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A crtica da religio na teologia de Karl Barth1
The critic of religion in the theology of Karl Barth
Adriani Milli Rodrigues2
Resumo / Abstract
Em contraste com vrios telogos que defenderam a religio con-tra
inmeros ataques realizados por filsofos modernos, Karl Bar-th
criticou a religio a partir de uma perspectiva teolgica. Desse
modo, este artigo objetiva descrever o significado da crtica da
religio na teologia de Barth, particularmente em suas obras A carta
aos romanos e Church dogmatics. De maneira geral, a partir do ponto
de vista da doutrina da justificao pela f, a crtica barthiana da
religio claramente envolve uma contraposio ao mtodo teolgico do
protestantismo moderno, espe-cificamente a teologia liberal, que
adota um ponto de partida antropocn-trico ao invs de
teocntrico.Palavras-chave: Mtodo Teolgico; Religio; Teologia
Moderna; Karl Barth
In contrast to many theologians who defended religion towards
the attacks of various modern philosophers, Karl Barth criticized
religion from a theological perspective. Thus, the purpose of this
article is to
describe the meaning of the critique of religion in the theology
of Barth, par-ticularly in his works The epistle to the romans and
Church dogmatics. Ove-rall, from the viewpoint of the doctrine of
justification by faith, the Barthian
1 Artigo original traduzido por Ingrid Lacerda. A verso em ingls
pode ser lida atravs do site da revista Kerygma
(www.unasp.edu.br/kerygma).2 Doutorando em Teologia Sistemtica pela
Andrews University. Professor na Faculdade de Teo-logia do Centro
Universitrio Adventista de So Paulo (Unasp). E-mail:
[email protected]
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O significado atual da religio um produto da modernidade.3 Esse
pero-do, de igual modo, pode ser considerado a era da crtica
religio.4 Alis, a crti-ca moderna da religio conta com um longo
processo que envolveu inicialmente filsofos e ento socilogos,
psiclogos, antroplogos e outros intelectuais.5
Sobretudo, autores como Karl Marx6 (1818-1883), Friedrich
Nietzsche7 (1844-1900) e Sigmund Freud8 (1856-1939), os quais
so
3 Harrison (2006) e Smith (1991, p. 76) destacam que a noo
objetiva da religio como um conjunto de crenas e prticas ligadas
compreenso de uma religio genrica foi formado no Iluminismo.4 Para
mais informao sobre a relao entre a crtica moderna da religio e a
ideia iluminista de emancipao do homem veja Zilles (1991, p. 2),
Maduro (1981, p. 42) e Higuet (2005, p. 13).5 Nesse sentido, Mondin
(2005, p. 82-127) denomina as duas fases desse processo iluminis-ta
e positivista, respectivamente. Ele destaca que a primeira fase
comea com Baruch Spinoza (1632-1677) e termina com W. F. Hegel
(1770-1831). No entanto, talvez a maior crtica da religio nesse
perodo foi feita por David Hume (1711-1776). Ele apresenta seu
argumento contra a religio e contra Deus em A histria natural da
religio (1757) e Dilogos sobre a reli-gio natural (1779). Alm
disso, Assmann e Reyes (1979, p. 12) afirmam que a primeira fase se
baseou na cultura inglesa e francesa, enquanto a segunda fase, na
cultura alem. 6 Em geral, o texto mais comum de crtica da religio
de Marx Crtica da Filosofia do Direito de Hegel. A obra foi escrita
no final do ano 1843 e publicada no German-French Annals (Anais
Franco-Alemes) em 1844. Partindo do ponto de vista do
desenvolvimento histrico do pensamento marxista, esse texto
representa a transio do perodo de crtica filosfica para o perodo de
crtica poltica. Para mais informaes sobre a crtica de Marx religio,
ver Assmann e Reyes (1979). 7 Nietzsche (1981, p. 142; 2008 p. 50),
em sua famosa crtica religio, decretou a morte de Deus e discorda
da crena crist da vida eterna. Alguns comentaristas afirmam que a
crtica religiosa de Nietzsche , na verdade, oposta ao pensamento
metafsico presente no cristianis-mo. Veja por exemplo, Penzo (2002,
p. 30); Sousa, (2008, p. 87).8 Freud (1950; 2009; 1955; 1951), nos
seus trabalhos, em geral, observa a religio como uma neurose
universal da humanidade. Para discusses adicionais veja Palmer
(2001, p. 27). Na realidade, Freud (2009, p. 32) reconhece que o
contedo de sua crtica religio no indi-to: ele somente adicionou uma
base psicolgica crtica de seus precursores.
critique of religion clearly implies an opposition to the
theological method of modern Protestantism, specifically liberal
theology, which adopts an anthro-pocentric, instead of a
theocentric starting point.Keywords: Theological Method; Religion;
Modern Theology; Karl Barth
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considerados os mestres da suspeita (RICOEUR, 1970, P. 32-33),
derivaram e desenvolveram suas principais acusaes contra a religio
e o cristianismo a partir das ideias de Ludwig Feuerbach9
(1804-1872), principalmente de sua proposta da religio como uma
projeo alienan-te dos sentimentos e desejos humanos (GLASSE, 1964,
p. 69).10
Alguns estudiosos afirmam que essas crticas da religio
represen-tam um reducionismo dos aspectos subjetivos da religio,
uma vez que as abordagens utilizadas nessas crticas no so
religiosas, e suas pers-pectivas externas interpretam a religio
inadequadamente.11 Esse argu-mento, no entanto, no explica porque a
crtica moderna da religio tambm encontrada na teologia.
Aparentemente, nesse ponto de vista, um telogo pertencente a uma
religio deveria defend-la, no critic-
-la. Essa verdade no se aplica teologia de Karl Barth; ele
conside-rado o primeiro telogo moderno a criticar a religio.12
Diferentes comentrios e explicaes so feitos sobre a crtica
religio-sa barthiana. Considerando que o ttulo do principal texto
sobre a religio na Dogmtica de Barth foi traduzido para o ingls
como The revelation of God as the abolition of religion 13, parece
que esse telogo era comple-tamente contrrio religio.14 Esse cenrio
incita algumas perguntas, por
9 A crtica religio mais conhecida de Feuerbach est registrada na
sua famosa obra A essncia do cristianismo (1841). Esse livro est
dividido em duas partes principais. Na primeira parte, ele afirma
que a antropologia a verdadeira essncia da religio; na segunda
parte, ele condena a teologia como uma falsa essncia da religio.
Para mais informaes sobre essa interpretao especfica de religio,
ver Alves (1984a, p. 85-101; 1984b, p. 37-46). Alm disso, em 1846,
Feuerbach publicou outro livro sobre religio chamado A essncia da
religio. No entanto, essa obra no ficou to conhecida como a
primeira. Para uma compreenso mais profunda da interpretao de
Feuerbach sobre religio ver Harvey (1997).10 Para uma
contextualizao mais aprofundada, descrio e avaliao das crticas
religio feitas por Feuerbach, Marx, Freud, e Nietzsche, ver Kng
(1981, p. 191-424). 11 Para uma estudo aprofundado ver Eliade
(1977, p. 17); Terrin (1998, p. 18). 12 Ver Bonhoeffer (1997, p.
280-286); Tillich (1967, p. 241). A crtica barthiana da religio
influenciou Bonhoeffer em sua ideia cristianismo sem religio. Para
mais informaes sobre essa influncia, ver Pangritz (2000, p. 87-94);
Wstenberg (1998, p. 31-59); Bethge (2000, p. 872); Zahrnt (1969, p.
134).13 Em alemo, o ttulo Gottes offenbarung als aufhebung der
religion. Na edio em ingls, esse tex-to est presente no 17 de
Church dogmatics [Dogmtica da Igreja], I/2. Ver Barth (1956, p.
280-361). 14 Green (2006, p. 5, traduo livre) escreveu que essa
traduo tem um papel crucial no encorajamento da caricatura da
teologia de Barth, a qual tem distorcido por muito tempo sua recepo
no mundo de fala inglesa. Antes mesmo da publicao de Church
dogmatics I/2 em ingls, em 1956, Barth (1953, p. 7, traduo livre)
reclamou sobre a compreenso equivocada de sua teologia no mundo
teolgico de fala inglesa: Estou eu
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exemplo: como Barth pode defender o cristianismo e criticar,
concomi-tantemente, a religio? Ele considera o cristianismo uma
religio? Como Barth define religio? Ele defende a nulidade ou a
abolio da religio? As pessoas devem ser crists sem religio? Que
base teolgica Barth usa para criticar a religio? Para ele, o que
seria crtica religio?
Nesse contexto, o objetivo deste artigo descrever o significado
da crtica religio na teologia de Karl Barth. Para isso,
discutiremos, primeiramente, a crtica de Barth em sua obra A carta
aos Romanos. Em seguida, abordaremos, a crtica de Barth presente no
17 de Church dogmatics. Ento, finalmente, ser elaborada uma
concluso.
Apesar da produo bibliogrfica de Karl Barth compreender um
grande nmero de livros e artigos,15 neste estudo usaremos apenas
duas de suas obras, que so as mais importantes do autor e incluem
prati-camente toda a sua discusso religiosa. Ademais, elas fazem
parte das duas ltimas fases da teologia de Barth16, a dialtica17
existencialista (1917-1927) e analogia da f (de 1931).18 Dessa
forma, o estudo dessas obras tornar possvel perceber ideias comuns
sobre religio nas duas fases. O tema da religio abordado ao longo
de A carta aos Romanos, em geral relacionado aos principais tpicos
desta obra.19 Em contrapar-tida, Church dogmatics discute a religio
num tpico especfico ( 17). Contudo, visto que o estudo da crtica
barthiana religio em A carta aos Romanos examinar todo o trabalho e
os paralelos entre religio e
decidido quando eu tenho a impresso de que eu existo na fantasia
de muitos mes-mo dos melhores homens basicamente, apenas na forma
de alguns, na maior parte, somatrios respeitveis; de algumas
imagens rapidamente aceitas, e depois copiadas in-terminavelmente,
as quais, obviamente, podem ser desprezadas facilmente? No entanto,
eu dificilmente poderia reconhecer neles qualquer outra coisa que
no fosse meu fan-tasma! [] Devo lamentar ou rir? essa a nica
maneira pela qual eu sou conhecido no mundo teolgico de fala
inglesa? 15 Busch (1994, p. 486) salienta que somente o inacabado
Church dogmatics totaliza 9185 p-ginas. nove vezes o Institutes de
Calvino e quase duas vezes Summa de Toms de Aquino!16 Para
discusses mais profundas sobre a teologia de Karl Barth, veja
Berkouwer (1956); Jngel (1986); Hordern (1955, p. 130-149);
Gibellini (2002, p. 13-31).17 Para mais informaes sobre Karl Barth
e a teologia dialtica, veja Robinson (1968); Ly-den (1992); Taubes
(1954).18 Sobre isso, ver Mondin (1987, p. 45) e Gouva (2006, p.
12). Barth (2006, p. 19-20) expli-ca que seu estudo sobre Anselmo
foi essencial para essa mudana metodolgica e constituiu a chave
teolgica para sua obra Church dogmatics. Ver tambm Barth (1966;
1960, p. 39-65).19 Apesar de um captulo incluir explicitamente
tpicos religiosos (o limite, o significado e a realidade da
religio) essa discusso representa um paralelo entre a lei e a
religio. Outrossim, h paralelos adicionais entre a religio e outros
tpicos, como circunciso e igreja, por exemplo.
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os principais tpicos, o estudo da crtica de Barth religio em
Church dogmatics se limitaro ao 17. Uma vez que o propsito deste
trabalho apenas descrever o significado da crtica de Barth religio,
no cui-daremos de avaliar esta crtica.
A carta aos RomanosA carta aos Romanos, sobretudo, transmite a
mensagem da justifica-
o pela f, de acordo com o entendimento dos reformadores do sculo
dezesseis,20 porm no estilo existencialista dos sculos dezenove e
vinte.21 No contexto da relao entre Deus e a humanidade, Barth
mantm um paralelo claro entre o conceito kierkegardiano existencial
da infinita distino qualitativa entre Deus e os humanos e a noo dos
reforma-dores sobre Deus absconditus. Nessa linha, se discute
primeiramente o tema da religio no contexto da infinita qualificao
distinta entre Deus e a humanidade, o que representa o ponto
principal do livro. Vale ressal-tar que a compreenso da religio
tambm estabelecida atravs de sua relao com tpicos importantes do
texto, especificamente a lei e a igreja.
A religio e a infinita distino qualitativa entre Deus e a
humanidade
O conceito da infinita distino qualitativa entre Deus e a
humanidade constitui a base da compreenso de Barth sobre a religio.
De acordo com essa perspectiva, a queda do ser humano destruiu o
seu relacionamento com Deus. No h uma maneira de se manter comunho
com Deus partindo da humanidade para o Cu. No entanto, para Barth
(1965, p. 36), Deus o
20 Barth (1965, p. 7) inclui vrias citaes de Lutero e Calvino em
seu trabalho e afirma sua apreciao da interpretao genuna da exegese
luterana e da interpretao sistemtica calvinista.21 Ao remeter a
Kierkegaard diversas vezes, Barth (1965, p. 10) apresenta uma
inter-pretao existencial de diversas passagens bblicas. Na verdade,
ele alega que se ele possui um mtodo nesse trabalho, este est
limitado a um reconhecimento do que Kierkegaard chamou de a
infinita distino qualitativa entre o tempo e a eternidade, e a
minha opinio sobre a significncia dessa ideia ter pontos negativos
e positivos:
Deus est no cu, e tu ests na Terra. A relao entre tal Deus e tal
ser humano, e a relao entre tal ser humano e tal Deus, para mim o
tema principal da Bblia e a essncia da filosofia.
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Deus desconhecido,22 e no pode ser identificado com nenhuma
realidade nesse mundo nem compreendido pela razo humana.23
No comeo de seu livro, Barth sustenta a ideia de que a mensagem
pau-lina presente no livro de Romanos a mesma do evangelho de Deus,
e no simplesmente uma mensagem religiosa sobre como um homem pode
se tor-nar divino. Alm do mais, essa mensagem no somente sobre
Deus, mas provm de Deus (BARTH, 1965, p. 28). Isso significa que
essa mensagem no pode ser alcanada pelos esforos do entendimento
humano.24
Nesse sentido, a compreenso humana sobre Deus possvel somente
atravs de sua prpria revelao.25 A humanidade precisa receber essa
compre-enso de Deus, no possvel obt-la por si s. De acordo com a
perspectiva de Barth, essa disposio para recebe-la uma atitude de f
a qual demonstra que no possvel ao ser humano compreender a Deus
sem a ajuda divina.26
Ao passo que a f est ciente da distino qualitativa entre Deus e
a humanidade (BARTH, 1965, p. 39), observando tambm a magnitude de
Deus e a limitao humana, a religio intenta arrogantemente
com-preender o deus desconhecido e ignorar completamente a infinita
distin-o qualitativa (BARTH, 1965, p. 37). Portanto, h uma clara
oposio entre f e religio. Enquanto a f demonstra a fraqueza e o
vazio que precisa ser preenchido com a graa de Deus (BARTH, 1965,
p. 88), a religio demonstra um ser humano cheio de sua prpria
piedade moral e conhecimento de Deus (BARTH, 1965, p. 50). No
contexto da doutrina da justificao pela f, considerando que atravs
da f o ser humano as-sume a salvao pela graa de Deus, na religio
ele busca obter a salvao atravs de suas prprias obras.
22 Pauck (1928, p. 472) considera que o conceito de Barth sobre
Deus como absolu-tamente remoto e desconhecido pelos humanos uma
noo exagerada influenciada pelo platonismo e neokantismo. 23 Nesse
ponto, Barth relembra o princpio calvinista finitum non est capax
infiniti ao invs do conceito luterano de communicatio idiomatum.
Para mais informao sobre essa compre-enso barthiana, ver Barth
(1957a, p. xxiii-xxiv).24 Tillich (1967, p. 241) confirma que a
crtica de Barth sobre religio est associada com sua oposio teologia
natural.25 Barth (1965, p. 112-113) ressalta que Deus pode ser
apreendido somente atravs dele mesmo e da sua fidelidade. Ele
inteligvel somente pela f. A suposio de que Ele , pos-sui e age de
maneira humana rouba sua divindade; e sua reivindicao para
alimentarmos o relacionamento com Ele, deprecia-o para o nvel de
homem, tempo e coisas, e priva-o de seu verdadeiro significado.26
Nesse sentido, Barth (1965, p. 38, traduo livre) afirma que a
recepo do evangelho requer f: O evangelho no se expe nem se
recomenda.
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Esse esforo demonstra que a religio objetiva elevar a humanidade
ao nvel de Deus, porque ela no depende da ao de Deus. Alis,
indiv-duos religiosos costumam se considerar conhecedores de Deus
por causa de suas prprias habilidades. Esse pensamento, todavia,
constitui idolatria, uma vez que esse deus no qual eles acreditam
conhecer , na verdade, feito pelas mos humanas,27 produto de seus
desejos e conhecimentos. 28 Na sua idolatria, porm, a religio o
humano altivo que se revolta contra Deus e pretende tomar o lugar
do divino, tornando a humanidade divina. Barth afirma que quando
colocamos Deus acima do trono do mundo, costuma-mos dizer Deus em
lugar de ns. Ao dizer acreditar nele, ns justificamos, apreciamos e
adoramos a ns mesmos (BARTH, 1965, p. 44, traduo li-vre).
Certamente, essa atitude provoca a ira e o julgamento divino diante
da rebelio humana que caracteriza a idolatria religiosa. Dessa
forma, til compreender a relao entre a religio e a lei.
A religio e a leiA questo original de Romanos 7 a discusso
paulina sobre a lei. A ex-
posio de Barth discute a lei em termos da religio para seus
leitores do sculo XX. O comentrio estruturado com trs subttulos
explcitos: 1) a fronteira ou o limite da religio; 2) o significado
da religio; e 3) a realidade da religio.
O limite da religioDo ponto de vista de Barth, a religio
representa a apresentao mais im-
portante da competncia humana. na religio que a capacidade
humana aparece da maneira mais pura, mais forte, mais penetrante e
mais adaptvel (BARTH, 1965, p. 183, traduo livre).29 Logo, ele diz
que a religio a ltima possibilidade para o ser humano. Nesse
sentido, nada mais pode ser dito sobre religio que sua mais pura,
mais nobre e mais tenaz conquista alcanou e, de
27 Barth (1965, p. 50) destaca que nisso afirmamos o nascimento
do no Deus, no feitio de imagens.28 A afirmao de Barth de que o que
chamado de Deus de fato Homem (BARTH, 1965, p. 44, traduo livre)
concorda plenamente com as ideias de Feuerbach sobre a projeo
humana na religio. Alm disso, h importantes referncias em Church
dogmatics. Ver tam-bm Barth (1957a, p. x-xxxii; 1959, p. 355-360).
Para mais discusses sobre o paralelo entre Barth e Feuerbach, ver
Vogel (1966, p. 27-52); Weber (1966, p. 24-36).29 Levando em
considerao esse aspecto fascinante da religio, Barth (1965, p. 183,
tradu-o livre) afirma que este no pode ser subestimado. Religio
aparece na histria de diversas maneiras diferentes, mas ela se
torna sempre mais atraente onde demonstra esprito de santi-dade
mais forte e sincero.
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fato, precisa alcanar, o pinculo mais alto da possibilidade
humana (BARTH, 1965, p. 185, traduo livre). Curiosamente, essa noo
fascinante da religio o ponto de partida da discusso sobre o seu
limite (BARTH, 1965, p. 229).
Apesar de a religio ser considerada, em geral, a ltima
possibilidade do ser humano, ela , de fato, uma possibilidade
limitada. 30 A religio uma possibilidade estreita, restrita e
ineficaz, porque o limite da religio aponta para o limite da
humanidade (BARTH, 1965, p. 229-230). Sendo a melhor possibilidade
humana, a religio se manifesta e tem sua realidade na histria, est
tecida na textura dos homens, ela pertence mentalmente e moralmente
ao mundo antigo, e se ergue sob a sombra do pecado e da mor-te
(BARTH, 1965, p. 184, traduo livre). No obstante, em sua condio
humana, a religio diz possuir o novo mundo da justia e da vida,
pois de-clara a possibilidade de possuir Deus e de viver em sua
presena (BARTH, 1965, p. 184, traduo livre). A religio, no entanto,
est sob o julgamento de Deus, pois essa atitude representa
claramente a indiferena com a infinita distino qualitativa entre
Deus e a humanidade.
De acordo com Barth (1965, p. 230, traduo livre), a religio um
trao intrnseco ao ser humano, uma vez que seu conceito de limite de
religio est totalmente ligado ao limite humano. Portanto, ele no
pode escapar da religio, pois acima de todas as ocorrncias da vida
humana haver sempre uma som-bra da religio, s vezes mais forte, s
vezes mais fraca. Todos que vivem nesse mundo no podem esperar
escapar a possibilidade da religio. Assim como Paulo destaca que a
lei tem o domnio sobre o homem por toda a sua vida (Rm 7:1), Barth
assegura que a humanidade sempre ser limitada pela religio.
O significado da religioApesar do fato de Barth aplicar o termo
religio no contexto de presun-
o, limitao e morte humana, isso no significa necessariamente
pecado, na sua perspectiva. Certamente, h uma relao prxima entre
esses termos, mas eles no possuem o mesmo significado. Paulo tambm
indica que a lei no pecado, mas atravs da lei o ser humano pode
conhecer o pecado (Rm 7:7), e Barth (1965, p. 242-243, traduo
livre) entende que a religio, assim como a lei, o ponto no qual o
pecado se torna um fato observvel de experincia. No entanto,
esquecendo-se da possibilidade da religio, o ser humano, como
30 Barth (1965, p. 230) afirma que a ltima e a mais inevitvel
possibilidade humana a possibilidade da religio mesmo em sua
variedade mais inevitvel, mais ponderosa, mais claramente definida
e mais impossvel , no fim, nada mais que uma possibilidade humana
e, portanto, uma possibilidade limitada.
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uma criatura em meio a muitas outras, um pecador somente no
segredo de Deus; isto , eles pecam deliberadamente e no
historicamente.
Nesse sentido, o significado da religio que toda a existncia
concreta e observvel da humanidade pecadora. Atravs da religio
possvel per-ceber que o ser humano se rebelou contra Deus (BARTH,
1965, p. 246, traduo livre). Barth (1965, p. 248) menciona a queda
como um exemplo dessa situao. No jardim do den, Ado e Eva ouviram a
seduo do ser-mo da serpente no tema da relao direta entre Deus e o
ser humano. 31 Portanto, Barth afirma que ao se esforar para
alcanar o que no pode ser, o ser humano se depara com o que ele
realmente e imediatamente perde suas foras e cai. Com os olhos
abertos, eles veem que esto separados de Deus e nus. Na tentativa
religiosa de se tornar como Deus, a humanidade reconhece sua
pecaminosidade e sua atual e real distncia de Deus. 32
Do ponto de vista de Barth, a compreenso do significado da
religio depende de quo claro nos o domnio do pecado sobre os seres
humanos nesse mundo (BARTH, 1965, p. 257, traduo livre). Alm disso,
repre-senta o ponto de partida da discusso sobre a realidade da
religio.
A realidade atual da religioDe acordo com a discusso do limite e
do significado da religio, Barth
(1965, p. 257-258, traduo livre) destaca a realidade da religio
em seu as-pecto negativo. Para demonstrar essa realidade, ele se
ope fortemente s ten-dncias romnticas da psicologia da religio que
celebram seu triunfo, tal qual a sua abordagem como a capacidade
humana pela qual todas as ocorrncias humanas so consideradas aes
divinas ou a descrio de Schleiermacher da religio como a msica que
acompanha toda experincia humana.
Ao invs disso, ele prefere considerar o exemplo de J, Lutero,
Kierke-gaard, e Paulo, os quais mantiveram um conceito distinto de
religio. Para eles, religio, longe de ser um lugar onde h abundncia
de harmonia sau-dvel de vida humana, o lugar onde esta aparece
doente, discordante e rompida. A religio no a terra firme sobre a
qual a cultura humana repou-sa tranquilamente. Alm do mais, Barth
(1965, p. 257-258, traduo livre)
31 O conceito da infinita distino qualitativa entre Deus e o ser
humano evidente aqui.32 Essa compreenso pode ser resumida atravs da
seguinte explicao: Atravs do ser hu-mano religioso ns podemos notar
mais claramente que o ser humano carnal, pecador, abominao para
Deus, sob sua ira, arrogantes, fracos, incapazes de compreender e
condes-cendentes com seus desejos. precisamente ao observar o
religioso que observamos a barreira inexorvel com a qual somos
confrontados (BARTH, 1965, p. 185, traduo livre).
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destaca que na realidade a religio est ciente que no deve ser
coroada e se dizer realizada por trazer a verdadeira humanidade;
est ciente de que , na realidade, questionvel, incomodante e
perigosa.
No lugar dessa viso inocente e romntica da religio, Barth (1965,
p. 268) buscava um desfecho da realidade atual da religio. Ele
afirma que seus esforos para conciliar essa nova realidade no podem
ser escondidos para sempre. A bomba que por tanto tempo foi to
cuidadosamente decorada com flores, ir explodir mais cedo ou mais
tarde. Na verdade, a realidade atual da religio de conflito,
estresse, inferno e morte, a desgraa com a qual todos os seres
humanos precisam enfrentar (BARTH, 1965, p. 259, traduo livre). Na
viso de Barth, a compreenso da realidade atual da religio , na
verdade, o reconhe-cimento de que a humanidade pertence morte
(BARTH, 1965, p. 269).
A relao entre a religio e a lei apresenta um entendimento
profundamente negativo da religio. Est conectada com limitao,
pecado e morte. Contudo, o fim das possibilidades humanas tambm o
comeo da possibilidade de Deus, que realizada pelo novo homem, isto
, Jesus Cristo. Ele quem executa a total dissoluo da realidade da
humanidade religiosa desse mundo velho, o que significa que o ser
humano finalmente est livre de sua situao negativa. De acordo com
Barth (BARTH, 1965, p. 269, traduo livre), essa a condio daquela
liberdade que nossa sem os mritos da lei; essa a soluo para a luta
que a religio nos colocou com tal preciso intolerante.
Dessa forma, em Jesus Cristo, a humanidade pode passar de morte
para vida (BARTH, 1965, p. 272). Nisso consiste o conceito de Barth
sobre o julgamento de Deus, o qual formado pela dialtica entre sim
e no. Isso significa que pertencer a Cristo participar em suas
questes e, consequentemente, em suas respostas; em seu pecado e,
por consequncia, em sua justia; em seu sim e em seu no; em sua
morte e em sua vida (BARTH, 1965, p. 283, traduo livre).
Essa possibilidade divina explicada na discusso da religio e a
igre-ja, porque sua exposio se torna mais clara e concreta. Nessa
discusso, termos antropolgicos so substitudos por linguagem
eclesiolgica. Alm disso, h uma apresentao positiva da religio,
juntamente com seu aspecto negativo, o que lhe permite uma
compreenso dialtica.
A religio e a igrejaBarth utiliza os termos religio e igreja ao
longo de A carta aos
Romanos quase sinonimamente. Por fim, ele definiu igreja como
uma re-ligio organizada (BARTH, 1965, p. 340). Assim como a
discusso sobre a
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religio e a lei, esse comentrio dividido em trs partes: 1) a
tribulao da igreja; 2) a culpa da igreja; e 3) a esperana da
igreja.
A tribulao da igreja ocorre precisamente no antagonismo entre a
vocao divina da igreja e sua realidade humana concreta. Esse
contraste revela a opo-sio entre o evangelho e a igreja (BARTH,
1965, p. 333). Barth (1965, p. 332, traduo livre) argumenta que na
Igreja, o Alm transfigurado para algo metafsico, o qual, por
contrastar com o mundo, no nada alm deste. Na igre-ja, toda sorte
de coisas divinas so tidas e conhecidas e so, no entanto, perdidas
e desconhecidas. Portanto, h uma relao clara entre este comentrio
acerca da igreja e a noo barthiana da negligncia da infinita
distino qualitativa en-tre Deus e a humanidade por parte da
religio. Alm do mais, em sua tentativa vigorosa e extensa de
humanizar o divino, a igreja estaria cometendo idolatria.
Assim, a tribulao da igreja indica sua prpria culpa. Ao invs de
viver somente da promessa divina e se diminuir para que Cristo
possa crescer, em comum com tudo que humano, a igreja objetiva
cumprir sua promessa nes-se mundo, vivendo triunfantemente (BARTH,
1965, p. 344). Barth (1965, p. 368) identifica essa situao como
ausncia de f e, citando Lutero, ele men-ciona que a igreja deveria
se atrever a comear na escurido da f. Contudo, ela nunca fez isso,
pois suas atividades so orientadas por obras, sendo guiada por
coisas que as pessoas podem ver. De fato, a igreja evita a solido
no deser-to, no deseja ser estrangeira no mundo. Ela no quer ficar
s nessa posio de cristianismo antes da ressureio, na paixo do
Cristo rejeitado.
Em sua crtica igreja, que a religio organizada, todavia, Barth
(1965, p. 334, traduo livre) no sugere o abandono da igreja ou da
religio. Primeira-mente, ele defende a ideia de que a relao no
eclesistica entre Deus e o ser humano no existe mais nesse mundo.
Depois, ele reconhece que ao criticar a igreja, ele est, na
verdade, criticando a si mesmo, pois ao descrever a igreja estamos
descrevendo a ns mesmos. Portanto, todos que esto seriamente
preocupados com o problema que confronta a igreja so como
perseguidores e defensores. Ento, em sua discusso sobre a culpa da
igreja, Barth afirma que ns mesmos estamos inseridos nela (BARTH,
1965, p. 371-372). Nesse caso, ataques igreja provenientes da ideia
de que nossos inimigos possuem conhecimento superior ou algum mtodo
superior de justificao e salvao so considerados sem sentido (BARTH,
1965, p. 337, traduo livre). Dessa forma, ele conclui que prefervel
ir para o inferno com a igreja a se exaltar, como os autopiedosos,
a se colocar num cu que no existe. Esse pensamento precisa ser
compreendido com base na doutrina de justificao pela f, por-que
Barth acredita que Cristo est onde h seres humanos desconsolados
por
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Revista Kerygma
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saber que foram banidos de sua presena. Cristo no est, nem nunca
estar onde pessoas pensam que se garantiram contra a angstia dessa
compreenso.
Em sua falta de f, a igreja permanece vazia, apesar de desejar
possuir con-tedo. Em seu pensamento dialtico, no entanto, Barth
afirma que a igreja possui contedo quando est vazia, pois a luz
brilha; mas brilha na verdadeira escuri-do. Tal situao a que ele
chama de a esperana da igreja. Certamente, a igreja incentiva a
justificao do ser humano atravs do moralismo e da piedade, mas tal
pensamento representa uma oposio humana a Deus (BARTH, 1965, p.
418). Essa ideia provoca, consequentemente, a ira de Deus contra a
igreja. Mas o no de Deus expresso em sua ira e em seu julgamento
tambm contm o seu
sim. Alis, Barth (1965, p. 416, traduo livre) afirma:
Onde a igreja acaba no por vontade ou ao humana, claro, mas por
decreto divino ali est seu comeo. Onde sua injustia exposta, ali
nasce sua justia. A demolio divina de qualquer igre-ja significa
que cada igreja ressurgir como sinalizao, limiar e uma porta de
esperana. ento quando a religio aparece, como era antes, como um
sinal que se v do outro lado da margem; ela aparece como a
mensageira de Cristo e como o tabernculo de Deus para o ser
humano.
O julgamento divino da igreja, o sim e no de Deus, representa a
justificao da igreja. claro que tambm representa a justificao da
religio. A religio, portanto, no a base do relacionamento de Deus
com a humanidade. Antes disso, a religio o resultado do que Deus
fez no ser humano. Em outras palavras, religio o reflexo inevitvel
na alma na experincia do milagre de f ocorrido. Contudo, a riqueza
da religio no a religio por si s, mas o que ela de fato aponta.
Barth enfatiza que a verdadeira religio um selo, relembrando o ser
humano que este foi estabelecido por Deus e assim continuar (BARTH,
1965, p. 129, traduo livre). Para esclarecer seu comentrio, ele
compara a reli-gio e a igreja com a circunciso, mais
especificamente no que diz respei-to aliana divina com Abrao.33
33 Assim como a circunciso, a religio um selo que aponta para a
aliana feita entre Deus e o homem, a qual ainda no se cumpriu e
ainda aguarda sua inaugurao. O ato de assinar esse contrato no deve
ser confundido com a deciso que a precede ou com a execuo que a
suceder. De modo semelhante, a deciso de Deus precede eternamente o
sinal (BARTH, 1965, p. 130).
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Atravs dessa comparao, Barth (1965, p. 331) argumenta:
Na medida em que a circunciso, a religio e a igreja so colocadas
nesse contexto e servem esse propsito, na medida em que esses
fatores so reconhecidos como sendo desse mundo e se tornaram
humildes por esse reconhecimento, [] estes so qualificados como
justificados e compartilham de seu eterno significado do Fim e do
Comeo. Se, no entanto, eles buscam ser algo que est alm desse
mundo, se, na arro-gncia da religio, eles alegam possuir a
realidade que no lhes pertence, eles so e devem permanecer
desqualificadas mesmo nesse mundo.
CHURCH DOGMATICSO tema da religio aparece em Church dogmatics
especificamente no
17, The Revelation of God as the Abolition of Religion [A
revelao de Deus como a abolio da religio]. A traduo, contudo, do
termo Abo-lition abolio para o termo alemo Aufhebung, o qual tambm
usado dialeticamente por Hegel,34 no expressa o pensamento dialtico
bar-thiano evidente nesse texto.35 Seguindo a maneira de Hegel,
Barth emprega esse termo na ambiguidade de seu duplo significado;
este pode se referir a
elevar e abolir (BROMILEY, 1979, p. 29).36Logo, a traduo do
ttulo do 17 de Church dogmatics expressa so-
mente um de seus significados, deixando de lado a ambiguidade
propos-ta pelo conceito de Barth referente relao entre revelao e
religio.
34 Gray (1997, p. 14-15, traduo nossa) explica que o verbo alemo
aufheben significa literalmente erguer algo ex. uma ma do cho. Mas,
figuradamente e intelectualmente, possui duas outras conotaes
aparentemente contraditrias: preservar, salvar ou guardar algo; ou
cancelar, anular algo. Esse duplo significado da palavra em alemo
foi utilizado por Hegel e selecionado por ele para ser o centro de
seu mtodo dialtico de interpretar o passado, um mtodo que ainda tem
grande importncia no presente. O passado histrico de indivduos,
pessoas, at mesmo pocas , de acordo com ele, um processo contnuo de
cance-lamento e anulao deste passado e, concomitantemente, de
preservar sua essncia numa sn-tese mais elevada, a qual uma
combinao do novo e do antigo, do passado e do presente.35
Inicialmente, os dois ltimos ttulos desse texto em Church Dogmatics
so, respectivamente
Religion as Unbelief (Religio e Descrena) e The True Religion (A
Verdadeira Religio). 36 Seguindo essa interpretao, Green (1995, p.
477) afirma que Barth emprestou o termo favorito de Hegel e
aproveitou-o para seu uso. Ambos os escritores compartilham a
convico que a verdade somente pode ser contada dizendo sim e no; e
encontram na ambiguida-de nica do verbo aufheben uma forma de
articular sua inter-relao dialtica.
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Ao invs de abolition (abolio), poderia ser utilizado o termo
subli-mation (sublimao).37 Assim, seria possvel manter o pensamento
dia-ltico de Barth mesmo em sua terceira fase metodolgica de sua
teologia, particularmente em sua discusso sobre religio.38
A exposio de Barth sobre religio 17 de Church dogmatics est
estru-turada em trs sees: 1) A religio como um problema teolgico;
2) Reli-gio como falta de f; e 3) A verdadeira religio.
A religio como um problema teolgicoEm sua discusso sobre o
problema da religio na teologia, Barth (1956, p.
284), apresenta duas possibilidades opostas para a relao entre a
religio huma-na e a revelao de Deus. A primeira opo estabelecer a
religio como uma norma e um princpio atravs do qual a revelao
explicada, enquanto a segun-da interpretar a religio de acordo com
a revelao de Deus. Essas possibilida-des apontam duas maneiras
diferentes de fazer a teologia. A primeira opo con-sidera a religio
como um problema da teologia, a igreja como uma sociedade e a f com
uma forma de piedade. A segunda opo considera a religio apenas um
dos problemas na teologia, a igreja o lugar onde a religio
sublimada e a f como uma forma de expressar a graa e o julgamento
de Deus.
Enquanto que a primeira opo implica a revelao ser subordinada a
um conceito geral e neutro da religio humana, a segunda estipula
que do ponto de vista da revelao, a religio pura uma atitude de
fidelidade a Deus, de acordo com as escrituras. A opo aceita pela
maioria dos Reformadores, segundo a histria da teologia, foi essa
segunda interpretao. Barth enfatiza que Calvino no Institutes of
the christian religion [Instituies da religio cris-t], entende
religio atravs da Bblia: isto , para ele, a forma e o contedo
37 Essa foi a escolha feita por Green em sua nova traduo em
ingls no 17, intitulada On religion: the revelation of God as the
sublimation of religion [Na religio: a revelao de Deus como a
sublimao da religio]. Considerando o significado dessa traduo, este
artigo ir us-la juntamente com a traduo tradicional de Church
dogmatics.38 Dorrien (2000, p. 4) destaca que as influentes
interpretaes da teologia de Barth por Torrance e Balthasar, que
retratam o desenvolvimento do pensamento de Barth como uma srie de
conversas dramticas, erroneamente chegaram concluso geral que o
telogo em questo abandonou por completo seu pensamento dialtico na
sua ltima fase teolgica. Le-vando em considerao que Torrance era um
editor de Church Dogmatics, possvel que esse conceito tenha, de
alguma forma, influenciado a verso em ingls no 17. Para mais
informa-es sobre a interpretao de Torrance e Balthasar sobre a
teologia de Barth, veja Torrance (1962); Balthasar (1992). Para
estudos mais profundos que, como Dorien, assegurem que Barth
manteve seu pensamento dialtico, veja McCormack (1997, p. 312);
Hunsinger (1993, p. 69); Ward (2008, p. 94); Johnson (1997, p.
31).
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da religio provm somente da revelao (BARTH, 1956, p. 284-285).
Na teologia dos reformadores, a revelao de Deus constitui o ponto
de partida.
Essa posio, porm, no foi mantida pela teologia protestante
moder-na, especialmente nos sculos dezenove e vinte, uma vez que
essa se desen-volveu principalmente do neoprotestantismo, o qual
nasceu no comeo do sculo XVIII, chamado comumente de ortodoxismo
racional. Barth (1956, p. 288) mencionou dois telogos desse perodo:
Salomon van Til (1643-1713) do lado Reformado e J. Franz Buddeus
(1667-1729) do lado Luterano.
Sobretudo, van Till retratou a religio como uma pressuposio
univer-sal, neutra e natural de todas as religies, e Buddeus
afirmou que a religio natural a base para o ser humano conhecer um
ser supremo, que Deus. Ambos utilizaram noes da religio natural
para descrever o papel e a natu-reza da religio, salientando a
necessidade natural do ser humano de obter tal conhecimento.
Certamente, esses telogos e os outros que os seguiram eram todos
homens de evidente seriedade e piedade. Mas em certos detalhes,
eram abertamente conservadores. Ao invs de contradizer a
revelao,
eles sabiam como garantir direitos totais da revelao em sua
teolo-gia, de qualquer maneira aparentemente. Seu objetivo era
encontrar um consenso mais ou menos perfeito entre a Bblia e
ensinamentos tradicionais, por um lado, e por outro, os postulados
de religio na-turalis e as reivindicaes para uma religio genuna de
revelao, qual do incio. (BARTH, 1956, p. 290, traduo livre).
Apesar de os telogos protestantes no se desviarem visivelmente
do curso da ortodoxia do sculo XVII, as implicaes de suas ideias
inverteram o ponto de partida da teologia. Da mesma maneira, embora
a religio tenha sido usada simplesmente para reconhecer e
compreender a revelao, aque-la de fato se tornou a base da teologia
no lugar desta. Partindo dessa perspec-tiva, Barth interpreta as
noes errneas subsequentes da revelao proposta por Christian Wolff,
Schleiermacher, Hegel, D. F. Strauss, L. Feuerbach, E. Troeltsch,
A. Harnack e outros:
E ento, finalmente veio a invaso tumultuosa da igreja e da
teo-logia pela religio natural, da qual ns nos tornamos testemunhas
em nossos dias. De tudo isto, os valentes van Till e Buddeus nem
mesmo sonharam. Ainda assim, eles e sua gerao devem ser lem-brados
como os verdadeiros pais da teologia neoprotestante, por
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meio da qual o caminho foi preparado dentro da prpria tradio da
Reforma. Todos esses movimentos mais ou menos destrutivos e
radicais na histria da teologia durante os dois ltimos sculos so
simplesmente variaes de um nico princpio, o qual foi in-troduzido
por van Till e Buddeus: religio no deve ser compreen-dida sob luz
da revelao, mas a revelao luz da religio. A esse denominador comum,
os objetivos e o programa de todas as mais importantes tendncias da
teologia moderna podem ser reduzidos. (BARTH, 1956, p. 290-291,
traduo livre, grifo nosso).
Na anlise da teologia protestante moderna, Barth (1956, p. 292)
sa-lienta que essa reverso no relacionamento entre revelao e
religio nunca teria acontecido se a teologia protestante no tivesse
hesitado exatamente no ponto que os Reformadores haviam confessado
e defendido to claramente: Jesus Cristo como senhor da
humanidade.
De fato, do sculo XVI ao XVIII, essa crena dos reformadores foi
tes-tada medida que a humanidade comeou a descobrir suas
capacidades e possibilidades e se tornou o centro e a medida de
todas as coisas. Com esse padro antropocntrico, a teologia moderna
protestante passou a conceber uma humanidade distante do senhorio
de Cristo. Barth chama isso de perda de f do protestantismo
moderno:
A real catstrofe que o objeto da teologia foi perdido - a
re-velao em sua singularidade e, ao perd-la, perdeu tambm a semente
da f atravs da qual seria possvel mover montanhas, at mesmo a
montanha da cultura humanista moderna. A per-da da revelao
demonstrada pelo fato de que esta poderia ser trocada, e com ela o
seu prprio direito de nascimento, pelo conceito de religio. (BARTH,
1956, p. 294, traduo livre).
Portanto, na concepo de Barth, estabelecer a religio como base
da teologia tornar esta antropocntrica, enquanto colocar a revelao
nesta posio torn-la teocntrica. Baseando-se nesta segunda
perspec-tiva, Barth (1956, p. 297, traduo livre) explica a relao
entre religio e revelao nesse mundo. Mantendo a analogia fidei e
guiado pela conside-rao cristolgica da encarnao do Verbo, ele
afirma que a unidade da revelao divina e da religio humana
semelhante unidade de Deus e do homem em Jesus Cristo. No entanto,
como Deus o sujeito deste
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evento, ele tambm do outro. A revelao divina precede a religio
hu-mana, assim como a divindade de Jesus precede sua
humanidade.39
Para concluir a relao entre revelao e religio, na qual a ltima
compreendida pela f do ponto de vista da primeira, Barth (2006, p.
52, traduo livre) conclui:
Basicamente, uma questo de reestabelecer a ordem dos concei-tos
de revelao e religio de forma que a relao entre eles se torna
compreensvel novamente e idntico quele evento entre Deus e o ser
humano no qual Deus Deus isto , senhor e mestre o qual por si s
julga, justifica e santifica e o ser humano o ser humano de Deus ou
seja, aquele que aceito e recebido por Deus atravs de sua
severidade e bondade. Baseando-se na dou-trina cristolgica da
encarnao e aplicando-a de maneira lgica, refere-se revelao como a
sublimao da religio.40
Em sua discusso da religio como um problema teolgico, Barth
in-troduz duas ideias que sero desenvolvidas detalhadamente nos
tpicos a se-guir. Do ponto de vista negativo, quando a religio
precede a revelao de Deus, h falta de f. Isso ser discutido no
prximo tpico. Em contrapartida, do ponto de vista positivo, quando
a revelao precede a religio, a religio sublimada pela revelao. Isso
ser discutido no ltimo tpico.
A religio como falta de fBarth (2006, p. 53) inicia essa seo se
opondo ao conceito de essn-
cia de religio e seu uso como medida para classificar as
religies, separan-do algumas como mais elevadas que outras. Logo,
no possvel diferen-ciar o Cristianismo das outras religies
utilizando o conceito de essncia da religio41 Ao invs de definir
religio pelo que ela possui, supostamente,
39 Barth (1963, p. 49) tambm expressa essa ideia em sua discusso
sobre teologia e a Bblia. Ele afirma que teologia cincia que busca
o conhecimento da palavra de Deus falada no trabalho dele cincia
aprendida na escola da Bblia. Alm do mais, Barth (1957b, p. 43,
traduo livre) argumenta, no so os pensamentos humanos sobre Deus
que formam o contedo da Bblia, mas o pensamento divino sobre mim.40
A traduo do termo alemo Aufhebung constitui a principal diferena
entre o texto tradicional de Church dogmatics e a traduo de G.
Green. A primeira diz:We speak of revelation as the abolition of
religion [Ns falamos de revelao como sendo a abolio da religio].
Ver Barth (1956, p. 297).41 Apesar de Church dogmatics utilizar o
termo natureza, Barth provavelmente empre-
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como essa essncia da religio, Barth a define pelo que lhe falta.
Partindo desse pressuposto, a religio falta de f.42
Alm de afirmar que o cristianismo no difere das outras religies,
Barth adiciona essa acusao de falta de f direcionada principalmente
para a reli-gio crist. De fato, Barth (1956, p. 300, traduo livre)
aponta para uma clara relao entre piedade crist e falta de f,
especialmente ao citar Lutero:
A piedade do ser humano blasfema e v e o maior pecado que ele
pode cometer. Semelhantemente, a criatura que faz isso como uma
atitude de adorao e piedade para fugir do mundo comete, do ponto de
vista de Deus, o maior pecado de todos, e esse o estado dos papas e
monges e de tudo que considerado bom para o mundo, mas no tem
f.43
Do ponto de vista de Barth, a afirmao que declara a falta de f
da igreja o julgamento de Deus sobre tudo que humano. No obstante,
no possvel traduzir essa ideia em termos humanos, ela deve ser
compre-endida do ponto de vista da revelao atestado nas Escrituras.
Essa pers-pectiva esclarecida principalmente atravs de dois tpicos
da revelao: 1)
a revelao a entrega e a manifestao de Deus (BARTH, 1956, p. 301)
e, 2) revelao o ato pelo qual Deus se reconcilia com a humanidade,
por causa da graa e pelos seus mritos (BARTH, 1956, p. 307).
O primeiro ponto implica que a revelao se depara com o ho-mem na
pressuposio e na confirmao do fato que as tentativas do homem de
conhecer a Deus baseando-se em seu prprio ponto de vista so
totalmente fteis. Atravs da revelao, Deus conta aos humanos
ga o termo alemo Wesen fazendo aluso procura pela essncia da
religio no sculo XIX, exemplificado notavelmente na filosofia na
obra de Feuerbach chamada The essence of christianity [A essncia do
Cristianismo] e na teologia liberal de Adolf von Harnack em suas
palestras em Berlin sobre o mesmo tema em 1900. Ver Green (2006, p.
131).42 A segunda seo do 17 de Church dogmatics tem como ttulo
Religion as unbelief [Re-ligio como descrena]. Ao usar, no entanto,
o termo alemo Unglaube para caracterizar a religio,Barth no tem em
mente, a princpio, crenas ou doutrinas, mas sim a falta de f, no
senso dos Reformadores de fiducia, confiana nas promessas de Deus.
[De acordo com Barth, religio uma expresso de falta de f, a
propenso do ser humano de desacreditar da certeza da salvao de Deus
em Cristo e de confiar, ao contrrio do que deveria, em seus prprios
esforos] (GREEN, 1995, p. 480 traduo livre).43 Esse um excerto do
sermo de Lutero, de 1523, sobre 1 Pedro 1:18. Ver Lutero
(1955-1976, p. 36-37).
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algo completamente novo que no seria descoberto sem seu auxlio.
Portanto, se algum pode realmente conhecer a Deus, essa capacidade
consiste no fato de que o indivduo verdadeiramente O conhece, pois
Ele se manifestou ao homem (BARTH, 1956, p. 301).
A revelao de Deus, contudo, no alcana seres humanos em situa-o
neutra, mas como pessoas religiosas, particulamente em sua
tentativa de conhecer a Deus a partir de suas prprias perspectivas.
Alis, essa atitude re-ligiosa se coloca claramente contra a f, que
seria a atividade adequada corres-pondente revelao. Enquanto na f o
ser humano reconhece a entrega e a manifestao de Deus, na religio
ele resiste revelao. Portanto, a religio a tentativa humana de
antecipar o que Deus deseja e faz na sua revelao, e ela tenta
substituir o trabalho divino pela manufatura humana. A realidade
divina oferecida e manifestada a ns na revelao substituda por um
concei-to de um Deus desenvolvido arbitraria e intencionalmente
pelo ser humano (BARTH, 1956, p. 302, traduo livre). Em adio, Barth
(2006, p. 58, tra-duo livre) cita Calvino, classificando essa
situao como idolatria: A capa-cidade perptua do ser humano, por
assim dizer, fabricar dolos [] Ele tentado a expressar
exteriormente, atravs de obras, o Deus que ele concebeu
interiormente. A mente, no entanto, gera um dolo; a mo o
fabrica.44
Ao opor atitude de f a atitudes religiosas, Barth (1956, p. 302)
quer demonstrar que a religio uma atividade contraditria revelao.
Diante da revelao, na f os seres humanos escutam, e na religio eles
falam. Na f eles aceitam um presente, na religio, porm, eles tomam
algo para si mes-mos. Por outro lado, a revelao tambm contradiz a
religio.45 Isso significa que quando a luz da revelao aparece, a
religio examinada e exposta como o oposto da revelao, como a falsa
religio da falta de f (BARTH, 2006, p. 64, traduo livre). Nesse
sentido, Barth (1956, p. 307) introduz o segundo tpico sobre a
revelao. Os dois tpicos podem ser compreendidos como dois aspectos
do mesmo conceito. Inicialmente, como um ensina-mento radical sobre
Deus, o primeiro define a revelao como a entrega e
44 Veja Calvino (1816, p. 115). Aqui, Barth relaciona as ideias
de Calvino sobre a mente humana como uma fbrica de dolos com a noo
de Feuerbach sobre Deus como uma projeo humana.45 Barth (2006, p.
59, traduo livre) explica que a revelao no se liga com a religio j
existente e operante do ser humano, mas sim a contradiz, assim como
contradisse a revela-o. Em sua nota explicativa, Green indica que
essa negao da ligao entre revelao e reli-gio a reiterao do
argumento de Barth sobre o chamado ponto de contato para a revelao,
que constitui o ponto-chave de seu debate com Emil Brunner. Para
mais informaes nesse conceito de Barth nos bastidores de sua
discusso com Brunner ver Green (1998, p. 29-33).
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a manifestao de Deus. O segundo tpico, ento, retrata a revelao
como um ato pelo qual, por causa da graa e por meio dela, Deus se
reconcilia com a humanidade. No entanto, o primeiro, que um
ensinamento sobre Deus, expresso no segundo como a assistncia
radical de Deus que vm a ns, que somos injustos e perversos.
Portanto, a principal pressuposio desse segundo tpico que o ser
humano incapaz de fazer algo para si,
seja em parte ou totalmente. Logo, do ponto de vista de Barth,
esse ensino sobre Deus compreende, tambm, um ensino sobre a
humanidade.
Se a revelao a assistncia radical de Deus ao ser humano, e esta
revelao alcana as pessoas na situao de religiosidade, a assistncia
de Deus ocorre em contradio religio. Barth (1956, p. 308, traduo
livre) explica essa contradio afirmando que Jesus Cristo, como a
revelao de Deus, no preenche ou aprimora todas as diferentes
tentativas do ser hu-mano de explicar e representar Deus com base
em seu prprio padro. Si-multaneamente, na medida em que Deus
reconcilia o mundo consigo mes-mo em Cristo, Este substitui todas
as tentativas do ser humano de reconciliar Deus com o mundo e todo
o esforo humano de justificao e santificao, de converso e
salvao.
Vale ressaltar que a revelao de Deus em Jesus anula qualquer
esfor-o religioso. De fato, para realmente ajudar a humanidade,
Deus precisa contradizer e anular a religio humana. No conceito de
Barth, o esforo re-ligioso universal para antecipar a revelao de
Deus , na verdade uma for-ma de o ser humano justificar e
santificar sua humanidade. Logo, os deuses manufaturados pela mente
humana refletem imagens e garantias da neces-sidade e capacidade
humana (BARTH, 1956, p. 309, traduo livre), que pretendem alcanar
uma maneira direta de chegar a Deus pelas suas obras. Nas palavras
de Barth (1956, p. 309, traduo livre), atravs de sua atitude,
ns trancamos as portas para Deus, nos alienamos do que diz a seu
respeito, nos opomos diretamente a Ele. Deus, em sua revelao, em
Jesus Cristo, aquele que levou sobre si os pecados do mundo, aquele
que deseja que lancemos sobre Ele todas nossas preocupa-es, pois
tem cuidado de ns.
De acordo com a dialtica do pensamento de Barth, a anulao da
re-ligio atravs da revelao, que expe aquela como falta de f
expressada na tentativa do ser humano de se justificar atravs de
suas obras, indispensvel para criar a verdadeira religio. A
discusso desse ltimo ponto promove a
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contraparte da abolio da religio ou seja, sua elevao. Esses dois
aspec-tos inclui o que Barth entende pela revelao como a sublimao
da religio.
A verdadeira religioBarth (1956, p. 325, traduo livre) comea sua
ltima seo com uma
concluso de seus dois ltimos tpicos. Essa concluso estabelece a
prin-cipal pressuposio de sua discusso sobre a verdadeira religio:
Ns po-demos falar de verdadeira religio somente no sentido que
falamos de um
pecador justificado. Essa analogia de Barth implica que a
religio nunca verdadeira por si s. Assim como os humanos no so
justos, a religio no verdadeira. Contudo, dada a possibilidade do
ser humano passar pela justificao divina, a religio pode se tornar
verdadeira da mesma maneira. A explanao de Barth sobre a verdadeira
religio, portanto, a discusso sobre a justificao da religio.
Partindo dessa perspectiva, a ideia dialtica de Barth sobre a
sublima-o da religio pode ser compreendida. Apesar de o julgamento
de Deus negar a religio, tambm a eleva atravs da justificao:
Assim como o ser humano justificado, a verdadeira religio uma
criatura da graa. Esta graa, no entanto, a revelao de Deus, a mesma
que diante da qual nenhuma religio pode subsistir como verdadeira,
a mesma que diante da qual nenhum ser humano justificado, a mesma
que nos sujeita ao julgamento de morte. Mas da mesma forma que ela
pode trazer os mortos vida e chamar pecadores ao arrependimento,
ela tambm pode criar a verdadei-ra religio, exatamente naquela
grande esfera onde, de seu ponto de vista, h somente a falsa
religio. A sublimao da religio por meio da revelao no significa
apenas a sua negao, no signifi-ca apenas o julgamento de que
religio falta de f. A religio, ape-sar de o julgamento contra ela
ser vlido, e por esse mesmo motivo, pode ser alegremente sublimada
na revelao, a primeira pode ser sustentada pela segunda e descansar
seguramente dentro dela; a religio pode ser justificada pela
revelao e, devemos acrescentar imediatamente, santificada. A
revelao pode aceitar a religio e torn-la verdadeira (BARTH, 2006,
p. 85, traduo livre).
Atravs dessa analogia, Barth (1956, p. 326) afirma que a religio
crist a religio verdadeira. No obstante, ele no pretende iniciar
uma polmica contra
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as religies no crists; a revelao contradiz no somente essas
religies, mas todas as religies, inclusive o cristianismo. Este no
ocupa uma posio privi-legiada no julgamento de Deus. Ademais, a
afirmao de que o cristianismo a verdadeira religio , na verdade,
uma declarao de f, dita pela revelao.
Portanto, a verdade da religio crist comea com o reconhecimento
de que esta tambm est sob o julgamento de que religio falta de f e
que ela j est absolvida desse julgamento no por sua dignidade
interior, mas somente pela graa de Deus (BARTH, 2006, p. 87). Alm
disso, esse julga-mento se refere concretamente prtica completa da
f crist: sua teologia, adorao, comunidade, ordem e moralidade. Por
ser uma atividade humana, toda atividade crist aparece no mesmo
nvel das obras em outras religies. De fato, o julgamento de Deus
contra o cristianismo revela que a prtica crist no o que pretendia
ser ou seja, uma obra de f em obedincia revelao divina mas a falta
de f humana, idolatria, autojustificao humana, exaltao prpria e
oposio revelao divina.
No entanto, Barth (1956, p. 333) enfatiza a importncia do
reconheci-mento dessas fraquezas por parte do cristianismo. Ele
menciona a experincia de Paulo, que alegremente se vangloriou de
suas fraquezas, dizendo que o meu poder se aperfeioa na fraqueza
(2Co 12:9).46 Do ponto de vista de Barth, essa ideia est claramente
relacionada ao conceito de justificao pela f, uma vez que a graa de
Deus age particularmente no contexto da incapacidade hu-mana.
Contudo, Barth concluiu que o nico poder [cristo] reside somente na
fraqueza. Ento, o dom da graa em meio fraqueza somente efetivo
quando o cristianismo se humilhar ao invs de se exaltar. Ao longo
da his-tria, porm, a religio crist tem negligenciado essa atitude
em seus contatos com outras religies, objetivando demonstrar suas
foras e sua superioridade em relao s outras religies. Barth v isso
nos trs estgios histricos da igre-ja crist: 1) a igreja primitiva,
2) a igreja medieval e 3) a igreja moderna.
Antes de Constantino, sendo uma religio illicita, a igreja
apostlica viveu, em sua maior parte, na fraqueza. Em geral, cristos
no poderiam adquirir nenhum crdito sua prpria causa, em termos
externos no campo da poltica, sociedade e cultura. Eles e sua f
estavam sozinhos contra um
46 Apesar de haver um paralelo claro entre a graa de Deus e a
fraqueza humana nessa pas-sagem bblica, Paulo no parece empregar a
palavra fraqueza no mesmo sentido de Barth. Enquanto Barth fala
sobre a fraqueza do cristianismo em termos de falta de f,
idolatria, au-tojustificao e oposio revelao de Deus, Paulo discursa
sobre fraqueza em termos de enfermidades, censuras, necessidades,
perseguies e angstias por amor de Cristo (2 Co 12:10). Assim, o
conceito de Barth sobre a falta de f no claro nessa passagem
bblica.
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superpoder externo. Apesar de eles terem lutado numa batalha
aparente-mente perdida, considerando toda a presso da perseguio, a
graa de Deus bastou para eles. Mas em seu contato com religies
pags, foi uma grande tentao para os cristos contrastarem qualidades
espirituais crists basi-camente sabedoria e moralidade com a
pobreza espiritual pag, ao invs de simplesmente validar Jesus
Cristo contra as religies pags, como man-dam o Antigo e o Novo
Testamento.
Aps o tempo de Constantino, a ideia de uma igreja e um imprio
unifi-cado o corpus christianum foi uma oferta extremamente
interessante para o cristianismo. Na igreja primitiva havia a
tentao de enfatizar a superiorida-de intelectual e moral do
cristianismo sobre as outras religies, mas na Idade Mdia havia
tambm a tentao da superioridade poltica. Por exemplo, onde estava a
mensagem da graa como a verdade do cristianismo no tempo das
Cru-zadas? Em adio a isso, Barth (1956, p. 334, traduo livre)
pergunta:
At que ponto os pagos e os judeus poderiam encontrar na Igreja
medieval um poder genuinamente diferente, novo e inco-mum, no um
poder que o ser humano pode sempre demons-trar, mas o poder de Deus
que humilha, porm abenoa todos os seres humanos, o poder do
Evangelho? At que ponto a Igre-ja poderia confrontar o Islamismo
que a oprimiu no Oriente e no Sul da Europa como algo que era de
fato original? At que ponto os oponentes cristos da Igreja, os
partidos nacional e imperial ou as seitas herticas, poderiam
deduzir a partir da ao e da atitude da Igreja que era a glria de
Deus e no sua prpria glria que ela buscava?
O ento chamado perodo moderno caracterizado pela dissoluo da
unio entre Igreja e Estado. Nesse novo perodo histrico, a sociedade
oci-dental atingiu a maturidade, ou pensa que atingiu (BARTH, 1956,
p. 335, tra-duo livre). O ser humano poderia encontrar seu prprio
caminho sem a igreja. Poltica, cincia, sociedade e arte tinham sua
prpria fora. Sem as condies favorveis da Idade Mdia, a igreja no
sabia como impressionar o mundo que se tornava cada vez mais
secular. Contudo, o cristianismo se tornou uma fora [restrita] para
a educao e a ordem no servio da nova glria secular da huma-nidade
ocidental (BARTH, 1956, p. 335, traduo livre).
Barth (1956, p. 336, traduo livre) afirma que na reconsiderao de
si e das possibilidades impostas por essa nova situao, [a igreja]
no alcanou
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novamente a fraqueza pela qual, e unicamente pela qual, ela pode
se tornar forte. Ao invs disso, ela aceitou o ser humano moderno
com sua atitude vigorosa para consigo mesmo, questionando-se sobre
qual seria a melhor maneira pela qual o cristianismo poderia ser
louvada por ele. De fato, nes-te contexto da humanidade moderna
autossuficiente e da subordinao da igreja a seu servio que se
tornou antropologicamente secular emer-ge o conceito geral da
religio (assunto discutido no tpico Religio como um problema
teolgico). Logo, atravs da compreenso da essncia da religio, o
cristianismo passou a ser comparado com seus vrios competi-dores
religiosos para ser reconhecida como um fundamento melhor para a
filosofia e a moralidade, como uma melhor satisfao das necessidades
ltimas, como uma realizao mais elevada dos ideais do ser humano
mo-derno. Do ponto de vista de Barth (1956, p. 336), nesse
contexto,
era inevitvel que o cristianismo rendesse sua verdade s contnuas
oscilaes do ser humano moderno, que ao lanar sua verdade de uma mo
suja outra faria com que ela parecesse em um momen-to absolutamente
autoritria, verdade racial de homens romntica, ento liberal,
nacional ou at mesmo verdade racial de homens. Mas nunca a verdade
de Deus que julga e abenoa, de acordo com os documentos originais
do cristianismo, que no foram suficien-temente silenciados.
Barth (1956, p. 337) concluiu que a verdade da religio crist que
esta forte somente em sua fraqueza, a mensagem da graa no pode ser
de-monstrada pela histria. Ao invs disso, a igreja continuamente
tenta se validar como a santa e verdadeira religio por meio de suas
obras. Mas ele ressalta que, da perspectiva da histria, uma religio
baseada na graa no difere das outras religies, devido ao fato de
que essa religio pode ser justificada e constituda a verdadeira
religio somente pela graa e no em si mesma (BARTH, 1956, p. 339).
Para Barth, (1956, p. 343), uma nica coisa decisiva na distino da
verdadeira religio: o nome de Jesus Cristo. Somente nesse nome a
igreja se fortalece, porque a graa de Deus em meio humanidade.
Nesse sentido, a relao entre o nome de Jesus Cristo e a religio
crist pode ser exposta em quatro pontos: 1) criao; 2) eleio; 3)
justificao; e, 4) santificao.
O primeiro ponto implica que o cristianismo no possui substncia
alguma nele mesmo; sua realidade histrica e contempornea deriva
somen-te de Cristo. A igreja crist , na verdade, o corpo de Cristo
nesse mundo.
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O segundo ponto significa que Jesus Cristo escolheu o
cristianismo como religio verdadeira baseada meramente na eleio e
compaixo divina; no h nada na religio crist que justifica essa
escolha. Nesse sentido, para Barth (1956, p. 347-348), qualquer
tentativa de explicar historicamente a verdade do cristianismo se
ope eleio divina. O terceiro ponto indica que a igreja em si
idolatria e falta de f, mas atravs da reconciliao provida por Jesus
Cristo, o cristianismo justificado e seus pecados so perdoados
(BARTH, 1956, p. 352-355). Finalmente, o ltimo ponto retrata a
diferenciao desse cristianismo justificado das outras religies
atravs da santificao por meio do nome de Jesus Cristo. A igreja,
porm, se torna um sinal concreto e visvel da revelao de Deus, tal
qual a lei no Antigo Testamento era uma testemu-nha e um sinal da
eleio e da graa de Deus (BARTH, 1956, p. 359).
Consideraes finaisO presente estudo foi realizado para descrever
o significado da crtica
religio na teologia de Karl Barth. Para completar esse trabalho,
foi discu-tida inicialmente sua crtica religiosa em sua obra A
carta aos Romanos. Pri-meiramente, o conceito de Barth sobre
religio foi retratado no contexto da infinita distino qualitativa
entre Deus e a humanidade, a qual compreende a base metodolgica
dessa obra. Ao contrrio da f, a religio desconsidera completamente
essa distino e objetiva compreender o Deus desconhecido, elevando a
humanidade ao nvel de Deus, pois sua compreenso de divinda-de uma
projeo humana. Na religio, potanto, a humanidade se coloca no lugar
de Deus. Outro ponto examinado foi a relao argumentada por Barth
entre a religio e a lei. Nesse sentido, a religio representa a
ltima e mais pura possibilidade humana, porm essa estreita e
limitada, devido s limitaes da humanidade. Contudo, a religio um
trao intrnseco a hu-manidade e, atravs dele, o ser humano pode
perceber que se rebelou contra Deus em sua tentativa de ser como
Ele e que a ele pertence morte.
Por ltimo, nessa primeira seo, foi examinada a relao
estabelecida por Barth entre a religio e a igreja, a qual
considerada uma religio orga-nizada. A crtica eclesistica religio
expressa que ao invs de ser fiel vo-cao de Deus, a igreja quer
alcanar sua magnitude. No obstante, este no um argumento
antieclesistico. A culpa da igreja a culpa da humanidade, e deixar
a igreja no resolver o problema. Somente o julgamento de Deus
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sobre a igreja sua esperana. Atravs de sua demolio divina, a
igreja surge como um selo e uma testemunha da justificao de
Deus.
Em seguida, foi descrita a crtica de Barth religio no 17 de sua
obra Chur-ch dogmatics. Inicialmente, foi discutido o tpico A
religio como um problema teolgico, onde Barth apresenta dois pontos
opostos sobre fazer teologia: 1) in-terpretando a revelao do ponto
de vista da religio e 2) compreendendo a reli-gio na perspectiva da
revelao. Enquanto os Reformadores escolheram a ltima opo, a
teologia moderna Protestante optou pela primeira. Essa mudana
ocor-reu porque o Protestantismo renunciou Jesus Cristo como o
senhor em favor do paradigma antropocntrico moderno, o qual
desconsiderou a humanidade como subordinada ao senhorio de Cristo.
De fato, isso significou a perda de f.
Em adio, em sua discusso sobre a Religio como Falta de F, Barth
descreve o que a religio realmente do ponto de vista da revelao.
Essa noo esclarecida atravs de dois pontos da revelao: 1) a
mani-festao de Deus, e 2) o ato pelo qual ele reconcilia a
humanidade consi-go. Ambos implicam a dependncia da humanidade da
ao de Deus para conhec-lo e alcanar salvao. Contudo, a revelao
alcana o ser humano em uma condio religiosa, na qual ele almeja
conhecer Deus a partir de suas perspectivas, substituindo-o pela
imagem que ele criou. A idolatria in-dica a tentativa humana de
alcanar justificao pelas obras. Logo, em sua falta de f, a religio
contradiz a revelao.
Finalmente, foi retratada a ideia de verdadeira religio, que
pos-sui a doutrina da justificao pela f como seu pano de fundo.
Nesse sentido, a religio nunca verdadeira em si mesma, mas pode ser
jus-tificada pela revelao de Deus e, assim, se tornar verdadeira.
Essa a sublimao da religio atravs da revelao de Deus. A religio
conde-nada como falta de f e abolida pela revelao, mas, ao mesmo
tempo, elevada e justificada pela revelao. Seguindo esse conceito,
Barth con-sidera a religio crist verdadeira. No nome de Jesus
Cristo, a religio crist foi criada, eleita, justificada e
santificada. Portanto, ela constitui um sinal visvel e verdadeiro
da revelao e da justificao.
Embora A carta aos Romanos e Church dogmatics correspondam a
dois perodos metodolgicos diferentes na teologia de Barth, essas
obras so seme-lhantes na abordagem do tema da religio. Apesar de
suas diferenas na lingua-gem e na nfase dada,47 ambas apresentam as
mesmas ideias, principalmente
47 A linguagem encontrada em A carta aos Romanos mais
existencialista e salienta a dis-tino qualitativa infinita entre
Deus e a humanidade, enquanto Church dogmatics se utiliza de uma
linguagem mais cristolgica, enfatizando a analogia da f com base na
cristologia.
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na discusso dialtica da religio. Barth utiliza a doutrina da
justificao pela f como uma base teolgica para criticar a religio.
Dessa forma, a religio compreendida como o esforo humano para
alcanar e compreender Deus. Do ponto de vista da justificao pela f,
ela representa a tentativa da humani-dade de se justificar atravs
de suas obras. Portanto, Barth considera a religio como falta de f,
idolatria e autojustificao, que, na verdade, morte.
Porm, impossvel viver sem religio, pois ela parte da natureza
huma-na: a ltima possibilidade do ser hutmano. A nica esperana da
humanidade o julgamento divino, que pode, dialeticamente, abolir a
religio e elev-la atra-vs da justificao, como um sinal da graa de
Deus. Em toda essa abordagem, Barth foca basicamente na religio
crist como a verdadeira religio. Sua falta de f precisa ser abolida
por Deus para se tornar testemunha de sua revelao. Alm disso,
evidente que em sua crtica religio Barth contrrio ao mtodo do
Protestantismo moderno, especialmente a teologia liberal.
Portanto, o estudo da crtica religio na teologia de Karl Barth
apre-senta uma viso significativa dos problemas do mtodo da
teologia liberal, a qual possui uma base antropocntrica no lugar de
teocntrica. No entanto, a abordagem de Barth tambm apresenta uma
forte pressuposio existencial que guia todas as suas consideraes,
principalmente em seu pensamento dialtico. A doutrina da justificao
pela f, o julgamento de Deus e o cris-tianismo so interpretados
existencialmente. Em sua oposio teologia natural, Barth
desconsidera os argumentos teolgicos histricos e objetivos. Essas
limitaes podero ser discutidas em estudos posteriores.
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Enviado dia 21/11/2011Aceito dia 09/02/2012