeumaeconomiademercado,inseridanaUEenaZonaEuro,e
que queira ser vencedora, apontando como objectivo permanente amelhoria de
produtividadeecompetitividade,aviaparaamelhoriasustentadadosíndicesde
bem-estareconómicoesocial.
PortugalpoderábeneficiardomaiorpacotefinanceirojamaispreparadopelaUnião
Europeia.SesomarmosassubvençõesdoQuadroFinanceiroPlurianualde2021a
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2030(€29a€30milmilhões)àsdoFundodeRecuperaçãopropostopelaCE(€15,5
milmilhõesnototal),Portugalpoderáirbuscarmaisde€45milmilhõesafundo
perdido,aquesejuntaaindaumtotalde€10,8milmilhõesemempréstimos.Para
alémdo reforço do papel doBanco Europeu de Investimentos (e do seu veículo
Fundo Europeu de Investimentos no domínio do apoio do capital de risco) em
projectoselegíveisnosváriossectoresdaeconomia.
DesdequePortugaladeriu,em1986,àentãoComunidadeEconómicaEuropeia,o
Paísrecebeuafundoperdidoaté2018(transferênciasdirectas)umaestimativade
130milmilhõesdeeuros(apreçosde2011).Agora,poderáreceber,emseteanos,
um montante relativamente muito mais elevado. Estamos conscientes das
dificuldadesdaaprovaçãonoseiodaUEdapropostadaCEnasuaversãoactual.É
natural que os montantes preliminares venham a ser revistos, mas não temos
dúvidasdequeasolidariedadeeuropeiaseráreforçadaePortugal(talcomooutros
países,comoaItáliaouaGrécia)teráumanovaoportunidadeparaarealizaçãode
reformaseparaadinamizaçãodoinvestimentopúblicoeprivado.
OPaísprecisadeaumentarovolumeeaqualidadedeinvestimento.Note-se
queaformaçãobrutadecapitalfixo(FBCF)nototaldaeconomiaatingiu,noperíodo
de1991-2000,umamédiaanualde25,8%doPIBapreçoscorrentesecaiupara
16,5%namédiadosúltimosnoveanos.Apreçosde2015,ataxadevariaçãoanual
médiadaFBCFnoperíodode1991-2000foipositivade4,8%,enquantofoinegativa
nadécadade2001-2010(-1,6%)enadécadade2011-2019(-1,2%).Porseuturno,
oinvestimentopúblicofoide4,4%doPIBem1995;de5,3%em2010;caiupara
1,5%em2016;eapenasde1,9%doPIBem2019.Oinvestimentopúblicofoiuma
variávelsacrificadanosúltimosanosnoprocessodeconsolidaçãoorçamental,com
o favorecimento político da despesa pública corrente primária. Isto apesar do
aumentodacargafiscalsobreasfamíliaseasempresasparaovalorhistoricamente
maisaltoem2019(35,4%doPIB,umasubidacrescentede4,2pontospercentuais
desde1995);doaumentoexponencialdoencaixedosdividendoseIRCpagospelo
BancodePortugal(umpicodemilmilhõesem2019);edaquedadopesodosjuros
dadívidapúblicanoPIB(5,5%em1995;2,3%em2015;1,4%em2019),apesardo
aumentoexponencialdoseupesonoPIBde62%em1995para131%em2015e
118%em2019.
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Precisamos de investir mais e com mais qualidade. A estimativa do coeficiente
capital/produtoapontatambémparaumatendênciadecrescente,oqueevidenciaa
necessidade de definição de melhores critérios de selecção dos investimentos
públicos e privados, em função do seu impacto no PIB potencial e na
competitividade.Osagentespolíticos,económicosesociaisterãodeestaràaltura
dassuasresponsabilidadesnaselecçãodoscritériosdeaplicaçãodosfundos.
Nocampodosinvestimentospúblicos,impõe-seareanálisedasprioridadesedos
projectosquetêmvindoaserreferidosnoâmbitodoprogramaPortugal2030.Sem
serexaustivo,entendoqueexisteumconsensosobreanecessidadedemelhoriade
infra-estruturas de apoio ao desenvolvimento; infra-estruturas de conectividade
(transporteferroviário,marítimo,aéreo,mobilidadeurbana,etc.);infra-estruturas
tecnológicasedeinvestigação;telecomunicaçõeseinternet;transformaçãodigital;
infra-estruturasdosistemaeducativoedeformaçãoprofissional;infra-estruturas
desaúdeetc.
Emmuitosdomínios,seriainteligenteoEstadoseguiraviadasparceriaspúblico-
privadas (um instrumento importante de maior eficiência com contratos
equilibrados) ou a da concessão de exploração a empresas privadas escolhidas
atravésdeconcursospúblicosinternacionaistransparentes.
Amelhoriadaqualidadedaspolíticaspúblicastemdeserumobjectivopermanente,
pois são importantes na criação de um enquadramento favorável à actividade
económica,àiniciativa,aoequilíbrioterritorialeàcoesãosocial.
As políticas empresariais são as determinantes na criação da riqueza e do
emprego.Asestratégiascompetitivasempresariaisvisamamelhoriacontínuado
posicionamentoestratégicoemmercadoscadavezmaiscomplexoseacriaçãode
vantagens competitivas de custo e/ou de diferenciação face aos concorrentes. A
inovaçãodeprodutos,processoseserviçoséamãedadiferenciação.Osestímulos
daspolíticaspúblicasdevemserorientadosparaesteobjectivofundamental,dentro
doprincípioquenãocompeteaoEstadofazeraselecçãodasempresasvencedoras,
que podem prosperar em qualquer sector da economia, mas apenas definir os
critériosestratégicosnaselecçãodosprojectosmerecedoresdeapoio.
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OPlanodeRecuperaçãoEconómicadeveinteriorizarqueasempresassãoacélula-
basedaactividadeeconómica,afontedecriaçãoderiquezaedeemprego,aorigem
dos rendimentos das famílias e do Estado, pelo que, deve ser prioritário o
aprofundamento do processo de renovação do tecido produtivo e da sua
internacionalização.
Comoreferi,emqualquersectordeactividadeépossívelterempresascomsucesso
competitivo.Aqualidadedasuagestãoestratégicaeoperacionaltemcrescido,tendo
sidoasempresasosgrandesmotoresdarecuperaçãodascontasexternasexigida
pelo nosso elevado nível de endividamento (na última década, o valor das
exportaçõesnoPIBsubiuàvoltade15pontospercentuais).Nospróximosanos,as
empresas vão enfrentar novos desafios num meio envolvente cada vez mais
complexopelasmutaçõestecnológicas,económicasesociais.
Arenovaçãoestratégicadaestruturaprodutivadeumpaíséumprocesso longo,
com acções de investimento, de desinvestimento e de desenvolvimento de
competências,duranteumhorizontetemporalalargado.Ésalutarque“asempresas-
zombie”sejamliquidadasouabsorvidasporoutras,paraumamelhorqualidadede
alocação de recursos na economia e equidade concorrencial. Portugal tem uma
estrutura económica comumpeso relativo elevadodemicro epequenas-médias
empresas, as quais precisam de aumentar a sua dimensão para melhoria da
produtividade,peloqueosincentivosaocrescimentoorgânico(investimentos)ou
aocrescimentoexterno(fusõeseaquisições)devemmerecerprioridade.
ACEvaiprocurardireccionarosinvestimentosparaachamadaeconomiaverdee
circulareparaaeconomiadigital.Semdeixardereconhecerquesãorecomendações
importantes, há que integrá-las na realidade da estrutura produtiva actual da
economiaportuguesaenasuaevoluçãodesejável,apartirdabasedeempresasde
sucessoemtodosossectoresdaeconomiaqueprecisamdeumanovaadaptação
estratégicaderespostaaosnovosdesafios.
Osapoiosterãodevisarquero“upgrading”doschamados“sectorestradicionais”
(agricultura,agroalimentar, indústriatransformadora,turismoeserviços),quera
introdução de novas actividades de valor acrescentado e com potencial de
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crescimentonoespaçoeuropeuenosmercadosglobais,nos sectoresdosbense
serviçostransaccionáveisdeterminantesdanossacompetitividadeexterna.
Nacomposiçãodaestruturaeconómicaaníveleuropeu,astendênciasapontampara
oreforçodomovimento,jásentidodesdeháalgunsanos,paraaregionalizaçãode
algumascadeiasdeproduçãoglobais,ouseja,paraadeslocalizaçãodesegmentos
daproduçãoindustrialdepaísesemergentes(incluindoaChinaeaÍndia)paraos
paísesmais avançados. Entendo, porém, que, em segmentos industriais de fraco
valoracrescentado,oscustosdeproduçãocomparativossejamumacondicionante
daamplitudedomovimentoapelidadode “reindustrialização”.Nãohádúvidade
que,paraeconomiascomoaportuguesa,existiráumanovaoportunidadedeatrair
investimentos que venham a visar, nomínimo, o espaço europeu, por razões de
escalacompetitiva.
É evidente que, face às mutações tecnológicas e de mercado, as estruturas
produtivasdospaísesvãoevoluiremtodosossectoresdaeconomiaequesurgirão
novas oportunidades de projectos de investimento industrial justificáveis para o
mercadoeuropeu.
Portugal poderá conseguir atrair alguns desses projectos se oferecer factores de
atractividade favoráveis em concorrência com os outros países, impondo-se
incentivos adequados e uma postura activa de todos os agentes de captação de
investimento (nacional e estrangeiro) indutor de um maior crescimento,
modernização empresarial e retenção e desenvolvimento de talentos e
competências.Trêsouquatroprojectosdedimensãoteriamefeitosmultiplicadores
importantesnaeconomiaportuguesa.
Naeconomiadofuturo,existirãosectoresganhadoresesectoresperdedores.E,em
cadasector,teremosempresascomsucessoesemsucessocompetitivo.Nosúltimos
tempos, alguns analistas têm apontado cenários sobre os sectores do futuro:
agroalimentar; a fileira da floresta; actividades ligadas ao mar; indústrias
farmacêuticas e de saúde; energias renováveis; mobilidade eléctrica; comércio
electrónico; internet e tecnologias de comunicação e informação; comércio “on-
line”; serviços logísticos; turismo “premium” (de natureza e cultural); meios de
pagamento,etc.
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Emtodoseles,asempresasportuguesaspoderãodesenvolverprojectoscoerentese
com massa crítica. Em muitos, poderão atrair investimento estrangeiro de
qualidade,oquecorrespondeaumanecessidadeobjectivadaeconomiaportuguesa
derivada da insuficiência crónica de “equity” português (devida a uma fraca
acumulaçãodecapitalesuadestruiçãopormáspolíticas emalgunsperíodosda
nossahistória).
Asempresasvãochegara2021emgeralmaisdescapitalizadas,peloqueacriação
decondiçõesdereforçodoscapitaisprópriosedemelhoriadarentabilidadedeverá
constituir um objectivo prioritário, através de políticas fiscais e financeiras
adequadas, com incentivos apropriados em domínios tais como: lucros retidos;
transacção de créditos fiscais; dedução de prejuízos acumulados sem restrições;
aumentos de capital; capital de risco; formação do capital fixo; retenção e
desenvolvimentodocapitalhumano;fusõeseaquisições(críticasparaoaumento
da“massacrítica”demuitasunidadesempresariais);internacionalização;inovação;
formaçãoprofissional,etc.
Os diagnósticos estão feitos (existem análises de qualidade elaboradas, por
exemplo,pelasconfederaçõesempresariaisepor“think-tanks”comoo“Forumpara
aCompetitividade”oua“MissãoCrescimento”).Oqueimportaéavontadepolítica
parasepassaràacção,vencendoo“vírus”ideológicoimpeditivodeumambiente
reformadormaisfavorávelaoinvestimento,àiniciativaempresarialeaorisco.
Aretomadaconfiançaseráumfactordeterminante,oque,noactualcontexto,só
acontecerá quando houver vacina e/ou tratamento médico adequados para o
coronavírus e quando as famílias retomarem os seus níveis de consumo, e as
empresasoseuníveldeinvestimento.Ahistóriaprovaque,apósasrecessõesque
ficamnamemória, se verificauma tendênciaparao aumentodapoupança, o tal
“paradoxodapoupança”explicadoporKeynesapropósitodascausasdacrisede
1929-1933.
Asempresas,nocurtoprazo,terãoderecuperarosseusmercados(oqueexigea
dinamizaçãodaprocura)enãodescuraramelhoria continuadadasuaeficiência
estratégicaeoperacional.Entreaspolíticasdegestãoadequadasparaaaceleração
daprodutividade,vejooaumentodesejáveldopesodossaláriosnadistribuiçãodo
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rendimentonacional,comefeitospositivosnopoderdecompradasfamílias;para
tanto,asempresasdeveriamexpandiromodelodosincentivosdeprodutividadee
departicipaçãodoslucrosdosseuscolaboradores.
Para cada sector relevante da economia (em função do seu potencial e do peso
relativonoPIBenoemprego),justifica-seumprogramaespecíficoderecuperação
e desenvolvimento. Defendo que os programas sectoriais sejam integrados num
Plano Global de Recuperação e Desenvolvimento, com acções a curto e amédio
prazo,aserelaboradoporumaliderançacoordenadoraeficazaníveldeGoverno:
tomando em consideração as propostas dos partidos políticos, associações
empresariais,“think-tanks”,eespecialistasquesetêmdebruçadosobreofuturoda
economiaportuguesa;massabendodefinirprioridadesnaafectaçãodosrecursos.
Osistemabancárioécrucialnoprocessoderetoma.Umaeconomiasaudávelexige
bancossaudáveisquecumpramasuafunçãodeintermediaçãofinanceiranoquadro
deumaregulamentaçãointeligenteenãoburocrática.Osectorbancárioportuguês
tem vindo a responder às sequelas da crise económica após o tsunami da crise
financeira despoletada em 2008, mas com raízes em anos anteriores e
consequênciasgravosasnosanosseguintes.Masevidencia,apesardosprogressos
nosúltimosanos,etomandocomoreferênciaasanálisesdaEBA(EuropeanBank
Association), a necessidade imperiosa de continuar as acções de reestruturação
para responder a desafios importantes. Entre eles: (i) baixa rentabilidade dos
capitaispróprios; (ii) melhoriadosráciosdocapital; (iii)deduçãodosprejuízos
fiscais acumulados sem restrições; (iv) montante ainda elevado do crédito
malparado(osráciosdeNPLsãodosmaiselevados,aseguiràGréciaeaChipre);(v)
dependênciadocréditoamicroepequenasempresas,emgeralmenosresilientes
queasgrandesempresas;(vi)sobrecustosnasuacontaderesultadosligadoscom
impostosexcessivosetaxasparaoFundodeResolução(quedeveriamereceruma
nova solução de financiamento); (vii) dificuldades demonetização de activos de
malparadopormorosidadedosistemajurídiconosprocessosdefalênciaeacordo
de credores; (vii) animosidade de certos segmentos do discurso político com
reflexosnaopiniãopública.Pensoqueoplanoderecuperaçãotambémdeverácriar
um ambiente mais favorável de incentivos ao desempenho do sector bancário,
permitindo a ultrapassagem dos bloqueios existentes e o processo da sua
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consolidação após anos difíceis, para o que será também relevante a criação de
condiçõesparaum“rating”adequadodoriscodaRepública.
Ainda no domínio do financiamento da economia, é chegado omomento de um
impulso ao desenvolvimento do instituto público embrião de um “banco de
fomento”edarestruturaçãodaacçãodepromoçãopúblicadocapitalderisconuma
lógicadedinamizaçãodeprojetosatravésdefundosdeinvestimentoprivadosem
parceriacomentidadesespecializadascomooFundoEuropeudeInvestimentosdo
BEI(“FundofFunds”).
Oplanoderecuperaçãoeconómicatambémdeverá incluirmedidasnocampodo
“pilar social”, um dos três pilares estratégicos estruturais determinantes do
desenvolvimento económico e social (a par dos pilares “político-institucional” e
“económico-financeiro”)quetenhodesenvolvidonoutrasocasiões.Omaiorriscoda
nova crise gerada em 2020 é o risco social, pois as crises acabam sempre por
prejudicar os segmentos mais desfavorecidos da sociedade, os que ficam sem
emprego,osjovensàprocuradoprimeiroemprego,apopulaçãoactivaacaminho
da reforma ou os idosos sem vida profissional activa que vêem diminuída a
remuneraçãodassuaspoupanças.Assim,impõem-sepolíticasactivasinovadorasno
campo da inclusão social (inclui a luta contra o abandono escolar precoce) e do
desenvolvimento do “capital humano”, optimizando permanentemente os meios
dossectorespúblicos,privadose instituiçõessem fins lucrativos, susceptíveisde
seremmobilizados.
Portugal tem condições para vencer os desafios. Com adequada combinação de
políticas macroeconómicas, microeconómicas, empresariais e sociais, integradas
num plano coerente a curto emédio prazos, ultrapassando o “vírus” da inacção
estrutural e transformando a crise numa oportunidade de reformas políticas,
económicasesociais.Pensoqueestavisãoestratégica,adequadamentetransmitida
aos portugueses, contribuiria para a retoma da confiança, essencial para a
recuperaçãoeodesenvolvimentodoPaís.
31deMaiode2020