CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ESTABILIDADE DE TALUDES CONSIDERANDO O EFEITO DA SISMICIDADE NATURAL NO BRASIL Luis Felipe Figueiredo do Nascimento Projeto de Graduação apresentado ao Curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Engenheiro. Orientadores: Prof. Leonardo de Bona Becker, D.Sc. Marcos Barreto de Mendonça, D.Sc. Rio de Janeiro Agosto de 2013
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CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ESTABILIDADE DE TALUDES CONSIDERANDO
O EFEITO DA SISMICIDADE NATURAL NO BRASIL
Luis Felipe Figueiredo do Nascimento
Projeto de Graduação apresentado ao Curso de
Engenharia Civil da Escola Politécnica,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Engenheiro.
Orientadores:
Prof. Leonardo de Bona Becker, D.Sc.
Marcos Barreto de Mendonça, D.Sc.
Rio de Janeiro
Agosto de 2013
ii
CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ESTABILIDADE DE TALUDES CONSIDERANDO
O EFEITO DA SISMICIDADE NATURAL NO BRASIL
Luis Felipe Figueiredo do Nascimento
PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE
ENGENHARIA CIVIL DA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A
OBTENÇÃO DO GRAU DE ENGENHEIRO CIVIL.
Examinado por:
Prof. Leonardo de Bona Becker, D.Sc.
Prof. Marcos Barreto de Mendonça, D.Sc.
Prof. Fernando Artur Brasil Danziger D.Sc.
Prof. Maurício Ehrlich, D.Sc.
RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL
AGOSTO de 2013
iii
Nascimento, Luis Felipe Figueiredo do
Contribuição ao Estudo da Estabilidade de Taludes
Considerando o Efeito da Sismicidade Natural no Brasil/
Luis Felipe Figueiredo do Nascimento. – Rio de Janeiro:
UFRJ/ Escola Politécnica, 2013.
xii, 151 p.: il.; 29,7 cm.
Orientadores: Leonardo de Bona Becker, Marcos
Barreto de Mendonça.
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/
Curso de Engenharia Civil, 2013.
Referências Bibliográficas: p. 61-67.
1. Sismicidade Natural. 2. Análise de Estabilidade de
Taludes. 3. Análise Pseudo-Estática 4. Método de Spencer.
5. Análises Paramétricas.
I. Becker, Leonardo de Bona et al. II. Universidade Federal
do Rio de Janeiro, UFRJ, Engenharia Civil. III. Contribuição
ao Estudo da Estabilidade de Taludes Considerando o
Efeito da Sismicidade Natural no Brasil.
iv
Dedicatória
Dedico este trabalho aos meus pais Regina Maria e Roberto que me mostraram a
importância do conhecimento e da educação, me incentivando a dar o melhor de mim
sempre.
Ao meu irmão Victor, que em breve poderá ser mais um engenheiro na família.
Aos meus avós Custódio, Hylas (in memoriam) Lídia e Maria Amélia que me orgulham
tanto por suas trajetórias de vida.
v
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus, a inteligência suprema e causa primária de todas as
coisas.
Aos meus pais, Regina Maria e Roberto, que tudo fizeram e fazem buscando sempre o
meu melhor, mesmo que muitas vezes eu não tenha compreendido isso. Obrigado por
todo amor e carinho, todos os valores transmitidos e até mesmo todas as broncas bem
dadas. Se hoje eu estou aqui é porque vocês estiveram sempre me apoiando.
Ao meu irmão Victor, por tantos momentos de diversão e bobeiras, que ajudaram a
tornar essa dura jornada um pouco mais leve. Obrigado também por ter se tornado
meu “despertador” nessa nova fase da minha vida, sempre cuidando dos horários das
minhas medicações e preocupado com meu sono.
À minha família por tantos momentos de descontração, mas em especial aos meus
avós Custódio, Hylas (in memoriam) Lídia e Maria Amélia. Suas trajetórias de vida, tão
diferentes, são exemplos de vida para mim. Obrigado por cada gesto de carinho, por
cada almoço de domingo, por cada história contada, por tudo.
À minha namorada Viviane, por todo seu apoio e incentivo ao longo de 3 anos e meio
de namoro. Minha companheira em momentos de alegria e tristeza, momentos calmos
e difíceis, minha melhor amiga. Obrigado por estar ao meu lado por todo esse tempo,
mesmo com tantas dificuldades. E obrigado por ter me tornado uma pessoa melhor,
reavivando em mim um lado espiritual adormecido, um gosto ainda maior pela leitura,
me fazer dar ainda mais valor à minha família e aos estudos.
Aos meus amigos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, por esses anos todos
de convivência. Foram muitos momentos marcantes (alguns impublicáveis) que serão
lembrados por nós para sempre, tenho certeza. Obrigado a vocês por cada encontro,
cada conversa à mesa, cada momento de risadas descontroladas por uma bobeira dita
e até mesmo por dividirmos cada momento de tensão durante as provas e nas
reuniões de trabalhos, virando noites, “perdendo” fins de semana. Enfim, obrigado a
todos vocês: André Santini, Arthur Fernandes, Bruno Lery, Cássio Pacheco, Diego
Mello, Diego Rezende, Isaac Balster, Luiz Augusto Berger, Raphael Santos e Tiago
Eller.
vi
Aos meus bons e velhos amigos do Colégio de Aplicação da UERJ que me
acompanharam em muitos momentos dessa jornada, seja batendo papo em algum
encontro de turma ou até mesmo me acompanhando ao Maracanã, para vermos o
2.3.3.1 Escala Richter ou Escala de Magnitude Local (ML) ................................. 9
2.3.3.2 Escala de Magnitude do Momento Sísmico (MW) ................................ 11
2.3.3.3 Escalas de Magnitude de Ondas Volumétricas (MB) e Ondas de Superfície (MS) .................................................................................................. 12
APÊNDICE A – Resultados das Análises de Estabilidade de Talude sob Influência de Sismicidade Horizontal ........................................................................................... 69
APÊNDICE B – Método do Talude Infinito .............................................................. 76
APÊNDICE C – Saídas do SLOPE/W para Sismicidade Horizontal ........................... 78
APÊNCIDE D – Saídas do SLOPE/W para Sismicidade Horizontal e Vertical ......... 141
APÊNDICE E – Mapas Sísmicos Mundiais ............................................................. 148
1
1 Introdução
1.1 Considerações Iniciais e Objetivos
Os princípios que envolvem os escorregamentos e a estabilização de taludes já foram
amplamente estudados e discutidos por décadas em todo o mundo. Uma das
considerações envolvendo o tema merece uma atenção especial: o efeito dos sismos.
Trata-se de um tópico muitas vezes determinante na segurança de uma região ou
obra, que pode vir a ser afetada pela ruptura de um talude. Contudo, há certa
dificuldade para definir a maneira de se considerar corretamente os efeitos destes
tremores em obras, sendo estes, muitas vezes, desprezados ou utilizados
incorretamente. A não consideração ou o subdimensionamento do efeito sísmico pode
gerar uma falsa sensação de segurança através dos resultados obtidos, assim como o
superdimensionamento deste efeito pode acabar inviabilizando um projeto.
No entanto, considerando o caso brasileiro, não existe uma determinação explícita em
norma sobre como se considerar o efeito sísmico em taludes. A Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABNT), por meio de suas normas NBR 11682, que trata da
estabilidade de encostas, e NBR 15421, que trata do projeto de estruturas resistentes
a sismos, não traz muitas informações neste aspecto. A primeira, apesar de citar
superficialmente os sismos como ação a ser levada em conta, não aborda sua
consideração no método de cálculo. A segunda não aborda o dimensionamento para
taludes. O Manual de Segurança e Inspeção de Barragens (2002) e as Orientações
para a Elaboração e Apresentação de Projeto de Barragem (2009), ambos
documentos desenvolvidos pelo Ministério da Integração Nacional, apresentam
algumas recomendações para a consideração da sismicidade em taludes de
barragens, mas ainda assim são incompletos, pois também não trazem metodologias
de cálculo.
Desta forma, este trabalho tem por objetivo dar uma pequena contribuição no melhor
entendimento dos efeitos da sismicidade na estabilidade de taludes. Buscar-se-á
abordar procedimentos para a consideração do efeito sísmico (obtenção de
parâmetros e coeficientes) na análise de estabilidade, bem como apresentar valores
destes parâmetros e coeficientes voltados à realidade brasileira. Além disso, através
do Método de Spencer e de análises paramétricas buscou-se entender o efeito dos
sismos naturais em um talude de aterro. Para tal, contou-se com o auxílio do software
2
SLOPE/W 2007, da GEO-SLOPE. Cabe ressaltar que os sismos artificiais – gerados
por ações humanas – não serão abordados neste trabalho.
1.2 Estrutura da Monografia
O capítulo 1 faz a apresentação do trabalho, trazendo as considerações iniciais e os
objetivos que se pretende alcançar com os estudos aqui desenvolvidos.
O capítulo 2 apresenta uma breve revisão sobre sismologia. Inicia-se com o estudo
interno do planeta terra, buscando-se entender a causa dos sismos naturais. Em
seguida são introduzidos alguns conceitos básicos sobre o assunto, desde
nomenclaturas, passando pelas ondas sísmicas, até as famosas escalas Richter,
Mercalli, entre outras.
O capítulo 3 trata da estabilidade de taludes de uma forma geral. Aborda-se a Teoria
do Equilíbrio Limite e seus diferentes métodos, dando ênfase ao Método de Spencer, a
base deste trabalho. Ainda é feita uma consideração especial para a influência da
sismicidade nas análises de estabilidade de taludes. Nesta parte do capítulo é
introduzido um conceito fundamental: a aceleração de pico, ligada ao movimento do
solo durante o sismo horizontal. Explica-se como obtê-la e aplicá-la nos cálculos de
estabilidade.
O capítulo 4 aborda o problema estudado neste trabalho, apresentando os parâmetros
geométricos e geotécnicos considerados para o problema em questão. Faz-se uma
breve explicação sobre as diferentes considerações realizadas pelo SLOPE/W acerca
das influências da sismicidade durante a análise de estabilidade.
O capítulo 5 apresenta os resultados obtidos das análises de estabilidade através do
SLOPE/W e uma discussão dos mesmos.
Por fim, no capítulo 6, são apresentadas as conclusões e considerações finais sobre o
trabalho.
3
2 Sismologia e Caracterização das Ações Sísmicas
2.1 O Conceito de Sismo
Os sismos, popularmente chamados de terremotos, são fenômenos de vibração da
superfície da terra. Ocorrem de forma brusca, tendo origem nos movimentos
subterrâneos de placas tectônicas (subdivisões da superfície terrestre que se
movimentam interagindo entre si – vide item 2.2.2), atividade vulcânica ou por
deslocamento de gases no interior da Terra, e sendo causados por uma liberação de
grandes quantidades de energia sob curto espaço de tempo que se propaga sob a
forma de ondas sísmicas. São observados principalmente nas fronteiras das placas e
nas zonas de falha (descontinuidades formadas pela fratura das rochas superficiais da
Terra e que podem variar de centenas de metros a milhares de quilômetros).
Sendo assim, segundo Monteiro (2007), a Sismologia é a ciência que estuda as
causas e os mecanismos de propagação dos sismos; determinação dos parâmetros
que caracterizam a propagação de ondas sísmicas através das camadas da Terra; e
realiza estudos da previsão da sua ocorrência, principalmente em regiões de elevado
risco sísmico. É uma área de conhecimento de grande importância para a Engenharia
Civil, já que o desempenho das obras é diretamente afetado pelas variações no
comportamento da superfície terrestre. A Figura 1 traz um exemplo de estrutura civil
destruída durante sismo ocorrido no Chile em fevereiro de 2010.
Figura 1 – Desastre sísmico no Chile ocorrido em 27 de Fevereiro de 2010 (GAZETA..., 2010)
4
Um dos papéis principais da Sismologia é a previsão da ocorrência de grandes
sismos. No entanto, por mais que os estudos nesta área tenham avançado, ainda não
é possível se fazer previsões com precisão satisfatória. Contudo, por meio de uma
análise de registros históricos e do acompanhamento dos movimentos das placas é
possível definir zonas no globo onde o risco sísmico é elevado e, consequentemente,
os efeitos das ações sísmicas passam a ter grande importância no cálculo (REBELO,
2004).
2.2 Estrutura Interna da Terra e Teoria da Tectônica de Placas
2.2.1 Estrutura Interna da Terra
Para entender a sismicidade da Terra é importante conhecer sua estrutura interna. O
planeta é dividido internamente de duas formas, baseado em suas características
físicas ou químicas, conforme pode ser observado na Figura 2.
De acordo com o modelo químico a Terra se divide em: crosta, manto e núcleo. A
crosta terrestre, a camada mais superficial, divide-se em continental e oceânica. A
primeira atinge até 70 km de profundidade e é composta basicamente por granito,
enquanto que a segunda, bem mais fina, varia entre 5 e 8 km, sendo composta
principalmente por basalto. O manto divide-se em superior e inferior e é composto de
peridotito (rocha ultrabasáltica). A camada superior atinge 700 km de profundidade,
enquanto que a inferior chega aos 2900 km abaixo da superfície. Por fim, o núcleo
terrestre, que se divide em externo e interno e é composto por ferro e níquel. O núcleo
externo possui 2250 km de espessura e o interno 1221 km.
Já o modelo físico divide a Terra em: litosfera, mesosfera, astenosfera e endosfera. A
litosfera é a camada superficial sólida, composta pela crosta terrestre e parte do manto
superior. Nas regiões de crosta oceânica chega a atingir 100 km de profundidade,
podendo alcançar o dobro nas zonas continentais. A astenosfera localiza-se abaixo da
litosfera, alcançando até 700 km de profundidade. Trata-se de uma camada plástica,
possibilitando o movimento das placas (conforme será visto a seguir). É também a
responsável por fornecer o material expelido pelos vulcões. A mesosfera prolonga-se
dos 700 km aos 2900 km de profundidade. Mesmo com as altas temperaturas no
interior do planeta, a mesosfera encontra-se no estado sólido, devido às elevadas
pressões. Finalmente, a endosfera é composta pelo núcleo terrestre. O núcleo externo
encontra-se no estado líquido enquanto que o núcleo interno é sólido. Assim como no
5
caso da mesosfera, as elevadas temperaturas no núcleo interno não são capazes de
sobrepujar o efeito das imensas pressões.
Figura 2 – Modelos Químico e Físico da Terra (Adaptado de USGS, 1999a)
6
2.2.2 Teoria da Tectônica de Placas
A teoria da tectônica de placas diz que a litosfera está fraturada em 7 placas rígidas
principais e diversas outras menores que se movimentam, conforme observado na
Figura 3. Essas movimentações ocorrem porque a litosfera, mais leve e fria, “flutua”
sobre a astenosfera.
As placas deslizam ou colidem umas contra as outras a uma velocidade variável de 1
a 10 cm/ano. Nas regiões onde se chocam ou se atritam, crescem os esforços de
deformação nas rochas e, periodicamente nesses pontos, ocorrem os grandes
terremotos. É justamente nos limites das placas, ao longo de faixas estreitas e
contínuas, que se concentra a maior parte da sismicidade da Terra (SIS-UnB, 2013a).
Figura 3 – Placas tectônicas (USGS, 2011)
Todo o movimento entre as placas ocorre devido a um mecanismo conhecido por
corrente de convecção, esquematizado na Figura 4. Neste processo o material mais
quente sobe até a base da litosfera, passando a se movimentar lateralmente e
perdendo calor. Assim, tende a descer novamente e dando lugar ao material mais
quente que está subindo, formando um ciclo. À medida que o material se desloca
lateralmente ele entra em atrito com as placas da litosfera, levando-as ao movimento.
7
Figura 4 – Correntes de convecção (WICANDER e MONROE, 2009, p. 19)
Desta forma, devido ao movimento relativo entre as placas, podemos definir 3 tipos de
limites entre elas:
i. Convergente: ocorre quando duas placas se chocam, podendo ocorrer ou não
subducção (a placa mais densa mergulha sob a outra) e/ou soerguimento
(levantamento da placa). Pode se dar entre duas placas oceânicas (ex:
formação das ilhas japonesas), entre uma placa oceânica e uma continental
(ex: formação da cordilheira dos Andes) ou entre duas placas continentais (ex:
formação da cordilheira do Himalaia e da vasta planície do Tibete).
ii. Divergente: ocorre o distanciamento entre duas placas, formando uma lacuna
que é preenchida pelo material ascendente da astenosfera. Pode se dar entre
duas placas continentais (ex: vale em rifte no Leste da África) ou duas placas
oceânicas (ex: dorsal Mesoatlântica)
iii. Transformante: envolve o deslocamento relativo entre placas, sem geração ou
destruição delas (ex: Falha de Santo André, na Califórnia). Isso não significa,
no entanto, que neste tipo de limite não ocorram abalos sísmicos. O principal
exemplo é a Falha de Santo André, na Califórnia (EUA), entre a placa do
Pacífico e a placa Norte-americana.
A Figura 5 traz um exemplo para cada limite de placa tectônica.
Figura 5 – Tipos de limites entre as placas tectônicas (CIENTIFIC, 2013)
2.3 Alguns Conceitos Envolvendo Sismos
2.3.1 Hipocentro, Epicentro e Distância Focal
Por mais que a geração de um sismo tenha o envolvimento de uma superfície de
muitos quilômetros quadrados, dado o tamanho do planeta pode-se considerar que foi
provocado por uma fonte pontual. Este ponto é chamado de hipocentro ou foco
sísmico. A projeção vertical deste ponto na superfície terrestre é chamada de
epicentro e é em torno dele que geralmente ocorrem os principais estragos causados
pelos terremotos. A distância entre hipocentro e epicentro é conhecida por distância
focal. O hipocentro e o epicentro estão evidenciados na Figura 6, sendo a distância
focal a linha tracejada entre eles.
Figura 6 – Hipocentro e epicentro (DIAS, 2006)
É importante citar que não existe uma relação direta entre a energia liberada pelo
sismo e os estragos causados por ele. Um sismo pode liberar grande quantidade de
energia e ser menos destrutivo que outro menos potente, caso seu hipocentro esteja
situado em região mais profunda e/ou seu epicentro no mar ou em zonas desabitadas.
9
2.3.2 Ondas Sísmicas
Conforme citado anteriormente, os sismos são movimentos vibratórios (ondas) da
crosta terrestre, que ocorrem devido à libertação rápida de energia de deformação
acumulada devido, principalmente, aos movimentos das placas tectônicas (REBELO,
2004). Estas ondas sísmicas podem ser de dois tipos principais: ondas de compressão
ou longitudinais (ondas P) e ondas de cisalhamento ou transversais (ondas S). Ambas
são denominadas ondas interiores ou volumétricas.
Existem também as ondas de torção (ondas de Love ou L) e as ondas circulares
(ondas de Rayleigh ou R) que são ondas de superfície. Estas ondas são formadas
quando as ondas volumétricas atingem a superfície e são as principais causadoras
das destruições provocadas pelos grandes sismos. As ondas L são resultado da
interação das ondas S paralelas à superfície (ondas SH) e a própria superfície. As
ondas R são o resultado da interação das ondas P com as ondas S perpendiculares à
superfície (ondas SV) e a própria superfície. Na Figura 7 encontra-se um esquema das
ondas P, S, Rayleigh e Love. (KRAMER, 1996)
Figura 7 – Tipos de ondas sísmicas (Adaptado de BOLT, 1976, p. 48)
2.3.3 Magnitude Sísmica
A magnitude sísmica é uma grandeza relacionada à quantidade de energia liberada
pela ruptura geológica que a originou. Existem diversos métodos para se medir a
magnitude de um sismo. Aqui serão citados alguns deles.
2.3.3.1 Escala Richter ou Escala de Magnitude Local (ML)
Em 1935, Charles F. Richter e Beno Gutenberg desenvolveram uma maneira de se
comparar os sismos através de uma escala adimensional. O sistema opera em escala
10
logarítmica de base 10, medindo a amplitude das ondas sísmicas gravadas por um
sismógrafo, conforme a seguinte equação (DAY, 2002):
ML = log A − log A0 = logA
A0, (2.1)
sendo:
ML: magnitude do sismo;
A: amplitude máxima detectada (em mm) por um sismógrafo padrão Wood-
Anderson localizado a exatamente 100 km do epicentro (existem gráficos e
tabelas para ajustar a distância do epicentro ao sismógrafo caso esta não seja
de exatamente 100 km);
A0: amplitude de referência correspondente a 0,001 mm.
A Tabela 1 apresenta uma comparação entre a frequência dos sismos de acordo com
sua magnitude medida pela escala criada por Richter.
Tabela 1 – Categoria e frequência dos sismos na escala a ML (ENCYCLOPÆDIA BRITTANICA, 2013)
Categoria Magnitude
Richter Frequência normalmente
observada (por ano)
Micro < 1,0 - 2,9 > 100 mil
Pequeno 3,0 - 3,9 12 mil - 100 mil
Leve 4,0 - 4,9 2 mil - 12 mil
Moderado 5,0 - 5,9 200 - 2 mil
Forte 6,0 - 6,9 20 - 200
Grande 7,0 - 7,9 20 - 200
Importante > 8,0 < 3
A medição das ondas sísmicas é realizada por meio da combinação da ação entre um
sensor e um registrador. O sensor (sismômetro) capta os movimentos e estímulos na
superfície de forma bastante precisa e transmite os dados obtidos ao registrador
(sismógrafo), que por sua vez produz um sismograma. O método consiste na obtenção
de um ponto relativamente fixo no espaço, enquanto a Terra se move. Schilindwein e
Macedo (2013) explicam que os aparelhos mecânicos os movimentos verticais são
medidos através de uma massa de grande inércia suspensa por uma mola em espiral
presa a um suporte, o que garante que o corpo manterá a sua posição fixa no espaço
durante o sismo. Nesta massa existe uma pena que toca suavemente um papel
envolvendo um cilindro que gira por movimento de relógio. Se a crosta está em repouso, a
pena marca uma linha horizontal. No entanto, se ocorre um tremor vertical a massa oscila
11
e a pena passa a traçar uma linha relativamente ondulada, conforme a intensidade do
movimento. Os movimentos horizontais são medidos com uma massa presa na
extremidade de um fio, que por sua vez é preso ao suporte. O sistema de marcação na
folha é semelhante ao observado para os movimentos verticais. A Figura 8 traz um
esquema de funcionamento de um sismógrafo mecânico.
Figura 8 – Sismógrafo mecânico (DIAS, 2000)
2.3.3.2 Escala de Magnitude do Momento Sísmico (MW)
Hanks e Kanamori (1979) introduziram a escala MW, que surgiu como um avanço à
escala Richter. Embora popularmente não seja tão conhecida quanto sua antecessora,
a escala MW se tornou o principal método para determinar a magnitude para todos os
grandes sismos modernos (TARANTOLA, 2013). Diferente da escala ML, que se
baseia na medição da amplitude das ondas, a escala de momento utiliza-se de uma
teoria tectônica diferente: o deslocamento elástico, proposto por F. A. Dahlen, em
1972. De acordo com a teoria proposta por Dahlen, a energia liberada por um sismo é
proporcional à área de superfície na falha, à distância média do deslocamento da falha
e à estrutura do terreno no entorno. Desta forma, tem-se que:
MO = μ ⋅ S ⋅ D, (2.2)
sendo:
MO : momento sísmico (10−7 N.m);
μ: módulo de cisalhamento dos materiais ao longo do plano de fraqueza
(geralmente 3x1010 N/m² para a crosta e 7x1012 N/m² para o manto);
S: área do plano de fraqueza;
D: deslocamento médio da falha.
12
Para calcular a magnitude do momento sísmico, utiliza-se a equação construída
por Hanks e Kanamori (1979):
MW = −10,7 + log MO (2.3)
A Tabela 2, apresenta a relação entre a magnitude da Escala de Momento e a energia
liberada em um sismo:
Tabela 2 – Comparação entre a escala MW e a energia equivalente (Adaptado de LOPES, 2010)
Magnitude (MW)
Energia (Joules)
Equivalente de energia liberada
Explosivo TNT
Bombas de Hiroshima
(un.) Fontes diversas
1 2,0 x 106 0,5 kg - -
2 6,3 x 107 15 kg - -
3 2,0 x 109 480 kg -
0,3 barril de petróleo; 2 meses de ar condicionado de 18.000 btu.
4 6,3 x 1010
15 ton. - 10 barris de petróleo
5 2,0 x 1012
480 ton. 0,03 330 barris de petróleo
6 6,3 x 1013
15 kton. 1,2 10 mil barris de petróleo
7 2,0 x 1015
480 kton. 37 330 mil barris de petróleo
8 6,3 x 1016
15 Mton. 1.157 10 milhões de barris de petróleo;
energia produzida pela hidrelétrica de Itaipu em 52 dias.
8,5 3,6 x 1017
85 Mton. 6 mil 60 milhões de barris de petróleo;
energia produzida pela hidrelétrica de Itaipu em 215 dias.
9 2,0 x 1018
480 Mton. 37 mil Energia produzida pela hidrelétrica
de Itaipu em 4,5 anos.
9,5 1,1 x 1019
2,7 Gton. 183 mil Energia produzida pela hidrelétrica
de Itaipu em 25 anos.
2.3.3.3 Escalas de Magnitude de Ondas Volumétricas (MB) e Ondas de
Superfície (MS)
A escala MB, desenvolvida por Gutenberg em 1945, utiliza a amplitude da onda P de
terremotos com distância epicentral (ângulo formado por um raio terrestre passando
pelo epicentro e um passando pelo ponto considerado) entre 20o e 100o. A onda P
empregada na calculo da magnitude MB deve ter período entre 0,5 e 2,0 segundos. A
escala MS, criada por Gutenberg e Richter em 1936, baseia-se na amplitude das
ondas R e é baseada em ondas com período de aproximadamente 20 segundos. É
uma das escalas mais empregadas pela sismologia para a avaliação da magnitude de
grandes sismos (DAY, 2002; KRAMER, 1996).
13
2.3.4 Intensidade Sísmica
A intensidade de um sismo é uma medida da destruição e da reação das pessoas
observada em uma determinada região afetada. Proposta inicialmente pelo italiano
Giuseppe Mercalli, em 1902, e modificada posteriormente por Richter, em 1956, trata-
se de uma classificação qualitativa e, de certa forma, subjetiva. Os efeitos causados
pelo sismo são classificados por numerais romanos de I a XII, sendo I um tremor não
sentido pelas pessoas e XII a alteração calamitosa do relevo da região afetada. Na
Tabela 3 encontra-se a Escala de Mercalli modificada e sua equivalência com a escala
Richter (PRESS et al., 2006; KRAMER, 1996; DATTA, 2010):
Tabela 3 – Escala de intensidade sísmica e comparação com Escala Richter (DATTA, 2010, p. 17;
DEFESA CIVIL-CE, 2008 apud SOUZA, 2009)
Grau Avaliação Descrição dos Efeitos Escala Richter
I Insignificante Não é sentido. Detectado apenas por aparelhos especiais (Sismógrafos).
1,0 - 1,9
II Muito leve Sentido por poucas pessoas, geralmente situadas em edifícios altos. Objetos suspensos podem balançar suavemente.
2,0 - 2,9
III Leve Sentido por pessoas dentro de casas. Ruídos semelhantes à passagem de caminhão pesado. Duração pode ser estimada.
3,0 - 3,9
IV Moderado Sentido dentro e fora de casas. Pode acordar pessoas. Vibrações de louças, janelas e portas. Rangido de paredes.
4,0 - 4,9
V Pouco forte Sentido por muitas pessoas. Quebram-se louças. Portas e janelas são abertas ou fechadas repentinamente. Objetos instáveis podem cair.
VI Forte Sentido por todos. Pessoas abandonam suas casas. Excitação geral. Mobílias pesadas podem mover-se. Danos leves como queda de reboco.
5,0 - 5,9 VII Muito Forte Assusta a todos. Pequenos danos em edifícios. Consideráveis danos em construções ruins. Queda de telhas e platibandas.
VIII Destrutivo Medo geral, próximo do pânico. Consideráveis danos em construções de qualidade regular, inclusive com colapso parcial.
IX Ruinoso Pânico geral. Danos consideráveis em estruturas de grande porte. Parte das estruturas pode deslocar-se dos alicerces. Quebra de tubulações subterrâneas.
6,0 - 6,9
X Desastroso Rachaduras no solo e ondulações em pavimentos de cimento e estradas asfaltadas. Grandes deslizamentos de terra. Trilhos entortados.
7,0 - 7,9
XI Desastroso ao extremo
Quase nenhuma estrutura de alvenaria permanece erguida. Pontes destruídas. Grandes rachaduras no terreno. Tubulações subterrâneas inutilizadas.
XII Catastrófico Danos totais. Praticamente todos os tipos de construções são totalmente danificadas ou destruídas. Objetos são atirados para cima.
8,0 - 8,9
14
2.4 Sismicidade no Brasil e no Mundo
Ao longo de sua história a humanidade vem sofrendo com as ações dos sismos,
afetando tanto as sociedades quanto o próprio planeta. Tremores, alteração no
movimento de rotação da Terra, tsunamis, surgimento de falhas, deslizamentos de
terra, destruição das construções humanas e mortes são alguns dos problemas
causados pelos sismos. Na Figura 9 e na Figura 10 são apresentadas a distribuição
dos sismos que ocorreram entre 1965 e 1995 e a distribuição dos vulcões com
atividade recente (dada escala geológica de tempo) respectivamente.
Figura 9 – Distribuição dos sismos pelo mundo (LNEG, 2007)
Figura 10 – Distribuição dos vulcões ativos pelo mundo (LNEG, 2007)
15
Esta distribuição, tanto dos sismos quanto dos vulcões, serviu como orientação na
delimitação dos limites das placas, ajudando a fundamentar a teoria da tectônica de
placas (SIS, 2013b). Analisando as duas figuras anteriores e comparando-as com a
Figura 3 no item 2.2.2, observa-se que os sismos e as atividades vulcânicas
concentram-se nas bordas das placas.
De acordo com D’Agrella Filho (2010), de 75 a 80% da energia liberada anualmente
pelos terremotos ocorre ao longo do chamado “Anel de Fogo do Pacífico”,
apresentado na Figura 11, em alusão à presença de vulcões coincidentes com os
sismos. Além disso, de 15 a 20% ocorre ao longo da zona “Mediterrânea-
Transasiática”, que começa nos Açores (Oceano Atlântico), passando pelo Norte da
África, Itália, Alpes, Turquia, Irã, Himalaia, Sul da China, até se unir ao “Círculo de
Fogo do Pacífico”. O sistema formado pelas cadeias meso-oceânicas representa uma
terceira zona de atividade sísmica, com cerca de 3 a 7% de energia liberada
anualmente.
Figura 11 – Anel de Fogo do Pacífico (USGS, 1999b)
O restante da Terra é considerado como sendo assísmico. Entretanto, nenhuma
região da Terra pode ser considerada como completamente livre de terremotos. Cerca
16
de 1% da sismicidade global é devida a terremotos em regiões intraplacas, mais
distantes das maiores zonas sísmicas. Os sismos intraplacas ocorrem pelas tensões
geradas nas bordas que são transmitidas para todo o interior, e geralmente são de
magnitudes mais baixas. Há, no entanto, relatos de grandes terremotos nessas
regiões, como os ocorridos em 1811 e 1812 em Nova Madrid, no estado americano do
Missouri, no Vale do Mississipi.
Anualmente ocorrem algumas centenas de milhares de tremores em todo planeta, mas
muitos deles não são percebidos. Contudo, alguns deles foram marcantes na história
mundial. Tudo indica que o mais avassalador tenha sido o de Shanxi, na China, no
ano de 1556. Acredita-se que tenha matado cerca de 830 mil pessoas. Apesar das
consequências, o terremoto de Shanxi não foi o de maior magnitude. Especialistas
estimam que ele tenha atingido 8,3 graus na escala MW. É um valor altíssimo –
terremotos que passam dos 8 graus costumam causar caos e morte em um raio de até
100 km de distância – mas não o maior já registrado. O mais violento sismo já
registrado cientificamente ocorreu no Chile em 1960. Alcançou 9,5 graus na escala MW
e deixou 1600 mortos, 300 feridos e 2 milhões de desabrigados. Na Figura 12 pode-se
ver um exemplo do estrago causado pelo terremoto de Valdivia.
Figura 12 – Terremoto de Valdivia (Chile), 1960 (NGDC, 1960)
A Tabela 4 apresenta os 15 maiores sismos registrados no mundo, em magnitude,
enquanto que a Tabela 5 apresenta os considerados mais destrutivos (em número de
mortes).
17
Tabela 4 – Maiores sismos já registrados ou estimados - escala MW (USGS, 2013)
Data Localização Magnitude
(MW)
22/05/1960 Valparaíso, Chile 9.5
28/03/1964 Prince William Sound, Alaska (EUA) 9.2
26/12/2004 Costa oeste do norte do Sumatra, Indonésia 9.1
11/03/2011 Proximidade da costa leste de Honshu, Japão 9.0
04/11/1952 Península de Kamchatka, Russia 9.0
13/08/1868 Arica, Chile 9.0
26/01/1700 Zona de subducção de Cascadia ≈ 9
27/02/2010 Mar de Bio-Bio, Chile 8.8
31/01/1906 Entorno da costa de Esmeraldas, Equador 8.8
04/02/1965 Ilhas Rat, Alaska 8.7
01/11/1755 Lisboa, Portugal 8.7
08/07/1730 Valparaíso, Chile 8.7
11/04/2012 Costa oeste do norte do Sumatra, Indonésia 8,6
28/03/2005 Norte do Sumatra, Indonésia 8,6
09/03/1957 Assam, Tibet 8,6
Tabela 5 – Sismos mais destrutivos da história em número de mortes - escala MW (USGS, 2010b)
Data Localização Número de
Mortes Magnitude
(MW)
23/01/1556 Shanxi , China 830 mil ≈ 8
12/01/2010 Porto Príncipe, Haiti 316 mil 7.0
27/07/1976 Tangshan, China 242.769 7.5
09/08/1138 Alepo, Síria 230 mil ≈ 8,5
26/12/2004 Ilhas Andaman, Sumatra 227.898 9.1
22/12/856 Damghan, Irã 200 mil -
16/12/1920 Haiyuan, China 200 mil 7.8
23/03/893 Ardebil, Irã 150 mil -
01/09/1923 Kanto, Japan 142.800 7.9
05/10/1948 Ashgabat, Turcomenistão 110 mil 7.3
27/09/1290 Chihli, China 100 mil ≈ 6,8
12/05/2008 Sichuan Ocidental, China 87.587 7.9
08/10/2005 Paquistão, norte da Índia e Afeganistão 86 mil 7.6
11/1667 Shemakha, Azerbaijão 80 mil -
18/11/1727 Tabriz, Irã 77 mil -
Quanto ao Brasil, popularmente diz-se que o país é livre de terremotos, uma ideia
equivocada. O Brasil encontra-se praticamente no centro da placa Sulamericana,
conforme visto na Figura 3. Como foi dito anteriormente, a sismicidade intraplacas
corresponde a uma porcentagem pequena da atividade sísmica mundial, mas mesmo
assim, não deve deixar de ser considerada. Os tremores “brasileiros” têm causas na
existência de falhas que surgem por desgastes na placa Sulamericana ou então são
reflexos de sismos com epicentro em outras regiões (SANTOS e AGUIAR, 2012).
18
Desta forma, pode-se dizer que os abalos sísmicos brasileiros apresentam
características diferentes dos que ocorrem, por exemplo, no Japão ou na Califórnia
(Estados Unidos), que são interplacas.
A cada ano o Brasil é atingido por apenas um sismo de magnitude até 4 na Escala
Richter, ocorrendo sismos maiores em intervalos médios mínimos de 5 anos
Assumpção (2005). O maior sismo já registrado com epicentro dentro do país ocorreu
em 1955, na Serra do Tombador, no Mato Grosso e atingiu 6,6 graus na Escala
Richter. Além disso, só há registro de uma vida perdida devido a um abalo sísmico.
Em 2007 uma criança de 5 anos morreu vítima de um tremor de 4,9 graus na Escala
Richter. A Figura 13 traz o mapa da distribuição dos sismos no território brasileiro.
Figura 13 – Distribuição dos sismos no território brasileiro (IAG-USP, 2013)
19
3 Estabilidade de Taludes
3.1 Introdução
Este capítulo tratará dos conceitos de estabilidade de taludes. Serão apresentados os
conceitos de talude e movimento de massa e, em seguida, introduzidos os objetivos,
tipos de análises de estabilidade, considerações e métodos envolvidos.
Os taludes ou encostas naturais são superfícies inclinadas de maciços terrosos,
rochosos ou mistos, originados em processos geológicos e geomorfológicos ou pela
ação humana. Entender e estudar os mecanismos e processos de instabilização de
taludes e suas formas de contenção é importante e necessário, devido aos danos que
as rupturas dos taludes podem causar.
Segundo Gerscovich (2009) as análises de estabilidade têm os seguintes objetivos:
i. Encostas naturais, cortes ou escavações – Estudar a estabilidade de taludes,
avaliando a necessidade de medidas de estabilização.
ii. Barragens e aterros – Estudar as diferentes seções e definir a configuração
economicamente mais viável. São levados em conta diversos momentos da
obra como: final de construção, operação, rebaixamento, sismo etc.
iii. Rejeitos – Muitas vezes há a necessidade de se desfazer de ou estocar
volumes em grande quantidade e em curto espaço de tempo em áreas com
solo de baixa resistência.
iv. Retro-análise – Averiguação de taludes rompidos permitindo a reavaliação de
parâmetros.
Em linhas gerais, o processo de instabilização do talude ocorre quando a tensão
cisalhante atuante no maciço é maior do que a resistência ao cisalhamento do solo.
Desta forma, surge uma superfície de cisalhamento contínua na massa de solo, cujo
material no entorno desta superfície perde as características originais durante o
processo de ruptura, o que leva à formação da zona cisalhada, conforme pode ser
observado na Figura 14 (GERSCOVICH, 2009). Após atingir a ruptura, o solo rompido
pode se deslocar por ação da gravidade.
20
Figura 14 – Zona fraca, zona cisalhada e superfície de cisalhamento (LEROUEIL, 2001 apud
GERSCOVICH, 2009)
3.2 Movimento de Massas
Movimento de massas é o nome dado ao processo de desprendimento e transporte do
solo e/ou rocha. Pode ocorrer de diversas formas, das quais podem-se destacar as
seguintes (AUGUSTO FILHO E VIRGILI, 1998 apud PIMENTA JUNIOR, 2005):
i. Escorregamentos – Apresentam poucos planos de escorregamento externos e
velocidades médias a altas. Podem ocorrer em geometria planar, circular ou
em cunha;
ii. Rastejos – Apresentam vários planos de deslocamentos internos e velocidades
muito baixas (mm/ano a cm/ano), podendo acelerar bruscamente em caso de
perturbações (cm/ano a m/ano). Costumam ocorrer em solos coluvionares com
nível do lençol freático elevado;
iii. Quedas e tombamentos – Não apresentam planos de deslocamento. Ocorrem
em material rochoso e de geometria variável, podendo apresentar altas
velocidades;
iv. Corrida de detritos – Apresenta muitas superfícies de deslocamento e
velocidades médias a altas. Possui caráter bastante destrutivo, pois a massa
de solo passa a se comportar como fluido viscoso e costuma carregar tudo que
está em seu caminho. Não possui geometria definida e pode alcançar limites
muito além do pé da encosta.
21
A Tabela 6 apresenta alguns fatores causadores de movimentos de terra.
Tabela 6 – Fatores deflagradores dos movimentos de massa (VARNES, 1978 apud GEORIO, 2000,
p. 13)
Ação Fatores Fenômenos geológicos / antrópicos
Aumento da
solicitação
Remoção de massa (lateral ou da base)
Erosão, escorregamentos
Cortes
Sobrecarga
Peso da água de chuva, neve, granizo etc.
Acúmulo natural de material (depósitos)
Peso da vegetação
Construção de estruturas, aterros etc.
Solicitações dinâmicas Terremotos, ondas, vulcões etc.
Explosões, tráfego, sismos induzidos
Pressões laterais Água em trincas, congelamento, material expansivo
Redução da
resistência
Características inerentes ao material (geometria, estruturas etc.)
Características geomecânicas do material, tensões
Mudanças ou fatores variáveis
Intemperismo: redução na coesão, ângulo de atrito
Elevação do N.A.
3.3 Análises de Estabilidade de Taludes
3.3.1 Introdução
De acordo com Dyminski (2011) a análise de estabilidade de taludes possui alguns
objetivos principais:
i. Avaliar a estabilidade de taludes das obras geotécnicas sob diferentes
condições de solicitação ou elaborar projetos de estabilização de taludes já
rompidos;
ii. Avaliar o risco de escorregamento em taludes naturais ou artificiais, por meio
de análises de sensibilidade, verificando a influência relativa de determinados
parâmetros;
iii. Retroanálise em escorregamentos já ocorridos, possibilitando o entendimento
dos mecanismos de ruptura e da influência de fatores ambientais.
A análise de estabilidade possibilita estimar o quão seguro está ou estará um talude.
Isso se reflete no cálculo de um fator de segurança, que é o menor valor da relação
22
entre a tensão cisalhante resistente do solo e a tensão cisalhante mobilizada pelos
esforços atuantes considerando as possíveis superfícies potenciais de ruptura:
FS =τres
τmob, (3.1)
sendo:
FS: fator de segurança;
τres : tensão cisalhante resistente;
τmob : tensão cisalhante mobilizada.
De acordo com o valor de FS, tem-se:
i. FS > 1,0 → obra estável;
ii. FS = 1,0 → ocorre ruptura por escorregamento;
iii. FS < 1,0 → sem significado físico.
3.3.2 Teoria do Equilíbrio Limite
3.3.2.1 Considerações Iniciais
Existem duas formas de se abordar o fator de segurança nas análises da estabilidade
de taludes: Teoria do Equilíbrio Limite e Análise de Tensão x Deformação. A segunda,
por fugir do escopo deste trabalho, não será apresentada aqui.
Na década de 10 do século XX, foram desenvolvidos na Suécia métodos de análise de
estabilidade em uso até os dias atuais. São baseados no conceito de equilíbrio limite,
o que pressupõe que:
i. O solo comporta-se como material rígido-plástico, ou seja, rompe-se
bruscamente, sem se deformar;
ii. Considera-se que a ruptura só ocorre quando a resistência for atingida em
todos os pontos ao longo da superfície;
23
iii. Existe uma superfície de ruptura de forma conhecida e, acima dela, uma
porção de solo instável. Sob ação da gravidade esta massa de solo instável se
movimenta como corpo rígido;
iv. O solo segue o critério de resistência de Mohr-Coulomb ao longo da superfície
de ruptura, conforme a Equação (3.2):
τres = c + σV ⋅ tanϕ, (3.2)
sendo:
τres : resistência ao cisalhamento total do solo;
c: coesão do solo;
σV: tensão vertical atuante;
Φ: ângulo de atrito interno do solo.
O método busca estabelecer o grau de estabilidade do terreno por meio do cálculo do
equilíbrio de uma massa ativa de solo com base nas seguintes condições:
i. Arbitra-se uma determinada superfície potencial de ruptura, passando a
considerar a massa de solo acima como corpo livre;
ii. Calcula-se o equilíbrio na massa de solo com base nas equações da estática
( FV = 0, FH = 0 e M = 0).
Vale ressaltar que os métodos que seguem o equilíbrio limite nem sempre satisfazem
todas as 3 condições da estática. Alguns ignoram o equilíbrio de forças, outros
ignoram o equilíbrio de momentos. Alguns métodos por sua vez conseguem satisfazer
as 3 condições. A seguir serão apresentados alguns métodos de análise de
estabilidade de taludes que consideram o equilíbrio limite, dando ênfase ao Método de
Spencer que será utilizado neste trabalho.
3.3.2.2 Tensões Totais X Tensões Efetivas
É muito importante definir corretamente os parâmetros de resistência do solo para se
garantir um resultado coerente nas análises de estabilidade de talude. Tais análises
podem ser feitas a partir tanto em termos de tensões totais quanto em termos de
tensões efetivas. Sendo assim, deve-se avaliar corretamente a situação considerada
24
para se aplicar o método correto. Vale ressaltar que há situações que permitem a
utilização das duas abordagens.
A análise em tensões totais é utilizada para solicitações não drenadas quando não se
conhecem as poro-pressões geradas pela solicitação. Este tipo de análise é adequada
para solicitação de curto prazo, pois a longo prazo o excesso de poro-pressão se
dissipa e deve-se optar pela análise em tensões efetivas. Neste caso a resistência ao
cisalhamento é determinada a partir dos parâmetros totais c e ϕ ou Su (resistência não
drenada da argila), obtendo-se:
τ = c + σV ⋅ tanϕ (3.3)
τ = Su (3.4)
A análise em tensões efetivas é utilizada quando se conhecem as poro-pressões
geradas pela solicitação ou quando essas poro-pressões foram dissipadas (caso
contrário não é possível determinar as tensões efetivas ao longo da superfície de
ruptura). Essa analise é aplicada para solicitações em solos argilosos submetidos a
carregamentos lentos ou quando estes são a carregamento rápido a longo prazo.
Também é aplicada para solos de permeabilidade elevada. Neste caso, tem-se:
τ = cpico′ + σV ⋅ tanϕpico
′ (3.5)
τ = σV ⋅ tan ϕresidual′ (3.6)
3.3.2.3 Métodos de Estabilidade
3.3.2.3.1 Método do Talude Infinito (1957)
O Método do Talude Infinito (SKEMPTON & DELORY, 1957), considera um
escorregamento predominantemente translacional, paralelo à superfície do talude,
bem como as linhas de fluxo (em caso de percolação). Um talude é dito infinito quando
tem sua extensão muito maior do que sua espessura. É comumente observado em
contatos solo-rocha, colúvio-solo residual ou em pilhas de material granular.
O problema é analisado admitindo-se que a massa de solo movimenta-se como um
corpo rígido. Para tal, consideram-se as tensões atuantes na base de uma fatia
25
vertical genérica de largura unitária com um nível d’água (NA) qualquer. Como as
seções verticais são idênticas (característica inerente ao método) as tensões atuantes
nestas seções podem ser desconsideradas, conforme a Figura 15.
Figura 15 – Método do Talude Infinito (SKEMPTON & DELORY, 1957 apud BECKER 2013)
FS =c′ + γ − m ⋅ γw ⋅ h ⋅ cos2 β ⋅ tanϕ′
γ ⋅ h ⋅ cosβ ⋅ sen β (3.7)
3.3.2.3.2 Método de Culmann (1866)
O Método de Culmann (CULMANN, 1866) baseia-se na hipótese de uma superfície de
ruptura plana passando junto/próximo ao pé do talude. Assim, define-se a cunha a ser
analisada considerando-a como um corpo rígido deslizando ao longo da superfície
plana, conforme Figura 16.
Figura 16 – Método de Culmann (CULMANN, 1866 apud BECKER, 2013)
26
3.3.2.3.3 Método das Cunhas
Muitas vezes a superfície potencial de ruptura pode ser constituída por dois ou mais
planos. Isso se dá quando existem camadas ou zonas de menor resistência no interior
do maciço. O Método das Cunhas, então, propõe que a análise seja feita considerando
que a massa de solo potencialmente instável seja dividida em duas ou mais cunhas,
como pode ser observado na Figura 17. A solução é obtida por processo iterativo.
Figura 17 – Método das Cunhas (GERSCOVICH, 2009)
3.3.2.3.4 Método das Fatias
O Método das Fatias divide a massa potencialmente instável em diversas fatias
verticais que são analisadas individualmente como um único bloco de
escorregamento, sofrendo de maneira independente o efeito das variáveis do terreno
(tipo de solo, nível d’água, carregamentos externos etc.), conforme a Figura 18:
Figura 18 – Método das Fatias
onde:
Wi: peso da fatia;
xi: projeção da base da fatia;
27
li: base da fatia;
θi: inclinação da base da fatia em relação a horizontal;
Ei: tensões normais que atuam na face esquerda;
Xi: tensões cisalhantes que atuam da face esquerda;
Ei+1: tensões normais que atuam na face direita;
Xi+1: tensões cisalhantes que atuam na face direita;
Ue e Ud : resultantes das poro-pressões nas faces verticais;
ai e ai+1: ponto de aplicação das tensões normais nas faces esquerda e direita
da fatia, respectivamente;
Ni′ : resultante das tensões efetivas normais à base;
bi: posição de N′i em relação a base da fatia;
Ti: resultante das tensões cisalhantes mobilizadas na base;
Ui: resultante das poro-pressões na base Ui = ui ∙ li . ui é a poro-pressão
média atuando na base da fatia.
As grandezas Wi, xi, li e θi são conhecidas pela geometria do problema. Ue, Ud e Ui
são obtidos pela rede de fluxo. A Tabela 7 apresenta um resumo das incógnitas do
sistema, enquanto que a Tabela 8 traz a lista de equações conhecidas na solução do
fator de segurança.
Tabela 7 – Resumo das incógnitas do sistema
Incógnitas Descrição
n Módulo da força normal à base de cada fatia: N'
n Ponto de aplicação da força normal à base: b
n-1 Módulo da força normal à interface entre as fatias: Z
n-1 Ponto de aplicação da força normal à interface entre as fatias: a
n-1 Módulo da força de cisalhamento na interface entre as fatias: X
1 Fator de Segurança: FS
5n-2 Número total de incógnitas
Tabela 8 – Equações conhecidas na solução de FS
Equações Descrição
n Somatório das forças horizontais é nulo
n Somatório das forças verticais é nulo
n Somatório dos momentos é nulo
3n Número total de equações
28
Observa-se que um total de 5n − 2 incógnitas para 3n equações, resultando em 2n − 2
incógnitas a mais no sistema. Sendo assim, o sistema é indeterminado. Desta forma,
torna-se necessário adotar hipóteses simplificadoras de forma a reduzir o número total
de incógnitas e tornar o problema possível de ser solucionado analiticamente.
Uma destas hipóteses adotadas é a de que a força normal atua no centro da fatia, o
que torna o valor de b conhecido, reduzindo o número de incógnitas para 4n − 2.
Assim, restam apenas n − 2 incógnitas a mais no sistema.
Método de Fellenius (1927, 1936)
O Método de Fellenius considera a superfície de ruptura circular e adota a hipótese de
que não há interação entre as fatias (as forças Ei, Ei+1, Xi, e Xi+1 se anulam
mutuamente). Além disso, considera que Wi, N′i e Ui atuam no centro da base da fatia.
FSFellenius =c′ ⋅ L + tan ϕ′ ⋅ Wi ⋅ cosθi − Ui
Wi ⋅ senθi , (3.8)
sendo: L = li
O método satisfaz o equilíbrio de forças em cada fatia segundo a direção
perpendicular à base e o equilíbrio de momentos global, segundo o centro da
superfície de deslizamento. O Método de Fellenius pode gerar fatores de segurança
com erros grosseiros, geralmente a favor da segurança (FSFellenius < FSreal ).
Método de Janbu Simplificado (1954)
O método original de Janbu baseia-se em equilíbrio de forças e momentos. A versão
simplificada, por sua vez, é baseada no equilíbrio de forças, desprezando as
componentes Xi, e Xi+1, referentes às forças de atrito lateral entre as fatias. Janbu
busca satisfazer parcialmente o equilíbrio de momentos através de um fator de
correção empírico 𝑓0. Este depende do tipo de solo e da forma da superfície de
deslizamento.
FSJanbu =
𝑓0cosθi ⋅ mθ
⋅ c′ ⋅ li ⋅ cosθi + tanϕ′ ⋅ Wi − Ui ⋅ cosθi
Wi ⋅ tanθi , (3.9)
sendo: mθ = cosθi +tan ϕ′ ⋅sen θi
FS
29
Diferente dos dois métodos anteriores, o Método de Janbu Simplificado pode ser
aplicado tanto para superfícies circulares quanto para superfícies não circulares,
tornando-o uma ferramenta importante na análise de estabilidade de taludes.
Método de Bishop Simplificado (1955)
O Método de Bishop Simplificado também considera a superfície de ruptura circular e
adota a hipótese de que a força de atrito entre as fatias pode ser desprezada, ou seja,
a resultante dos esforços entre as fatias é horizontal. O equilíbrio de forças se dá na
direção vertical e, desta forma, além de atender ao equilíbrio de momentos, o método
também atende o equilíbrio de forças verticais.
FSBishop =
1mθ
⋅ c′ ⋅ li ⋅ cosθi + tanϕ′ ⋅ Wi − Ui ⋅ cos θi
Wi ⋅ senθi , (3.10)
sendo: mθ = cosθi +tan ϕ′ ⋅sen θi
FS
Observa-se que o fator de segurança aparece em ambos os lados da equação, o que
sugere o uso de processos iterativos na resolução do método. Contudo, a
convergência tende a ser rápida. Diferente do método anterior, o fator de segurança
encontrado pelo Método de Bishop Simplificado costuma se aproximar bastante do
fator de segurança real do talude, o que torna o método bastante satisfatório.
Método de Morgenstern & Price (1965)
O Método de Morgenstern & Price é considerado um dos métodos mais rigorosos para
análise de estabilidade de taludes, atendendo todas as condições de equilíbrio de
forças e momentos e podendo ser aplicado a qualquer superfície de ruptura. Contudo,
é um método complexo e necessita do auxílio de um computador para o
desenvolvimento dos cálculos.
A hipótese adotada considera que:
X = λ ⋅ f x ⋅ E, (3.11)
sendo:
λ: constante a ser determinada por processo iterativo;
f(x): função arbitrária
30
A função f(x) geralmente costuma ser arbitrada como arco de seno, devido à pouca
influência no valor final do fator de segurança. No entanto, a função pode assumir
valor constante, arco de seno incompleto, trapezoidal etc. Vale ressaltar que quando
f x = 0 a solução torna-se idêntica à Bishop e quando f x = constante o método
torna-se idêntico ao de Spencer.
Método de Spencer (1967)
O Método de Spencer adota a hipótese de que todas as resultantes dos esforços entre
as fatias (Q) são paralelas entre si. Há um ângulo δ de inclinação das resultantes.
Desta forma, diminuem-se n − 2 incógnitas, restando 3n incógnitas para 3n equações
(Figura 19).
Observa-se, que o Método de Spencer atende às 3 condições de equilíbrio, sendo,
portanto, considerado um método rigoroso. Além disso, é aplicável a superfícies não-
circulares.
Figura 19 – Simplificação do Método de Spencer (BECKER, 2013)
Através do equilíbrio das forças paralelas e normais à base da fatia, obtem-se:
Fn = 0
Ni + Ui − Wi ⋅ cosθi + Qi ⋅ sen(θi − δ) = 0
Ni = Wi ⋅ cosθi − Ui − Qi ⋅ sen(θi − δ) = 0 (a)
Ft = 0
Ti − Wi ⋅ senθi − Qi ⋅ cos(θi − δ) = 0
31
Ti =c′ ⋅ li
FS+
Ni ⋅ tan ϕ′
FS
c′ ⋅ li
FS+
Ni ⋅ tanϕ′
FS= Wi ⋅ senθi + Qi ⋅ cos(θi − δ) (b)
Substituindo a em b:
Q =
c′ ⋅ liFS +
tanϕ′
FS Wi ⋅ cosθi − Ui − Wi ⋅ sen θi
cos(θi − δ) 1 +tanϕ′ ⋅ tan(θi − δ)
FS (3.12)
Observa-se que Q é função de FS e δ. Aparentemente, trata-se de uma situação sem
solução. Contudo, como dito anteriormente, a força Q é a força entre as fatias, ou seja,
uma força interna. Logo, não havendo carregamento externo, tem-se que:
Qi
n
i=1= 0 (c)
Além disso, é suposto que as direções de W, N e U passam pelo centro da base da
fatia. Como o somatório entre as forças atuantes (as citadas anteriormente e Q) vale
zero, então, para que o somatório dos momentos na fatia seja nulo, a direção de Q
também deve passar pelo centro.
Qi
n
i=1⋅ yi ⋅ cos δ + xi ⋅ senδ = 0, (d)
sendo xi e yi as coordenadas do centro da base da fatia “i”.
A solução final para o problema pode ser obtida seguindo as seguintes etapas:
i. Arbitra-se um valor para δ e determina-se o fator de segurança para o equilíbrio
de forças (FSf – Equação c) e de momentos (FSm – Equação d);
ii. Traçam-se curvas de variação de FSf e FSm por δ, até se encontrar a interseção
de ambas. O ponto definido identifica o fator de segurança crítico do talude,
conforme pode ser visto no exemplo da Figura 20.
32
Figura 20 – Determinação do Fator de Segurança para o Método de Spencer (SPENCER, 1967)
3.4 A Sismicidade na Análise de Estabilidade de Taludes
3.4.1 Aceleração de Pico
Quando se fala da ocorrência de eventos sísmicos para os cálculos de estabilidade,
considera-se que os taludes são submetidos a acelerações adicionais causadas pelos
movimentos registrados no interior do planeta. Para os cálculos de estabilidade de
taludes é de extrema importância definir-se o valor da aceleração de pico do terreno. A
aceleração de pico do solo (PGAsoil – Peak Soil Acceleration) ou da rocha (PGArock –
Peak Rock Acceleration), de acordo com Day (2002), podem ser calculadas por
diversos métodos, dentre os quais pode-se citar:
i. Eventos históricos – Para eventos históricos mais recentes é possível obter os
dados de sismógrafos, enquanto que para os mais antigos a localização, a
magnitude e os registros de danos são as ferramentas. No entanto, vale
ressaltar que este método não deve ser a única fonte para a determinação da
aceleração de pico, dado o curto intervalo de duração das medições antigas.
ii. Códigos ou exigências regulamentares – Muitos lugares têm regulamentos
definindo a aceleração de pico para dimensionamento em projetos.
iii. Máximo terremoto potencial (Maximum Credible Earthquake – MCE) – Maior
terremoto que é possível ocorrer conhecendo dados geo e sismológicos do
local. De forma simplificada, trata-se do maior sismo que uma falha ativa pode
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produzir considerando as evidências geológicas de movimentos antigos e os
sismos registrados.
iv. Máximo terremoto provável (Maximum Probable Earthquake – MPE) – Está
relacionado ao tempo de recorrência. Pode ser entendido como o maior
terremoto previsto que a falha pode gerar em um intervalo específico, como 50
ou 100 anos.
v. Mapas sísmicos da USGS (U.S. Geological Survey) – Outro método é
determinar o valor da aceleração de pico com possibilidade de ser excedido
após um determinado tempo. Os diversos mapas da USGS mostrando a
aceleração de pico com 2, 5 e 10 por cento de probabilidade de exceder em 50
anos fornecem ao usuário a possibilidade de escolher o nível de perigo mais
adequado à situação.
A USGS fornece, em seu site1, um aplicativo reunindo os dados sísmicos de diversas
regiões do planeta. Através do aplicativo é possível se obter, de acordo com diferentes
fontes, os valores de Ss e S1. O primeiro valor corresponde à aceleração de resposta
espectral do terremoto para períodos curtos (0,2 segundos), enquanto que o segundo
corresponde a períodos longos (1,0 segundo). Tomando-se por base os dados
fornecidos pelo GSHAP (Global Seismic Hazard Assessment Program) encontra-se o
valor de PGA com probabilidade de 2 e 10 por cento de exceder 50 anos.
PGA2%−50 anos =SS
2,5 ou
S1
1,0 (3.13)
PGA10%−50 anos =SS
5,0 ou
S1
2,0 (3.14)
A Figura 21 apresenta a mapa sísmico com as acelerações de pico para o Brasil,
considerando 10 por cento de probabilidade de exceder 50 anos: