XIII SEMINARIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS RIO DE JANEIRO ABRIL 1980 "ALGUMAS CONSIDERAcOES SOBRE A CONSTRUC , AO DE FILTROS E TRANSIcOES FINAS EM BARRAGENS" TEMA IV Nelson Luis Ferreira Porto Engenheiro da Divisao de Geotecnia ENGEVIX S.A. 125
XIII SEMINARIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS
RIO DE JANEIRO
ABRIL 1980
"ALGUMAS CONSIDERAcOES SOBRE A
CONSTRUC,AO DE FILTROS E TRANSIcOES FINAS EM BARRAGENS"
TEMA IV
Nelson Luis Ferreira Porto
Engenheiro da Divisao de Geotecnia
ENGEVIX S.A.
125
1.INTRODUQAO
Os filtros e transigoes finas de areia compactada,em barragens
de terra (secao "homogenea") ou de terra-enrocamento (segao"mis
to"),constituem-se, com relagao as caracteristicas e comporta -
mento, em descontinuidades interiores ao macigo, separando o nu
cleo de argila dos espaldares de enrocamento ou a zona de mon -
tante ("saturada") e a de jusante ("drenada") de barragens de
terra.
Prop6em-se, com base em conclusoes desse presente trabalho que
se tente revisar as especificacoes construtivas normalmente ado
tadas para esses elementos drenantes, no que se refere a requi-
sitos de compactagao, geralmente simplificadamente estudados,me
recendo, na opiniao do autor, uma analise mais aprofundada, de-
vido a importancia dos filtros e transigoes no comportamento
global do macigo.
2.METODOS E ESPECIFICAcOES CONSTRUTIVAS
E pratica comum adotar-se, na construgao de filtros e transigoes
finas, a compactagao por trator de esteiras, rolo ou placa vi -
bratorios, especificando-se a densidade minima necessaria a equi
valente a compacidade relativa ("relative density"), de 70%(Ref.
1,9,10) sendo a mesma definida como:
eC.R.= max - e
emax - e min
ou
x 100
C.R.= ^ smax ('s "(smin) x 100
^s-max (^ smax-'smin
e = indice de vazios da amostra
emax = indice de vazios no estado mais foto
^emin = indice de vazios no estado mais compacto
Osmax = densidade seca maxima
smin = densidade seca minima
^s = densidade seca de amostra
A limitagao da densidade somente e feita ao valor minimo (C.R.
min), e raramente ao maximo (C.R. max), subestimando-se a redu-
gao de permeabilidade, devido a compactagao, especialmente nos
127
materiais granulares bem graduados (Ref. 3).
Objetivando a determinagao de uma faixa de compacidade relativa
favoravel para o comportamento do macigo , a ser obtida por com-
pactagao , para • a areia, pode-se proceder a uma analise compara-
tiva, ainda que basicamente qualitativa, devido ao numero redu-
zido de ensaios , da influencia da compacidade relativa (C.R.)nas
propriedades de engenharia da areia compactada . Para esse anali
se, utilizaremos ensaios de permeabilidade , em amostras represen
tativas de areias parcialmente usadas na construgao de filtros e
transigoes de uma barragem visando aproveitamento hidroeletrico,
da qual o autor participa da equipe de projeto , alem de dados pu
blicados na bibliografia.
3.INFLUNCIA DA COMPACIDADE RELATIVA
3.1)Permeabilidade
A analise da influencia da C.R. na permeabilidade sera subsidia
da pelos ensaios de laboratorio em amostra de areias citados a
cima, plotados na figura 1, com as faixas granulometricas respec
tivas apresentadas na figura 2.
A areia natural a de granulometria media a grossa , com ocorren-
cia de pedregulhos ( seixos rolados ), constituida mineralogicanen
to por silica amorfa e graos de quartzo , com finos coesivos; a
areia artificial provem da britagem de basalto denso, com ocor-
rencia de pedregulhos ( graos angulosos ), nao desagregiveis duran
to a compactagio , com finos no coesivos . Observa-se, pelo gra
fico da figura 1, que o aumento da C.R. (e consequente redugao
do indice de vazios) de 60 % a 70% e 70 % a 80% reduz a permeabi-
lidade em 28% e 30% respectivamente , ocorrendo na ultima faixa
valores extremos de ate 400 % e 200 % de redugao , na areia artifi
cial e natural, respectivamente, provavelmente devido a major
porcentagem de finos e /ou melhor graduagao do material.
Sendo a capacidade de drenagem do filtro ( notadamente no horizon
tal), fungao exclusiva da permeabilidade da areia ( Ref. 2 ), desde
que garantido o fluxo laminar, podemos concluir, com base nesses
dados e para esse material , que a cada elevagao de 10% da C.R.da
areia, reduz - se em media , de 30% a potencialidade de drenagem
do filtro podendo essa redugao ser mais elevada dependendo da
distribuigao granulometrica do material.
A redugio da capacidade de drenagem a especialmente importante
para filtros de barragem de terra, sendo , geralmente, de aspec-
to secundirio no caso de barragens de segao mists, em que a dre
128
nagem propriamente dita e feita pelos espaldares de enrocamento.
3.2) Resistencia ao Cisalhamento
A resistencia ao cisalhamento de areia, no intervalo de tenses
normalmente ensaiado, e representado pelo coeficiente de atrito
(tan 0). Na fig. 3 estao representados graficamente, relagoes C.
R. x tan 0 para use da analise da influencia da C.R. no angulo
de atrito. Na figura 4, representa-se esquematicamente uma su-
perficie de ruptura, passando pelo filtro horizontal de uma bar
ragem de terra, e o fator de seguranga calculado para diversos
valores de compacidade relativa, influentes no coeficiente de a
trito, supondo-se que o filtro 6 composto de areia media unifor
me (ver fig. 3).Pode-se observar, pelo grafico F.S. x C.R., que
o aumento da C.R. de 60% a 70% e de 70% a 80%, eleva o fator de
seguranga em 6% e 5% respectivamente. Consequentemente, conclui-
-se, com base nesses dados , que a cada 10% de elevagao da C.R.e
leva-se o fator de seguranga em 5% a 6%, percentagem julgada no
significativa, face as simplificagoes de hipoteses normalmente
adotadas na analise de ruptura por equilibrio limite. Note-se
ainda, que esse tipo de ruptura raramente a condicionante da es
tabilidade do talude de jusante, devido as altas pressoes nor-
mais ocorrentes no filtro horizontal, bem Como a (possivelmente)
menor resistencia da argila compactada acima do filtro. No ca-
so de barragens de segao mista, tal analise de ruptura pode ser
normalmente descartada, devido ao confinamento conferido pelos
espaldares de enrocamento e menor resistencia da argila na in-
terface nucleo-transigao.
3.3) Deformabilidade
Em trabalho publicado recentemente (Ref.8), a recomendado o va
for minimo de 70% para a compacidade relativa,para a transigao
nucleo-enrocamento de areia siltosa compactada, indicando como
necessaria uma densidade minima na areia,para que haja expansao
durante o processo de cisalhamento. Tal recomendagao e contra-
ria a exposta por Terzaghi (Ref.13,pag 604-605), que aponta o
excesso de compactagao da areia das transigoes de montante e ju
sante como altamente indesejavel em barragens de enrocamento de
nucleo estreito inclinado, por reduzir a capacidade "auto-selan
te" da areia no caso de eventuais fissuras no nucleo (Fig. 5).
Alem do aspecto de colmatagao de fissuras, o excesso de rigidez
por supercompactagao de filtros-transigoes pode levar a uma dis-
tribuigao desfavorivel de tensoes (Fig.6)em macigos de terra-en
129
rocamento (Ref. 5, 6 e 12).
No caso de barragens de terra ("homogeneas "), o excesso de com-
pactagao da areia do filtro pode torna-lo muito mais rigido que
a argila compactada , forgando o aparecimento de zonas de tragao
(Fig. 7) proximo a crista da barragem e na interface argila-fil-
tro (Ref. 11), podendo ocorrer infiltragao nocivas de agua de
chuvas por trincas abertas por tensoes de tragao.
4. CONCLUSOES
Em vista das analises aqui efetuadas , que embora eminentemente
qualitativas e baseados em numero reduzido de ensaios , sao julga
dos representativas parece ser uma decisao desfavoravel e prejir
dicial, alem de desnecessaria , o excesso de compactagao da areia
em filtros e transigoes, sendo as desvantagens , como a signifi -
cativa redugao da capacidade de drenagem e excesso de rigidez,
julgadas mais importantes que a unica vantagem , o aumento rela-
tivamente pequeno, e geralmente desnecessario , do angulo de atri
to.
Outros fatores que devem ser levados em conta , sao a possibilid3
de de redugao da permeabilidade da areia por colmatagao fisico
-quimica( Ref. 4 ), alem do grau de incerteza na estimativa, em
projeto, do valor real da percolagao pela fundagao, devido a er
raticidade de permeabilidades , dificilmente investigivel e simu
livel em modelos matematicos, sendo aconselhavel pois, que os
filtros tenham uma boa margem de seguranga , no que se refere a
capacidade (ou potencialidade ) de drenagem . Sugere-se , portan-
to, que as especificagoes construtivas de filtros e transigoes
de areia, sejam analisados com maior profundidade , no que diz
respeito a compactagao , reservando -se um numero minimo de ensa-
ios, criteriosamente programados, em amostras representativas ,
que permitam delinear satisfatoriamente o comportamento mecani-
co-hidriulico da areia, em gama ampla de densidades , objetivan-
do determinar uma faixa favorivel de valores de C.R. a ser per-
mitido ao material quando compactado , devendo o metodo constru-
tivo ser cuidadosamente planejado e investigado em aterros expe
rimentais , nao sendo do escopo desse presente trabalho discusses
sobre o melhor metodo de controle de qualidade ( G.C. ou C.R.,ver
Ref. 7 ) a ser adotado.
5.AGRADECIMENTOS
0 autor agradece a ENGEVIX S.A. o apoio necessario a preparagao
do trabalho, e ao Eng9s . Manuel A. Martins e Heitor B. Oliveira
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que revisaram e fizeram sugestoes ao texto.
6.BIBLIOGRAFIA
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2 )Cedergren, H.R. (1967 ) - " Seepage, Drainage And Flow Nets"Jo
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3 )De Mello , V.F.B.(1977) - " Reflections on Design decisions of
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5 )Marsal, R. (1977) - " Esfuerzo - Deformacion v.s. Estabilidad
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12)SRH - C.F.E. - II (1976) - "Comportamento de presas construi
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13)Terzaghi, K. and Peck, R.B. (1967) - "Soil Mechanics in Engi
neering Practice" - John Wiley & Sons.
14)U.S. Bureau of Reclamation (1974) - "Earth Manual" 2nd Edi-
tion.
131
7. SUMARIO
No presente trabalho sao apresentados analises de influencia da
compacidade relativa da areia no comportamento geotecnico de fil
tros e transicoes finas em barragens de terra-enrocamento.
Sugere-se, com base nessas analises, que seja evitado, na cons-
trugao de tais elementos, a supercompactacao da areia, julgada
desnecessaria, alem de prejudicial.
132
a-
l00
80
70
60
50
000
0 I-w
50 0
c
10 90
0
PENEIRAS N° 200 40 10 4 3/8" 3/4
/
AREIA NATURAL 1
II
l AREI 4ARTIFICIAL
I-
^I I
^•
0,01 0,l 1
O GRAOS EM mm10 100
100
0a
FIG.2 - FAIXA GRANULOMETRICA DAS AREIAS ENSAIADAS(FIG.1)
2025
FORTE CONCENTRACAO DE ESFOR^OSNA INTERFACE DO NUCLEO.
0 25 50 75 loom
ESCALA GRAFICA
FIG.6 - CURVAS DE IGUAL ESFORQO PRINCIPAL (T i) AO FINAL DECONSTRUcAO (BARRAGEM NETZAHUALCOYOTL, REF. 5)
90
80
70
604-
50^ ^'-
0
0- 30-200
n AREIA SILTOSA ( REF 8)
-6- AREIA MEDIA UNIFORME
-0- AREIA GROSSA UNIFORME
20}- x -' --e- AREIA C/PEDREGULHOS1 20%PEDREGULHO DML1X 3/4"2 20% PEDREGULHO DMgx . 11/2 ' i
10 8 35% PEDREGULHO DMAX 3/4"4 50 %PEDREGULHO D mixMAX 3/4
OS 50%PEDREGULHO DM4x 3
-X- © 82%ROCHA BRITADA DMtix.3"
0.4 0.5 0 .6 0.7 0 .8 6.9 60
COEFICIENTE DE ATRITO, TAN 0
FIG.3-EFEITO DA COMPACIDADE RELATIVA NO COEFICIENTEDE ATRITO PARA SOLOS GRANULARES(REF 14)
135
W tan f
90
80
60
50
ROTURA PELO FILTRO -' F. S. = E + U(NAO CONDICIONANTE)
0 10 20 30 40 50 60 70m
ESCALA GRAFICA
ROTURA CIRC(INOEPENDENTE
ULAR F.S.:1.,44DA C.R. DO FILTRO)
ilooo,
ROTURA PLANA PELO FILTRO
1,0 1,5F.S.
2,0 2,2
FIG.4 - INFLUENCIA DA COMPACIDADE RELATIVA NAESTABILIDADE DO MACICO DE UMA BARRAGEMDE TERRA
136
ARRASTE DE AREIA PARADENTRO DA FISSURA DE-VIDO A FORA DE PERCO-LAcAO.
0 5 10
ESCALA GRAFICA
O NUCLEO ARGILOSO
O TRANSIcAO FINA ( AREIA)
O3 TRANSIcAO GROSSA (6RITA)
4O ENROCAMENTO
15m
FIG.5 - IMPORTANCIA DA SUPOSTA CAPACIDADE "CICATRIZANTE"DAS TRANSIQOES DE MONTANTE E JUSANTE
90
80
0
70
U
60
50
AMOSTRA COM 8% <#4 AMOSTRA COM 17% <#4
-•
AREIA ARTIFICIAL
•- AREIA NATURAL
4x10-3 10-2 k (cm /s ) 10-1
FIG. 1 - EFEITO DA COM PACI DADE RELATIVA NOCOEFICIENTE DE PERMEABILIDADE
4x10-1