-
CCCCC onter o incontvel...
47
CCCCC onte r o i n con t v e l :on te r o i n con t v e l :on te
r o i n con t v e l :on te r o i n con t v e l :on te r o i n con t
v e l :apon tamen to s sob rapon tamen to s sob rapon tamen to s
sob rapon tamen to s sob rapon tamen to s sob re o s conce i t o s
dee o s conce i t o s dee o s conce i t o s dee o s conce i t o s
dee o s conce i t o s de e s t ru tu r a e s t ru tu r a e s t ru
tu r a e s t ru tu r a e s t ru tu r a e e spon tane idade em Gre e
spon tane idade em Gre e spon tane idade em Gre e spon tane idade
em Gre e spon tane idade em Gro t o w s k io t o w s k io t o w s k
io t o w s k io t o w s k i
TTTTT atiana Motta Lima
A
Tatiana Motta Lima atriz, professora de Interpretao da UNI-RIO e
doutoranda do Programa dePs-Graduao em Teatro da mesma
Universidade.
1 Thomas Richards e Mario Biagini so, respectivamente, o diretor
geral e o diretor associado do Work-center of Jerzy Grotowski and
Thomas Richards, localizado em Pontedera, Itlia. No Workcenter se
desen-volvem, atualmente, pesquisas em torno da arte como veculo
(desde 1986) e em torno do ProjectThe Bridge: Developing Theatre
Arts. No projeto The Bridge, intenta-se, atravs do artesanato
ligados artes performticas, estabelecer uma ponte entre a arte como
veculo e o teatro. One Breath Left,
Uma lata existe para conter algo, mas quando opoeta diz Lata
pode estar querendo dizer oincontvel. [...] Na lata do poeta
tudo-nadacabe, pois ao poeta cabe fazer com que na latavenha a
caber o incabvel (Gilberto Gil).
In t rInt rInt rInt rInt roduooduooduooduooduo
s palavras partitura, estrutura, vida e es-pontaneidade esto
presentes em grandeparte dos textos e prticas que se debru-am sobre
o trabalho do ator. Tambm aspalavras impulso, ao fsica,
organici-
dade, preciso. Essas palavras tornaram-se in-dispensveis no
lxico de um certo tipo de tea-tro preocupado com o ator; entretanto
elas tmsido usadas freqentemente como se fossemauto-explicveis e,
por esse motivo, tm servidode referncia a inmeros procedimentos
artsti-cos, mesmo antagnicos. Alm disso, como seconfiguram como
palavras de ordem, no pa-
rece muito elegante perguntar o seu significa-do, uma vez que
todos deveramos saber do queestamos falando.
Temos o direito de usar as palavras comoassim nos aprouver e
sabemos que, algumas ve-zes, leituras a princpio equivocadas podem
le-var a experincias artsticas bastante interessan-tes. Por outro
lado, lanar certas questes sobrepalavras que parecem j
compreendidas ou dis-cordar de certas leituras pode ser um
exerccioque, alm de interessante, colabore para levarinquietao e
novos estmulos para as nossas sa-las de trabalho e nossos prximos
textos. a esseexerccio que pretendo me dedicar neste artigo.
Muitas das palavras enumeradas acimaso encontradas nos textos de
Grotowski e cita-das, quase sempre, tendo explcita ou
implici-tamente o artista polons como referncia. Pro-porei assim
alguns caminhos de abordagem dosconceitos a partir da obra escrita
de Grotowski,de Thomas Richards e de Mario Biagini.1 Bus-carei
analisar certas definies correntes, apon-
-
sssss a l a ppppp r e t a
48
tando o que vejo como problemas e deixandoalgumas questes.
Um primeiro problema que localizo notratamento dado ao
vocabulrio grotowskiano que esse vocabulrio aparece, muitas vezes,
sepa-rado das investigaes s quais esteve relaciona-do.2 Essa operao
de retirada dos termos da suarelao com experincias prticas
especficaspode gerar algumas incompreenses. A mais pro-blemtica
delas aquela que toma as idias deGrotowski como fazendo parte de um
conjuntohomogneo e sem contradies. Ora, Grotowskirechaou,
abandonou, transformou, renomean-do ou no, vrios de seus conceitos
no curso desua investigao. E no estou falando apenas dasmudanas
ocorridas nos perodos que o prprioGrotowski classificou como as
diferentes fases desua vida artstica3 A arte como apresentao,o
parateatro, o Teatro das fontes e A arte comoveculo4 , mas,
principalmente, das transforma-es pelas quais passaram os conceitos
(e as pr-ticas) dentro de cada uma dessas fases.
Essa homogeneidade pressuposta dos tex-tos impede, inclusive,
que se perceba uma dascaractersticas mais interessantes de
Grotowskienquanto terico: o fato dele realizar, quase acada novo
texto, um efetivo dilogo com seusprprios textos anteriores;
retomando, de ma-
neira explcita ou no, seus prprios conceitospara critic-los,
transform-los e mesmo reexpli-c-los, seja luz de novas experincias
realiza-das em sala de trabalho, seja ainda luz do quepercebeu como
possveis erros de leitura aosquais seus conceitos teriam sido
submetidos.
Uma leitura homogeneizadora acaba, as-sim, por reunir, em uma
mesma formulao esob um mesmo nome, conceitos diferentes
pro-venientes de experincias diversas e, o que pior, conceitos que
s vezes esto, na prpriaobra de Grotowski, em oposio. Essa operaod
origem a conceitos Frankenstein que defi-nitivamente no nos fazem
avanar.
Ao ler Grotowski preciso estar atentotambm ao fato de que, em
certos momentos,ele mantm termos j utilizados anteriormente,mas
altera consideravelmente seu sentido. As-sim, o que ele entende por
forma em um certomomento pode ser bastante diferente do
quepreconiza em um outro. Isto se explica porqueo termo forma no
est solto em sua obra, masligado sua trajetria de investigao e ao
di-logo que realiza com seus leitores. No deve-mos, portanto,
inferir que palavras semelhantesdesignem conceitos semelhantes.
Entre os ter-mos e os conceitos h todo um trabalho queprecisa ser
realizado.5
Dies Ir e Dies Ir: My Preposterous Theatrum Interioris Show
foram as obras produzidas, at agora, poresse projeto. Richards e
Biagini, alm de seu trabalho prtico, do conferncias, tm livros,
artigos e/ouentrevistas publicados.
2 No estou dizendo que os textos de Grotowski respondam,
imediatamente, s mudanas ocorridas nasua investigao prtica, e nem
mesmo que sejam todos eles testemunhos da trajetria dessas
investiga-es. De fato, existem, ainda que em nmero reduzido, textos
nos quais ele revela mais desejos do quede prticas efetivamente
experimentadas. No estou tambm afirmando que se chegar a
compreendertotalmente as investigaes prticas de Grotowski somente
atravs do estudo de seus textos. Salientoapenas que, mesmo se a
relao entre texto e cena no direta, no h dvida que, no esforo de
tecera trama dessa relao, nos aproximamos de forma mais pertinente
tanto dos conceitos quanto das pr-ticas de Grotowski.
3 Ver a parte IV do texto De la compagnie thtrale lart comme
vhicule, texto de Grotowski includono livro Travailler avec
Grotowski sur les actions physiques de Thomas Richards.
4 Uma introduo Arte como veculo, em portugus, pode ser
encontrada em Motta Lima (1999) eem Calvert (2002).
-
CCCCC onter o incontvel...
49
Os conceitos de estrutura e espontanei-dade foram escolhidos
como o centro da inves-tigao deste artigo. Alm de serem
conceitosnucleares na obra de Grotowski que, portanto,dialogam com
inmeros outros, eles permitemtambm que percebamos mais claramente
osproblemas de uma leitura homogeneizadora.Permitem, em outras
palavras, que coloquemosrapidamente o dedo na ferida.
Tentarei, por diferentes caminhos, cercara terminologia,
aproximar-me dos conceitos poruma via que aceitar os paradoxos e as
dvidase que no espera dar conta do todo; e, emborarelacione
terminologia e processos artsticos naobra grotowskiana, no seguirei
todo o tempouma temporalidade seqencial na exposio doproblema.
As palavras estrutura e espontaneidadee seus, por vezes,
respectivos sinnimos, parti-tura e forma, para uma e vida e
organicida-de para outra, quando aparecem no dia-a-diade trabalho
de um ator que se interessa pela pes-quisa de seu ofcio, esto,
muitas vezes, reves-tidas de um certo peso moralizante. So
enten-didas como obrigaes do bom ator que, assim,teria que
encontrar o mais rpido possvel osmeios (e mtodos) de realiz-las em
sua prtica.O devemos ter uma partitura e o devemos es-tar vivos em
cena acabam, ento, escondendoo que seriam, talvez, as questes mais
interes-santes. Questes que no se submetem a proce-dimentos
produtivos e nem a mtodos estan-
ques e que dizem respeito investigao prticaincessante do que vem
a ser essa vida e essa es-trutura, de qual a sua inter-relao (j que
setrata de um binmio) e sua importncia.
Em o Teatro Morto,6 Brook falava deum teatro que est o tempo
todo andando sobum fio de navalha estendido entre a mecanici-dade e
a experincia viva. Aquilo que mec-nico, morto, no fixaria casa
apenas em algunstipos de teatro, em alguns atores ou mtodosde
aprendizagem. Nem o que vivo estaria se-guro de uma vez por todas
quando optamos porum certo tipo de fazer teatral mais
investigativo.Brook, em vez de conceituar uma certa noode teatro,
acaba, ao contrrio, por espraiar omorto e o vivo por todos os
lugares e momen-tos, convidando-nos a uma busca incessantepelo
segundo. Se aceitarmos sua concepo, oteatro que no se quer morto
ter que traba-lhar sob a gide dos ajustes e transformaes,sob a gide
de um certo tipo de instabilidade. E s em estreita relao com essa
busca por umteatro vivo que podemos nos aproximar dosconceitos de
estrutura e espontaneidade emGrotowski.
O que seria, ento, uma estrutura, ten-do em vista essa busca? O
que se estrutura?Quando? Por qu? Ao responder a essas pergun-tas e
ao propor uma certa via de leitura do bin-mio
estrutura/espontaneidade, corre-se o riscode, no desejo de
explicar, acabar por esterilizaros conceitos. Impus-me, ento, duas
regras que
5 Um outro problema para ler Grotowski que tambm est relacionado
com a confuso entre termose conceitos a interseo que tem sido
feita, de maneira um tanto apressada, entre sua obra e a deEugenio
Barba. Efetivamente, Barba tomou parte, principalmente nos
primeiros anos, do trabalho deGrotowski: foi seu assistente de
direo nas montagens de Akrpolis e na primeira verso de Dr.
Faustus,e auxiliou na divulgao da obra do artista polons, tendo
editado, pelo Odin Teatre, em 1968, o livroEm Busca de um Teatro
Pobre. Alm disso, Barba se manteve em contato com as pesquisas
desenvol-vidas por Grotowski ao longo das fases de trabalho do
artista polons. Mas esses fatos no nos permi-tem inferir que a
terminologia e as prticas grotowskianas devam ser vistas como
referidas quelas deBarba, ou vice-versa. Creio mesmo que fazer
atritar os conceitos de Barba e Grotowski referidos, svezes, a uma
terminologia semelhante ajudaria a perceber diferenas fundamentais
entre essas duasobras e a localizar melhor a contribuio de cada um
desses artistas.
6 Primeiro captulo do livro O Teatro e seu Espao, de Peter
Brook.
-
sssss a l a ppppp r e t a
50
pretendo seguir o mais fielmente possvel. A pri-meira de que os
conceitos, se aparecerem, se-ro o resultado esperado, mas no
evidente de um processo de indagao e crtica, processoem curso muito
antes da escrita deste texto.Busca-se, ento, trazer no bojo dos
conceitos,no um entendimento estril ou erudito, masuma inquietao e
instabilidade quilo que pen-svamos j ter entendido ou realizado. A
se-gunda regra a de no trabalhar com vistas dicionarizao mas, num
vaivm entre as ex-perincias prticas e a terminologia, ver comoum
artista filia certas experincias a conceitosna tentativa de nomear
aquilo que foi realizadoe, ao mesmo tempo, de dialogar com outros
queesto do lado de fora das prticas experimenta-das. Creio que esse
procedimento ajudar naformulao de perguntas dirigidas nossa pr-pria
prtica artstica.
Seguirei a trajetria do binmio estru-tura/espontaneidade no
percurso artstico deGrotowski, concentrando-me nos seguintes
pe-rodos: entre os anos de 1959 e 1969 (a chama-da fase teatral) e
no perodo relacionado s in-vestigaes do Workcenter of Jerzy
Grotowski, quefoi inaugurado em 1986. Para analisar essesltimos
anos, utilizarei textos, entrevistas e con-ferncias de Richards e
Biagini, alguns delesrealizados mesmo aps a morte de Grotowski,em
1999.
O artigo est dividido em quatro sees:as trs primeiras referem-se
a trs momentosde conceituao do binmio na fase teatral e altima
investiga o binmio a partir de certasnoes utilizadas no
Workcenter.7
Seo ISeo ISeo ISeo ISeo I
Nos seus primeiros textos,8 ao traar um para-lelo entre teatro e
ritual, Grotowski fazia umelogio da artificialidade. No ritual, ele
iden-tificava um sistema de signos abreviado, defi-nido a priori,
e, portanto, convencional, arti-ficial. Tambm a teatralidade se
distinguiria davida de todo dia por ser produtora de
signos.Grotowski fazia uma diferena entre o que cha-mava de lgica
da forma, justificada pelas leisda teatralidade e baseada na
construo designos, e lgica da vida corrente que, no sen-do
estruturada, no seria, portanto, artstica(Grotowski, 2001 [dez. de
1960], p. 42-3).9 As-sim, o teatro, naquele momento, era
definidocomo um espao de construo, de estrutu-rao e de
artificialidade.
Essa teatralidade, nos primeiros espet-culos, era buscada
eqitativamente em todos oselementos da mise-en-scne, no havendo
ne-nhuma nfase particular sobre o trabalho doator. Foi s em
Shakuntala,10 quarto espetculo
7 Estarei analisando textos de Grotowski, Richards e Biagini,
escritos em diversas lnguas. Para facilitar aleitura deste artigo,
optei por traduzi-los, responsabilizando-me, assim, por possveis
incorrees. Tam-bm farei a traduo de outros textos em lngua
estrangeira que venha a citar ao longo do artigo.
8 Refiro-me, principalmente, aos textos Giochiamo a Siva e
Farsa-Misterium, ambos de 1960, e LaPossibilit del Teatro que, at a
publicao do livro Il Teatr Laboratorium di Jerzy Grotowski
1959-1969, em 2001, estavam inacessveis ao leitor no familiarizado
com a lngua polonesa. Alm disso,Farsa-Misterium e La Possibilit del
Teatro faziam parte do arquivo pessoal de Ludwik Flaszen,
co-fundador do Teatro das 13 Fileiras e no haviam sido publicados
nem mesmo na Polnia.
9 Utilizarei colchetes [ ] para informar ao leitor a primeira
data referente citao utilizada, seja a data daprimeira publicao,
seja a data da entrevista ou conferncia que esteve na origem dessa
publicao.
10 Shakuntala, antigo drama ertico indiano escrito por Kalidasa,
estreou em 13 de dezembro de 1960.Antes disso, o Teatro das 13
Fileiras, inaugurado em 1959, j tinha apresentado Orfeu de Jean
Cocteau,Cain de Byron e Mistrio Buffo de Mayakovski.
-
CCCCC onter o incontvel...
51
de Grotowski frente do ento Teatro das 13Fileiras, que aquela
artificialidade comeou aser trabalhada atravs da partitura de
signos vo-cais e corporais do ator: ... Aparecia a partitu-ra do
ator, minuciosa, matematicamente exata[...] O corpo-voz (Flaszen,
2001, p. 24). Nessemomento, apareceu tambm a noo de
umator-feiticeiro, construtor de signos que pro-vocariam associaes
no psiquismo da platia;11
signos sonoros e corporais fixados precisamenteem uma partitura.
Como um feiticeiro, o atordeveria conhecer e controlar seus
instrumentos,seu corpo e sua voz, de maneira a que pudes-sem fugir
da esfera do cotidiano e, aventuran-do-se em posies, gestos e
entonaes inusuais,causar impacto profundo na imaginao
doespectador.
Nesses primeiros anos da dcada de 1960,as palavras habilidade,
efeito, truque eramutilizadas de maneira elogiosa por
Grotowskiquando referidas ao trabalho do ator,12 pois oartista
entendia que, para ser produtor daquelessignos, o ator deveria,
assim como o feiticeiro,possuir um arsenal de instrumentos a serem
uti-lizados quando necessrio. No de se estra-nhar, portanto, que
exatamente poca deShakuntaka se inicie o treinamento vocal e
cor-poral dos atores do Teatro das 13 Fileiras. Essetreinamento, ao
contrrio do que ocorrer umpouco mais tarde, estava extremamente
vincu-
lado tanto s necessidades especficas de cadaespetculo quanto
instrumentalizao do ator,que deveria ser capaz de, com seu corpo e
voz,sair das esferas da expressividade cotidiana eaventurar-se na
produo dos signos, entendi-dos como gestos e sons capazes de tocar
o in-consciente coletivo13 dos espectadores.
Nesse primeiro momento, a partituraera, portanto, um conjunto de
signos vocais ecorporais, repetidos pelo ator habilidoso demaneira
precisa e, mesmo, como pontua Flas-zen, matemtica. Os signos se
diferenciariamda gestualidade cotidiana, instaurando umalgica da
forma capaz de afetar ao mesmo tem-po ntima e coletivamente a
comunidade deespectadores. Podemos perceber, assim, que oalvo mais
evidente da partitura era, nesse mo-mento da trajetria artstica de
Grotowski, aplatia: buscava-se impact-la atravs dos sig-nos
produzidos.
Grotowski fez, explcita ou implicitamen-te, em inmeros textos
posteriores, crticas a esseperodo de sua investigao, ou pelo menos
aalguns dos pressupostos de trabalho presentesnaquele momento. Uma
facilmente localizvel aquela que se refere busca, pelos atores,
deum arsenal de habilidades e, tambm, de umvirtuosismo tcnico.
Segundo Grotowski, visan-do habilitar-se para seu trabalho, o ator
esta-ria, muitas vezes, reforando a diviso entre ele
11 O gesto ou entonao do ator estariam associados a um modelo de
gesto ou encantao, associado(s)a qualquer coisa que tenha um
significado universal [...]. Penso em uma arte do ator que atravs
daaluso, da associao, do aceno com o gesto ou com a entonao se
refira aos modelos formados naimaginao coletiva. (Grotowski, 2001
[fev. de 1962], p. 78).
12 [...] aquilo que artstico, que arte, artificial [...] como
uma demonstrao de habilidade, pode serexaminado como puro efeito
(fsico ou vocal) [...] so possveis e mesmo convincentes os truques
doator que consistem em contrapor a palavra e o movimento [...]
(Grotowski, 2001[fev. de 1962],p. 77-78).
13 Grotowski define, assim, inconsciente coletivo: [...] no
significa aqui (diferentemente da escolajunguiana) uma qualquer
psiqu supra individual, mas funciona como uma metfora operativa;
trata-se da possibilidade de influir sobre a esfera inconsciente da
vida humana numa escala coletiva (2001[fev.de 1962], p. 53).
-
sssss a l a ppppp r e t a
52
mesmo e seu organismo. Produzir-se-ia, assim,um corpo
domesticado, no liberado para aspossibilidades do processo
criativo.14
Pode-se inferir que ao criticar uma certarelao do ator com o seu
corpo e sua voz, rela-o que geraria entraves ao processo
criativo,Grotowski estava, ao mesmo tempo, criticandoa partitura
que tinha sido estruturada com basenessa mesma relao. Isso ficar
mais evidentequando analisarmos, mais adiante, os novosconceitos de
partitura surgidos entre Shakun-tala e os ltimos anos da dcada de
1960.
Para finalizar essa primeira seo, citouma crtica contundente que
Grotowski fez, emtexto de 1968, Shakuntala, crtica que revelatanto
a direo do trabalho realizado no espet-culo, quanto aquilo que o
artista percebeu comoerros que foram posteriormente
retificados.
[...] Ns montamos um espetculo, Shakun-tala de Kalidasa, onde
investigamos a possi-bilidade de criar signos no teatro
europeu.[...] O espetculo efetivamente era construdocom pequenos
signos gestuais e vocais. [...]O espetculo foi realizado, era uma
obra sin-gular, dotada de um certo poder de sugesto.Mas eu percebi
que era uma transposio ir-nica de todos os esteretipos possveis,
detodos os clichs possveis; cada um desses ges-tos, desses
ideogramas propositalmente cons-trudos era, no fundo, o que
Stanislavski cha-mava: clichs gestuais; no havia, na verda-de, eu
amo com a mo sobre o corao, mas,definitivamente, se reduzia a algo
parecido.Tornou-se claro que no era este o caminho(Grotowski, 2001
[out. de 1968], p. 144-5).
Quando Grotowski comparava os signosproduzidos em Shakuntala com
aquilo que
Stanislavski nomeou clichs gestuais, podemosdeduzir, para o tema
deste artigo, que os atoresmantinham com as suas partituras, apenas
umvnculo formal. Quero dizer com isso que asformas finais no eram
influenciadas pelo fluxode imagens ou de aes atorais, mas podiam
serdescritas quase como fotografias reproduzidas aposteriori por
msculos bem treinados que des-conheciam porque no reatualizavam
ossentidos das imagens que reproduziam. Osclichs, nesse caso,
poderiam tambm estar re-lacionados a uma certa fixidez da ateno
dosatores: preocupados em reproduzir as formasmusculares que haviam
sido estabelecidas, elesacabavam impedindo que as
transformaesinerentes dinmica da vida psicofsica parti-cipassem da
partitura. Se observarmos as fotosdo espetculo Shakuntala,15
podemos perceberessa gestualidade da qual falava Grotowski:
osatores esto como que parados em certas posesou posies
inusuais.
Seo I ISeo I ISeo I ISeo I ISeo I I
At Shakuntala, o conceito de partitura ou deforma no se
relacionava com o conceito de es-pontaneidade. Essa relao s comea a
apare-cer nos textos de Grotowski a partir de 1962, e,inicialmente,
de maneira tmida. A primeira re-ferncia est, salvo engano, no texto
La Possi-bilit del Teatro, no qual Grotowski dizia que,a partir de
um aprendizado prtico, teria chega-do concluso que a escola de
viver o papel ou seja, a escola de Stanislavski tem um pou-co de
razo, que forma era necessrio aliar oque chamava, naquele momento,
de empenhointerior, inteno consciente, ou associaesntimas do ator
(2001[fev. de 1962], p. 77).
14 Ver o texto de Grotowski Los Ejercicios, na Revista Mscara de
1993. Esse mesmo texto est publica-do, em italiano, no livro Il
Teatr Laboratorium de Jerzy Grotowski 1959-1969, de 2001.
Acreditoque esse seja um texto fundamental para analisar a noo de
corpo em Grotowski.
15 Podem-se ver essas fotos nos livros Le Thtre Laboratoire, de
1979 e Jerzy Grotowski: Zrdla,inspiracje, konteksty, de 1998.
-
CCCCC onter o incontvel...
53
Grotowski afirmava ainda que esse em-penho interior deveria
acontecer no s duran-te o trabalho de composio, mas tambm nomomento
de realizao da partitura. Aqui, eleparece tambm concordar com
Stanislavskiquando este opunha arte da representao aarte da
vivncia. Na primeira, o viver o pa-pel ocorria apenas como
preparativo para oaperfeioamento de uma forma exterior, seriaapenas
uma fase preparatria numa elaboraoartstica mais ampla; j na
segunda, o viver opapel era considerado o instante primordial
dacriao e, portanto, deveria ocorrer todas asvezes que o ator
interpretasse seu personagem,fosse nos ensaios ou nas apresentaes16
(Stanis-lavski, 1984, p. 47).17
Antes de 1962, no havia, no trabalho deGrotowski, uma relao
entre a partitura e
aquilo que poderamos chamar de subjetivida-de, pessoalidade ou
interioridade do ator. Fois a partir desse momento que processo
pes-soal e articulao formal (Grotowski, 1987[1965], p. 15)18
comearam a aparecer comoduas faces de uma mesma moeda, ainda que
es-sas faces, esses dois plos do binmio, assumam,com o passar dos
anos, diferentes configuraes.
Nos textos escritos entre 1962 e 1965, jpodemos ver algumas
dessas configuraes. EmO Novo Testamento do Teatro,19 de 1964,por
exemplo, ainda so fortes ao menos naterminologia empregada os ecos
das experin-cias anteriores. Grotowski definia a artificia-lidade
de maneira semelhante quela que vimosem Shakuntala, como um
problema de ideo-gramas [...] que evocam associaes no psiquis-mo da
platia, mas, esse ideograma comeava
16 Quando retiramos os termos estrutura e espontaneidade de sua
relao permanentemente dinmica epolar, acabamos tambm por nos
aproximar dessa escola da arte da representao. As
experinciassensveis, imagticas e relacionais do ator seriam
utilizadas para dar vida a certas formas que, quandoprontas,
necessitariam apenas ser bem realizadas, mas no mais reatualizadas,
a partir da relao doator com o seu ambiente, no momento da sua
realizao.
17 A diferenciao entre arte da vivncia e arte da representao
pode ser lida como referida a doismodos distintos de convivncia
entre as noes de estrutura e espontaneidade. Pode-se encontrar
essadiferenciao no captulo Quando Atuar uma Arte da Preparao do
Ator de Stanislavski. Parauma leitura mais fidedigna, sugiro o
captulo Arte de la Escena y Oficio de la Escena no livro ElTrabajo
del Actor sobre si mesmo Tomo I. A traduo, nesse caso, foi feita
diretamente do originalrusso.
18 Alm desses termos, Grotowski tambm utilizou, poca, entre
outros, artificialidade, composioartificial e disciplinas externas
para o primeiro, e autopenetrao, tcnica interior e processo
inte-rior para o segundo. Nessa poca, a interioridade do ator
passou, paulatinamente, a fazer parte doprocesso de trabalho, que
se modificou inteiramente. Nos ensaios de Dr. Faustus, espetculo de
1963,Grotowski comeou a trabalhar com cada ator individualmente,
desenvolvendo procedimentos quedependiam significativamente da
relao estabelecida com cada um. O trabalho do ator santo
eraentendido como um trabalho de confisso, e a cena era construda
no embate com as associaespessoais, com as vivncias de cada ator. O
treinamento se tornou cada vez menos vinculado ao espet-culo e
passou a ser visto como um lugar de pesquisa ntima do ator, um
lugar que acolhia as experinci-as pregressas do ator,
possibilitando tambm o nascimento de novas experincias.
19 Esse texto faz parte do livro Em Busca de um Teatro Pobre.
Trabalharei com alguns textos desse livropublicado em 1968. Advirto
o leitor de que o livro no ser pensado como um todo orgnico,
isentode contradies. Os textos, entrevistas e relatos que o compem
foram escritos em anos diferentes e,assim, trabalham com conceitos
referidos a experincias e dilogos diversos. Cada captulo do
livroser, portanto, investigado como uma unidade em separado, mas
que, claro, ilumina outra unidadepor continuidade, oposio ou
reconfigurao.
-
sssss a l a ppppp r e t a
54
a ter uma funo tambm junto s motivaesescondidas do ator,
transmitindo-as instanta-neamente ou lutando contra elas
(Grotowski,1987[1964], p. 33-4). Nesse mesmo texto,Grotowski tambm
revelava procedimentos queparecem semelhantes busca pelos signos
oci-dentais realizada em Shakuntala, como o pro-cedimento de
estabelecer, ao buscar a artificia-lidade, uma miniatura de tabela
para cadaparte do nosso corpo. Porm, essa rigidez nasdisciplinas
externas apresentada como umpar exigido absoro no que est
escondidodentro de ns (Grotowski, 1987[1964], p. 34).O novo
conceito de forma, que agora fazia par-te de um binmio, demandava a
modificaode antigas noes. Grotowski mantinha parteda terminologia
anterior, como o termo artifi-cialidade mas, comeava a
reconceitu-la, aretir-la daquele contexto de investigao
apre-sentado na primeira seo deste artigo.
No artigo Em Busca de um Teatro Po-bre, de 1965, Grotowski
assinalava, ainda, umaoutra qualidade do binmio: a tenso trops-tica
entre as unidades que o compunham. Estatenso esteve, a partir de
ento, todo o tempopresente na sua obra escrita. Grotowski diziaque
a forma como uma sedutora armadilha qual o processo responde
instantaneamente,contra a qual luta (1987[1965], p. 15; grifomeu).
Richards, trinta anos depois, falava dessemesmo paradoxo do mtier
do ator, pois, afir-mava que era somente a partir da luta de
duasforas opostas, que nomeou forma e fluxo davida, que o equilbrio
da vida cnica poderiaaparecer (Richards, 1995, p. 50).
Voltaremos,
mais adiante, a essa noo. Por hora, ressaltoapenas que, para
Grotowski, naquele momen-to, no havia uma contradio entre a
tcnicainterior e o artifcio. Ele acreditava que o pro-cesso
interior do ator no s suportava a artifi-cialidade, como
necessitava dela para existir eexpandir-se. Em momentos chaves, a
interio-ridade amalgamava-se com o artifcio: O ho-mem em um estado
espiritual elevado no secomporta naturalmente, usa smbolos20
articu-lados ritmicamente... (1987[1965], p. 15).
guisa de concluso desta seo, creioque podemos entender melhor os
termos da-quele binmio, nessa poca especfica, se acei-tarmos que
navegavam entre pelo menos doiseixos conceituais. Por um lado, a
forma estavarelacionada ao espectador; buscava-se, atravsdela,
afetar seu psiquismo e transmitir-lhe asmotivaes secretas do ator.
Por outro lado, aforma tambm operaria e seria mesmo fun-damental no
mbito do trabalho do prprioator, j que ela suportaria, reforaria e
expandi-ria o processo interior.
Outra especificidade que percebo nobinmio
espontaneidade/estrutura, nos textosdatados de 1963 a 1965, sua
similaridade como que nomeamos classicamente de interno/ex-terno ou
de contedo/forma. Embora propo-nha entrelaamentos interessantes
paradoxais,no-lineares entre esses dois plos, Grotowskiacabava
trabalhando com a imagem de um cer-to interior do ator que estaria
encoberto (tal-vez informe, desencarnado) esperando para
serpenetrado, e oferecido ao exterior de maneiraestruturada.21 Como
veremos adiante, esse
20 Grotowski, ao explicar sua noo de smbolo, afastou-a dos
smbolos hieroglficos do teatro orien-tal. Dizia que, no teatro
oriental, os smbolos eram inflexveis, como o alfabeto, mas que, no
seutrabalho, eles eram a articulao da psicofisiologia particular do
ator (1987[1965], p. 21). Nessemesmo texto, mais adiante, smbolo se
apresentava quase como sinnimo de impulso: Grotowskidizia procurar
a quintessncia dos smbolos pela eliminao daqueles elementos do
comportamentonatural que obscurecem o impulso puro (1987[1965], p.
16; grifo meu). Por essas citaes, pode-seperceber a diferena entre
esse momento e aquele de Shakuntala. Em 1965, a busca era
psicofsica:noo de oganicidade comeava a fortalecer-se.
-
CCCCC onter o incontvel...
55
binmio foi trabalhado de maneira diferentenos anos seguintes,
principalmente aps a ex-perincia do espetculo O Prncipe
Constante.
Em texto do incio da dcada de 1970,Grotowski parecia criticar
exatamente aquela di-cotomia de seus textos (e, quem sabe, tambmas
leituras de sua obra que se aprisionavam nes-se perodo e nessa
nomenclatura) quando criti-cava a expresso se abrir:
Ns camos todos em tentao, e tambmeu, por essa palavra mgica, se
abrir. Mas, apartir do momento que ns dizemos se abrirns camos na
cova dessa tradio milenarque, a despeito da todas as suas vitrias,
ape-sar de toda sua fecundidade, nos mutila: aque-la que diz que o
homem se divide entre o que interior e o que exterior, o intelecto
e ocorpo, etc. Na verdade, quando dizemos seabrir, queiramos ou no,
dizemos que em
ns, bem no fundo, h algo que precisodeixar sair e oferecer aos
outros; que o interiore o exterior existem como duas coisas
distin-tas [...] um pouco para evitar agir com todoo seu ser [...],
inteiramente ([dez. de 1970]1973, p. 10).
Seo I I ISeo I I ISeo I I ISeo I I ISeo I I I
Para continuar a investigao sobre o
binmioestrutura/espontaneidade atravs das investiga-es prticas do
Teatro Laboratrio, importan-tssimo referirmo-nos aos textos
escritos entre1966 e o final da dcada de 1960,22 textos semdvida
ligados a algumas descobertas feitas aolongo do trabalho sobre os
espetculos O Prn-cipe Constante23 e Apocalipsys cum Figuris.24
Existe um conceito-chave25 na leituradesses textos, conceito que
se relacionava com
21 Estou sintetizando as experincias riqussimas desse perodo que
gerou espetculos como Akrpolis eDr. Faustus. Isso se faz necessrio
no mbito de um artigo, mas preciso ressaltar que o perodo entre1962
e 1965 foi um perodo de transformaes profundas e inmeras
descobertas tanto no mbito dotrabalho do ator, como naquele da
relao com o espectador.
22 No livro Em Busca de um Teatro Pobre, penso em O Discurso de
Skara, O Encontro Americano,A Tcnica do Ator e em Ele no era
inteiramente ele. Penso ainda, em alguns textos do final dadcada de
1960 principalmente Teatro e Rituale nos quais Grotowski fez um
certo balano desua trajetria teatral. Outros textos importantes
para entender essa poca esto no livro The GrotowskiSourcebook, de
1997.
23 O Prncipe Constante estreou em 1965, tendo sido apresentado
at 1968. Embora j se possa perceber ainfluncia das experincias
realizadas nesse espetculo em alguns dos textos datados de
1964/1965,acredito que elas nortearo mais fortemente textos e
entrevistas posteriores, de 1966/1967.
24 Apocalipsys estreou em fevereiro de 1969 e continuou sendo
apresentado e transformado durante operodo parateatral do Teatro
Laboratrio.
25 Talvez o conceito mais importante do perodo seja ato total,
termo cunhado por Grotowski paranomear a experincia de Cieslak em O
Prncipe Constante. A noo de ato total possibilitava conside-rar um
amlgama entre aquilo que fsico biolgico, instintivo e aquilo que
espiritual: comoum degrau para o pice do organismo do ator, no qual
conscincia e instinto estejam unidos(Grotowski, 1987[1967], p.
180). Alm disso, para o tema desse artigo, o ato total tambm
umconceito importante, pois que originado pela conjuno de opostos
[espontaneidade e disciplina](Grotowski, 1987[abr. de 1967] p. 99).
Optei, entretanto, por trabalhar sobre o conceito de contatoporque
creio que essa nomenclatura pode ser mais imediatamente dirigida s
experincias prticas. Oconceito de contato foi trabalhado por
Grotowski, principalmente, em situaes onde ele estava en-
-
sssss a l a ppppp r e t a
56
inmeras transformaes prticas ocorridas noTeatro Laboratrio e
que, sem dvida, nos aju-dar a entender a trajetria do binmio
queestamos investigando. O conceito a que me re-firo o contato.
Existem vrias camadas decompreenso desse conceito que s
aparente-mente simples. Inicialmente, vamos aceitar que,de forma
geral, estar em contato, significa es-tar em relao com, reagir a,
responder a.
Grotowski disse ter descoberto esse con-ceito na base de um
problema completamen-te objetivo e tcnico (1987[dez. de 1967],p.
201). Um problema que poderia ser formu-lado mais ou menos assim: o
ator corria o riscode compreender aquele processo interior,aquele
trabalho de auto-revelao e de ama-durecimento, como um trabalho que
se reali-zaria a partir dele e que seria voltado, tambm,para ele
mesmo. Esse seria, para Grotowski, umator concentrado no elemento
pessoal comoum tipo de tesouro [...], procurando a rique-za de suas
emoes, um ator que apenas esti-mularia artificialmente o processo
interno, umator imerso em uma espcie de narcisismo(1987[jan. de
1966], p. 191). Para fugir desseproblema, Grotowski afirmava que o
ator, a fimde se realizar, no deveria trabalhar para si mes-mo, que
penetrando em sua relao com osoutros estudando os elementos de
contato ,o ator descobrir o que est nele (1987[dez. de1967], p.
202).
Estar em contato significava, concomi-tantemente, perceber o
outro e reagir intima-mente de acordo com essa percepo;
signifi-cava tambm que era no presente, agindo e
reagindo no aqui e agora das relaes, que sepoderia trabalhar com
aquilo que dizia respeitoao mbito da memria, das associaes ou
dasaspiraes e desejos.
Ouakinine26 chamava o ator, nessa pes-quisa, de lacteur Proust.
Para ele, a motiva-o criativa do ator corresponderia
memriainvoluntria de Proust. O processo poderia serdescrito assim:
o ator est em cena, realizandosuas aes. Em um dado momento, uma
dessasaes abre a porta das associaes, das mem-rias do ator. Essa
associao transforma a tota-lidade psico-corporal do ator: sua voz,
seus ges-tos, sua expresso so modificados, determina-dos por essa
associao pessoal. O ator, ento,no fica absorvido pela lembrana
despertada (oque o levaria, segundo Ouakinine, a ficar au-sente ou
em outro lugar), mas reage, a partirdaquele comportamento/memria,
no espao/tempo da prpria improvisao, e essa reaoestimula seu(s)
companheiro(s) de cena. O atorno fica mergulhado em vivncias
ntimas, masas percebe como reaes dirigidas ao outro,deslocadas
espacialmente na direo do outro.
O contato pressupunha, portanto, umarelao concreta com o espao:
em direo aooutro (aos outros, ao Outro), em termos de es-pao fsico,
que a reao pode se dar. Nesse sen-tido, o conceito de contato no
inclui apenasos atores que se relacionam, mas tambm o es-pao onde
acontecem essas relaes. O espao, ao mesmo tempo, percebido
geomtrica eexistencialmente. Ele direciona e orienta as re-laes, ao
mesmo tempo em que direcionadoe orientado por elas. Isso pode ficar
mais claro
volvido com a pedagogia teatral em conferncias ou entrevistas
realizadas aps estgios prticos, porexemplo e isso facilita o
approch com o conceito. Alm disso, o conceito de contato iluminar
anoo de ao fsica que apresentarei na seo IV.
26 Ouakinine chegou ao Teatro Laboratrio em janeiro de 1966. Aps
um ano de estgio, Grotowski solici-tou que ele reconstrusse o
roteiro de O Prncipe constante. Ouakinine fez, ento, uma srie de 90
de-senhos que descreviam o desenrolar do espetculo. Posteriormente,
em 1970, ele preparou o volume Ida coleo Les Voies de la Cration
Thtrale, inteiramente dedicado ao espetculo O Prncipe
Constante.
-
CCCCC onter o incontvel...
57
atravs de uma citao de Grotowski sobretrabalho com o que chamava
de companheiroimaginrio:27
[...] Esse companheiro imaginrio deve ser fi-xado no espao desta
sala real. Se no se fixaro companheiro em um lugar exato, as rea-es
permanecero dentro da gente. Isto sig-nifica que vocs se controlam,
sua mente osdomina e vocs se movimentam para umnarcisismo
emocional, ou para uma tenso,um certo tipo de limitao (1987 [jan.
de1966], p. 187).
Para finalizar o conceito de contato, massem a pretenso de ter
conseguido dar conta detodas as suas camadas e variveis,
necessriotambm ressaltar sua vinculao noo de umcompanheiro
seguro.28 Esse seria, segundoGrotowski, um outro ser humano, que
poderealiz-lo [a cada ator] e compreend-lo absolu-tamente. [...]
Algum por quem se procura. [...]Este ser humano [...] no pode ser
definido [...]precisamos apenas dizer-lhe [ao ator]: Vocstm de
doar-se totalmente. E muitos atorescompreendem (Grotowski, 1987
[jan. de1966], p. 202-3). A revelao, para Grotowski,implicava,
portanto, em contato: que noh impulsos ou reaes sem contato
(Gro-towski, 1987[jan. de 1966], p. 187).
Voltando ao nosso tema, pode-se afirmarque o conceito de
partitura estava, naquele mo-mento, totalmente associado ao de
contato.Dizia Grotowski: A partitura do ator consistedos elementos
do contato humano: dar e tomar.Olhe para as outras pessoas,
confronte-as con-sigo, com as suas prprias experincias e
pen-samentos, fornea uma rplica (1987[1967],p. 182).
Frente ao conceito de contato no maispossvel definir partitura
como uma exteriori-zao organizada de contedos interiores, j queno
contato aquilo que est dentro ou forano pode mais ser to facilmente
separado. Osimpulsos, as associaes e as reaes esto fir-memente
atados corporeidade, ao outro, eao espao. O que se partiturava,
nessa via detrabalho, era, ao mesmo tempo, corpreo,29 re-lacional
(o outro , em alguma medida, partedo eu ou vice-versa) e projetado
espacialmente(o espao fsico espao de reao e de rela-o). Essas
instncias corporal, relacional eespacial so tambm percebidas de
maneiraamalgamada, s podendo estar divididas teori-camente. Alm
disso, todas as instncias apon-tam para um universo, ao mesmo tempo
e pa-radoxalmente, visvel e invisvel. O corpo, ooutro e o espao
podem acolher, na tangibili-dade que lhes prpria, a presena do
intang-vel; podem ser setas lanadas ao desconhecido.
27 Fala-se em companheiro imaginrio quando o ator dirige a um
ser humano, no presente na sala detrabalho, as suas aes. As
associaes, compreendidas por Grotowski como relacionadas a
qualquercoisa que aconteceu conosco no passado, ou que poderia ter
acontecido, ou ainda que deveria ter acon-tecido: Algo enraizado na
vida pessoal, por exemplo, uma necessidade nunca satisfeita
(Grotowskiapud Magnat, 2000, p. 12), me parecem ser acionadas na
relao com esses companheiros imaginrios.
28 Essa noo de companheiro seguro parece tambm estar presente,
ainda que no nomeada porGrotowski, nesse trecho do texto Jour
Saint, de 1970: Eu sou gua, pura, que corre, a fonte ento ele e no
eu, esse ao encontro de quem eu vou, frente a quem eu no me
defendo. somente quandoele a fonte que eu posso ser gua vivente.
Uma outra referncia possvel para a noo de companhei-ro seguro pode
ser encontrada no conceito de Eu-Tu de Martin Buber.
29 No sentido de um corpo no subjugado ao pensamento racional,
um corpo que no ilustra um movi-mento da alma, mas que realiza esse
movimento com o seu organismo (Grotowski, 1987 [abr. de1967], p.
97-8).
-
sssss a l a ppppp r e t a
58
Se no compreendemos esse amlgamaexistente, principalmente aps O
Prncipe Cons-tante, entre eu e outro, corpo e associaes,corpo e
outro, acabamos por levar essa faltade compreenso para o conceito
(e as prticas)de partitura. Acabamos por produzir uma
certafetichizao do corpo e da musculatura comose uma forma precisa
e repetida levasse inexo-ravelmente a uma certa vida. Ora,
quandoGrotowki afirmava que as recordaes so sem-pre reaes fsicas
(1987 [jan. de 1966], p. 187)ou que o ator deveria pensar com o
corpo, ouainda quando falava no corpo-memria ou nocorpo-vida (2001
[mai. de 1969], p. 196), oque estava em jogo, antes de tudo, era a
pos-sibilidade de superao de um modelo que se-pararia corpo, mente
e esprito (valorizando opensamento racional) em instncias
estveis,distintas e hierarquizadas. Grotowski criticavatambm a
crena, que considerava ilusria, naexistncia de individualidades
fixas e apartadas,em um modelo que separaria rigidamente aqui-lo
que sou eu do que o outro.30 Ao valori-zarmos excessivamente aquilo
que corporal,fsico ou ao encantarmo-nos com a possibilida-de de
encontrar ou doar nosso eu verdadeiro,esttico e apartado do outro,
estamos, pelomenos, fugindo do desafio proposto naquelemomento por
Grotowski.
Seo IVSeo IVSeo IVSeo IVSeo IV
Aqui pretendo saltar, e trata-se de um salto demais ou menos 30
anos, para alguns textos, se-jam de Richards ou Biagini, escritos
entre o fi-nal da dcada de 1990 e incio dos anos 2000.31
Nesta seo, diferentemente do que fiz ao ana-lisar os dez
primeiros anos de trabalho deGrotowski frente do Teatro Laboratrio,
noseguirei a trajetria dos conceitos, mas escolhe-rei alguns temas
que, pouco trabalhados at ago-ra no artigo, no poderiam ficar de
fora de umareflexo sobre estrutura/espontaneidade.
Em primeiro lugar, exploraremos a noode ao fsica que, se j era
utilizada h muitopor Grotowski, s ganha corpo terico com olivro At
Work with Grotowski on Physical Actionsde Thomas Richards,
publicado em 1993. Tra-balharei, dessa noo, somente o que for
neces-srio para iluminar os conceitos de estrutura evida utilizados
pelos diretores do Workcenter.
Alm disso, atravs de certas respostas deBiagini e de um exemplo
de Richards, preten-do refletir sobre a polaridade do binmio,
oconjunctio oppositorum (Grotowski, 2001[mai. de 1969], p. 197)
espontaneidade e es-trutura, que Grotowski j havia explorado emseus
textos da segunda metade dos anos 60. Ve-remos como, frente a essa
polaridade, as noes
30 Dizia Grotowski em 1970: O ato do corpo-vida implica a
presena de uma outra pessoa humana, acomunicao dos homens, a
comunidade. E mesmo nossas lembranas s so verdadeiramente
impor-tantes quando elas nos ligam com um outro, quando elas evocam
os momentos nos quais ns vivemosintensamente com os outros. [...] e
se com seu corpo-vida vocs forem tocar algum, seu algum apare-cer
naquilo que vocs fazem. E haver, talvez, ao mesmo tempo, a presena
daquele que est aqui eagora, seu parceiro, e daquele que conta na
sua vida e daquele que contar na sua vida e Ele ser um.Veja porque,
entre outras coisas, isso no pode contentar-se com a introspeco,
com uma atitudefechada sobre si mesmo (1973[1970], p. 60).
31 Todas as citaes de Biagini so retiradas da entrevista
Incontro allUniversit la Sapienza, de 2000.As citaes de Richards so
retiradas tanto de uma entrevista indita que ele me concedeu em
1999, eque integra a sua tese de doutoramento De lart comme
vhicule, defendida em 2001, na Paris VIII,quanto de minhas anotaes
feitas no Symposium International ocorrido no Workcenter of Jerzy
Grotowskiand Thomas Richards em Pontedera, em dezembro de 2000.
-
CCCCC onter o incontvel...
59
correntes de detalhamento e de preciso deuma dada estrutura
ficam problematizadas.
Por ltimo, sero trabalhados os concei-tos de ajustamento e de
inrcia utilizados porRichards. Veremos como esses conceitos
ilumi-nam a noo de partitura.
Antes de tudo, necessrio abrir umgrande parntese para
apresentar, em linhas ge-rais, o que Grotowski, no seu Projeto de
Ensi-no e Pesquisa: Antropologia Teatral, para oCollge de France,32
distinguiu como os dois p-los principais do jogo do ator, plos que,
poranalogia, ele localizava tambm nos rituais: oplo artificial e o
plo orgnico. Essa diferen-ciao ter, nesse artigo, um duplo papel
namedida em que iluminar as sees anteriores,oferecendo a elas uma
certa concluso, ao mes-mo tempo em que fornecer uma introduos
questes que sero desenvolvidas a seguir.
O primeiro plo, o artificial,33 est liga-do a tcnicas
artificiais de jogo, tcnicas que,segundo Grotowski, como aquelas
descritas porDiderot no Paradoxo do Comediante, visamunicamente
exercer um efeito sobre a percep-o do espectador, sem que seja
prevista nenhu-ma identificao por parte do ator nem com ocarter da
personagem, nem com a lgica decomportamento ligada ao papel.
O ator estaria trabalhando, nesse plo, so-bre uma estrutura
composta de elementosextremamente precisos (herdados, em
algunscasos, das geraes precedentes), estaria concen-
trado na composio desses elementos. A mo-vimentao do ator est,
mesmo se no assimque a platia a percebe, separada em
pequenospedaos, havendo como paradas de fraes de se-gundo entre um
movimento e o seguinte. O en-gajamento pessoal do ator se d atravs
da distri-buio (e mudanas) na quantidade de foramuscular e nervosa
(Grotowksi a chama de t-nus) que ele utilizaria na realizao da sua
se-qncia. Haveria o que Grotowski chamou deum fluxo de tnus, mas o
corpo do ator noentraria, como no plo orgnico, em uma flui-dez do
movimento (Grotowski, p. 15). A maes-tria da execuo do ator est,
nesse caso, na suacapacidade de se concentrar nos micro-elemen-tos
gestuais de uma composio j pr-ordenada.
Grotowski exemplificava esse plo princi-palmente atravs da pera
de Pequim, mas cita-va tambm Meyerhold, alm de outros exemplosdo
teatro clssico oriental: ... os approches artifi-ciais se
caracterizariam pela composio bastan-te estrita das posies
corporais (pelas posies eno pelas transies), pela no-identificao
como processo, pelo que poderamos qualificar deno-espontaneidade
(Grotowski, p. 18).
O outro plo, chamado de linha org-nica, teria como pai fundador
Stanislavski. Se-gundo Grotowksi, para o encenador russo, oator
deveria construir a personagem como umfenmeno da sua prpria vida
(Grotowski,p. 12). As tcnicas orgnicas de jogo estariamapoiadas no
fluxo contnuo de impulsos.34 So
32 O projeto de Grotowski me foi cedido por Mario Biagini, mas
parte desse material est acessvel naRevista Teatro e Storia, anno
XIII, 1998-1999.
33 Grotowski fez questo de dizer que no havia nenhum
desmerecimento por esse plo ao usar o termoartificial, ligado, para
ele, e como j testemunhamos no incio desse artigo, mesma etimologia
dapalavra arte.
34 Seria falso acreditar que esses impulsos pertencem
exclusivamente ao domnio fsico. Todo larrire-plan das experincias
humanas, das associaes mentais, das lembranas, de uma linguagem no
for-mulada, mas presente como atrs dos pensamentos, tudo isso, e
outras coisas ainda, condicionam osimpulsos. [...] Se o fluxo de
impulsos que precedem as pequenas aes se libera, o corpo do ator
setorna em seu comportamento orgnico, para utilizar um termo do
prprio Stanislavski(Grotowski, p. 13).
-
sssss a l a ppppp r e t a
60
tcnicas nas quais os elementos inter-humano ecorpreo apareceriam
em primeiro plano; Gro-towski se considerava ligado a esse plo,
mas,de maneira diferente de Stanislavski, teria tra-balhado no
campo do comportamento huma-no ligado s condies extracotidianas
[...] onde[...] o aspecto dos impulsos e da organicidadepodem se
tornar ainda mais marcados (Gro-towski, p. 13).
Embora esses plos no devam ser vistos,de maneira alguma, como
duas possibilidadesque se excluem mutuamente e que exigem
fide-lidade irrestrita, creio que essas categorias uti-lizadas por
Grotowski acabam apontando, tam-bm, para duas maneiras de se
trabalhar sobreuma estrutura. Nesse artigo, estamos investi-gando o
conceito de estrutura dentro do tra-balho de Grotowski. Nessa
investigao, o con-ceito esteve, sem dvida, mais relacionado,
pelomenos a partir de 1962, s chamadas tcnicasorgnicas de jogo.
Parece impossvel pensar produtivamen-te a obra e o legado de
Grotowski se no locali-zarmos em suas investigaes um forte
desliza-mento entre arte e vida. O que , afinal, essalinha orgnica,
na qual o fenmeno teatral (ouritual) est relacionado com os
processos psico-fsicos do atuante, seno esse deslizamento le-vado s
ltimas conseqncias? No existe, por-tanto, a idia de um corpo de
ator, um corpoda arte, separado ou diferente do corpo do
ho-mem/artista, separado de um corpo vivo. Noexiste um corpo para
servir cena. Ao contr-rio, a cena que serve como espao
potencia-lizador para a vida do corpo.
E mesmo quando Grotowski falava emcondies extracotidianas, ele
no estava falan-do em um processo de vida submetido s exi-gncias da
arte, mas de uma vida excessiva, dis-tinta porque mais visvel,
menos submetida domesticao, seja do corpo, das relaes ou
dopensamento cotidianos.
As exigncias do artesanato e do mtier doator fazem sentido no
trabalho de Grotowskiporque (e se) participam dessa
potencializao,so necessrios a essa no domesticao da vida.Assim,
quando pensarmos em partitura, porexemplo, no podemos pensar apenas
na suafuno junto fruio do espectador, mas comoreferida a um
trabalho do ator sobre si mesmo,para usar uma expresso de
Stanislavski. a ser-vio daquela fluidez do movimento, que
Gro-towski localizava no plo orgnico, que a es-trutura ir
funcionar.
Nos textos de Richards e Biagini, essanoo de estrutura est, em
geral, bastante pr-xima da noo de ao fsica. Estruturar umfragmento
seria poder organiz-lo atravs deuma linha de aes fsicas.
As aes fsicas dizem respeito quilo queo atuante faz: [...] no
somente algo fsico. algo que envolve voc todo: a sua carne,
mastambm o seu pensamento, a sua vida, os seusdesejos e os seus
medos e, alm disso, a sua von-tade, as suas intenes (Biagini, 2000,
p. 23-24).
O que mais relevante na ao fsica,para o tema deste artigo, que
essas intenesno so pensamentos racionais e nem devem serentendidas
de maneira apenas psquica ou emo-cional; elas existem tambm ao nvel
musculardo corpo. Richards e Biagini j explicitaram, eminmeros
momentos, que as intenes estoligadas tambm a uma orientao da
mobi-lizao corporal (em-tenso, in-tencionar nadireo de algo ou de
algum) (Biagini, 2000,p. 23-4).35 As intenes se configuram,
portan-to, como um ponto de contato entre um mun-do impalpvel e um
palpvel. Uma ponte entreaquilo que desejo e aquilo que fao
(Biagini,2000, p. 24). Por esse motivo, por serem tam-bm aquilo que
fao, as intenes podem serestruturadas e podem servir de ncoras para
oator que quer se reaproximar de um dado frag-mento j
experienciado.
35 Ver principalmente o captulo Grotowski face a Stanislavski:
les impulsions do livro Travailler avecGrotowski [...], de
Richards.
-
CCCCC onter o incontvel...
61
Mas, se o trabalho sobre as aes fsicasvisa essencialmente
permitir ao ator construiruma partitura fsica precisa que possa ser
repro-duzida, esse trabalho busca gerar, ao mesmotempo, a cada vez,
um novo fluxo de impulsose de associaes no seio do seu organismo
[doator], influindo sobre ele de maneira no pre-determinada e no
premeditada (Magnat,2000, p. 9). Tenho especial apreo pela frase
queacabei de citar, pois, ao reunir em uma mesmaformulao as idias
aparentemente contrriasde reproduo e de no predeterminao
oupremeditao, Magnat deixa-nos entrever umapergunta fundamental ao
trabalho de estrutu-rao de um dado fragmento. A pergunta : deque
modo estruturar quando a estrutura visa,ao mesmo tempo, refazer um
fragmento, retor-nar a uma experincia vivida pelo ator, e permi-tir
que essa experincia continue guiando-se(como toda experincia) pelo
que desconhe-cido, o que no est determinado a priori?
A partir dessa pergunta, pode-se compre-ender melhor a afirmao
de Biagini quando di-zia que a estrutura no a conscientizao,
porparte do ator, da totalidade do seu comporta-mento cnico: O ator
consciente das suas in-tenes que vo na direo do exterior (inten-es
que so, talvez, suscetveis de acordar neleintenes e reaes secretas,
ntimas, que so araiz viva, o ncleo fundamental, quente, de seuato),
mas o modo como a inteno passa no cor-po atravs do agir, passa na
voz, passa no espa-o, passa no partner. Todo esse processo no
plenamente consciente. No momento em quese torna, h o risco de se
ter entre as mos umaforma vazia (Biagini, 2000, p. 31; grifo meu).
atravs de uma certa relao entre aquilo doqual o ator consciente e
aquilo que permane-
ce sempre desconhecido que podemos, portan-to, antever o
conceito de partitura.
Podemos concluir que, desse ponto devista, nem a vida se
apresenta sem uma estru-tura, nem a estrutura pode ser vista
apenascomo uma srie de movimentos que, bem re-petidos, podero fazer
com que o ator reencon-tre, inexoravelmente, a vida da ao.
Gostaria, agora, de olhar a questo dapartitura por um outro
ngulo, aquele do ma-terial que vai ser estruturado. Utilizarei
comometfora para aquilo que desejo pontuar umaentrevista de
Grotowski, na qual ele comenta omodo como as personalidades de
Gurdjieff e deOuspenski36 se materializavam nos textos deambos os
autores. Segundo ele, todos os aspec-tos pretensamente frios,
presentes nos textos deGurdjieff, e que poderiam ser vistos como
umperigo, uma fria manipulao das idias(Grotowski, 1997, p. 125) no
o eram, pois quefriccionavam com um homem extremamentepassional.
Gurdjieff, para Grotowski, era comoum vulco e seus textos estavam
numa relaoao mesmo tempo oposta e sustentada por suapassionalidade.
J Ouspenski era, segundoGrotowski, um homem muito inteligente,
umintelectual refinado, de modo que quandoOuspenski utilizava e
explicava a terminologiagurdjieffiana, desaparecia este aspecto de
luta,de contradio entre algo que no quer se sub-meter a uma
estrutura, a uma nomenclatura, eum esforo, por outro lado, de
estruturao eorganizao.
Grotowski no estava, nessa entrevista,falando sobre o binmio
estrutura/esponta-neidade, mas creio que esse fragmento
podeiluminar aquela relao de oposio, luta e sus-tentao entre os
plos do binmio. Metafo-
36 Gurdjieff, mstico nascido provavelmente em 1866, comeou a
compartilhar seus ensinamentos, naRssia, um pouco antes da primeira
guerra mundial. Em outubro de 1922, funda o Institute for
theHarmonious Developement of Man, em Fontainebleu-Avon, sul de
Paris. Morre em 1949. Gurdjieffescreveu alguns livros, entre os
quais Life is only real, then, when I am. Ouspenski (1878-1947),
fil-sofo russo, torna-se mais conhecido como um grande estudioso e
comentador da obra de Gurdjieff;entre seus inmeros livros est o In
search of the miraculous, publicado postumamente.
-
sssss a l a ppppp r e t a
62
ricamente, o exemplo pode nos fazer pensartambm sobre a escolha
do material a ser estru-turado. Investiguemos esses dois
pontos.
Freqentemente, a idia de partiturarseduz aqueles que esto
envolvidos com o tra-balho artstico. Talvez porque a partitura
tragaa noo de um resultado, de um ponto ao qualse chegou, talvez
porque ela parea oferecer umacerta segurana, na possibilidade de
repetio.Mas, o que vai ser estruturado? E quando co-mear essa
estruturao? Creio que essas deve-riam ser interrogaes permanentes,
respondi-das de maneira diversa a cada novo trabalho.Diz
Biagini:
Quando, para mim, o rigor, a estrutura, aartificialidade no
sentido forte da palavra atin-gem todo o seu sentido? Quando a fora
davida que escorre dentro do ator forte, quan-do verdadeiramente
nele acontece algo [...] avida sempre far resistncia a uma
estrutura,faz resistncia porque quer sair, maior, maisplena. [...]
Do meu ponto de vista, a armadurada tcnica, do artesanato, tem
sentido se pro-tege uma carne viva. Sustenta-a: paradoxal-mente,
como contradizendo-a, d-lhe fora.E defende-a frente ao mundo (2000,
p. 31).
Assim como no exemplo de Gurdjieff, no embate de foras opostas
que se produz umaexperincia criativa. Nesse contexto, no fazsentido
pensar, ento, em estruturao sem queainda tenhamos, durante os
ensaios, levado aefeito experincias que nos interessem a pontode
querermos reencontr-las e, necessariamen-te, aprofund-las em um
confronto com a es-trutura. Talvez fosse mais interessante
trabalhar-mos com uma certa idia de desperdcio, ummenor apego quilo
que produzimos, ou de for-ma menos utilitria em relao s nossas
expe-rincias. Afinal, o que estamos procurando?Sobre qual material
nos interessaria verdadei-ramente trabalhar?
Tambm o momento de comear a estru-turar deveria ser uma questo.
Qual seria omelhor momento? Ou melhor, se sempre existe
uma certa estrutura, j que o que fazemos no, como vimos,
informe, qual seria a hora decercar essa estrutura com vistas a
reviv-la eaprofund-la? Richards respondeu a essa ques-to quando se
referiu a entrada de novos atuan-tes no trabalho do Workcenter:
O tempo, a etapa de desenvolvimento deuma dada pessoa, isto que
dita a natureza eo tempo de elaborao de uma estrutura. [...]Para
descobrir o potencial, s vezes, a pessoatem necessidade de espao,
ela no tem ne-cessariamente necessidade que voc preenchao tempo
muito rapidamente com o que vocj sabe: ela est procurando o que ela
no sabe.Depois de um tempo de trabalho, depois deter feito
descobertas, quando a questo se tor-na como manter estas
descobertas e desen-volv-las, ns nos encontramos naturalmen-te face
questo de como tornar a estruturamais precisa (2001, p. 263).
Podemos pensar, ento, frente fala deRichards, em estruturas mais
abertas oufechadas que possam acompanhar a maturaode um certo
fragmento. O detalhamento daestrutura no nasceria, assim, nem a sua
lim-peza, como puro artefato, mas como uma de-manda da prpria
experincia (ou do atuanteque a realiza) que, refinando-se, refina,
ao mes-mo tempo, sua estruturao. Haveria uma re-lao estreita entre
o nmero de descobertasfeitas pelo atuante e a preciso de um
dadofragmento.
Tambm aqui, no devemos pensar a re-lao entre estrutura e fluxo
de vida comouma relao entre forma e contedo: Nemmesmo na fase
inicial, separamos um aspectoformal de um interior: estruturamos
quase queexclusivamente intenes e associaes, outalvez deveria dizer
impulsos? (Biagini, 2000,p. 24). E so essas intenes ao mesmo tem-po
tangveis e intangveis que vo ficandomais detalhadas.
A estrutura uma espcie de canalizaoque configura uma dada
experincia e, ao mes-
-
CCCCC onter o incontvel...
63
mo tempo, traz em seu bojo a possibilidade deaprofundamento
dessa experincia que tersempre, porque experincia, um dado de
risco,de desconhecimento, de inconscincia.
Como vimos, construir uma estruturano o processo de trazer
conscincia a totali-dade do comportamento cnico, e sim um pro-cesso
de construo de ncoras, de pontos de re-ferncia que evitam a
disperso, impem umadireo e, assim, permitem e exigem sempre no-vas
descobertas, desenvolvimentos e ajustes. Ri-chards trabalhou com a
imagem de um rio paraexemplificar a luta entre forma e fluxo da
vida:
A fora da gua descendo da montanha, cain-do, pela fora da
gravidade, em direo aooceano enorme. Se a gua desce da monta-nha
sem as bordas de um rio, ela vai disper-sar-se um pouco aqui, um
pouco l. preci-so que existam margens que devem tam-bm ter sua
fora, diferente da fora da gua,para canaliz-la. Assim, a fora dessa
mesmagua, canalizada, torna-se ainda maior e apa-rece um rio. [...]
No que a gua queira es-correr como rio, no que as margens garan-tam
o rio, mas so necessrios os dois paraque o rio possa aparecer.
[...] E por que eudigo luta? Por causa da natureza do ponto
deencontro quando eles se encontram, h umaluta: a gua cai e ela vai
escorrer em muitasdirees, mas a presena das margens resiste,se ope;
elas se mantm firmes para que agua seja canalizada em uma direo
precisa.[...] Sem estrutura ser sempre uma questode sorte, e faltar
a possibilidade de desen-volvimento (2001, p. 236-7).
Para concluir esta seo, gostaria ainda decomentar uma
possibilidade de relao entreum ator e sua partitura, como a percebo
atra-vs de alguns escritos dos diretores do Work-
center. O processo criativo no acaba, para eles,no momento em
que, depois de longo traba-lho, o ator consegue chegar a uma certa
estru-tura mais detalhada. No se trata de, a partirdesse momento,
simplesmente repetir a parti-tura, mas de viv-la, de novamente
passar poruma certa experincia. Ento, digamos que oator organizou,
atravs daqueles pontos de refe-rncia, atravs das intenes e
associaes, umdeterminado fragmento. E agora? Como repe-ti-lo? Como
relacionar-se com esse fragmento?
Toporkov37 parece estar se referindo a essaquesto quando dizia:
Seria errado considerara ao fsica s como um movimento plsticoque
expressa a ao. No; uma ao autntica,logicamente fundada, que
persegue uma finali-dade concreta e que, no momento da sua execu-o,
se converte em uma ao psicofsica (To-porkov, 1961, p. 175; grifos
meus). Mesmodepois de estabelecida a partitura o ator correperigo,
pois, como disse no incio deste artigo,referindo-me a Brook, o
teatro morto est, atodo momento, assaltando o trabalho do ator.Como
ento completar o ciclo? Ou seja, como,partindo de uma experincia,
partitur-la emaes fsicas, em pontos de referncia, e como,no momento
da execuo, no privilegiar a for-ma ou o que foi organizado a
priori, mas deixaressa organizao ser, tornar-se novamente, umasrie
de aes psicofsicas?
Obviamente, no pretendo dar uma res-posta a essa questo. Creio
que essa resposta spode ser encontrada na investigao prtica decada
ator. Quero apenas levantar alguns pontosde discusso com os
leitores.
Percebo que Richards e Biagini pensam arelao do atuante com sua
partitura comouma relao extremamente dinmica. comose houvesse
sempre, e a todo momento, comopontuam os dois artistas, a pergunta:
ser que possvel realiz-la (a partitura) inteiramente?
37 Ator que trabalhou junto a Stanislavski quando o encenador, j
no final de sua vida, estava investigan-do o Mtodo das Aes Fsicas.
Toporkov escreveu o livro Stanislavskii na repetitsii, no qual fala
desseperodo.
-
sssss a l a ppppp r e t a
64
como se, com essa pergunta, o ator fosse coloca-do entre a
estrutura, aquilo que ele conhece, eo momento presente, aquilo que
ele (esse ele est relacionado noo de contato, e nose refere a uma
individualidade essencial e est-tica). O desafio seria, ao mesmo
tempo, no fu-gir da estrutura nem desse momento presente.
A noo que aparece na fala de Richardspara dar conta dessa operao
prtica a noode ajustamento. Trata-se de um certo parado-xo. O ator
ajusta a estrutura ao momento pre-sente e, porque a ajusta, pode
segui-la, j queela era uma srie de intenes e no um con-junto de
movimentos. Se ele simplesmentemantivesse a estrutura sem ajust-la,
ela se tor-naria seca, mecnica, uma seqncia de gestos.Por outro
lado, se ele a desrespeitasse, como ela o prprio caminho para uma
dada experin-cia, ele teria se deixado levar, sem rumo. Aquiestamos
no cerne da noo de ajustamento: umjogo permanente entre
estabilidade e dinamis-mo. Mesmo correndo o risco de errar a
estrat-gia, permitir o ajustamento, quando necessrio,parece ser a
nica forma de realizar a estrutura.
A noo contrria quela de ajustamen-to a de inrcia, tambm de
Richards. Estarna inrcia seria no se permitir lidar com emesmo
querer bloquear a dinmica inerente experincia viva. Richards falava
da inrciacomo ancorada em uma certa relao que o atorestabeleceria
com a passagem do tempo. O atorestaria to fortemente identificado
com um cer-to momento experienciado tenha sido elebom ou ruim, de
um tempo remoto ou de ape-nas alguns segundos atrs que no seria
maiscapaz de seguir a dinmica da ao, permane-cendo como que
amarrado ao passado. Assim,impedido (impedindo-se) de entrar em
contatocom o que est acontecendo no momento, norealizaria os
ajustamentos necessrios ao desen-rolar da experincia criativa.
A inrcia pode ser gerada por vrias cau-sas: o apego do ator
quilo que funcionou nopassado, o seu apego aos erros que acabara
decometer (no sentido de ficar relembrando oserros nos momentos
sucessivos da sua ao), o
apego do ator ao olhar positivo ou negativo do espectador. Os
exemplos so infinitos.
Richards afirmava tambm que permane-cer na inrcia teria relao
com o medo daqui-lo que ainda desconhecido, do que poderia vira
acontecer. como se os atores se fechassemem uma certa moldura
conhecida e segura e novissem se (e quando) algo no funciona e
preci-sa ser modificado, precisa ser ajustado.
H uma parte de ns [...] que adora fixar ascoisas; sentimos como
se as conhecssemos,no nos arriscamos mais no desconhecido. Eufao o
que eu j conheo. [...] Essa atitudeno aceita a realidade, que
aquela de que nadapode ser exatamente a mesma coisa. umparadoxo
engraado: a experincia, no ato per-formtico, pode ser quase a
mesma, quase exa-tamente a mesma, mas no a mesma, do mes-mo modo
que nada jamais o mesmo, tudose transforma continuamente (2001, p.
245).
Frente complexidade e s variantes des-se processo, seria,
portanto, impossvel dar umaresposta puramente tcnica questo de
comorepetir uma ao viva. O processo estaria nasmos da pessoa que o
realiza. As ferramentas te-riam que ser criadas e as estratgias
inventadas ereinventadas pelo prprio ator a todo e a cadamomento de
sua cena.
Pequena concluso:
necessrio compreender que, sim, todas ascoisas podem ajudar, mas
a chave est na pa-lavra podem, talvez porque quando voc vaitentar,
voc no vai aplicar um dogma, ouuma crena, mas ser algo que voc est
tes-tando, que voc experimenta, que voc pro-cura. [...] Voc tem o
talvez e o pode quan-do se aproxima do que chamaramos de es-tratgia
ou tcnicas; voc est acordado epode julgar por si mesmo (Thomas
Richards).
A investigao do binmio estrutura/es-pontaneidade coloca em
questo certas leiturasque parecem ter ficado coladas ao nome de
-
CCCCC onter o incontvel...
65
Grotowski. Creio que, frente a esses conceitos,no mais possvel a
classificao de seu teatrocomo um teatro fsico. Tambm torna-se
dif-cil sustentar uma imagem de subjetividade doator esttica e
interior que revela e doa suaessncia para o mundo. Em Grotowski,
pelomenos aps meados da dcada de 1960, quan-do a subjetividade tem
lugar, ela percebida emfluxo, em dinamismo, enraizada em um
cor-po-vida, onde corpo, outro, espao, mem-ria, esprito no se
distinguem to facilmente.No tambm uma subjetividade
introspectiva,mas se quer acordada para seus prprios pa-dres e
hbitos mecanizados, se quer atenta ecapaz de reagir s experincias
que se apresen-tam. Por outro lado, no uma subjetividadeapenas
reativa, moldada inteiramente pelosacontecimentos, jogada para l e
para c ao sa-bor do vento, mas que faz escolhas rigorosas
eajusta-as com vistas a poder seguir, arriscada einstavelmente, um
percurso que lhe interessa.
Finalizo com uma histria que muitos dens conhecemos: Grotowski
no permitia quese fizessem gravaes em vdeo de O PrncipeConstante,
mas um espectador burlou a regra efez uma gravao sem som. A essa
gravao, en-contrada em um mercado e comprada pela Uni-versidade de
Roma, anexou-se uma gravao deudio. Essa ltima havia sido feita,
anos antes,pela rdio de Oslo durante uma das apresenta-es do
espetculo. Entre a gravao em vdeo ea realizada em udio havia,
portanto, uma gran-de diferena de tempo, mas, quando da monta-gem,
principalmente nos monlogos de RyszardCieslak, o som casou
perfeitamente com a ima-gem.38 Salvo mitificaes, no h dvida ne-
nhuma que temos aqui um exemplo de estru-tura extremamente
detalhada feita com extre-ma preciso. Por outro lado, inmeros
espec-tadores da poca acreditavam estar vendo umaimprovisao, tal
era o grau de espontaneida-de e engajamento do ator no espetculo.
Exem-plo emblemtico daquilo a que estamos nos re-ferindo. Sim, mas
como lidar com os exemplosemblemticos? Em primeiro lugar, no
tentan-do imit-los no seu resultado final. que a pre-ciso pode se
transformar em controle e limpe-za de movimentos com o objetivo de
repetirperfeita e rigorosamente a estrutura (mas esta-ramos aqui
falando da mesma preciso a queGrotowski se referia?). E
espontaneidade podese confundir com um bombeamento emocio-nal que
nos traz a impresso de desvendamentoe excesso. O trabalho sempre
longo. O exem-plo precisa ser reenviado prtica de cada um:perceber
que, talvez, no seja o momento de fe-char excessivamente uma
partitura, mas dedeix-la, ainda, aberta s descobertas. Daqui
apouco, poderemos aprender, quem sabe, o quevem a ser detalhe e
preciso. Talvez no deva-mos, tambm, colocar o nosso voluntarismo
nacaa de momentos preciosos a serem compar-tilhados, mas perceber o
que estimula o nossointeresse, o que nos faz sentido. E com
certezano o momento de fechar uma definio paraesse binmio, mas
recoloc-lo em jogo nas ex-perincias de todos ns. No ficar com os
res-duos da festa que acabou, mas limpar a mesa efazer uma nova
festa.39 E para isso que dialo-gamos, seja com nossos companheiros
de tra-balho, seja com os textos e investigaes deGrotowski,
Richards ou Biagini.
36 Grotowski relatou essa histria no encontro em homenagem a
Cieslak realizado em Paris em dezembrode 1990. Sua interveno est
transcrita no livro Ryszard Cieslak, acteur-emblme des annes
soixante.
39 No esqueci mais dessa frase desde que a ouvi em um vdeo
dedicado ao movimento Fluxus. Infeliz-mente no tenho nenhuma
referncia desse vdeo. Essa declarao foi dada por um dos artistas
quehavia participado do movimento. Ao comentar a exposio de objetos
fluxus que estava sendo feita poca em um museu, ele disse no se
reconhecer ali. Aquilo seria somente um final de festa e a
eleinteressava sempre recomear a festejar, j que o movimento se
queria ligado vida (e no ao museu). Afrase parece ser pertinente
nessa concluso.
-
sssss a l a ppppp r e t a
66
Referncias bibl iogrficasReferncias bibl iogrficasReferncias
bibl iogrficasReferncias bibl iogrficasReferncias bibl
iogrficas
BIAGINI, M. Incontro allUniversit la Sapienza. In: I Giganti
della Montagna rivista di cultu-ra teatrale. Anno I n. 0, Roma,
fevereiro, 2001.
BROOK, P. O Teatro e seu Espao. Petrpolis: Vozes, 1970.
BUBER, M. Eu e Tu. Introd. e trad. de Newton Aquiles Von Zuben.
So Paulo: Centauro, s/d.
BURZYNSKI, T. & OSINSKI, Z. Le Laboratoire de Grotowski.
Varsvia: Editions Interpress, 1979.
CALVERT, D. Heranas de Grotowski. In: Revista Folhetim, n. 13,
Rio de Janeiro: Teatro doPequeno Gesto, abr-jun 2002.
FLASZEN, L. Da mistero a mistero: alcune osservazioni in
apertura. In: FLASZEN, L e PO-LLASTRELLI, C. Il Teatro Laboratorium
di Jerzy Grotowski 1959-1969 testi e materiali diJerzy Grotowski e
Ludwik Flaszen com uno scritto di Eugenio Barba. Pontedera:
FondazionePontedera Teatro, 2001.
GROTOWSKI, J. Giochiamo a Siva [1960]. In: FLASZEN, L e
POLLASTRELLI, C. Il TeatroLaboratorium di Jerzy Grotowski 1959-1969
testi e materiali di Jerzy Grotowski e LudwikFlaszen com uno
scritto di Eugenio Barba. Pontedera: Fondazione Pontedera Teatro,
2001.
_______. Farsa-Misterium [dez. 1960]. In: FLASZEN, L e
POLLASTRELLI, C. Il Teatro Labo-ratorium di Jerzy Grotowski
1959-1969 testi e materiali di Jerzy Grotowski e Ludwik Flaszencom
uno scritto di Eugenio Barba. Pontedera: Fondazione Pontedera
Teatro, 2001.
_______. La possibilit del teatro [fev. 1962]. In: FLASZEN, L e
POLLASTRELLI, C. Il TeatroLaboratorium di Jerzy Grotowski 1959-1969
testi e materiali di Jerzy Grotowski e LudwikFlaszen com uno
scritto di Eugenio Barba. Pontedera: Fondazione Pontedera Teatro,
2001.
_______. O Novo Testamento do Teatro [1964]. In: Em Busca de um
Teatro Pobre. Rio de Janei-ro: Civilizao Brasileira, 1987.
_______. Em Busca de um Teatro Pobre. In: Em Busca de um Teatro
Pobre. Rio de Janeiro: Civi-lizao Brasileira, 1987.
_______. O Discurso de Skara [jan. 1966]. In: Em Busca de um
Teatro Pobre. Rio de Janeiro:Civilizao Brasileira, 1987.
_______. A Tcnica do Ator [1967].In: Em Busca de um Teatro
Pobre. Rio de Janeiro: CivilizaoBrasileira, 1987.
_______. Ele no era inteiramente Ele [abr. 1967]. In: Em Busca
de um Teatro Pobre. Rio deJaneiro: Civilizao Brasileira, 1987.
_______. O Encontro Americano [dez. 1967]. In: Em Busca de um
Teatro Pobre [1965]. Rio deJaneiro: Civilizao Brasileira, 1987.
-
CCCCC onter o incontvel...
67
_______. Teatro e Rituale [out. 1968]. In: FLASZEN, L e
POLLASTRELLI, C. Il Teatro Labo-ratorium di Jerzy Grotowski
1959-1969 testi e materiali di Jerzy Grotowski e Ludwik Flaszencom
uno scritto di Eugenio Barba. Pontedera: Fondazione Pontedera
Teatro, 2001.
_______. Ezercizi [mai. 1969]. In: FLASZEN, L e POLLASTRELLI, C.
Il Teatro Laboratoriumdi Jerzy Grotowski 1959-1969 testi e
materiali di Jerzy Grotowski e Ludwik Flaszen com unoscritto di
Eugenio Barba. Pontedera: Fondazione Pontedera Teatro, 2001.
_______. Los Ejercicios [mai. 1969]. In: Mscara Cuaderno
Iberoamericano de Reflexion sobreEscenologia (Grotowski) ano 3 n.
11-12, Mxico, janeiro de 1993.
_______. Ce qui fut [1970]. In : Jour saint et autres textes.
Paris: Gallimard, 1973.
_______. Jour Saint [dez. 1970]. In : Jour saint et autres
textes. Paris: Gallimard, 1973.
_______. Era como un Volcn. In: Gurdjieff. Venezuela: Editorial
Ganesha, julho de 1997.
_______. De la compagnie thtrale lart comme vhicule. In:
Travailler avec Grotowski sur lesactions physiques. Paris:
ActesSud/Acadmie Exprimentale des thtres, 1995.
_______. Programmi al Collge de France [1996-1997]. In: Teatro e
Storia 20-21, anno XIII,1998-1999. Sullattore e Grotowski
Posdomani, Il Mulino.
_______. Projet dEnseigment et de Recherches Antropologie
Thtrale, 1996. Programa apre-sentado para candidatura ao Collge de
France. Arquivo de Mario Biagini.
_______. Le Prince constant de Ryszard Cieslak. In: BANU, G.
Ryszard Cieslak, acteur emblmedes annes soixante. Paris: Actes Sud,
1992.
MAGNAT, Virginie. Cette Vie nest pas Suffisante: De lacteur
selon Stanislavski au performerselon Grotowski. In: Thatre/Public,
153, mai-juin 2000
MOTTA LIMA, T. A arte como veculo. In: Revista do Lume. N. 2,
Campinas: UNICAMP, ago1999.
OSINSKI, Z. Jerzy Grotowski: Zrdla, inspiracje, konteksty.
Gdansk: Slowo/Obraz terytoria, 1998.
OUAKNINE, S. Les Voies de la Cration Thtrale. Volume I: Thtre
Laboratoire de Wro-claw Le Prince constant. Introduction para Jean
Jacquot. tude et recontitution du droule-ment du spectacle. Paris:
Editions du Centre National de la Recherche Scientifique, 1970.
RICHARDS, T. Travailler avec Grotowski sur les actions
physiques. Paris: ActesSud/Acadmie Exp-rimentale des thtres,
1995.
_______. De LArt comme Vhicule. Tese de doutoramento.
Universidade Paris VIII, 2001.
STANISLAVSKI, C. El Trabajo del Actor sobre si mesmo. Tomo I: En
el proceso creador de lasvivencias. Buenos Aires: Editorial
Quetzal, 1994.
_______. A Preparao do Ator. Rio de Janeiro: Civilizao
Brasileira, 1984.
SCHECHNER, R. & WOLFORD, L. The Grotowski Sourcebook. New
York: Routledge, 1997.
TOPORKOV, V. O. Stanislavski Dirige. Buenos Aires: Compaia
General Fabril Editora, 1961.