Fernanda Aparecida Ferreira .DEMONSTRAÇÕES EM GEOMETRIA EUCLIDIANA: O USO DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA COMO RECURSO METODOLÓGICO EM UM CURSO DE LICENCIATURA DE MATEMÁTICA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Matemática da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências e Matemática. Belo Horizonte 2008
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DEMONSTRAÇÕES EM GEOMETRIA EUCLIDIANA: … · momentos certos e carinho incondicional. ... Esta pesquisa tem como proposta de trabalho fazer uma abordagem acerca da ... 134 Figura
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Fernanda Aparecida Ferreira
.DEMONSTRAÇÕES EM GEOMETRIA EUCLIDIANA: O USO DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA COMO RECURSO METODOLÓGICO EM
UM CURSO DE LICENCIATURA DE MATEMÁTICA
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Ensino de Matemática
da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Ensino
de Ciências e Matemática.
Belo Horizonte2008
2
À
Você, que hoje mora além do
horizonte, em um lugar tranqüilo
e bonito, dedico minha
dissertação. Espero que esteja
orgulhoso pai.
3
AGRADECIMENTOS
A minha querida mãe (Fátima) e irmã (Flávia), por serem fonte de inspiração e
compreenderem minha ausência durante a realização da Pesquisa.
Ao meu cúmplice de vida Ériks Vargas, pelas palavras de incentivo nos
momentos certos e carinho incondicional.
Ao grande mestre, Dr. Dimas Felipe de Miranda, que iluminou minhas idéias
com suas preciosas considerações e conhecimentos. Agradeço sua confiança
no meu trabalho.
Ao corpo docente do Mestrado por contribuir com meu aprofundamento teórico.
Aos amigos do Mestrado, pelos momentos compartilhados e força nas horas
difíceis.
Ao amigo Dr. João Bosco Laudares por ser o impulsionador da minha
caminhada em direção a produções acadêmicas.
A todos os funcionários do Programa de Pós-Graduação em ensino de
Ciências e Matemática da PUC/MG pelo suporte. Em especial a prestativa
Ângela Augusta, secretária e amiga.
A direção da Fundação Helena Antipoff por permitir que a pesquisa fosse
realizada nas suas dependências.
Aos alunos do 4º período do curso de Licenciatura em Matemática sem os
quais este trabalho não teria acontecido.
A ajuda dos familiares e amigos.
E por fim, agradeço a Deus pelo consolo, conforto e abertura de novas portas
no meu caminho. A ELE meu maior agradecimento.
4
“A arte de raciocinar consiste em
agarrar o assunto na ponta certa,
apoderar-se das poucas idéias gerais
que iluminam o todo e arregimentar
persistentemente todos os fatos
subsidiários ao redor... Creio que para
esta espécie de treinamento a
Geometria seja melhor que a Álgebra”.
Whitehead
5
RESUMO
A experiência profissional e pesquisas realizadas em educação matemática
constatam as dificuldades que alunos de licenciatura em matemática sentem
ao se depararem com problemas geométricos que envolvem demonstrações.
Esta pesquisa tem como proposta de trabalho fazer uma abordagem acerca da
demonstração em geometria euclidiana, focando aspectos de ordem teórica e
pedagógica, de forma que esta auxilie na compreensão do que é uma
demonstração e sua importância na teorização da matemática. O intuito do
trabalho é apresentar uma estratégia metodológica que contribua para suavizar
as dificuldades constatadas. Para tal, foi elaborada, aplicada e analisada uma
seqüência didática em um curso de formação de professores de matemática,
na qual a demonstração se caracterizou mais como uma hierarquização de
processos do que como uma hierarquização de conteúdos, elucidando sua
engenharia com o uso de “técnicas de demonstração”. O aporte teórico baseia-
se nas idéias de Raymond Duval sobre o conhecimento geométrico e a
importância dos registros de representação semiótica para a aquisição e a
compreensão do mesmo. Conhecimentos acerca da demonstração
matemática, seu ensino, suas particularidades e características também foram
abordadas, norteando e direcionando o desenvolvimento da seqüência
didática.
Palavras-chave: demonstração, geometria, técnicas de demonstração, registros
de representação, atividades geométricas, formação de professores.
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ABSTRACT
The professional experience and research carried through in mathematical
education evidence the difficulties that students of licenciatura in mathematics
feel to if coming across with geometric problems that involve demonstrations.
This research has as work proposal to make a boarding concerning the
demonstration in Euclidean geometry, focusing aspects of theoretical and
pedagogical order, so that this assists in the understanding of what is a
demonstration and its importance in the theorization of mathematics. The
intention of the work is to present a methodology strategy that contributes to
minimize the evidenced difficulties. For such, it was elaborated, applied and
analyzed a didactic sequence in a course of formation of mathematics
professors, in which the demonstration if it characterized more as a hierarchy of
processes than as a hierarchy of content, elucidating its engineering with the
use of "demonstration techniques". It arrives in port it theoretical is based on the
ideas of Raymond Duval on the geometric knowledge and the importance of the
representation registers semiotics for the acquisition and the understanding of
it. Knowledge concerning the mathematical demonstration, its education, its
particularitities and characteristics had also been boarded, guiding and directing
the development of the didactic sequence.
Key words: demonstration, geometry, techniques of demonstration, registers of
representation, geometric activities, formation of professors.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Processos cognitivos, segundo Duval (1995)...............................................................................20 Figura 2: Problema de área.................................................................................................................24Figura 3: Representação gráfica de uma circunferência..............................................................................28Figura 4: Representação geométrica: retas..................................................................................................31Figura 5: Representação geométrica: ângulos.............................................................................................31Figura 6: Modelo utilizado para trabalhar técnicas de demonstração..........................................................78Figura 7: Esboço comum entre os alunos que fizeram a Seqüência didática............................................127Figura 8: Representação figural dada pelo aluno.......................................................................................134Figura 9: Representação geométrica feito por um dos alunos para a questão 2........................................148Figura 10: Alunos discutindo sobre as atividades......................................................................................173Figura 11: Alunos resolvendo as atividades em dupla...............................................................................173Figura 12: Alunos realizando individualmente as atividades....................................................................174Figura 13: Parte da turma pensando nas atividades...................................................................................174Figura 14: Parte da Atividade I da seqüência feita por um dos alunos......................................................175Figura 15: Parte da Atividade I da seqüência feita por um dos alunos......................................................176Figura 16: Parte da Atividade I da seqüência feita por um dos alunos......................................................177Figura 17: Parte da Atividade II da seqüência feita por um dos alunos....................................................178Figura 18: Parte da Atividade II da seqüência feita por um dos alunos....................................................179Figura 19: Parte da Atividade III da seqüência feita por um dos alunos...................................................180Figura 20: Parte da Atividade III da seqüência feita por um dos alunos...................................................181Figura 21: Parte da Atividade III da seqüência feita por um dos alunos...................................................182Figura 22: Parte da Atividade IV da seqüência feita por um dos alunos...................................................183Figura 23: Parte da Atividade IV da seqüência feita por um dos alunos...................................................184Figura 24: Parte da Atividade IV da seqüência feita por um dos alunos...................................................185Figura 25: Parte da Atividade V da seqüência feita por um dos alunos....................................................186
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LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Formação Básica ..............................................................................................................67Gráfico 2: Análise quantitativa da questão 1...............................................................................................68Gráfico 3: Análise quantitativa da questão 2...............................................................................................68Gráfico 4: Análise quantitativa da questão 3...............................................................................................69Gráfico 5: Análise quantitativa da questão 4...............................................................................................69Gráfico 6: Análise quantitativa da questão 5...............................................................................................69Gráfico 7: Análise quantitativa da questão 6...............................................................................................70Gráfico 8: Análise quantitativa da questão 7...............................................................................................70Gráfico 9: Análise quantitativa da questão 8...............................................................................................70Gráfico 10: Análise quantitativa da questão 9.............................................................................................71Gráfico 11: Análise quantitativa total..........................................................................................................71
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Solução apresentada por um dos alunos para a demonstração do teorema 3...........................140
1.2.1 Engenharia didática ..................................................................................................................... 14 1.2.2 Caracterização do processo da pesquisa ..................................................................................... 15
Primeira Fase – Análises preliminares ......................................................................................................... 15 Segunda Fase – Análise a priori e formulação da seqüência didática ......................................................... 16
2.1 Raymond Duval ................................................................................................................................. 19 2.2 As funções das representações no ensino/aprendizagem da matemática ........................................... 26 2.3 Obstáculos em procedimentos ........................................................................................................... 32 2.4 O ensino de geometria: o papel da demonstração .............................................................................. 33 2.5 A demonstração nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) .................................................... 39 2.6 A formação de futuros professores de matemática ............................................................................ 42
3 DEMONSTRAÇÃO MATEMÁTICA: CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS, FILOSÓFICAS E EPISTEMOLÓGICAS ................................................................................................................................. 46
3.1 O surgimento da demonstração .......................................................................................................... 46 3.2 O papel da demonstração no olhar da filosofia .................................................................................. 51
3.3 Estudo epistemológico ...................................................................................................................... 60 4 PROBLEMATIZAÇÃO E HIPÓTESES DE PESQUISA ....................................................................... 66
4.1 Questionário ....................................................................................................................................... 66 4.1.1 População ................................................................................................................................... 66 4.1.2 Dados e análise ........................................................................................................................... 67 4.1.3 Análise das respostas dos alunos - dados quantitativos .............................................................. 67 4.1.4 Análise qualitativa das respostas dos alunos ............................................................................. 71
5 A SEQÜÊNCIA DIDÁTICA .................................................................................................................... 76 5.1 Finalidade da seqüência didática ....................................................................................................... 76 5.2 Concepções do modelo proposto ....................................................................................................... 78 5.3 Engenharia da seqüência didática ...................................................................................................... 81 5.4 Aplicação da seqüência didática ........................................................................................................ 84 5.5 Atividades da seqüência – Apresentação e Descrição ....................................................................... 85
................................................................................................................................................................... 124 6 ANALISANDO OS RESULTADOS ..................................................................................................... 124 6.1 Análise individual das atividades da seqüência didática ..................................................................... 125
6.2 Análise geral das atividades da seqüência didática .......................................................................... 150 6.2.1 Retomando nossa problemática ................................................................................................ 150 6.2.2 Retomando alguns dos obstáculos enfrentados ......................................................................... 152 6.2.3 Retomando nossas hipóteses de pesquisa ................................................................................. 154 6.2.4 Retomando nossas expectativas com a aplicação da seqüência ................................................ 156
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÃO ..................................................................................... 158 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 163 Referências Complementares ..................................................................................................................... 169 APÊNDICE A – Questionário aplicado aos alunos ................................................................................... 171 ANEXO A – Fotos dos alunos desenvolvendo a seqüência didática ......................................................... 172 ANEXO B - Atividades produzidas pelos alunos ...................................................................................... 175
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1 INTRODUÇÃO
1.1 Nossa proposta
No decorrer de nossa experiência acadêmica, inquietações têm surgido
acerca da demonstração em Geometria. Dificuldades de várias ordens são
observadas e apontadas por profissionais da área, tanto no que se refere ao
uso da demonstração no ensino de Geometria quanto à sua aprendizagem.
Atuamos em um curso de formação de professores de Matemática,
lecionando a disciplina Geometria Espacial. Preocupa-nos a forma como
futuros professores vêm estudando e se preparando para ensinar Geometria,
especialmente no que se refere ao envolvimento e ao tratamento que
dispensam às dificuldades apresentadas, quando se deparam com problemas
geométricos que abordem uma demonstração. Tais dificuldades, normalmente,
fazem com que os futuros professores desistam da solução desses tipos de
problemas ou simplesmente os ignorem. Isso acontece pelo fato de eles não
estarem preparados para entender e organizar um encadeamento de
conhecimentos ou processos exigidos para a constatação ou prova de uma
proposição Matemática.
Quando se fala em Matemática, é comum que o termo “demonstração”
esteja associado a esse conhecimento. A demonstração desempenha um
papel central na teorização da matemática e no desenvolvimento do raciocínio
lógico dedutivo. Mas, por motivos de limitações diversas, constatamos que, de
maneira geral, o processo de formação de professores nesta área pouco está
contribuindo para que o formando se prepare e desenvolva habilidades para
lidar com a teoria e o raciocínio matemáticos.
Por isso, nesta pesquisa, decidimos trabalhar com “técnicas de
demonstração” no ensino de Geometria Euclidiana, envolvendo alunos de um
curso de formação de professores de Matemática. A nossa proposta foi
preparar, testar, analisar e disponibilizar um material didático de alcance
formativo (aprendizagem) e pedagógico (ensino). A intenção é a de que o
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trabalho contribua para o desenvolvimento de habilidades e de conceitos
geométricos, de raciocínio lógico e, em suma, de compreensão do processo de
demonstração em Geometria.
Para tal finalidade, elaboramos uma seqüência didática em cinco
sessões, cada qual com seu objetivo específico e suporte teórico, conforme
relatados no corpo deste trabalho.
Após este capítulo de Introdução, o trabalho apresenta mais seis
capítulos, a saber: Construindo nossos fundamentos; Demonstração
matemática: considerações históricas, filosóficas e epistemológicas;
Problematização e hipóteses de pesquisa; A seqüência didática; Analisando os
resultados obtidos e, por fim, as Considerações finais e conclusão.
Em “Construindo nossos fundamentos”, apresentamos as considerações
de Raymond Duval sobre os processos cognitivos envolvidos na aquisição de
conceitos geométricos e as funções das representações semióticas neste
processo. Expomos também considerações da Educação Matemática acerca
do ensino das demonstrações e da formação de professores para tal fim.
Evidenciamos as propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais, no que
tange ao trabalho com as demonstrações.
Elucidamos a evolução da demonstração no capítulo “Demonstração
matemática: considerações históricas, filosóficas e epistemológicas” ao longo
da história da Matemática, considerando o posicionamento de matemáticos,
filósofos e educadores.
A partir de nossa fundamentação teórica e experiência profissional,
delimitamos nossa “Problematização e as hipóteses de pesquisa”,
apresentando também um diagnóstico que corrobora nosso posicionamento.
No capítulo “Seqüência didática”, expomos sua concepção, bem como
finalidades e objetivos. Uma descrição de cada atividade da seqüência é
apresentada, assim como os procedimentos de sua aplicação.
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Posteriormente, apresentamos “Analisando os resultados obtidos” com a
aplicação da seqüência. Retomamos nossa problemática, nossas hipóteses e
nossas expectativas, à luz do referencial teórico.
Finalmente, no capítulo “Considerações finais e Conclusão”, refletimos
sobre os resultados alcançados e as contribuições da aplicação da seqüência
didática, sugerindo novas abordagens no modelamento das atividades, com a
intenção de minimizar as dificuldades percebidas ao longo da pesquisa.
1.2 Procedimentos metodológicos da pesquisa
1.2.1 Engenharia didática
Nossa metodologia de trabalho tem como premissa o fato de que uma
investigação baseada em realizações didáticas de uma disciplina deve ser
norteada pelo duplo movimento entre teorização e validação experimental.
Sendo assim, orientamos nosso trabalho pela teoria de Duval e pelos
procedimentos característicos de uma engenharia didática (Artigue, 1992) que,
como metodologia de pesquisa, se propõe a esquemas experimentais
baseados na concepção, na realização, na observação e na análise de
seqüências didáticas (Chevallard, 1982).
A engenharia didática, conceito que surgiu em meados da década de
1980, é apresentada por Artigue (1989) como um trabalho que se assemelha
ao do próprio engenheiro. Isto é, ao realizar um projeto, o engenheiro apóia-se
sobre o conhecimento científico de seu domínio, submete-se a um controle
científico e, ao mesmo tempo, encontra-se obrigado a trabalhar com objetos
menos precisos que os científicos. Com o professor não é diferente, uma vez
que, ao elaborar ou a escolher uma seqüência didática, devem ser levados em
conta de forma integral: o domínio do conhecimento (científico), o
conhecimento prévio do aluno (não científico) e o papel do professor e dos
seus alunos (submissão de controle).
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O processo experimental da Engenharia Didática é composto de quatro
fases:
• análise preliminar: fase que fundamenta a construção da seqüência
didática;
• análise a priori: momento de decisão sobre quais variáveis didáticas
serão trabalhadas, fase composta de uma parte descritiva e outra de
previsão de resultados;
• experimentação: realização das seqüências didáticas e da observação
dos alunos e professor;
• análise a posteriori e validação: confrontação entre as análises e
validação das hipóteses de pesquisa.
Por meio da concepção de Engenharia Didática, que pressupõe uma
produção para o ensino, elaboramos uma Seqüência Didática, orientando o
trabalho de acordo com as fases do processo experimental.
1.2.2 Caracterização do processo da pesquisa
Primeira Fase – Análises preliminares
• Fundamentação teórica baseada nos trabalhos de Duval sobre registros
de representação e suas relações com a aquisição de conhecimento
matemático, prioritariamente no processo de demonstração.
• Estudos históricos, epistemológicos e filosóficos sobre o papel da
demonstração na matemática e no ensino de Matemática.
• Análise das propostas curriculares para o ensino de Matemática e,
especificamente, o de Geometria.
• Estudo sobre o atual ensino de Geometria e como a demonstração tem
sido trabalhada.
• Estudo sobre a formação dos professores de matemática no que tange
ao ensino de Geometria, focando o papel da demonstração.
15
• Estudo sobre as concepções dos futuros professores com relação ao
ensino de Geometria e das demonstrações (levantamento de dados
através de questionário).
• Delimitação da problemática e de nossas hipóteses de pesquisa.
Segunda Fase – Análise a priori e formulação da seqüência didática
• Criação e formatação da seqüência, de acordo com o objeto de estudo.
• Controle da situação didática por meio de escolhas pré–determinadas na
formatação da seqüência didática, conforme referencial teórico.
Ressaltamos que, nesta fase, de acordo com o que se propõe a
metodologia da engenharia didática, deveríamos fazer uma análise a priori dos
resultados esperados pelos alunos durante o desenvolvimento da seqüência
didática. Porém, na elaboração da seqüência, tentamos fazer com que as
atividades escolhidas, em cada situação, conduzissem ao objetivo geral do
trabalho: apreender e compreender técnicas de demonstração. Dessa forma,
nossa análise a priori se restringirá à descrição de cada uma das atividades
que compõem a seqüência didática.
Destacamos o fato de que as situações que trabalham efetivamente com
as demonstrações podem ter mais de uma solução, uma vez que, ao se
demonstrar um teorema, divergentes caminhos podem ser trilhados, porém,
estes devem convergir para um único resultado: a tese.
Terceira Fase – Experimentação
• Aplicação da seqüência didática.
A aplicação da seqüência foi realizada em uma instituição de ensino
superior, localizada na região metropolitana de Belo Horizonte, MG. Os
participantes foram 20 alunos que já haviam cursado e sido aprovados nas
disciplinas de Geometria Plana e Espacial. Este foi o único critério para a
determinação de escolha dos envolvidos.
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A seqüência didática foi dividida em 4 blocos, descritos de acordo com
seus objetivos:
• 1º bloco - composto de duas atividades com o foco em: trabalhar a
noção de um sistema formal, distinção entre os elementos de um
sistema formal e seus respectivos estatutos, apresentação de diferentes
registros de representação e suas congruências, figura geométrica,
desmembramento de um teorema em hipótese e tese e suas
representações em dois/três registros de representação;
• 2º bloco – atividade em que foi trabalhado o recíproco de um teorema, a
unificação de um teorema com seu recíproco, sua legitimidade por meio
de contra-exemplos e reforço dos diferentes registros de representação;
• 3º bloco - composto de duas atividades que privilegiam o processo de
demonstração matemática por meio de apresentação e criação de uma
caixa de ferramentas, técnicas de demonstração, mobilização e sinergia
de registros de representação distintos. Estas atividades contemplaram,
ainda, todos os objetivos definidos nas atividades anteriores.
Uma melhor descrição do processo de aplicação e desenvolvimento da
seqüência, assim como seus objetivos, é realizada no capítulo “A seqüência
didática” e seus resultados analisados posteriormente.
Quarta fase – Análise a posteriori e validação
• Analisar as respostas dos alunos durante as atividades
desenvolvidas na seqüência didática.
• Dialogar com os referenciais teóricos no processo de análise das
respostas dos alunos.
• Confrontar as análises a priori (descrição) e a posteriori.
• Corroborar as hipóteses levantadas.
Com a utilização desses procedimentos que contribuem para a
investigação da prática educativa, esperamos que este trabalho sirva de
17
modelo e incentivo aos educadores matemáticos que, assim como nós, sentem
desejo de propor alternativas metodológicas para o ensino e a aprendizagem
da Matemática. Esperamos também que se multipliquem as reflexões sobre a
importância das demonstrações matemáticas, principalmente nos cursos de
formação de professores e que surjam novas idéias as quais sejam colocadas
em prática, contribuindo, assim, para a discussão dos diversos
problemas/dificuldades com o ensino e a demonstração em Geometria.
18
2 CONSTRUINDO NOSSOS FUNDAMENTOS
Objetivando um trabalho voltado para o ensino de demonstrações em
Geometria, com base em processos relacionados a uma atividade seqüencial e
lógica do pensamento, foram utilizadas, como referências bibliográficas,
estudos e pesquisas relacionados à demonstração, seu ensino e os
procedimentos inerentes, na engenharia, de se demonstrar.
Ressaltamos os trabalhos de Duval na sustentação do nosso objetivo e
enfocamos alguns obstáculos didáticos, epistemológicos e lingüísticos no
ensino das demonstrações. Finalizamos com algumas considerações sobre o
ensino de Geometria e o papel que a demonstração tem desempenhado neste
ensino.
2.1 Raymond Duval
Duval1 (1995) acredita que o aprendizado em Geometria envolve três
tipos de processos cognitivos intimamente conectados e que preenchem
específicas funções epistemológicas. São eles:
• processo de visualização: relacionado com a representação espacial.
Nele ocorre o exame do espaço representativo, passando da
ilustração de uma afirmação para a exploração heurística de uma
situação complexa, isto por meio de uma interpretação ou uma
verificação subjetiva;
• processo de construção (por instrumentos): realizado por meio de
ferramentas como régua, compasso, softwares, etc. O processo de
construção é caracterizado pela execução de configurações,
podendo ser trabalhada com um modelo. As ações e os resultados
observados durante a execução associam-se aos objetos
matemáticos representados;
1Filósofo e psicólogo de formação, Raymond Duval é autor de vários trabalhos sobre a psicologia cognitiva e sobre os registros de representação semiótica na aquisição do conhecimento matemático. Sua principal obra é Sémiosis et pensée humaine (1995).
19
• processo de raciocínio: é a extensão do conhecimento para a prova e
a explicação, mediante o discurso. Baseia-se nos teoremas, nos
axiomas e nas definições.
Segundo Duval, esses processos podem ser realizados
independentemente uns dos outros. Sendo assim, a visualização não depende
da construção, pois ela é uma passagem às figuras por qualquer caminho que
se esteja construindo. O processo de construção depende, exclusivamente, da
conexão entre as propriedades matemáticas do conceito que se quer construir
e as técnicas de construção que precisam ser utilizadas. E, finalmente, o
raciocínio depende de um corpo qualquer de proposições (definições,
teoremas, axiomas), pois se a visualização é um apoio intuitivo que, em
algumas vezes, é necessária para se achar a prova, devemos entender que
ela, em alguns casos, pode levar a interpretações errôneas.
Uma esquematização desses processos cognitivos encontra-se na
Figura 1.
Figura 1: Processos cognitivos, segundo Duval (1995)Fonte: Autora, 2008
Mesmo que os processos cognitivos, segundo Duval (1995), possam ser
realizados individualmente, os mesmos estão entrelaçados em sua sinergia e
são cognitivamente indispensáveis para o aprendizado em Geometria.
Para Duval, os raciocínios exigidos na resolução de problemas em
Geometria dependem da consciência de distinção das formas de se assimilar e
20
registrar as figuras. Ressalta-se que o raciocínio geométrico ou dedutivo
formal, utilizado nas resoluções de problemas que envolvem demonstrações,
difere totalmente do raciocínio discursivo natural, utilizado em outros contextos.
Em Geometria, o raciocínio com vistas à demonstração requer duas
condições críticas:
1. uso de proposições, sendo que as mesmas têm como partida um
2. utilização de axiomas, teoremas ou definições para cada avanço
feito em direção à conclusão.
Duval (1991) considera que o raciocínio utilizado para construir
conjecturas plausíveis é o "raciocínio argumentativo", enquanto o raciocínio
utilizado para validar tais conjecturas é o "raciocínio dedutivo". Dessa forma,
para formular uma conjectura, bastam a observação de alguns casos
particulares e a percepção de uma característica que se mantém invariante,
baseando-se os argumentos nesses casos particulares. Para demonstrar, a
exigência é maior e mais especifica, pois os argumentos utilizados devem ser
"gerais", "resistentes", "convincentes2" e "rigorosos".
O mesmo autor distingue os processos discursivos naturais dos
processos discursivos teóricos, característicos do raciocínio dedutivo formal,
afirmando que, neste último, "as proposições estão ligadas de acordo com seu
estatuto" e que esta organização "funciona por substituição de proposições
como num cálculo e não por associação ou oposição como no discurso
natural".
Para Duval, não existe pretensão em se demonstrar a verdade de uma
afirmativa, nem estabelecer a validade lógica de um raciocínio por meio da
argumentação, apenas obter do "outro" a concordância na validade de uma
2 Convincentes à comunidade de matemáticos
21
afirmativa dada. O objetivo da argumentação é o de obter a concordância do
interlocutor, convencendo-o. O objetivo da demonstração é o de garantir a
verdade. Porém, nem sempre os argumentos que convencem são válidos
(Balacheff, 1988; Duval, 1992). Para Balacheff (1999), a argumentação está
para a conjectura assim como a demonstração está para o teorema.
Todavia, a "heurística" dos problemas que envolvem a Geometria
baseia-se em registros espaciais que permitem formas de interpretações
autônomas e, para tais, Duval classificou as apreensões das figuras em quatro
tipos:
• seqüencial: com o objetivo de reproduzir uma figura; é utilizada nas
atividades de construção ou descrição;
• perceptiva: é a interpretação das formas de uma figura em uma
determinada situação geométrica;
• discursiva: é a interpretação dos elementos da figura geométrica,
privilegiando as articulações dos enunciados; relaciona semanticamente
as propriedades inerentes aos enunciados à figura;
• operatória: centrada nas modificações possíveis de uma figura inicial
(de partida) e sua reorganização perceptiva determinada pelas
modificações.
Qualquer que seja a figura geométrica desenhada no contexto de uma
atividade é possível estabelecer duas atitudes:
1. a apreensão perceptiva das formas (instantâneo, automático);
2. e a apreensão discursiva dos elementos e propriedades da figura
(verificação).
Essas atitudes, às vezes, se opõem, pois a figura pode mostrar objetos
que não são explicitados nos enunciados e os objetos enunciados pelas
hipóteses não são, necessariamente, os espontaneamente determinados pelos
alunos. Em acordo com as idéias de Duval, Fainguelernt (1999) aponta para o
22
problema da percepção das características geométricas, por meio de um
enunciado e a imagem que se faz do mesmo, pois, para ele:
"A grande complexidade do papel da percepção
no processo de formação e desenvolvimento de
conceitos geométricos, atua em duas direções.
Por um lado, não podemos formar uma imagem
de um conceito, identificar suas características e
dar exemplos sem visualizar seus elementos. Por
outro lado, esses elementos visuais podem
empobrecer a imagem atual que se quer
construir" (p.56).
Para Duval, o problema das figuras geométricas se concentra nas
diferenças entre a apreensão perceptiva e a apreensão discursiva
(interpretações comandadas necessariamente pelas hipóteses), pois, nem
sempre o objeto que aparece na figura é o objeto que a situação geométrica
(enunciado) exige ver.
"... os alunos lêem o enunciado, constroem a
figura e em seguida se concentram na figura sem
voltar ao enunciado" (DUVAL, 1998, p.61).
Conseqüentemente, o abandono do enunciado contribui para a ausência
de interpretação discursiva do problema (figura). Um dos fatores que podem
ser os responsáveis por esse abandono é o fato de que a grande maioria dos
problemas geométricos acessíveis aos alunos tem enunciado semanticamente
congruente com a figura construída, ressaltam Pavanello (1989), Bertonha
(1989) e Mello (1999).
A apreensão operatória das figuras, segundo Duval, depende das
modificações que a mesma pode sofrer e são classificadas da seguinte
maneira:
23
• mereológica: relação da parte e do todo. A figura pode ser separada
em partes, gerando subfiguras da mesma;
• ótica: transformação da figura em outra chamada sua imagem;
• posicional: deslocamento da figura em relação a um referencial.
As modificações são realizadas tanto graficamente quanto mentalmente.
O fracionamento de uma figura (modificação mereológica) ou uma análise por
meio de partes elementares da figura está relacionado com a "operação de
reconfiguração intermediária3". Dessa forma, partes elementares da figura
podem ser obtidas por fracionamento e reagrupadas em várias subfiguras,
todas inerentes à figura inicial. Por meio dessa operação, o tratamento
matemático de problemas que envolvem área (por exemplo) pode ser adaptado
pela equivalência de reagrupamentos intermediários ( Figura 2):
Figura 2: Problema de área
Porém, se, pelo fracionamento da Figura 2, decisões locais forem
tomadas somente com o uso de operações visíveis, apoiadas na "apreensão
perceptiva", é bem provável que ocorra um erro na determinação da solução do
problema, pois, visualmente, podemos concluir que a área A é diferente da
área B.
Agora, caso uma análise das hipóteses inerentes ao problema,
sugeridas pela "apreensão discursiva" (note que, no problema sugerido,
podemos utilizar o fato da diagonal do retângulo, dividi-lo em partes
congruentes) for realizada, a "apreensão operatória", baseada nas 3 Operação que consiste em organizar uma ou várias subfiguras diferentes de uma figura dada em outra figura (Duval, 1988).
24
Se um problema geométrico pede para
determinar se a área da região A é igual ou
diferente da área da região B, sendo EFGH
um retângulo, podemos, segundo Duval,
fracionar e reagrupar as figuras geradas em
subfiguras da figura original e reconfigurá-
las de forma a estabelecer a igualdade das
áreas sugeridas.
modificações e reorganizações visuais das figuras, necessária para a solução
do problema, poderá ser percebida.
Generalizando as "cadeias de processos" envolvendo as apreensões
sugeridas por Duval na "heurística" dos problemas geométricos, podemos
adequar as propostas metodológicas sugeridas por Descartes (1596-1650) em
"O Discurso do Método" (1978) com as idéias até então apresentadas.
Simplificando, Descartes considera como verdadeiro apenas o que for
evidente, ou seja, o que for intuitível com clareza e precisão. Porém, a
ampliação da área do conhecimento nem sempre oferece um panorama
permeável à intuição e, conseqüentemente, adequado à pronta aplicação do
preceito da evidência. A fim de contornar tal situação, são propostos os
seguintes recursos metodológicos: o preceito da análise que consiste em dividir
cada uma das dificuldades que se apresentem em tantas outras parcelas que
sejam necessárias para se resolver um problema (operação de reconfiguração
intermediária); o da síntese, que consiste em conduzir ordenadamente os
pensamentos, começando dos objetos mais simples e mais fáceis de serem
percebidos/conhecidos, para depois tentar gradativamente o conhecimento dos
mais complexos (apreensões perceptiva e discursiva) e, por fim, o da
enumeração, em que se devem realizar enumerações de modo a verificar que
nada foi omitido (apreensão operatória). Dessa forma, a construção do
conhecimento se opera por intuições e por análises.
Voltando a Duval, este considera que a maioria das dificuldades
encontradas pelos alunos na utilização das transformações geométricas está
na não congruência entre o tratamento matemático do problema e a apreensão
operatória da figura.
"A apreensão operatória das figuras é uma
apreensão central sobre as modificações
possíveis de uma figura de partida e por
conseqüência as reorganizações perceptivas que
essas modificações sugerem. A produtividade
25
heurística de uma figura, num determinado
problema geométrico, tem como fato, que existe a
congruência entre uma de suas operações e um
dos tratamentos matemáticos possíveis do
problema dado" (DUVAL, 1988, p.62).
O autor ainda afirma que "... a figura desvia, de algum modo, um
fragmento do discurso teórico" (1988, p.69) e, assim, distintos fatores
interferem, facilitando (ver de prontidão) ou ocultando (não ver) a percepção da
relação de congruência entre a apreensão operatória e um tratamento
matemático possível.
Duval considera que, analisando o problema de congruência entre a
figura e o enunciado e a congruência entre a figura e o tratamento matemático,
passamos pelo problema do estatuto das figuras geométricas. Ou seja, as
propriedades das figuras estão subordinadas às hipóteses do enunciado de um
problema e, conseqüentemente, a apreensão perceptiva está subordinada à
apreensão discursiva, por ser esta uma teorização da representação da figura.
Os elementos e propriedades que aparecem em uma figura estão
condicionados pelas definições, axiomas e teoremas estabelecidos. O mesmo
desenho pode representar distintas figuras geométricas se o enunciado das
hipóteses for alterado. Duval conclui que a teorização das figuras geométricas
constitui um dos princípios do acesso à demonstração.
2.2 As funções das representações no ensino/aprendizagem da matemática
De acordo com as idéias de Duval, ensinar matemática é, antes de tudo,
propiciar situações para o desenvolvimento geral das capacidades de
raciocínio, de análise e de visualização. E, para isso, "não é possível estudar
26
os fenômenos relativos ao conhecimento sem recorrer à noção de
representação4" (DUVAL, 1995, p.15).
Para o autor, a distinção entre um objeto matemático e a representação5
que se faz dele é fundamental para o funcionamento cognitivo do sujeito frente
a uma situação de ensino. Este funcionamento é estudado por meio de uma
abordagem cognitiva que leva em consideração a importância das
representações semióticas6 na Matemática e a variedade de representações
semióticas nela utilizadas.
As representações podem ser mentais, computacionais ou semióticas.
As mentais "... ocultam o conjunto de imagens e, mais globalmente, as
concepções que um indivíduo pode ter sobre um objeto, sobre uma situação e
sobre o que lhes está associado” (DUVAL, 1993, p.38). São internas e
conscientes; geralmente são representações semióticas interiorizadas. As
computacionais, assim como as mentais, são internas, porém, não conscientes.
As semióticas "... são produções constituídas pelo emprego de signos
pertencentes a um sistema de representação que têm dificuldades próprias de
significância e de funcionamento" (DUVAL, 1993, p.39). As representações
semióticas não são internas nem externas, mesmo que muitos confundam as
representações semióticas como meras exteriorizações das representações
mentais. "Não se pode considerar as representações
semióticas como simplesmente subordinadas às
representações mentais, uma vez que essas
últimas dependem de uma interiorização das
primeiras e sozinhas as representações
semióticas permitem certas funções cognitivas
essenciais, como a do tratamento" (DUVAL, 1993,
p.44).
4 Um registro de representação é, segundo Duval (1993), um sistema semiótico que tem as funções cognitivas fundamentais no funcionamento cognitivo consciente.5 Duval considera três tipos de registros de representação: o figural, o simbólico e o da língua natural.6 As representações semióticas têm dois aspectos: a forma (representante) e o conteúdo (representado).
27
Para o autor, a mobilização dos vários registros de representação é
fundamental para a função cognitiva do pensamento humano. Na Matemática,
é a articulação dos registros que conduz ao acesso à compreensão matemática
e esta compreensão sugere a coordenação de ao menos dois registros de
representação semiótica, dos quais um é a utilização pelo aluno da linguagem
natural. Porém, a coordenação entre os registros, apesar de ser fundamental
para a compreensão, não é suficiente. É essencial não confundir os objetos
matemáticos com suas distintas representações.
Por exemplo, considere uma circunferência e seus distintos registros de
representação:
(a) representação na língua natural: lugar geométrico, no qual os pontos
do plano são eqüidistantes de outro ponto, chamado centro;
Figura 3: Representação gráfica de uma circunferência
Um aluno pode ser capaz de resolver um problema envolvendo a
circunferência algebricamente ou de outra forma, mas nada garante que ele
tenha a compreensão desse objeto matemático.
"O ponto comum à grande maioria dos bloqueios
dos alunos, quaisquer que sejam os domínios de
atividade matemática e qualquer que seja o nível
do currículo, é a incapacidade de converter a
representação de um objeto em uma outra
28
representação do mesmo objeto" (DUVAL, p.53,
1993).
Para resolver esse problema, Duval ressalta a necessidade de duas
operações cognitivas relacionadas ora ao objeto matemático, ora à sua
representação. Uma delas é a "semióse" que está associada à produção e à
apreensão de uma representação semiótica. A outra, "noésis", refere-se à
apreensão conceitual do objeto. Ambas mobilizarão diferentes atividades
cognitivas, que deverão ser interligadas e examinadas entre si. "Não há noésis
sem semiósis, é a semiósis que determina as condições de possibilidade e de
exercício da noésis" (CASTRO, 2001, p.12). Duval ainda insiste que muitos
registros devem ser mobilizados para que os objetos matemáticos não sejam
confundidos com suas representações, de forma que venham a ser
reconhecidos em cada uma delas.
Normalmente, os sistemas semióticos têm como primeiro registro de
representação a língua natural e, por meio desta, criam-se outros sistemas
semióticos que coexistem. Geralmente, o progresso dos conhecimentos é
sempre acompanhado pela criação e pelo desenvolvimento de sistemas
semióticos novos e específicos. Na Matemática, mais do que "meios de
comunicação", as representações semióticas possibilitam realizar tratamentos
em objetos matemáticos que dependem exclusivamente do sistema de
representação utilizado. Dessa forma, as representações semióticas são
necessárias e primordiais ao desenvolvimento da própria atividade matemática.
Segundo Duval, a transformação de um sistema de representação em
outro, atividade ligada à semióse, pode ser de dois tipos: o tratamento e a
conversão. O primeiro é uma transformação que ocorre no mesmo sistema de
representação; é uma transformação estritamente interna a um registro.
Existem tratamentos que são específicos a cada registro e que não necessitam
de nenhuma contribuição externa para serem feitos ou justificados. Um
exemplo de um tratamento é a transformação da equação 35 =+x em x = -2.
O segundo é uma transformação que muda de sistema de representação,
fazendo referência ao mesmo objeto, ou seja, muda-se a representação, mas
29
não se muda o conteúdo. Um exemplo de conversão é a transformação de uma
função na forma algébrica para a forma gráfica.
O autor ainda ressalta que o tratamento normalmente é a transformação
que mais se prioriza no ensino, privilegiando a forma mais que o conteúdo. Não
se é dada a importância devida às conversões e os tratamentos são escolhidos
na forma que mais convém, isto é, de uma forma que seja mais fácil a
compreensão pelos alunos. Para Duval, é na conversão que mecanismos
subjacentes à compreensão serão desvelados. São nas conversões que as
mudanças dos registros de representação se mostram mais eficazes para a
formação conceitual - aquisição de conceitos.
A conversão não é uma transformação trivial; é um processo
cognitivamente complexo, pois exige uma compreensão global e qualitativa das
representações de registros utilizados. A complexidade da conversão só será
compreendida se os sistemas semióticos forem vistos em sua relação entre
conhecimento/representação. Mudar de um registro para outro não significa
apenas mudar o tratamento de um objeto; significa também explicar suas
propriedades ou seus distintos aspectos.
O processo de conversão enfrenta dois fenômenos que fatalmente
contribuem para as dificuldades enfrentadas pelos alunos na coordenação e
compreensão dos registros de representação: a congruência e a não-
congruência.
Para que dois sistemas semióticos sejam congruentes é preciso que
haja uma correspondência semântica entre as unidades significantes, ou seja,
é preciso que a representação terminal (representação de chegada)
transpareça na representação de saída (representação de partida). Por outro
lado, se a representação terminal não transparece a representação de saída,
temos o fenômeno da não-congruência.
Podemos exemplificar esses fenômenos conforme as situações
apresentadas a seguir:
30
a) Representação na linguagem natural: duas retas são paralelas se
forem coplanares e não se interceptarem.
Representação da Figura:
Figura 4: Representação geométrica: retas
b) Representação na linguagem natural: se dois ângulos são opostos
pelo vértice, então eles são congruentes.
Representação da Figura:
Figura 5: Representação geométrica: ângulos
No primeiro exemplo, existe uma correspondência semântica entre o
enunciado inicialmente apresentado e a figura final. Se, a partir da figura,
quiséssemos chegar ao enunciado, é bem provável que não haveria problemas
em fazê-lo. Sendo assim, as representações utilizadas no primeiro exemplo
são congruentes. Já no segundo exemplo, mesmo que a figura faça referência
ao enunciado, ela também pode ser interpretada para outros objetos
matemáticos, como retas perpendiculares, ângulos retos são congruentes,
enfim, não existe uma congruência imediata entre as representações utilizadas.
É necessário mobilizar os registros para associá-los ao mesmo “objeto
matemático”.
Por isso, um trabalho envolvendo a compreensão e a coordenação de
vários registros de representação é essencial para a aprendizagem. Suas
vantagens na economia de tratamento (o recurso a uma figura pode resolver
31
um problema geométrico com economia de memória ou mesmo de processos
heurísticos) e na complementaridade das representações são fatores
determinantes na conceitualização e apreensão do conhecimento.
2.3 Obstáculos em procedimentos
Pesquisas relacionadas ao ensino de demonstrações em geometria
destacam alguns obstáculos enfrentados na compreensão e aquisição dos
procedimentos envolvidos em uma demonstração (Gouvêa, 1998; Sangiacomo,
1996; Mello, 1999). Esses obstáculos, conforme apontam os pesquisadores,
podem ser de origens epistemológicas, didáticas e lingüísticas.
Em nossa pesquisa, consideraremos como “obstáculo” a definição dada
por Brosseau (1983) que, substanciado por trabalhos de Bachellard (1965) e
Piaget (1967), analisa o “erro” apoiando-se na noção de obstáculo.
Para Brosseau, o erro é uma manifestação explícita de concepções que
podem, ou não, ser espontâneas, relacionadas a uma rede coerente de
representações cognitivas, que passam a ser “obstáculos” para a aquisição de
novos conceitos.
“O erro não é somente efeito da ignorância, da
incerteza, do azar, como acreditam as teorias
behavioristas e empiristas da aprendizagem, e
sim, efeito de um conhecimento anterior, que
mobilizava seu interesse, seu sucesso, mas que
agora se revela falso ou inadaptado”
(BROUSSEAU, 1983, p.171).
Para o autor, um obstáculo se caracteriza por um
conhecimento/concepção e não pela falta do mesmo. Este, em determinadas
situações, produz respostas adaptadas a certo contexto e, fora dele, produz
respostas falsas. Dessa forma, cada conhecimento pode se mostrar um
32
obstáculo em potencial. Um “obstáculo” pode apresentar resistências ao ser
confrontado com um novo conhecimento que mostra sua inexatidão, assim, sua
identificação é fundamental para a incorporação de um novo saber.
Considerar o “obstáculo” como um conhecimento associado à
incapacidade de compreensão de certos problemas e na dificuldade de
resolvê-los constitui um meio necessário para desencadear o processo de
aprendizagem do aluno, bem como do professor (Gouvêa, 1998). Assim,
estudaremos os obstáculos relativos ao ensino da demonstração (como
técnica) para considerá-los na elaboração de nossa seqüência didática,
evidenciando seus aspectos didáticos, epistemológicos e lingüísticos.
2.4 O ensino de geometria: o papel da demonstração
A produção de pesquisas relacionadas ao ensino de Geometria no Brasil
tem aumentado consideravelmente. Isso é o que relata a pesquisa feita por
Andrade e Nacarato (2003) sobre as “Tendências Didático-pedagógicas para o
ensino de Geometria”. Nesta pesquisa, os autores fizeram um estudo dos anais
dos Encontros Nacionais de Educação Matemática (ENENs), no período de
1987 a 2001, com o objetivo de analisar e identificar as atuais tendências para
o ensino de geometria no Brasil. Ao categorizar os trabalhos selecionados, ao
todo 363, os pesquisadores concluíram que, dentro das categorias
identificadas, a “Geometria Experimental” e a “Geometria em Ambientes
Computacionais” emergiam como as principais novas “vocações”.
Na categoria “Geometria Experimental”, dentre vários assuntos
discutidos, destacamos os relacionados com a demonstração matemática,
definidos pelos autores da pesquisa em uma subcategoria intitulada “Ensino de
Geometria na perspectiva das provas e argumentações/refutações”. Nesta,
alguns trabalhos discutiam o papel da prova no ensino de Geometria, tendo
como ponto de partida as mudanças significativas ocorridas com seu ensino,
33
até então moldado no modelo euclidiano, promovidas pelo Movimento da
Matemática Moderna7, que ocorreu no Brasil nos anos 1960.
Segundo Pavanello (1989), a idéia central do movimento era a de
adaptar o ensino da Matemática às novas concepções surgidas com a
evolução deste ramo de conhecimento. O ensino constituiu-se em priorizar, em
sala de aula, as estruturas algébricas, desenvolvendo-os sem qualquer relação
com os geométricos em uma linguagem simbólica da teoria dos conjuntos.
Para muitos, foi neste momento que um abandono substancial ocorreu no
ensino de geometria.
Este abandono, segundo Pavanello (1989), tem aspectos de natureza
tanto científica quanto educativa. A autora aponta as razões levantadas pelos
matemáticos e as de caráter educacional, considerando:
• O abandono do ensino de geometria (euclidiana), de acordo com
os matemáticos, está fundamentado nos próprios avanços da
matemática como ciência. A dicotomia entre visualização e rigor,
presente na teorização da geometria euclidiana, foi fundamental
na subordinação da mesma à álgebra. Com o modelo da busca
da verdade na matemática, cada vez mais formal e rigoroso,
aspectos intuitivos presentes na formulação da Geometria
Euclidiana, como é o caso recorrente à visualização, não seriam
suficientes para o desenvolvimento do conhecimento matemático,
uma vez que atrelava o estudo somente a duas e três dimensões,
induzindo, às vezes erradamente, a certos resultados. Dessa
forma, o espaço destinado ao ensino de geometria em diferentes
níveis de ensino, diminuiu, dando lugar a sua subordinação à
álgebra e ao cálculo.
7 O Movimento da Matemática Moderna iniciou-se nas discussões sobre a reforma do ensino de matemática, nos anos 1950. Efetivamente se desenvolveu nos anos 1960 e os líderes principais das discussões desencadeadas foram os franceses Dieudonné, Choquet e Lichnerowics. Expandiram-se as discussões para a Bélgica, Canadá, Grã-Bretanha e Polônia e, posteriormente, para o mundo. Ver mais em Pires (2000).
34
“... atualmente é muito complexo falar do ensino
da geometria porque dentro da matemática a
geometria está quase extinta. Hoje em dia,
nenhum matemático se reconhece como
geômetra, não se fazem investigações em
geometria, pois esta foi absorvida por teorias mais
gerais, onde aí sim há investigações” (SAIZ, 1993,
p.45).
• No aspecto educacional, o abandono do ensino de Geometria tem
fortes relações com a formação do educador matemático, esta
baseada em aspectos quase que puramente formais. Por não
entender a complexidade das demonstrações algébricas feitas
durante os cursos de geometria, não associando as relações
existentes entre as duas representações, o educador acaba
relegando o ensino de Geometria ao segundo plano, por não se
sentir preparado para ensiná-la.
Preocupados com o crescente abandono do ensino da Geometria,
movimentos que questionavam a Matemática Moderna surgiram, propondo
uma retomada ao seu ensino. Porém, a tentativa estava mais impermeada na
busca de motivações para esse ensino e, dessa forma, a ênfase recorreu mais
para os aspectos empíricos, abandonando quase que totalmente o raciocínio
dedutivo envolvido nos métodos de validação da Geometria (Andrade e
Nacarato, 2003).
Para Andrade e Nacarato (2003), analisando as produções referentes ao
ensino de Geometria, esse quadro começou a mudar, especialmente na última
década, em decorrência da Avaliação Nacional do Livro Didático. Segundo
Nasser e Tinoco (2001), com o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD),
muitos livros se adaptaram aos guias, propondo atividades envolvendo
processos de inferência, análise, argumentação, tomada de decisões, crítica e
validação de resultados. Juntamente com esse programa, produções da
comunidade de educadores matemáticos também contribuíram para um novo
35
olhar sobre o papel da demonstração (prova) no ensino de Geometria,
especialmente na educação básica. As questões que mais inquietavam eram:
Qual o sentido de se falar em demonstrações em Geometria nesse nível de
escolaridade? Como trabalhar as demonstrações de forma significativa8?
O que se percebeu nas produções acadêmicas era que muitas delas
recorriam à intuição, à experimentação e às argumentações para “demonstrar”
os teoremas da Geometria, porém, a sistematização do processo na linguagem
formal da matemática não estava ocorrendo. Por qual motivo a transposição
didática não ocorria? Para Almouloud (1999), as dificuldades de se trabalhar
com a sistematização estão associadas a obstáculos de naturezas
epistemológicas, pois muitos professores entendem que uma demonstração é
um processo de validação e, como tal, justificativas, argumentações e provas,
mesmo que baseadas apenas em representações figurais, já seriam suficientes
para se caracterizar uma demonstração matemática. Mas, e o seu aspecto
formal?
A demonstração matemática é um processo de validação, que visa
comprovar a veracidade de um enunciado, assim como explicar e elucidar essa
comprovação (de Villiers, 2001). Porém, a demonstração também tem um
aspecto de comunicação e, como tal, utiliza uma linguagem específica de
domínio da ciência matemática: a algébrica. Dessa forma, para fazer uma
demonstração matemática, é necessário se apropriar da linguagem utilizada e
saber operacionalizar dentro da mesma.
“O modo de argumentação por excelência é a
prova rigorosa ou demonstração formal, envolta
em paradoxos, mas com o objetivo de firmar,
definitivamente, a veracidade das afirmações
Matemáticas” (GARNICA, 2002, p.97).
8 Significativa: ter sentido dentro da própria matemática.
36
“A demonstração é um texto argumentativo da
matemática (com estrutura particular, com
argumentos tomados entre os resultados já
enunciados) cujo significado está ligado à prova”
(BALACHEFF, 1987, p.45).
Para Pais (1996), existem três aspectos epistemológicos que compõem
o conhecimento geométrico: o intuitivo, o experimental e o teórico. O trâmite
entre tais aspectos tem como objetivo final o aspecto teórico, ou seja, o
conceito geométrico. A demonstração matemática tem como ponto de partida a
intuição, a especulação de propriedades por meio de situações experimentais
e, por fim, a sistematização teórica do conceito geométrico trabalhado.
Porém, esse é um processo lento e trabalhoso. A sistematização de
conceitos geométricos por meio de demonstrações, de acordo com a conclusão
da pesquisa feita por Andrade e Nacarato (2003), é um processo social,
decorrente da atividade de comunicação estabelecida em sala de aula entre os
vários atores do ato pedagógico, explicitada pela dinâmica permeada por
processos dialógicos (seja entre professor e aluno, seja entre formador e
professor).
E mais, o trabalho com diferentes registros de representação foi
apontado como um facilitador para a articulação argumentativa no ato de
demonstrar. A passagem de um registro para outro em atividades de
demonstração permite a exploração ativa de conceitos, proporcionando o
estabelecimento de novas relações e a compreensão dos processos
necessários para a teorização do conceito.
Com relação às mudanças ocorridas nos livros didáticos, Gouvêa (1998)
realizou um trabalho de análise de livros didáticos de matemática, com a
intenção de entender as evoluções ocorridas nos mesmos, com relação à
valorização do raciocínio dedutivo e à demonstração. Para isso, ela fez sua
análise baseada nas produções dos últimos 50 anos.
37
A autora constatou que, antes do advento do “Movimento da Matemática
Moderna”, os livros analisados apresentavam todas as demonstrações de uma
forma “estável” e “organizada”, porém, o ensino estava caracterizado na
memorização dos teoremas e das provas que eram apresentadas nos livros.
Com o “Movimento da Matemática Moderna”, os livros sofreram influência das
discussões que estavam sendo estabelecidas naquela época, em sua grande
maioria centrada na atividade ativa do aluno. Com isso, as demonstrações em
duas colunas surgiram, sugerindo um ensino mais divertido e criativo. Todavia,
as atividades ainda se centravam na memorização de procedimentos e na
repetição exaustiva de atividades idênticas, não contribuindo para a
compreensão dos processos da demonstração.
Por fim, Gouvêa, analisando os livros após a influência da Matemática
Moderna, constatou que alguns deles não procuram despertar o
desenvolvimento do raciocínio lógico, pois grande parte dos exercícios
envolvendo demonstração ainda se restringia à memorização, porém, em
consonância com a constatação de Andrade e Nacarato (2003), outros livros
traziam atividades que instigavam o raciocínio lógico-dedutivo, com exercícios
de “justificar”, “provar” e “demonstrar”. De acordo com dados levantados por
Gouvêa, a maioria das tarefas envolvendo este tipo de raciocínio tem como
ponto de partida a atividade experimental. Fundamental para o processo
argumentativo na aquisição parcial de uma prova, a atividade experimental se
mostra um grande avanço no ensino de Geometria, contudo, a sistematização
do processo, nos livros analisados, se mostra mais como um modelo de
demonstração acabada, “acessível por imitação, sem possibilidade de
trabalhá-la, participando com ações e reflexões” (GOUVÊA, 1998, p.78).
A autora conclui que, apesar de melhorias ocorridas na evolução do
tratamento dado a problemas envolvendo demonstrações, a grande maioria
dos professores, além de não trabalhar a Geometria, quando o faz, abandona
quase que exclusivamente as demonstrações, pois afirmam que o rigor e a
formalização dificultam a criatividade do aluno.
38
2.5 A demonstração nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)
Na proposta para o ensino fundamental, de acordo com os PCNs (1997,
1998), o ensino de Geometria encontra-se distribuído em dois blocos: “Espaço
e forma”, “Grandezas e medidas”. No primeiro, a ênfase é dada ao
desenvolvimento de habilidades que levem o aluno a compreender o mundo
em que vive, aprendendo a descrevê-lo, representá-lo e localizar-se nele. O
segundo se destaca por sua relevância social e seu evidente caráter prático e
utilitário, justificada nos PCNs pela gama de situações cotidianas vivenciadas
pelos alunos com relação a problemas que envolvem a necessidade de medir,
compreender o que é medir e estabelecer unidades de medida padronizadas.
Inicialmente, as orientações didáticas dos PCNs para o ensino de
Geometria se baseiam no aspecto experimental, pois é a partir de suas
experiências que o aluno aprenderá a construir uma rede de conhecimentos
que, posteriormente, lhe possibilitará distanciar-se do espaço sensorial ou
físico, dando espaço ao conhecimento geométrico a partir de relações
abstratas.
“É o aspecto experimental que colocará em
relação esses dois espaços: o sensível e o
geométrico. De um lado, a experimentação
permite agir, antecipar, ver, explicar o que se
passa no espaço sensível, e, de outro lado,
possibilita o trabalho sobre as representações dos
objetos do espaço geométrico e assim,
desprender-se da manipulação dos objetos reais
para raciocinar sobre representações mentais”
(BRASIL, 1997, p.126).
A preocupação na fase inicial do ensino fundamental é o
estabelecimento das relações do conhecimento geométrico com o mundo
sensível por meio da visualização, da experimentação e da observação.
39
“O pensamento geométrico desenvolve-se
inicialmente pela visualização: as crianças
conhecem o espaço como algo que existe ao
redor delas (....). Por meio da observação e
experimentação elas começam a discernir as
características de uma figura, e a usar as
propriedades para conceituar classes de
formas” (BRASIL, 1997, p.127).
Neste estágio, o objetivo não é a formalização dos conceitos
geométricos e, sim, uma exploração dos mesmos por meio de estratégias tanto
pessoais quanto instrumentais (uso de material concreto). As informações
devem ser tratadas de forma a instigar os alunos a perguntarem, justificarem e
desenvolverem o “espírito de investigação”.
É a partir do quarto ciclo (7ª e 8ª séries) que se propõem atividades que
favoreçam o raciocínio dedutivo e a introdução da demonstração,
apresentando, ainda, verificações empíricas.
“Embora no quarto ciclo se inicie um trabalho com
algumas demonstrações, com o objetivo de
mostrar sua força e significado, é desejável que
não se abandonem as verificações empíricas, pois
estas permitem produzir conjecturas e ampliar o
grau de compreensão dos conceitos envolvidos”
(BRASIL, 1998, p.86).
É nos problemas de Geometria que os alunos perceberão a necessidade
e as exigências que são estabelecidas por um raciocínio dedutivo, porém, as
orientações indicam que isso não significa que um estudo absolutamente
formal e axiomático deva ser feito. Ressalta-se que um trabalho na construção
de argumentos plausíveis vem sendo desenvolvido ao longo dos ciclos
anteriores e, dando continuidade ao trabalho, a prática da argumentação é
fundamental para a compreensão das demonstrações.
40
“Mesmo que a argumentação e a demonstração
empreguem os mesmos cognitivos lógicos, há
exigências formais para uma demonstração em
matemática que podem não estar presentes numa
argumentação. O refinamento das argumentações
produzidas ocorre gradativamente pela
assimilação de princípios da lógica formal,
possibilitando as demonstrações” (BRASIL, 1998,
p.86).
Os PCNs enfatizam que as atividades de Geometria são muito propícias
para que o professor construa, a partir de experiências concretas, juntamente
com seus alunos, caminhos que os levem a compreender a importância e a
necessidade da prova matemática. Evidenciam, ainda, as funções que um
desenho desempenha na busca de uma prova, orientando que suas principais
funções são o de ajudar o aluno a: visualizar, resumir, fazer conjecturas e
provar. Destacamos, com isso, a importância dos registros de representação
da figura.
“Quando os alunos têm de representar um objeto
geométrico por meio de um desenho, buscam
uma relação entre a representação do objeto e
suas propriedades e organizam o conjunto do
desenho de uma maneira compatível com a
imagem global que têm do objeto” (BRASIL, 1998,
p. 125).
Devemos observar que, mesmo que as experimentações com materiais
concretos constituam um forte mecanismo para o convencimento dos alunos,
elas não podem ser tratadas como provas matemáticas, apesar de as mesmas
serem aceitas como tais no terceiro ciclo (5ª e 6ª). As experimentações no
quarto ciclo devem ser vistas como desencadeadoras de conjecturas e
processos que levem às justificativas mais formais.
41
Ao orientar para a concretização de um teorema e posteriormente para a
formalização de sua demonstração, os PCNs sugerem para que as conjecturas
e o discurso teórico se relacionem. O tratamento dado ao papel e as funções
que o desenho (figura) desempenha na prova matemática e a utilização de
registros de representação constitui um fator positivo na aquisição de uma
demonstração. Contudo, não percebemos no estudo feito dos PCNs, tópicos
relacionados com a aprendizagem de técnicas de demonstração e, até mesmo,
da “engenharia” envolvida no processo demonstrativo (estatuto dos elementos
de um sistema formal) e sobre a importância das mudanças de registros de
representação.
2.6 A formação de futuros professores de matemática
Há algum tempo que a comunidade de educadores matemáticos vem
discutindo sobre a aprendizagem da Matemática, insistindo que a mesma não
deve estar limitada ao ensino de técnicas, fórmulas, repetição e memorização
de procedimentos. O ensino deve propor o desenvolvimento de habilidades
relacionadas à capacidade de interpretação, criação e construção de
instrumentos para a resolução de situações problemas.
Muitos acreditam ser na Geometria que o desenvolvimento dessas
habilidades seja favorecido (Pavanello, 2002). A Geometria é um dos campos
da matemática no qual os conhecimentos permitem ampla aplicação em
problemas do cotidiano e em outras áreas e mais, o desenvolvimento de
capacidades cognitivas relacionadas à habilidade de abstrair, o que é
imediatamente sensível.
Porém, pesquisas mostram que o trabalho feito no ensino de Geometria
não tem alcançado seus objetivos: propiciar aos alunos o desenvolvimento de
um tipo de pensamento que favorece a compreensão, a descrição, a
representação e a organização do mundo em que vivem, utilizando para isso
do raciocínio hipotético-dedutivo (PCNs, 1998).
42
Pavanello (2002) aponta que um dos problemas envolvendo o ensino de
Geometria é a própria formação dos professores de matemática,
principalmente “porque os professores consideram sua formação em relação a
este conteúdo bastante precária” (p.80).
Os motivos levantados pela autora como determinantes para essa
constatação, no que tange os cursos de licenciatura, são:
• os alunos aprendem muito pouco sobre Geometria;
• os conteúdos que posteriormente devem ser abordados na
prática profissional (educação básica) não são abordados, ou
essa abordagem é muito superficial;
• prioriza-se a teoria e despreza-se a prática como fonte de
conteúdos de formação;
• falta de articulação entre o saber matemático e o saber
pedagógico;
• trabalho exaustivo em temas mais complexos (acredita-se que
trabalhar temas mais complexos automaticamente possibilitará
aos alunos a compreensão de temas mais elementares).
Para Lorenzato (1995, p.4), corroborando as idéias de Pavanello, “nos
cursos de licenciatura em Matemática a Geometria possui uma fragilíssima
posição”. Sendo assim, a formação do futuro professor fica prejudicada,
desencadeando, conseqüentemente, uma deficiência de conhecimentos, tanto
em termos de conteúdos como em termos de metodologia. Lorenzato conclui
que, por isso, muitos professores, não tendo um conhecimento razoável sobre
a Geometria, muitas vezes preferem não ensiná-la em suas aulas.
“O professor que não conhece Geometria também
não conhece o poder, a beleza e a importância
que ela possui para a formação do futuro cidadão,
então, tudo indica que, para esses professores, o
dilema é tentar ensinar Geometria sem conhecê-la
43
ou então não ensiná-la” (LORENZATO, 1995, p.
3-4).
Então, como ensinar Geometria para os futuros professores? Como
propor, nas licenciaturas, um espaço para a construção de conhecimentos que
atrelem a especificidade da Geometria a uma reflexão sobre métodos para
transpor didaticamente os conceitos geométricos?
Pavanello (2002) afirma que o redimensionamento da atividade docente
“necessita de professores que tenham desenvolvido novas competências não
só para trabalhar com alunos em diferentes níveis de conhecimento
matemático, mas para organizar situações de aprendizagem mais amplas e
significativas” (p.82). Para ela, essa organização pode ser traduzida de acordo
com a seguinte adaptação metodológica:
• conhecer o conteúdo geométrico a ser ministrado, assim como os
objetivos de sua aprendizagem;
• estabelecer, sempre que possível, conexões entre a Geometria e
outros campos de conhecimento, inclusive da própria Matemática;
• trabalhar a partir das representações dos alunos, compreendendo
situações-problemas ajustadas a cada nível e possibilidades;
• trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à aprendizagem;
• planejar e propor dispositivos didáticos para a aprendizagem
(seqüências didáticas);
• envolver os alunos em atividades e projetos de pesquisa com o
objetivo de construírem conceitos geométricos;
• observar e avaliar os alunos em situações de aprendizagem,
numa concepção formativa, possibilitando a correção de rumos do
trabalho desenvolvido em sala de aula.
Porém, no que se refere à construção axiomática da Geometria, parece
ser o desafio ainda maior, pois esta axiomatização tem sido construída de
forma automática, recorrendo apenas à memorização procedimental sem
44
significação alguma para os alunos. Logo, a rejeição pelo ensino das
demonstrações geométricas na Licenciatura é um fato que, inevitavelmente, se
refletirá na prática pedagógica do licenciando , quando este, efetivamente,
atuar na sala de aula da Educação Básica. É necessário que os formadores
alinhem, em sua prática pedagógica, atividades que favoreçam a construção
gradativa dos conhecimentos matemáticos (geométricos) para, finalmente,
sistematizá-los por meio das demonstrações.
“Se na licenciatura deve haver uma construção
axiomática da geometria, e não se discute que
isso seja necessário, esta não pode acontecer
desligada de um trabalho de construção de
conceitos através de atividades, pois esta
construção e a axiomática não são
independentes” (PAVANELLO, 2002, p.83).
A formação do futuro professor de matemática é determinante da forma
como o mesmo irá atuar durante sua prática profissional. É fundamental
conceber a formação como um trabalho abrangente, pois a atividade a ser
desenvolvida em sala de aula exige uma sólida formação teórica e
interdisciplinar que os habilite, não só na compreensão do fenômeno
educacional, mas também no domínio de conteúdos a serem ensinados, como
afirmam Fiorentini, Nacarato e Pinto:
“O saber docente é um saber reflexivo, plural e
complexo porque histórico, provisório, contextual,
afetivo, cultural, formando uma teia, mais ou
menos coerente e imbricada, de saberes
científicos – oriundos das ciências da educação,
dos saberes das disciplinas, dos currículos – e de
saberes da experiência e da tradição pedagógica”
(FIORENTINI, NACARATO e PINTO, 1999, p.55).
45
3 DEMONSTRAÇÃO MATEMÁTICA: CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS, FILOSÓFICAS E EPISTEMOLÓGICAS
É sabido que a Matemática, como ciência, ainda hoje, tem se apoiado no
método axiomático-dedutivo para construir seu conhecimento. A demonstração
tem papel primordial neste método por ser ela parte do "produto" dos
conhecimentos matemáticos. É por meio da demonstração que se constrói
(produz) os conhecimentos matemáticos; que se busca a verdade na
matemática. No referido método, a demonstração é um encadeamento lógico
de raciocínios determinados por dedução de outras verdades estabelecidas,
algumas delas também determinadas pelo mesmo encadeamento lógico
uma demonstração consiste em um conjunto de raciocínios feitos a partir de
verdades já demonstradas ou aceitas sem demonstrações.
À primeira vista, esse método pode parecer um "circulo vicioso", porém,
o que garante a finitude dos procedimentos na formalização de uma
demonstração são os "polêmicos" axiomas, cujas discussões acerca dos
mesmos geraram controvérsias e posicionamentos distintos sobre a busca da
verdade em matemática (Barker, 1969; Silva, 1999; Bicudo, 2002).
Porém, essa visão reducionista do que vem a ser "demonstração" não
nos permite um vislumbre geral sobre como a demonstração surgiu e as
distintas concepções acerca da mesma em Matemática.
Para tal, uma análise histórico-filosófica será feita, seguida de outra não
menos importante, a epistemológica.
3.1 O surgimento da demonstração
Precisar o surgimento da demonstração em matemática não é algo fácil,
tendo em vista a precariedade de documentos. Porém, muitos autores
concordam que a demonstração teve início na Grécia do séc. VI, utilizando-se
46
de relatos posteriores de historiadores gregos por meio de textos não
matemáticos da época.
Considerando-se que o papel da demonstração seria o de validar
alguma hipótese, provar algo, então, seu surgimento precederia aos gregos,
uma vez que babilônios e egípcios, sem se valerem de qualquer estrutura
axiomática, garantiam verdades por meio de procedimentos práticos.
Basicamente, o conhecimento para esses povos se valia da evidência física, da
tentativa e erro, da analogia, etc. (Boyer, 1996; Eves, 1992). Vale ressaltar que,
mesmo se valendo da experiência sensorial, o papiro de Moscou, comprado no
Egito, em 1893, mostrou a sofisticação com que os egípcios encontraram uma
regra para calcular o volume do tronco de pirâmides de bases quadradas.
Como eles fizeram isso, não se sabe, apenas se especula.
Mas, graças aos gregos, estes dotados de espírito crítico e criativo, a
demonstração se tornou o pilar da verdade em matemática. O Sumario
Eudemiano9, uma das poucas fontes sobre a produção grega do período
helênico, relata as contribuições de Pitágoras de Samos (C. 523 a.C.) e de sua
escola à matemática. De acordo com Domingues (2002, p.58), "essa escola
teria sido a responsável pela criação da matemática pura, movida por razões
intelectuais e na esteira do estudo de problemas abstratos". Dessa forma, a
escola pitagórica havia imprimido à sua matemática um caráter mais dedutivo,
mesmo que nenhuma base axiomática tenha sido utilizada para tal.
Mas, foi com Euclides (C. 300 a.C.), em seus "Elementos", que o método
axiomático-dedutivo, mesmo contendo falhas lógicas, marcou para sempre a
busca da verdade em matemática e a demonstração se firmou como a
ferramenta principal para essa busca (Domingues, 2002, p.59-60). Mesmo que
erros lógicos nas demonstrações dos teoremas e até mesmo nas escolhas dos
postulados e axiomas estivessem presentes nos Elementos, o método utilizado
por Euclides perdurou por muito tempo, quando, nos séculos XVII e XVIII, um
abandono considerável do método ocorreu, alavancando avanços
consideráveis na matemática e discussões intermináveis sobre a "busca da
9 Ver mais em BOYER. História da Matemática. p. 32.
47
verdade", por meio das demonstrações (Caraça, 2003; Courant, 2000; Davis e
Hersh, 1995; Milodnow, 2004). Ressalta-se, nesta fase, a criação da geometria
analítica (Descartes 1596-1651) e o cálculo diferencial integral (Newton
1643-1727 e Leibiniz 1646-1716).
De acordo com Courant (2000), o ideal grego cristalizado na
axiomatização e na dedução sistemática não parecia relevante para os novos
pioneiros da ciência. Em um processo intitulado por Domingues (2002) de
"ilógico”, por meio de um autêntico trabalho de "adivinhação" intuitiva, de
raciocínios irrefutáveis entremeados de misticismo sem sentido (metafísica),
com uma confiança cega no poder sobre-humano do procedimento formal, eles
conquistaram um mundo matemático de imensas riquezas.
Essa visão ingênua, declarada por uns demasiadamente metafísica, não
pareceu ser, para alguns, suficiente para ser o método da busca da verdade
em matemática (Boyer, 1996; Lakatos, 1978). A intuição e os raciocínios
heurístico-geométricos já não bastavam para explicar resultados
aparentemente paradoxais. Assim, no século XIX, uma retomada no método
utilizado por Euclides ressurge em uma nova roupagem, inclinando-se ainda
mais para o lado da pureza lógica e da abstração (Domingues, 2002, p.62).
Até perto do final do século XIX, a demonstração
em matemática tinha um caráter grandemente
material. A demonstração de uma proposição era
uma atividade intelectual que visava a nos
convencer e a convencer os outros, racional, mas
também psicologicamente, da veracidade dessa
proposição (DOMINGUES, 2002, p.62).
Em função da tentativa de compreender paradoxos10 que se
apresentavam cada vez mais nos fundamentos da Matemática, o conceito
clássico da demonstração não resistiu e a nova reformulação da idéia de
10 A teoria dos conjuntos de Cantor é um exemplo disso. Sua teoria dos números transfinitos, que mais tarde ficou conhecida como "Paradoxo de Cantor", sofreu severas críticas, principalmente de Russel, que revelou uma inconsistência fundamental no centro da teoria dos conjuntos (ver BARKER, Filosofia da Matemática, p. 111-114).
48
demonstração surgiu sob o novo conceito de demonstração formal. Entre os
matemáticos que contribuíram para essa nova perspectiva, devem-se citar
Frege (1848-1925) e Russel (1872-1970) que, por meio de princípios
"puramente" lógicos, mostravam a possibilidade de se demonstrar uma
proposição, por mais complexa que essa fosse, recorrendo única e
exclusivamente às leis gerais da Lógica, com o auxílio de algumas definições.
“Toda matemática pura trata exclusivamente
de conceitos definíveis em termos de um
número muito reduzido de conceitos lógicos
fundamentais e que todas as suas proposições
são redutíveis a um número muito pequeno de
princípios lógico” (KORNER, 1974, p.42).
Mesmo com o grande avanço em relação aos procedimentos anteriores,
os logicistas carregavam consigo o gérmen de alguns revezes futuros para os
especialistas nos fundamentos da Matemática.
Com as geometrias não-euclidianas e as álgebras não convencionais no
final do século XIX, uma grande liberdade de produção matemática tinha sido
inaugurada e a axiomatização de sistemas matemáticos diversos emergiam
(Boyer, 1996; Domingues, 2002).
Nesse período, a Matemática era vista como uma ciência das deduções
formais, o que pressupunha destituí-la de toda e qualquer conotação material.
Um dos pioneiros nessa nova tentativa de consolidar o conhecimento
matemático por meio da nova "axiomatização" foi Pasch (1843-1931), que
sugeriu uma geometria calcada em alguns conceitos primitivos e fez dos
axiomas que introduziu apenas enunciados formais que serviam para
caracterizar implicitamente esses conceitos. Caso os axiomas pudessem, de
alguma forma, ser pronunciados pela experiência, "as demonstrações que se
seguiam em hipótese alguma deveriam ter qualquer conotação
material" (DOMINGUES, 2002, p.63).
49
Mas, foi com Hilbert (1852-1934) que a nova axiomatização utilizada na
Geometria teve maior sucesso e, no afã de estabelecer não só na Geometria,
mas também nos outros campos da matemática o seu método axiomático,
Hilbert e seus seguidores criaram a "teoria da demonstração formal", um
método que objetivava determinar a consistência de qualquer sistema formal.
Porém, Gödel (1906-1978) provou a impossibilidade11 de estabelecer a
consistência de qualquer sistema matemático. O projeto de Hilbert e sua escola
estavam com os dias contados e a "Crise dos Fundamentos" restabelecida.
Trabalhos de Zermelo (1871-1953), aprimorados por Fraenkel (1891-1965),
tentaram contornar esta crise, porém, mesmo que seus trabalhos tentassem
evitar a "queda" em paradoxos, o sistema criado por ambos estava muito mais
impermeado em fé do que uma adoção matemática (Domingues, 2002; Barker,
1969; Machado, 2001).
A nova axiomatização sugerida por Zermelo e Fraenkel perdurou
soberanamente no século XX, quando um estranho no ninho, o computador,
surgiu e, com ele, uma nova idéia de demonstração, constrangendo os mais
puristas (Domingues, 2002; Davis e Hersh, 1995). Objeções foram feitas, mas
com a ciência cada vez mais dependente do computador e com os
matemáticos não podendo se isolar cientificamente, uma nova idéia do papel
da demonstração parece surgir e inevitavelmente deverá ser aceita: a idéia de
que a demonstração deve mais que convencer - deve instigar a investigação e
a descoberta de novos resultados, mediantes a exploração de novas
oportunidades (de Villiers, 2001).
Historicamente, percebemos o caráter não absolutista da demonstração,
uma vez que nuances distintas na busca da verdade em matemática
aconteceram e ainda acontecem. Mesmo que, no âmago de cada uma das
posições, o papel da demonstração não se desvirtue totalmente, não se pode
esquecer que a sua função não é apenas gerar produto (teoria) matemático,
mas também explicar tais produtos, como resume a colocação de Steen:
11 Gödel estabeleceu um método de associar certas "fórmulas" do sistema formal de Hilbert a enunciados metamatemáticos acerca do sistema, fazendo-o de tal modo que cada uma dessas fórmulas, interpretada normalmente, expressaria um enunciado verdadeiro a propósito dos números apenas no caso de ser verdadeira também a asserção metamatemática a ela associada (Barker, 1969, p.127).
50
"Sua tarefa [dos matemáticos] está clara agora:
não devem eles gastar tempo e energias na
busca do fogo fátuo da verdade que
constantemente lhes foge das mãos. Ao contrário,
deverão encarar suas criações pela óptica da
utilidade e da adaptabilidade às circunstâncias,
com o espírito sempre aberto a possíveis métodos
que possam levar a esses fins. O fato de certos
métodos levarem a contradições, quando usados
indiscriminadamente, não significa que devam ser
abandonados, tal situação apenas aponta para a
necessidade de determinar as áreas nas quais
esses métodos se mostram seguros" (Apud
DOMINGUES, p.55, 2002).
3.2 O papel da demonstração no olhar da filosofia
Polêmicas sobre a busca da verdade em matemática, em especial a
"crise dos fundamentos" (Silva, 1999; Barker, 1969; Caraça, 2003; Courant,
2000), impulsionaram discussões não só no campo da Matemática, mas
também no da Filosofia. As inconsistências dos sistemas sugeridos pelos
matemáticos para a construção do conhecimento, em que a demonstração tem
papel fundamental, desencadearam a criação de "escolas" com visões distintas
sobre a atividade matemática. Um breve ensaio sobre as escolas Intucionistas,
Logicistas e Formalistas será feito, a fim de apontar as divergências e
congruências das mesmas e mostrar como a demonstração é vista por essas
escolas.
Começamos com uma citação de LAKATOS, impulsionando o ensaio a
ser feito:
"Não deveria existir nenhum desacordo acerca da
demonstração matemática. A gente olha com
inveja a suposta unanimidade dos matemáticos,
mas de fato existe uma controvérsia
51
consideravelmente grande na matemática. Os
matemáticos puros negam as demonstrações dos
matemáticos aplicados, enquanto que os lógicos,
por sua vez, repudiam as dos matemáticos puros.
Os logicistas desprezam as demonstrações dos
formalistas e alguns intucionistas rejeitam com
desdém as demonstrações de logiscistas e
formalistas" (1987, p.21).
3.2.1 Intucionistas
Ligados a uma escola filosófica fundamentada especialmente pelas
idéias de Kant e Brower (Barke, 1969; Machado, 2001), os intucionistas
acreditam que a Matemática é uma construção de entidades abstratas, feitas a
partir da intuição do matemático, de forma que a construção prescinde de uma
redução à linguagem lógica ou de uma formalização rigorosa, característica de
um sistema dedutivo.
"O primeiro ato do intucionismo separa por
completo a Matemática da linguagem matemática,
em particular dos fenômenos da linguagem que
descreve a lógica teórica e reconhece que a
matemática intucionista é essencialmente uma
atividade sem linguagem...”(KORNER, 1974, p.
155).
Kant sustentava que as leis que regiam os números e a geometria
euclidiana eram, ao mesmo tempo, a priori e sintéticas12. Um exemplo desse
tipo de conhecimento, de acordo com Kant, são nossas intuições sobre o
tempo e espaço. Ele explica a natureza a priori afirmando que aquelas
intuições são propriedades inerentes da nossa mente e que o nosso
conhecimento sobre o tempo e o espaço é sistematizado pela aritmética e pela
12 Conhecimento será a priori quando não for justificável pela experiência sensorial e será sintético quando não for justificável pela conexão intrínseca dos conceitos empregados, ou seja, pela maneira de entender os termos empregados. Para melhores esclarecimentos, ver BARKER (1969, p.23).
52
Geometria Euclidiana, respectivamente (Hersh e Davis, 1995, p.309). Nessa
perspectiva, a explicação para a existência do conhecimento sintético e a priori
estaria baseado no fato de que, ao conhecer as leis dos números (aritmética),
por meio da consciência do tempo, o espírito ganha uma visão de seu próprio
funcionamento interior e não da realidade objetiva, possuindo a capacidade
mental de repetir, seguidamente o ato de contar. No caso da Geometria
Euclidiana, conhecimento este baseado na consciência do espaço como forma
de intuição, o espírito manifesta em torno de sua própria capacidade de
construir, "puramente", as figuras espaciais (Barker, 1969, p. 99).
A concepção kantiana, baseada na intuição13, apóia-se na idéia de que
todo o conhecimento matemático deve ser "construído" com o auxílio de uma
atividade puramente intuitiva (finita). Sendo assim, a Matemática começa
sempre pelo intuitivo, o finito, e deve conter apenas o que for obtido de um
modo construtivo deste ponto de partida intuitivo (Hersh e Davis, 1995, p. 317).
Para os intucionistas, os entes matemáticos não têm suas existências
postuladas, como acreditam os platonistas, nem é necessário que emerjam do
empírico. Tais entes devem ser construídos passo a passo e constituem um
mundo a parte na filosofia intucionista (Machado, 2001, p. 40).
Tal construção, do ponto de vista dos intucionistas, associada ao que
eles denominam demonstração construtiva (qualquer enunciado matemático
deve ser demonstrado construtivamente), é fator determinante para dizer
acerca da verdade de um enunciado. Dessa forma, se um enunciado afirma a
existência de "algo matemático", devemos saber como construir ou computar
esse "algo" por meio de processos finitos. Se um enunciado classifica esse
"algo" como tal ou qual, deve-se estar em condições de demonstrar, usando-se
apenas um número finito de processos, de qual classe pertence esse "algo". E,
de forma semelhante, é preciso dispor-se de uma contra demonstração
construtiva de qualquer que seja um enunciado, para poder dizer a cerca de
sua falsidade. Logo, "a questão da veracidade da Matemática coloca-se, então,
como um problema interno seu e não como decorrência de sua relação com o
mundo exterior" (MACHADO, 2001, p. 40). 13 Intuição para contar, somente isso.
53
Em casos que não são possíveis demonstrações/contrademonstrações
construtivas, os intucionistas admitem uma terceira possibilidade, sustentando
que um enunciado pode ser falso ou verdadeiro, rejeitando, assim, a lei do
"terceiro excluído” 14. Para eles, um enunciado pode ser dotado de significado
e, ainda sim, não ser nem verdadeiro ou falso. Podemos pensar que, por meio
dessa postura, os intucionistas se viram a salvo de qualquer problema com
relação à consistência do método utilizado, porém, a doutrina segundo a qual
os "entes matemáticos" surgem da pura intuição do processo de contagem é
toda ela muito vaga e discutível.
A penumbra deixada pelos intucionistas sobre a dinâmica das "intuições"
que conduziam os matemáticos à criação de seu mundo autônomo e sobre o
modo como se mesclavam as concepções sobre o espaço e o tempo é uma
deficiência visível da teoria intucionista, se esta for considerada ao "pé da letra”
(Barker, 1969; Machado, 2001).
"... ponto de vista "Kantiano" não existe qualquer
problema de consistência. Infelizmente, contudo,
o corpo real da matemática não pode ser
colocado neste esquema filosófico simples. Os
intucionistas da Matemática moderna não
dependem da "intuição pura" no amplo sentido
Kantiano. Eles aceitam o infinito enumerável como
filho legítimo da intuição, e admitem apenas
propriedades construtivas; porém assim,
conceitos básicos como o do contínuo numérico
seriam banidos, partes importantes da Matemática
existente excluídas e o restante quase
irremediavelmente complicado" (COURANT, 2000,
p.263).
14 Princípio da lógica tradicional que afirma ser um enunciado ou verdadeiro ou falso, não havendo terceira hipótese.
54
3.2.2 Logicismo
A escola logicista tem em Leibniz importantes raízes de sua
fundamentação filosófica (Silva, 1999; Davis e Hersh, 1995). Para ele, existem
duas classes de verdades: as verdades da razão e as verdades dos fatos. As
primeiras são verdades chamadas necessárias e essa necessidade se exprime
por meio de uma análise15 que gera, conseqüentemente, uma decomposição
em proposições mais simples até que se chegue a um ponto em que a
necessidade lógica seja explícita (tautologias). As verdades da razão são
impossíveis de serem negadas, sem que incorram em contradições (Machado,
2001).
As chamadas verdades dos fatos são aquelas cujas proposições são
comprovadas empiricamente, cuja negação não encontra obstáculos, do ponto
de vista lógico. Por exemplo: é uma verdade da razão que o teclado em que
digitamos é um teclado e é uma verdade de fato que a cor do teclado é preta.
Porém, encontram-se nas verdades dos fatos dificuldades de redução a lógica
Leibniziana, uma vez que seu propósito era "criar um método de representar o
pensamento através de signos, de caracteres relacionados com o que se está
pensando” (Machado, 2001, p.23).
Frege (1848-1925), Russel (1872-1970) e Whitehead (1861-1947),
seguindo a doutrina deixada por Leibniz, tentaram fazer com que a Matemática,
em sua totalidade, fosse reduzida a lógica. Em uma primeira tentativa feita por
Frege, este tentou demonstrar que as leis da aritmética são todas elas
reduzíveis às leis da lógica, de forma analítica por meio de uma visão racional
(Barker, 1969, p.107).
"Na Aritmética não nos preocupemos com objetos
que chegamos a conhecer de fora, como algo
alheio... mas com objetos que se apresentam
15 A regulamentação das análises é feita a partir do princípio da não-contradição e por meio de identidades.
55
diretamente à Razão e que, por se assemelharem
a ela, são inteiramente transparentes à Razão"
(MACHADO, 2001, p.26)
Russel e Whitehead vão além. Para eles, não só as leis da aritmética
poderiam ser demonstradas apelando a leis da lógica, mas toda a matemática
o poderia (Davis e Hersh, 1995; Russell, 1974; Silva, 2002). Em “Principia
Mathematica”, os dois se “lançam na tarefa de esvaziar a Matemática, ou pelo
menos parte dela, de conteúdo próprio, reduzindo-a a lógica e, portanto à teoria
das formas vazias do pensamento correto” (SILVA, 1999, p.47).
Na perspectiva lógica, diferentemente da intucionista, as demonstrações
podem e devem ter um caráter não-construtivo e não parece haver qualquer
justificativa para pensar que um enunciado não seja verdadeiro nem falso, uma
vez que a lei do terceiro excluído aniquila esse tipo de pensamento (Russel,
1974; Körner, 1974; Barker, 1969).
Os logicistas adotam uma posição realista, não admitindo que o "reino
das entidades abstratas" esteja limitado pelos insuficientes poderes criadores
do espírito, pois as entidades existem em si e por si e não como construções
da mente. Dessa forma, o matemático não pode criar ou inventar os objetos
dos quais fala, pois eles estão por aí para serem descobertos e descritos.
Como o próprio Russell afirmou:
"Todo o conhecimento deve ser reconhecido, sob
pena de não passar de ilusão; a Aritmética precisa
ser descoberta exatamente no mesmo sentido em
que Colombo descobriu as Índias Ocidentais, e
não criamos os números, assim como ele não
criou os índios... Tudo que o puder ser imaginado
existe, e o ser é anterior e não resultado do fato
de ter sido pensado" (apud BARKER, 1969, p.
105).
56
Por meio dessa concepção filosófica realista, os lógicos se viram
exploradores de um terreno até então desconhecido da realidade abstrata,
onde a vasta área da realidade matemática não passava de uma ilha do amplo
continente da realidade lógica. Porém, "quanto maior o sonho maior é a queda"
e as idéias logicistas começaram a se desfazer, antes mesmo de ganharem
contornos definidos (Hersh e Davis, 1995; Barker, 1969; Silva, 1999).
A fim de contornar os paradoxos da Teoria dos Conjuntos de Cantor,
Russel-Whitehead desenvolveram a Teoria dos tipos16, cujo objetivo principal
era formular de modo técnico e rigoroso, o princípio do "círculo vicioso” 17. A
teoria dos tipos foi, sem dúvida, um avanço considerável na lógica matemática,
mas um fracasso com relação aos objetivos iniciais (Barker, 1969; Davis e
Hersh, 1995). Ao tentar excluir os paradoxos da Teoria dos Conjuntos, a
estrutura gerada se tornou tão complicada, que mal podia ser identificada com
a lógica (regras de raciocínio correto). A proposta resultou em uma indesejável
duplicação de entidades, tornando difíceis ou impossíveis a enunciação e a
demonstração de alguns teoremas tradicionais da Matemática. Dessa forma,
"tornou-se insustentável dizer que a matemática nada mais é do que lógica -
que a matemática é uma enorme tautologia" (DAVIS E HERSH, 1995, p.312).
O próprio elaborador da Teoria dos tipos escreveu:
"Queria a certeza da mesma maneira que as
pessoas querem a fé da religião. Pensava que a
certeza seria encontrada mais provavelmente na
matemática do que em qualquer outro lado. Mas
descobri que muitas demonstrações matemáticas,
que os meus professores queriam que eu
aceitasse, estavam cheias de falácias e que, se,
na verdade, a certeza pudesse ser encontrada na
matemática, teria de ser num novo campo, com
fundamentos mais sólidos do que os que até aí
16 Ver mais em Russell, Introdução a Filosofia da Matemática (1974).17 Para Russel, os paradoxos da Teoria dos Conjuntos de Cantor tinham raízes findadas no fato de violarem a regra do "Princípio do círculo vicioso" que, segundo Russel dizia: "Se, admitindo que uma dada coleção tivesse um total, ela teria elementos definíveis apenas em termos desse total, então, a coleção não tem um total". Na tentativa de definir o número de números cardinais, Cantor contradiz o "princípio do círculo vicioso", uma regra indiscutivelmente válida (Barker, 1969, p.112-119).
57
tinham sido julgados seguros... cheguei à
conclusão que não podia fazer mais nada para
tornar o conhecimento matemático isento de
dúvida" (apud DAVIS E HERSH, 1995, p.
312-313).
3.2.3 Formalistas
Assim como para os intucionistas, a escola formalista tem raízes nas
concepções de Kant, porém, para eles não existem objetos matemáticos. A
matemática consiste apenas em um emaranhado de definições, axiomas e
teoremas, meras "fórmulas", estas destituídas de qualquer significado e relação
com a realidade objetiva (Lakatos, 1978; Körner, 1974).
A pretensão inicial dos formalistas era a de se obter um sistema formal
em que toda a matemática clássica pudesse estar alocada de forma
consistente e completa, estabelecendo a matemática como a "ciência dos
sistemas formais", estes destituídos de qualquer interpretação, considerados
apenas como um "jogo sem sentido". As peças desse jogo não têm significado
próprio, ou seu significado não interessa para o matemático/jogador.
Segundo Silva (1999), o formalismo "propõe-se a esvaziar o discurso
matemático, ou partes substanciais dele, de qualquer referência, significado ou
verdade, reduzindo-o a um discurso vazio" (p.48). Parafraseando Russel, a
matemática passa ser um discurso do qual “não sabemos do que estamos
falando nem se aquilo que falamos é verdade".
Foi com Hilbert a primeira tentativa significativa de transformar toda a
Matemática em um "sistema formalizado", com a criação do "programa de
demonstração e teoria", em que a atenção está voltada apenas para o arranjo
das cadeias de fórmulas que constituem os teoremas do sistema,
negligenciando interinamente o significado de qualquer uma das fórmulas e a
58
verdade daquilo que, eventualmente, querem dizer (metamatemática)18. Seu
programa, na realidade, era uma tentativa de demonstrar matematicamente a
consistência de toda matemática. Basicamente, seu programa fundamentava-
se da seguinte maneira (Machado, 2001, p.29):
1. a Matemática compreende descrições de objetos e construções
concretas, extralógicas;
2. estas construções e estes objetos dever ser enlaçados em teorias
formais em que a Lógica é o instrumento fundamental;
3. o trabalho do matemático deve consistir no estabelecimento de
teorias formais consistentes, cada vez mais abrangentes até que se
alcance a formalização de toda a Matemática.
Dessa forma, encarando a Matemática como um sistema formalizado, a
demonstração passa a ser caracterizada como qualquer seqüência de fórmulas
bem formadas, cada uma dessas fórmulas sendo um axioma ou um teorema,
este último obtido finitamente por aplicação de alguma regra de transformação,
por meio de fórmulas bem formadas anteriormente na seqüência.
De acordo com Hilbert, os problemas de inconsistência estariam
resolvidos se toda a Matemática fosse estabelecida "formalmente".
"O objetivo da minha teoria é estabelecer de uma
vez por todas a certeza dos métodos matemáticos
(...). A presente situação, em que encontramos
paradoxos, é intolerável. Imaginem só, as
definições e métodos dedutivos que toda a gente
aprende, ensina e utiliza na matemática, o modelo
da verdade e da certeza, conduzem a absurdos!
Se o raciocínio matemático é defeituoso, onde
vamos encontrar a verdade e a certeza?”
(Apud DAVIS E HERSH, 1995, p.316-317).
18 Teoria das propriedades combinatórias da linguagem formal hilbetiana, encarada como um conjunto finito de símbolos, sujeitos a permutações e arranjos segundo as regras de inferência, estas como regras para transformar fórmulas. (Davis e Hersh, 1995, p.315)
59
Porém, Godel e os teoremas da incompletude demonstraram que era
impossível alcançar o programa de Hilbert. Utilizando-se de uma engenhosa
cadeia de raciocínios metamatemáticos, Godel provou que a consistência é
incompatível com a completação. Ou seja, era impraticável determinar a
consistência de toda matemática (completude) por meio de fórmulas de um
sistema, no qual as mesmas refletiam asserções metamatemáticas do próprio
sistema de que faziam parte (Barker, 1969, p.126).
Talvez, a teoria metamatemática de Hilbert já estivesse fadada ao
fracasso mesmo antes de se consolidar, pois, diferentemente dos que pensam
os formalistas puros, Hilbert acreditava que os problemas matemáticos
estavam relacionados com a realidade finita e possuíam significados (Davis e
Hersh, 1995; Silva, 1999). Ele inventou a metamatemática com o propósito de
justificar a matemática do infinito, a matemática por ela mesma, a matemática
sem sentido, contradizendo o que ele mesmo acreditava.
Em verdade, podemos dizer que todos os formalistas devem se sentir
desconfortáveis e com dificuldades de explicar como, sendo a matemática o
que eles crêem ser, se adaptar tão bem à realidade objetiva, como é o caso
das aplicações nas ciências empíricas e em nossa vida cotidiana.
3.3 Estudo epistemológico
Vimos que, ao longo dos séculos, determinar o que é, e como se
alcança a verdade em matemática, foi motivo de discussões e mudanças
significativas de pensamentos acerca do que é uma demonstração e seu papel
na matemática. Porém, tais discussões, além de não chegarem a um
"veredicto", criaram um campo vasto de significações e finalidades da
demonstração em matemática. Dessa forma, não seriam notáveis os
problemas epistemológicos enfrentados para responder a uma pergunta: O que
é uma demonstração matemática?
60
Ao tentar responder essa pergunta, enfatizando os aspectos
epistemológicos, faremos nossas considerações baseadas no ensino, pois
acreditamos que uma análise mais profunda desses aspectos irá
inevitavelmente se relacionar com as idéias da filosofia da Ciência e
Matemática, estas já suscitadas no tópico anterior.
De maneira simplista, temos algumas respostas acerca do problema
exposto no início, que são conflitantes e que interessam ao nosso estudo:
Um matemático diria: É um procedimento utilizado para
"convencer" um grupo de especialistas, através de uma
linguagem formal e regras de transformações;
Um educador matemático diria: É uma forma de "esclarecer",
"explicar" as teorias matemáticas, através de evidências tanto
físicas quanto abstratas. Utilizando-se de especulações e
argumentações;
O estudante de matemática diria: Eh... Bem... Então... Não sei
dizer muito bem o que é uma demonstração matemática. O que
é?
Responder a essa pergunta não é tarefa fácil. Talvez ela nem tenha uma
resposta correta e uma análise de pontos de vistas distintos é fundamental
para um posicionamento crítico e reflexivo sobre o papel da demonstração na
matemática.
Direcionemos a discussão para dois pontos importantes sobre a função
da demonstração: "Convencer" e "Esclarecer".
Barbin (1988), em seus estudos epistemológicos e didáticos sobre a
demonstração, ressalta o seu papel "discursivo" na civilização Grega. Para ela,
a demonstração surge para ser a regulamentadora de um debate contraditório,
público, de acesso a todos, de discussões argumentadas, tornando-se
também, regras de um jogo intelectual. Para a autora, com os assuntos das
cidades sendo postos em discussão pública, a demonstração aparece como
61
ato social que visa a "convencer" o outro. Esse espírito parece ter sido
incorporado pela matemática que surgia naquela época. "Conhecer, é
conhecer por intermédio da demonstração, ou seja, a demonstração é de
ordem da convicção num debate contraditório" (ARSAC, 1988).
Essa visão da demonstração, calcada no discurso e no ato de
"convencer" socialmente, parece ser reconhecida por vários matemáticos.
Afinal, há outros aspectos envolvidos na maneira como os próprios
matemáticos validam suas descobertas, não recorrendo exclusivamente a
"demonstração formal".
"Deveríamos reconhecer que as demonstrações
humanamente compreensíveis e humanamente
verificáveis que atualmente fazemos, são as mais
importantes para nós, é que elas são muito
diferentes da "demonstração formal". Atualmente,
as demonstrações formais são inacessíveis e em
grande parte irrelevantes, temos bons processos
humanos para verificar a validade matemática."
(TRURSTON, 1994, p.171).
"Considero a demonstração como forma de
discurso. È uma maneira de falar própria da
matemática e de ser reconhecido por tradição."
(WHELLER, 1990, p.3).
A convicção de que sabemos a verdade, por meio do discurso, para
alguns autores é o que impulsiona a demonstração matemática. Desse modo, a
demonstração tem um papel de verificação. A demonstração passa a ser um
argumento necessário para validar uma afirmação, um argumento que pode
assumir várias formas, desde que seja convincente.
Vejamos algumas funções da demonstração, de acordo com Polya
(1995), Lakatos (1978), Hanna (1989), Guarnica (1996) e de Villiers (2001),
entre outros:
62
♦ verificação/convencimento: dizem respeito à verdade de uma afirmação.
Podem ser feitos por meio de procedimentos empíricos e de raciocínio
indutivo;
♦ explicação/clarificação: têm a função de explicar a verdade de uma
afirmação. Não se satisfaz somente pela evidência empírica;
♦ sistematização: organização de resultados num sistema formal;
♦ descoberta: invenção de novos resultados;
♦ comunicação: transmissão do conhecimento matemático;
♦ desafio intelectual: realização pessoal, gratificação da construção de uma
demonstração.
A demonstração como processo de explicação, de esclarecimento, tem
sido defendida por Hanna (1990) em seus trabalhos sobre demonstrações no
currículo. Resumindo, Hanna sugere que o ensino de demonstrações deve ser
apoiado nas demonstrações que explicam, pois elas, diferente das
demonstrações que simplesmente provam a veracidade de um teorema,
explicam por que é que um teorema é verdadeiro.
Poderíamos dizer que a demonstração que convence, vinculada ao
discurso e aos métodos empíricos, é um pontapé inicial para as demonstrações
que explicam, clarificam. Mesmo que estejamos convencidos, por processos
heurístico-empíricos, que a soma dos ângulos internos de um triângulo
euclidiano seja 180º (demonstração que convence), necessitamos de algo que
nos explique, além da evidência física, o porquê desse fato (demonstração que
explica).
Dessa forma, o aspecto de explicação de uma demonstração para
muitos matemáticos tem maior valor do que o de verificação (de Villiers, 2001).
Podemos fazer uma analogia desses dois aspectos da demonstração
com a atividade matemática e o produto desta atividade. A atividade
matemática tem como pressuposto a criação de conceitos matemáticos
63
(demonstração como verificação) e a estes conceitos, chamamos de produto
(demonstração como explicação). Segundo POLYA:
"... o resultado do trabalho criativo de um
matemático é um raciocínio dedutivo, uma
demonstração; mas a demonstração é descoberta
por raciocínio plausível, pela especulação
(guessing). Se a aprendizagem da matemática
reflete, em alguma medida, a invenção
matemática, tem de haver lugar para a
especulação, para a inferência plausível" (1954, p.
83).
No que diz respeito ao ensino de demonstrações, vimos que o processo
de demonstrar, de acordo com os autores pesquisados, passa por várias
etapas até que se chegue a um produto que explique, sem sombra de dúvidas,
um determinado problema. Porém, esse produto pode ser representado de
distintas formas e cada uma delas apresentada corretamente. Então, o que
devemos considerar? Como determinar o que é certo ou errado? Como
estabelecer um padrão de demonstração se podemos estabelecer uma
verdade de várias maneiras?
O desconhecimento das discussões sobre a "Educação Matemática",
por parte dos profissionais da educação, e mais precisamente sobre o papel da
demonstração, gera conflitos epistemológicos na medida em que, ao se
desconsiderar as nuances da atividade matemática e dos produtos gerados,
somos podados uma teoria única, formal, em que a demonstração é algo
pronto, acabado. Como ressalta GARNICA sobre o papel das demonstrações
na Matemática:
"Matemática, portanto, em seu regime de
verdade, é uma outra Matemática, radicalmente
distinta daquela vista sob a perspectiva da prática
profissional dos matemáticos. Distintos regimes
de verdade falam de distintas matemáticas, não
64
de uma única Matemática, plena, onipresente,
onipotente, onisciente, que pode ser atingida de
diferentes formas. Isso não tem sido explicitado
de modo claro, ou falando de outro modo, pode
estar sendo sistematicamente negligenciado"
(2002, p.99).
65
4 PROBLEMATIZAÇÃO E HIPÓTESES DE PESQUISA
Ressaltamos, no referencial teórico, algumas considerações sobre o
processo de ensino/aprendizagem das demonstrações em Geometria e como
esta tem sido abordada no ensino em geral. Consideramos também as
orientações nacionais para o estudo de demonstração e as suas concepções
na história, na filosofia e na epistemologia.
De posse deste aporte teórico, focamos nosso trabalho nas idéias de
Duval sobre a aquisição dos conceitos geométricos e sobre a importância dos
registros de representação nesta aquisição.
Para situarmos melhor nossa problemática, aplicamos um questionário
para os alunos da instituição de ensino na qual a pesquisa foi realizada, com o
objetivo de obter dados concretos que pudessem vir a corroborar algumas das
afirmações e conjecturas expostas nas discussões iniciais e no referencial
utilizado. Procedemos também a uma análise desse questionário.
4.1 Questionário
A fim de verificarmos a relação/conhecimento dos futuros professores de
matemática com a demonstração e seu papel no ensino de Geometria, um
questionário estruturado contendo nove questões fechadas19 e uma aberta foi
elaborado (ver apêndice A, p.170). Sua análise consistirá de uma leitura
quantitativa (para as questões fechadas) e qualitativa (para a questão aberta)
dos dados obtidos.
4.1.1 População
Os alunos de um curso de licenciatura plena em matemática da região
metropolitana de Belo Horizonte foram escolhidos para responder ao
questionário proposto. O referido curso está no seu quarto ano e a primeira
19 As opções de respostas para essas perguntas são apenas sim ou não.
66
Formação Básica
66%
12%
12%
10%
Científ ico Técnico Supletivo Magistério
turma irá se formar no segundo semestre de 2007. Para responder ao
questionário, optamos pelos alunos do 3º ao 7º períodos, pois, de acordo com
a grade curricular da instituição que oferece o curso, as disciplinas de
Geometria Plana e Geometria Espacial já teriam sido ofertadas, com exceção
dos alunos do terceiro e quarto períodos que fizeram apenas geometria plana,
mas, estariam com a geometria espacial em curso.
Após uma preleção do pesquisador, 100 questionários foram distribuídos
e, destes, 49 foram respondidos e analisados.
4.1.2 Dados e análise
Acreditando ser fundamental, para a análise das respostas, o tipo de
formação básica feito pelos pesquisados, pedimos que os mesmos
identificassem de que forma concluíram o ensino médio, a saber: científico,
técnico, supletivo e ou magistério. O Gráfico 1 estabelece aproximadamente o
percentual para cada modalidade:
Gráfico 1: Formação Básica
4.1.3 Análise das respostas dos alunos - dados quantitativos
Os gráficos a seguir apresentam os resultados quantitativos das
respostas dos alunos para as questões de 1 a 9 do questionário, divididos por
Teorema 2 : Duas retas paralelas a uma terceira são paralelas entre si.
Forma condicional: ..........................................................................................................................................................................................................................
Registros de representação:
Teorema Linguagem natural
Linguagem geométrica
Linguagem algébrica
Hipóteses
Tese
Teorema 3: Por um ponto dado, fora de uma reta, existe uma única reta
perpendicular à reta dada.
Forma Condicional:....................................................................................................................................................................................................................
Registros de representação:
92
Teorema Linguagem natural
Linguagem geométrica
Linguagem algébrica
Hipóteses
Tese
• Atividade II
Atividade II - Associando às propriedades, definições e teoremas à figura
geométrica adequada: transposição didática dos registros de
representação.
A atividade II foi elaborada com a intenção de trabalhar o conceito de
figura geométrica na mobilização dos registros de representação, destacando,
assim, a congruência ou não das formas representadas. Reforçamos, nesta
atividade, a determinação das hipóteses e tese de um teorema e suas
representações.
Iniciando a atividade, apresentamos novamente alguns conceitos já
trabalhados apenas para retomar a proposta da atividade anterior.
Lembrando alguns conceitos fundamentais
Definição: Determina os atributos essenciais e específicos de um ente, de tal
forma que o torne inconfundível com outro.
Teoremas: Verdades aceitas mediantes demonstrações pela comunidade de
matemáticos.
Na primeira situação, exploramos a figura geométrica e seus atributos,
pedindo que os alunos correlacionassem, a partir da representação na
linguagem natural, as definições apresentadas à figura correspondente.
93
Tentamos criar situações de forma que as representações figurais pudessem
gerar interpretações dúbias. Esta situação foi feita na questão 1. Na segunda
questão, além de explorar a associação de enunciados com suas respectivas
figuras geométricas, pedimos que as hipóteses e tese fossem determinadas.
Assim fizemos para trabalhar a questão da congruência dos registros de
representação, fator determinante para a compreensão dos processos
envolvidos na construção de conhecimento e, conseqüentemente, no processo
de demonstrar (c.f. referências DUVAL).
Situação 1: Congruência dos registros de representação
1)Associe a cada definição a representação geométrica que mais lhe convier.
Definições Figura Geométrica( 1 ) A distância de um plano com um
ponto exterior a ele, é o comprimento do
segmento perpendicular do ponto ao
plano.
( )
( 2 ) Duas retas são concorrentes, se a
interseção entre as duas for um único
ponto.
( )
( 3 ) Duas retas são perpendiculares, se
forem concorrentes e o ângulo entre as
retas for um ângulo reto.
( )
( 4 ) Mediatriz de um segmento é a reta
perpendicular ao segmento passando
pelo seu ponto médio.
( )
94
( 5 ) Um ponto M é ponto médio de um
segmento, se pertencer ao segmento e
for eqüidistante de suas extremidades.
( )
( 6 ) Um conjunto M é chamado convexo
se, para todo par de pontos P e Q do
conjunto, o Segmento PQ está
inteiramente contido no conjunto.
( )
( 7 ) Um conjunto de pontos se diz
coplanar se existe um plano que contém
todos os pontos do conjunto.
( )
2) Escreva na linguagem algébrica as hipóteses e teses dos teoremas
apresentados e associe a cada um deles a figura geométrica correspondente.
Teorema Linguagem algébrica Linguagem geométrica(1) Se uma reta é
perpendicular a um
plano, então, qualquer
reta paralela à reta dada
também será
perpendicular ao plano
Hipótese:
Tese:
()
95
(2) Duas retas em um
plano são paralelas se
ambas forem
perpendiculares a uma
mesma reta
Hipótese:
Tese:
( )
(3) Se um plano
intercepta dois planos
paralelos, então, as
interseções são duas
retas paralelas
Hipótese:
Tese:
( )
(4) Duas retas
perpendiculares a um
mesmo plano são
paralelas
Hipótese:
Tese:
( )
(5) Se duas retas são
perpendiculares a uma
terceira, então, elas são
paralelas entre si.
Hipótese:
Tese:
( )
(6) Duas retas
perpendiculares a um
mesmo plano são
coplanares.
Hipótese:
Tese:
( )
96
Na situação 2, trabalhamos a criação da figura geométrica para
destacarmos a diferença entre figura20 e desenho21. Propositalmente, criamos
situações em que a figura desenhada poderia representar mais de uma
situação. Também pedimos que as hipóteses e tese fossem destacadas para
frisar a congruência ou não dos enunciados e suas representações.
Situação 2: Desenho e figura geométrica: distinção associada às propriedades
geométricas.
1) Dados os teoremas, preencha o quadro abaixo com o que se pede:
Teorema 1: Teorema fundamental do perpendicularismo
• Se uma reta é perpendicular a duas retas que se interceptam em seu ponto
de interseção, então, ela é perpendicular ao plano que as contém.
Representação algébrica Figura geométricaHipótese:
Tese:
Teorema 2:
• Se uma reta e um plano são perpendiculares, então, o plano contém toda
reta perpendicular à reta dada no seu ponto de interseção com o plano
dado.
20 Figura é a classe de todos os desenhos possíveis do objeto matemático (DUVAL, 1993)21 Desenho é o traçado sobre o suporte material (DUVAL, 1993)
97
Representação algébrica Figura geométricaHipótese:
Tese:
Teorema 3:
• Duas retas perpendiculares a um mesmo plano são coplanares.
Representação algébrica Figura geométricaHipótese:
Tese:
Teorema 4:
• Duas retas em um plano são paralelas se ambas forem perpendiculares a
um mesmo plano.
Representação algébrica Figura geométricaHipótese:
Tese:
98
• Atividade III
Atividade III: Teoremas recíprocos: "se e somente se"
A atividade III tem como objetivo apresentar aos alunos o recíproco de
um teorema. Começamos a atividade destacando, por meio de um breve
esquema, o que é um recíproco, ressaltando que o mesmo não
necessariamente é verdadeiro.
Apresentamos nesta atividade ferramentas de justificação para
estabelecer a veracidade/falsidade de um recíproco, utilizando, para isso,
definições e figuras geométricas. Frisamos que o uso de mais de um registro
de representação se apóia em nossas hipóteses de pesquisa, que determina
que os conceitos geométricos envolvidos na obtenção de uma demonstração,
só serão compreendidos na mobilização de mais de um registro (Duval, 1995).
Dado dois teoremas, estes serão chamados de "teoremas recíprocos",
se a hipótese e a tese de um dos teoremas forem trocadas, respectivamente,
Esboce a figura que justifica a veracidade/falsidade.
A atividade II faz apelo apenas à figura geométrica na tentativa de
justificar a falsidade dos recíprocos apresentados, de forma que os alunos
pudessem perceber as propriedades que as figuras “mostram” que contrapõem
o recíproco dado.
2) Correlacione as colunas, para justificar a falsidade dos recíprocos por meio
das figuras geométricas.
105
Enunciados/recíprocos Figuras geométricas(1) Enunciado: Se uma reta é
concorrente com um plano, então, ela é
concorrente com pelo menos uma reta
do plano.
Recíproco: Se uma reta é concorrente
com pelo menos uma reta do plano,
então, ela é concorrente com o plano.
( )
(2) Enunciado: Se uma reta está
contida em um plano, então, eles têm
um ponto em comum.
Recíproco: Se uma reta e um plano
têm em comum um ponto, então, a reta
está contida no plano.
( )
(3) Enunciado: Se uma reta é
perpendicular a um plano, então, ela
forma ângulo reto com pelo menos uma
reta do plano.
Recíproco: Se uma reta forma ângulo
reto com uma reta de um plano, então,
ela é perpendicular ao plano.
( )
Reforçamos na atividade III, além do recíproco, o papel fundamental da
figura em atividades geométrica que visam à verificação e ao estabelecimento
de verdades. O fizemos, pois as atividades que se seguem terão na
representação figural um apoio na obtenção de uma demonstração.
• Atividade IV
Atividade IV – Demonstrando teoremas: utilização de ferramentas na
construção de um raciocínio lógico dedutivo.
A quarta atividade tem foco central nas demonstrações de propriedades
e conceitos geométricos. Na tentativa de auxiliar os alunos na obtenção de
uma demonstração, apresentamos caixas de ferramentas que julgamos
106
importantes na redação de uma demonstração (hipóteses de trabalho) e
algumas “técnicas de demonstração”. Trabalhamos os diferentes registros de
representação na busca da demonstração dos teoremas, reforçando a
congruência semântica dos mesmos.
Para que os alunos compreendessem o significado e os objetivos de
uma demonstração, um texto explicativo foi abordado, explicitando, também, a
lógica subjacente de um sistema formal e a importância de conhecimento
operacional no mesmo para se “alcançar” uma demonstração matemática.
Apresentamos também uma caixa contendo símbolos que usualmente são
utilizados nas demonstrações em registro algébrico, além de outros que foram
utilizados na atividade com significados atribuídos pela pesquisadora.
Um exame mais detalhado do que vem a ser uma demonstração
matemática.
Ao longo das atividades desenvolvidas, apresentamos alguns elementos
que compõem um sistema formal e, mais especificamente, aqueles
fundamentais para o processo de se demonstrar. Destacamos, por meio de
situações, a necessidade do reconhecimento desses elementos para uma
operacionalização em um sistema formal, explicitando a consistência lógica
envolvida na “Engenharia da Demonstração” em teoremas da geometria
euclidiana.
A atividade que se segue tem como foco “técnicas de demonstração” e,
para fazermos uma demonstração matemática de um determinado teorema, é
necessário que compreendamos seu significado, a hierarquização dos
processos envolvidos nesta tarefa, os elementos adjacentes explícitos e
implícitos no teorema e que saibamos mobilizar, além dos registros de
representação, as ferramentas necessárias para o processo de se demonstrar.
Sendo assim, alguns pontos seguem esclarecidos:
• O que é demonstrar?
107
De acordo com o método do qual se vale a matemática para se criar
teorias, demonstrar é provar, sem qualquer dúvida, que um enunciado é
verdadeiro, de tal forma que esta prova seja aceita por uma comunidade de
matemáticos.
Utilizando a definição dada por Balacheff (1987), podemos dizer que uma
demonstração matemática é uma atividade de raciocínio lógico, encadeada
por uma seqüência de enunciados organizados numa regra de dedução,
interferindo nas capacidades cognitivas, metodológicas e lingüísticas,
objetivando validar teoremas por meio de uma explicação que leva a
convicção.
• Para que demonstrar?
Para explicar, verificar, esclarecer, validar e convencer a si e a outros que
um enunciado matemático é verdadeiro.
• Como fazer uma demonstração?
Na matemática, para fazermos uma demonstração, utilizamos postulados,
definições, propriedades e teoremas já estabelecidos em um critério lógico
e seqüencial. Estas serão nossas ferramentas de trabalho na obtenção de
uma demonstração. Nossas demonstrações também deverão seguir uma
hierarquização na utilização das ferramentas, organizadas de acordo com
regras determinadas.
• Tipos de demonstração
As demonstrações podem ser diretas ou indiretas (redução por absurdo).
As diretas são feitas no sentido de hipóteses para a tese, ou seja,
admitindo que as informações nas hipóteses de um teorema sejam
verdadeiras, então, a partir de uma organização lógica de procedimentos,
chegaremos à conclusão também verdadeira.
108
As indiretas são feitas no sentido oposto das demonstrações diretas (da
tese para hipótese), com a particularidade de se negar a tese intentando
chegar à negação da hipótese gerando, assim, um absurdo.
Alguns símbolos importantes:
Símbolo Significado símbolo significado∈ Pertence ⊃ contém∉ não pertence ∀ para todo∃ Existe ∴ logo⊥ Perpendicular ⇒ implica// Paralelas ⇔ se, e somente se⊂ está contido ≅ congruente⊄ não está contido ⁄ tal que
Significado das simbologias utilizadas na atividade IV:
Simbologia Significado
(A,B) = r Os pontos A e B determinam a reta r.
(A, B, C) = α Os pontos A, B e C determinam o plano α.
( r, A) = α A reta r e o ponto A determinam o plano α.
(r, s) = α As retas r e s determinam o plano α.
Na situação 1 da atividade IV, apresentamos alguns esquemas de
demonstração na linguagem figural, algébrica e natural. O objetivo da
representação figural é destacar a relação entre apreensão perceptiva e
discursiva (relacionada aos dados do teorema) por meio da apreensão
operatória. Colocamos à disposição dos alunos, caixas de ferramentas
auxiliares para justificar os passos da demonstração, logicamente. A
mobilização dos registros de representação também desempenhava esse
papel. A hierarquização dos passos evidência nosso objetivo em destacar a
demonstração mais como “uma hierarquização de passos do que uma
hierarquização de conteúdos”.
Situação 1: Utilizando uma caixa de ferramentas para justificar os passos de
esquemas de demonstração
109
1) Dado o teorema, preencha o que se pede utilizando seus
conhecimentos adquiridos até o momento e a caixa de ferramentas
apresentada.
Teorema 1: Dados uma reta r e um ponto P fora dela, existe
exatamente um plano α que os contém.
a) Preencha o quadro.
linguagem natural linguagem algébricaHipóteses
Tese
b) Utilizando a caixa de ferramentas apresentada e as hipóteses do
teorema 1, justifique os passos da demonstração feita a partir da
mobilização das figuras, completando os espaços em branco.
Caixa de ferramentas (CF):
Postulado 1: Dois pontos distintos determinam uma única reta que os contém.Postulado 2: Três pontos não colineares determinam um único plano que os contém.
Figuras:
Passo 1: Passo 2: Passo 3:
Justificativa:
Justificativa:
Justificativa: Justificativa: Justificativa:
Dado na hipótese ....................................... ...................................
c) complete a redação da demonstração na linguagem natural:
110
∃ r e ∃ ..... / P∉.....
∃ A e .... ∈ ...com .....≠...... / (A, B) = .....
(P,A,B) = ..... (r,P) = ....
Temos que, por hipótese, existe uma reta r e um ponto P não pertencente a
................ . Em r, existem os pontos ........ e ......., pois dois
pontos .................... determinam uma única reta (postulado 1 da CF). Os
pontos .......,........ e ......... determinam o plano ......., pois três pontos não
colineares determinam um ...................................... que os contém
(postulado 2 da CF). Como os pontos ...... e ...... pertencem à reta ......,
então, temos que r e ......, determinam o plano ...... .
d) Complete os espaços em branco do esquema demonstração na
linguagem algébrica:
e) A demonstração feita é direta ou indireta? Justifique sua escolha.
Teorema 2: Se duas retas r e s são concorrentes, então, elas
determinam um único plano α que as contém.
Definição: Retas concorrentes são retas que se interceptam em um único
ponto.
a) Preencha o quadro.
linguagem natural linguagem algébricaHipóteses
Tese
b) Utilizando a caixa de ferramentas apresentada e as hipóteses do
teorema 2, justifique os passos da demonstração feita a partir da
mobilização das figuras, completando os espaços em branco.
111
Post. 1 (C.F)
...............
∴
Caixa de ferramentas (CF) :
Postulado 1: Dois pontos distintos determinam uma única reta que os contém.Postulado 2: Três pontos não colineares determinam um único plano que os contém.Postulado 3: Se dois pontos de uma reta estão em um plano, então, a reta está contida neste plano.
Na situação 2, desenvolvemos uma demonstração fora de ordem para
que os alunos a organizassem logicamente, justificando com o auxílio da caixa
de ferramentas e das hipóteses do teorema às opções feitas. Na atividade
proposta, o aluno, após organização dos passos, deveria apresentar, nos três
registros de representação (figural, algébrico e natural), a demonstração feita,
uma vez que a coordenação destes registros é importante para a compreensão
dos conceitos geométricos envolvidos nos problemas (hipóteses de trabalho).
Situação 2: Organizando logicamente o esquema de demonstração
114
r = s
1)Dado o teorema, faça o que se pede:
Teorema: Se dois planos são perpendiculares e uma reta de um deles é
perpendicular à interseção dos planos, então, essa reta será
perpendicular ao outro plano.
Palavra–chave: Planos perpendiculares são concorrentes.
Caixa de ferramentas (CF):
Postulado 1: Em um plano e fora dele existem tantas retas quanta desejarmos.Postulado 2: A interseção de dois planos é uma única reta.Postulado 3: A interseção de uma reta e um plano é um único ponto.Teorema 1: Dois planos são perpendiculares se uma reta contida em um deles é perpendicular ao outro.Teorema 2: Se duas retas são paralelas e uma delas é perpendicular a um plano, então, a outra reta também o será.Teorema 3: Duas retas perpendiculares ao mesmo plano são paralelas.Teorema 4: Se uma reta é perpendicular a um plano, então, ela é perpendicular a toda reta deste plano no seu ponto de interseção.Teorema 5: Duas retas em um plano são paralelas se ambas forem perpendiculares a uma mesma reta.
a) Enumere corretamente de 1 a 6 para obter a redação da demonstração, sem
deixar de justificar os passos que julgar ser necessário. Para isso, utilize a
caixa de ferramentas apresentada.
( ) Sendo r perpendicular à reta s e r’ perpendicular à reta s, ambas
contidas em α, teremos que r e r’ são retas paralelas.
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APÊNDICE A – Questionário aplicado aos alunos
Questionário destinado a alunos do Curso de Licenciatura em Matemática que já passaram pela disciplina de Geometria sobre "Demonstrações"
Nome ( caso queira): _____________________________________________________Período que cursa: ___________
1. Durante sua Educação Básica ( Ensino Fundamental e Médio) você teve aulas de Geometria?
( ) sim ( ) não
2. Caso sua resposta tenha sido "sim" na primeira questão, responda: Você fez alguma demonstração nas aulas de geometria?
( ) sim ( ) não 3. Na Graduação, você trabalhou ou trabalha com "demonstrações" na disciplina de
Geometria?( ) sim ( ) não
4. Você sabe o que é um sistema formalizado?( ) sim ( ) não
5. Você se acha capaz de definir "axioma", "postulado" e "teoremas"?( ) sim ( ) não 6. Você acha que demonstrar é importante para o ensino de Geometria?( ) sim ( )não
7. Você acha necessário o uso de demonstrações no ensino de Geometria?( ) sim ( ) não
8. Você sente alguma dificuldade em demonstrar? ( ) sim ( ) não
9. Você acha que sua formação em Geometria lhe dá subsídios para trabalhar futuramente com as demonstrações?
( ) sim ( ) não
10. Discorra sobre o que você entende ser uma "Demonstração Matemática"?