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DO PARADIGMA ETIOLGICO AO PARADIGMA DAREAO SOCIAL: MUDANA E
PERMANNCIA DE
PARADIGMAS CRIMINOLGICOS NA CINCIA E NOSENSO COMUM
Vera Regina Pereira de Andrade
1 Introduo
Neste artigo abordamos, numa perspectiva sincrnica antes que
diacrnica (his-trica), a mudana do paradigma etiolgico para o
paradigma da reao social que aCriminologia experimenta desde a
dcada de sessenta de nosso sculo, situando adesconstruo
epistemolgica que o novo paradigma operou em relao ao tradicional
ea permanncia deste, para alm desta desconstruo, pela sua
importante funcionalidade(no declarada) como cincia do controle
scio-penal. Muitas razes justificam, pensa-mos, a ateno aqui
dedicada ao tema. Mas ao invs de explicit-las - o que
ensejariabasicamente um outro artigo - deixamos que o leitor
extraia suas prprias concluses.
2. O paradigma etiolgico de Criminologia.
A Antropologia criminal de C. Lombroso e, a seguir, a Sociologia
Criminal de E.Ferri constituem duas matrizes fundamentais na
conformao do chamado paradigmaetiolgico de Criminologia, o qual se
encontra associado tentativa de conferir disciplina o estatuto de
uma cincia segundo os pressupostos epistemolgicos dopositivismo e
ao fenmeno, mais amplo, de cientificizao do controle social,
naEuropa de finais do sculo XIX.
Na base deste paradigma a Criminologia ( por isto mesmo
positivista) defini-da como uma Cincia causal-explicativa da
criminalidade ; ou seja, que tendo porobjeto a criminalidade
concebida como um fenmeno natural, causalmente determi-nado, assume
a tarefa de explicar as suas causas segundo o mtodo cientfico
ouexperimental e o auxlio das estatsticas criminais oficiais e de
prever os remdios para1Professora nos cursos de graduao e
ps-graduao em Direito da UFSC.2 O LUomo delinqente de LOMBROSO
(publicado em 1876), a Sociologia Criminale de FERRI(publicada em
1891)e a Criminologia - studio sul delitto e sulla teoria della
represione de GARFALO (publicada em 1885) com
enfoque,respectivamente, antropolgico, sociolgico e jurdico, so
consideradas as obras bsicas caracterizadoras da chamadaEscola
Positiva italiana e os trs seus mximos definidores e divulgadores.
Sobre a insero histrica e os condicionamen-tos deste paradigma, bem
como sua transnacionalizao ver ANDRADE,1994.3 Sobre a caracterizao
do positivismo ver ANDRADE, 1994 e TAYLOR, WALTON, YOUNG, 1990.
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combat-la. Ela indaga, fundamentalmente, o que o homem
(criminoso) faz e porque o faz.O pressuposto, pois, de que parte a
Criminologia positivista que a
criminalidade um meio natural de comportamentos e indivduos que
os distinguemde todos os outros comportamentos e de todos os outros
indivduos. Sendo acriminalidade esta realidade ontolgica,
preconstituda ao Direito Penal (crimes na-turais) que, com exceo
dos chamados crimes artificiais,4 no faz mais do quereconhec-la e
positiv-la, seria possvel descobrir as suas causas e colocar a
cinciadestas ao servio do seu combate em defesa da sociedade.
A primeira e clebre resposta sobre as causas do crime foi dada
pelo mdicoitaliano LOMBROSO que sustenta, inicialmente, a tese do
criminoso nato: a causa docrime identificada no prprio criminoso.
Partindo do determinismo biolgico(anatmico-fisiolgico) e psquico do
crime e valendo-se do mtodo de investigaoe anlise prprio das
cincias naturais (observao e experimentao) procurou com-provar sua
hiptese atravs da confrontao de grupos no criminosos com
crimino-sos dos hospitais psiquitricos e prises sobretudo do sul da
Itlia, pesquisa na qualcontou com o auxlio de FERRI, quem sugeriu,
inclusive, a denominao criminosonato. Procurou desta forma
individualizar nos criminosos e doentes apenados ano-malias
sobretudo anatmicas e fisiolgicas5 vistas como constantes
naturalsticasque denunciavam, a seu ver, o tipo antropolgico
delinqente, uma espcie partedo gnero humano, predestinada, por seu
tipo, a cometer crimes.
Sobre a base destas investigaes buscou primeiramente no atavismo
umaexplicao para a estrutura corporal e a criminalidade nata. Por
regresso atvica, ocriminoso nato se identifica com o selvagem.
Posteriormente, diante das crticas sus-citadas, reviu sua tese,
acrescentando como causas da criminalidade a epilepsia e, aseguir,
a loucura moral. Atavismo, epilepsia e loucura moral constituem o
que Vonnackedenominou de trptico lombrosiano.6
Desenvolvendo a Antropologia lombrosiana numa perspectiva
sociolgica,Ferri admitiu, por sua vez, uma trplice srie de causas
ligadas etiologia do crime:individuais (orgnicas e psquicas),
fsicas (ambiente telrico) e sociais (ambientesocial) e, com elas,
ampliou a originria tipificao lombrosiana da criminalidade.
Assim FERRI (1931,p.44,45,49 e 80) sustentava que o crime no
decorrncia dolivre arbtrio, mas o resultado previsvel determinado
por esta trplice ordem de fatores queconformam a personalidade de
uma minoria de indivduos como socialmente perigosa.
4 Segundo a distino entre delitos naturais e artificiais, que
ficou a dever-se a GAR0FALO, se considera que apenasos delitos
artificiais representam, excepcionalmente, violaes de determinados
ordenamentos polticos e econmicos eresultam sancionados em funo da
consolidao dessas estruturas.5 Como pouca capacidade craniana,
frente fugidia, grande desenvolvimento dos arcos zigomtico e
maxilar, cabelo crespoe espesso, orelhas grandes, agudeza visual,
etc.6 A respeito do exposto ver LOMBROSO (1983); SOUSA (1977,
p.17-8) e LAMNEK (1980, p.20).
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Seria fundamental, pois, ver o crime no criminoso porque ele ,
sobretudo, sintomarevelador da personalidade mais ou menos perigosa
(anti-social) de seu autor, para aqual se deve dirigir uma adequada
defesa social.
Da a tese fundamental de que ser criminoso constitui uma
propriedade dapessoa que a distingue por completo dos indivduos
normais. Ele apresenta estigmasdeterminantes da criminalidade.
Estabelece-se desta forma uma diviso cientfica entre o
(sub)mundo dacriminalidade, equiparada marginalidade e composta por
uma minoria de sujeitospotencialmente perigosos e anormais (o mal)
e o mundo, decente, da normalidade,representado pela maioria na
sociedade (o bem).
A violncia , desta forma, identificada com a violncia individual
(de umaminoria ) a qual se encontra, por sua vez, no centro do
conceito dogmtico de crime,imunizando a relao entre a criminalidade
e a violncia institucional e estrutural.
E este potencial de periculosidade social, que os positivistas
identificaramcom anormalidade e situaram no corao do Direito Penal7
que justifica a pena comomeio de defesa social e seus fins
socialmente teis: a preveno especial positiva(recuperao do
criminoso mediante a execuo penal) assentada na ideologia
dotratamento que impe, por sua vez, o princpio da individualizao da
pena comomeio hbil para a elaborao de juzos de prognose no ato de
sentenciar.8
Logo, trata-se de defender a sociedade destes seres perigosos
que se apartamou que apresentam a potencialidade de se apartar do
normal (prognstico cientficode periculosidade) havendo que
ressocializ-los ou neutraliz-los. (BUSTOS RAMIREZin BERGALLI e
BUSTOS RAMREZ, 1983b, p.17)
Este saber causal gerou, pois, um saber tecnolgico: no apenas o
diagnsti-co da patologia criminal, mas acompanhada do remdio que
cura.
Instaura-se, desta forma, o discurso do combate contra a
criminalidade ( omal) em defesa da sociedade (o bem) respaldado
pela cincia . A possibilidade deuma explicao cientificamente
fundamentada das causas enseja, por extenso,uma luta cientfica
contra a criminalidade erigindo o criminoso em destinatrio de
umapoltica criminal de base cientfica. A um passado de
periculosidade confere-se umfuturo: a recuperao.
Obviamente, um modelo consensual de sociedade que opera por
detrs des-te paradigma, segundo o qual no se problematiza o Direito
Penal - visto como ex-presso do interesse geral - mas os indivduos,
diferenciados, que o violam. A socie-dade experimenta uma nica e
maniquesta assimetria: a diviso entre o bem e o mal.
A s r e p r e s e n t a e s d o d e t e r m i n i s m o / c r i
m i n a l i d a d eo n t o l g i c a / p e r i c u l o s i d a d e
/ a n o r m a l i d a d e / t r a t a m e n t o / r e s s o c i a
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7 Foi GAROFALO (1983) quem, projetando as concepes antropolgicas
e sociolgicas do positivismo para o Direito Penal,formulou o
conceito de temibilidade do delinqente significando a perversidade
constante e ativa do delinqente e aquantidade do mal previsto que h
que se temer por parte dele, depois substitudo pelo termo mais
expressivo de periculosidade.8 E justifica, tambm, a introduo das
medidas de segurana por tempo indeterminado. Pois elas devem durar
at que ocriminoso aparea recuperado para a vida livre e
honesta.
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lizao se complementam num crculo extraordinariamente fechado
conformando umapercepo da criminalidade que se encontra, h um
sculo, profundamente enraizadanas agncias do sistema penal e no
senso comum.
3. O labelling approach9 e o paradigma da reao social :uma
revoluo de paradigma em Criminologia.
Este paradigma, com a qual nasceu a Criminologia como cincia no
final dosculo XIX liberta-se, assim, de suas condies originrias de
nascimento para setransnacionalizar em grande escala permanecendo,
no apenas na Europa, na base deposteriores desenvolvimentos da
disciplina, inclusive os mais modernos que, inda-gao sobre as
causas da criminalidade, forneceram respostas diferentes das
antro-polgicas e sociolgicas do positivismo originrio e que
nasceram, em parte, dapolmica com ele (teorias explicativas de
ordem psicanaltica, psiquitrica,multifatoriais, etc.). (BARATTA,
1982b, p.29)
Mas enquanto a Criminologia europia permanece relativamente
estanque, doponto de vista epistemolgico, no mundo anglo-saxo, em
particular na Amrica doNorte, que experimentar um posterior
desenvolvimento, sobretudo como SociologiaCriminal, assumindo a
dianteira terica da disciplina e preparando o terreno para
umamudana de paradigma em Criminologia.10
Foi assim que a introduo do labelling approach, devido sobretudo
influ-ncia de correntes de origem fenomenolgica (como o
interacionismo simblico e aetnometodologia) na sociologia do desvio
e do controle social e de outros desenvol-vimentos da reflexo
histrica e sociolgica sobre o fenmeno criminal e o Direitopenal
determinaram, no seio da Criminologia contempornea, a constituio de
umparadigma alternativo relativamente ao paradigma etiolgico: o
paradigma da reaosocial (social reation approach) do controle ou da
definio.(BARATTA, 1983b,p.147 e 1991a, p.225)
9 O labelling approach designado na literatura, alternativa e
sinonimiamente, por enfoque (perspectiva ou teoria)
dointeracionismo simblico, etiquetamento, rotulao ou ainda por
paradigma da reao social (social reation approach),do controle ou
da definio. Ele surge nos Estados Unidos da Amrica em finais da
dcada de 50 e incios da dcadade 60 com os trabalhos de autores como
H. GARFINKEL, E. GOFMANN,K. ERICSON, A. CICOUREL, H.BECKER,
E.SCHUR, T. SCHEFF, LEMERT, KITSUSE entre outros, pertencentes Nova
Escola de Chicago com o questionamentodo paradigma funcional at o
momento dominante dentro da Sociologia norte-americana.Considera-se
H. Becker, sobretudo atravs de seu j clssico Outsiders ( publicado
em 1963) o fundador deste paradigmacriminolgico. E na verdade,
Outsiders persiste ainda como a obra central do labelling, a
primeira onde esta nova perspec-tiva aparece consolidada e
sistematizada e onde se encontra definitivamente formulada a sua
tese central.10 justamente este desenvolvimento da Criminologia
desde os anos 30 do nosso sculo que BARATTA (1991a, p.35 et seq.e
1982b, p.33-36) reconstri para demonstrar que, no obstante
demarcado num sistema jurdico e numa Cincia do DireitoPenal muito
diversos dos caractersticos da Europa Ocidental, preparou o terreno
para esta mudana paradigmtica queocorre, pois, como um processo sem
soluo de continuidade na histria da disciplina.
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Modelado pelo interacionismo simblico11 e a etnometodologia12
como esque-ma explicativo da conduta humana (o construtivismo
social) o labelling parte dosconceitos de conduta desviada e reao
social, como termos reciprocamenteinterdependentes, para formular
sua tese central: a de que o desvio e a criminalidadeno uma
qualidade intrnseca da conduta ou uma entidade ontolgica
preconstituda reao social e penal, mas uma qualidade (etiqueta)
atribuda a determinados sujei-tos atravs de complexos processos de
interao social; isto , de processos formaise informais de definio e
seleo.
Uma conduta no criminal em si (qualidade negativa ou nocividade
ineren-te) nem seu autor um criminoso por concretos traos de sua
personalidade ou influ-ncias de seu meio-ambiente. A criminalidade
se revela, principalmente, como umstatus atribudo a determinados
indivduos mediante um duplo processo: a definiolegal de crime, que
atribui conduta o carter criminal e a seleo que etiqueta
eestigmatiza um autor como criminoso entre todos aqueles que
praticam tais condutas.
Conseqentemente, no possvel estudar a criminalidade
independentementedesses processos. Por isso, mais apropriado que
falar da criminalidade (e do criminoso) falar da criminalizao (e do
criminalizado) e esta uma das vrias maneiras de cons-truir a
realidade social. (BARATTA,1982b, p.35; PABLOS DE MOLINA, 1988,
p.581-583; HASSEMER,1984, p.81-2; HULSMAN, 1986, p.127-8; ALVAREZ,
1990, p.15-6 e 21)
Esta tese, da qual provm sua prpria denominao
(etiquetamento,rotulao) se encontra definitivamente formulada na
obra de BECKER (1971,p.19) nos seguintes termos: os grupos sociais
criam o desvio ao fazer as re-gras cuja infrao constitui o desvio e
aplicar ditas regras a certas pessoas
11 Direo da Psicologia Social e da Sociolingstica inspirada em
Charles COOLEY e George H. MEAD.Do interacionismo desenvolvido por
MEAD, cuja tese central pode ser resumida em que a sociedade
interao e que adinmica das instituies sociais somente pode ser
analisada em termos de processos de interao entre seus membros,
sederivaram diversas escolas dentre as quais a Escola de Chicago
que pertencem LEMERT e BECKER, a escola dramatrgicade GOFFMAN e a
Etnometodologia.O interacionismo simblico representa uma certa
superao da antinomia rgida das concepes antropolgicas e
sociol-gicas do comportamento humano, ao evidenciar que no possvel
considerar a sociedade - assim como a natureza humana- como dados
estanques ou estruturas imutveis. A sociedade, ou seja, a realidade
social, constituda por uma infinidadede interaes concretas entre
indivduos, aos quais um processo de tipificao confere um
significado que se afasta dassituaes concretas e continua a
estender-se atravs da linguagem. O comportamento do homem assim
inseparvel dainterao social e sua interpretao no pode prescindir
desta mediao simblica. (ALVAREZ G,1990, p.19; DIAS eANDRADE, 1984,
p.344-5)12 Direo inspirada na sociologia fenomenolgica de Alfred
SHUTZ. Segundo a etnometodologia, tambm, a sociedade no uma
realidade que se possa conhecer objetivamente, mas o produto de uma
construo social obtida mediante umprocesso de definio e de
tipificao por parte dos indivduos e grupos
diversos.Conseqentemente, para o interacionismo e a
etnometodologia, estudar a realidade social (por exemplo, a conduta
des-viada e a criminalidade) significa, essencialmente, estudar
esses processos, partindo dos que so aplicados a
simplescomportamentos para chegar s construes mais complexas, como
a prpria ordem social. (BARATTA,1991a, p.85-6; DIASe ANDRADE, 1984,
p.54)
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em particular e qualific-las de marginais (estranhos). Desde
este ponto de vista, odesvio no uma qualidade do ato cometido pela
pessoa, seno uma conseqnciada aplicao que os outros fazem das
regras e sanes para um ofensor. Odesviante uma pessoa a quem se
pode aplicar com xito dita qualificao (etique-ta); a conduta
desviante a conduta assim chamada pela gente.
Numa segunda aproximao, a criminalidade se revela como o
processo deinterao entre ao e reao social de modo que um ato dado
seja desviante ouno depende em parte da natureza do ato (ou seja,
se quebranta ou no algumaregra), e em parte do que outras pessoas
fazem a respeito. (BECKER,1971, p.13)
Pois, ainda no dizer de BECKER (1971, p.14) devemos reconhecer
que nopodemos saber se um certo ato vai ser catalogado como
desviante at que seja dadaa resposta dos demais. O desvio no uma
qualidade presente na conduta mesma,seno que surge da interao entre
a pessoa que comete o ato e aqueles que reagemperante o mesmo.
Ao afirmar que a criminalidade no tem natureza ontolgica, mas
social edefinitorial e acentuar o papel constitutivo do controle
social na sua construoseletiva, o labelling desloca o interesse
cognoscitivo e a investigao das causasdo crime e, pois, da pessoa
do autor e seu meio e mesmo do fato-crime, para a reaosocial da
conduta desviada, em especial para o sistema penal.
Como objeto desta abordagem o sistema penal no se reduz ao
complexoesttico das normas penais mas concebido como um processo
articulado e din-mico de criminalizao ao qual concorrem todas as
agncias do controle socialformal, desde o Legislador (criminalizao
primria), passando pela Polcia e a Jus-tia (criminalizao secundria)
at o sistema penitencirio e os mecanismos docontrole social
informal. Em decorrncia, pois, de sua rejeio ao determinismo eaos
modelos estticos de comportamento, o labelling conduziu ao
reconhecimentode que, do ponto de vista do processo de criminalizao
seletiva, a investigaodas agncias formais de controle no pode
consider-las como agncias isoladasumas das outras, auto-suficientes
e auto-reguladas mas requer, no mais alto grau,um approach
integrado que permita apreender o funcionamento do sistema comoum
todo. (DIAS e ANDRADE, 1984, p.373-4).
Neste sentido, no apenas a criminalizao secundria insere-se no
continuumda criminalizao primria, mas o processo de criminalizao
seletiva acionado pelosistema penal se integra na mecnica do
controle social global da conduta desviadade tal modo que para
compreender seus efeitos necessrio apreend-lo como umsubsistema
encravado dentro de um sistema de controle e de seleo de maior
ampli-tude. Pois o sistema penal no realiza o processo de
criminalizao e estigmatizao margem ou inclusive contra os processos
gerais de etiquetamento que tem lugar noseio do controle social
informal, como a famlia e a escola (por exemplo, o filho
estig-matizado como ovelha negra pela famlia, o aluno como difcil
pelo professor
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etc.) e o mercado de trabalho, entre outros. (HASSEMER, 1984,
p.82; CODE, 1985,p.37)
E desta perspectiva relativizado fica tanto o lugar do Direito e
da Justia Penalno controle social formal quanto o lugar deste em
relao ao controle social global.
Assim, ao invs de indagar, como a Criminologia tradicional, quem
crimino-so?, por que que o criminoso comete crime? o labelling
passa a indagar quem definido como desviante? por que determinados
indivduos so definidos comotais?, em que condies um indivduo pode
se tornar objeto de uma definio?,que efeito decorre desta definio
sobre o indivduo?, quem define quem? e,enfim, com base em que leis
sociais se distribui e concentra o poder de definio?(BARATTA,
1991a, p.87; DIAS e ANDRADE, 1984, p.43).
Da o desenvolvimento de trs nveis explicativos do labelling
approach,cuja ordem lgica procede aqui inverter:
a) um nvel orientado para a investigao do impacto da atribuio do
statusde criminoso na identidade do desviante ( o que se define
como desvio secund-rio)13; b) um nvel orientado para a investigao
do processo de atribuio do statusde criminoso (criminalizao
secundriaou processo de seleo)14; c) um nvel ori-entado para a
investigao do processo de definio da conduta desviada(criminalizao
primria)15 que conduz, por sua vez, ao problema da distribuio
dopoder social desta definio, isto , para o estudo de quem detm, em
maior ou menormedida, este poder na sociedade. E tal o nvel que
conecta o labelling com as teoriasdo conflito.(BARATTA, 1991a,
p.87; PABLOS DE MOLINA, 1988, p.588, 592-3)
A investigao se desloca, em suma, dos controlados para os
controladores e, reme-tendo a uma dimenso macrosociolgica, para o
poder de controlar. Pois ao chamar a atenopara a importncia do
processo interativo (de definio e seleo) para a construo e
13 Este nvel prevalece entre os autores que se ocuparam
particularmente da identidade e das carreiras desviadas, comoHoward
Becker, Edwin M. Schur e Edwin M.Lemert a quem se deve o conceito
de desvio secundrio (secondary deviance)que teorizado pela primeira
vez em seu Social Pathology em 1951, foi por ele retomado e
aprofundado em HumanDeviance. social problems and social control
(1972) tendo se convertido num dos tpicos centrais do
labelling.Relacionando-se com um mais vasto pensamento penalgico e
criminolgico crtico sobre os fins da pena este nvel deinvestigao pe
em evidncia que a interveno do sistema penal, em especial as penas
privativas de liberdade, ao invsde exercer um efeito reeducativo
sobre o delinqente, determinam, na maior parte dos casos, uma
consolidao de umaverdadeira e prpria carreira criminal, lanando luz
sobre os efeitos crimingenos do tratamento penal e sobre o
problemano resolvido da reincidncia. De modo que seus resultados
sobre o desvio secundrio e sobre as carreiras criminosasrepresentam
a negao da concepo reeducativa da pena e da ideologia do
tratamento. (BARATTA, 1991a, p. 89 e 116)14 Tal o processo de
aplicao das normas penais pela Polcia e a Justia, que corresponde
ao importante momento daatribuio da etiqueta de desviante
(etiquetamento ou rotulao)15 Correspondente ao processo de criao
das normas penais, em que se definem os bens jurdicos a serem
protegidos, ascondutas que sero criminalizadas e as respectivas
penas numa determinada sociedade. No obstante, no se limitam
aanlise das definies legais, levando tambm em considerao ( com
maior ou menor nfase) as definies informais dadaspelo pblico em
geral (definies do senso comum).
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a compreenso da realidade social da criminalidade, o labelling
demonstrou tambmcomo as diferenas nas relaes de poder influenciam
esta construo. ((HULSMAN,1986, p.127) Assenta, pois, na recusa do
monismo cultural e do modelo do consensocomo teoria explicativa da
gnese das normas penais e da sociedade, que constituaum pressuposto
fundamental da Criminologia positivista.16
Manifesta , pois, a ruptura epistemolgica e metodolgica operada
com aCriminologia tradicional, traduzida no abandono do paradigma
etiolgico-determinista(sobretudo na perspectiva bio-psicolgica
individual) e na substituio de um mode-lo esttico e descontnuo de
abordagem por um modelo dinmico e contnuo que oconduz a reclamar a
redefinio do prprio objeto criminolgico.17
Opera por este caminho como se autoatribuem seus representantes
e a litera-tura em geral subscreve, um verdadeiro salto qualitativo
- uma revoluo deparadigma no sentido kuhneano -consubstanciado na
passagem de um paradigmabaseado na investigao das causas da
criminalidade a um paradigma baseado nainvestigao das condies da
criminalizao, que se ocupa hoje em dia, fundamen-talmente, da
anlise dos sistemas penais vigentes (natureza, estrutura e funes).
ACriminologia contempornea desenvolvida na base deste paradigma,
especialmentea Criminologia crtica, tende a transformar-se, assim,
de uma teoria da criminalidadeem uma teoria crtica e sociolgica do
sistema penal. (BERGALLI, in BERGALLI eBUSTOS RAMREZ, 1983a,
p.146-7; BARATTA, 1991a, p.167 e 1982b, p.40-1ALVAREZ, 1990, p.15-6
e 31; MUOZ GONZALEZ, 1989; HASSEMER, 1984, p.84;LARRAURI, 1991,
p.1; PAVARINI, 1987, p.127)
Alm dos j referidos resultados da investigao sobre o impacto
doetiquetamento podemos enunciar, ainda que sumariamente, um
conjunto de resulta-dos irreversveis deste paradigma sobre a
seletividade do sistema penal que, oriundados demais nveis
referidos, reconhece nele uma complexa formulao.18
Desde o ponto de vista das definies legais, a criminalidade se
manifestacomo o comportamento da maioria, antes que de uma minoria
perigosa da populaoe em todos os estratos sociais. Se a conduta
criminal majoritria e ubqua e aclientela do sistema penal composta,
regularmente, em todos os lugares do mun-do, por pessoas
pertencentes aos mais baixos estratos sociais, isto indica que h
umprocesso de seleo de pessoas, dentro da populao total, s quais se
qualificacomo criminosos. E no, como pretende o discurso penal
oficial, uma incrimina-
16 A respeito ver BECKER (1971, p.26)17 Ruptura que se traduz,
por outro lado, na desqualificao das estatsticas oficiais como
instrumento fundamental de acesso realidade criminal, devido s
insuperveis aporias a que conduziam do ponto de vista
gnoseolgico.18 Tais resultados so tributrios de trs outros campos
de investigao em que o labelling se baseia: as aquisies da
teoriajurdica relativamente tese do papel criador do juiz, as
investigaes sociolgicas relativas criminalidade de colarinhobranco,
cifra negra da criminalidade e a crtica das estatsticas
criminais.
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o (igualitria) de condutas qualificadas como tais. O sistema
penal se dirige quasesempre contra certas pessoas, mais que contra
certas aes legalmente definidascomo crime. A conduta criminal no ,
por si s, condio suficiente deste processo.Pois os grupos poderosos
na sociedade possuem a capacidade de impor ao sistemauma quase que
total impunidade das prprias condutas
criminosas.(ZAFFARONI,1987,p.22 e 32; BARATTA,1982b, p.35, 1991a,
p.172 e 1993, p.49)
Desta forma, a minoria criminal perigosa a que se refere a
explicao etiolgica(Criminologia positivista) resulta de que as
possibilidades (chances) de resultar etiquetado,com as graves
conseqncias que isto implica, se encontram desigualmente
distribudas. Eum dos mecanismos fundamentais desta distribuio
desigual da criminalidade so precisa-mente os esteretipos de
autores e vtimas que, tecidos por variveis geralmente associa-das
aos pobres ( baixo status social, cor, etc) torna-os mais
vulnerveis criminalizao: o mesmo esteretipo epidemiolgico do crime
que aponta a um delinqente as celas dapriso e poupa a outro os seus
custos. (DIAS e ANDRADE, 1984, p.552)
A clientela do sistema penal constituda de pobres no porque
tenham umamaior tendncia para delinqir mas precisamente porque tem
maiores chances deserem criminalizados e etiquetados como
criminosos.
Em suma, como conclui SACK, a criminalidade (a etiqueta de
criminoso) umbem negativo que a sociedade (controle social) reparte
com o mesmo critrio dedistribuio de outros bens positivos (o status
social e o papel das pessoas: fama,patrimnio, privilgios etc.) mas
em relao inversa e em prejuzo das classes sociaismenos favorecidas.
A criminalidade o exato oposto dos bens positivos (do privil-gio).
E, como tal, submetida a mecanismos de distribuio anlogos, porm
emsentido inverso distribuio destes.
4. A desconstruo epistemolgica do paradigma etiolgico:a traio da
Criminologia matriz positivista de cincia.
importante ento pontualizar como esta mudana de paradigma
permitiu evi-denciar o dficit causal do paradigma etiolgico e
desconstruir seus fundamentosepistemolgicos a partir da constatao
de que o substrato ontolgico que confere criminalidade no se apoia,
em absoluto, sobre a criminalidade como fenmeno oufato social, mas
sobre o Direito e o sistema penal.
que a Criminologia positivista tem como referente para a
individualizao doseu objeto a prpria lei penal e os resultados
finais e contingentes do processo decriminalizao acionado pelo
sistema penal investigando assim a criminalidade talcomo resultante
de uma dupla seleo.
Em primeiro lugar, das definies legais de crime e das
estatsticas oficiais e emsegundo lugar, da seleo dos criminosos
deste modo tornados disponveis para aobservao e experimentao clnica
atravs da priso e dos manicmios.
Ao aceitar que crime a concreo de uma conduta legalmente
definida
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como tal j no pode investigar a criminalidade como fenmeno
social, mas apenasenquanto definida normativamente. Na prpria
delimitao de seu objeto j se realiza,pois, uma subordinao da
Criminologia ao Direito Penal. E ao identificar os crimino-sos com
os autores das condutas legalmente definidas como tais e, mais do
que isso,com os sujeitos etiquetados pelo sistema como criminosos,
identifica populao cri-minal com a clientela do sistema penal .
Neste nvel sua dependncia metodolgicaestende-se da normatividade ao
resultado da prpria operacionalidade, altamenteseletiva, do sistema
penal. Seu laboratrio de experimentao que, coerentementecom o
interesse originrio na investigao da criminalidade como fenmeno,
deveriaser a sociedade converte-se, na prtica, nas prises e
manicmios.19 (PLATT, 1980;ZAFFARONI, 1991, p.44; DIAS e ANDRADE,
1984, p.66; PAVARINI, 1988, p.53-4;PABLOS DE MOLINA, 1988,
p.583)
Assim, o criminlogo positivista no conhecer nunca o fenmeno da
pros-tituio, do trfico de drogas, do crime organizado, etc.,
podendo conhecer algumasmulheres, traficantes e mafiosos, por
exemplo, que foram selecionados pelo sistema.E isto vale
independentemente para todas as formas de criminalidade.
Pelo que se chega a uma concluso verdadeiramente paradoxal:
opositivismo criminolgico que havia se dirigido para a busca de um
fundamentonatural, ontolgico, da criminalidade, contra toda sua boa
inteno a demons-trao inequvoca do contrrio; ou seja, de que a
criminalidade um fenmenonormativo. Certamente impossvel de ser
conhecido desde um ponto de vistafenomenolgico. (PAVARINI, 1988,
p.54)
Suas teorias etiolgicas somente podem concluir, pois, por causas
indissocivele exclusivamente ligadas ao tipo de pessoas que
integram a clientela do sistema,buscando nelas todas as variveis
que expliquem sua diversidade com respeito aossujeitos normais, com
excluso, todavia, do prprio processo criminalizao, queaparece como
o fundamento da diversidade. sobre os baixos estratos sociais,
por-tanto, que recai o estigma da periculosidade e da maior
tendncia para delinqir.
precisamente esta situao de dependncia na qual a Criminologia
positivistase encontra na prpria definio de seu objeto de
investigao e as aporias daresultantes, que do lugar ao profundo
questionamento de seu status cientfico le-vando concluir que a sua
pretenso de proporcionar uma teoria das causas dacriminalidade no
tem justi f icao do ponto de vista epistemolgico(BARATTA,1982a,
p.29 e 1983b, p.146)
E isto porque uma investigao causal-naturalista no aplicvel a
objetos defini-dos por normas, convenes ou avaliaes sociais ou
institucionais, j que faz-lo acar-reta uma coisificao dos
resultados destas definies normativas que aparecem comocoisas que
existem independentemente delas. A criminalidade, os criminosos
so,sem dvida, objetos deste tipo. E so impensveis sem a interveno
da rea-
19. Basta lembrar a engenharia lombrosiana de medio e
quantificao de crneos dos presos italianos, imortalizada noMuseu de
Turim.
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o social e penal (BARATTA, 1983, p.146)Em sntese, pois, a aporia
desta Criminologia consiste em que ela se declara como
uma cincia causal-explicativa da criminalidade, exclui a reao
social de seu objeto(centrando-se na ao criminal) quando dela
inteiramente dependente; ao mesmo tempoem que se apoia,
aprioristicamente, numa noo ontolgica da criminalidade. Assim,
aoinvs de investigar, fenomenicamente, o objeto criminalidade, este
aparece j dado pelaclientela das prises e dos manicmios que
constitui ento a matria-prima para a elabo-rao de suas teorias
criminolgicas, com base nas estatsticas oficiais.
A coisificao da criminalidade produzida pelo paradigma etiolgico
comportaento, como reverso da medalha, uma grave conseqncia. Esta
matria-prima obti-da e coincide, no se sabe em virtude de que
harmonia preestabelecida, com o produ-to da reao social e penal a
qual, segundo a hiptese de que parte este paradigmadeveria ser
indiferente para a existncia do seu objeto de investigao, porque
deexistncia ontolgica.
Chegamos, assim, a um ponto fundamental. A partir desta
desconstruoepistemolgica, fica claro como a Criminologia
positivista, mesmo nas suas versesmais atualizadas (atravs da
aproximao multifatorial) no opera como uma ins-tncia cientfica
sobre a criminalidade, mas como uma instncia interna e funcionalao
sistema penal, desempenhando uma funo imediata e diretamente
auxiliar, relati-vamente a ele e poltica criminal oficial.20
Neste sentido, no apenas coloca seu prprio saber ( causal e
tecnolgico) aoservio dos objetivos declarados do sistema, mas
produz (e reproduz) o prpriodiscurso interno que os declara,
avalizando, do ponto de vista da cincia, uma ima-gem do sistema que
dominada por esses objetivos. A sua contribuio para a raci-onalizao
do sistema , sobretudo, uma contribuio legitimadora
(auto-legitimaooficial). (BARATTA, 1983a, p.152)
Verifica-se, desta forma, uma autntica traio criminolgica aos
pressupos-tos epistemolgicos do positivismo cientfico.
5 A Criminologia positivista como cincia do controle
s-cio-penal: das promessas s funes latentes e reais
Pois no se trata de explicar causalmente a criminalidade, mas de
instrumentalizare justificar, legitimando-a, a seleo da
criminalidade e a estigmatizao dos criminososoperada pelo sistema
penal. E no se trata, igualmente, de combat-la, porque afuno do
sistema , precisamente, a de constru-la ou geri-la
seletivamente.
Com seu proceder, a Criminologia positivista contribui para
mistificar osmecanismos de seleo e estigmatizao ao mesmo tempo em
que lhes confereuma justificao ontolgica de base cientfica (uma
base de marginalizao
20. por isso que o seu universo de referncias praticamente
imposto pelo mesmo sistema e ela obrigada a pedir-lhe adefinio do
seu prprio objeto de investigao.
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cientfica aos estratos inferiores). Contribui, igualmente, para
a produo e reproduo deuma imagem estereotipada e preconceituosa da
criminalidade e do criminoso vinculada aosbaixos estratos sociais -
que condiciona, por sua vez, a seletividade do sistema penal -
numcrculo de representaes extraordinariamente fechado que goza -
repita-se - de uma secularvigncia no senso comum em geral e nos
operadores do sistema penal em particular.
Ao definir-se, pois, como cincia causal-explicativa a
Criminologia positivistaoculta o que na verdade sempre foi: uma
cincia do controle social (ANYAR DECASTRO, 1987, p. 22-32) que
nasce como um ramo especfico da cincia positivistapara
instrumentaliz-lo e legitim-lo .21
Tal contributo legitimador destacado por PAVARINI (1980,
p.49-54) ao assi-nalar que foi precisamente pela aportao
determinante do positivismocriminolgico que o sistema repressivo se
legitimou como defesa social. O conceitode defesa social tem
subjacente uma ideologia cuja funo justificar e racionali-zar o
sistema de controle social em geral e o repressivo em particular.
(...)A defesasocial portanto uma ideologia extremamente sedutora,
enquanto capaz de enri-quecer o sistema repressivo (vigente) com os
atributos da necessidade, da legitimi-dade e da cientificidade.
Conseqentemente, a sobrevivncia secular desta Criminologia e
suas represen-taes da criminalidade, na cincia e no senso comum,
para alm de sua desconstruoepistemolgica, se explica pelo
cumprimento de outras funes latentes e reais, distintasdas
prometidas. Eis a o fascnio pelo qual saiu da academia para ganhar
as ruas e legiti-mar o sistema penal, em uma palavra, como cincia
do controle social.
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CCRRIIMMIINNOOLLOOGGIIAA MMIIDDIITTIICCAA EE AA
SSEELLEETTIIVVIIDDAADDEE DDOO
SSIISSTTEEMMAA PPEENNAALL
CRIMINOLOGY MEDIA AND SELECTIVITY OF THE PENAL SYSTEM
Fbio Freitas Dias 1
Felipe da Veiga Dias 2
Tbata Cassenote Mendona 3
RESUMO
O presente estudo tem como tema central o debate acerca da
criminologia miditica e a seletividade imposta pelo sistema penal,
bem como busca respostas a indagao acerca da aceitao social desse
discurso. Para fundamentar o estudo, utiliza-se da teoria do
Labeling Aproach para explicar como ocorre essa seletividade. Para
tanto, utiliza-se aqui o mtodo de abordagem dedutivo, juntamente a
adoo dos mtodos de procedimento monogrfico e da tcnica de pesquisa
de bibliografia indireta. Contudo, cabe aludir como concluses que h
alternativas como a modificao cultural ou at mesmo a simples adoo
do paradigma constitucional-penal e processual penal como prisma
orientador das atividades miditicas, de forma a estruturar uma
atividade informadora e justa para com todos os indivduos na rea
criminal. Palavras-chave: Criminologia miditica; Teoria do Labeling
Aproach; Seletividade do sistema penal.
ABSTRACT
This study is focused on the debate about the criminology media
and selectivity imposed by the penal system, as well as seeking
answers to inquiries about the social acceptance of this discourse.
To support the study, it was utilized the Labeling Aproach Theory
to explain how this selectivity occurs. For that we use here the
method of deductive approach along the adoption of methods
monographic of procedure and technique research bibliography
indirect. However, it is alluding to conclusions that there are
alternatives such as cultural change or even the simple adoption of
the constitutional-penal paradigm and criminal procedure as the
guiding prism media activities, in order to structure an activity
informant and fair to all individuals in the criminal area.
Key-words: Criminology media, Labeling Aproach Theory; Selectivity
of the penal system
INTRODUO
O presente texto tem o objetivo de apontar a relao entre a mdia
e as formas da
seletividade penal. A partir disso busca responder por que o
discurso da criminologia miditica
1 Mestre em Direito (Coimbra). Professor do Centro Universitrio
Franciscano (UNIFRA). [email protected]. 2 Doutorando em
Direito (UNISC). Professor da Faculdade Metodista de Santa Maria
(FAMES). [email protected]. 3 Graduada em Direito (UNIFRA).
Advogada. [email protected].
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aceito pela sociedade? Possvel resposta: Porque diferencia o ns
e o eles. Alm disso, visa
alertar que, muito possivelmente, em decorrncia dessa
seletividade penal criada pela mdia e
aceita pelo senso comum, eleva-se a crena da priso como nica
alternativa para estabelecer a
segurana pblica e a ordem, vez que nada mais eficaz do que uma
pena privativa de liberdade
para afastar eles do convvio social.
A expresso eles, utilizada no presente artigo, est embasada na
ideia de Eugenio Ral
Zaffaroni, no seu livro A palavra dos mortos: conferncias de
criminologia cautelar. Neste texto,
quando o referido autor se utiliza de tal expresso durante a
abordagem do tema da criminologia
miditica, quer sustentar o posicionamento de que essa
criminologia, que segundo suas palavras se
diferenciam substancialmente da criminologia acadmica4, pretende
criar uma realidade onde
existam pessoas boas, que somos ns, expectadores, vulnerveis a
eles como um todo: uma
massa criminosa de diferentes5.
Posto isso, a explorao da temtica da mdia e da seletividade do
sistema penal adota o
mtodo de abordagem dedutivo, haja vista que parte de consideraes
gerais a fim de aplacar
elementos especficos, no obstante cabe aludir tambm a adoo dos
mtodos de procedimento
monogrfico e da tcnica de pesquisa de bibliografia indireta,
todos convergindo para uma
construo terico-crtica do tema.
1 Teoria do Labeling Aproach (ou etiquetamento)
Pensar um ato intrnseco prpria condio humana, processo
intrapsquico que
engloba todos os sentimentos, valores, concepes, crenas e a
conscincia6. Portanto, o
4 ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos mortos: conferncias de
criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva, 2012. p. 303. 5 Eis o
entendimento do referido autor na ntegra: A criminologia miditica
cria a realidade de um mundo de pessoas decentes frente a uma massa
de criminosos, identificada atravs de esteretipos que configuram um
eles separado do resto da sociedade, por ser um conjunto de
diferentes e maus. O eles da criminologia miditica incomodam,
impedem de dormir com as portas e janelas abertas, perturbam as
frias, ameaam as crianas, sujam por todos os lados e por isso devem
ser separados da sociedade, para deixar-nos viver tranquilos, sem
medos, para resolver todos os nossos problemas. Para tanto,
necessrio que a polcia nos proteja de suas ciladas perversas, sem
qualquer obstculo nem limite, porque ns somos limpos, puros e
imaculados. ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos mortos:
conferncias de criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva, 2012. p.
307. 6 O termo foi aqui utilizado no sentido freudiano, ou seja,
como ato psquico que tem a noo da realidade do nosso meio ambiente
imediato, que permite enxergarmos nossa presena no mundo com os
outros e assim reconhecer atributos essenciais. Ver A Teoria
Freudiana da Conscincia, por Gilberto Gomes, Disponvel em . Acesso
em 10 de abr. 2013.
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ato de pensar est num espao de plena liberdade de
desenvolvimento intelectivo, espao
personalssimo, secreto, privado.
Todavia, o homem, como um ser essencialmente social, tende
agrupar-se
comunitariamente, acercar-se do outro, instituir com o seu
semelhante uma convivncia e
coexistncia comunicacional7, ambiente de concretizao do pensar
em expresso real.
Ns nos relacionamos com o semelhante, pois o nosso ser s ser
perceptvel se for
refletido na presena dos outros. A formao da nossa personalidade
e da nossa prpria
histria depende das experincias reais com os outros. O eu s
poder indicar a
individualidade do seu ser, se existir ao seu lado a
alternatividade do ns8, dizer, o
eu, para que exista e se desenvolva enquanto ser, necessita da
convivencialidade
comunitria. Dessa forma, as relaes intersubjetivas so marcadas
pela superao da
natureza puramente natural e instintiva do homem por uma
natureza social, ou seja, o
homem se relaciona e age como membro de uma coletividade e, como
tal, expressa seu
pensamento.
Nesse contexto de inteligncia, o ato de pensar se
inter-relaciona com a natureza
social intrnseca ao ser humano, e o interesse em propagar o
prprio pensamento e
conhecer o pensamento do outro passa a ser algo, no s gentica e
biologicamente, como
comunitariamente natural.
Tal interesse torna os homens sujeitos dialticos que dialogam
entre si, instituem
necessrias relaes comunicacionais, vias de mo dupla, de
reciprocidade, de percepo,
enfim de manifestaes do pensar. Por outras palavras, o dilogo
comunicacional entre os
indivduos algo concreto, externado por algum meio, que
ultrapassou os limites daquele
espao personalssimo antes mencionado9.
Em sntese, pode-se afirmar que a opinio nada mais do que um
[...] movimento
do pensamento de dentro para fora; a forma de manifestao de
pensamento, resume a
7 TZITZIS, Stamatios, Filosofia penal, traduo de Mrio Ferreira
Monte, Legis, 1999. p. 82. 8 TZITZIS, Stamatios, Filosofia penal,
traduo de Mrio Ferreira Monte, Legis, 1999. p. 81. 9 Nesse sentido
possvel sustentar que a liberdade de expresso possui uma dimenso
substantiva e outra instrumental. Como afirma Machado, deve-se
sublinhar a dupla dimenso deste direito. A dimenso substantiva
compreende a actividade de pensar, formar a prpria opinio e
exterioriz-la. A dimenso instrumental, traduz a possibilidade de
utilizar os mais diversos meios adequados divulgao do pensamento.
MACHADO, Jnatas E. M.. Liberdade de Expresso. Dimenses
constitucionais da esfera pblica no sistema social. Coimbra:
Coimbra, 2002. p. 417.
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prpria liberdade de pensamento, encarada, aqui, como manifestao
do fenmeno
social10.
Feita essa introduo sobre a formao de opinio, o presente
trabalho objetiva
salientar os efeitos da criminologia miditica sobre a populao
brasileira no tocante
reproduo de ideias equivocadas e preconceituosas sobre o sistema
penal. Esse fenmeno
d-se, principalmente, pela fabricao dos esteretipos do
criminoso.11
A seletividade dos esteretipos pode se dar pela observao das
caractersticas
comuns populao prisional, por exemplo. De acordo com Eugenio Ral
Zaffaroni,
estes esteretipos permitem a catalogao dos criminosos que
combinam com a imagem
que corresponde descrio fabricada, deixando de fora outros tipos
de delinquentes
(delinquncia de colarinho branco, dourada, de trnsito,
etc.).12
Porm, antes de adentrar na crtica sobre o assunto, imprescindvel
fazer uma
breve anlise sobre a Teoria do Labeling Approach, conhecida
tambm como teoria do
etiquetamento. Essa teoria difere-se da criminologia
tradicional, vez que esta se
preocupa em investigar questes sobre quem o criminoso, como se
torna um desviante
ou porque reincide. J a teoria do labeling approach, teorizada
por autores interacionistas,
questionam quem definido como desviante?, que efeito decorre
desta definio sobre
o indivduo?, em que condies esse indivduo pode se tornar um
objeto de definio? e,
enfim, quem define quem?.13
De acordo com Alessandro Baratta, os tericos precursores dessa
teoria, quais
sejam, Howard S. Becker, Edwin M. Lemert e Edwin M. Shur,
apontaram a pesquisa em
duas direes: uma para a anlise da formao da identidade
desviante, bem como para
definir o desvio secundrio, o que consiste no efeito do
etiquetamento de criminoso
pessoa que recebe essa etiqueta; e outra em investigar o que
constitui o desvio como
10 CALDAS, Pedro Frederico. Vida privada, liberdade de imprensa
e dano moral. So Paulo, 1997. p. 59. 11ZAFFARONI, Eugenio Ral. Em
busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal.
Rio de Janeiro: Revan, 1991. p. 130. 12ZAFFARONI, Eugenio Ral. Em
busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal.
Rio de Janeiro: Revan, 1991. p. 130. 13 BARATTA, Alessandro.
Criminologia Crtica e Crtica do Direito Penal: Introduo Sociologia
do Direito Penal. 3 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002. p 88.
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caracterstica imposta aos comportamentos e aos indivduos, alm de
destacar a quem
incumbe esse poder de atribuio, sendo neste caso as agncias do
controle social14.
Howard S. Becker foi primeiro autor a se aprofundar na anlise
das condutas
desviadas, em sua obra denominada Outsiders15. Segundo Howard S.
Becker, grupos sociais
buscam traar linhas comportamentais a fim de determinar o certo
e errado, para que
assim quando uma regra imposta, a pessoa que presumivelmente a
infringiu (essa
afirmativa encaixa-se com perfeio nos julgamentos miditicos)
pode ser vista como
um tipo especial, algum de quem no se espera viver de acordo com
as regras estipuladas
pelo grupo. Essa pessoa encarada como um outsider16. Segundo
Sergio Salomo
Shecaira, ainda baseando-se na obra de Becker, afirma que aquele
que viola alguma regra
em vigor pode ser interpretado como uma pessoa no confivel para
a vivncia em um
grupo e que pode alcanar um traficante de drogas ou algum que
bebeu em excesso em
uma festa e que se porta de maneira inconveniente17. Diante
disso, conclui o autor que:
surgindo a intolerncia, haver uma espcie de estigmatizao desse
agente.18
Apenas como meno ao tocar no tema da rotulao tambm acresce na
construo
desse processo as classificaes da obra de Erving Goffman acerca
do estigma, haja vista
que sua abordagem demonstra as possibilidades de tais processos
de excluso serem
somados, funcionado combinadamente para excluso de determinados
indivduos19.
Edwin M. Lemert, outro autor relevante para o tema, contribuiu,
principalmente,
estabelecendo a diferena entre delinquncia primria e delinquncia
secundria. Tal
distino foi imprescindvel vez que demonstrou, segundo Alessandro
Baratta, como a
reao social ou a punio sobre uma primeira conduta desviante gera
um estigma, ou
seja, uma tendncia a permanecer no papela social no qual a
estigmao o introduziu.20
Nesse contexto, cabe transcrever o entendimento de Srgio Salomo
Shecaira,
sobre a Teoria do Labeling Approach:
14 BARATTA, Alessandro. Criminologia Crtica e Crtica do Direito
Penal: Introduo Sociologia do Direito Penal. 3 ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2002. p. 89. 15 BECKER, Howard S. Outsiders: estudos de
sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008. 16 BECKER,
Howard S. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de
Janeiro: Zahar, 2008. p. 15. 17 SHECAIRA, Srgio Salomo.
Criminologia. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 292. 18
SHECAIRA, Srgio Salomo. Criminologia. So Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004. p. 292. 19 GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a
manipulao da identidade deteriorada. 4 ed. Rio de Janeiro: LTC,
1988. p. 14. 20 BARATTA, Alessandro. Criminologia Crtica e Crtica
do Direito Penal: Introduo Sociologia do Direito Penal. 3 ed. Rio
de Janeiro: Revan, 2002. p. 89.
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Quando os outros decidem que determinada pessoa non grata,
perigosa, no confivel, moralmente repugnante, eles tomaro contra
tal pessoa atitudes normalmente desagradveis, que no seriam
adotadas com qualquer um. So atitudes a demonstrar a rejeio e a
humilhao nos contatos interpessoais e que trazem a pessoa
estigmatizada para um controle que restringir sua liberdade. ainda
estigmatizador, porque acaba por desencadear a chamada desviao
secundria e as carreiras criminais..21
Diante do exposto, tendo em vista que Teoria do Etiquetamento
analisa
principalmente os efeitos estigmatizantes sobre o indivduo, essa
de suma importncia
para compreender que a conduta desviante construda pela
sociedade, ou seja, no se
trata de uma qualidade do ato que a pessoa comete, mas uma
consequncia da aplicao
pelos outros das regras e sanes para o ofensor. Dessa forma,
leva-se a crer que a mdia
tem uma participao muito grande na construo desse conceito de
desvio.22
nesse contexto de inteligncia que deve ser analisada a informao
sobre o crime.
Scheneider sustenta que existe uma espcie de fascinao pelo
crime. Parece ser uma
percepo compatvel com a realidade, ao menos brasileira, j que h
anos pesquisas no
Brasil indicam que as pginas policiais so as mais lidas nos
jornais e peridicos23. Por
bvio, a criminalidade um campo frtil a propiciar informao,
oferta de opinio,
entretenimento e, em face daquela vis atrativa que produz na
populao em geral,
capaz de captar audincia e aumentar a venda de exemplares. Os
meios de comunicao
so conscientes disso e, evidentemente, a produo de notcias sobre
a criminalidade
direcionada aos fins de informar, oferecer opinio, mas
fundamentalmente de entreter
(mesmo que estigmatizando determinados indivduos) e captar
audincia.
2 A construo da informao pela mdia a partir do processo de
seletividade penal 21 SHECAIRA, Srgio Salomo. Criminologia. So
Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 291. 22 Eis na ntegra o
esclarecimento do autor: Para Becker, a conduta desviante originada
pela sociedade. Os grupos sociais criam a desviao por meio do
estabelecimento das regras cuja infrao constitui desviao, e por
aplicao dessas regras a pessoas especficas que so rotuladas como
outsiders. Dentro dessa linha de raciocnio, a desviao no uma
qualidade do ato que a pessoa comete, mas uma consequncia da
aplicao pelos outros das regras e sanes para o ofensor. SHECAIRA,
Srgio Salomo. Criminologia. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
p. 292. 23 SOARES, Luiz Eduardo. Justia: Pensando alto sobre
violncia, crime e castigo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p.
19.
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Atualmente, os meios de comunicao de massa, principalmente a
televiso, so,
infelizmente, os principais formadores de opinio da
coletividade. Com base nas
(des)informaes exploradas fortemente pela mdia, observada aquela
vis atrativa antes
mencionada, a maioria das pessoas se imaginam como legitimadas a
abordar questes de
ordem penal, processual penal, bem como de poltica criminal.
Tendo em vista que o produto crime e o sensacionalismo
produzem
entretenimento, fato este que eleva os nveis de audincia,
configura-se tal prtica como
altamente rentvel, por isso, se encaixando perfeitamente na
atuao empresarial e
lucrativa desenvolvida pela imprensa privada.
Dessa forma, a mdia acaba configurando parte integrante do
exerccio de poder do
sistema penal, pois tem o poder de criar o punitivismo popular
(ou como aduz recente obra
doutrinria o "populismo penal miditico")24, vez que impe uma
forma de analisar os
problemas sociais de uma forma muitas vezes exacerbada. Com
isso, responsvel por
criaes legislativas s pressas que vo totalmente de encontro com
as garantias
constitucionais.
Segundo Zaffaroni, a comunicao produzida pela mdia no que tange
a fatos
criminosos se configura numa espcie de criminolgia miditica. A
criminologia
miditica atual tem como principal meio tcnico a televiso para
propagar o discurso do
neopunitivismo. Na viso desse jurista, os crticos mais radicais
e precisos sobre a
televiso so Giovani Sartori e Pierre Bourdieu. Afirma que para
Bourdieu a televiso o
oposto da capacidade de pensar, enquanto que Sartori desenvolve
a tese de que o homo
sapiens est se degradando para um homo videns por culpa de uma
cultura exclusivamente
de imagens25.
De acordo com Pierre Bourdieu, a televiso o meio mais eficaz na
tarefa de
deformar a opinio da maioria da populao, o que a distancia das
informaes que so
realmente essenciais para o exerccio da democracia. Vejamos seu
pensamento na ntegra.
H uma proporo muito importante de pessoas que no lem nenhum
jornal; que esto devotadas de corpo e alma televiso como fonte nica
de informaes. A televiso tem uma espcie de monoplio de fato sobre a
formao das cabeas de uma parcela muito importante da populao.
24 GOMES, Luiz Flvio; ALMEIDA, Dbora de Souza de. Populismo
penal miditico: caso mensalo, mdia disruptiva e direito penal
crtico. So Paulo: Saraiva, 2013. 25 ZAFFARONI. A palavra dos
mortos: conferncias de criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva,
2012. p. 305.
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Ora, ao insistir nas variedades, preenchendo esse tempo raro com
o vazio, com nada ou quase nada, afastam-se as informaes
pertinentes que deveria possuir o cidado para exercer seus direitos
democrticos26.
Sendo a televiso o nico meio de acesso informao pela parte
majoritria da
populao, forma-se o grande perigo, pois esse meio de comunicao
em massa, traz um
contedo pronto, no deixando margem s crticas, a evoluo do
pensamento. No se
pode perder de vista que a mdia, atravs da imagem, tem o poder
de criao de uma
realidade j posta e acabada. De acordo com Bordieu, a imagem tem
a particularidade de
poder produzir o que os crticos literrios chamam o efeito do
real, ela pode fazer ver e
fazer crer no que faz ver27.
Partindo da premissa da necessidade de atingir lucro, os meios
de comunicao
realizam um processo de seletividade do que deve ser informado e
agregam contribuies
decisivas sobre a informao de forma transform-la em algo ainda
mais atrativo, de forma
que, esse processo de seleo se sustenta na busca do sensacional,
do espetacular28. Na
verdade, muitas vezes, o discurso de um oferecimento de
informao, mas que,
efetivamente mera opinio, nada tcnica, sem qualquer fundamentao
e que atende
interesses bem claros.
Diante disso, cria-se um punitivismo quase impossvel de ser
desmistificado, criando
uma ideia totalmente distorcida da realidade criminal
principalmente, gerando uma
vontade de punir a qualquer custo. Observe-se a gravidade disso.
A manipulao da notcia
em busca de audincia cria uma espcie de poltica criminal cujas
bases tericas so bem
conhecidas29. Com relao aos efeitos da criao desse punitivismo,
Zaffaroni defende o
seguinte posicionamento:
(...) so os meios de massa que desencadeiam as campanhas de lei
e ordem quando o poder das agncias encontra-se ameaado. Estas
campanhas realizam-se atravs da inveno da realidade (distoro pelo
aumento de espao publicitrio dedicado a fatos de sangue, inveno
direta de fatos que no aconteceram), profecias que se auto-realizam
(instigao pblica para a prtica de delitos mediante metamensagens de
slogans tais como a impunidade absoluta, os menores podem fazer
qualquer coisa, os presos entram por uma porta e saem pela outra,
etc; publicidade de novos mtodos para a prtica de delitos, de
facilidades,
26 BOURDIEU, Pierre. Sobre a televiso. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1997. p. 23-24. 27 BOURDIEU, Pierre. Sobre a televiso. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. p. 28. 28 BOURDIEU, Pierre, Sobre a
televiso. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. p. 25. 29 J tivemos
oportunidade de mencionar que a cultura do castigo e da vingana
legitimam certos discursos e prticas.
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etc.). produo de indignao moral (instigao violncia coletiva,
autodefesa, glorificao de justiceiros, apresentao de grupos de
extermnio como justiceiros, etc.)30.
Porm, o que h de mais perigoso nessa atividade da criminologia
miditica,
consiste na construo do esteretipo do criminoso, ou seja, na
seletividade de quem
so os criminosos perigosos na comunidade31.
De acordo com o Zaffaroni, na Amrica Latina, o esteretipo sempre
se alimenta
das caractersticas de homens jovens das classes mais carentes
(...).32. Dessa forma, o
sistema penal operacionaliza uma atuao seletiva, com fulcro nos
estigmas j
estabelecidos, o que acaba por deixar inerte determinadas
espcies de indivduos que
violam a legislao penal33.
Ainda, porm em obra diversa, explica o autor acima referido que
a criminologia
miditica joga com imagens, selecionando as que mostram os poucos
estereotipados que
delinquem e em seguida os que no cometeram crimes ou que s
incorreram em infraes
menores, mas so parecidos34. No bastasse isso, consolidada a
seletividade, aponta o
autor que surge o exerccio de futurologia aplicada a eles, que
consiste geralmente
em um adolescente de um bairro pobre:
A mensagem que o adolescente de um bairro precrio que fuma
maconha ou toma cerveja em uma esquina, amanh far o mesmo que o
parecido que matou uma velhinha na sada de um banco e, portanto,
preciso isolar a sociedade de todos eles35.
30 ZAFFARONI, Eugenio Ral. Em busca das penas perdidas: a perda
da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 1991. p.
129. 31 Comunidade significa mesmice, e a mesmice significa a
ausncia do Outro, especialmente um outro que teima em ser
diferente, e precisamente por isso capaz de causar surpresas e
prejuzos. Na figura do estranho (no simplesmente o pouco familiar,
mas o alien, o que est fora do lugar), o medo da incerteza, fundado
na experincia da vida, encontra a largamente procurada, e
bem-vinda, corporificao. (...) Dada a intensidade do medo, se no
existissem estranhos eles teriam que ser inventados. E eles so
inventados, ou construdos, diariamente: pela vigilncia do bairro,
pela tev de circuito fechado, guardas armados at os dentes. A
vigilncia e as faanhas defensivas/agressivas que ela engendra criam
o seu prprio objeto. Graas a elas, o estranho metamorfoseado em
aliengena, e o aliengena, numa ameaa. BAUMAN, Zygmunt. Comunidade:
a busca por segurana no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2003. p. 104-105. 32 ZAFFARONI, Eugenio Ral. Em busca das penas
perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro:
Revan, 1991. p. 131. 33 ZAFFARONI, Eugenio Ral. Em busca das penas
perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro:
Revan, 1991. p. 130. 34 ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos
mortos: conferncias de criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva,
2012. p. 307. 35 ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos mortos:
conferncias de criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva, 2012. p.
307
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Zygmunt Bauman analisa o fenmeno ora em discusso sob a tica da
Sociologia,
expondo que a excluso no se d necessariamente pela questo racial
ou cor de pele, mas
que fatalmente ser pobre em uma sociedade rica implica em ter o
status de uma
anomalia social e ser privado de controle sobre representao e
identidade coletiva
constitui um fator determinante de segregao e excluso36. O autor
referido reverbera o
efeito excludente em outras obras37, sendo inclusive possvel
associ-las a viso de Ulrich
Beck, o qual tambm refere o "bode expiatrio"38 e ao mesmo tempo
a necessidade
miditica de aumento dos riscos (como a criminalidade) como base
para sua atividade
hodierna.
Dessa forma, essa criao artificial de dois grupos que no se
encontram, gera
diversos efeitos inclusive na esfera policial e judiciria. Nesse
sentido, Loic Wacquant
aponta alguns desses efeitos no Brasil, abaixo:
Um terceiro fator implica gravemente o problema: o recorte de
hierarquia de classes e da estratificao etnorracional e a
discriminao baseada na cor, endmica nas burocracias policial e
judiciria. Sabe-se, por exemplo, que em So Paulo, como nas outras
grandes cidades, os indiciados de cor se beneficiam de uma
vigilncia particular por parte da polcia, tm mais dificuldade de
acessa a ajuda jurdica e, por um crime igual, so punidos com penas
mais pesadas que seus comparsas brancos. E, uma vez atrs das
grades, so ainda submetidos s condies de deteno mais duras e sofrem
as violncias mais graves. Penalizar a misria significa aqui tornar
invisvel o problema negro e assentar a dominao racial dando-lhe um
aval de Estado39.
Tendo em vista o exposto acima, a questo se torna clara, ou
seja, o discurso
miditico a respeito da criminalidade legitimado na sociedade
porque cria uma distino
entre ns e criminosos, como se existisse uma diviso imaginria
entre pessoas boas
e ms.
Nessa linha de raciocnio, Maria Lcia Karam, citada na obra de
Rafael Braude
36 Na ntegra: Os mecanismos de segregao e excluso pode ou no ser
complementado e reforado por fatores adicionais de raa/pele, mas no
limite todas as suas variedades so essencialmente a mesma: ser
pobre em uma sociedade rica implica em ter o status de uma anomalia
social e ser privado de controle sobre sua representao e identidade
coletiva; a anlise da mancha urbana do gueto norte-americano e da
periferia urbana francesa [mostra] a privao simblica que torna seus
habitantes verdadeiros prias. BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca
por segurana no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. p.
108. 37 BAUMAN, Zygmunt. Vidas desperdiadas. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2005. 38 BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a outra
modernidade. So Paulo: Editora 34, 2010. p. 92. 39 WACQUANT, Loic.
As prises da misria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p.
9-10.
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Canterji, adverte sobre essa vontade da sociedade de identificar
apenas alguns indivduos
bem especficos para serem eles os criminosos inimigos, de modo a
delimitarem a imagem
do que "o mal" ou "o perigoso", e por conseguinte realizar a
"simultnea e conveniente
ocultao dos perigos e dos males que sustentam a estrutura de
dominao do poder"40.
Estabelecida a seleo de quem so eles, o prximo passo, de acordo
com o
pensamento punitivista da criminologia miditica, o que fazer com
isso. Surgindo o culto
priso (refugo humano)41. De acordo com Wacquant, a priso que faz
papel de gueto
ao excluir as fraes do (sub) proletariado negro persistentemente
marginalizado pela
transio para a economia dual do servio e pela poltica de
retirada social e urbana.
Complementa ainda que a priso assegura a colocao parte
(segregare) de uma
categoria indesejvel, percebida como provocadora de uma dupla
ameaa,
inseparavelmente fsica e moral42.
Com efeito, na opinio de Nilo Batista, a mdia tambm faz crer na
pena como ideal
para a soluo da criminalidade, vez que tal discurso muito bem
aceito pela maioria da
sociedade, nos seguintes termos:
O novo credo criminolgico da mdia tem seu ncleo irradiador na
prpria idia de pena: antes de mais nada, crem na pena como rito
sagrado de soluo de conflitos. Pouco importa o fundamento
legitimante: se na universidade um retribucionista e um preventista
sistmico podem desentender-se, na mdia complementam-se
harmoniosamente. No h debate, no h atrito: todo e qualquer discurso
legitimante da pena bem aceito e imediatamente incorporado massa
argumentativa dos editoriais e das crnicas. Pouco importa o
fracasso histrico real de todos os preventinismos capazes de serem
submetidos constatao emprica, como pouco importa o fato de um
retribucionismo puro, se que existiu, no passar de um ato de
f43.
Essa crena na priso no surpreendente, vez que corrobora com o
pensamento
legitimador da mdia, pois a priso, nada mais , para o senso
comum, a forma mais eficaz
e rpida de afastar eles da sociedade, e no nos depararmos com os
reais problemas, ou
at mesmo com nossas semelhanas. De acordo com Bauman, gostamos
de solues
imediatas e simples, caso contrrio, torna-se causa de grande
indignao, agravada ainda
40 CANTERJI, Rafael Braude. Poltica Criminal e Direitos Humanos.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 103. 41 BAUMAN,
Zygmunt. Vidas desperdiadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p.
81 85. 42 WACQUANT, Loic. As prises da misria. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2001. p. 98. 43 BATISTA, Nilo. Mdia e sistema penal no
Capitalismo Tardio. Disponvel em: http://www.bocc.ubi.pt. Acesso em
09 de abr. 2013. p. 03-04.
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mais quando temos que ver nossas prprias falhas que nos
identificam com eles.
Ficamos indignados diante de qualquer soluo que no consiga
prometer efeitos rpidos, fceis de atingir, exigindo em vez disso um
tempo longo, talvez indefinidamente longo, para mostrar resultados.
Ainda mais indignados ficamos diante de solues que exijam ateno s
nossas prprias falhas e iniquidades, e que nos ordenem, ao estilo
de Scrates, que conhea-te a ti mesmo!. E abominamos totalmente a
ideia de que, a esse respeito, h pouca diferena, se que h alguma,
entre ns, os filhos
da luz, e eles, as crias das sombras44
.
Seguindo nesse pensamento, pode-se concluir que atualmente, as
prises consistem
em mecanismos de gesto da misria e dos grupos inconvenientes
representados pelos
mal-adaptados e desajustados sociais45.
Alm da criminologia miditica influenciar as pessoas que no detm
o conhecimento
jurdico, os variados rgos do Poder Judicirio acabam cedendo s
presses punitivistas
de uma populao que no tem qualquer conhecimento da realidade
penal que
enfrentamos. Dessa forma, de acordo com Salo de Carvalho citando
Nancy Gertner, a
concluso irnica: aqueles que possuem a informao sobre os
infratores os juzes
enfrentam extraordinria presso por aqueles que no possuem o
pblico46.
Diante desse desagradvel pensar imposto pela mdia e aceito pela
sociedade, o
nico vis para alterar tal concepo, na opinio de Eugenio Ral
Zaffaroni, no seria a
censura, pois toda censura inclusive fora de qualquer hiptese se
massacre, um
elemento sempre mo do primeiro massacrador que aparea47, mas sim
por meio de
uma mudana cultural e com maior comunicao. De forma mais
precisa, necessrio que,
por meio da cultura de da comunicao, possa haver uma
ressignificao da criminalidade.
Nas palavras do autor:
as faltas ticas na comunicao no so resolvidas com censura, mas
sim com maior comunicao. (...) A arte autntica um instrumento
insupervel que facilita a compreenso do outro, justamente a que o
preconceito obstrui. A criminologia cautelar deve dialogar com
artistas, pois so eles que podem contribuir muitssimo para a
modificao do para
44 BAUMAN, Zygmunt. Tempos lquidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2007. p. 149. 45 CARVALHO, Salo de. O Papel dos Atores do Sistema
Penal na Era do Punitivismo (O Exemplo Privilegiado da Aplicao da
Pena). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 29. 46 CARVALHO, Salo
de. O Papel dos Atores do Sistema Penal na Era do Punitivismo (O
Exemplo Privilegiado da Aplicao da Pena). Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2010. p. 246. 47 ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos
mortos: conferncias de criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva,
2012. p. 515.
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o qu das coisas, para ressignific-las, ou seja, para mudar o
mundo
entendido como conjunto de significados48
.
Diante do acima exposto, pode-se concluir que infelizmente,
atravs da
criminologia miditica e de nenhum esforo de quem detm o
conhecimento para afirmar
o contrrio, formou-se uma sociedade majoritariamente convencida
de que, prendendo
aceleradamente pobres e negros, est no caminho certo para
reduzir a violncia e fazer
justia49.
CONCLUSO
No entendimento ora firmado, pode-se chegar a concluso de que o
discurso da
criminologia miditica, apesar de ser, na maioria da vezes,
equivocado, punitivista e
seletivo, aceito facilmente pela populao pois faz essa ntida
diferenciao entre
pessoas boas e ms.
Essa criao de eles e ns deriva de uma construo social que pode
ser
verificada a partir da j referida Teoria do Etiquetamento (ou
Labeling Approach), a qual
se destina identificao e caracterizao das condutas desviantes,
tendo como
consequncia a alterao na prpria identidade do indivduo.
E para tanto, utiliza-se principalmente a televiso, sendo este
meio o principal
formador de opinio, por trazer um contedo j construdo, pronto e
acabado,
estreitando bastante a possibilidade de pensar mais criticamente
sobre o assunto.
Como consequncia, acaba-se por propagar ainda mais o discurso
punitivista,
fazendo com que a populao enxergue como nica alternativa para
resolver os problemas
da criminalidade a priso, pois consiste no meio mais eficaz para
afastar as pessoas
etiquetadas e indesejveis do convvio com a sociedade e com as
pessoas honestas.
Como mencionado anteriormente, Eugenio Ral Zaffaroni, principal
inspirador do
presente trabalho, prope uma mudana cultural de pensamento, que
poderia ser
alcanado somente com mais informao, com dados verdadeiros sobre
a criminalidade, e
no com limitao da mdia que poderia consistir em uma censura que
no levaria a lugar
48 ZAFFARONI, Eugenio Ral. A palavra dos mortos: conferncias de
criminologia cautelar. So Paulo: Saraiva, 2012. p. 516; 518. 49
SOARES, Luiz Eduardo. Justia: Pensando alto sobre violncia, crime e
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algum. Ou seja, a mdia poderia servir a outro papel que no o de
formar opinies, mas
sim de realmente informar, por fontes legtimas e sem interesses
diversos, como polticos.
Dito isso, a opinio dos presentes autores parece convergir para
que qualquer mudana
cultural no sentido de afinar comportamentos evoludos e
adequados ao momento histrico
que se vive sempre um caminho aceitvel. No entanto, sabe-se que
tal mudana depende
de uma conscientizao coletiva alongada no tempo e desprovida de
efetividade imediata.
REFERNCIAS
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crtica e Crtica do Direito
Penal: Introduo Sociologia do Direito Penal. 3 ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2002. BATISTA, Nilo. Mdia e sistema penal no Capitalismo
Tardio. Disponvel em: http://www.bocc.ubi.pt. Acesso em 09 de abr.
2013. BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurana no mundo
atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. _____. Tempos lquidos.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. _____. Vidas desperdiadas. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. BECK, Ulrich. Sociedade de risco:
rumo a outra modernidade. So Paulo: Editora 34, 2010. BECKER,
Howard S. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de
Janeiro: Zahar, 2008. BOURDIEU, Pierre. Sobre a televiso. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1997. CALDAS, Pedro Frederico. Vida privada,
liberdade de imprensa e dano moral. So Paulo, 1997. CANTERJI,
Rafael Braude. Poltica Criminal e Direitos Humanos. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2008. CARVALHO, Salo de. O Papel dos Atores
do Sistema Penal na Era do Punitivismo (O Exemplo Privilegiado da
Aplicao da Pena). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. GOFFMAN,
Erving. Estigma: notas sobre a manipulao da identidade deteriorada.
4 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1988. GOMES, Gilberto. A Teoria
Freudiana da Conscincia. Disponvel em . Acesso em 10 de abr. 2013.
GOMES, Luiz Flvio; ALMEIDA, Dbora de Souza de. Populismo penal
miditico: caso mensalo, mdia disruptiva e direito penal crtico. So
Paulo: Saraiva, 2013. MACHADO, Jnatas E. M.. Liberdade de Expresso.
Dimenses constitucionais da esfera pblica no sistema social.
Coimbra: Coimbra, 2002.
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Anais do 2 Congresso Internacional de Direito e
Contemporaneidade: mdias e direitos da sociedade em rede
http://www.ufsm.br/congressodireito/anais
SHECAIRA, Srgio Salomo. Criminologia. So Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004. SOARES, Luiz Eduardo. Justia: Pensando alto sobre
violncia, crime e castigo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.
TZITZIS, Stamatios, Filosofia penal, traduo de Mrio Ferreira Monte,
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_____. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do
sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 1991.
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ANLISE CRTICA DOS ARTIGOS DE ANDRADE (2013?) E DIAS, DIAS E
MEDONA (2013)
Denilson Prestes GadzinowskiProf. Roberto Bittencourt
Olinger
Universidade do Oeste de Santa Catarina UNOESCDireito (4 fase)
Criminologia
10/07/2014
Palavras-Chave: Criminologia, Miditica, Seletividade, Penal
1 ANLISE CRTICA DOS ARTIGOSTanto o artigo de Andrade (2013?)
quanto o de Dias, Dias e Medona (2013) fazem
uma breve imerso bibliogrfica nos clssicos do estudo da
Criminologia para consubstanciar suas concluses, chegando Andrade
(2013?) a tratar de teorias como os de Lambroso e Ferri, bem como
tanto Andrade (2013?) quanto Dias, Dias e Medona (2013) se
utilizaram da teoria do Etiquetamento (Labelling Approach).
No resgate de Andrade (2013?) dos estudos de Lambroso e Ferri,
estes alegaram que o criminoso era fruto de sua gentica defeituosa,
e que essa anomalia determinaria quem seria criminoso ou no, sendo
possvel inclusive, pelos traos fsicos determinar quem criminoso ou
no. Claro que teoria ultrapassada e refutada pelos fatos
cientficos, mas que, esse determinismo do criminoso por sua
fisiologia, segundo Andrade (2013?), ainda influencia nosso atual
sistema penal.
Ambos os autores, Andrade (2013?) e Dias, Dias e Medona (2013),
utilizaram a teoria do Etiquetamento (Labelling Approach), cuja
teoria infere, em suma, que no h crime a menos que algum o defina
como tal, etiquetando um determinado comportamento, e que por assim
o fazer, a sociedade j etiqueta quem faz esse tipo de crime.
Com esse estudo, Andrade (2013?) culmina concluindo que a
criminologia passou a perder seu compromisso com a epistemologia,
passando apenas a exercer o papel legitimador do vigente controle
social penal. Todavia, para Dias, Dias e Medona (2013) ele vai alm,
inaugurando a teoria do midiatismo penal, no qual a mdia,
principalmente a televiso, vem pressionando os rgos do Estado e,
por assim dizer, definindo quem deve
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ser preso e quem deve ser solto, separando o eles do ns,
salientando que os presos so sempre os mesmos: os pobres e
negros.
Sim, o homem ao criar uma lei, etiqueta o que ou no aceitvel na
sociedade... Se assim no o fosse, estaramos em estado selvagem, na
lei do mais forte... como os animais, que no conhecem propriedade
ou fronteiras, e s o descobrem quando so mortos por invadir o
territrio do animal mais forte... Ns delegamos a fora ao Estado, e
este legisla para que haja normas mnimos de convivncia em
sociedade... Matar, por exemplo, punido, e todos nisso concordam, e
ainda mais severamente deve ser punido se a morte foi por motivo
ftil... mas o mesmo matar no poder ser punido de forma alguma se
por legtima defesa... essa a lei, que toda a sociedade sanciona
como justa. Mas criar uma lei pensando especificamente em um grupo
de pessoas?
Ser? Ser que realmente o legislador tem isso em mente quando
promulga uma lei penal? Ser que um grupo de deputados se renem e
deliberam qual vai ser a lei que vai ferrar ainda mais com a vida
do pobre e do negro? Sim, por certo que certos crimes tm maiores
incidncias na sociedade mais carente e de predominncia
afro-descendente, isto as estatsticas so inegveis... Entretanto, ao
se verificar os ndices de educao dessas pessoas, poucas ou sequer
uma delas concluiu o ensino mdio, e isso sim, tem maior relao
direta com a criminalidade do que a cor ou camada social. Se as
leis fossem somente para negros e pobres, a condenao de Suzane
Richthofen, que, era de uma classe social alta, sendo loirssima, de
aparncia agradvel, diga-se de passagem, todavia, apesar da lei lhe
garantir o cumprimento de regime semiaberto, todos os pedidos foram
negados, pela presso da sociedade, que no tolera mais crimes desse
tipo, no importa se autor ou autora, negro ou branco, pobre ou
rico.
Tanto Andrade (2013?) quanto Dias, Dias e Medona (2013)
inferiram que o sistema penal seletivo... que pobres e negros so os
que so presos.... Se seletivo ou no, talvez precise de maiores
anlises ante ao crivo dos argumentos expostos acima... Mas em um
aspecto eles esto certos: o sistema penal falho, e ningum se
importa com isso... Mas querendo ou no, o melhor que h at agora, ou
at que outro modelo seja proposto (prises privadas? Leis penais
mais rgidas?)... At l... preciso haver seletividade... uma
seletividade bem maior, bem mais rigorosa... mas no seletividade de
criminosos como tem sido feito... mas uma seletividade de
polticos!! Polticos decentes! A discusso comea por a...
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2 REFERNCIAS BIBLIOGRFICASANDRADE, Vera Regina de. Do Paradigma
Etiolgico ao Paradigma da Reao Social: Mudana e Permanncia de
Paradigmas Criminolgicos na Cincia e no Senso Comum. (2013?) -
Demais dados bibliogrficos no concedidos para anlise do texto.
DIAS, Fbio