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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES/ CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES COMUNIDADES NOVAS DE VIDA E ALIANÇA NO NORDESTE BRASILEIRO: PROCESSO COMUNITÁRIO E PRÁTICAS RELIGIOSAS KÁTIA SIMONE ALMEIDA LINS ALVES João Pessoa-PB 2009
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES/

CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES

COMUNIDADES NOVAS DE VIDA E ALIANÇA NO NORDESTE

BRASILEIRO: PROCESSO COMUNITÁRIO E PRÁTICAS RELIGIOSAS

KÁTIA SIMONE ALMEIDA LINS ALVES

João Pessoa-PB 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES/

CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES

COMUNIDADES NOVAS DE VIDA E ALIANÇA NO NORDESTE

BRASILEIRO: PROCESSO COMUNITÁRIO E PRÁTICAS RELIGIOSAS

KÁTIA SIMONE ALMEIDA LINS ALVES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências das Religiões, na linha de pesquisa Religião, Cultura e Produções Simbólicas, sob a orientação da professora Dra. Maristela Oliveira de Andrade.

João Pessoa-PB 2009

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À Otávio Augusto, meu primeiro filho.

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AGRADECIMENTOS

Para construir o trabalho dissertativo aqui exposto, não foram poucas as pessoas

que de alguma forma contribuíram. Quando se tem pouco, mas se dá tudo o que se tem,

acontece o fenômeno da multiplicação e, de repente, têm-se tudo e em abundância, foi o

que aconteceu nesse percurso.

Agradeço imensamente a Deus, pois sei que é por graça dEle que faço parte do

Programa de Ciências das Religiões da UFPB, desde a primeira turma da Especialização,

realizada em 2005, até agora.

Ao meu esposo, Rinaldo, e ao meu filho, Otávio Augusto, agradeço, por

partilharem comigo esses momentos de estudo e pesquisa.

Aos meus pais, Otávio e Gracinha, por estarem sempre disponíveis para me ajudar

em todas as horas, inclusive na etapa final desta dissertação, quando cuidaram de Otávio

Augusto na minha ausência.

A professora Maristela Andrade, pelo incentivo, pela compreensão, pelas preciosas

orientações nessa dissertação, pela amizade, que está para além de uma formação

estritamente intelectual.

As várias pessoas que contribuíram com seu pouco para transformar no resultado

conjunto deste trabalho: Paula Ângela, minha querida cunhada, pela ajuda pronta,

oportuna e eficiente, na correção ortográfica dessa dissertação; a Joelma Maria e

Marileuza, pelo zelo nas considerações sobre as Normas da ABNT; a Karlena Moura, pela

prontidão e alegria em contribuir com o abstract; a Sarinha, pela contribuição final.

Aos colegas da primeira turma de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em

Ciências das Religiões-UFPB, pelo companheirismo, respeito, aprendizado conjunto,

amizade, convivência, troca de conhecimentos, em especial a André Agra, pelas valiosas

discussões sobre o tema aqui tratado. Assim como aos professores deste Programa, que se

mostraram mestres responsáveis com o aprendizado e conhecimento.

Agradeço muito a Maria, Secretária do Programa de Pós-Graduação em Ciências

das Religiões da UFPB, pela simpatia, acolhimento constante e prontidão em atender.

Não posso deixar de agradecer aos membros das Comunidades Novas de Vida e

Aliança do Regional Nordeste2 que participaram da Escola de Formadores em Campina

Grande/PB, onde realizei a pesquisa de campo, pela abertura em responder os

questionários, compreensão e interesse pela pesquisa aqui realizada.

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Ora, a existência humana só é

possível graças a essa comunicação

permanente com o Céu.

(ELIADE,1996)

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RESUMO

Nesta dissertação, analisa-se a dinâmica das Comunidades Novas de Vida e Aliança (CNVA), nova forma de sociabilidade religiosa presente no contexto atual do catolicismo, com ênfase no processo de fundação e manutenção da comunidade, nas experiências religiosas vivenciadas por seus membros, na sua relação com a sociedade e a igreja e nos valores difundidos. Para tanto, vale-se das lições de autores clássicos e contemporâneos da antropologia e da sociologia no campo da religião (Mircea Eliade, Max Weber, E. Troeltsch, Peter Berger) e da comunidade (Ferdinand Tönnies, Victor Turner, Francesco Alberoni, Zygmunt Bauman, Michel Maffesoli). A pesquisa de campo foi realizada em eventos nos quais se reuniram Comunidades dos Estados da Paraíba, do Rio Grande do Norte, de Pernambuco e de Alagoas, utilizando como metodologia a descrição etnográfica dos módulos II e IV da Escola de Formadores de líderes das Comunidades Novas de Vida e Aliança do Regional Nordeste2 realizada em Campina Grande/PB, além da análise de questionários aplicados com os participantes dessa escola. Do confronto entre o suporte teórico e os dados obtidos no trabalho empírico, observamos que a fundação da comunidade acontece como um movimento que tende à institucionalização, procurando reconhecimento na hierarquia da Igreja Católica, empregando as escolas de formação como estratégia formativa para criação de unidade interna através da difusão de valores comuns. Verificou-se o surgimento das CNVA no Nordeste no final dos anos 1980 intensificando-se na última década, sendo que poucas se encontram numa fase avançada no processo comunitário. Palavras-chave: Comunidade, Novos Movimentos Religiosos, catolicismo,

Comunidades Novas de Vida e Aliança.

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ABSTRACT In this dissertation we analyze the dynamics of Charismatic Communities, new formation of religious sociability that exists in the present context of Catholicism, with emphasis on the process of foundation and maintenance of the community, on the religious experiences lived by its members, on its relationship with the society and the church and on the values spread. Therefore, we have recourse to the experience of classical and contemporaneous authors of anthropology and sociology in the field of religion (Mircea Eliade, Max Weber, E. Troeltsch, Peter Berger) and of the community (Ferdinand Tönnies, Victor Turner, Francesco Alberoni, Zygmunt Bauman, Michel Maffesoli). The field research was carried out during events in which communities of the State of Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco and Alagoas came together, using as methodology the ethnographic description of modules II and IV of the Leaders Formers School of Charismatic Communities from Northeast Regional that took place in Campina Grande/PB, besides the analyses of the questionnaires applied to the participants of this school. From the confrontation between the theoretical support and the data obtained in the empirical work, we observed that the foundation of the community occurs as a movement which tends to institutionalization, seeking recognition in the hierarchy of the Catholic Church, using the formation schools as a formation strategy for the creation of an internal unit through the diffusion of common values. We verified the emergence of the Charismatic Communities in the Northeast in the end of the 1980s, intensifying this process in the last decade. However a few are in an advanced phase in the communitarian process. Keywords: Community, New Religious Movements, New Life and Alliance Communities, Catholicism.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Características e valores da Comunidade ..............................................................26

Quadro 2 - Distribuição das Comunidades do Regional Norteste2 participantes II módulo....75

Quadro 3 - Distribuição das atividades da programação do II Módulo....................................76

Quadro 4 – Comunidades que participaram do IV Módulo .....................................................78

Quadro 5 – Distribuição das atividades ao longo do IV Módulo..............................................79

Quadro 6 – Resumo dos temas abordados no IV Módulo........................................................85

Quadro 7 – Carisma das CNVA.............................................................................................101

Quadro 8 – Data de fundação das CNVA..............................................................................105

Quadro 9 – Estrutura organizacional das CNVA....................................................................106

Quadro 10 – Formas de participação dos membros nas decisões comunitárias.....................108

Quadro11 – Decisão de se consagrar/fundar uma CNVA......................................................120

Quadro 12 - Dificuldades em fundar uma comunidade ou nela se consagrar.........................124

Quadro 13 - Motivações para se consagrar em uma CNVA...................................................126

Quadro 14 - Motivações para permanecer na CNVA.............................................................128

Quadro 15 - Mudanças nos membros após aderirem à CNVA...............................................131

Quadro 16 - Visão da sociedade atual pelos membros das CNVA ......................................137

Quadro 17 - Valores presentes na CNVA ..........................................................................139

Quadro 18 - Meios de divulgação utilizados pelas CNVA.....................................................141

Quadro 19 – Abertura dos membros das CNVA para outros conhecimentos........................142

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Modelo de estrutura das CNVA .............................................................................59

Figura 2 – Dimensões do processo comunitário.....................................................................103

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Distribuição da faixa etária dos membros das CNVA...................................97

Gráfico 2 – Estado de vida dos membros das CNVA......................................................98

Gráfico 3 – Inserção dos membros das CNVA na sociedade...........................................98

Gráfico 4 – Formas de vida comunitária: vida ou aliança..............................................106 Gráfico 5 – Percentual de líderes fundadores e outros líderes .......................................108

Gráfico 6 – Porcentual de consagrados e não-consagrados nas CNVA.........................109

Gráfico 7 – Formas de ingresso nas CNVA ...................................................................110

Gráfico 8 – Fluxo de membros que entraram e saíram da comunidade

nos últimos 12 meses ..............................................................................110

Gráfico 9 – Processo Comunitário.................................................................................110

Gráfico 10 – Dificuldades de convivência entre os membros na CNVA........................114

Gráfico 11 – Atividades realizadas comunitariamente...................................................115

Gráfico 12 – Origem dos recursos para o sustento da comunidade .................................116

Gráfico 13 – Porcentual dos membros que permanecem desde a fundação

da CNVA...................................................................................................118

Gráfico 14 – Motivações para entrada nas CNVA.........................................................119

Gráfico 15 – Motivações para saída das CNVA............................................................120

Gráfico 16 – Como seria viver fora da CNVA...............................................................134 Gráfico 17 – Como seria viver sem religião...................................................................135

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LISTA DE SIGLAS

CNVA – Comunidade Nova de Vida e Aliança CV – Comunidade de Vida CA – Comunidade de Aliança CEB – Comunidade Eclesial de Base CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil LG – Lumen Gentium Constituição Dogmática sobre a Igreja RCC – Renovação Carismática Católica

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................................13

1 RELIGIÃO, COMUNIDADE E PROCESSO COMUNITÁRIO...... ....................18

1.1 Sociologia e estudo da religião................................................................................18

1.2 Comunidade e sociedade.........................................................................................22

1.3 Processo comunitário ..............................................................................................30

1.3.1 Os sujeitos do estado nascente................................................................................30

1.3.2 O contexto externo de surgimento..........................................................................31

1.3.3 A experiência fundamental.....................................................................................31

1.4 Panorama sócio-cultural atual e idéia de comunidade...............................................33

2 COMUNIDADES CRISTÃS AO LOGO DA HISTÓRIA.......... ........................... 37

2.1 Primeiras comunidades cristãs...............................................................................37

2.2 Primeiras comunidades religiosas monásticas......................................................40

2.3 Comunidades religiosas mendicantes ....................................................................44

2.4 Comunidades religiosas na modernidade..............................................................45

2.4.1 Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s)..............................................................46

2.4.2 Movimento da Renovação Carismática Católica....................................................48

2.5 Comunidades Novas de Vida e Aliança .................................................................50

2.5.1 Contextualização ....................................................................................................51

2.5.2 Características das Comunidades Novas de Vida e Aliança (CNVA) ...................55

2.5.3 Estrutura das CNVA...............................................................................................57

2.5.4 Os membros das CNVA .........................................................................................60

2.5.5 Vocação, espiritualidade, carisma, fundadores e missão das CNVA.....................64

2.5.6 Economia nas NCVA .............................................................................................67

3 CNVA NO NORDESTE BRASILEIRO ..................................................................68

3.1 Metodologia – a pesquisa empírica ........................................................................69

3.1.1 Questionário ...........................................................................................................70

3.1.2 Descrição etnográfica e observação participante....................................................70

3.2 A Escola de Formadores de líderes de Comunidades Novas de Vida e Aliança do Nordeste em Campina Grande/PB...............................................................................73

3.2.1 Descrição do segundo módulo................................................................................74

3.2.2 Descrição do quarto módulo...................................................................................77

3.2.3 Descrição da parte pedagógica dos módulos..........................................................79

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3.2.3.1 Objetivo da formação e requisitos para fundação de novas comunidades.........80

3.2.3.2 Parte pedagógica do segundo módulo................................................................81

3.2.3.3 Parte pedagógica do quarto módulo...................................................................83

3.2.4 Descrição da parte ritual dos módulos....................................................................90

3.2.4.1 Parte ritual do segundo módulo ..........................................................................90

3.2.4.2 Parte ritual do quarto módulo.............................................................................92

3.2.5 Descrição da parte de convívio e sociabilidade dos dois módulos.........................93

3.2.6 Participação da Igreja na Escola de Formadores de Campina Grande ...................94

3.2.7 Apreciação geral dos módulos II e Iv da Escola de Formadores de Campina Grande/PB.........................................................................................................................................95

3.3 Análise dos questionários aplicados no módulo II da Escola de Formadores em Campina Grande/PB .....................................................................................................95

3.3.1 Perfil dos líderes e fundadores das Comunidades Novas de Vida e Aliança aqui

estudadas .........................................................................................................................96

3.3.1.1 Sexo, idade, estado civil, inserção na sociedade.................................................96

3.3.2 O carisma das Comunidades Novas .......................................................................99

3.3.3 Processo Comunitário...........................................................................................103

3.3.3.1 Dinâmica comunitária: estrutura, fluxo de membros e etapas de amadurecimento das CNVA.............................................................................................................................104

3.3.3.2 Relações membros e comunidade (adesão, permanência, saída, consagração,

fundação) .......................................................................................................................119

3.3.3.3 Relações da Comunidade com a Igreja e com a RCC.......................................132

3.3.3.4 Relações da Comunidade com a Sociedade ......................................................133

3.3.4 Apreciação geral dos resultados do questionário .................................................143

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................145

REFERÊNCIAS ..........................................................................................................148

APÊNDICES ................................................................................................................153

ANEXOS ......................................................................................................................158

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Dados de acordo com: AACR2, CDU e Cutter

A474c Kátia Simone Almeida Lins Alves

Comunidades novas de vida e aliança no Nordeste brasileiro: processo comunitário e práticas religiosas / Kátia Simone Almeida Lins Alves. – João Pessoa, PB: [s.n], 2009.

133 f.

Dissertação (Pós-Graduação) – Universidade Federal da Paraíba (UFPB) – Mestrado em Ciências das religiões, 2009.

1. Religiões e Movimentos Religiosos Recentes 2. Catolicismo 3. Igreja Católica 4. Comunidades – Vida e Aliança I. Título

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ALVES, K.S.A.L. UFPB-PPGCR 2009

13

INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva pesquisar o universo das Comunidades Novas de Vida e

Aliança (CNVA), analisando o processo comunitário por elas vivenciado no contexto

religioso católico atual, especificamente no Nordeste brasileiro, desde o seu surgimento,

verificando as dinâmicas decorrentes e se caminham para a institucionalização ou

permanecem fora dela. Dar-se-á ênfase também nos aspectos de relações internas e de

relações com a sociedade, além de identificar algumas práticas religiosas dos seus membros.

Partindo do conceito sociológico e antropológico de Comunidade, para situar as

comunidades estudadas, utilizaremos os ensinamentos de Ferdinand Tönnies, pai da

sociologia alemã, na sua obra “Comunidade e Sociedade”; Victor Turner, antropólogo, no seu

livro “O Processo Ritual – estrutura e anti-estrutura” (1969), especificamente a distinção entre

communitas e societas e a associação com o conceito de Liminaridade, e Francesco Alberoni,

sociólogo italiano, e sua obra “Gênese – como se criam os mitos, os valores e as instituições

da civilização ocidental” (1929), onde aborda o surgimento dos movimentos sociais.

A sociedade contemporânea, ao contrário do que previam os discursos durante os

anos 1960, tem vivenciado uma reinserção do sagrado na vida social. Alguns teóricos do

“pós-moderno”, como a socióloga francesa Danièle Hevieu-Léger (2005), vêem a religião

atual como uma rede de “comunidades emocionais”, que destacam o emocionalismo e o

subjetivismo, havendo um processo de desistitucionalização, pois os fiéis estão reunidos em

torno de um líder carismático (apud MARIZ, 2003). Outros, como Cecília L. Mariz, socióloga

brasileira que estuda o fenômeno religioso contemporâneo, acredita que as estruturas

organizativas mantêm as experiências espontâneas e emocionais (MARIZ, 2003). De

qualquer maneira, o que se observa é uma multiplicação de comunidades religiosas ligadas a

diferentes tradições religiosas, fenômeno que requer maiores estudos que possam ajudar a

esclarecer a que circunstâncias ele está associado.

No contexto da Igreja Católica, junto com a Renovação Carismática Católica (RCC),

as Comunidades Novas de Vida e Aliança vêm ganhando expressão como forma de vivência

da fé cristã. Elas são uma forma de vida comunitária existente na Igreja Católica do Brasil

desde o final da década de 19701, tendo um grande impulso na década de 1990, continuando a

surgir CNVA a cada ano. Esse fenômeno não é só no Brasil, tem-se vivenciado uma grande

1 A Comunidade Canção Nova, considerada a mais antiga Comunidade Nova de Vida e Aliança do Brasil, comemora este ano 30 anos de existência, ou seja, foi fundada em 1978.

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ALVES, K.S.A.L. UFPB-PPGCR 2009

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difusão pelo mundo inteiro. Esse fenômeno vem sendo estudado por sociólogos, teólogos e

acadêmicos no Brasil e no exterior. No Brasil, trabalham no estudo das NCVA, entre outros:

Brenda CARRANZA (2000), Maria das Dores C. MACHADO (1996), Ricardo MARIANO

(2003), Cecília L. MARIZ (2003, 2004, 2005), Reginaldo PRANDI (1997).

Foi também na década de 1970 que surgiu a primeira Comunidade Nova de Vida e

Aliança do mundo, no mesmo local onde teria nascido a RCC, ou seja, em Arbor, no Estado

de Michigan, nos Estados Unidos. Trata-se da Comunidade Word of God, fundada por Ralph

Martin e Steve Clark (MAFRA, 2000).

A grande expressão desse fenômeno para a Igreja aconteceu em Roma, no coração da

Igreja Católica, no dia 30 de maio de 1998, na Praça São Pedro, durante a Vigília de

Pentecoste, com o encontro de uma multidão de 4400 mil pessoas, cerca de 60 Movimentos

Eclesiais e Novas Comunidades.

No Brasil, segundo pesquisa realizada pela Comunidade Católica Shalom, existem

cerca de 400 Novas Comunidades, dentre estas, aproximadamente 65% estão em fase

embrionária, 20% estão em desenvolvimento e 15% estão atingindo ou já atingiram um

amadurecimento. (TIMBÓ, 2004). Diante desse panorama, o propósito desse estudo é analisar

a dinâmica que gera o surgimento e a multiplicação das comunidades, e as transformações

sofridas em sua trajetória em direção a uma institucionalização das mesmas, ou as

dificuldades encontradas neste processo.

As CNVA nasceram de grupos de oração da Renovação Carismática Católica,

portanto, trazem desses grupos a espiritualidade característica da RCC, ou seja, o uso dos

carismas e dons do Espírito Santo, a espontaneidade da oração, cânticos, danças, louvores.

São formadas, em sua maioria, por fiéis católicos leigos.

São geralmente definidas como Associação Privada de Fiéis, porque dirigidas por

leigos, e a maioria são reconhecidas pela Igreja Católica, por meio da aprovação do bispo

local. Têm como objetivo uma atualização da experiência de vida comunitária dos primeiros

cristãos, inclusive com o fim de Evangelizar com novos métodos, respondendo aos anseios do

homem contemporâneo. São estruturas com Conselhos, Departamentos, Secretarias,

coordenadorias, de acordo com a realidade de cada Comunidade.

Essa forma de associação religiosa de fiéis e modo de expressão da fé católica tem

suscitado diversas opiniões na hierarquia da Igreja, entre os demais fiéis católicos e até

naqueles que não fazem parte da Igreja Católica, seja pela novidade da forma, seja pela

expressão da fé católica que, em geral, se desenvolve.

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ALVES, K.S.A.L. UFPB-PPGCR 2009

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A Igreja Católica, pelos discursos direcionados às CNVA, diz que as Comunidades

Novas são um fenômeno que nasceu da busca de ter uma experiência com Jesus Cristo e com

o Espírito Santo, que gera cristãos comprometidos com a doutrina católica, com profundas

mudanças de vida, nas diversas estruturas sociais. O Papa João Paulo II via os Movimentos e

as Comunidades Novas como resposta para os cristãos católicos anunciarem com fervor

Cristo Jesus e o seu Evangelho no mundo descristianizado (Papa João Paulo II apud TIMBÓ,

2004, p.19 - pronunciamento durante o encontro dos Movimentos Eclesiais e das Novas

Comunidades, 30/05/1998, no Vaticano):

No nosso mundo, com freqüência dominado por uma cultura secularizada que fomenta e difunde modelos de vida sem Deus, a fé de muitos é posta à dura prova e, não raro, é sufocada. Percebe-se, então, com urgência, a necessidade de um anúncio forte e de uma sólida e aprofundada formação cristã. Como é grande, hoje, a necessidade de personalidades cristãs amadurecidas, conscientes da própria identidade batismal, da própria vocação na Igreja e no mundo! E eis, então, os movimentos e as Novas Comunidades eclesiais: eles são a resposta, suscitada pelo Espírito Santo, a este chamativo desafio do final do milênio. Vós sois esta resposta providencial.

Quando da realização do Curso de Especialização, realizado pelo Programa de Pós-

Graduação em Ciências da Religião da UFPB, em 2005/2006, trabalhei a monografia sobre

Religião e Juventude na pós-modernidade, enfocando o caso da Comunidade Nova de Vida e

Aliança denominada Comunidade Católica Missionária Salve Maria, em João Pessoa/PB,

abordando os vários aspectos que levam a parcela jovem da sociedade a aderir a essa forma de

convívio religioso da atualidade. Constatou-se que a procura por uma vida comunitária

religiosa, nos moldes das CNVA, é influenciada pela cultura da sociedade atual, na medida

em que os jovens buscam na vivência comunitária valores como o acolhimento, a partilha, as

relações duradouras, todos contrários aos vivenciados pela sociedade contemporânea

(ALVES, 2006).

Nessa dissertação, almeja-se enfocar aspectos da vida em comunidade experienciados

por membros das CNVA, no que se refere ao processo comunitário religioso e aos valores

difundidos por algumas das CNVA localizadas no Nordeste.

Entre os nossos objetivos específicos estão:

a) caracterizar a estrutura e os valores das CNVA a partir de uma reflexão teórica

produzida por autores clássicos e contemporâneos da antropologia e da sociologia;

b) realizar pesquisa empírica junto a líderes (fundadores e formadores) de algumas

CNVA da regional nordeste 2 no espaço da escola de formadores;

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ALVES, K.S.A.L. UFPB-PPGCR 2009

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c) fazer uma análise qualitativa dos questionários aplicados com líderes (formadores

e fundadores) das CNVA acima citadas, averiguando em suas respostas como

acontece a dinâmica interna do processo comunitário de fundação de uma CNVA,

como e quais são as relações internas entre seus membros e, entre esses e a

sociedade.

Na pesquisa empírica, fez-se uso dos seguintes métodos de campo para coleta dos

dados: aplicação de questionários e observação participante nos 2° e 4° módulos do

curso/evento intitulado “Escola de Formadores”, organizado pela Comunidade Remidos no

Senhor, em Campina Grande/PB, com o objetivo de formar as lideranças das CNVA do

Nordeste, especificamente da região chamada pela CNBB de “Regional Nordeste2”, formada

pelos Estados da Paraíba, do Rio Grande do Norte, de Pernambuco e de Alagoas.

Essa é a primeira versão da “Escola de Formadores” organizada pela Comunidade

Remidos no Senhor, da qual participam líderes (formadores e fundadores) das CNVA. A

Escola é dividida em 8 módulos, de 05 dias completos, cada um, sendo oferecido um módulo

por semestre. Serão descritos dois módulos dessa escola, buscando obter uma visão dos

principais objetivos do grupo e da maneira como as atividades e práticas são direcionadas.

Essas Escolas de Formadores também são uma oportunidade para os líderes trocarem

experiências e definirem direcionamentos para a CNVA que fazem parte. A escolha por esse

local de pesquisa nos permitiu traçar um panorama geral da atual formação e características

gerais das CNVA, em parte do Nordeste brasileiro.

O questionário aplicado entre os participantes do módulo II da Escola de Formadores,

em novembro de 2007, abordou questões referentes ao perfil pessoal dos líderes das CNVA e

ao processo comunitário de fundação da comunidade, com seus vários desdobramentos2.

No geral, buscamos responder aos seguintes questionamentos:

1) Quais os fatores internos (subjetivos) e externos (oriundos da sociedade) que

influenciam o surgimento e manutenção das CNVA?

2) Como foram/são vivenciados os primeiros tempos de vida comunitária pelas

pessoas que dele participaram/participam – processo de fundação?

3) Como se desenvolve, em geral, o processo de formação das CNVA?

A estrutura da presente dissertação é a seguinte:

No capítulo I, será feita uma reflexão teórica a partir de autores clássicos e

contemporâneos da sociologia e da antropologia que abordaram os temas da religião, das

2 Ver modelo do questionário no Apêndice A.

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comunidades e da sociedade, buscando caracterizar os valores e estruturas das comunidades

religiosas.

No capítulo II, serão pontuadas algumas formas de vida comunitária cristã ao longo da

história, iniciando com as características gerais das primeiras comunidades cristãs, até o

surgimento das CNVA. Destaca-se a origem das CNVA, sua relação com a RCC,

especificidades, estruturas, espiritualidade, membros, relação com a hierarquia da Igreja e

com a sociedade.

No Capítulo III, apresentar-se-á o resultado da análise quantitativa e qualitativa da

pesquisa empírica realizada com líderes (formadores e fundadores) de CNVA dos Estados

supra citados, provenientes da aplicação de questionários e da observação participante nas

Escolas de Formadores, na tentativa de encontrar as reais características básicas dessas

Comunidades e como acontece seu processo de fundação, investigando e observando as

relações entre os líderes, os ideais, as formas de organização das CNVA, os temas escolhidos

para formação de seus líderes e membros, as opções de vida, os valores, as experiências

religiosas. Tudo isso nos conduzirá às considerações finais, relacionando as propostas das

CNVA com as teorias abordadas no Capítulo II, indicando possíveis desdobramentos para

posteriores pesquisas.

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1 RELIGIÃO, COMUNIDADE E PROCESSO COMUNITÁRIO

O tema da religião é estudado em todas as culturas, visto que está presente em

qualquer sociedade humana de que se tem notícia, influenciando a forma de se perceber os

ambientes desse mundo e de reagir a eles, dando um sentido à vida (GIDDENS, 2005). Os

assuntos que sobrevivem no cerne da religião são a vida e a morte, o sentido e o propósito da

vida. Mesmo nas sociedades modernas, nas quais o pensamento racionalista tende a

prevalecer, a religião não desapareceu como alguns pensadores previram, ainda exercendo um

papel importante.

Segundo definição de Giddens (2005, p. 427): “As religiões envolvem um conjunto de

símbolos, que invocam sentimentos de reverência ou de temor, e estão ligadas a rituais ou

cerimoniais dos quais participa uma comunidade de fiéis.”

As três religiões monoteístas consideradas por vários estudiosos as mais influentes da

história mundial são o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. O cristianismo é a religião que

domina um número maior de adeptos na atualidade, cerca de um bilhão de pessoas se dizem

cristãos, havendo, entretanto, divergências em termos de teologia e de organização

eclesiástica, ramificando-se em catolicismo romano, protestantismo, ortodoxia oriental, etc.

Cristão é aquele que segue o Cristo – em grego o “ungido”, na pessoa de Jesus, um judeu

ortodoxo que, aparentemente, não quis formar uma nova religião. Após a sua morte, seus

seguidores foram perseguidos como uma seita do judaísmo, mas a religião foi difundida na

Ásia Menor, Grécia e Roma, até que o imperador romano Constantino adotou a religião cristã

como oficial do império romano (GIDDENS, 2005).

1.1 Sociologia e estudo da religião

Os teóricos clássicos da sociologia que estudaram a religião, ou seja, Marx, Durkheim

e Weber, eram racionalistas, cientificistas e estavam preocupados em analisar, entre outras

coisas, como seria a religião na modernidade.

De acordo com o primeiro sociólogo citado, a religião representa a auto-alienação

humana, um refúgio encontrado para a dureza da nossa vida terrena.

Já Émile Durkheim concentrou seus estudos na religião de sociedades tradicionais de

pequena escala, relacionando-a com a natureza geral das instituições sociais e descrevendo-a

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em termos de uma distinção entre sagrado e profano. A religião, sendo uma expressão

coletiva, adéqua os indivíduos a ela, havendo uma influência da coletividade sobre o

individual, quando o objeto do culto, na religião, expresso pelo “totem”, na verdade, é a

própria sociedade. Assim como Marx, Durkheim disse que a religião tradicional, que envolve

deuses e forças divinas, desapareceria. Portanto, para sustentar os valores da sociedade, novas

atividades cerimoniais substituiriam as antigas.

Max Weber, em meados do séc. XX, iniciou um estudo substancial sobre as religiões

no mundo inteiro, como o hinduísmo, o budismo, o taoísmo, o antigo judaísmo e o

cristianismo. Weber estuda como a religião está relacionada com as transformações sociais,

por exemplo, a influência do protestantismo na visão capitalista do Ocidente moderno. Já as

religiões orientais ofereciam barreiras para o desenvolvimento do capitalismo industrial da

forma como ocorreu no ocidente. (GIDDENS, 2005).

Os estudos de Weber sobre a religião estão direcionados, entre outros aspectos, pela

noção de carisma, entendido como (Weber apud Filoramo, 2003, p. 105):

uma qualidade considerada extraordinária (...) que é atribuída a uma pessoa. Por isso, esta é considerada como dotada de forças e propriedades sobrenaturais ou sobre-humanas, ou pelo menos excepcionais de modo específico, não acessíveis aos outros, ou como enviada de Deus, ou como revestida de um valor exemplar e, conseqüentemente, como condutora.

Diferindo de Durkheim, Weber acredita que há uma força individual no fenômeno

religioso, não dissolvida na coletividade, mas autônoma e ativa, com poder de escolha e

decisão.

Este teórico identifica ainda a relação entre religião e sociedade sob o aspecto daquela

nesta. A religião, através de suas respostas a significados últimos, influi na sociedade em

relação a aspectos extremamente práticos e materiais, como a economia e suas leis,

interagindo com outras dimensões da vida em sociedade. O diferencial da religião seria

porque ela almeja dar uma visão totalizante e exaustiva do mundo. Para Weber, a era moderna

trouxe o desencantamento do mundo, por causa da exacerbada importância dada à razão e aos

meios técnicos, tendo chegado ao fim a era da história transcorrida sob o signo religioso

(FILORAMO, 2003).

O historiador e sociólogo do cristianismo, E. Troeltsch aprofundou dois conceitos

importantes para os estudos da religião, o de igreja e o de seita. No primeiro existe um

compromisso social por tratar-se de uma instituição em que as pessoas geralmente já nascem

dela participando, enquanto que no segundo conceito não há esse compromisso social e se

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refere a uma separação polêmica e opcional da igreja, além disso, produz em seus adeptos um

sentimento de regeneração espiritual (FILORAMO: 2003)

Jean Séguy, estudioso francês na área de história e sociologia, aprofundando os

estudos de Troeltsch a partir da distinção entre seita e Igreja e fazendo referência a Weber,

pesquisou os movimentos religiosos surgidos com a expansão da Reforma, sobre vários

aspectos, entre eles sobre ecumenismos interconfessionais (diálogo entre católicos,

protestantes e ortodoxos). Esses estudos levaram-no a perceber o caráter contestador presente

nos ecumenismos europeus e americanos, particularmente os pentecostais e os carismáticos.

Já indicando o tema desta pesquisa, as Comunidades Novas de Vida e Aliança,

surgidas da vertente carismática da Igreja Católica, tendo como líderes, em sua maioria, os

fiéis católicos leigos, vale transcrever a análise feita pelo estudioso francês (Séguy apud

Filoramo, 2003, p. 119):

O protesto implícito de que são portadores esses movimentos é particularmente evidente no âmbito católico: eles realizam de fato a fusão entre os estratos (sacerdotes e leigos), que o catolicismo por definição separa e coloca em planos distintos. Os leigos passam a ser protagonistas e, no caso dos carismáticos, alcançam o contato com o Espírito Santo sem nenhuma mediação institucional: o carisma pessoal, e não o de ofício, é que determina a constituição da liderança (grifos nossos)

E ainda, trazendo outra contribuição de Séguy no que se refere aos estudos sobre as

ordens monásticas, que serão tratadas mais adiante, tem-se que ordens monásticas seriam

portadoras de duas instâncias (segundo o modelo weberiano), aparentemente contraditórias:

uma carismática, na qual existiria uma tendência inovadora e de apelo à pureza das origens, e

outra institucional, pela necessidade de enquadrar-se na Ecclesia. O historiador propõe as

linhas de uma sociologia das formações monásticas, pesquisando várias ordens religiosas e

seus fundadores, entre os séculos XVI e XIX. (FILORAMO, 2003)

Outro conhecido estudioso da sociologia da religião é o alemão Thomas Luckman, que

se dirige a uma explicação da “progressiva marginalização social da religião de Igreja e a

emergência de uma religiosidade interior, invisível, que melhor satisfaz às exigências

espirituais do homem secularizado” (ibid, p. 125). Esse estudioso aponta a tensão entre Igreja

e leigos, já percebido por Troeltsch, mas fala de uma crise no caráter normativo da religião de

Igreja e do processo de secularização, que Luckman entende, sobretudo, como retrocesso da

religião oficial em relação aos papéis tradicionalmente exercidos, passando a religião para a

esfera privada.

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Por outro lado, o sociólogo inglês Brian Wilson, docente em Oxford, ocupou-se “do

fenômeno sectário contemporâneo, dos movimentos profético-messiânicos do Terceiro

Mundo e da relação entre secularização e novos movimentos religiosos” (ibid, p. 128). Na

análise de seita, ele também parte da definição troeltschiana de seita, dizendo que Troeltsch se

referia aos movimentos heréticos da Idade Média ou a ramificações da Reforma Protestante,

enquanto as seitas contemporâneas não teriam mais as características por ele apresentadas.

Para Wilson, as características das seitas modernas baseiam-se em elas serem, ao mesmo

tempo, radicais e conservadoras (Wilson apud Filoramo, 2003, p. 129):

É característico das seitas emergentes no seio de uma cultura tradicional o fato de elas serem ao mesmo tempo radicais e conservadoras. São radicais no desafio que dirigem à autoridade religiosa constituída: rejeitam os procedimentos e as atividades da Igreja dominante, considerando-os não-válidos ou até mesmo errados; dissociam-se sob muitos aspectos, da cultura secular; pelo menos, condenam aquelas leis do Estado que, para eles, contrariam as exigências colocadas pela religião verdadeira. Por outro lado, são conservadoras, porque procuram reafirmar preceitos morais e religiosos que consideram negligenciados pela tradição dominante ou tentam reavivar aqueles que têm como representações religiosas legítimas, ou reutilizar um primitivo modelo organizativo que crêem divinamente legitimado.

Peter L. Berger (1985, p. 145) faz uma análise da religião na modernidade, falando

sobre uma predominância da religiosidade privada:

(...) a religião manifesta-se em sua forma tipicamente moderna, a saber, como um complexo legitimante voluntariamente adotado por uma clientela não-coagida. Como tal, localiza-se na esfera privada da vida social cotidiana e está marcada pelas características típicas dessa esfera na sociedade moderna. Uma dessas características essenciais é a da ‘individualização’. Isso significa que a religião privatizada é assunto de ‘escolha’ ou ‘preferência’ do indivíduo ou do núcleo familiar, ipso facto carecendo de obrigatoriedade.

Como para Berger a religião na modernidade se insere na esfera privada, ela perde a

sua força social, na medida em que os valores religiosos aí adotados, muitas vezes, não são

levados para os setores secularizados da sociedade. Essa perda do caráter coletivo é

provocada pela secularização que, por sua vez, indica o fim do monopólio das instituições

religiosas e produz o pluralismo religioso, entendido como diferentes grupos religiosos

tolerados pelo Estado e mantendo competição entre si (BERGER, 1985).

O supracitado autor também aponta a coincidência do processo de secularização com a

“era do laicato”, inclusive no catolicismo, tendo os leigos um caráter de consumidores. Além

disso, o pluralismo religioso também engendrou a “redescoberta das heranças confessionais”,

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ou seja, cada denominação religiosa procura reforçar a sua identidade, pela necessidade de se

diferenciar de uma padronização global, que, para Berger, parte “do próprio processo de

racionalização da concorrência” (ibid, 1985, p. 159). No entanto, essa diferenciação é apenas

superficial, inclusive variando de acordo com a necessidade dos consumidores.

Na atualidade, há uma discussão teórica sobre a autonomia do campo religioso.

Filoramo (2003), por exemplo, chega à conclusão de que se deve trabalhar com um conceito

de religião capaz de levar em conta tanto os seus aspectos funcionais, devendo a religião ser

explicada, quanto os aspectos específicos, levando em consideração as “individualidades

religiosas com sua particular lógica e estrutura, além de determinados contextos histórico-

sociais” (FILORAMO, 2003, p. 20). Ou seja, a religião precisa ser estudada tanto em seus

aspectos internos como nos externos, impostos pelo ambiente.

1.2 Comunidade e sociedade

De um modo ou de outro, a religião tem-se expressado no seio da sociedade e em

comunidade. Até mesmo a experiência religiosa pessoal tem conseqüências comunitárias.

No tema desta pesquisa, procurou-se aproximar as concepções de religião e vida em

comunidade. Como será detalhado no capítulo III, esse panorama conceitual aplica-se e pode

ajudar a problematizar a discussão sobre as Comunidades Novas de Vida e Aliança, tendo em

vista que o objetivo geral do presente estudo é identificar o processo de formação e

permanência dessas comunidades, se caminham para a institucionalização ou permanecem

fora dela a partir de depoimentos das lideranças.

Na discussão teórica, utiliza-se os ensinamentos de Ferdinand Tönnies (1855-1936),

reconhecido pioneiro da sociologia, cuja obra teve grande impacto sobre o estudo sociológico

e antropológico das “comunidades”. Para Tönnies, a comunidade seria o estado ideal dos

grupos humanos, e a sociedade seria a sua corrupção, conceitos aprofundados em sua famosa

obra Gemeinschaft Ud Gesselschaft, 1887 (Comunidade e Sociedade).

Outro teórico clássico que aprofundou o conceito de comunidade foi Victor Turner

(1920-1983), antropólogo anglo-americano, que trouxe uma contribuição no estudo do ritual

na vida em sociedade, especificamente em seu livro The Ritual Process – Structure anda

Anti-Structure, 1974 (O Processo Ritual – Estrutura e Anti-Estrutura) Os conceitos de

Communitas e liminaridade desenvolvidos por este autor irão nortear a análise da vida

comunitária nas Novas Comunidades de Vida e Aliança.

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Valiosos também serão os estudos de Francesco Alberoni (1929), popular sociólogo

italiano, na sua obra GENESI (título original – 1989), em português, Gênese – Como se criam

os mitos, os valores e as instituições da civilização ocidental (1991). Nessa obra, o autor

analisa os movimentos sociais em seus vários aspectos. Daí, foram retiradas as concepções de

estado nascente, experiência fundamental, entre outros, buscando aplicá-los ao processo

comunitário vivenciado pelas Comunidades Novas de Vida e Aliança.

Os estudos desse sociólogo contemporâneo, pesquisador dos movimentos coletivos e

dos sentimentos humanos, professor de Sociologia da Universidade de Milão, muito

contribuirão para uma análise do processo comunitário nas comunidades pesquisadas, visto

que a vivência das Novas Comunidades de Vida e Aliança são experiências de fundações

recentes (1978-), estando algumas (as mais antigas) em processo inicial de

institucionalização.

Todos os autores citados abordam estudos sobre os grupos humanos e as maneiras

como se relacionam. Suas as abordagens auxiliaram o estudo do processo comunitário

vivenciado pelas CNVA (Comunidades Novas de Vida e Aliança). De Tönnies,

especificamente, foi extraída a concepção de comunidade, pela influência que tem sobre os

teóricos do assunto até os dias de hoje. O seu conceito de comunidade não é de todo

abandonado por Turner, mas este a aborda em um sentido processual e relacional com a

sociedade. De certo modo, Turner não contradiz, mas complementa a comunidade de Tönnies.

Já Alberoni, apesar de não utilizar o termo comunidade, ao estudar a dinâmica dos

movimentos sociais, aproxima-se bastante da visão de Turner sobre o processo social de

estrutura e anti-estrutura (societas e communitas).

Ferdinand Tönnies apresenta os conceitos de comunidade e sociedade a partir de uma

diferenciação entre ambos. Partindo das vontades humanas, o autor verifica que, quando as

vontades humanas mantém entre si relações recíprocas, formam uma associação. Essa

associação, por sua vez, quando se caracteriza por uma “vida real e orgânica”, duradoura, é

denomina comunidade, e quando apresenta uma estrutura mecânica, pública, passageira, o

próprio mundo, trata-se da sociedade (TÖNNIES, 1995).

Esses conceitos serão usados: primeiro, para verificar se as características de

comunidade apontadas por Tönnies estão presentes nas Comunidades aqui estudadas;

segundo, para analisar a relação dessas Comunidades com a sociedade.

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Essa diferença entre sociedade e comunidade é destacada por vários autores que

estudam o pioneiro da sociologia. Assim se expressa Orlando de Miranda sobre a distinção

feita por Tönnies (MIRANDA, 1995, p. 65):

O que caracteriza o tipo-comunidade é a expressão da igualdade e o vigor dos fenômenos e valores identitários. (...) Na sociedade, para cuja descrição a referência histórica é a troca (que implica a alteridade como princípio) e o desenvolvimento histórico capitalista, os valores reforçam as diferenças, acentuam a individualidade e isolam o ‘indivíduo’ (...) Em razão disso, enquanto na comunidade-tipo a identidade dimensiona-se e se realiza, reunindo na mesma unidade um certo número de seres (...), na sociedade-tipo, a ‘natureza’ identitária constitui apenas uma abstração. (grifos nossos)

Discorrendo sobre o ser social, o pensamento de Ferdinand Tönnies é colocado por

Orlando Miranda no seguinte sentido (TÖNNIES, 1995, p. 69):

A negação do ser social, isto é, a sociedade, transfere a condição de ser para o agente individuado. Todavia, este, que não pode realizar-se na comunidade (que é, plenamente, sua negação), não pode também prescindir das ligações comunitárias, necessárias à construção da identidade concreta. Abdicando dessas, para se entender como plenamente “individualizado”, reduz-se a uma abstração por se encontrar desprovido de qualquer dimensão cognoscível.

Ou seja, para Tönnies, como ser social, o homem só encontra a si mesmo,

concretamente, quando faz parte de uma comunidade, pois nela há uma ligação muito estreita

entre os membros, que estão juntos em todas as situações, boas ou não, essas relações intensas

de verdadeira convivência não é encontrada na sociedade, na qual o indivíduo chega como um

estranho, apesar de poder estar em companhia de alguém, não havendo uma troca de vida. Um

exemplo de comunidade seria a relação de convivência entre marido e mulher (ibid, 1995)

Nos grupos humanos que se agregam em comunidade, em suas formas emergentes e

embrionárias, segundo Tönnies, existe uma unidade completa das vontades humanas, de uma

forma natural3, como, por exemplo: (a) na relação entre mãe e filho, que é a mais profunda,

“fundada no instinto e no prazer”; (b) na relação entre homem e mulher, sustentada não pelo

instinto sexual, mas pelo hábito de vida em comum, que configura “um acordo mútuo de

afirmação recíproca” e (c) na relação entre irmãos e irmãs nascidos da mesma mãe, essa

relação de fortalece a partir da memória, não do instinto, daí seu caráter mais humano (ibid, p.

235). Já a sociedade, é formada por vontades humanas ditas arbitrárias, porque não parte de

3 A vontade natural, para Tönnies, são unidades biológicas motivada por instintos de origem orgânica, como nutrição, auto-preservação e reprodução, cf. MIRANDA, 1995.

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um determinante natural e orgânico, mas da racionalidade humana, de suas representações

ideais e artificiais sobre o mundo ao seu redor.

Por outro lado, o capítulo sobre Liminaridade e Communitas, no livro “O Processo

Ritual – estrutura e anti-estrutura”, de Victor Turner, trata do rito de passagem. Arnold van

Gennep (1960, apud Turner, 1974), define-os como “ritos que acompanham toda mudança de

lugar, estado, posição social, de idade”.

Turner retoma a oposição conceitual de Tönnies entre comunidade e sociedade com os

termos latinos communitas e societas, no sentido de uma análise da sociedade enquanto

processo ritual, feita por mecanismos de homogeneização e diferenciação, dinamizados por

passagens de uma situação para outra.

Seria a estrutura (societas) e anti-estrutura (communitas), que estão em contínuo

relacionamento e movimento, originando as instituições e os problemas culturais (TURNER,

1974). Ou seja, Turner estuda as comunidades humanas como processo e, portanto, busca

entender como elas se originam e como se formam.

Explicando melhor o que seja communitas para Victor Turner, pode-se dizer que ele

separou as relações entre as pessoas em dois modelos, um é a sociedade, um “sistema

estruturado”, que separa, divide e hierarquiza, outro é a “sociedade considerada como um

comitatus não-estruturado” , uma comunidade que surge de forma clara no estado de

liminaridade, que não estava em um local determinado, que estão em transição. Para Turner,

trata-se de “reconhecer um laço humano essencial e genérico, sem o qual não poderia haver

sociedade” (ibid, p. 119).

Na Communitas, há uma forma de poder diferente, onde os fracos detêm o poder. Os

exemplos apresentados por Turner são: pequenas nações que mantêm poderes, valores

religiosos e morais, como “os hebreus no antigo Oriente Próximo, os irlandeses na primitiva

cristandade medieval e os suíços na Europa moderna”(ibid, p. 134); bobos da corte, que

“representam os pobres e os deformados, simbolizando os valores morais da “communitas”

contrapondo-se ao poder coercitivo dos dirigentes políticos supremos” (ibid, p. 134/135) e nos

filmes de faroeste, o misterioso “estranho sem lar, sem riqueza ou nome, e que restaura o

equilíbrio legal e ético num grupo local.” (ibid, p.135)

As características comuns das pessoas e grupos que formam a communitas situam-se

nos interstícios da estrutura social, estão à margem dela, ocupam os degraus mais baixos.

A communitas, entretanto, só pode ser apreendida por suas relações com a estrutura.

Nesse sentido, a estrutura (societas) também é importante, ambas fazendo parte da vida em

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sociedade. Ela irrompe “nos interstícios da estrutura, na liminaridade; nas bordas da estrutura,

na marginalidade; e por baixo da estrutura, na inferioridade.” (ibid, p. 156), por sua vez, essas

são condições que geralmente geram “os mitos, símbolos rituais, sistemas filosóficos e obras

de arte”. (ibid, p.156)

Há uma relação dialética entre a communitas e a estrutura social, ou seja, as pessoas

que se encontram numa ou noutra estrutura estão em constante relação, inclusive de

dependência, havendo uma coexistência permanente e necessária entre esses dois princípios

de constituição social: communitas/societas. Por exemplo, nos ritos de passagem, envolve

algo como um renascimento: primeiro a pessoa se distancia da estrutura social (societas),

como se não mais existisse na posição ocupada na sociedade, passando por um processo de

transição, no qual é trabalhada a igualdade e a humildade (na communitas); depois, ela volta a

ser integrada na estrutura social (societas), agora ocupando uma nova posição, como se

renascesse.

Entretanto, o equilíbrio entre communitas e sociedade deve ser mantido, pois o

exagero em uma ou outra provoca uma patologia. “A maximização da communitas provoca a

maximização da estrutura, a qual por sua vez produz esforços revolucionários pela renovação

da communitas.” (ibid, p.157)

Vejamos no quadro n° 1 as características e os valores da comunidade (communitas)

para Tönnies e para Victor Turner:

Características da comunidade Valores da Comunidade Vida real e orgânica Identidade Duradoura Afetividade pessoal Ligação estreita entre os membros

(associações com a terra e laços de lugar, de amizade, de sentimentos partilhados e crenças comuns)

Partilha

Unidade de vontades Aproximação entre os membros

Tönnies

Laços de sangue e de Parentesco

Tradição

Homogeneização Igualdade Laço humano essencial Humildade Os fracos detêm o poder Ausência de “status”

Turner

Transitoriedade Quadro 1 – Características e valores da Comunidade São notáveis as semelhanças e divergências entre a concepção de comunidade para os

dois autores. Algumas semelhanças a se destacar são: a unidade de vontades, os laços

afetivos, a aproximação entre os membros (Tönnies) e a homogeneização, a ausência de

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“status” e os laços humanos (Turner); a diferença mais marcante seria que, enquanto Tönnies

percebe a comunidade como algo duradouro, Turner a vê como algo transitório.

Segundo Alberoni, os grupos e a sociedade se formam a partir de uma experiência

fundante, sempre presente no estado nascente, que seria “uma descontinuidade social

provocada por uma experiência de morte e renascimento em nível individual.” (1991, p. 37)

O indivíduo no estado nascente parece estar vivendo de maneira diferente de tudo que

já viveu até então, com uma grande esperança no futuro, em uma existência maravilhosa e

intensa. Quando vários indivíduos acreditam nesse novo recomeçar, com relação a toda

sociedade, acabará ocorrendo uma verdadeira transformação social com uma descontinuidade.

(ibid)

Neste estudo, quando se fala de estado nascente, busca-se aprofundar a experiência

fundante das novas comunidades carismáticas, percebendo como se deu o início desse

movimento.

Ademais, o presente trabalho traz um paralelo entre a noção de estado nascente e de

communitas, posto que tanto Turner (communitas) como Alberoni (estado nascente), apesar

de teorizar esses processos com expressões diferenciadas (Turner não utiliza a expressão

movimentos sociais, enquanto Alberoni teoriza sobre elas), nas suas análises, são encontradas

características semelhantes, como, por exemplo: o estado de transição, de descontinuidade, de

transformação, de rebaixamento, a orientação para a mudança. No estudo dos movimentos

sociais de Alberoni, especificamente no estado nascente, também encontramos presentes os

valores da comunidade de Tönnies, ou seja, a igualdade, a humanidade, a aproximação entre

os membros.

Victor Turner relaciona a noção de liminaridade com a communitas. A liminaridade é

a condição de pessoas que não estão posicionadas em uma classificação específica num

espaço cultural, sendo suas características ambíguas e indeterminadas, são pessoas que estão

transitando. Por isso, freqüentemente a liminaridade é comparada à morte, ao estar no útero,

na escuridão, na invisibilidade.

As pessoas ou entidades que estão vivendo em estado de liminaridade não possuem

um “status” definido, “propriedades, insígnias, roupa mundana indicativa de classe ou papel

social, posição em um sistema de parentesco, em suma, nada que a possa distinguir de seus

colegas neófitos ou em processo de iniciação”. (TURNER, 1974, p. 117/118). O autor afirma

que nas iniciações e ritos de passagem há muitos símbolos liminares. Os rituais de passagem

levam o indivíduo a distanciar-se de sua posição social.

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O estado de liminaridade (transição) é aprofundado em relação ao neófito, que “deve

ser uma tabula rasa, uma lousa em branco, na qual se inscreve o conhecimento e a sabedoria

do grupo, nos aspectos pertinentes ao “status”.” (ibid, p. 127), ou seja, aquele que é admitido

em um grupo deve despir-se de tudo o que trazia consigo até então, para incorporar a maneira

de vida do grupo a que adere.

O referido antropólogo enumera uma longa lista das características da liminaridade,

opondo-as ao sistema de posições sociais, foram enumeradas algumas, que chamaram a

atenção de plano, pois têm relação com o problema pesquisado neste trabalho. São elas:

transição, totalidade, homogeneidade, “communitas”, ausência de propriedade, nudez ou

uniformidade de vestuário, humildade, descuido com a aparência pessoal, obediência total,

sacralidade, silêncio, referência contínua aos poderes místicos, insensatez, simplicidade,

aceitação de dores e sofrimentos.

Turner afirma que muitos desses traços aparecem nas ordens religiosas cristãs, mas

que também a institucionalização da liminaridade aconteceu de forma marcante nos estados

monásticos e mendicantes, das grandes religiões mundiais. Significa dizer que a communitas

nasce fora da estrutura, mas pode incorporar-se a ela através de uma institucionalização.

Uma das características do estado de liminaridade apresentada pelas ordens religiosas

é o nivelamento: quando um neófito chega para entrar na vida monástica, ele é convidado a

despir-se de tudo o que vivia na vida anterior, também de roupas e bens, além do “status”

social e de abandonar até seus antigos nomes.

Há um receio, por parte de quem quer manter a estrutura, de que as manifestações do

estado de liminaridade apareçam na estrutura. Por isso, taxam-nas de “perigosas e anárquicas,

e precisam ser rodeadas por prescrições, proibições e condições”. (ibid, p. 133).

Aqui se percebe, mais uma vez, a aproximação entre os conceitos de estado nascente

de Alberoni, com o de liminaridade, de Turner. A liminaridade seria uma condição que é

exteriorizada pela marginalidade ou situação de estar fora da sociedade ou contexto

abrangente enquanto o estado nascente seria uma condição psicológica, um estado de espírito

ou uma condição interior.

Com o tempo, a communitas se transforma em relações de estrutura, com suas normas.

Há, pois, que se considerarem alguns tipos de communitas: a communitas existencial ou

espontânea (busca uma experiência transformadora, além da amizade, que “vai até as raízes

do ser de cada pessoa, e encontra nessas raízes algo profundamente comunal e compartilhado.

(ibid, p. 169)”, sendo uma fase, um momento, não uma condição permanente; a communitas

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normativa (quando a communitas existencial passa a organizar-se em um sistema de normas)

e a communitas ideológica (modelos utópicos de sociedade, baseados na communitas

existencial).

Procurou-se enquadrar nessa classificação de comunidades feita por Turner as

comunidades estudadas nesta dissertação (Comunidades Novas de Vida e Aliança). De acordo

com as pesquisas realizadas, pode-se dizer que essas comunidades podem se enquadrar ora

em um, ora em outro tipo de communitas, dependendo do estágio em que se encontre no

processo de institucionalização.

Ou seja, existem Comunidades onde há com nitidez a presença da communitas

espontânea, aquelas que estão iniciando a sua fundação; outras que estão na communitas

normativa, porque sentem a necessidade, e também são pressionadas pela Igreja, a

normatizar-se; e, por fim, há aquelas com as características da communitas ideológica, pois

não passaram pela experiência da communitas espontânea, mas querem nela basear-se para

estruturar esse modelo utópico de comunidade, como enfatiza Turner (1974, p. 171):

É essencial que se distinga entre os modelos ideais de communitas apresentados na literatura ou proclamados pelos fundadores de movimentos ou de efetivas comunidades, e o processo social resultante das tentativas entusiásticas do fundador e de seus discípulos de viverem de acordo com esses modelos.

Ao longo do tempo os fundadores acabam percebendo o que difere a communitas que

foi por ele idealizada e a que realmente existe, ou seja, entre a communitas espontânea e a

communitas normativa.

A Comunidade idealizada por São Francisco é apresentada por Turner como um

modelo clássico de tentativa do fundador de viver de acordo com o modelo de Comunidade

original. O estudo da ordem Franciscana revela um paradigma processual do destino da

“communitas” espontânea.

Segundo este autor, o modo de Francisco pensar revela uma pessoa que ama a

communitas existencial, pois é “com a relação direta entre um homem e outro, e entre o

homem e a natureza” (ibid, p.172). O sonho também é uma característica dos participantes de

communitas, tendo São Francisco tomado muitas decisões essenciais com base no simbolismo

dos sonhos.

Porém, São Francisco sentiu dificuldade em escrever uma constituição detalhada por

imposição dos frades, posto que a ordem estivesse crescendo bastante. Martin Burber, citado

por Turner, propõe uma forma para as comunidades que se reproduzem buscar conseguir uma

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coerência: “profundo tato espiritual dando formas à relação entre centralismo e

descentralização, e entre idéia e realidade, com a constante e infatigável pesagem e mediação

da exata proporção entre elas” (Burber apud Turner, ibid, p. 174).

O fundador da ordem franciscana também imaginava seus frades como pessoas em

liminares, em passagem para o céu, dando ênfase ao estar sem e ao não ter; também desejava

que seus frades cortassem inteiramente as amarras com o sistema comercial do mundo, com a

ausência literal de propriedade. Aí estava mais uma dificuldade com a estruturação da ordem,

pois, como diz Turner (ibid, p. 178), “a propriedade e a estrutura estão indissoluvelmente

intercaladas, e a constituição de unidades sociais duradouras incorpora ambas as dimensões,

bem como os valores centrais que legitimizam.” Assim, com o tempo, a simplicidade das

regras ditas por São Francisco tornou-se bem mais legalistas.

1.3 Processo comunitário

Por processo comunitário entenda-se as dinâmicas ocorridas no interior de um novo

movimento ou de uma comunidade nascente, a partir das relações entre os membros e desses

com a sociedade.

1.3.1 Os sujeitos do estado nascente

Quando se fala do indivíduo isolado vivendo um estado nascente, este aparece como

uma “conversão, transformação interior, metanóia, repentina e profunda renovação do próprio

modo de ser e de pensar devido a uma descoberta ou uma revelação religiosa, filosófica,

artística, política ou amorosa” (ALBERONI, 1991, p. 39).

É possível fazer uma distinção clara entre a idéia de estado nascente e de liminaridade.

Os sujeitos do estado nascente aparecem quando as estruturas não mais satisfazem e o

cotidiano não dá mais resposta. Nesse momento, ou se cai na desesperança e nenhuma reação

acontece, ou sobressai-se dentro das pessoas uma poderosa “vontade de viver, de existir”

(ibid, p.69). Podem ser citados como alguns exemplos de pessoas que viveram a experiência

do estado nascente em geral, precisaram superar uma situação difícil ou trazem em si um forte

sentimento de ordem, de regra, de instituição: Buda, Cristo, Paulo de Tarso, Lutero, Lenin.

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1.3.2 O Contexto externo de surgimento

A forma ou o momento como é desencadeado o estado nascente depende de várias

condições, não é algo intencional, mas pode ser provocado, como todo fenômeno espontâneo

(ibid,p. 45).

O supramencionado autor fala ainda de precondições estruturais para o surgimento do

estado nascente, uma tensão entre ordem e desordem, entre algo que era e já não pode voltar a

ser, é necessário fazer-se um novo. “Surgem novas possibilidades de ação, enquanto as velhas

são desacreditadas”. (ibid, p. 67).

1.3.3 A experiência fundamental

Experiência fundamental são as principais características em geral presentes no estado

nascente, quais sejam: (a) a experiência de libertação, (b) o renascer, (c) o transcender, (d) a

historicização, (e) a liberdade e o destino, (f) o dilema ético, (g) a unanimidade, (h) a

fraternidade, (i) o comunismo, (j) o sistema externo.

a) A experiência de libertação está presente no estado nascente “porque são abatidas

proibições, regras, repressões que já se tornaram pesadas ou intoleráveis” (ibid, p. 91).

Segundo o autor, o termo libertação indica uma manifestação da verdade, uma clareza das

coisas.

b) O renascer indica que algo desmoronou e algo novo está se iniciando. “O tema do

homem novo está presente no cristianismo primitivo, volta a aparecer a cada explosão

religiosa cristã” (ibid, p. 93).

c) A historicização se refere a não desprezar o passado, mas fazer um futuro novo a

partir desse passado. Essa é uma característica do estado nascente porque só aí há uma

disposição para olhar o passado com olhos de quem deseja mudar o rumo da vida partir de

então.

d) A liberdade e o destino se apresentam como a capacidade existente no estado

nascente de ser livre para direcionar a própria vida de forma diferente do que normalmente as

pessoas o fazem. Nesse aspecto, há uma relação estreita da procura da liberdade com a

procura de Deus, Alberoni afirma que “O ser humano só é livre se buscar o unum, verum et

bonum, se buscar Deus”. (ibid, p. 108)

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e) O dilema ético é conflito interior presente no estado nascente porque, apesar de

vislumbrar uma realidade transcendente, o estado nascente está no mundo, e o mundo tem

suas leis e contradições.

A experiência de transcendência, ou metafísica, precisa ser vivida pelos sujeitos do

estado nascente. O normal da vida diária é estarmos com os pés bem firmados na realidade, e

parece que não se pode mudar nada. No estado nascente têm-se a impressão de que tudo

poderia ser diferente. “Análoga é a experiência do reformador religioso que compreende,

compreende até o fundo da alma, que a ordem edificada pela Igreja não é a ordem de Deus”

(ibid, p. 95).

Um exemplo dado por Turner se refere, como exposto anteriormente, à ordem

franciscana, quando seu fundador pretende uma comunidade idealizada em seus objetivos e

vivências e encontra os obstáculos da necessidade de organizar-se.

Esse dilema ético provoca uma divisão interior “O renascido é também o dilacerado, o

dividido” (ibid, p. 113). Victor Turner também fala de um renascimento do homem no

processo ritual, com a necessidade de sair da estrutura, ficando na liminaridade, para poder a

ela retornar após um renascimento (TURNER, 1974, p. 117-119)

f) A unanimidade é também algo presente, de forma espontânea, nos grupos que

vivenciam o estado nascente. “Os grupos no estado nascente estão sempre prontos a assimilar

experiências novas. O próprio fato de ver-se cercado de tanta gente, entretanto, provoca no

indivíduo um espontâneo moldar-se conforme as expectativas gerais”. (ALBERONI, 1991, p.

119).

Victor Turner também traz, entre as características da liminaridade, presente da

“communitas”, a uniformidade no vestir e no comportar-se, criando um intenso sentimento de

igualdade entre os iniciados, desaparecendo ou homogeneizando as distinções de classe

(TURNER, 1974, p. 118).

g) A fraternidade existe de forma calorosa em um grupo no estado nascente, porque há

um forte sentimento de participação. O grupo é aberto a outros membros, sem maiores

condições. “Para compreendermos se um processo está no estado nascente ou se é uma

instituição, muitas vezes basta observar como acontece a admissão no grupo.” (ALBERONI,

1991, p. 121).

h) O comunismo também é realidade no estado nascente, a experiência de se colocar

tudo em comum. “O estado nascente nada pede, consegue tudo de que necessita. Depois a

instituição se consolida e impõe a renúncia.” (ibid, p. 130)

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i) E, finalmente, o sistema externo é representado por todos aqueles que não estão

vivendo a experiência do estado nascente. “Quem está no sistema externo não percebe que o

estado nascente é uma busca, uma exploração do possível.” (ibid, p. 133/134).

Nesse sentido, E. Troeltsch já aprofundava a relação entre seita e igreja, no sentido de

seita como movimento religioso que se confronta com a Igreja. A seita seria uma opção de

separação da instituição Igreja. A partir dessa distinção, muitos estudos foram feitos, por

exemplo, dos vários movimentos ocorridos no cristianismo através dos tempos.

(FILORAMO, 2003).

1.4 Panorama sócio-cultural atual e a idéia de comunidade

O projeto de modernidade entrou em foco durante o século XVIII, conforme expõe

Habermas4 (Harbemas, apud Harvey, 1994, p. 23).

Esse projeto equivalia a um extraordinário esforço intelectual dos pensadores iluministas ‘para desenvolver a ciência objetiva, a moralidade e a lei universais (...). Os escritores iluministas estavam possuídos da idéia de que “as artes e as ciências iriam promover não somente o controle das forças naturais como também a compreensão do mundo e do eu, o progresso moral, a justiça das instituições e até a felicidade dos seres humanos.

O século XX afastou esse otimismo, diante das guerras mundiais, do militarismo, das

ameaças de aniquilação nuclear. Ao contrário, foi alegado que, por trás da lógica de

racionalidade do iluminismo, há uma lógica de dominação e de opressão. Já no início do

século XX, pensadores como Max Weber, alegava que “a esperança e a expectativa dos

pensadores iluministas era uma amarga e irônica ilusão” (Bernstein apud Harvey, 1994, p.

25).

Essas enormes mudanças vêm ocorrendo desde a década de 1970, especificamente no

modo de vivenciar o tempo e o espaço. A modernidade trouxe conseqüências históricas,

culturais, sociais, artísticas, como, por exemplo, o sentido do fugidio, do efêmero, do

fragmentário e do contingente (HARVEY, 1994), que dificulta o sentido de continuidade

histórica, assim, rompe com as condições históricas precedentes.

Para Zygmunt Bauman (2003), a idéia de comunidade remete a priori a algo “bom”.

Essa idéia viria da mitologia grega ou da Bíblia, pois em ambos a noção de paraíso está

relacionada ao conceito de inocência, de pertencimento a um grupo sem interesses

4 Jüerger Habermas, filósofo e sociólogo alemão da atualidade.

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individualistas. Temos guardada em nossa memória essa idéia nostálgica de paraíso perdido,

de uma comunidade que fazia-nos sentir dentro do ninho, confortáveis e seguros.

Paradoxalmente, existe ainda para o autor, uma tensão entre essa utópica e almejada

segurança e a idéia de liberdade, na medida em que a vivência em comunidade significa a

perda da liberdade individual.

Na realidade atual, para Bauman, a comunidade estaria em baixa, o que se vê são

necessidades de agrupamentos em guetos, expressão extrema de negação do conceito de

comunidade. A formação de guetos vem como conseqüência das formas de exploração,

perpetuação e aprofundamento da divisão da sociedade em classes econômicas. De um lado,

temos alguns bem-sucedidos que não se importam com a idéia de comunidade, preferem o

isolamento, entendem que não ganhariam nada permanecendo na comunidade. Em linhas

gerais, os guetos se caracterizariam pelo confinamento espacial e fechamento social, tendo a

homogeneidade dos “de dentro” e a heterogeneidade dos “de fora”.

Analisando as relações humanas na pós-modernidade, Michel Maffesoli (1998)

apresenta como uma das características desse tempo a coletivização dos sentimentos. Mas

essa tendência à união, não significa que queremos transformar o mundo, mas contemplá-lo.

“A prevalência da estética, a perspectiva ecológica, a não-atividade política, as diferentes

formas do souci de soi e os diversos cultos do corpo são, na realidade, não importa o que

possam parecer, forma desta ‘contemplação’” (ibid, Prefácio ).

O referido autor fala do neotribalismo, para diferenciar que, ao contrário da

estabilidade induzida pelo tribalismo clássico, o “é caracterizado pela fluidez, as reuniões

pontuais e a dispersão.” (ibid, Prefácio) Trabalha ainda a seguinte reflexão: “O vaivém

constante que se estabelece entre a massificação crescente e o desenvolvimento dos

microgrupos que chamarei ‘tribos’.” (ibid, p. 8). Para ele, é a tensão fundadora da

sociabilidade do fim do século XX, pois sem a lógica da identidade, não são sujeitos de uma

história em marcha, no entanto, na metáfora da tribo o sociólogo pretende demonstrar o

processo de desindividualização, a saturação da função e a valorização do papel que cada

pessoa é chamada a representar dentro dela.

Relacionando com o gueto de Bauman, a noção de tribo trazida por Michel Maffesoli

é apresentada como resultante do processo de massificação com a formação de grupos,

caracterizados por reuniões pontuais, dispersão e fluidez, diferente daqueles, que se

caracterizam por um confinamento espacial e um fechamento social, sendo uma estrutura

fechada e não aberta, como as tribos.

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Para Maffesoli, o problema do individualismo está essencialmente presente na

Modernidade, na Pós-Modernidade, “a massa indefinida, o povo sem identidade ou o

tribalismo enquanto nebulosa de pequenas entidades locais, contrapõem-se ao

individualismo” (ibid, p. 14)

No referido livro “O tempo das tribos”, Maffesoli desenvolve as idéias de

“comunidade emocional”, “tribalismo” e “proxemia ”. A comunidade emocional surge a

partir da noção de persona, em voga nos tempos atuais e que só existe em relação com o

outro. As relações sociais são impulsionadas por sentimentos. Citando a concepção de

“comunidade emocional” para Max Weber, que demonstra sua existência em todas as

religiões, e, geralmente, à parte dos enrijecimentos institucionais, afirma que suas

características são: o aspecto efêmero, a composição cambiante, a inscrição local, a ausência

de uma organização e a estrutura quotidiana.

Também cita Durkheim, quando este fala da “natureza social dos sentimentos”,

simplesmente porque se procura a companhia “daqueles que pensam e que sentem como nós”

(Durkheim apud Maffesoli: 1998, p. 19). Remete-se ainda a Berguer, lembrando a

diferenciação que este faz do gregarismo para o grupismo, pois neste há uma preocupação dos

seus membros de reforçar aquilo que é comum a todos, devido ao processo de identificação

com o grupo.

Então, para Maffesoli, a comunidade se realiza no simples estar-junto, nos sentimentos

comuns. Enquanto a sociedade está voltada para a história futura, a comunidade se concentra

na própria criação, na repetição do ritual, que assegura a permanência do grupo. Há o

“momento tribal” que, comparado ao período de gestação, equivale a algo que está sendo

aperfeiçoado, provado, experimentado, “o vivido e a experiência partilhada podem ser o fogo

depurador do processo alquímico que permite a transmutação.” (MAFFESOLI, 1998, p. 30).

O costume (usos comuns), além da estética (sentir em comum) e da ética (o laço coletivo)

caracterizam a vida dos grupos contemporâneos.

O autor explica que a cultura de hoje é feita de pequenas coisas vividas no dia a dia,

que dão conta de uma sensibilidade coletiva, dos lugares de convivialidade, onde circula a

palavra, o alimento e a bebida, lembrando da mesa eucarística para os cristãos, que enfatiza a

união dos fiéis e a união com Deus ao redor de uma mesa. Maffesoli postula um

reencantamento do mundo que acontece principalmente na emoção ou na sensibilidade vivida

em comum.

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A socióloga francesa Danièle Hervieu-Léger, que fala da religião na sociedade atual

como uma rede de comunidades emocionais, diz que na contemporaneidade existe uma crise

institucional do religioso que ameaça a estrutura hierárquica da Igreja Católica, pelos

fenômenos correlatos da proliferação do “neocomunitarismo” dentro da própria Igreja e do

processo de individualização da fé (HERVIEU-LÉGER, 2005).

Já Carranza (2005 apud MAIA, 2008) coaduna com esse posicionamento, dizendo que

há uma processo de deinstitucionalização, ao tempo em que há uma tentativa de

retradicionalização, presente nas práticas da RCC. Enquanto Miranda (1999 Ibid) corrobora

essa reflexão, dizendo que há uma continuidade do catolicismo tradicional na RCC e nas

CNVA, porque reforçam a hierarquia da Igreja, ao tempo em que

separa os mundos (espiritual e social; dentro e fora da comunidade), legitima um sistema de valores, reproduzindo-o e transmitindo-o e, finalmente, vai construindo também uma visão alternativa de sociedade (MIRANDA, 1999, p. 65, Ibid).

Esses e outros autores têm estudado o fenômeno da religião atual e da comunidade,

produzindo definições diversas. Entretanto, passar-se-á a discorrer, no capítulo seguinte, sobre

algumas formas de comunidades cristãs, buscando modelos da antiguidade até os dias atuais,

para que seja possível se aproximar do tema desta pesquisa, que são as Comunidades Novas

de Vida e Aliança.

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2 COMUNIDADES CRISTÃS AO LONGO DA HISTÓRIA

Desde os primeiros séculos do Cristianismo surgiram comunidades religiosas nas

quais se reuniam os cristãos, seja para fortalecerem a sua fé, seja para melhor propagá-la. O

cristianismo cresceu e se desenvolveu dentro do quadro político-cultural do Império Romano.

Talvez influenciados pela cultura da época e local, os três primeiros séculos do

cristianismo se caracterizam por um estilo secular de vida. Nesses três séculos o Império

Romano perseguiu os cristãos, no século IV os cristãos conseguiram a liberdade religiosa

dentro do Império Romano, até o cristianismo se converter em religião oficial do Estado, no

tempo de Teodósio. Nessa época, a Igreja Católica deu início à organização de suas estruturas

territoriais.

2.1 Primeiras comunidades cristãs

A religião cristã, especificamente estudada nesta dissertação, em sua expressão

católica, tem uma forte tendência comunitária. Jesus de Nazaré, o Cristo, tem como o seu

mandamento maior “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”(Jo 15, 11). Depois de

Pentecostes (Atos dos Apóstolos, Capítulo 2), quando os apóstolos e Maria, reunidos em

oração, receberam o dom do Espírito Santo, em forma de línguas de fogo, expandem-se as

comunidades cristãs e a Igreja.

Os Atos dos Apóstolos e as cartas, chegadas até nós sob os nomes de S. Paulo e dos

apóstolos Tiago, Pedro, João e Judas, fazem uma descrição do que eram as primeiras

comunidades cristãs. Por exemplo, At 2, 42-47:

Eles se mostravam assíduos aos ensinamentos dos Apóstolos, à comunhão fraterna, à fração do pão e às orações. O temor se apossava de todos os espíritos, porque numerosos eram os prodígios e sinais realizados pelos Apóstolos. Todos os fiéis, unidos, tinham tudo em comum; vendiam as suas propriedades e os seus bens e dividiam o preço entre todos, segundo as necessidades de cada um. Dia após dia, unânimes, freqüentavam assiduamente o Templo e partiam o pão pelas casas, tomando o alimento com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e gozavam do favor de todo o povo. E, cada dia, o Senhor acrescentava à comunidade os que seriam salvos.

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O ensinamento dos apóstolos diz respeito ao Evangelho, que a comunidade recebe dos

discípulos de Jesus, daqueles que com ele conviveram, e tem neles o seu fundamento. A

comunhão (koinonia) é um modo de viver em comunidade que tem uma dimensão subjetiva

expressa na fórmula “tinham um só coração e uma só alma” (Atos 4, 32) e uma dimensão

objetiva expressa em três aspectos: primeiro tinham tudo em comum, ou porque ninguém

considerava seu o que possuía ou porque vendiam tudo e entregavam aos apóstolos; segundo

tudo era repartido para cada um conforme suas necessidades e terceiro não havia nenhum

necessitado entre eles.

A fração do pão se refere, certamente, à Eucaristia. Nas primeiras comunidades, ela

era celebrada nas casas, no contexto de uma refeição (Lc 22, 14-20; 24,28-31). Era presidida

normalmente pelo chefe do local, cabeça da comunidade eclesial, que se reunia em sua casa

(RICHARD, 1999).

Outro relato bem diverso de uma reunião comunitária encontra-se em Atos dos

Apóstolos 4, 23-31:

Logo que foram postos em liberdade, Pedro e João voltaram para junto dos irmãos e contaram tudo o que os chefes dos sacerdotes e os anciãos haviam dito. Ao ouvir o relato, todos elevaram a voz a Deus, dizendo: “Senhor, tu criaste o céu, a terra, o mar e tudo o que existe neles. (...) Agora, Senhor, olha as ameaças que fazem e concede que os teus servos anunciem corajosamente a tua palavra (...)”. Quando terminaram a oração, estremeceu o lugar onde estavam reunidos. Todos, então, ficaram cheios do Espírito Santo e, com coragem, anunciavam a palavra de Deus.

É uma reunião de uma comunidade muito mais missionária e carismática do que

estabelecida como mostramos em Atos 2,42. Há uma partilha dos apóstolos com os demais

irmãos sobre o que ocorreu, oram e interpretam a Palavra de Deus, em comunidade. No final,

há uma semelhança com o evento de pentecostes.

O livro dos Atos dos Apóstolos provavelmente foi redigido depois da destruição do

Templo, sob a ordem de Tito, em 70 (DONINI, 1988, p. 97). Dele provém a fonte principal

para caracterizar as primeiras comunidades cristãs.

As primeiras comunidades cristãs surgiram logo após a morte de Jesus Cristo, com as

atividades dos apóstolos, após o acontecimento de pentecostes, narrado em Atos 2,1-4. Nesse

acontecimento, os apóstolos reunidos em oração recebem o dom do Espírito Santo, que lhes

deu a coragem de expandir os valores de Jesus Cristo. Foi especialmente Paulo de Tarso,

antes perseguidor dos cristãos, depois “apóstolo dos gentios”, como ele mesmo se

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autodenomina (Atos dos Apóstolos), quem fundou muitas dessas comunidades no mundo

mediterrâneo.

Antes da institucionalização, a igreja é estruturada em pequenas comunidades

domésticas, que fazem o Evangelho de Jesus se expandir nas cidades e nas culturas. “A

pequena comunidade é o lugar onde se mantém vivo o ensinamento dos apóstolos (a memória

de Jesus) e onde se vive a koinonia (eles tinham tudo em comum), a diakonía (não havia

pobres entre eles) e a Eucaristia - At 2, 42-47” (RICHARD, 1999, p. 07).

Os primeiros cristãos eram chamados “nazarenos” e se tratavam em geral como irmãos

e irmãs (em grego adelphos e adelphe). Um dos valores primordiais dos cristãos era (e ainda

deve ser) a hospitalidade e ajuda dada aos irmãos sem distinção, muito enfatizada nas cartas

de Paulo. Pode-se imaginar que a sociedade dos primeiros séculos depois de cristo era bem

diferente da de hoje. As comunidades eram pequenas e compactas, com um vivo sentimento

de vida em comum. Não havia um templo onde se reunissem para o culto nos finais de

semana, ninguém falava em cristianismo, mas no “caminho”, ou “via” (MORAIS, 1992).

As pequenas células eram a própria ekklesia (grupo local de fiéis) e se reuniam na casa

de um dos fiéis que fosse mais próspero, eram reuniões informais, privadas e secretas (ibid),

sendo uma das finalidades “comer a ceia do Senhor” (I Cor. 11,20). Vê-se, pois, que as

primeiras comunidades cristãs não moravam sob o mesmo teto, como as Comunidades de

Vida em estudo, nesta dissertação. No entanto, mesmo morando em casas separadas,

possuíam um forte sentido de irmandade e se reuniam toda semana.

O valor que norteava a prática dos primeiros cristãos era certamente o amor ágape, ou

seja, o amor cristão, sem limites e barreiras, ele direcionava a prática da solidariedade

(MORAIS, 1992).

As primeiras comunidades cristãs se desenvolveram principalmente na palestina, nas

regiões da bacia oriental do Mediterrâneo, da Ásia Menor à Síria, Trácia, Macedônia, Grécia

Setentrional, Egito e África Setentrional, em um ambiente popular, de pobres e sem direitos,

“com formas ao mesmo tempo avançadas e ingênuas de solidariedade assistencial, nos

confrontos com um mundo privilegiado e egoísta” (DONINI, 1988, p. 89).

Talvez o ambiente pobre tenha ajudado a difusão das comunidades cristãs, por causa

da mensagem de iniciação religiosa transmitida pelos missionários cristãos, formando

comunidades que se ligavam por vínculos de solidariedade e de apoio mútuo.

Um dos maiores desafios de se dizer cristão, ainda hoje, é a vivência do “amor

fraterno”, e é justamente esse o maior pedido do mestre Jesus Cristo. A comunidade cristã

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busca apoiar-se nos valores da ajuda mútua, no acolhimento, na opção pelos pobres, na

“partilha do que se é e do que se tem” (discurso dos líderes das Comunidades Novas) nas

relações verdadeiras, no fazer o bem sempre, no servir uns aos outros, na oração constante, na

santidade de vida. Nas epístolas de Paulo, muitas vezes encontramos conselhos sobre os

valores que devem estar presentes na vida dos cristãos (Rom 12,9-12.16-17.21):

O amor seja sincero. Detestai o mal, apegai-vos ao bem. Que o amor fraterno vos una uns aos outros, com terna afeição, rivalizando-vos em atenções recíprocas. Sede zelosos e diligentes, fervorosos de espírito, servindo sempre ao Senhor, alegres na esperança, fortes na tribulação, perseverantes na oração. Mantende um bom entendimento uns com os outros; não sejais pretensiosos, mas acomodai-vos às coisas humildes. A ninguém pagueis o mal com o mal. Empenhai-vos em fazer o bem diante de todos. Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal pelo bem.

Por fim, pode-se ressaltar que, nas comunidades primitivas, a atuação das mulheres era

expressiva, apesar da sociedade da época ser acentuadamente machista; percebemos ainda

que, desde os seus primórdios, a Igreja tem uma constituição hierárquica, formada pelos

apóstolos e por Pedro e que foi se difundindo no mundo Romano, principalmente nas cidades,

por meio do boca a boca.

2.2 Primeiras comunidades religiosas monásticas

O início da vida monástica remonta ao século IV, quando o cristianismo é reconhecido

como religião oficial do Império Romano por Constantino (313) e Teodósio (380), e a Igreja

passou a ter privilégios, riquezas e conversões em massa. Alguns cristãos abandonaram a vida

da cidade e foram para o deserto, desejando viver a integridade do cristianismo de forma mais

radical (SOUSA, 2007, p. 9).

Uma das formas mais antigas dessa vida comunitária religiosa é a cenobítica (do grego

koinós bio = vida comum), nas quais os discípulos se reuniam em torno de um pai comum. No

princípio, cada um tinha sua cela e alguns espaços em comum (refeitório, capela, enfermaria),

combinando o estilo de vida comunitária com a solitária. Um dos pais mais conhecidos é

Pacômio, que no decorrer da experiência propôs uma regra de vida para a comunidade,

dividindo os monges nos diversos ofícios manuais, e havia a presença de um superior, que era

o seu pai espiritual, e dirigia todos os trabalhos, sendo-lhe devidas obediência e abertura total

de consciência.

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A espiritualidade baseava-se na leitura meditada e ruminada na Escritura; as atitudes

dos monges deveriam ser de humildade, serviço e submissão, além de uma ascese adequada;

havia mudança de traje. Esse estilo de vida existe até hoje na igreja, o exemplo mais

conhecido é o dos Cartuchos, a única ordem que não sofreu reforma.

Conforme salienta Sousa (2007, p. 10):

Quando Pacômio morreu (346) havia 08 fundações para homens e 02 para mulheres e no final do século havia no Egito mais de 5 mil monges (...) É um movimento carismático e profético que ninguém poderia ter imaginado nem programado.

Lentamente o monacato se espalhou pela Europa, sendo Bento de Núrcia (480-543) a

sua figura principal, nos séculos V e VI. Inicialmente ele retirou-se para vida eremítica em

Subiaco, depois fundou o mosteiro de Monte Cassino, em 529. Dele temos a famosa Regra,

que tem um sentido de equilíbrio entre trabalho, oração e descanso, regulados pela

obediência. Aparecem os votos religiosos feitos nas mãos dos abades, sem a formulação de

obediência, castidade e pobreza, os votos são de estabilidade (permanência no mesmo

mosteiro por toda vida), obediência ao abade e conversation morum (conversão de costumes),

que se refere à vida em comum levada às últimas conseqüências, pois os monges beneditinos

possuem coro, refeitório, lugar de trabalho e até dormitório em comum. A liturgia, o opus

divinum, ocupa lugar principal, sendo o trabalho também importante (ibid).

O mosteiro beneditino é, em sua origem, composto por monges não ordenados. Com o

passar dos anos e sua propagação, a partir do século VII, de laical passou a ser

predominantemente clerical. Há um momento em que a Igreja chega a ser monástica, os

monges evangelizam a Europa ensinando as pessoas a lerem e a rezarem.

A ordem cristã ocidental de São Bento, citada por Victor Turner, possui características

interessantes abaixo expressas:

provê a subsistência de homens que desejam viver em comunidade, devotar-se inteiramente ao serviço de Deus pela autodisciplina, a oração e o trabalho. Devem formar essencialmente famílias, sob os cuidados e o controle absoluto de um pai (o abade); individualmente, são obrigados à pobreza pessoal, abstenção do casamento e obediência aos superiores, bem como pelos votos de estabilidade e conversão de conduta (sendo originariamente sinônimo de ‘vida em comum’, a ‘vida monástica’ distinguia-se da vida secular), um grau moderado de austeridade é imposto pelo ofício noturno, o jejum, pela abstinência de carne e restrição na conversa. (Attwater, 1961, p.51 apud Turner, 1974, p. 133, grifos nossos):

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O supracitado autor enfatiza os processos de despojamento e de nivelamento do

iniciado, quando se chega à ordem, como característica do processo ritual de liminaridade.

Em História da Vida Privada 25, verificam-se as características dos mosteiros

beneditinos na época da idade média, no século IX. A descrição de suas construções

demonstra uma tentativa de serem réplicas da morada do paraíso, assim como a sua estrutura

hierárquica interna, organizado em função de um projeto de perfeição estabelecido a partir das

regras de São Bento. Nessa época, continuando nos séculos XI e XII, grandes recursos

convergiam para a instituição monástica. Eram cidades fechadas, com a abertura na hotelaria,

que governava a relação entre o interno e o externo. Esses mosteiros chegaram a tamanhos

desmesurados como o mosteiro em Corbie, 852, onde “viviam 150 monges, 150 viúvas eram

sustentadas permanentemente à porta e trezentos hóspedes recebidos a cada dia na

hospedaria” (ARIÈS, 1990, p. 58)

Os papéis no mosteiro são bem definidos. O abade é o senhor e tem autoridade

exclusiva e rege toda sociedade doméstica. É assistido por uma equipe, os “seniores”, que o

aconselham e apóia-se em chefes de serviços. O primeiro, o “prior” é uma espécie de vice-

senhor, que supre a ausência do abade; o sacristão é aquele que cuida das coisas referentes à

igreja, abre e fecha, zela pelos utensílios; o camareiro é quem guarda o dinheiro e tudo aquilo

que com ele se consegue; o ecônomo é o senhor do celeiro, onde dorme um monge e onde se

mantém permanentemente uma luz, ele reparte, a cada dia, as porções de alimento; o

hospedeiro e o capelão são responsáveis pelas relações com as pessoas do exterior,

consideradas menos puras e abaixo da dignidade monástica, eles distribuem os excedentes

entre os indigentes, visitam os doentes homens acamados fora dos muros, albergam os pobres

de passagem. (ibid)

A fraternidade do mosteiro, agrupada atrás de um pai, é descrita pela História da Vida

Privada 2 (ibid, p. 63/68), em seus quatro grupos: o noviciado, a enfermaria, o cemitério e o

claustro.

O noviciado era separado da Igreja pela morada dos monges, um lugar transitório e de

gestação onde ficavam aqueles que chegavam ao mosteiro para se tornarem monges, inclusive

crianças, deixadas junto com seus dotes. Ali eram alimentadas e educadas, sob a direção de

um mestre; quando se considerava a aprendizagem terminada, eram transferidas solenemente

para o meio dos monges. O rito era de integração, com a profissão da fórmula escrita,

assinada e lida; depois depositada no altar, diante da comunidade reunida. Em seguida, veste a

5 Coleção dirigida por Philippe Ariès e Georges Duby.

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peca do vestuário que ainda lhe falta, a cogula; por fim, recebe um beijo de cada um dos

irmãos, iniciando pelo abade. Após a cerimônia, o novo monge passa três dias de

recolhimento, em retiro silencioso e privado, o corpo coberto noite e dia pela cogula e a

cabeça pelo capu como uma forma de provação.

A enfermaria é um lugar de espera, onde se encontram os enfermos, isolados do resto

da comunidade, pois a doença era considerada como marca do pecado. “os internos da

enfermaria eram reconhecidos por seu bastão, sinal de fraqueza, por sua cabeça coberta, sinal

de penitência.” (ibid, p. 62). Os que de lá não voltavam, “passavam para o outro mundo”,

sendo a morte precedida de uma cerimônia em que o falecido era levado por outros monges

para a Igreja e sepultado no cemitério, após a salmodia.

O cemitério era o terceiro quarto desse espaço familiar, estando os defuntos integrados

aos seus irmãos vivos. No dia do aniversário do seu falecimento, era servida uma refeição

saborosa e suplementar, da qual fazia parte apenas a comunidade.

Por fim, a moradia queria mostrar o que seria na terra uma vida privada perfeita. O

claustro era o pátio interno, voltado para o privado, em forma de praça, de lá se ordenavam o

tempo e as atividades funcionais, distribuídas entre os compartimentos do edifício, o mais

ordenado era o consagrado ao Opus Dei, ao trabalho para Deus, era a igreja, onde faziam as

orações cantadas em comunidade. Ao seu lado, estava a sala para conferências e reuniões de

justiça, onde se tratavam das questões temporais e se procediam às correções mútuas. Os

faltosos eram flagelados e afastados temporariamente da comunidade, como castigo. O

refeitório, também parte da moradia, era onde se tomavam as refeições em comum, nas quais

se celebrava a unidade fraterna, sentados, em perfeita ordem, comandados pelos sinais

silenciosos do abade, enquanto um irmão lia um texto. O dormitório, local mais retirado da

moradia, era ocupado por todos os monges, inclusive o abade, dormindo cada um em sua

cama, “que a regra proibia formalmente de partilhar” (ibid, p. 68).

Enfim, de acordo com as afirmações de Sousa (2007, p. 12), “os mosteiros eram tudo

na Idade Média: roça, hospital, escola. Por causa disso, recebiam muitas doações e heranças e

se tornaram muito ricos. O trabalho manual foi sendo deixado para os escravos e a oração se

transformou em culto suntuoso.” Assim, o mosteiro foi passando de um local retirado para o

centro do poder sócio-eclesial, que pode ter sido fruto de um excessivo processo de

institucionalização.

Começaram, então, as reformas. Durante os anos de 927-941, Santo Odão, ou Otão,

segundo abade do mosteiro de Cluny, promoveu um retorno à Regra beneditina, à observância

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dos votos, ao estudo, à oração, ao trabalho manual. No século XII, os mosteiros de Cluny já se

arrefeciam no fervor reformista. Alguns monges fundaram a ordem dos cistercienses,

chamados monges brancos para se diferenciarem dos monges pretos de Cluny, liderado por

Bernardo de Claraval, com ímpeto de manter o trabalho manual, a austeridade de vida e a

simplicidade. Mesmo assim, os mosteiros se enriquecem no envolvimento com o sistema

feudal.

Dois elementos teológicos dos mosteiros nessa época eram a escatologia e o

exorcismo, a partir dos quais tentavam reproduzir o paraíso celeste pela própria arquitetura do

mosteiro, voltada para o céu e queriam destruir o poder do Demônio.

Tönnies (1995) analisa as comunidades religiosas como essas, - existentes ainda hoje,

com mudanças em alguns aspectos -, em função do Estado, portanto, não as considera

comunidades, e sim sociedades religiosas. Nessa visão, as comunidades religiosas são vistas

dentro de uma condição de instituídas.

2.3 Comunidades religiosas mendicantes

O século XIII, na Europa, marca a mudança da vida rural para as cidades em

expansão, surgem subúrbios pobres, povoados e burgos ricos pela intensificação do comércio.

Há o desmoronamento do sistema feudal, mas a igreja, totalmente incorporada a esse sistema

em sua mentalidade, governo e concepção teológica, considera as novas aspirações violentas,

anárquicas e diabólicas e afasta-se do povo simples.

Mais uma vez, surgem por toda parte grupos e associações que desejam voltar às

origens da vida cristã. Um desses grupos são as ordens mendicantes, cujo ideal se encarna na

figura de São Francisco (1182-1226). Há um novo ciclo na vida religiosa, não simplesmente

uma reforma no monaquismo. Após sua conversão, São Francisco escuta a voz de Cristo em

São Damião e inicia uma vida eremítica. Em seguida começa a pregar o Evangelho e forma

um grupo de irmãos que são chamados menores, contrapondo-se aos ricos e poderosos do

tempo, vão bater às portas, vivem de esmolas. Há um rompimento com o estado clerical da

vida religiosa e uma vivência da criação como teofania e fraternidade universal (SOUSA,

2007). Entretanto, a crítica eclesial do franciscanismo é pelo testemunho, pois continuam com

profunda obediência ao Papa e se dispõem a assumir as missões que lhes foram confiadas.

São Francisco introduz a tríade pobreza, obediência e castidade, com ênfase na

pobreza, como ideal individual e comunitário. Nesse ideal comunitário também se encontram

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a vivência fraterna intensa, a simplicidade nas regras, características do estado de

liminaridade proposto por Turner (1974).

Apesar de uma posterior institucionalização, relutada por São Francisco, a ordem

franciscana não perdeu a fecundidade, sendo a mais numerosa da Igreja Católica,

ramificando-se em três ramos principais: menores, conventuais e capuchinhos, segundo

diferentes interpretações das Regras franciscanas, sobretudo no que se refere à pobreza.

2.4 Comunidades religiosas católicas na modernidade

No século XVI, várias descobertas e inovações alteram a vida social, e as navegações

possibilitam o colonialismo, começa o Renascimento e o mundo moderno. No campo

religioso ocorre a Reforma Protestante e a Contra-reforma católica, no Concílio de Trento.

Por outro lado, as ordens religiosas se impulsionam e se reformam. Mesmo assim, nascem

novas formas de vida religiosa. Uma delas são os clérigos regulares, formada por cléricos,

que renunciam ao serviço litúrgico coral e ao hábito; adotam o modo de vestir próprio dos

sacerdotes onde moram, bem como a pobreza baseada em São Francisco, vivendo do trabalho

e da esmola; vivem a gratuidade do ministério apostólico; têm formação intelectual

prolongada e sólida; realizam pregações, missões, ensino e cuidam dos enfermos e desvalidos

(SOUSA, 2007).

Os jesuítas da Companhia de Jesus estão entre as novas ordens religiosas dessa época,

também clerical, surgida nesse tempo, fundada por Inácio de Loyola (1491-1556). A

companhia acrescenta mais um voto, o de disponibilidade total, para poderem ser enviados

em missão pelo mundo. Essa ordem cresceu rapidamente, tornando-se uma instituição

poderosa, mas ao mesmo tempo foi perdendo a mística evangélica na espiritualidade,

tornando-se moralista e racionalista (ibid).

Com a Revolução Francesa (1790), as ordens religiosas sofrem um novo abalo, são

consideradas como coisa do passado, devendo monjas e religiosos abandonar seus conventos.

Essa situação prolongou-se por todo século XIX, sendo a vida religiosa considerada obstáculo

para o triunfo da sociedade leiga, democrática, progressista e liberal; cresce o processo de

secularização, e o sistema capitalista se consolida, com a Revolução Industrial.

A Igreja Católica adota uma postura de saudosismo, vendo negativamente os

movimentos seculares e sociais modernos. O Concílio Vaticano I (1869) produz documentos

de valor dogmático, acentuando o papel da autoridade, inclusive a infalibilidade papal em

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questão de fé. Quanto às ordens religiosas, foram restauradas algumas ordens antigas, como a

Companhia de Jesus, as congregações beneditinas, cistercienses, trapistas, franciscanos e

dominicanos. Surgem como marco do século XIX várias congregações com características

ativas e de especialização em algum campo apostólico, como ensino, juventude, obras

populares, entre elas estão: maristas, palotinos, salesianos, cordimarianos, sociedade do verbo

divino, irmãzinhas da assunção, mercedárias, entre mais de uma centena de outras (ibid)

O início do século XX está marcado por crises sociais e políticas: Revolução Russa e

as duas grandes guerras mundiais. A vida religiosa prossegue como no século anterior, com

surgimento ainda de outras ordens religiosas, como a que se inspira do carisma de Charles de

Foucauld, que iniciou uma vida de presença evangélica silenciosa, paciente e criativa no meio

do povo, e foi seguido por várias fraternidades que procurarão se encarnar no meio dos

pobres. Outra forma surgida são os institutos seculares, cuja inspiração é viver a pobreza, a

obediência e a castidade no mundo.

2.4.1 Comunidades Eclesiais de Base (CEB's)

No Brasil, desde sua colonização por Portugal, sempre foi considerado um país

religioso. Até o final do século XIX, o brasileiro tinha quase obrigação de ser católico, uma

vez que o catolicismo era a religião oficial do Império brasileiro. Com a Proclamação da

República e a separação do Estado e da Igreja Católica, o espaço religioso brasileiro vem

sofrendo mudanças constantes, tornando-se mais significativas a partir dos anos de 1940,

acelerando-se a partir do final dos anos de 1970 (SANTOS, 2002).

Nos dias de hoje, há grande pluralidade religiosa no Brasil e, conseqüentemente, cada

religião usa de estratégias para garantir e expandir seu espaço na sociedade, buscando adesão

de novos fiéis, com a utilização de meios contemporâneos de divulgação da religião, como,

por exemplo: .pregação em espaço público, programas de rádio e televisão.

Após o Concílio Vaticano II (1962-1965), que impulsionou, entre outras coisas, a

participação dos leigos na Igreja Católica, a partir da década de 1970, a Igreja Católica da

América Latina segue a linha da “opção preferencial” pelos pobres e a da “desclerização”,

proliferando-se as chamadas Comunidades Eclesiais de Base. Em 1968, os delegados da

Assembléia do CELAM (Conselho Episcopal Latino Americano), em Médellin (Colômbia),

optam pelas CEB's como forma pastoral prioritária para a América Latina (CASTRO, 1987).

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Clodovis Boff (apud Castro, 1987, p. 63) faz uma síntese do significado de CEB, qual

seja: comunidades - “agrupamentos restritos, onde vigem relações primárias, isto é, afetivas,

nominais e interpessoais”, eclesiais - “aspectos religiosos dessas comunidades” e de base -

“camadas mais baixas da sociedade”, “fazer renascer a Igreja lá onde sua presença acha-se

praticamente apagada” e “em oposição ao 'do alto', 'de cima', entendido como das instâncias

do poder, 'das cúpulas'”.

As principais características das CEB's são: grupos em torno de 20 a 80 pessoas,

reunidas geralmente em função da proximidade territorial; compostas principalmente por

membros das classes populares; vinculadas a uma paróquia; utilizam o método do ver-julgar-

agir e leitura bíblica em articulação com a vida; articuladas pela própria Igreja católica, por

meio de bispos, padres e leigos (Wikipédia).

A organização interna de um Comunidade Eclesial de Base é feita a partir de um

número mínimo de pessoas, com descoberta de uma necessidade e interesses convergentes,

desperta-se para valores comunitários em busca de soluções e de satisfações solidárias, a

presença de alguém que entenda o processo e seja capaz de conduzi-lo e que haja motivações

de fé religiosa e uma metodologia de ação de acordo com os objetivos comunitários

perseguidos (CASTRO, 1987).

Na pesquisa feita em CEB's localizadas na periferia de Recife/PE, Gustavo do Passo

Castro6 observou vários detalhes internos, chegado à conclusão de que “A comunidade é,

pois, vista como altamente importante na vida de seus membros.” (1987, p. 142) E de que há

descoberta de valores como senso comunitário, novas relações de amizade, nova concepção

do mundo, educação para a vida, livre expressão de idéias e sentimentos, pertença,

reconhecimento como sujeito ativo do fenômeno religioso (CASTRO, 1987).

A articulação das CEB's brasileiras promove encontros com líderes, chamados

“Encontros Intereclesiais”, sendo o último deles, o 11º encontro, realizado de 19 a 25 de julho

de 2005, no Brasil, na cidade de Ipatinga, Minas Gerais. O 12º Intereclesial das CEBs está

previsto para ser realizado de 21 a 25 de julho de 2009, na cidade de Porto Velho, capital do

Estado de Rondônia, e tem como tema CEBs: Ecologia e Missão e o lema Do Ventre da

Terra, o grito que vem da Amazônia.

6 Professor de Antropologia da Educação na UFPE, assessor de atividades eclesiais na Arquidiocese de Olinda e Recife, no Seminário do Regional Nordeste2 da CNBB e no Instituto de Teologia do Recife – ITER.

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2.4.2 Movimento da Renovação Carismática Católica

As Comunidades Novas nasceram, em sua grande maioria, do Movimento da

Renovação Carismática Católica, um Movimento na Igreja Católica, surgido na década de 70,

a partir de experiências de alguns católicos com grupos pentecostais protestantes, nos Estados

Unidos. Quando João Paulo II iniciou seu pontificado, em 1978, já havia vários grupos de

oração, e os mais antigos estavam começando a viver momentos de decisão de iniciar ou não

uma experiência de vida comunitária mais intensa.

Até 1979, a Renovação Carismática Católica do Brasil tentou uma experiência

ecumênica, que “foi frustrada devido a seu esforço de legitimidade institucional em relação ao

catolicismo” (SOUSA, 2005, p. 63). Em 1975, a Igreja Oficial Romana apoiava os

carismáticos, o atual Papa, Paulo VI, dizia que o mundo necessitava da renovação espiritual

que o Espírito Santo suscitava através do movimento, e João Paulo II seguiu a mesma linha

(ibid, p. 67/68), sempre com apoio e incentivo.

No entanto, a Igreja da América Latina não seguiu Roma no apoio ao pentecostalismo.

Na década de 70, houve uma forte adesão do episcopado à Teologia da Libertação,

culminando com o documento de Puebla (1979), que teve muito mais repercussão no Brasil

do que os pronunciamentos de Roma. Nos anos 80, a Igreja Católica Brasileira olhava a RCC

sempre com referências às CEB’s (Comunidades Eclesiais de Base). Entretanto, nos anos 90,

houve uma crise na Teologia da Libertação e um fortalecimento da RCC (ibid, 2005). Foi nos

anos 90 também que as Novas Comunidades aprofundaram sua experiência comunitária,

definindo carisma próprio, missão na Igreja e na sociedade, aspectos da espiritualidade.

Os grupos de oração tiveram o seu ponto alto na década de 80, no início da expansão

da RCC no Brasil, tendo seu número diminuído na década de 90 e 00, como tendência

nacional, talvez devido a formação de várias Comunidades Novas a partir desses grupos que,

por sua vez se estruturam de formas diferentes, apesar de algumas manterem o grupo de

oração como forma de atração de novos membros.

No que se refere à espiritualidade da RCC, trazida para as Comunidades Novas, muitas

pesquisas, em diversas abordagens, já vêm sendo feitas, por isso o tema não será focado aqui

mais detidamente, até para não fugir do foco da pesquisa7.

7 Entre os estudiosos do Movimento da Renovação Carismática Católica estão CARRANZA (2000); MACHADO (1996) e MARIZ (2003).

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Destaca-se a opinião de Ronaldo José de Sousa, quanto ao uso do termo “intimista” para

caracterizar os carismáticos que, para ele, leva a uma percepção subjetiva e egoísta da fé, o

que não se verifica na prática de muitos membros da RCC.

Embora seja verdade que os seus componentes não se incomodam de experimentar as

chamadas “esquisitices” e tudo fazem para manter sua prática espiritual. Outro aspecto

destacado pelo estudioso, é que, como os carismas são vivenciados de modo direto com Deus,

as pessoas encontraram na Renovação Carismática um mecanismo de afirmação pessoal e

coletiva (Ibid, 2005).

A Renovação Carismática tem práticas que diferem da tradição da Igreja Católica, como

as curas milagrosas, o repouso no Espírito, exorcismos, profecias, o dom das línguas e o dom

do discernimento. Muitas dessas práticas se opõem à racionalidade da Igreja e à religiosidade

popular. Os seus adeptos, em geral fiéis católicos leigos, fazem uso dos dons efusos do

Espírito Santo, que são nove: língua, profecia, interpretação, cura, milagres, ciência, sabedoria

e discernimento.

O grupo básico da RCC é o “Grupo de Oração”, que em geral se reúne semanalmente

para oração, escuta, pregação e partilha da Bíblia, no qual os engajados exercem seus

ministérios, utilizando os “dons de serviço” do Espírito Santo. O grupo de oração é bem

estruturado, havendo o coordenador (ministério de pastoreio), os pregadores (ministérios de

ensino e pregação), os membros da música (ministério de música), os intercessores

(ministério de intercessão e cura e aconselhamento), entre outros.

As Comunidades Novas nascem, em geral, desses grupos de oração. Portanto, trazem

deles algumas características, como o uso dos carismas e dons do Espírito Santo, a

espontaneidade da oração, os cânticos, as danças, os louvores, além da estrutura, formadas por

fiéis católicos leigos e da manutenção da estrutura básica dos grupos de oração, que são os

ministérios.

O Movimento da Renovação Carismática Católica reconhece que de seus grupos de

oração freqüentemente surgem Comunidades Novas dentro da Igreja Católica, deixando,

conseqüentemente, de pertencer hierarquicamente a esse Movimento. O que a leva a orientar

os grupos de oração no sentido de que não almejem formar uma Comunidade Nova pelo

simples fato de estar na “moda”, mas que verifiquem cuidadosamente se realmente existe uma

“inspiração divina”, um “sopro do Espírito Santo”, para uma nova fundação.8

8 Ver o Portal da RCC Londrina (www.rcclondrina.com.br), que contém um serviço específico de formação para pessoas que desejam iniciar uma Comunidade Nova. “Dentro da RCC, Deus tem inspirado comunidades, extensões mais especificas do grande chamado feito a todos os batizados de viverem em

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2.5 Comunidades Novas de Vida e Aliança (CNVA)

As Comunidades Novas de Vida e Aliança estão entre os Movimentos ocorridos na

Igreja Católica através dos tempos. O bispo João Evangelista Martins Terra (2004), para

explicar o lugar eclesiológico dos Novos Movimentos Eclesiais, primeiro discorre brevemente

sobre os grandes movimentos apostólicos ocorridos na história da Igreja Católica9, concluindo

que a sua estrutura institucional se formou através dos tempos, mas não deixou de acolher os

novos movimentos espirituais e carismáticos que surgiam fora da instituição e do modelo de

paróquia (Igreja local, dividida em territórios). Ressalta que “o papado não cria os

movimentos, porém eles têm sido sustentáculos dentro da estrutura da Igreja” (TERRA, 2004,

p. 29).

Pode-se deduzir que, assim como o bispo de Roma (o Papa) tem um ministério que

alcança a Igreja universal, também o têm os Movimentos, que superam o âmbito das

estruturas.

Se se contempla a história da Igreja em seu conjunto, salta à vista que o modelo de Igreja local está decididamente configurado pelo ministério episcopal, é o nexo e a estrutura permanente ao longo dos séculos. Porém ela está também permeada incessantemente pelas diversas ondas de novos movimentos, que revalorizam continuamente o aspecto universal da missão apostólica e a radicalidade do Evangelho, e que, por isso mesmo, servem para assegurar vitalidade e verdade espirituais às igrejas locais” (TERRA, 2004, p. 29).

Quanto ao surgimento, os movimentos geralmente se iniciam com uma pessoa

“carismática líder” que “vive o Evangelho em sua totalidade”, passando depois a formar

comunidades concretas, que “reconhecem na igreja sua razão de ser, sem a qual não poderiam

subsistir” (ibid, p. 36).

comunidade. Podemos afirmar que as comunidades novas não são uma invenção humana e nem são “grupos crescidos de oração” mas nascem do coração de Deus para estar a serviço da Igreja. Na diocese de Londrina vimos o pipocar muitas comunidades ou de pessoas que querem ser, ou estão em processo de discernimento quanto ao chamado para uma vida comunitária, sendo assim, surgiu a necessidade de montar um serviço que possa informar, ajudar e formar aqueles que tem esse chamado.” 9 Ver seções 2.1 a 2.4 desse Capítulo.

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2.5.1 Contextualização

Para as “Comunidades Novas”, que continuam nascendo, desde o final da década de 70

até hoje, as condições externas são as da sociedade pós-moderna10 e suas características de

globalização acelerada no campo da economia, da política e da cultura, da comunicação

instantânea, da ação à distância, da fragmentação do sujeito e das relações sociais, do senso de

vivência do aqui e agora, da crise da família patriarcal, da predominância da mídia na

constituição do universo simbólico das grandes massas, tudo isso marcado pelas mudanças no

modo de produção, distribuição e consumo de produtos (DINIZ, 2005; PUNTEL, 2005).

No contexto do catolicismo, as Comunidades Novas de Vida e Aliança surgem após o

Concílio Vaticano II, que aconteceu entre os anos de 1962-1965, convocado pelo Papa João

XXIII. Alguns estudiosos inclusive afirmam que o seu florescimento só ocorreu devido às

mudanças trazidas por esse Concílio Ecumênico, que deu um novo perfil à igreja.

Os concílios são períodos em que os Cardeais e Bispos da igreja católica param para

refletir sobre os vários aspectos a ela relacionados, como liturgia, vida religiosa, relação com

a sociedade, identidade, doutrina. A partir das discussões, são criados vários documentos que

irão orientar os fiéis da igreja.

O documento do Vaticano II chamado Lumen Gentium (LG), a Luz dos Povos, que trata

da igreja, acentua o papel dos leigos e religiosos com bastante clareza, sugerindo passar do

perfeccionismo puro da vida religiosa para a afirmação de que a santidade é algo constitutivo

do ser cristão, independente de ser ou não religioso (LG, Capítulos IV, V e VI).

Outro documento importante é o Gaudium et spes sobre a Igreja de hoje, que passou a

ver o mundo em sintonia com a fé cristã, e o documento Apostolicam Actuasitatem sobre o

apostolado dos leigos – aqueles que não fazem parte da hierarquia da Igreja Católica, ou de

ordens religiosas -, que impulsiona os leigos a se unirem em comunidades, fundar associações

e movimentos, por livre iniciativa.

É nesse contexto que surgem, em profusão, as Comunidades Novas e os Novos

Movimentos Eclesiais, formados e fundados, em sua grande maioria, por cristãos católicos

leigos, com o impulso de “dar a vida pela causa de Jesus Cristo e da Igreja Católica” (discurso

dos líderes das Comunidades Novas de Vida e Aliança), com um ardente desejo de viver em

10 A expressão “pós-modernidade” é usada por um grupo de sociólogos, entre eles LYOTARD, . F. “A condição pós-moderna”. Rio de Janeiro, José Olympo, 5ª edição, 1998; BAUMAN, Zygmunt, “O mal-estar da pós-modernidade”. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1997 e KUMAR, K. DA sociedade pós-industrial à pós-moderna: novas teorias sobre o mundo contemporâneo”. Rio de Janeiro, Zahar Editora, 1997.

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comunidade, como os primeiros cristãos, mas como testemunho de fé diante da sociedade

secularizada.

Todas as Comunidades Novas e os Novos Movimentos Eclesiais foram fundados na

segunda metade do século XX, à exceção do Movimento dos Focolares11. Parece que após o

Concílio Vaticano II os fiéis leigos se sentiram mais “à vontade” para participar ativamente da

vida da igreja, dirigindo o próprio culto, promovendo evangelização, organizando-se para o

exercício de obras de caridade.

Outro fator decisivo para o florescimento das Comunidades Novas foi o pontificado de

João Paulo II, que orientou as conclusões do Vaticano II, com uma nova antropologia

teológico-filosófica. Promoveu vários encontros com os Movimentos Eclesiais e as

Comunidades Novas. Durante o seu pontificado, aconteceram 04 grandes encontros: em 1981,

1985, 1991 e 1998.

Este último é considerado um marco para as Comunidades Novas e Movimentos. O

encontro foi precedido de um congresso para fundadores e co-fundadores de Comunidades e

Movimentos do mundo inteiro. Na carta convite, com assinatura do Papa e o selo do

Vaticano, pela primeira vez foi aplicado o termo “fundador” a Comunidades e Movimentos

leigos, pois o termo até então era restrito às ordens e congregações religiosas. O encontro

ocorreu em 30 de maio de 1998, na Praça São Pedro, no Vaticano, reunindo mais de 300 mil

fiéis e 50 diferentes Movimentos de Comunidades Novas. Abaixo trechos do pronunciamento

do Papa João Paulo II (1998)12, que é reproduzido por várias CNVA em seus sites, indicando

um importância dada a esse reconhecimento pela Igreja de Roma:

A passagem do carisma originário ao movimento acontece pela misteriosa atração exercida pelo Fundador sobre quantos se deixam envolver na sua experiência espiritual. (...) Desse modo, os movimentos reconhecidos oficialmente pelas autoridades eclesiásticas propõem-se como formas de auto-realização e reflexos da única Igreja. O seu nascimento e a sua difusão trouxeram à vida da Igreja uma novidade inesperada, e por vezes até explosiva. Isto não deixou de suscitar interrogativos, dificuldades e tensões; às vezes comportou, por um lado, presunções e intemperanças e, por outro, não poucos preconceitos e reservas. Foi um período de prova para a sua fidelidade, uma ocasião importante para verificar a genuinidade dos seus carismas. Hoje, diante de vós, abre-se uma etapa nova, a da maturidade eclesial. Isto não quer dizer que todos os problemas tenham sido resolvidos. É, antes, um desafio. Uma via a percorrer. A Igreja espera de vós frutos «maduros» de comunhão e de empenho. Como conservar e garantir a autenticidade do carisma? É fundamental, a respeito disso, que cada movimento se submeta ao discernimento da Autoridade eclesiástica

11 Fundado em Trento/Itália, em 1944, por Chiara Lubich. 12 Pronunciamento disponível em http://www.vatican.va.

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competente. Por esta razão, nenhum carisma dispensa da referência e da submissão aos Pastores da Igreja. Com palavras claras o Concílio escreve: «O juízo acerca da sua autenticidade e reto uso pertence àqueles que presidem na Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e conservar o que é bom (cf. 1 Ts 5, 12.19-21)» (Lumen gentium, 12). Esta é a necessária garantia de que a estrada que percorreis é justa! Assim, na confusão que reina no mundo de hoje é fácil errar, ceder às ilusões. Na formação cristã cuidada pelos movimentos jamais falte o elemento desta confiante obediência aos Bispos, sucessores dos Apóstolos, em comunhão com o Sucessor de Pedro! (grifos nossos)

O trecho do pronunciamento do Papa João Paulo II foi transcrito porque é

especificamente dirigido às Comunidades Novas em fase inicial de fundação, objeto de

pesquisa nesta dissertação, e menciona o seu processo de institucionalização, que também

será analisado. Nos grifos, foram destacadas a preocupação da igreja oficial no

reconhecimento de um novo carisma e sua observação no tempo para verificar a sua

autenticidade, de acordo com os parâmetros oferecidos pela igreja católica e observando a

obediência aos pastores.

O Papa Bento XVI continua incentivando os Movimentos Eclesiais e as Comunidades

Novas a viverem a radicalidade da vida cristã e a vida missionária. Em 03 de junho de 2006,

na Vigília de Pentecostes, na Praça São Pedro, mais de 100 Movimentos estavam presentes

para ouvir a sua homilia, depois de ter participado de um encontro cujo tema era “A beleza de

ser cristão e a beleza de comunicar a vida cristã.”

A Comunidade de Vida e Aliança mais antiga que se conhece é a “Word of God”, que

está na origem do movimento da renovação carismática católica e que foi fundada por um

grupo de estudantes da Universidade de Michigan – EUA, em 1967. Os líderes fundadores

eram Steven Clark e Ralph Martin. Em meados de 1970 o grupo por eles liderados decidiu

morar em residências coletivas e, com o passar do tempo, as lideranças foram ganhando

poder, a medida que regras eram criadas para a vivência coletiva, “tendo como ápice a decisão

do uso do véu de linho belga para as mulheres e manto de linho irlandês para os homens”

(MAFRA, 2008, p. 2). Em meados de 80, o grupo dividiu-se em dois, com a criação do

“Sword of Spirit”; em 1992, o “Word of God” já não apresentava as características

“personalistas e centralizadoras do poder e de normatização da prática” (ibid).

No Brasil, a comunidade com maior tempo de existência é a Canção Nova, com sede

em Cachoeira Paulista/SP, que já conta 30 anos, fundada em janeiro de 1978, pelo Monsenhor

Jonas Abib e alguns jovens. A segunda mais antiga é a Comunidade Católica Shalom, com 25

anos, que tem sede em Fortaleza/CE. No total, existem atualmente cerca de 400 Novas

Comunidades (TIMBÓ, 2004) espalhadas por todo território brasileiro. Dentre estas,

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aproximadamente 65% estão em fase embrionária, 20% estão em desenvolvimento e 15%

estão atingindo ou já atingiram um amadurecimento (ibid).

No sítio da Fraternidade das Novas Comunidades no Brasil podemos encontrar

informações apenas sobre 13 Comunidades, entre elas as mais antigas e conhecidas no Brasil:

a Comunidade Canção Nova, de Cachoeira Paulista/SP; a Comunidade Shalom, e

Fortaleza/CE e Comunidade Doce Mãe de Deus, de João Pessoa/PB. Isso deve se dar pelo

fato de que para entrar nessa Fraternidade são feitas algumas exigências formais que muitas

Comunidades Novas ainda não possuem em sua estrutura, como estatuto e carta de indicação

do bispo ou aprovação diocesana, se houver (http://www.comunidadesnovas.org.br/).

No sítio da Comunidade “Divina Misericórdia”

(http://www.divinamisericordia.com.br/index.phpoption=com_weblinks&catid=27&Itemid=2

3) , encontramos a lista de links de 18 Comunidades Novas, entre elas estão as citadas acima,

as demais se chamam: “Arca da Aliança” – Joinville-SC, “Betel” – Nova Andradina-MS,

“Hesed”- Fortaleza-CE, “Mensagem Brasil” – São Paulo, “Oásis” – Caxias do Sul-RS, “Obra

de Maria” – Recife/PE, “Palavra Viva” – Belo Horizonte-MG, “Pantokrator” – Campinas-SP,

“Recado” – Fortaleza-CE, “Remidos no Senhor” – Campina Grande/PB, “Sagrada Família” –

Arapuá-SP e “Vida Nova” – Joinville-SC.

Nesse processo de fundação e trajetória no tempo, as CNVA encontram a necessidade

de se estruturar internamente, a partir do momento que o número de membros e atividades

aumenta e, por conseguinte, institucionalizar-se. Também precisam justificar sua presença

para a Igreja Católica local, na pessoa do bispo da diocese onde se encontra. Os bispos

católicos, em geral, seguem a orientação da Igreja Católica de Roma de “esperar os frutos”,

ou seja, deixar que passe um determinado período de tempo, no qual a Comunidade específica

é observada e acompanhada pelo bispo diocesano, para identificar se se trata de uma nova

fundação, ou seja, se possui característica novas e diferentes das demais associações leigas,

das diversas ordens religiosas, das associações apostólicas, e de outras formas de

sociabilidades presentes na Igreja Católica.

Nessa dissertação, procura-se verificar o surgimento e a estrutura interna de algumas

Comunidades Novas localizadas no Nordeste brasileiro, que almejam tornar-se “novas

fundações” dentro da Igreja Católica, acreditando possuírem características (carisma,

espiritualidade, missão) diversas das demais formas de vida comunitária e religiosa presentes

nessa Igreja. Nessa busca, analisar-se-á o discurso posto em questionários por lideranças

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dessas Comunidades, procurando identificar as relações presentes no seu surgimento e na sua

manutenção, assim as práticas religiosas dos seus membros.

2.5.2 Características das CNVA

A concepção de Comunidades Novas de Vida e Aliança está muito ligada às suas

características gerais. O Papa João Paulo II, na Exortação Apostólica Pós-Sinodal: Vita

Consecrata assim caracteriza os Movimentos e as Comunidades Novas (1996):

O Espírito, que ao longo dos tempos, suscitou numerosas formas de vida consagrada, não cessa de assistir a igreja, quer alimentando nos Institutos já existentes o esforço de renovação na fidelidade ao carisma original quer distribuindo novos carismas a homens e mulheres do nosso tempo, para que dêem vida a instituições adequadas aos desafios de hoje. Sinal desta intervenção divina são as chamadas Novas Fundações, com características de algum modo originais relativamente às tradicionais. A originalidade dessas novas comunidades reside no fato de se tratar de grupos compostos por homens e mulheres, de clérigos e leigos, casados e solteiros, que seguem o mesmo estilo particular de vida, inspirado às vezes numa ou noutra forma tradicional ou adaptado às exigências da sociedade atual. Também o seu compromisso de vida evangélica se exprime de formas diversas, manifestando-se, como tendência geral, uma intensa aspiração à vida comunitária, à pobreza e à oração. No governo participam clérigos e leigos, segundo as respectivas competências, e o fim apostólico vai de encontro das solicitações da nova evangelização.

O Subsídio da CNBB sobre Igreja Particular, Movimentos Eclesiais e Novas

Comunidades assim se expressa sobre as Comunidades Novas e os Novos Movimentos:

Acentuam a conversão e a vivência radical da fé, demonstrada com gestos concretos de mudança de vida e de participação no movimento. Apresentam-se com identidade católica, pois nasceram, desenvolveram-se e atuam dentro da Igreja, sentindo-se, de modo especial, vinculados ao papa e aos bispos. Inspirados também pela fé, diversos movimentos se engajam na promoção da justiça, da paz, da solidariedade com os pobres. Alguns movimentos se apresentam e se estruturam mais como formas particulares de vida comunitária do que como associações, recusando o próprio nome de “movimento” e optando por “comunidade”. “Comunidades de vida” são encontradas em diversos novos movimentos.” (CNBB: 2006, p. 19, grifos nossos).

Os grifos destacam que a CNBB vê as Comunidades Novas na sua diferenciação com

os demais movimentos existentes na atualidade dentro da Igreja Católica. Mesmo assim,

reconhece a existência de “Comunidades de vida” e procura informar sobre suas

características, incluindo-as dentro dos Novos Movimentos e destacando que elas se

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autodenominam de “Comunidades”. Ou seja, esse trecho do subsídio aponta que não foram os

bispos do Brasil que criaram as Comunidades Novas, mas elas surgem como Movimento, fora

da hierarquia da Igreja e agora estão sendo por ela analisados.

Na Wikipédia13, já existe uma interessante definição para Comunidades Novas:

As comunidades novas tratam-se de novas inspirações adaptadas dos institutos de Vida Consagrada da Igreja Católica, tendo como grande diferencial a Vida Comunitária ser formada por Sacerdotes e leigos, homens e mulheres em uma mesma Comunidade devidamente dividida, mas trabalhando junto em prol da Evangelização ou Promoção da Dignidade Humana.

Após os conceitos expostos acima e com base da pesquisa de campo realizada14,

destaca-se, brevemente, algumas características principais das Comunidades Novas de Vida e

Aliança:

a) Seu perfil é de pessoas (fiéis católicos leigos) que se dizem consagradas a Deus e

almejam um reconhecimento dessa consagração pública por parte da instituição da Igreja

Católica.

b) Sua forma de se reunir é uma adaptação dos institutos de vida consagrada já

existentes, no sentido da vida em comum, das orações comunitárias, das orações pessoais, da

vida sacramental, do compromisso com a doutrina católica, da profissão de votos de

castidade, pobreza e obediência. Entretanto, diferem desses institutos, não só por serem

formadas por sacerdotes e leigos, mas, sobretudo, pela presença de casais consagrados.

c) O que os une, além do chamado “carisma da Comunidade”, é o trabalho comum, em

geral de “evangelização” e de “promoção humana”.

d) Não se definem por território e possuem uma forte dimensão missionária, indo além

da sua diocese e até do país.

e) São fundadas com o “impulso de dar a vida pela causa de Jesus Cristo e da Igreja

Católica”, com um “ardente desejo de viver em comunidade, como os primeiros cristãos”,

como “testemunho de fé diante da sociedade secularizada”.

f) São geralmente definidas como Associação Privada de Fiéis, porque erigidas por

fiéis leigos e aprovadas pela autoridade eclesiástica, por meio do bispo da diocese em que se

localizem.

13 Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Comunidades_Novas 14 Ver Capítulo III dessa dissertação.

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g) Aspiram intensamente uma vida comunitária, expressam isso em comunidade de

vida ou comunidade de aliança.

h) Têm um carisma de fundação específico, com espiritualidade e missão próprias.

i) Identificam-se com a espiritualidade da RCC, de onde nasceram.

j) Empenham-se “no serviço a Deus, à Igreja e à Humanidade”.

As pessoas que não fazem parte dessas Comunidades Novas as vêem de maneiras

diversas. Para alguns fiéis católicos, são vistos como pessoas de uma fé intimista, como uma

forma de percepção subjetiva e egoísta da fé, porque seus membros praticam a espiritualidade

da RCC, com as chamadas “esquisitices” por quem não fazem parte do Movimento (oração

em línguas, repouso no espírito, louvor entusiástico, exorcismos, curas milagrosas) e fazem

questão de manter essa prática espiritual. (SOUSA, 2005) Tais práticas, entretanto, são

diferentes da tradição da Igreja Católica de uma forma geral.

Os novos movimentos eclesiais e comunidades ainda não receberam uma formulação

canônica completa, tratando-se de um conjunto de experiências eclesiais novas. A legislação

eclesiástica com relação aos leigos não pode ser aplicada simplesmente aos novos

movimentos, porque neles se encontram também religiosos(as) e sacerdotes. A semelhança

maior dos novos movimentos é com a vida religiosa, pois vários componentes desta última

estão presentes, como o espírito de pobreza, de castidade, de obediência, de vida de oração e

de convivência fraterna.

2.5.3 Estrutura das CVA

Na estrutura das Comunidades Novas, em geral, existem Conselhos, Departamentos,

Secretarias, Coordenadorias, de acordo com a realidade de cada Comunidade. Há uma

preocupação de organização que vem desde o grupo de oração carismático, mantido na

estrutura comunitária, inclusive com o Seminário de Vida no Espírito Santo, que acontece

dentro do grupo de oração. Quando se forma a comunidade de vida ou de aliança, apesar da

informalidade do início, já são escritas regras básicas de convivência, de vivências de orações,

de forma de governo e de modos de arrecadar renda15.

15 Este tema será retomado na análise dos dados coletados através da aplicação dos questionários.

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Para iniciar a participação em grupos de oração, as pessoas são convidadas por quem

já faz parte do grupo, também podem ser atraídas pelas formas de divulgação utilizadas, como

avisos nas Missas, panfletos, rádio, cartazes.

O Seminário de Vida no Espírito Santo, o qual culmina com o batismo no Espírito,

também é uma das formas de atração utilizada por grande parte das Comunidades. O

Seminário tem as mesmas características dos grupos de oração, com cantos, orações e

pregações baseadas na Bíblia. A diferença é que nos Seminários há uma seqüência de temas a

serem tratados a cada semana ou em um final de semana

Com o tempo, quando a Comunidade resolve oficializar-se, em geral como Associação

Privada de Fiéis, é necessária a redação do Estatuto da Associação, que contém várias

exigências, como a indicação do seu regime e forma de governo dessa Associação, quem o

compõe, os membros da diretoria, as assembléias, as visitas da autoridade eclesiástica

competente à comunidade, as formas de ingresso e de saída dos membros, entre outras

exigências presentes no Código de Direito Canônico (C. 298 a 311).

A divisão em Comunidade de Vida e Comunidade de Aliança se dá pela forma como o

membro vivencia a sua pertença à comunidade, não havendo uma separação hierárquica ou

espiritual entre elas, compartilhando da mesma identidade comunitária. Ou seja, o membro da

Comunidade de Vida (homem/mulher, casado/solteiro, padre/freira) deixa sua residência e vai

morar em uma casa da Comunidade, comprometendo-se em tempo integral, ou sendo-lhe

permitido estudar e/ou trabalhar, deixando a renda do trabalho na própria Comunidade de

Vida.

O membro da Comunidade de Aliança continua em sua residência e em suas

ocupações na sociedade, como família, trabalho, estudos, mas assume as regras de vida da

Comunidade, no carisma, nos serviços de evangelização, na espiritualidade, na missão, na

fraternidade, na comunhão de bens, destinando parte de sua renda, em geral 10% para o

sustento da Comunidade.

Tem uma proposta de inserção na sociedade, fazendo todas as suas atividades

seculares a partir do espírito e vivências da Comunidade, com o objetivo de levar para as

diversas realidades seculares em que está inserido, os valores cristãos vivenciados e

assumidos pela comunidade da qual faz parte. Divide o seu tempo, além do trabalho, da

família, dos amigos, com os trabalhos desenvolvidos pela comunidade e com os exercícios

espirituais presentes nas regras de vida da comunidade (oração do terço, participação na

missa, estudo bíblico, oração pessoal e comunitária).

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Comunidade de Vida e Aliança

Coordenação Geral Conselho Geral

Formador-Geral

Formadores Comunitários

A estrutura das Comunidades Novas de Vida e Aliança vai se modificando de acordo

com a etapa no processo comunitário, mas não há um padrão definido. A figura 1, extraída da

observação e das leituras feitas, mostra um dos modelos presentes na estrutura organizacional

das CNVA.

Figura 1 – Modelo de estrutura das CNVA

A figura acima demonstra a importância dada à formação nas CNVA, pois há um

Formador Geral que orienta e supervisiona o planejamento de formação de toda

Comunidade. A ele estão diretamente ligados os Formadores Comunitários, que coordenam

os grupos de formação dos membros até chegar à consagração (Vocacional, Postulantado,

Noviciado) e depois os grupos dos consagrados da Comunidade de Aliança (CA) e da

Comunidade de Vida (CV), e os Formadores Pessoais, que exercem uma função mais

direcionada a cada membro, personalizada, orientando-os com relação à fé, à doutrina e a

aspectos humanos, como o autoconhecimento.

Formadores Pessoais

Coordenadores de Ministérios

Outros Conselhos

Formador do Vocacional – vocacionados

Formador do Postulantado – Postulantes

Formador do Noviciado - Noviços

Form. dos consagrados da Com. Vida

Form. dos consagrados da Com. Aliança

MEMBROS

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2.5.4 Os membros das CNVA

Em geral, são considerados membros das Comunidades Novas aqueles que passam por

algumas etapas de formação, até chegar a uma consagração temporária. As fases de formação

são semelhantes às da vida religiosa como, por exemplo, vocacional, postulantado e

noviciado.

O principal objetivo dos membros de uma Nova Comunidade de Vida e/ou Aliança é a

atualização da experiência de vida comunitária dos primeiros cristãos, inclusive com o fim de

“Evangelizar com novos métodos, respondendo aos anseios do homem contemporâneo”

(discurso dos líderes das CNVA).

Nesse discurso, encontra-se presente a necessidade de adaptar-se ao panorama atual da

religião no mundo, entrecortado pelo poder da demanda e pela lógica do mercado religioso,

estudado por sociólogos da atualidade, que consideram que a religião, na atualidade, foi

transformada em um “item de consumo, oferecido aos indivíduos no mercado de maneira

semelhante à dos bens simbólicos, tais como estilos de vida e de identidade cultural”

(GUERRA, 2000), na linha já iniciada por Peter Berger (1985). Esse panorama atual,

especialmente no Brasil, seria causado por uma diminuição da força da tradição católica na

escolha da religião, que provoca abertura para variadas propostas de religiosidade.

Os membros das Comunidades Novas acreditam que estão fazendo uma experiência

religiosa que terá conseqüências em todos os aspectos da vida. Nesse sentido, fazem uma

“consagração” de sua vida a Deus, aproximando-se de uma “consagração religiosa”, tratada

pela doutrina católica como “estado religioso”, quando os indivíduos professam votos, ou

outros vínculos sagrados, obrigando-se à prática dos conselhos evangélicos de castidade

consagrada a Deus, de pobreza e de obediência, que se fundamentam nas palavras e nos

exemplos de Cristo (LG 43). Essa consagração os faz “separados” do mundo, ficando

“destinados” para Deus e buscando em tudo imitar os sentimentos de Cristo.

As Comunidades Novas costumam usar as seguintes expressões para falar da

diversidade de estilos de vida existentes em seu seio: “homens, mulheres, casados, solteiros,

celibatários, diáconos e sacerdotes”. Essa forma de vida cristã comunitária ainda não encontra

definição no Código de Direito Canônico, que legisla sobre toda vida e ação da Igreja. Por

isso, as Comunidades Novas se enquadram como Associações de Fiéis, estando diretamente

ligada ao Pontifício Conselho para os Leigos, no âmbito do Vaticano.

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A dificuldade de enquadrar as CNVA no Código de Direito Canônico é devido aos

diversos estados de vida (casais, celibatários e clérigos) vividos concomitantemente dentro da

mesma estrutura. Portanto, as Comunidades Novas não possuem o caráter de ordens

religiosas, e seus membros não são considerados religiosos, mas leigos, apesar de alguns

assumirem o celibato16 (homens e mulheres). Vale lembrar que o celibato não se confunde

com a castidade, esta diz respeito a uma virtude cristã, que deve ser buscada pelo fiel cristão,

independente do seu estado de vida, seja solteiro/celibatário ou casado. Fora os leigos

(solteiros, celibatários e casados), existem apenas os cléricos/sacerdotes. Como explica

Emmir Nogueira (1999, p. 27):

(...) nós, Comunidades Novas ou Novas Fundações, não podemos nos denominar ‘Vida Consagrada’, ainda que assim nos identifiquemos entre nós, em nossas conversas e nossos discursos. O termo Vida Consagrada – VC, como já citamos acima, identifica os Institutos de Vida Religiosa e as Sociedades de Vida Apostólica. Trocando em miúdos queremos dizer que o termo VC, não se aplica a nós, basicamente por causa da diversidade de características que estão reunidas em nossas realidades comunitárias. (...) não somos Vida Consagrada porque o celibato consagrado não é vivido igualmente por todos, mas apenas alguns, e por outros é vivido ‘um dever de castidade próprio da vida conjugal’ (grifos nossos).

Percebe-se que as Comunidades Novas trazem traços tanto da vida consagrada como da

vida laical. Algumas Comunidades, diferindo da grande maioria, almejam assumir, no Direito

Canônico, a definição de Instituto de Vida Religiosa, postulando-a junto ao Vaticano. Nesse

caso, sairiam da categoria de leigos e iriam para a categoria de ordem religiosa17.

Os leigos (apesar de o termo leigo ter adquirido o sentido de alguém alheio a

determinado assunto) são aqueles que não são religiosos, de acordo com o Direito Canônico

da Igreja Católica. Nas Comunidades Novas, eles fazem uma consagração religiosa, mas

continuam sendo considerados leigos pelo Direito Canônico, pois a Associação da qual fazem

16 “O celibato é o estado de uma pessoa solteira, sexualmente abstinente, que fez voto de castidade”. (Wikipédia) O voto do celibato é uma condição para o sacerdote católico e para os religiosos católicos (freiras, freis, irmãos, irmãs). 17 É caso da Toca de Assis, na qual não há a presença de casais como consagrados, devendo homens e mulheres que lá se consagram, assumirem o celibato, além de absorvem várias práticas das ordens religiosas já existentes como o uso de vestimentas e sinais de consagração religiosa (manto marrom, siglo na cintura, cabelos cortados), não há sacerdotes em seu meio, a não ser o fundador, Pe. Roberto José Lettieri. A Toca de Assis se auto-declara uma “Fraternidade Católica que se inspirou nos ensinamentos de São Francisco, no seu zelo eucarístico e amor aos pobres” e se chamam os “Filhos e Filhas da Pobreza do Santíssimo Sacramento”. Ver site da Toca de Assis www.tocadeassis.org.br

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parte, a Comunidade Nova, não é considerada uma ordem religiosa. A Constituição

Dogmática Lúmen Gentium sobre a Igreja define que

por leigos entende-se aqui o conjunto de fiéis, com exceção daqueles que receberam uma ordem sacra ou abraçaram o estado religioso aprovado pela Igreja, isto é, os fiéis que, por haverem sido incorporados em Cristo pelo batismo e constituídos em povo de Deus, e por participarem a seu modo do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, realizam na Igreja e no mundo, na parte que lhes compete, a missão de todo povo cristão. Aos leigos compete, por vocação própria, buscar o reino de Deus, ocupando-se das coisas temporais e ordenando-as segundo Deus. (LG 31).

Como leigos, os membros das Comunidades Novas entendem poderem levar valores da

Igreja naqueles lugares onde só por meio deles a Igreja pode ir. Tais membros das

Comunidades Novas são instruídos a “levar a sério” o seu batismo como cristãos e a

consagrar todos os atos de sua vida, realizando-os de uma forma espiritual, no Espírito de

Cristo. Assim, convertem o seu trabalho cotidiano, a vida familiar e conjugal, as obras,

orações e trabalhos na igreja, em “sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo”

(LG 34).

Podem eles assumir os estados de vida de casado ou celibatário. Se for solteiro(a) será

considerado sempre em processo de definição do estado de vida. Estado de vida é uma

expressão muito utilizada entre os membros das Comunidades Novas, diz respeito à própria

identidade da pessoa, encontrando-se enraizado na área da afetividade. Segundo Emmir

Nogueira (2006, p. 425), é “aquele chamado insubstituível de Deus para que o sirvamos como

casados ou celibatários ou no ministério sacerdotal”. Existem, portanto, três estados de vida: o

celibato, o sacerdócio e o matrimônio. Antes do Concílio Vaticano II e até algum tempo após

ele, discernir o estado de vida era restrito apenas àqueles que queriam entrar na vida religiosa

ou no sacerdócio, sendo o matrimônio considerado uma “não eleição de Deus” (NOGUEIRA:

2006).

Os solteiros, moças e rapazes, acolhidos nas Comunidades Novas, se residem em

Comunidade de Vida, em geral moram em casas separadas, mas próximas, para fazerem

refeições, orações e trabalhos em comum. Algumas Comunidades Novas, como a Arca da

Aliança (Joinville/SC)18, ao acolherem um novo membro que ainda não tem o seu estado de

vida definido, ou seja, é solteiro, exige que ele faça um “celibato temporário” para, com o

tempo, com a ajuda dos formadores da Comunidade, decidir sobre um dos estados de vida.

18 Ver site http://www.arcadaalianca.com.br.

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Os celibatários, ou seja, aqueles que decidem optar por esse estado de vida permanente,

fazem o voto de celibato com rito próprio e solene, mas não são considerados religiosos,

porque vivem o celibato sob a orientação das regras de vida da Comunidade Nova, que é

considerada uma Associação de Fiéis Leigos. Homens e mulheres podem optar por este

estado de vida.

Os casais, aqueles que abraçaram o matrimônio, encontram-se em um estado de vida

muito valorizado nas Comunidades Novas. Os solteiros que desejem escolher essa opção de

vida são preparados e formados adequadamente para assumirem o matrimônio, havendo

vários depoimentos de casais que se conheceram e se casaram na Comunidade. Os filhos

gerados por casais consagrados nas Comunidades são educados e formados na fé, mas há

orientação para que os deixem livres para escolher uma futura opção de vida. As residências

dos casais que moram na Comunidade de Vida são núcleos separados das dos solteiros,

entretanto, há uma preocupação de que se façam refeições, orações e trabalhos junto com

estes.

Os sacerdotes, ou clérigos, cuja vocação se originou na Comunidade Nova, se ordenam

sacerdotes segundo o carisma dessa Comunidade. Como a maioria delas não possui

autorização da igreja oficial para formar e ordenar sacerdotes, eles são ordenados, em geral,

por bispos amigos da Comunidade, que os colocam em disponibilidade da Comunidade Nova

da qual fazem parte. O arcebispo de Palmas(TO), Dom Alberto Taveira, responsável oficial

da igreja pelas Comunidades Novas no Brasil, em geral, ordena vários sacerdotes, que são por

ele acompanhados durante a formação anterior, e os deixa viverem conforme o carisma e a

direção da Comunidade Nova19.

Para um membro chegar à consagração passa por várias etapas de formação (em geral

denominadas vocacional, postulantado/discipulado e noviciado), no final das quais, se

considerado decidido e preparado, profere compromissos com a Comunidade, em rito

litúrgico próprio, indicando sua decisão de que realmente pertence àquela família.

Após a consagração, o membro é considerado formado na Formação Inicial, passando

para a Formação Permanente, apto para sair à frente em novas missões que por ventura a

Comunidade vá iniciar em outros locais e adquire mais responsabilidades com relação ao

carisma da Comunidade. Em geral, apenas os membros consagrados votam em assembléia e

podem participar dos Conselhos e Diretorias da Comunidade.

19 Ver artigo no site: http://blog.cancaonova.com/vocacional/2007/11/23/a-cancao-nova-esta-em-festa-6-novos-padres/

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2.5.5 Vocação, espiritualidade, carisma, fundadores e missão das CNVA

As Comunidades Novas, como uma nova forma de vida consagrada na Igreja Católica,

possui uma vocação20 específica, com características próprias de espiritualidade, carisma e

missão. A seguir serão tratados esses aspectos vivenciados pelas Comunidades em estudo.

A vocação “é a forma concreta de viver um carisma, dirigida por seus Estatutos,

Tradição, Espiritualidade e Espírito do Fundador. Uma vocação é parte da identidade da

pessoa (...) e é eterna” (NOGUEIRA, 2007, p. 6). Ou seja, seria a própria identidade da

Comunidade Nova. “A identidade é composta também por símbolos de uso comum, como

cruz, figuras de Jesus Cristo, vestimentas e logomarca da comunidade” (CNBB, 2006, p. 22).

Por exemplo, a Comunidade Obra de Maria21 declara “Usamos uma medalha no peito onde

temos o Cristo Crucificado no calvário, ainda vivo, Maria e o discípulo João aos pés da cruz,

onde Jesus pede a ele para levar a Sua Mãe para casa.".

A espiritualidade da Comunidade Nova “é a forma de manifestar o mistério

cristológico da vocação na vida espiritual, fraterna e apostólica” (NOGUEIRA, 2007, p. 6).

Os membros das Comunidades, sejam de vida ou de aliança, devem dividir o tempo entre

trabalhos e orações. A espiritualidade é tida como o alicerce da vida em comum e da vida de

trabalhos, por isso, o tempo para estudo bíblico, orações pessoais, adorações, participação na

celebração eucarística, deve ser preservado.

Em geral, essa espiritualidade é marcada (a) pelo uso dos carismas do Espírito

Santo, que revela sua origem na RCC; (b) por devoção mariana, como oração do Rosário e

do Ofício de Nossa Senhora da Conceição; (c) por adoração ao Santíssimo Sacramento,

seja durante a celebração da missa ou fora dela, pois os membros de várias Comunidades

devem passar alguns minutos, diária ou semanalmente, em adoração ao Corpo de Cristo

consagrado e/ou participar da celebração da eucaristia (missa); (d) por devoção a alguns

santos considerados padroeiros ou baluartes da Comunidade, sendo os mais populares Santa

Terezinha do Menino Jesus, São José, São João Evangelista, São Padre Pio, entre outros.

O carisma próprio é o que une a diversidade de estados de vida dos membros das

Comunidades Novas. A palavra carisma pode ser considerada um neologismo criado por

Paulo, que provém da palavra charis, graça (dom de Deus derramado na humanidade em

Jesus Cristo), quando esta toca uma determinada pessoa, tornando-se charisma, dom

20 Vocação aqui é entendido como um chamado específico que está em cada pessoa, diz respeito a sua própria existência e deve ser decifrado. 21 Ver site da Fraternidade das Comunidades Novas do Brasil: http://www.novascomunidades.org.br.

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particular (NOGUEIRA, 1999). Após vários estudos os teólogos têm usado a palavra

carisma, com c minúsculo, como “dom, graça, manifestação do Espírito Santo de forma

infusa (Is 11) ou efusa (I Cor 12), ordinária (Ef 4) ou extraordinária (I Cor 12)” (Ibid, 1999, p.

6) e carisma, com c maiúsculo, como “graça manifestada através de um fundador (ou

fundadores) segundo a necessidade do tempo histórico e eclesial” (Ibid, 1999, p. 6). O

fenômeno da vida religiosa é lido nessa ótica a partir do Concílio Vaticano II.

O carisma próprio de uma Comunidade Nova provém de uma experiência de

fundação vivida pelo fundador(a) ou fundadores da comunidade, da qual obtém um

“chamado” para viver de forma específica um dos aspectos da realidade divina ou da vida

humana de Cristo. Os fundadores, em geral, percebem o “chamado de Deus” por meio de

experiências de oração que, aos poucos, vão sendo confrontadas com a vida, levando-os a

perceber o projeto de Deus sobre si e sobre outras pessoas, uma identidade a ser assumida,

uma imagem divina a ser vivida na própria história, uma semelhança com Deus a ser

manifestada.

Essa experiência de fundação, vivida pelos fundadores das Comunidades Novas, pode

ser considerada uma “hierofania” (algo de sagrado se nos revela), termo utilizado por Mircea

Eliade (1996, p. 16), para quem o sagrado “manifesta-se sempre como uma realidade

inteiramente diferente das realidades ‘naturais’ (...) como algo absolutamente diferente do

profano”.

O termo fundador é usado no Concílio Vaticano II para designar todos os que

instituíram comunidade de vida consagrada. “São fundadores aqueles que definiram a índole

própria, a própria função, o espírito e as intenções do instituto (PC2). Estes são vistos como

exemplo de santidade (...)” (NOGUEIRA, 1999, p. 5). Os elementos essenciais que permitem

encontrar a identidade de um fundador(a) são assim colocados por Emmir Nogueira (1999, p.

6): (a) a inspiração, recebe um chamado preciso do Espírito Santo para dar vida a uma nova

comunidade na Igreja, tomando-a de uma forma irresistível, até para direções opostas às que

ela gostaria; (b) a capacidade de comunicar a própria inspiração e de exercer um certo influxo

sobre as pessoas afim de atraí-las e envolvê-las em um projeto comum de vida; (c) o ter dado

vida, de alguma forma, a um instituto; (d) o ter dado ao grupo as normas de vida, mesmo que

estas tenham sido escritas só após a sua morte; (e) o acolhimento da nova obra por parte da

hierarquia competente da Igreja.

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A missão da Comunidade Nova está diretamente ligada à sua espiritualidade e ao seu

carisma e diz respeito às várias atividades realizadas pela Comunidade para levar ao mundo o

que o seu carisma e a sua espiritualidade nela suscita.

Muitas Comunidades consideram como missão as ações evangelizadoras através de

diversos meios: rádio, TV, eventos, shows, pregações, cursos, visitas às casas, saída pelas

ruas, engajamento nas atividades da paróquia e diocese. Organizam Projetos de

Evangelização, que são realizados dentro dos espaços da igreja paroquial ou fora dela, nas

ruas, casas, escolas, espaços para eventos, são, em geral, planejados conforme a abertura que

a Comunidade encontre. Algumas possuem “Centro de Escuta da Vida”, que é um projeto

mais específico e, presumidamente, deve ocorrer dentro da própria comunidade ou em um

espaço na igreja paroquial.

Na estrutura das Comunidades estão previstas, em geral, missões sociais das mais

variadas formas, como o acolhimento a pessoas doentes, abrigos de idosos, de crianças, de

alcoólatras ou dependentes químicos, pessoas portadoras de HIV, ação social com

comunidades carentes, visita aos hospitais e aos presídios, educação com menos favorecidos.

Há comunidades que também possuem missões no campo educacional, possuindo, inclusive,

escolas e universidades. O que se observa nessas missões, no que se refere às ações sociais, é

que a ação só acontece após algum tempo de vivência comunitária e trabalhos com a

Evangelização.

É razoável pensar que a estrutura hierárquica da Igreja Católica procurasse interrogar

aos fundadores das Comunidades Novas o que pretendiam fazer, viver, realizar. Há um

interessante depoimento do fundador da Comunidade Arca da Aliança, Elias Dimas dos

Santos, quando, no início da experiência de comunidade de vida, um dos membros foi

indagado sobre qual seria o carisma da Comunidade: “Explique-me primeiro o que é carisma.

O padre lhe disse: ‘Carisma é aquela dimensão de Cristo que queremos professar’. O rapaz

concluiu: ‘Pode ser que mude, mas nós viemos aqui para viver todas as dimensões de Cristo”

(SANTOS, 2003, p. 18). Nesse depoimento, vemos a espontaneidade e a despreocupação das

pessoas que fundam Comunidades Novas com os termos teológicos utilizados pela Igreja

Católica.

Para a Igreja Católica, a grande novidade existente nas Comunidades Novas de Vida e

Aliança é a presença de casais consagrados vivendo em comum com solteiros(as),

celibatários(as), padres, tendo em vista que, até o momento, o direito canônico só prevê uma

consagração religiosa, com vida em comum, para pessoas que também sejam celibatárias.

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2.5.6 A economia nas CNVA

Os membros da Comunidade de Vida deixam tudo e passam a morar em uma casa da

comunidade, em “missão”, esses membros se organizando-se para arrecadar donativos ou

receber, pela “providência divina”, os bens necessários para viver, como alimentos, roupas e

sapatos.

Muitas CNVA arrecadam donativos de benfeitores ou recebem doações espontâneas e

as dividem entre os membros, a partir de subgrupos, deixando um responsável pelas

necessidades das pessoas que dele fazem parte. Outras dividem os donativos por meio de

mesadas para os membros casados. E há ainda aquelas que permitem que os casais com filhos

trabalhem fora da comunidade e repartam sua renda entre a comunidade e as necessidades dos

filhos.

A produção e venda de livros, revistas, CD's, DVD's, objetos artesanais, artigos

religiosos em geral, também são fontes de renda; bem como são fontes de renda o aluguel de

casas para retiros de grupos, a venda de roupas usadas em brechó, a venda de alimentos e

bebidas (doces, salgados nas lanchonetes e restaurantes).

A Comunidade Canção Nova, por exemplo, que recebeu o seu reconhecimento

pontifício em 2008, possui 672 missionários da comunidade de vida (celibatários, solteiros,

casados e sacerdotes), ou seja, pessoas que deixam tudo e moram em uma casa de missão da

Canção Nova. Eles trabalham oito horas por dia, apesar de não receberem salário no final do

mês. Para suprir as necessidades básicas dos que moram em casa de solteiros, a comunidade

oferece uma quantia quinzenal, entregue a uma pessoa da casa, chamada “caixinha”.

(REBOUÇAS, 2008).

Há comunidades que dão a permissão aos seus membros de Vida (que moram nas

casas da comunidade) para trabalharem e/ou estudarem fora. Nesse caso, a renda será

revertida para toda a comunidade ou será dividida também com os filhos, caso os tenha. Em

sua grande maioria, o trabalho ocorre dentro da própria “obra”, como é chamada a

comunidade, seja com evangelização, através de rádios, TVs, livros, eventos (retiros, shows),

visita as casas das famílias, fazendo parte da missão da Comunidade.

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3 CNVA NO NORDESTE BRASILEIRO

O alvo desta pesquisa são as Comunidades Novas de Vida e Aliança localizadas no

Nordeste brasileiro, integrantes da Regional Nordeste 2, divisão administrativa adotada pela

CNBB22, que envolve os Estados da Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Norte.23

A escolha desse universo foi possibilitada pela realização de encontros anuais nesta

região que congregam todas ou a maioria das Comunidades a ele pertencentes e pela

facilidade de acesso aos líderes de várias comunidades, permitindo realizar não um estudo de

caso envolvendo uma comunidade apenas, mas permitindo mapear a situação do processo

comunitário vivido por um conjunto amplo de comunidades 24.

Na pesquisa, objetivou-se investigar o processo comunitário vivenciado por essas

comunidades, no contexto religioso católico atual, especificamente no Nordeste brasileiro,

desde o seu surgimento, verificando as dinâmicas decorrentes, com ênfase nos aspectos de

vivência religiosa dos seus membros.

As Comunidades Novas de Vida e Aliança são formadas, em geral, por grupos de

oração da Renovação Carismática Católica que, após um tempo de existência, decidem

assumir mais compromissos com os membros do próprio grupo e com a Igreja Católica, seja

na Evangelização ou em outros serviços da Igreja.

No discurso dos fundadores e dos membros dessas comunidades, as grandes

motivações para fundá-las ou a elas aderirem são, em geral, experiências pessoais e fortes

22 A CNBB dividiu os Estados do Brasil em 17 Secretariados Regionais: Regional Norte 1 (Norte do Amazonas e Roraima), Regional Norte 2 (Amapá e Pará), Regional Nordeste 1 (Ceará), Regional Nordeste 2 (Alagoas, Paraíba, Pernambuco e R. G. do Norte), Regional Nordeste 3 (Bahia e Sergipe), Regional Nordeste 4 (Piauí), Regional Nordeste 5 (Maranhão), Regional Leste 1 (São Paulo), Regional Leste 2 (Espírito Santo e Minas Gerais), Regional Sul 1 (São Paulo), Regional Sul 2 (Paraná), Regional Sul 3 (Rio Grande do Sul), Regional Sul 4 (Santa Catarina), Regional Centro-Oeste (Distrito Federal, Goiás, Tocantins e parte do Mato Grosso), Regional Oeste 1 (Mato Grosso do Sul), Regional Oeste 2 (Mato Grosso) e Regional Noroeste (Rondônia, Acre e Sul do Amazonas). Fonte: site da CNBB: www.cnbb.org.br. 23 O Regional Nordeste 2 foi criado em 1964, na VI Assembléia Geral Ordinária da CNBB, realizada em Roma, em setembro / outubro, durante o Concílio Ecumênico Vaticano II, foram votados os desdobramentos de alguns Secretariados Regionais. Na sessão plenária do dia 30 de setembro de 1964, foi aprovado o desdobramento do Secretariado Regional Nordeste em três Regionais: Nordeste 1 (Maranhão, Piauí e Ceará); Nordeste 2 (Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas); e Nordeste 3 (Bahia e Sergipe). O Regional Nordeste 2 apresentou, como Secretário Regional, Dom Helder Pessoa Câmara, e a capital Recife como sede do Regional. A fundação oficial do Regional Nordeste 2, bem como dos demais Regionais da CNBB, ocorreu no dia 8 de junho de 1971, em reunião da Presidência da CNBB, no Rio de Janeiro. A ata da reunião foi aprovada, assinada e lavrada em cartório, para fins de comprovação jurídico-civil. (http://www.cnbbne2.org.br/)

24 A pesquisadora reside no Estado da Paraíba e participa como membro de uma comunidade em João Pessoa/PB, de modo que pode estar também presente nos encontros realizados nos dois últimos anos

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com Deus que lhes fala: após as quais vão acontecendo outras, aumentando o desejo de

fazerem uma aliança com esse Deus, a Ele consagrando sua vida e seu tempo, para ajudarem

na evangelização e nos serviços da Igreja.

Com a fundação, surge uma preocupação em manter a Comunidade em atividade e,

conseqüentemente, estruturá-la em vários aspectos, como formação dos membros, atividades

de evangelização, meios de arrecadação de contribuições financeiras, rotina. Além disso, há

um cuidado constante com o carisma próprio vivido pela comunidade, sua descoberta,

descrição e escritos para, posteriormente, formularem um Estatuto da Comunidade, no qual

constarão todos esses aspectos: financeiro, espiritual, formativo, entre outros.

No decorrer do processo, são enfrentados problemas, como saída e entrada de

membros, crises espirituais, financeiras, humanas. Uma das formas encontradas pelos

membros para resolver ou evitar esses e outros problemas, foi a formação, procurando

conhecer a experiência de Comunidades mais antigas, lendo livros de direção espiritual, de

formação humana, de doutrina da Igreja Católica, até surgirem as Escolas de Formadores,

difundidas em várias partes do Brasil e em outros países, como a Itália.

Deter-nos-emos na descrição do espaço desta pesquisa, ou seja, uma escola de

formação, buscando percebê-la como um espaço comunitário que reúne periodicamente os

líderes regionais que desempenha um papel no processo de estruturação e permanência das

Comunidades Novas de Vida e Aliança.

3.1 Metodologia – a pesquisa empírica

A pesquisa empírica foi realizada durante eventos que congregaram Comunidades

Novas de Vida e Aliança localizadas na região Regional Nordeste 2, ocorridos na Paraíba, nos

últimos dois anos. Foi feito uso dos seguintes métodos para coleta de dados: aplicação de

questionários e pesquisa documental em publicações produzidas por algumas dessas

Comunidades, como as alusivas aos eventos e outras tais como página na internet, apostilas,

estatutos; e a descrição etnográfica. Considerando que a aplicação do questionário foi feita

durante a realização da escola de formação, um espaço de interação e sociabilidade entre os

líderes das comunidades, foi aproveitada a oportunidade de utilizar o método etnográfico para

detectar outros aspectos da vida comunitária em ação. Objetivou-se com o uso dos dois

instrumentos de pesquisa a complementaridade entre os dados visando obter maior

confiabilidade.

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3.1.1. Questionário

O objetivo do questionário25 foi coletar dados sobre o perfil social e o discurso

religioso dos membros, líderes e fundadores das CNVA do Regional NE2, com o objetivo de

investigar como ocorre o processo de fundação e crescimento dessas Comunidades. As

questões foram de dois tipos: fechadas, abertas e relacionadas. Quanto ao conteúdo,

abordaram fatos, atitudes, crenças e comportamentos.

O questionário elaborado foi dividido em duas partes: a primeira, com questões

referentes ao perfil pessoal do membro da comunidade e a segunda, voltada para o processo

comunitário. Ele foi aplicado no 2° módulo da Escola de Formadores de líderes de

Comunidades dos 04 Estados citados, que aconteceu em novembro de 2007, em Campina

Grande/Pb, no qual a pesquisadora estava presente, realizando também o trabalho por meio da

observação participante. Os questionários foram entregues a todos os participantes (cerca de

100), para serem respondidos a mão no decorrer do encontro, mas apenas 33% deles foram

devolvidos à pesquisadora preenchidos. A identificação pessoal foi opcional.

3.1.2 Descrição etnográfica e observação participante

Foi utilizada também a descrição etnográfica, especificamente fazendo uso dos

métodos de observação participante, e de análise interpretativa. Através da observação de

comportamentos e práticas dos integrantes das comunidades, buscou-se encontrar os

significados de suas ações, na tentativa de desenvolver uma pesquisa essencialmente

qualitativa. A participação foi feita nos encontros das CNVA pertencentes ao Regional NE2,

cuja programação incluía palestras, partilhas em grupo, ritos litúrgicos, como a celebração

eucarística, orações em grupo, orações pessoais.

Por meio da observação participante procurou-se chegar ao conhecimento dessas

comunidades a partir do discurso dos seus líderes. Como a pesquisadora também faz parte de

uma dessas comunidades, assumindo a função de formadora, a sua participação nessa escola

foi natural, não causando estranhamento entre os demais participantes. No decorrer dos

eventos, os participantes foram informados pela pesquisadora que ela estava colhendo dados

para uma pesquisa científica. A reação da maioria foi de naturalidade, entusiasmo e até

25 Ver modelo do questionário no apêndice A.

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encorajamento, alguns ficando inclusive interessados no resultado da pesquisa. Poucos foram

os que se fizeram indiferentes ou demonstraram estranhamento.

A metodologia etnográfica leva o pesquisador a dialogar profundamente com o grupo

humano estudado, por meio de uma observação rigorosa, impregnando-se lenta e

continuamente da vivência desse grupo. Para tanto, precisamos sair das convenções da época,

cultura e meio social em que vivemos, que, segundo Laplantine (2004: p, 14), nos diz o que

“é preciso olhar e como é preciso olhar”. É preciso aprender a redirecionar o olhar, para nos

“espantar com aquilo que nos é mais familiar (aquilo que vivemos cotidianamente na

sociedade em que nascemos) e tornar mais familiar aquilo que nos parecia inicialmente

estranho e estrangeiro” (ibid, p. 15).

Essa seria a experiência de campo na etnografia, no intuito de “perceber de dentro”,

inclusive no seu íntimo, os temas obsessivos de uma sociedade, seus ideais, suas angústias

(ibid). É preciso sair da nossa comodidade e misturar-se com a realidade do outro,

estabelecendo trocas, muitas vezes, “abaixando-se” para alcançar o outro. É bom lembrar

também que a descrição nunca é neutra, pois não se pode eliminar aquele que escreve e vai

progressivamente construindo um objeto.

Após a experiência do ver e compreender, é necessário dar a ver aos outros, atribuindo

forma escrita ao que se viu, que deve ocorrer de maneira descritiva, para procurar dar conta,

nomeando a totalidade do que vemos. Laplantine (2004) menciona as especificidades da

descrição etnográfica: busca compreender o mundo fora do escritor; trata de fenômenos

sociais; observa um contexto e uma história; é direta em sua forma de expressão; exige

globalidade, no sentido de, a partir dos fatos concretos, estabelecer relações. O citado autor

define assim essa metodologia (2004, p. 87):

A descrição etnográfica, como acontece com as outras três formas de descrição, consiste na aceitação incondicional da realidade tal como ela aparece. Ela procede de uma atitude, que eu chamaria a ingenuidade, a suspensão do saber e do julgamento que é a atitude inicial da filosofia de Sócrates a Husserl: façamos com se não soubéssemos nada.

No caso deste trabalho, procurou-se fazer uma descrição etnográfica da “Escola de

Formadores” de líderes de Comunidades Novas localizadas no Regional Nordeste2, entendida

como uma experiência comunitária, por meio da observação participante, que aconteceu no

período de 2007 a 2008, no 2° e no 4° módulos desse curso/evento, em sua primeira versão,

organizado pela Comunidade Remidos no Senhor.

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Essa “Escola de Formadores” é dividida em 08 módulos, de 05 dias completos para

cada um, sendo oferecido um módulo por semestre. Esses eventos reúnem grande parte das

lideranças das Novas Comunidades de Vida e Aliança dos Estados do Regional 2, tendo em

média 100 participantes. A divulgação ocorre por meio eletrônico: colocando-se notas nos

diversos sites das Comunidades Novas e enviando e-mails. As inscrições ocorrem por meio de

convites também enviados eletronicamente às Comunidades, e são feitas mediante o

pagamento de taxa. Não se sabe se há patrocinadores, porque não são divulgados durante o

evento.

A observação participante foi realizada pela pesquisadora ao longo da programação

dos eventos, inclusive nas atividades rituais e pedagógicas, por exemplo, fazendo os

exercícios sugeridos, nas orações comunitárias, pela participação durante as palestras,

partilhando o microfone, indo à frente quando solicitada.

Foi feito registro da observação em fotografias e descrição em caderno de campo, no

qual, além de descrever o que era visto, também foram transcritas conversas com os

participantes, além da anotação de fatos que chamavam a atenção e pontos considerados

“chaves”, para maior investigação posterior. Foram ainda adquiridos a gravação em CD das

palestras realizadas, bem como o material pedagógico utilizado (apostilas e livros).

Nos depoimentos colhidos em conversas informais com os participantes foi possível

perceber a repetição de temáticas, de pensamento e direcionamentos ou orientações comuns,

como, por exemplo, que a formação estava muito intensa e oportuna e que teriam muitas

mudanças a fazer ao retornarem às comunidades de origem.

No quarto módulo, ocorrido em setembro de 2008, foi realizada apenas a observação

participante, buscando perceber se as características dos grupos relatadas pelos líderes

continuavam as mesmas, o que tinha se intensificado, o que estava diferente, além de observar

detalhes ainda não percebidos.

Os módulos da Escola de Formadores não foram estudados por si só, ou seja, a sua

descrição é feita com o intuito de perceber também as práticas religiosas dos membros

(líderes e fundadores) igualmente adotadas no espaço comunitário das mesmas. Além disso,

trata-se de mapear o modo como as Comunidades Novas de Vida e Aliança estão se

organizando nos Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas e Pernambuco. Ao

analisar um grupo formado por líderes, entre os quais alguns fundadores de Comunidades,

teve-se uma visão dos principais objetivos do grupo, da maneira como as atividades e práticas

são direcionadas.

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O processo comunitário de surgimento e transformações da Comunidade Nova

também pode ser verificado nos relatos trazidos pelos fundadores e líderes, muitos deles

presentes na Comunidade desde sua fundação, tendo observado também as dinâmicas

decorrentes.

Sendo assim, a amostra analisada, de líderes e fundadores, proporcionou-nos uma

visão das estratégias propostas e dos encaminhamentos dados aos demais membros das

Comunidades Novas de Vida e Aliança, rumo que tomou a presente dissertação, a partir da

opção dada pelo trabalho de campo realizado nas Escolas de Formadores.

Por outro lado, observando a estrutura e o funcionamento dessas Escolas de

Formadores, e percebendo a sua importância para os líderes de Comunidades Novas lá

presentes, decidiu-se descrevê-las, objetivando uma análise das atuais preocupações e práticas

das CNVA do Regional NE2.

3.2 A escola de formadores de líderes de Comunidades Novas de Vida e Aliança do

Nordeste em Campina Grande/PB

A seguir serão descritos o segundo e o quarto módulos da Escola de Formadores de

líderes de Comunidades Novas de Vida e Aliança do Regional NE2, organizada pela

Comunidade Remidos no Senhor/PB.

A pesquisadora esteve presente também no primeiro módulo deste mesmo curso,

ocorrido durante os dias 1 a 5 de agosto de 2007, entretanto, não estava na qualidade de

pesquisadora, mas apenas de participante. O III módulo ocorreu durante os dias 17 a 21 de

abril de 2008, com divulgação através de e-mail26, como nos demais módulos, mas não foi

possível a participação27.

Essa iniciativa de promover atividades de formação tem sido tomada por várias

Comunidades Novas no Nordeste e em outras regiões do Brasil. Inclusive, em João

Pessoa/PB, segundo informações informais, já se iniciou uma Escola de Formadores em 2008.

Através de pesquisa na internet, foram encontradas algumas divulgações sobre Escola

de Formação ou de Formadores, inclusive algumas das quais possibilitam a participação de

reitores e formadores de seminários, institutos religiosos e novas comunidades, como é o caso

26 Ver anexo E (e-mail de divulgação do terceiro módulo da Escola de Formadores, 17 a 21 de abril de 2008) 27 A pesquisadora estava com um bebê de apenas um mês e meio.

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do Curso para Formadores oferecido pela “Comunidade Mar a Dentro”, presente em vários

estados do Brasil, entre eles São Paulo, e São José do Rio Preto.28

Outro exemplo é a Escola de Formadores organizada pelas Comunidades Oásis e pela

Comunidade Canção Nova, que aconteceu na sede da Comunidade Oásis, em Caxias do

Sul/RS, durante dois anos e meio, e teve sua última etapa em agosto de 2007. Parece que essa

Escola foi uma das pioneiras no Brasil, pois dela participaram 20 Comunidades Novas de toda

a Federação29, sendo uma das mais antigas, contando com organização e experiência,

inclusive sendo a organizadora do VIII Congresso Nacional das Comunidades Novas de Vida

e Aliança, que acontecerá em Bento Gonçalves/RS, de 30 de abril a 03 de maio de 2009.30

3.2.1 Descrição do segundo módulo

O II Módulo ocorreu no período de 13 a 17 de novembro de 2007, no Centro de

Formação Redentorista Santo Afonso, em Campina Grande/PB.

Logo no início do evento, houve a apresentação de todas as Comunidades presentes,

que ao todo eram 22, conforme quadro n° 2, abaixo:

ESTADO

COMUNIDADE

LOCALIZAÇÃO

Casa de Judá João Pessoa

Consolação Misericordiosa João Pessoa

Doce Mãe de Deus João Pessoa Fanuel João Pessoa

Filhos da Misericórdia João Pessoa Magnificant Campina Grande Nova Berith João Pessoa Obra Nova Campina Grande

Remidos no Senhor Pombal e Campina Grande

Salve Maria João Pessoa

PARAÍBA

Siloé Cajazeiras

Centelha Divina Caruaru Christus Arco Verde

PERNAMBUCO Filhos de Maria Nazaré

28 Ver anexos G (informações sobre a Comunidade Mar a Dentro e o Curso para Formadores por ela organizado, retirados de sites na internet) 29 Ver anexo H (Informativo da “Frater - Fraternidade das Novas Comunidades do Brasil, Ano IX, n° 22 – Agosto de 2007) 30 Ver site da Comunidade Oásis: www.comudidadeoasis.org.br

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Manim Caruaru Sal e Luz Caruaru

Discípulos da Mãe de Deus Natal

Divina Misericórdia Natal Maria Auxiliadora dos Cristãos Natal

Terço da Sagrada Família Mossoró

RIO GRANDE DO

NORTE Vida Nova Natal

ALAGOAS Trindade Santa Maceió

Quadro 2 - Distribuição das Comunidades do Regional Norteste2 participantes do II módulo da Escola de Formadores em Campina Grande/PB

Os participantes, que eram em média 100 pessoas, foram recrutados por meio de

divulgação via e-mail, sendo cobrada uma taxa de R$ 120,00 por cada inscrição, para cobrir

as despesas com alimentação e hospedagem. Os e-mails dos participantes foram conseguidos

nos encontros anuais que a Igreja Católica realiza com as comunidades localizadas no

Regional Nordeste 2 da CNBB.31

O local é dividido: uma parte é destinada ao convento onde moram os padres

redentoristas, a outra parte é reservada para encontros e retiros de grupos da Igreja Católica.

Por isso, possui um grande galpão onde se realizam palestras, momentos de oração

comunitária, refeitório próprio com várias mesas e cadeiras, uma grande cozinha, vários

quartos e banheiros. Também uma capela onde fica o sacrário com o Santíssimo Sacramento

durante todo o tempo e onde ocorrem as celebrações da Missa.

A maior parte dos participantes eram adultos jovens, ou seja, com idade variando entre

24 a 35 anos; com a presença equilibrada entre os dois gêneros, sendo metade formada por

mulheres, e a outra por homens. As mulheres dormiram em uma ala separada dos homens.

Pela observação, acredita-se que havia cerca de 4 casais, sendo o restante solteiros ou casados

que não vieram acompanhados dos seus cônjuges.

Com certeza, havia vários celibatários e celibatárias32 presentes, pois, nas conversas

informais, foi possível perceber a participação de pelo menos 03 homens e 03 mulheres de

comunidades diferentes. As freiras, que usavam hábitos, eram apenas 02, membros da

Comunidade Doce Mãe de Deus. Havia ainda 01 padre desta mesma Comunidade de João

31 Ver anexo C (e-mail enviado com as informações sobre o módulo II da Escola de Formadores) 32 Pessoa que fez voto de castidade no celibato

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Pessoa, que presidiu boa parte das celebrações eucarísticas e também estava presente nos

demais momentos. (Ver a programação em anexo)

A programação seguiu mais ou menos o esquema previsto, diferindo na inclusão diária

de Adoração ao Santíssimo Sacramento (atividade ritual), das 18:30h às 19:00h, que não

estava prevista. Também não estavam explícitas na programação as orações comunitárias à

tarde, antes do início do ensino, com duração de 15 a 30min. Em geral, o tempo de oração era

maior do que o previsto.

As atividades dividiram-se em: pedagógicas ou de formação (ensinos e exibição de

vídeos), de convivência (refeições, lanches, recreação) e rituais (Missa, adoração ao

Santíssimo Sacramento exposto e orações comunitárias), conforme quadro n° 3.

Atividades de Formação ou

Pedagógicas

• Ensinos em vários horários durante o dia, quase

toda manhã e tarde, totalizando em 6 horas

diárias.

• Exibição de filmes, musicais e documentários

durante as noites, totalizando 6 horas no decorrer

dos 04 dias.

Atividades de Convivência • Foram utilizados 30min para cada uma das

refeições, totalizando 1h30 diárias.

• Foram dedicados 30 min para um lanche da

manhã, e outros 30 min para o lanche da tarde,

totalizando 1h diária.

• Para descanso, durante o dia, foram dedicadas 2

horas diárias, após o almoço*

• Para recreação só foi retirada uma das noites,

durante 3 horas.

Atividades rituais • Para a missa, 1 hora.

• Para as duas orações comunitárias, em média

30min, cada.

• Para a adoração ao Santíssimo Sacramento, em

média 30min, totalizando em 2h30 diárias.

Quadro 3 - Distribuição das atividades da programação do II Módulo da Escola de Formadores

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3.2.2 Descrição do quarto módulo

Para a realização do IV módulo, o meio de divulgação foi ainda a internet, enviando e-

mails para as Comunidades que participaram dos anteriores. O IV Módulo aconteceu no

período de 24 a 28 de setembro de 2008, no “Day Camp” Hotel Fazenda, zona rural de

Campina Grande/PB. Houve o envio de e-mail para divulgação, como anteriormente.

Havia representantes de 27 Comunidades de Vida e Aliança, em geral, pelo menos 02

membros de cada comunidade conforme o quadro 4, abaixo:

ESTADO

COMUNIDADE

LOCALIZAÇÃO

Casa de Judá João Pessoa Doce Mãe de Deus João Pessoa

Fanuel João Pessoa

Nossa Senhora das Mercês João Pessoa

Nova Berith João Pessoa Obra Nova Campina Grande

Remidos no Senhor Pombal e Campina Grande

Salve Maria João Pessoa

Siloé Cajazeiras

Cristo Ama Petrolina Crux Sacra Itambé

Divina Misericórdia Santa Cruz do

Capibaribe Eterna Aliança São Caetano

Kairós Taguatinga Ressurreição Bezerros

Sagrado Coração de Maria Caruaru

Sal e Luz Caruaru

PERNAMBUCO

Santa Clara Paulista

Discípulos da Mãe de Deus Natal

Maria Mater Natal Terço da Sagrada Família Mossoró

Reviver pela Misericórdia Natal

RIO GRANDE DO NORTE

Vida Nova Natal

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Discípulos de Jesus Crucificado

Maceió

Filhos da Virgem Santíssima Maceió

ALAGOAS

Trindade Santa Maceió

Mãe Imaculada Juazeiro

DA BAHIA Sagradas Chagas Luiz Eduardo

Magalhães

Quadro 4 – Comunidades que participaram do IV Módulo da Escola de Formadores em Campina Grande/PB

O Estado da Bahia não faz parte do Regional Nordeste II, mas as comunidades vieram

participar da Escola de Formadores por conveniência de data. Nesse módulo IV o número de

Comunidades participantes (27) foi um pouco maior que no módulo II (22). Esse fato,

segundo informações obtidas em conversas informais durante do módulo IV, também ocorreu

devido à junção de dois grupos.

Expliquemos: a Escola de Formadores realizada em Campina Grande iniciou uma

nova turma, com um segundo grupo de Comunidades, para fazer a seqüência de módulos I a

VIII. Entretanto, essa segunda turma teve uma freqüência baixa no módulo II, então, a

comissão organizadora decidiu pular o módulo III dessa turma, deixando-o para outro

momento, e convidar os participantes para fazerem o módulo IV, junto com a primeira turma.

A presença da Bahia, que estaria fora da região administrativa Regional NE2

demonstra que o curso organizado em Campina Grande já está sendo divulgado em outras

regiões do país.

Verifica-se que o número de Comunidades localizadas na Paraíba diminuiu nesse

módulo IV, passando de 11 para 09, enquanto o número de Comunidades localizadas no

estado de Pernambuco aumentou consideravelmente, passando de 05 para 09, assim também

as localizadas no estado de Alagoas, que passou de 01 para 03. O estado do Rio Grande do

Norte manteve o número de Comunidades: 05. Esse fluxo demonstra a maior divulgação do

curso nos estados de Pernambuco e Alagoas. Quanto à diminuição da participação de

Comunidades localizadas no Estado da Paraíba, uma das razões pode ter sido o início de uma

Escola de Formadores na cidade de João Pessoa, no ano de 2008, sobre a qual não temos

maiores informações.

A maioria das comunidades presentes tinha menos de 05 anos de existência (este dado

foi constatado em um momento no qual se pediu para orar de acordo com os anos de

permanência na comunidade). Tais Comunidades mais recentes estão buscando formação com

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as mais antigas para saberem como organizar-se na parte formativa. Quando não estão

participando dos momentos de formação, as pessoas geralmente estão reunidas em grupos de

suas comunidades.

As atividades, assim como no segundo módulo, dividiram-se em: pedagógicas ou de

formação, de convivência e rituais. A programação seguiu o mesmo padrão do outro módulo e

o tempo das atividades manteve-se mais ou menos igual.

Atividades de

Formação ou

Pedagógicas

• Ensinos em vários horários durante o dia, quase toda

manhã e tarde, totalizando em 6 horas diárias.

• Exibição de 01 filme, com duração de 02 horas.

Atividades de

Convivência

• Refeições:30min para cada - 1h30 diárias.

• Lanches, 30 min para cada - 1h diária.

• Descanso, durante o dia: 2 horas diárias, após o

almoço*

• Uma noite com recreação orientada, com duração de 3

horas, e as outras três noites livres, para descanso,

conversas ou orações.

Atividades rituais • Missa, 1 hora diária.

• Duas orações comunitárias, em média 30min, cada,

totalizando 1 hora diária.

• Adoração ao Santíssimo Sacramento, em média 30min

diários.

Total de horas em

atividades

• 16 horas diárias

Quadro 5 – Distribuição das atividades ao longo do IV Módulo

3.2.3 Descrição da parte pedagógica dos módulos

A parte mais importante desses cursos é a pedagógica, devido ao seu próprio objetivo

de formação líderes, que segue uma programação consistente na qual se aborda vários

aspectos da vida religiosa em comunidade33. Por isso a escolha de iniciar a descrição por essas

atividades.

33 Ver anexo A (apresentação da Escola de Formadores do Regional Nordeste II em Campina Grande.

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3.2.3.1 Objetivo da formação e requisitos para fundação de novas comunidades

Existe uma preocupação, por parte das Comunidades Novas, com a formação, tendo

em vista que os eventos nos quais ocorreu a pesquisa de campo foram essencialmente

voltados para a formação. A necessidade de formação e a exigência de fazê-la são feitas pela

própria Igreja Católica, por meio da CNBB e, por conseguinte, pelo bispo responsável pelas

Comunidades do Regional NE2, Dom Dino, bispo de Fortaleza. A Igreja Católica se preocupa

com a formação em todas as instituições e movimentos que dela participam. A orientação é

para que a formação abranja vários aspectos: preparação humana, cultural, espiritual e

pastoral, visando a transformação de toda a pessoa, com o objetivo de que “cada uma de suas

atitudes ou gestos possa revelar a sua pertença total e feliz a Deus” (TERRA, 2004, p. 159).

No caso das Comunidades Novas, que surgem fora da estrutura hierárquica da Igreja

Católica, como surgem em geral os Movimentos, a ênfase na formação é dada quando essas

Comunidades procuram se estruturar, buscando o reconhecimento oficial da Igreja, na pessoa

do bispo da diocese onde estão localizadas. Pois dele necessitam para conseguirem seus

objetivos, como Evangelização, inserção em pastorais da Igreja, promoção de eventos,

realização de rituais como a Missa.

Quando a Comunidade pede a oficialização como associação privada de fiéis, a Igreja

Católica, por meio do bispo diocesano, impõe algumas exigências como a apresentação de um

Estatuto ou Regimento Interno da Comunidade, no qual estejam presentes vários requisitos,

entre eles: a finalidade, a sede da comunidade, o regime ou modo de governo, os associados, o

patrimônio, a extinção da associação. Algumas observações sobre esse estatuto pode-se

encontrar no livro de Sidney Timbó (2004, p. 163):

Para que uma associação privada de fiéis seja considerada como tal precisa

que a autoridade competente (c. 312) aprove o estatuto, e para que este seja

aprovado deve ter por finalidade fomentar uma vida mais perfeita, promover

o culto ou a doutrina cristã, realizar atividades de apostolado e a animação

da ordem temporal com espírito cristão.

De acordo com informações colhidas junto aos participantes, essa Escola para

Formadores já existia, em outras versões, na Região Sudeste do Brasil, organizada pela

Comunidade Canção Nova, e também na Itália, para onde chegaram a ir formadores e

fundadores de Comunidades Novas do Brasil, inclusive alguns que estão dando formação no

Brasil.

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Essa Escola de Formação, da qual a pesquisadora participou, não é uma exigência da

Igreja Católica para que a Comunidade seja legitimada. A escola é iniciativa das próprias

comunidades mais antigas, que desejam passar sua experiência para as mais recentes. Não é

obrigatória. Tanto que há muito mais comunidades nesses estados do Regional Nordeste 2 do

que aquelas presentes à escola. Em João Pessoa, por exemplo, existem mais do que as 07

comunidades presentes na escola, podendo ser citadas, por conhecimento informal:

Comunidade Lírios do Vale, Comunidade Servos de Maria, Comunidade Nossa Senhora

Menina, Comunidade Fraterno Amor, Comunidade Despertai, Comunidade Jesus

Misericordioso.

3.2.3.2 Parte pedagógica do segundo módulo

O propósito da Escola de Formadores no Módulo II era ensinar às pessoas que

fundaram comunidades ou líderes dessas sobre como trabalhar com os novos membros que

vão chegando, no sentido de repassar-lhes conhecimentos doutrinários, espirituais, humanos,

morais, bíblicos, tudo conforme a orientação da Igreja e segundo o “carisma” de cada

Comunidade.

Os temas previstos para serem abordados nesse módulo eram os seguintes: “O carisma

da Formação”, “Projeto de Formação Inicial”, “Projeto de Formação Permanente”34 Todos

temas foram vistos conforme programado, enfatizando-se, na parte do “carisma de formação”,

também o “carisma de fundação” e ao “carisma das comunidades”, temas importantes para o

momento no qual é iniciada uma Comunidade Nova. “Projeto de Formação Inicial” e “Projeto

de Formação Permanente”, estão inseridos no momento de estruturação da Comunidade

Nova, sendo o primeiro a grade formativa para os membros da comunidade que ainda não

chegaram à consagração, e o segundo para os membros que já são consagrados.

A formação inicial parece estar ligada ao processo comunitário de fundação, pois se

refere às primeiras tentativas de passar conhecimentos para o grupo antigo, bem como para os

iniciantes, e a permanente se refere à fase institucional ou mais oficial da comunidade, quando

os membros já estão consagrados e já passaram pela inicial.

A novidade do tema pode ser justificada porque a maioria das comunidades presentes

tinha menos de 05 anos de existência, portanto, ainda estavam na fase embrionária do

34 Ver anexo C (e-mail encaminhado sobre programação e orientação do módulo II)

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processo comunitário, muitas vezes sem programação rígida, sem muita organização, ainda

longe de uma institucionalização.

A palestrante, Maria Emmir Oquendo Nogueira (Formadora Geral e co-fundadora da

Comunidade Shalom) começou por explicar como fazer uma grade de formação utilizando

elementos da pedagogia e forneceu indicações bibliográficas para consulta, sendo as

indicações básicas: o Catecismo da Igreja Católica e a Bíblia. Quanto à formação humana,

indicava livros publicados pela Editora Shalom e por algumas editoras de comunidades

francesas ou italianas, bem como livros escritos por Amedeo Cencini35.

Emmir estava entusiasmada com a resposta dada pelo grupo aos conhecimentos

repassados e também demonstrava preocupação em continuar acompanhando as pessoas ali

presentes, porque sabia que tudo era muito novo para elas.

Como não existe um modelo de formação pré-estruturado e obrigatório para

orientação das ações das comunidades, não há etapas de formação previamente estabelecidas

a serem seguidas por elas. Entretanto, há a experiência das comunidades mais antigas,

principalmente aquelas que já foram reconhecidas pela Igreja Católica no Vaticano, como a

Comunidade Shalom, ou estão em processo para tal, como a Comunidade Canção Nova que é,

em geral, muito respeitada, sendo seguidas como modelo por outras comunidades.

No segundo dia, o então Bispo de Campina Grande veio presidir a celebração da

Missa e fazer um pronunciamento sobre o documento produzido pela V Conferência do

CELAM – Conselho Episcopal Latino Americano e do Caribe, ocorrida de 13 a 31 de maio de

2007, no santuário nacional de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, no Brasil, inaugurada

com a presença e a palavra do Papa Bento XVI.

O interesse dos participantes pela fala do representante da Igreja institucional não

parecia ser muito grande, percebido pelas conversas paralelas, movimentação nas cadeiras,

falta de perguntas, além disto, poucos anotavam o que o bispo falava ou tinham o documento.

Talvez esse desinteresse tenha ocorrido porque os participantes do evento não foram avisados

sobre a interferência do Bispo. Além disso, o bispo falava sentado, enquanto a pregadora

oficial, Emmir Nogueira, usava de várias técnicas de entretenimento e estava sempre em pé,

recebendo grande atenção de todos, que se sentiam vivamente estimulados a estudarem os

documentos da Igreja.36

35 Sacerdote, religioso canossiano, mestre em ciências da educação pela Universidade Salesiana de Roma e doutor em psicologia pela Universidade Gragoriana da mesma cidade. Desde 1995, é consultor da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apóstolica (Congregação do Vaticano). 36 Ver Anexo I – Fotografias tiradas no módulo II.

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O dia 15 de novembro (quinta-feira) foi um dia cheio de atividades de ensino. Sob a

orientação da pregadora, os participantes foram divididos por comunidades presentes, para

elaborarem os esboços da grade de formação de sua Comunidade, para isso, a pregadora

utilizou textos, exercícios, data-show. Pela dificuldade demonstrada na elaboração da

primeira grade de formação para muitas comunidades, percebia-se a novidade da proposta.

Os dias seguintes seguiram o mesmo ritmo. O dia 16 de novembro (sexta-feira) foi

novamente dedicado a ensinamentos, desta vez sobre “formador pessoal”, “formador

comunitário”, “fundador”, etc. No dia 17 de novembro (sábado), último dia, retorna-se ao

tema de grade de formação. Abaixo seguem algumas palavras de Emmir Nogueira, sobre

formação, que motivam os participantes a se dedicaram à formação dentro de suas

Comunidades:

As ordens religiosas já têm uma grade, do Direito Canônico e do carisma do fundador. Nós, Comunidades Novas, estamos em transição. Nós colocaremos os nossos carismas, com base em outros carismas. A formação garante a unidade, sem a formação, não devemos sair em missão. Recebemos o mesmo alimento, para termos a mesma mentalidade e o mesmo coração.

Realmente, para a pregadora, essas afirmações são fruto de uma vivência de 26 anos

dentro do universo das Novas Comunidades, sempre como liderança e abrindo caminhos,

estando no início do Movimento da Renovação Carismática Católica em Fortaleza/CE e nas

primeiras experiências de vida em comunidade nos moldes das NCVA. Para ela, essa

realidade é muito preciosa e verdadeira, grande parte de sua vida está ali colocada e é com

muita seriedade que executa sua tarefa de formadora, apesar de não cobrar profissionalmente

para isso, pois tudo o que recebe em missão passa diretamente para a Comunidade de Vida da

qual faz parte.

3.2.3.3 Parte pedagógica do quarto módulo

A seguir será feita a descrição do IV Módulo da Escola de Formadores, ocorrido de 24

a 28 de setembro de 2008, especificamente na sua parte pedagógica. O tema central

focalizado neste módulo foi “A Vida Fraterna em Comunidade”, baseado no documento

com o mesmo nome, em latim “Congragavit nos in unum Christi amor”, escrito pela

Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica.

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Os pregadores foram dois membros consagrados de vida da Comunidade Católica

Shalom: Júnior Alves e Maria Gorethi Menezes Queiroz, assessora de formação da

Comunidade Shalom, que utilizaram, além do documento citado, livros e formações de

Amedeo Cencini, o filme Com Mérito e o livro de Emmir Nogueira (co-fundadora da

Comunidade Shalom): Tecendo o Fio de Ouro.

A participação de membros da instituição da igreja Católica aconteceu para presidir as

celebrações eucarísticas e para fazer a reflexão sobre a Carta Encíclica do papa Bento XVI:

“Spe Salvi”. Esse documento foi incluso neste módulo porque o bispo responsável pelas

Comunidades Novas de Vida e Aliança do Regional NE2 (Paraíba, Rio Grande do Norte,

Alagoas e Pernambuco), Dom Bernardino Marchió, bispo de Caruaru/PE, segundo

informação de um dos participantes do encontro, pediu para que em cada módulo fosse

estudado um documento da Igreja Católica.

Os pregadores abordaram como deve ser a vida fraterna em comunidade e a formação

dos membros. Durante o encontro, eles deram muitos exemplos vivenciados pela sua

Comunidade, haja vista a grande experiência da pregadora, consagrada há 23 anos, desde os

seus 17/18 anos. Quando é dado um exemplo prático e vivencial há uma resposta positiva da

assembléia, rindo, conversando entre si, como se estivessem se identificando com os

exemplos ou lembrando alguém. São exemplos da vida diária, sobre tipos de pessoas que

moram na comunidade.

O documento do Vaticano, “Vida Fraterna em Comunidade”, foi estudado

minuciosamente, lendo-se partes do texto, comentando-se e dando-se exemplos práticos. Foi

usado inclusive o recurso do “power point”.

Uma diferença interessante presente nesse documento é entre a “vida fraterna” e a

“vida em comum”. Um é elemento espiritual: a fraternidade, que seria “corações animados

pela caridade, a comunhão de vida e o relacionamento interpessoal”, outro elemento mais

visível seria a “vida em comum” ou “vida de comunidade”, que consiste em “habitar na

própria casa religiosa legitimamente constituída” e no “levar vida comum” através da

fidelidade às mesmas normas, da participação aos atos comuns, da colaboração nos serviços

comuns (Doc. A Vida Fraterna em Comunidade, §3).

A grande preocupação nesse módulo é com a “formação humana”, por isso são

passadas muitas informações sobre relações humanas, educação, psicologia humana. Os

problemas na vida fraterna em comunidade são colocados como presentes em todo ser

humano, fazendo parte da humanidade e passam pela formação integral da pessoa.

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No quadro 6 será apresentado o resumo de alguns dos temas abordados:

I - Processo Comunitário

II - Relacionamentos internos

III - Cotidiano das comunidades

a) Formação Permanente

a) Educação, gentileza, sinceridade, controle de si mesmo, delicadeza, senso de humor, espírito de partilha

a) Lazer e descanso

b) Auto-conhecimento b) Amadurecimento psicológico

b) Paz e gozo em estar juntos

c) O papel da autoridade

c) Ascese pessoal (esforço e dedicação)

c) Experiência de oração pessoal e comunitária

Quadro 6 – Resumo dos temas abordados no IV Módulo

A seguir será dada uma breve explanação do que foi comentado em cada um dos

pontos citados, sobre a Vida Fraterna em Comunidade: caracterizar-se-ão os assuntos a partir

dos valores e preceitos comunitários seja ligando ao processo comunitário, aos

relacionamentos internos, ao cotidiano das comunidades ou ao comportamento moral.

I - Processo Comunitário

Seria tudo aquilo que está direcionado para a formação dos membros das

Comunidades Novas, as etapas desse processo de formação, o que deve ser visto em cada uma

delas, como a comunidade deve se estruturar internamente. Também percebe-se que no

processo comunitário encontram-se pistas do tempo de fundação e da maturidade da

comunidade. Aqui também pode-se identificar possíveis tensões, conflitos, consensos, jogos

de interesse.

a) Formação contínua

Para que haja um controle na formação das pessoas, há uma orientação para que desde

quando um novo membro entre na comunidade, seja direcionado a fazer uma formação

humana séria e profunda, abordando aspectos psicológicos, afetivos, de relações humanas,

além da espiritualidade e vida missionária, com o objetivo de que, quando a pessoa estiver em

uma possível “crise” ou dificuldade de continuar na comunidade, tenha uma sólida formação

que a mantenha no equilíbrio e na vida comunitária. Essa formação deve ser uma constante

durante toda a vida da pessoa que se consagra dentro da comunidade.

b) Autoconhecimento

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Esta etapa é abordada como um ponto chave, devendo ser buscada por todos os

membros das comunidades. O autoconhecimento seria necessário para possibilitar uma

convivência saudável, além do conhecimento da identidade da pessoa, levando-a a perceber se

realmente quer, gostaria e está preparada para uma vivência comunitária.

c) O papel da autoridade

Este papel no interior da comunidade religiosa é retomado, apesar de ter estado

prejudicado, com a reivindicação da liberdade pessoal e dos direitos humanos de forma

unilateral e exacerbada, devendo esta autoridade continuar com o seu papel, sob pena de

prejudicar uma vivência comunitária saudável.

O documento “Vida Fraterna em Comunidade”, enfatizado pela pregadora, analisa que

a convivência fraterna nas comunidades religiosas melhorou muito nos últimos anos, nos

aspectos da humanidade, na participação de todos, na atenção às necessidades individuais.

Mas essa convivência mais aberta levou a não entender o papel da autoridade dentro da

comunidade, que deve continuar existindo, sob pena de um crescente individualismo e

esfacelamento da vida comunitária. “Por outro lado, os resultados dessas experiências estão

levando progressivamente à redescoberta da necessidade e do papel de uma autoridade

pessoal, em continuidade com toda a tradição da vida religiosa”. (Doc. Vida Fraterna em

Comunidade, § 48).

A pregadora aborda o documento, explicando que a autoridade deve ser exercida

dentro da comunidade religiosa, privilegiando os aspectos da espiritualidade, da unidade, para

que tome as decisões finais e lhes assegure a execução, com papel e função bem definidos nos

documentos da comunidade religiosa.

II - Relacionamentos internos

a) Educação, gentileza, sinceridade, controle de si mesmo, delicadeza, senso de

humor, espírito de partilha

A pregadora enfatiza as recomendações sobre estes aspectos através da citação do § 23

do Documento “A Vida Fraterna em Comunidade”:

Esse caminho de libertação que conduz à plena comunhão e à liberdade dos filhos de Deus exige, porém, a coragem da renúncia a si mesmo na aceitação e no acolhimento do outro, a partir da autoridade. Notou-se, em mais de um lugar, que isso constituíu um dos pontos mais fracos do período de renovação destes anos. Aumentaram os conhecimentos, estudaram-se diversos aspectos da vida comum, mas cuidou-se menos do esforço ascético, necessário e insubstituível para qualquer libertação capaz de fazer de um grupo de pessoas uma fraternidade cristã. A comunhão é um dom oferecido que exige também uma resposta, um paciente tirocínio e um combate para superar o espontaneísmo e a instabilidade dos desejos. O altíssimo ideal comunitário comporta necessariamente a conversão de qualquer atitude que causasse obstáculo à comunhão.

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Nesse sentido, a pregadora contou um caso acontecido com ela na sua vivência de

comunidade, para mostrar como se deve controlar a raiva e os desejos precipitados. Disse que

dormia em um quarto, em beliches, com pelo menos mais cinco pessoas, e só tinham um

ventilador para todas. Um irmão que dormia ao seu lado, ao chegar depois que ela estava

dormindo, colocou o ventilador em cima da cama dela, para ficar mais próximo dele. Durante

a noite, quando ela se mexeu um pouco, bateu no ventilador, este enroscou em seu lençol, e

ela acordou em pânico, enquanto todos dormiam tranqüilamente. Nesse momento, disse que a

sua vontade era de acordar o irmão e gritar com ele, ou de colocar o ventilador em cima dele

para acontecer o mesmo. Mas dominou a raiva e esses desejos e voltou a dormir. No outro

dia, o irmão perguntou se ela tinha dormido bem, ela disse que sim, apesar de um “monstro”

de quatro hélices ter aterrorizado na cama dela durante a noite.

b) Amadurecimento psicológico

Fala-se de pessoas que vêm de experiências difíceis fora da comunidade, de pessoas

“que sofrem” e até prejudicam a vida comunitária. Orienta-se para verificar de onde vêm

esses “sofrimentos”, se “de deficiências de caráter, de trabalhos sentidos como muito

gravosos, de graves lacunas na formação, das transformações demasiadamente rápidas destes

anos, de formas demasiadamente autoritárias de governo” (Doc. Vida Fraterna em

Comunidade § 38). Se detectados já na fase inicial do processo de ingresso na comunidade,

deve ser tratado adequadamente.

Destaque-se uma frase desse Documento que recomenda a convivência como uma

forma de “máxima penitência”: “Pode haver até diversas situações em que a autoridade deve

fazer presente que a vida em comum exige, por vezes, sacrifícios e pode tornar-se uma

forma de «maxima poenitentia»” (§ 38). Ou seja, a pessoa deve realmente suportar uma

convivência muito difícil, tomando-a como meio de penitência estrema.

Entretanto, o documento citado, e a fala da pregadora assim o corrobora, diz que há

casos patológicos que devem ser verificados com especialistas: psicólogos, psiquiatras.

Ressaltando que esses sejam, de preferência, “uma pessoa de fé e conhecedora da vida

religiosa e de suas dinâmicas” (§ 38), e que esses especialistas não substituem um bom “guia

espiritual”.

c) Ascese pessoal (esforço e dedicação)

São levados problemas vividos por todas as comunidades participantes, mas são dadas

soluções baseadas na “caridade” e na “misericórdia”, ou seja, soluções que necessitam de

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virtudes teologais para serem vividas, e que vêm de uma ascese pessoal, para que se possa ter

uma vida fraterna em comunidade.

A ênfase na necessidade de esforço pessoal para sair de si mesmo, na vivência em

comunidade, é feita citando trecho do Documento “A Vida Fraterna em Comunidade”, §21:

Mas tudo isso não é conforme à natureza do «homem velho» que deseja, sim, a comunhão e a unidade, mas não pretende nem está disposto a pagar-lhe o preço, em termos de esforço e de dedicação pessoal. O caminho que vai do homem velho, que tende a fechar-se em si mesmo, ao homem novo, que se doa aos outros, é longo e cansativo. Os santos fundadores insistiram realisticamente sobre as dificuldades e sobre as ciladas dessa passagem, conscientes como estavam de que a comunidade não se pode improvisar. Ela não é coisa espontânea nem realização que se consiga em breve tempo.

A pregadora insiste que a vida fraterna em comunidade “brota da construção, da

renúncia, e muitas vezes do caminho de cruz para ir ao encontro do outro, (...) para não ter

ilusões de 'angelicalismos', mas viver na verdade do auto-conhecimento.” Ou seja, aqui se

verifica que realmente um dos propósitos da vida comunitária é a busca de uma vida no

modelo dos santos, de uma vida que busque o crescimento espiritual nas relações do dia a dia.

A expressão 'angelicalismos' é dita no sentido de trazer a pessoa para sua realidade humana,

conscientizando-a de que ela não é apenas um ser espiritual, como os anjos. Os santos foram

pessoas reais, que tiveram problemas concretos.

III - Cotidiano das Comunidades

a) Lazer e descanso

O tema lazer e descanso foi abordado como conteúdo da formação pela pregadora,

indicando a necessidade dos coordenadores e líderes pararem para descanso e lazer, a fim de

evitar o “stress”, devido ao fato da maioria das Comunidades presentes serem pequenas,

exigindo esforços redobrados dos membros e líderes para realizar várias tarefas, indo além de

seus limites humanos.

Fala-se do “ativismo” em detrimento da oração e da vida fraterna. Os membros ficam

tão envolvidos com os trabalhos sociais ou de evangelização, ou com a própria estrutura da

comunidade, ou com suas funções na comunidade, com muitas preocupações, que acabam

ficando muito cansados e até doentes.

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b) Paz e gozo em estar juntos

A pregadora enfatiza também a necessidade de “paz e gozo de estar junto”, de uma

“alegria que contagia a todos”, cita mais um trecho do Documento sobre a vida fraterna em

comunidade (§ 28):

Uma fraternidade rica de alegria é um verdadeiro dom do Alto aos irmãos que sabem pedi-lo e que sabem aceitar-se empenhando-se na vida fraterna com confiança na ação do Espírito. Realizam-se assim as palavras do Salmo: «como é bom, como é agradável os irmãos morarem juntos... Aí o Senhor dá sua benção e a vida para sempre» (Sl 133, 1-3)

Depois, dá mais um exemplo acontecido com ela. Em sua comunidade , eles têm um

momento na semana para simplesmente estarem juntos e, como são pobres, e não têm

dinheiro para sair ou comprar uma comida diferente, geralmente ficam em casa mesmo,

conversando e rindo uns dos outros. Um casal muito rico que conhecia a comunidade há

pouco tempo foi convidado para um desses momentos, mas tinham uma festa da sociedade

que a esposa fazia questão de ir.

No meio da festa, o homem disse que não estava agüentando mais aquele lugar. Ao

sair, lembrou do convite do pessoal da Comunidade e foi para lá. Quando ele chegou, todos

estranharam seus trajes de gala, mas o receberam com carinho e animação, logo depois,

chegou a sua esposa, toda arrumada também, receberam-na da mesma forma. Depois o casal

contou o que havia acontecido e que não sabiam porque, mas se sentiam muito mais felizes ali

com eles, sem nada especial para comer e ouvir, apenas “jogando conversa fora”, do que

naquela festa para a qual gastaram R$ 5.000,00.

c) Experiência de oração pessoal e comunitária

A pregadora e o documento utilizado dizem que a própria comunidade religiosa só

pode ser acolhida numa dimensão de contemplação, ou seja, oracional. Sem a qual a vida

fraterna pode muitas vezes parecer “inútil” e “perda de tempo”. Assim, é recomendado que

haja um horário fixo para oração em comum e para “dar tempo a Deus”, mesmo em meio a

diversas atividades e vida corrida, de sobrecarga de trabalhos, de diversos horários.

As orações em comum, como a Liturgia das Horas, a Missa, a partilha da Bíblia, as

devoções Marianas, a adoração ao Santíssimo Sacramento, são recomendadas a serem vividas

sem pressa e com entusiasmo. Também é elevada a importância da experiência de oração

pessoal como sendo um dos fatores que conduz à vida “evangélica e apostólica” das

comunidades religiosas, principalmente hoje, que “se assiste a um novo despertar da busca do

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transcendente, as comunidades religiosas podem se tornar lugares privilegiados onde se

experimentam os caminhos que levam a Deus” (§ 20).

3.2.4 Descrição da parte ritual dos módulos

As atividades rituais foram privilegiadas devido a quantidade de tempo a elas

destinadas e, principalmente, porque se dava bastante importância a esses momentos.

Notadamente, a celebração da Missa, no início de todas as atividades e a adoração ao

Santíssimo Sacramento, encerrando-as, demonstrou como os participantes preocupam-se em

expressarem a sua religiosidade, como forma de integrá-las às atividades pedagógicas e de

convivência.

Outro motivo seria para identificar as especificidades das expressões da religiosidade

católica demonstradas pelas Comunidades Novas, quando reunidas. Além disso, verificar a

ocorrência da espontaneidade nas orações, já detectada por estudiosos da Renovação

Carismática Católica.

3.2.4.1 Parte ritual do segundo módulo

O segundo Módulo da Escola de Formadores se inicia, no dia 13 de novembro de

2007, com a celebração da Missa. Depois da Missa, seguida pelo café da manhã. Logo após,

oração comunitária.

A oração comunitária em geral se inicia com uma música de louvor a Deus, de

acolhida dos irmãos que estão presentes. Alguém “ministra” a oração, ou seja, direciona a

oração conforme o “Espírito Santo de Deus” está conduzindo dentro de si. São os dons

carismáticos do Espírito Santo, que logo é invocado, seguindo-se de orações espontâneas por

toda assembléia presente, terminando com um momento de silêncio, para “ouvir” o que o

Espírito Santo está “falando” para cada um em particular. Após o silêncio, as pessoas são

convidadas para proclamar em alta voz as “moções” do Espírito Santo, com visualizações, ou

palavras de ciência ou de sabedoria.

Um exemplo de uma visualização ocorrida durante essa oração: “o Espírito Santo

banhando, molhando, irrigando uma terra árida”. Outra pessoa “confirma” a visualização,

porque teve uma “visualização de pessoas cansadas caminhando no deserto, depois

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começava a cair água do céu”. Outra pessoa “confirma”, porque se lembrava do texto bíblico

de Isaías 32, 15-20.

Quando o Espírito Santo manifesta-se através das pessoas, elas são estimuladas a

agradecer a Deus por essas revelações com um louvor em português, todos ao mesmo tempo,

em alta voz.

A oração continua, colocando-se a mão no irmão do lado e “orando em línguas” uns

pelos outros. Um tempo depois, a dirigente do dia diz a moção do Espírito Santo durante essa

“oração em línguas”: “Descanso para a mente, refrigério”.

Entra a pregadora do encontro, Maria Emmir Oquendo Nogueira, co-fundadora da

Comunidade Shalom. As pessoas oram por ela. Há uma moção do Espírito Santo, vinda

através de Alessandra, fundadora da Comunidade Remidos no Senhor, uma palavra de

sabedoria: “dai de graça o que de graça recebeste, e o que deres a mais eu daria em dobro de

volta”. Inicia-se a pregação de Emmir Nogueira sobre Formação, às 9h40. Foram 40 min de

oração comunitária. O dia inteiro foi de formação, com parada de 3 horas, para o almoço e

descanso e, durante a tarde, para um lanche.

No final do primeiro dia, às 18h45, antes do jantar, houve “adoração ao Santíssimo”,

ou seja, exposição do Corpo de Cristo no ostensório para adoração. O padre37 entra com o

ostensório e todos aplaudem e se ajoelham. Um homem dirige a adoração. Durante a

adoração, as pessoas ficam de joelhos ou em pé, em silêncio, é pedido para contemplar a

graça do carisma de cada comunidade.

Um tempo depois, várias pessoas, uma por uma, vão falando as visualizações, as

moções, as contemplações. Os demais ouvem, “confirmam”, completam com outra moção,

sentimento, visualização. Depois, inicia-se uma oração de louvor, com um canto, primeiro os

homens oram em línguas e as mulheres cantam, depois as mulheres oram em línguas e os

homens cantam. Novo silêncio.

Os fundadores ou fundadoras das comunidades presentes, que eram cerca de 10

pessoas, são chamados à frente, próximos ao ostensório38, onde se encontra, para os fiéis

católicos, que simboliza o Corpo de Cristo, o Santíssimo. Os demais impõem as mãos sobre

eles, próximos ou distantes, oram em línguas. Novo silêncio, novas palavras ditas na 1ª

37 A atribuição de conduzir o ostensório é do padre, que pode delegar a um diácono, caso não possa estar presente. 38 Objeto de metal com um círculo de vidro transparente no meio, no qual se coloca a óstia consagrada para que as pessoas possam vê-la e prestar-lhe culto de adoração.

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pessoa, como se fosse Deus falando. É lido um trecho bíblico – Isaías 2. Novo louvor com

cantos e palmas de pé.

O padre, que trouxe o ostensório com o Santíssimo, diz a moção do Espírito Santo

para aquele momento, pede para cantar uma música, depois reza a oração oficial da Igreja

para os momentos de “exposição” e “bênção” do Santíssimo. Leva de volta o ostensório,

passando pelo meio do povo, enquanto todos cantam e batem palmas, um canto em

agradecimento.

As adorações ao Santíssimo Sacramento parecem constituir o momento mais fervoroso

do encontro, com relação à espiritualidade, pois é ali que se percebe um maior silêncio para

oração, aprofundamento e a ocorrência de profecias do Espírito Santo.

Os demais dias transcorrem mais ou menos nesse ritmo, na parte ritual.

Ressalta-se apenas que, no segundo dia, houve uma pequena mudança no ritmo da

programação: a oração comunitária da manhã não ocorreu logo após o café, como no primeiro

dia, mas só depois da fala do Bispo de Campina Grande (que também presidiu a celebração da

Missa), convidado para o evento, e de um intervalo para lanche. Essa mudança deve ter

ocorrido devido à presença do Bispo, ou porque ele tinha outros compromissos e precisava

antecipar sua fala, ou porque não é afeito a orações com expressões carismáticas, e os

organizadores preferiram deixar a oração comunitária para depois que ele saísse.

3.2.4.2 Parte ritual do quarto módulo

No quarto módulo (setembro de 2008), as orações comunitárias foram um pouco

diferentes das do encontro anterior. No segundo módulo (novembro de 2007), as orações

sempre se iniciavam com músicas mais agitadas, de louvor e com motivações direcionadas a

uma oração animada, empolgada. Nesse quarto módulo, as orações se iniciam com canções

mais suaves e com orações de invocação do Espírito Santo, sempre pedindo renovação da

vida fraterna em comunidade.

Em algum momento da oração, era pedido para as pessoas se dividirem em sub-

grupos, procurando os membros da sua própria comunidade. O intuito pareceu ser fazer com

que as pessoas “intercedam” pela vida fraterna em sua comunidade. Essa divisão não é uma

prática corriqueira, realmente esse módulo estava muito voltado para a formação da vida

fraterna em cada comunidade, fazendo com que os membros refletissem e orassem sobre isso.

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Durante todo o módulo, diferente do primeiro, não houve preocupação com interação entre os

membros de comunidades diferentes.

Nos momentos de adoração do Santíssimo Sacramento (Eucaristia), um Ministro

Extraordinário da Sagrada Comunhão, que faz parte da Comunidade Remidos no Senhor,

conduzia o Santíssimo (hóstia consagrada), na “teca”39 e quando chegava na mesa própria,

preparada com velas, toalha e flores, colocava a hóstia consagrada no ostensório.

Em geral, ao ministro da sagrada comunhão não é permitido conduzir o ostensório

com a óstia consagrada exposta, apenas lhe é permitido conduzi-la na “teca” e expô-la em

local fixo.

3.2.5 Descrição da parte de convívio e sociabilidade dos dois módulos

No segundo módulo, durante as noites não havia palestras, exibiam-se vídeos de

shows de música, documentários e também filmes que seriam utilizados pela pregadora

posteriormente para ilustrar os conteúdos. Também filmes sobre Madre Teresa de Calcutá40

e sobre Dom Bosco41, para demonstrar o surgimento de duas fundações diferentes dentro da

Igreja. Os participantes deviam tentar responder algumas questões por escrito sobre o filme,

que seriam debatidas no dia seguinte.

No quarto módulo, também não houve palestras durante as noites, esse período foi

deixado livre, para descanso, conversas espontâneas, orações espontâneas individuais ou em

grupo. Apenas na última noite houve uma recreação direcionada.

A exibição de filme foi usada como recurso pedagógico, à tarde, utilizando o filme

“Com Mérito42”. Durante a exibição dever-se-ia observar as características e comportamentos

dos personagens e as relações entre eles para depois comentar em sub-grupos, relacionando os

comportamentos dos personagens com as características dos membros das comunidades.

39 Objeto de metal inox em forma de caixa redonda, no qual se guarda a óstia consagrada. 40 Filme produzido por Luca Bernabei, Carlo Boserman e Pete Maggi, em 2003, narra a trajetória de Madre Teresa de Calcutá da fundação de sua congregação até sua morte. 41 Filme produzido por Leandro Castellani, pela TV italiana, em 2004, e narra a trajetória do santo São João Bosco (Dom Bosco) para fundar a Congregação Salesiana. 42 Produzido nos EUA, em 1994, por Spring Creek Productions, Warner Bros. Pictures.

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3.2.6 Participação da Igreja na Escola de Formadores de Campina Grande/PB

Pode-se dizer que a hierarquia da Igreja Católica participa desses eventos nas pessoas

dos padres e bispos da arquidiocese onde eles são realizados.

Os padres que participam desses eventos de formação, em geral são convidados para o

evento, principalmente, para celebrar a Missa e dar algum ensinamento sobre um documento

específico da Igreja. Convidam-se padres mais conhecidos ou mais disponíveis. Nesses

eventos também houve a participação do bispo local.

Percebe-se que algumas NCVA, principalmente aquelas mais estruturadas, como a

Comunidade Remidos no Senhor, que organizou o evento junto com o Regional NE2 da

CNBB, preocupam-se em convidar o bispo local para visitá-los. Inclusive, ele faz visitas

periódicas à Comunidade.

Essas visitas são de interesse da Comunidade, que busca respaldo da hierarquia da

Igreja para que suas atividades e consagração sejam por ela reconhecidas, e da Igreja, na

pessoa do bispo local, que tem obrigação hierárquica de “fiscalizar” os Movimentos,

Pastorais, Paróquias dentro da sua diocese (divisão territorial).

A Igreja oficial não dispõe sobre o que, especificamente, deve ser estudado em cada

módulo, mas como o curso é organizado por uma Comunidade Nova, a Comunidade Remidos

no Senhor que, segundo consta em e-mail explicativo encaminhado por essa Comunidade,

tem apoio oficial da Igreja por meio do bispo que acompanha as Comunidades Novas do

Regional NE2, pode-se presumir que haja, pelo menos, uma revisão do conteúdo sugerido

pela Comunidade.

O padre que presidiu a celebração da eucaristia na sexta-feira (26/09/2008), ao

término, disse que sua vocação de padre surgiu dentro de um grupo de oração da Renovação

Carismática Católica - alguns bateram palmas -, daí ele se sentir à vontade, em família,

quando “celebra a eucaristia” com grupos que usam os dons e carismas do Espírito Santo.

Já o celebrante do sábado, que fez a reflexão sobre a Encíclica “Spe Salvi” é o reitor

do Seminário de Campina Grande, e no final da reflexão disse que as Novas Comunidades de

Vida e Aliança são testemunhos proféticos nesse tempo e fez elogio à Toca de Assis, por

vivenciarem realmente o carisma de pobreza do franciscanismo. Disse ainda que as

comunidades tradicionais estão se esvaziando, enquanto que as Novas Comunidades de Vida

e Aliança vivem a “primavera vocacional”.

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3.2.7 Apreciação geral dos módulos II e IV da Escola de Formadores em Campina

Grande/PB

Diante disso, percebeu-se que a pressão para que os membros tenham uma formação

constante vem das próprias Comunidades Novas sobre si mesmas e das Comunidades mais

antigas sobre as mais recentes. Havendo também uma preocupação de se enquadrar nas

exigências oficiais da Igreja Católica, para “conseguir” um reconhecimento oficial Igreja

como “Associação Privada de Fiéis”, sendo uma dessas exigências a formação permanente

dos membros das comunidades.

Na parte ritual dos módulos, é marcante a presença da oração espontânea, do uso dos

dons carismáticos de línguas, de interpretação, de visualizações, de cura, de aconselho, entre

outros. Entretanto, dependendo de quem esteja à frente da oração, essa pode desenrolar-se em

sentido mais eufórico ou mais sereno, foi a diferença percebida na parte litúrgica dos

módulos. Enquanto no II módulo as orações transcorriam de uma forma mais de louvor, no IV

módulo, as orações eram mais contemplativas, serenas.

Houve diferença também na parte de convivência entre um e outro módulo. Enquanto

no módulo II a sociabilidade foi mais intensa e constante, no módulo IV ela foi um pouco

dispersa, talvez devido a fatores como o local (no IV módulo havia um grande espaço,

proporcionando isolamento e afastamento, inclusive em sub-grupos).

Especificamente sobre os temas abordados em cada módulo, apesar do interesse dos

participantes existir em ambos, no II módulo a intensidade foi maior. Um dos fatores pode ter

sido a presença de Emmir Nogueira, que conseguiu atrair as atenções para o tema tratado,

pela forma como o expôs.

No que se refere ao perfil dos participantes, foi perceptível a presença no IV módulo

de várias pessoas que não estavam no II módulo, como também, a falta de algumas delas. Mas

não havia maiores diferenças no sentido de comportamento, faixa etária, etc.

3.3 Análise dos questionários aplicados no módulo II da Escola de Formadores em

Campina Grande/PB

A seguir será feita uma análise dos questionários43 aplicados com participantes do 2°

Módulo da Escola de Formadores organizada pela Comunidade Remidos no Senhor, em

43 Ver modelo do questionário no apêndice A.

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Campina Grande/PB, no período de 13 a 17 de novembro de 2007. Os participantes, em

média de 100, eram fundadores e formadores (líderes) de Novas Comunidades de Vida e

Aliança dos Estados da Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Norte. Foram

entregues questionários a todos os participantes e foram recebidos 33 questionários

respondidos.

O grande número e variedade de questões inseridas no questionário podem ser

justificados pela necessidade de tocar em vários aspectos da vida comunitária dessas

Comunidades. Serão enfatizadas as questões consideradas como características fundamentais

das Comunidades Novas de Vida e Aliança e o seu processo de formação e transformação.

Levando em consideração que havia 22 comunidades diferentes participando do

evento, no qual o questionário foi aplicado, e que no levantamento dos questionários

respondidos foi constatado que pelo menos um membro de 18 comunidades diferentes

respondeu às questões, o uso deste documento possibilitou uma boa variedade de vivências

para serem descritas e analisadas.

3.3.1 Perfil dos líderes e fundadores das Comunidades Novas de Vida e Aliança

Esse parâmetro não foi aprofundado, pois nos deteremos nas questões que dizem

respeito à dinâmica da comunidade, no que se refere ao processo de fundação e seus

desdobramentos e tudo o que a ele se refira. A identificação, como nome, endereço, foi

deixada como opcional.

3.3.1.1 Sexo, idade, estado civil, inserção na sociedade

Dentre as pessoas que responderam ao questionário (33), a metade (52,8%) era do

sexo masculino e a outra, (56,1%) era do sexo feminino.

Mesmo havendo um equilíbrio entre os gêneros, especialmente entre as lideranças das

Comunidades Novas de Vida e Aliança (apenas líderes responderam ao questionário, pois

foram eles os participantes da Escola de Formação), apontando uma participação aberta tanto

para mulheres como para homens nessas funções, a percentagem do sexo feminino ainda é

maior, corroborando com a tendência geral de haver mais mulheres que homens freqüentando

as igrejas.

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Quanto à faixa etária dos membros (líderes) das CNVA que responderam ao

questionário, expomos o gráfico 1, para uma melhor visualização.

Gráfico 1 – Distribuição da faixa etária dos membros das CNVA

Os dados demonstram a participação de jovens e adultos nas CNVA de forma

equilibrada, estando metade entre os 20 e os 30 anos e a outra, com mais de 31 anos. É

relevante a predominância de jovens (52%) em relação ao grupo com mais de 50 anos (12%).

Entre os membros fundadores (06), a faixa etária predominante (metade dos fundadores) é

ainda de jovens, entre os 20 e os 30 anos (03 fundadores), estando 02 deles entre 41 e 50 anos

e apenas 01, com mais de 50 anos.

Quanto ao estado civil dos membros/líderes das CNVA, a questão foi fechada, com as

seguintes opções de resposta: “solteiro”, “casado”, “casado consagrado”, “solteiro

consagrado”. Por “estado de vida”, entende-se a opção de vida que o membro da Comunidade

deve fazer: casado, celibatário ou sacerdote44. Nessa questão, o objetivo foi verificar a

porcentagem de casais presentes nas NCVA, em relação aos solteiros, tendo em vista que a

presença de casais consagrados e de celibatários (solteiros) vivendo um carisma comum é a

maior novidade que as CNVA trazem para a Igreja Católica. A distinção feita visou perceber

em qual categoria (solteiros ou casados) se encontram mais consagrados.

44 Ver Capítulo II, subseção 2.5.4 – Membros das CNVA.

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Gráfico 2 – Estado de vida dos membros das NCVA

A soma dos percentuais de cada categoria (solteiro + solteiro consagrado x casado +

casado consagrado) indica equilíbrio entre casados e solteiros. Por outro lado, verificando o

número de consagrados, percebe-se a predominância de casais consagrados (15%) sobre os

solteiros consagrados (6%). Há, pois, uma forte indicação para a presença dos leigos nas

Comunidades Novas buscando uma consagração religiosa que não exclua o matrimônio.

A presença de pessoas que não responderam a essa questão significa que pode estar

em um estado civil diferente das opções propostas, que pode ser, por exemplo, separado.

Percebe-se, pelo baixo número de pessoas que não responderam ao questionário (3%), que

existem poucos separados ou divorciados nas Comunidades Novas pesquisadas, apontando

para uma postura moral em conformidade com as orientações da igreja oficial de Roma com

relação ao matrimônio, no sentido de sua indissolubilidade.

Gráfico 3 – Inserção dos membros das CNVA na sociedade

No que se refere à inserção ou não dos membros das NCVA na sociedade, o resultado

aponta para a integração/inserção social dos membros à sociedade exercendo profissões

diversas e tendo outros tipos de ocupação, como o estudo. Pelo conhecimento informal,

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existem médicos, enfermeiras, advogados, juízes, professores, administradores, psicólogos,

entre muitas outras profissões, fazendo parte tanto como membro da Comunidade de Aliança

como da Comunidade de Vida. O que demonstra que a participação na comunidade religiosa

não exclui as demais atividades seculares de seus membros.

Percebe-se que os integrantes das CNVA estão em trânsito entre a communitas e a

societas (Tönnies), entre a estrutura e a anti-estrutura (Turner). Os membros das CNVA

vivem os mecanismos de homogeneização na communitas e de diferenciação na societas,

aparentemente, levando e trazendo valores de uma para a outra. Vive-se algo real e orgânico,

com fortes laços humanos e afetivos, em igualdade, na communitas, mas também é feita a

experiência do estranhamento, do afastamento, na societas. Essa situação pode ser geradora

de tensão, pela convivência permanente com valores contraditórios.

O resultado da questão ainda dá indícios de participação de pessoas que fazem parte de

camadas sociais que necessitam do trabalho próprio para o sustento e que já estão no

mercado, não sendo apenas estudantes, haja vista que 27% dos respondentes trabalham e

estudam.

Com tantas atividades (trabalho, estudo, serviços na Comunidade) fica a indagação de

real possibilidade de excesso de ativismo por parte dos membros, o que justificaria a

necessidade de um módulo da Escola de Formadores (módulo IV) enfatizar a vivência

fraterna e chamar a atenção para o cansaço, o stress e o pouco tempo para convivência entre

os membros das Comunidades45.

3.3.2 O Carisma das Comunidades Novas

Por ser um tópico sui generis, não se enquadrando no perfil pessoal do líder/fundador

nem no processo comunitário, e muito importante para a compreensão das CNVA, pois

apenas um carisma NOVO pode legitimar a existência de uma NOVA comunidade46, tratar-

se-á aqui do que se refere aos resultados do questionário sobre o carisma das Comunidades

Novas.

Perguntou-se: Qual é o carisma da comunidade da qual você faz parte? Na análise

dessa questão, a palavra carisma é entendida em seu sentido teológico, especificamente

quanto ao carisma de um “instituto” dentro da Igreja Católica, por exemplo, quando se diz

45 Ver subseção 3.2.3.3 – Parte pedagógica do quarto módulo, desta dissertação. 46 Ver Capítulo II, subseção 2.5.5 – Vocação, espiritualidade, carisma, fundadores e missão das CNVA, desta dissertação.

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“carisma beneditino”, “carisma franciscano”, “carisma dominicano”. É aquilo que lhe dá uma

índole própria, uma identidade, o que o diferencia das demais CNVA e de outros movimentos

e institutos pertencentes à igreja. Essa identidade vem especialmente da experiência religiosa

dos fundadores e, conseqüentemente, da experiência religiosa dos seus seguidores.

As Comunidades Novas procuram essa identidade própria e o fazem verificando a sua

história, o que foi por ela vivenciado, por meio de seus fundadores e primeiros membros, sob

a ótica da fé. A partir daí, formulam um resumo dessa experiência religiosa, que deve ser

buscada também por todos os que fazem parte da Comunidade.

Serão analisadas aqui as expressões que cada Comunidade encontrou para expressar o

seu “carisma” próprio. No quadro 7, estão transcritos os carismas descritos pelas 19

Comunidades que responderam ao questionário.

A santidade do matrimônio (03 responderam).

Viver a santidade do sacramento do matrimônio.

Amar, consolar e manifestar ao mundo o prazer que é Deus (04 responderam).

Anunciar a Divina Misericórdia do jeito de Maria.

Anunciar o amor libertador de Jesus Cristo crucificado como filhos de Maria.

Com Maria lançar a rede de pesca: o terço, atraindo almas a experimentar o Amor

de Deus revelado em Jesus Cristo.

Cuidamos de alcóolatras. Estamos descobrindo como trabalhar e definir esse

carisma.

Gerado no ventre de Maria ser para o mundo e para a Igreja pão partido e

partilhado, gerando vida ao coração do homem, por gratidão a Deus.

Indefinido, porém dentro da misericórdia divina que jorra da cruz de Cristo.

Morrer com Jesus na cruz para com Ele ressuscitar, levando a ressurreição aos

outros.

Na simplicidade do Espírito, doar-se por amor a Deus e aos irmãos, como Jesus se

consome por nós na Eucaristia.

Oração e Intercessão.

Permanecer no Eucarístico em silêncio, espera e adoração. (02 responderam).

Reconciliar-nos com Deus.

Resgatar a dignidade dos filhos de Deus, pela Misericórdia (02 responderam).

Reviver pela misericórdia - eu estava morto e revivi.

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Ser hóstia viva e bálsamo para a Igreja.

Ser sal que dá gosto e luz para iluminar.

- Ser sal e luz através de todos os meios possíveis.

- Levar o sal e a luz de Deus através de todos os meios possíveis (fazer as pessoas

experimentarem Cristo, verdadeiro sal que dá gosto à vida).

Ser sinal de unidade.

Testemunhar, no silêncio de Maria, a contemplação à cruz de Cristo.

Viver com alegria intensamente a radicalidade do sim a Deus (02 responderam).

Quadro 7 – Carisma das CNVA

Percebe-se que, em sua grande maioria, a definição do Carisma da Comunidade se

refere à uma forma de identificação adotada pelas comunidades, e na sua formulação se inicia

com um verbo na sua descrição. Essa particularidade se justifica porque o carisma está

diretamente relacionado com a vivência dos membros, com o ser e o viver de cada pessoa

consagrada àquele carisma.

Algumas das respostas aqui apresentadas, como por exemplo, “Indefinido, porém

dentro da misericórdia divina que jorra da cruz de Cristo”, confirmam a observação

participante durante os eventos, quando membros alegaram não saber indicar ainda qual era

seu carisma e quem era seu fundador, de modo que parece ser necessário se construir uma

história ou um mito fundador da comunidade.

Observando a repetição de temas nas respostas das perguntas abertas sobre os carismas

das Comunidades, foi feita uma divisão visando identificar aqueles mais freqüentes. A palavra

encontrada com mais freqüência foi MARIA (26%), conforme a transcrição das respostas:

• Anunciar a Divina Misericórdia do jeito de Maria ;

• Gerado no ventre de Maria ser para o mundo e para a Igreja pão partido e

partilhado, gerando vida ao coração do homem, por gratidão a Deus;

• Com Maria lançar a rede de pesca: o terço, atraindo almas a experimentar

o Amor de Deus revelado em Jesus Cristo;

• Testemunhar, no silêncio de Maria , a contemplação à cruz de Cristo;

• Anunciar o amor libertador de Jesus Cristo crucificado como filhos de

Maria .

Carismas que possuem a palavra MISERICÓRDIA (15,7%) no nome:

• Reviver pela Misericórdia ;

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• Misericórdia divina que jorra da cruz de Cristo;

• Resgatar a dignidade dos filhos de Deus, pela Misericórdia .

Carismas que possuem a palavra DEUS no nome (15,7%):

1. Reconciliar-nos com Deus;

2. Amar, consolar, manifestar ao mundo o prazer que é Deus;

3. Viver com alegria intensamente a radicalidade do sim a Deus.

Por outro lado, pela observância dos verbos e da redação, percebe-se a existência de

carismas que evidenciam a vivência de fé individual e subjetiva, como por exemplo:

4. Ser sinal de unidade;

5. Reconciliar-nos com Deus;

6. Permanecer no Eucarístico em silêncio, em espera e adoração;

7. Ser hóstia viva e bálsamo para a Igreja.

E ainda a existência de carismas que apontam para valores na relação com o outro. Os

exemplos abaixo destacam as palavras que demonstram saída de si mesmo:

8. Reviver pela misericórdia – eu estava morto e revivi;

9. Oração e Intercessão;

10. Amar, consolar e manifestar ao mundo o prazer que é Deus;

11. Morrer com Jesus na cruz para com Ele ressuscitar, levando a

ressurreição aos outros;

12. Anunciar a divina misericórdia do jeito de Maria; Na simplicidade do

Espírito, doar-se por amor a Deus e aos irmãos, como Jesus se consome

por nós na Eucaristia;

13. Testemunhar, no silêncio de Maria, a contemplação à cruz de Cristo;

14. Cuidamos de alcoólatras;

15. Resgatar a dignidade dos filhos de Deus, pela Misericórdia.

O carisma aqui descrito e analisado trata-se do carisma de uma nova forma de ser e de

reunir-se dentro da Igreja e possui, conforme a teologia, as dimensões carismática,

cristológica e evangélica, eclesial e de fecundidade, todas as dimensões exigem uma

experiência religiosa pessoal e comunitária por parte do fundador ou fundadores. A dimensão

carismática se encontra na vivência pessoal do fundador, que o leva a um caminho particular

de vida, de santidade e de ação.

A dimensão eclesial está mais relacionada com a “abertura para o outro”, para as

necessidades da sociedade e/ou da Igreja, no tempo em que se é experienciado aquele

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carisma, e para se relacionar com outros carismas. A dimensão de fecundidade também fala

dessa “abertura para o outro”, e é um aspecto essencial na identificação de um novo carisma

dentro da Igreja, ou seja, trata-se da comunicação da experiência religiosa pelo fundador(es) a

outras pessoas (discípulos) que, por sua vez, também se identificam e vivem experiência

religiosa semelhante a do fundador(es) (NOGUEIRA, 1999).

Nesse sentido, pode-se identificar experiências pessoais diversas, analisando a

definição do carisma de uma Comunidade pode divergir quando escrito por membros

diferentes. Por exemplo, um membro definiu o carisma como “Ser sal e luz através de todos

os meios possíveis” enquanto outro definiu o mesmo carisma como “Levar o sal e a luz de

Deus através de todos os meios possíveis (fazer as pessoas experimentarem Cristo, verdadeiro

sal que dá gosto à vida).” A diferença está justamente na compreensão do carisma como

vivência pessoal “ser o sal...” e a vivência para o outro “levar o sal...”, ou seja, que indica se

o mesmo é vivido na dimensão interior da experiência religiosa ou na abertura para o outro.

3.3.3 Processo Comunitário

As questões que se seguem referem-se, seja de modo quantitativo ou qualitativo, às

vivências de processos comunitários. Entendendo tal processo como: (a) a própria dinâmica

comunitária (início, atividades, número de membros, etapas de amadurecimento, recursos

para sustento e patrimônio, dificuldades de convivência); (b) a relação entre os membros e as

Comunidades (adesão, permanência, saída, consagração de vida ou aliança, fundação); (c) a

relação da comunidade com a igreja e (d) como a relação da comunidade com a sociedade. A

figura 2 procura esclarecer essas dimensões do processo comunitário.

Figura 2 – Dimensões do processo comunitário

Comunidade e Igreja

Dinâmica interna da Comunidade

Membros e comunidade

Comunidade e sociedade

Processo Comunitário

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3.3.3.1 Dinâmica Comunitária: estrutura, membros e seu fluxo de entrada e saída e etapas de

amadurecimento das Comunidades Novas de Vida e de Aliança

Na dinâmica comunitária estão elencados os elementos referentes ao contexto interno

da Comunidade e tudo o que está a ele relacionado, dando ênfase ao processo comunitário de

entrada e saída de membros e de transformações ao longo do tempo.

a) Fundação das CNVA47

A maioria dos que responderam ao questionário (66,6%) afirma que nasceu de um

grupo de oração da RCC. Alguns atestam que nasceram de um grupo formado pelo(a)

fundador(a), de um grupo de crisma ou de um grupo de outro movimento.

No questionário foi perguntada em qual data é considerada fundada a Comunidade. A

expressão “considera fundada” significa a data que a Comunidade, observando a sua história,

designou como data de sua fundação, que pode estar ligada a uma fase informal da vida

comunitária ou a uma fase mais institucional da Comunidade, podendo se referir, por exemplo

a: (a) quando o fundador da Comunidade simplesmente decide iniciar uma vida em comum

com outras pessoas, (b) quando um grupo de oração que já se reúne há algum tempo decide

comprometer-se mais com a Igreja e uns com os outros, (c) quando um grupo de pessoas,

junto com o fundador, decidem, sob a direção de um guia espiritual, como um padre,

comprometer-se a viver em comunidade religiosa segundo algumas regras por eles

estabelecidas.

Pela diversidade de possibilidades, não é possível fazer um esboço do surgimento das

comunidades, mas sim dizer que todas elas iniciam uma vida comunitária antes de serem

oficializadas, mesmo que essa vida comunitária não seja de convivência no mesmo teto, mas

de várias reuniões em comum. O quadro 8 demonstra as datas de fundação das Comunidades,

separadas por décadas.

Década de 80 - Comunidade Manain (15/11/87)

- Comunidade Católica de Casais Vida Nova (31/03/89)

Década de 90

- Comunidade Remidos no Senhor (19/01/91)

- Comunidade Católica Maria Mater Familiae (31/05/95)

- Comunidade Católica Terço da Sagrada Família (29/04/97)

- Comunidade Católica Magnificat (27/09/97)

- Comunidade Maria Auxiliadora dos Cristãos (30/04/98)

47 Ver Capítulo II – subseção 2.4.1 – Movimento da Renovação Carismática Católica.

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- Fraternidade Casa de Judá (14/10/99)

Década de 00

- Comunidade Católica Missionária Salve Maria (01/00)

- Comunidade Siloé (04/00)

- Comunidade Ressurreição (26/12/00)

- Comunidade Santa Clara (01/01/01)

- Comunidade Christós (14/04/01)

- Comunidade Filhos da Misericórdia (23/06/01)

- Comunidade Divina Misericórdia (16/09/02)

- Comunidade Católica Sal e Luz (06/11/2002)

- Comunidade Filhos de Maria (11/06/04)

- Comunidade Católica Kairós (17/01/06)

- Comunidade Católica Reviver pela Misericórdia (18/07/06)

Quadro 8 – Data de fundação das CNVA

Das comunidades que responderam, a mais antiga é a Comunidade Manain, de

Caruaru/PE, considerada fundada em 15/11/87, e a mais recente é a Comunidade Católica

“Reviver pela Misericórdia”, com sede em Natal/RN, considerada fundada em 18.07.2006. A

comunidade que organizou o evento foi a Remidos no Senhor, nascida em Pombal/PB,

considerada fundada em 19.01.1991.

b) Estrutura das CNVA48

As Comunidades Novas de Vida e Aliança possuem em sua estrutura duas formas de

pertença: vida ou aliança. O termo “comunidade de vida” se refere aos membros que deixam

as suas casas e vão morar em casas da comunidade, e o termo “comunidade de aliança” se

refere aos membros que continuam residindo em suas casas, entretanto formam vínculos com

a comunidade. Foi perguntado: Você faz parte da: com duas opções de respostas:

Comunidade de Vida ou Comunidade de Aliança, objetivando saber qual forma de pertença é

mais encontrada entre os líderes/fundadores presentes nos eventos pesquisados.

Os resultados mostram que 39% dos respondentes pertencem à Comunidade de

Aliança, enquanto 61% pertence à Comunidade de Vida. O que significa que os fundadores e

as lideranças, respondentes do questionário, pertencentes à comunidade de vida, representam

quase o dobro dos respondentes líderes das comunidades de aliança. Talvez isso se deva ao

48 Ver Cap. II, subseção 2.5.4 – A estrutura das CNVA.

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fato da exigência de maior disponibilidade de tempo investido na comunidade para as

lideranças e os fundadores que residem no seio de uma comunidade.

Mais diretamente sobre a estrutura da Comunidade, independente da opção do

respondente, pergunta-se: Qual a forma da Comunidade? Dando as opções de resposta: vida,

aliança ou vida e a aliança. Os resultados estão expressos no gráfico 4.

Gráfico 4 – Formas de vida comunitária: vida ou aliança

Essa resposta indica que as Comunidades de Vida se formam junto com as

Comunidades de Aliança, não existindo, entre as pesquisadas, comunidades apenas de vida,

existindo, porém, Comunidade de Aliança sem Comunidade de Vida. O que pode significar

que a ajuda financeira dada pelos membros da Comunidade de Aliança à obra influencie na na

formação da estrutura comunitária ou, por outro lado, pode significar apenas que há uma

tendência a existirem as duas formas de pertença nas Comunidades Novas.

Sobre a estrutura organizacional da Comunidade, foi feita uma pergunta de

múltiplas respostas. Pergunta-se: Qual a estrutura organizacional da Comunidade

atualmente? sendo dadas várias alternativas expostas o quadro 9, com os respectivos

resultados:

Assembléia de membros ou reunião do coletivo de membros

Diretoria/ conselho diretor/ coordenação

Conselho Consultivo

Conselho Admin.

Conselho Financ.

Grupos de oração

Minis-térios

Projetos de Evangeliza-ção

48,6% 48,6% 28,6% 28,6% 28,6% 28,6% 62,8% 68,5%

Quadro 9 – Estrutura organizacional das CNVA

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A maioria das Comunidades está estruturada em Ministérios (62,8%), que são grupos

de serviço à comunidade e à sociedade vindos da formação dos Grupos de Oração da RCC,

como Ministério de Intercessão, Ministério de Música, Ministério de Pregação, Ministério de

Teatro, Ministério de Pastorais49.

A maioria também possui Projetos de Evangelização (68,5%), como por exemplo,

junto às famílias, às crianças e aos jovens (maioria), que são projetos amplos, podendo ser

realizadas diversas atividades dentro e fora da Comunidade. Outras indicam tanto os eventos

realizados (“Forró do Povo de Deus”, “Festival de Artes”, “Casa de Show Católica”) como

projetos voltados para o social como “Lar de Idosos, “Ensino”, “Abrigo de Crianças”, “Centro

de Cultura da Vida”.

Poucos ainda possuem Grupos de Oração, que se reúnem uma vez por semana

exclusivamente para oração, louvor, escuta da Bíblica, 28, 6%. Esse resultado demonstra uma

discrepância em relação às formas de ingresso nas Comunidades Novas apresentadas nos

questionários, que foram os Grupos de Oração, com 62,7% de indicação. No entanto, nessa

questão apenas 28,6% o indicam como presentes na estrutura comunitária. Talvez a forma da

presente questão, com múltiplas escolhas e já no fim de um questionário relativamente

grande, tenha prejudicado as respostas.

Isso demonstra que a maioria das Comunidades pesquisadas está em fase inicial de

institucionalização, pois possuem ainda a estrutura dos Grupos de Oração da RCC, que é

muito simples, formada por uma Coordenação Geral e alguns Ministérios, além da assembléia

com todos os membros. Essa tendência vem sendo repetida a partir dos modelos de

Comunidades mais antigos, principalmente a Comunidade Católica Shalom, segunda mais

antiga Comunidade Nova do Brasil (fundada em 1982), que se dedica também à formação.

Apesar de iniciarem um processo de organização diferenciada, porque muitas já

possuem Projetos de Evangelização e algumas terem diversos Conselhos formados que são

criados de acordo com as necessidades ou por exigências formais, quando a Comunidade

deseja oficializar-se junto à igreja local50.

Dentro da estrutura interna, investigou-se quais são as formas de participação dos

membros nas decisões, sendo uma pergunta fechada, de múltiplas escolhas. Pergunta-se

Quais as formas de participação dos membros nas decisões? sendo colocadas várias

alternativas, conforme quadro 10, com os resultados encontrados.

49 Sobre a RCC e os ministérios, ver subseção 2.4.1 Origem no Movimento da Renovação Carismática Católica. 50 Ver também Cap II – subseção 2.5.3 – A estrutura das CNVA.

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Acesso aos registros e informações da comunidade 25,7%

Eleição da diretoria em assembléia geral/reunião do

coletivo de membros

33%

Prestação de contas aos membros em assembléia 28,6%

Participação nas decisões cotidianas da Comunidade 34,2%

Não existem mecanismos de participação 40%

Quadro 10 – Formas de participação dos membros nas decisões comunitárias

Nessa questão, boa parte não respondeu: 31,4%.Talvez o grande índice de respostas

deixadas em branco se deve à forma diferenciada da linguagem utilizada (termos de uso não

comum na comunidade), ou à forma como a questão foi exposta (necessidade de leitura das

respostas), ou pode não haver muito interesse por parte dos membros sobre o assunto, além do

posicionamento da questão ter sido quase no final do questionário.

Mesmo assim, o resultado indica um ponto problemático na vivência interna das

comunidades, ou seja, uma ausência de acesso às decisões e informações por parte de todos os

membros da Comunidade. Este resultado bastante significativo requer uma explicação que

demandaria outro estudo, no interior das comunidades, que no momento não foi possível

realizar, uma vez que a pesquisa se concentrou em uma amostra formada por líderes.

c) Membros e seu fluxo

Perguntou-se: Você é fundador? Respostas: sim ou não. Essa pergunta tem como

objetivo verificar o número de fundadores entre os presentes, inclusive destacando-os no

questionário, para perceber o grau de envolvimento do líder-fundador com a Escola de

Formadores de Campina Grande, curso pesquisado nesta dissertação.

Gráfico 5 – Percentual de líderes fundadores e outros líderes

Em números absolutos, responderam ao questionário 06 fundadores (18%) e 27

membros (82%). Entre os respondentes fundadores, há apenas 01 pertencente à Comunidade

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recém fundada (data de fundação: 2006), 03 pertencentes a Comunidades fundadas entre 2000

e 2002 e outros 02 que fundaram Comunidades nos anos de 1987 e 1989.

Esse percentual de fundadores participante da Escola de Formadores pode ser

considerado alto, em relação ao número de membros, indicando a importância dada por eles a

essa Escola, demonstrando preocupação com a formação em suas Comunidades. Pode indicar

também, por outro lado, que muitos fundadores não se consideram necessitados de formação.

Perguntou-se, em questão fechada, se o membro é ou não consagrado na sua

Comunidade, com opções de resposta sim ou não, objetivando perceber a fase do processo

comunitário pela qual a Comunidade está passando, no sentido de organização da formação e

denominação dada aos membros (vocacionados, postulantes, noviços, consagrados). O gráfico

6 mostra os resultados.

Gráfico 6 – Porcentual de consagrados e não-consagrados nas CNVA

Esses dados demonstram equilíbrio entre os consagrados (fundadores são considerados

consagrados) e os não consagrados, apontando para existência, entre as Comunidades

participantes, de fases diversas no processo comunitário, seja de fundação ou formação,

porque, como dito acima, a consagração indica uma fase mais avançada no processo de

formação da comunidade.

Logo após, perguntou-se há quanto tempo a pessoa é consagrada, procurando

aprofundar a pergunta anterior. Aqui serão analisadas as respostas das pessoas que se

dizem consagradas, sejam fundadoras ou não, sendo elas quase a metade dos que

responderam o questionário (46%-conforme gráfico acima).

O resultado confirma a tendência mostrada no universo pesquisado de que poucas

comunidades estão em uma fase avançada do processo comunitário, ou seja, estão entre

11 e mais de 15 anos de fundação. Apenas uma comunidade está no início da fundação (01

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ano) e a maioria (36%) está no processo intermediário de fundação (de 02 a 07 anos), e

somente 6% estão em um processo mais maduro de fundação, ou seja, com mais de 11 anos

de fundação.

Quanto às formas de ingresso na Comunidade foi proposta questão de múltipla

escolha, podendo optar por mais de um tópico. Os resultados estão expressos no gráfico 7.

Gráfico 7 – Formas de ingresso nas CNVA

Com relação ao número de participantes e seu fluxo foram formuladas três

perguntas: qual o número inicial de participantes; qual o número atual de participantes e

qual o fluxo de entrada e saída nos últimos 12 meses. Com relação ao fluxo de membros nos

últimos 12 meses, a pergunta foi a seguinte: Nos últimos 12 meses o número de participantes

(membros): aumentou, diminuiu, permaneceu igual. As respostas se encontram expressas no

gráfico 8.

Gráfico 8 – Fluxo de membros que entraram e saíram da comunidade nos últimos 12 meses

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A maioria das pessoas que responderam ao questionário (66%) disse que teve seu

número de membros aumentado nos últimos 12 meses e alguns disse que esse número

permaneceu igual (28%). Apenas uma pessoa disse informou que o número de membros da

sua Comunidade diminuiu: a Comunidade Católica Kairós, sediada em Taquaritinga do Norte,

fundada em 17/01/2006. Essa diminuição pode indicar que, como essa Comunidade se

encontra em fase bem inicial do processo fundacional (há apenas 01 ano o grupo resolveu

formar uma Comunidade), alguns membros resolveram se afastar, talvez por que foram mais

exigidos nos compromissos ou não concordaram com a decisão.

O número atual de membros varia bastante, ao ponto de um dos representantes da

Comunidade de Casais Vida Novo, Natal/RN afirmar que possui 900 membros (450 casais), e

Comunidade Santa Clara – Paulista/PE afirmar que possui apenas 12 membros.

Da análise dos questionários, percebemos que entre as mais numerosas estão:

• com 100 membros iniciais, a Comunidade Filhos da Misericórdia, com

sede em Fortaleza e uma casa de missão em João Pessoa, considerada

fundada em 23 de junho de 2001, com número atual de 80 membros e

nos últimos 12 meses esse número permaneceu igual;

• com 120 membros iniciais está a Comunidade Católica Maria Mater

Familiae, com sede em Natal/RN, considerada fundada em 31/05/1995,

com número atual de 60 membros e nos últimos 12 meses o número

de membros permaneceu igual.

Entre as menos numerosas estão:

com 03 membros iniciais, a Comunidade Santa Clara, com sede em

Paulista/PE, considerada fundada em 01/01/2001;

com 05 membros iniciais, a Comunidade Filhas de Maria, com sede em

Itambé/PE, considerada fundada em 11/06/2004, atualmente a

Comunidade possui, em média, 14 membros, e esse número tem

aumentado nos últimos 12 meses.

Em média, o número inicial de membros é de 06 a 22, aumentando ao longo do tempo.

Com exceção da comunidade mais recente, a Comunidade Reviver pela Misericórdia que, à

época da aplicação do questionário, estava com pouco mais de 01 ano de existência,

permanecendo com 22 membros desde a sua fundação (18/07/2006).

Nos casos acima expostos, as Comunidades que possuem um maior número de

membros permaneceram com esse número igual nos últimos doze meses, apesar de terem

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diminuído em relação ao número inicial de membros. E dentre as Comunidades que iniciaram

com um reduzido número de membros teve uma que aumentou esse número nos últimos 12

meses.

Os dados sobre o tamanho poderiam colocar em cheque o sucesso das CNVA, porque

a sua diminuição indicaria desinteresse das pessoas pela vivência em Comunidade.

Entretanto, também pode significar uma mudança no perfil dessas Comunidades, com a

tendência de serem “pequenos núcleos”. Vale lembrar também que a Comunidade sempre nos

remete a algo acolhedor, seguro, muitas vezes utópico, principalmente em nossos dias e,

quando levado para a realidade dos que procuram uma vivência comunitária, traz exigências

de lealdade absoluta que, quando não encontrada, facilmente é entendida como traição

(BAUMAN, 2003). Outra dificuldade encontrada seria quando algumas condições para que a

comunidade permaneça começam a desabar, por exemplo, quando as trocas entre o mundo

exterior e o interior passam a ser mais intensas do que as realizadas internamente (STASIAK,

2006).

Com o intuito de verificar o processo comunitário no tempo, perguntou-se: Você

percebe que Comunidade que você faz parte está crescendo ou diminuindo? Porquê?

A maioria (86,4%) respondeu que a comunidade está crescendo; apenas 02 (menos de

1%) responderam que está diminuindo e também 02 responderam que está estável. Uma delas

respondeu que só tinha 1 ano e 4 meses, ainda eram muito bebê.

Há uma aparente contradição deste resultado com o resultado apresentado no gráfico

8, que mostra apenas 66% de respostas indicando que o número de membros aumentou nos

últimos 12 membros. Entretanto, como aquela pergunta foi mais específica, pode-se entender

que a palavra crescendo, apresentada nesta questão, não seja entendida pelas pessoas que

responderam ao questionário, como diretamente relacionada com o aumentou ou diminuição

dos membros de sua comunidade. A essa palavra (crescendo) pode ser dado, por exemplo, um

significado espiritual, ou um entendimento melhor entre os membros, um melhor

aproveitamento da formação por parte dos membros.

Esse entendimento pode ser corroborado com as respostas apresentadas para justificar

o “crescimento” da Comunidade. Veja-se algumas:

- a formação;

- a procura por ajuda espiritual;

- porque estão sendo obedientes;

- a dedicação de todos da comunidade;

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- porque o fundador tem ousadia no Espírito e coragem de dar passos;

- porque as pessoas estão sedentas de Deus;

- pelo número de casais que a procuram;

- porque são chamados a servir em outras cidades e dioceses;

- pelo melhor entendimento da Igreja sobre as comunidades;

As pessoas que afirmaram que a sua Comunidade estava diminuindo, justificaram

assim sua resposta:

- porque ainda está saindo de uma crise;

- devido à dificuldade de aderir às exigências da vida comunitária.

Essas respostas poderiam levar ao entendimento de que essas Comunidades possuem

um maior tempo de fundação, o que as fariam vivenciar situações como essas. Entretanto,

ambas têm poucos anos de existência. A que justifica a diminuição porque está saindo de uma

crise tem 10 anos de existência, e a que justifica a diminuição por motivo de dificuldades na

vida comunitária tem 07 anos.

Na verdade, olhando para a intensidade de uma vida em comum, 07 ou 10 anos são

tempos suficientes para a entrada num processo de rotinização da vida comunitária com o

surgimento de várias tensões e conflitos entre os membros com riscos de perda dos valores

iniciais de fundação (Turner, Alberoni).

Pesquisou-se também qual seria a fase do processo comunitário que a Comunidade

estaria vivenciando, sendo esta uma questão de múltipla escolha. Para as opções de resposta,

foram usados termos que sugerem três etapas, quais sejam:

- iniciando e com muitos membros se engajando seria a fase inicial do processo

comunitário;

- com muitas atividades missionárias, mais centrada na formação, estável

indicam uma fase intermediária no processo comunitário;

- em crise e com muitos membros saindo indicam uma fase de mudanças ou final

do processo comunitário;

- o termo em tempo de definições pode indicar qualquer das fases.

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O gráfico 9 mostra o resultado dessa questão.

Gráfico 9 – Processo Comunitário

A maioria marcou que está com muitas atividades missionárias (24%) e em tempo de

definições (29%). Boa parte indicou que está concentrada na formação (15%), e algumas

indicaram que está estável ou com muitos membros se engajando (11% ambas), ou ainda

iniciando (8%). Apenas uma considerou que estava em crise e com muitos membros saindo,

foi a Comunidade Católica Magnificat, de Campina Grande, considerada fundada em

27/09/1997, ou seja, há mais de 10 anos.

Os dados demonstram que a maioria das comunidades pesquisadas se encontra em

uma fase intermediária de maturidade comunitária, verificada pela estabilidade e pelas

atividades missionárias, que indicam certa organização interna para poder sair em missão,

como também pela concentração na formação, que pode indicar necessidade de melhor se

estruturar.

O tempo de definições, apontado pela maioria, indica a preocupação em definir os

rumos da Comunidade. Provavelmente, no que se refere à redação do Regimento Interno ou

Estatutos, exigidos pela Igreja para que a comunidade se mantenha na diocese onde se

encontra.

Foi indagado no questionário sobre a existência de dificuldades de convivência

entre os membros, procurando perceber se há interferência disso no fluxo de entrada e saída

de membros nas Comunidades. Em caso afirmativo, perguntou-se sobre quais seriam essas

dificuldades. O gráfico 10 trás as possíveis escolhas e o resultado.

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Gráfico 10 – Dificuldades de convivência entre os membros na CNVA

Extrai-se dos resultados que a maioria de 63% admite que há dificuldade de

convivência na vida comunitária. As maiores dificuldades assinaladas fora: a dificuldade de

abertura das pessoas (31%), o tempo para a convivência (27%) e a falta de

perdão/reconciliação (24%). São problemas que ocorrem, freqüentemente, fora da vida

comunitária e que se buscaria ultrapassar, no contexto comunitário. Entretanto, não deixam de

existir em um passe de mágica, só porque há uma convivência comunitária, deve ser mais um

motivo pelo qual as CNVA estariam investindo em formação.

O questionário também explorou as atividades realizadas em comunidade, dando-se

algumas opções de atividades e podendo ser marcada mais de uma atividade. Buscou-se

observar as oportunidades de convívio e envolvimento comunitário, que reforçam os laços

fraternos entre os membros. O gráfico 11 demonstra os resultados encontrados.

Gráfico 11 – Atividades realizadas comunitariamente

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Os dados demonstram que as atividades rituais de oração de louvor e adoração ao

Santíssimo Sacramento são as mais indicadas como vivência comunitária (17% cada

atividade). A recitação do Rosário mariano também é atividade ritual (8%). Somando os

resultados, as atividades rituais ficaram com 47% das atividades comunitárias. O lazer e

a convivência são privilegiados como momentos comunitários de sociabilidade, somando

26%, demonstrando preocupação com as relações afetivas entre os membros. As missões e os

serviços são outras formas de agregarem os membros comunitariamente, somando 24%.

No que se refere à manutenção da Comunidade, investigamos se ela tem sede

própria e encontramos o seguinte resultado: 59% das Comunidades responderam que não têm

sede própria e 41% responderam que possuem sede própria. Os resultados demonstram que

grande parte possui sede própria, indicando um bom grau de organização e planejamento de

manutenção da Comunidade no tempo.

Quanto a outros patrimônios, que não seja a sede da Comunidade, perguntando: a

comunidade tem patrimônio próprio? Não, Sim, O quê? Foi obtido o seguinte resultado: 74%

afirmam que têm patrimônio próprio, enquanto 26% afirmam que não têm, revelando que,

apesar de muitas Comunidades não terem sede própria, a grande maioria possui outros

patrimônios como terreno, propriedade rural, móveis, equipamentos, terras com construções,

carro, indicados no questionário.

Para verificar como esse patrimônio foi adquirido, foram feitas mais algumas

perguntas. Primeiro, quanto à origem dos recursos que sustentam a Comunidade, com

algumas possibilidades de resposta expressas no gráfico 12, junto com os resultados.

Gráfico 12 – Origem dos recursos para o sustento da comunidade

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O resultado mostra que os recursos vêm proporcionalmente dos próprios membros

(42%) e de doações (42%), em igual proporção, poucos indicam outras origens (11%) ou

ajuda da igreja/paróquia (2%) ou de projetos governamentais (0%).

Além dessas mencionadas fontes, os recursos podem provir de outros meios, por isso

indagou-se sobre a realização de projetos/campanhas de arrecadação nos últimos 12 meses,

deixando a possibilidade de indicação de quais seriam esses projetos. Como resultado, 69%

afirmaram que sim e 31% afirmaram que não. Sobre quais foram os projetos de arrecadação

de fundos, houve menção, entre outros, a sorvetada, rifas, eventos, brechó, bazar, chá,

feijoada, bingos, campanha porta a porta, venda de CDs, campanha para construção de sede

própria.

Do grupo de respostas acima, sobre a origem dos recursos das Comunidades Novas,

concluímos que o patrimônio e o sustento das Comunidades Novas provêm de dos próprios

membros51, de doações e de projetos de arrecadação de fundos.

Foi investigada a faixa etária do grupo que iniciou a experiência comunitária ,

procurando perceber se o fenômeno de fundação de Comunidades Novas está ou não

relacionado com uma faixa etária determinada, devendo ser apontada uma das respostas

sugeridas.

O alto percentual de pessoas que não responderam a essa questão (82%) é justificado

pelo fato de que elas não participaram do início da fundação da Comunidade. Portanto,

apenas as que se consideram fundadoras de Comunidades (06 pessoas - 18%), responderam-

na. Isso deixa a presente questão em suspeita, pela pouca variedade de Comunidades

avaliadas. Mesmo assim, constata-se que a faixa etária do grupo fundante dessas 06

Comunidades é variável, estando o número de jovens, de 15 a 25 anos e de 21 a 25 anos, em

maioria (somam 12% dos 18% que responderam).52

Perguntaram-se quantos por cento dos membros que iniciaram a experiência

comunitária permaneciam até então, dando algumas opções para escolha. Nessa questão

objetivamos investigar a tendência à evasão dos que fundaram a Comunidade, após um

determinado período.

Houve bastante variação no resultado dos que responderam à pergunta, houve um

equilíbrio entre 20% e 80% de permanência e entre 10% e 100% de permanência, mas

também houve indicação de 30% e 50% de permanência. Essa grande variação pode ser

51 A Comunidade de Aliança em geral trabalha e contribui com parte de sua renda para a Comunidade em Geral, e a Comunidade de Vida também, pode, em alguns casos, trabalhar. 52 Ver gráfico 13.

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explicada talvez pelo fato de que o processo comunitário dessas comunidades se encontra em

diferentes fases. Ou seja, aquelas que afirmam que permanecem 100% dos membros significa

que são as que foram fundadas há pouco tempo, talvez 01 ano ou dois; as que afirmam que

permanecem apenas 10% dos membros foram fundadas a mais tempo e talvez já possuíssem

poucos membros desde a sua fundação. As demais estão em tempos intermediários no

processo comunitário. Entretanto, a essa tendência natural, diverge a Comunidade Kairós,

com apenas 01 ano de existência que informou que há muitos membros saindo.

Gráfico 13 – Percentual dos membros que permanecem desde a fundação da CNVA

Esse resultado demonstra que a juventude foi/é uma fase propícia para iniciar

Comunidades Novas, mas não a única. Comparando essa análise com a estimativa de idade

dos fundadores respondentes, que estão metade (06) entre os 20 e os 30 anos e outra metade

entre os 41 e 50 e poucos anos, e levando em consideração o tempo de existência de suas

comunidades, percebemos que, com raras exceções, a fundação de comunidades é feita por

membros em idade bem jovem.

A forma de engajamento dos membros nas comunidades é, em geral, por participação

em grupos de oração, em Seminários de Vida no Espírito Santo e em eventos.53 Atendimentos

são conversas e orações com as pessoas que procuram a comunidade para aconselhamentos e

orações, e são uma das formas de atração de pessoas para engajar-se na Comunidade.

53 Ver Capítulo II, subseção 2.5.3 – Origem na RCC.

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3.3.3.2 – Relação entre os membros e a comunidade (adesão, permanência, saída,

consagração, fundação)

Nas análises das questões que seguem tratar-se-á de aspectos internos da relação entre

os membros e a comunidade, sendo a maioria das questões abertas, nas quais serão feitos

comentários buscando relacionar o discurso exposto nas respostas com a teoria exposta no

primeiro Capítulo desta dissertação. Para começar, analisaremos as questões de múltiplas

escolhas, apenas duas, seguidas.

Foram exploradas as principais motivações para a entrada e a saída dos membros.

Com relação a entrada, pergunta-se Qual o motivo para a entrada, com várias opções de

resposta expressadas no gráfico 14.

Gráfico 14 – Motivações para entrada nas CNVA

A motivação mais indicada para decisão de pertencer à comunidade foi o desejo de

servir a Deus (28%), seguido pelo desejo de se consagrar a Deus e situações difíceis que

estão sendo vividas (ambos 19%), influência de amigos (14%), comprometer-se com o reino

de Deus (10%) e outros (6%). O motivo inconsciente ficou com 3% e o medo da solidão teve

apenas 1% das respostas.

Os dados demonstram que há um desejo coerente em pertencer a uma comunidade

religiosa, que seria servir a Deus e se consagrar a Deus, não se sabe, porém, se esse desejo

vem acompanhado de uma consciência sobre as implicações geradas dessa pertença, como

renúncia aos projetos pessoais, afastamento da família (dificuldades indicadas no quadro 13).

A diferença entre os termos está no detalhe de “servir” e “consagrar”, no qual “servir” assume

uma conotação em direção ao outro, e “consagrar”, uma conotação mais subjetiva da

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experiência com o sagrado. A opção comprometer-se com o reino de Deus também tem um

significado em direção ao outro.

Por fim, a influência de amigos teve certo peso nas decisões, talvez, e principalmente,

na parcela mais jovem dos participantes. Vale notar a pouca influência, na decisão, causada

pelo medo da solidão.

Para as opções de motivações para saída da Comunidade, perguntou-se: Qual(is) o(s)

motivo(s) para a saída de membros, com as opções de resposta expressas no gráfico 15 junto

com os resultados.

Gráfico 15 – Motivações para saída das CNVA

A maior motivação apontada foram os interesses pessoais (41%), o que demonstra a

influência da cultura atual no seio da comunidade, pois enquanto a Comunidade exige do

membro renúncia dos planos pessoais em função do projeto comunitário, a cultura atual

influencia no sentido de pensar primeiro nos projetos pessoais.

Também é notável a influência das crises pessoais (29%), indicando o pensamento da

sociedade atual no sentido da grande importância dada à pessoa, que busca o equilíbrio

emocional, o tratamento psicológico.

Parece contraditório que tenha sido indicado que as crises comunitárias (15%) pouco

influenciem para a motivação de saída dos membros, tendo em vista que tanto as crises

pessoais como os interesses pessoais estão presentes na crise comunitária e vice-versa. Talvez

as pessoas que responderam os questionários não percebam a profundidade do significado de

crises comunitárias.

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Com as respostas abertas, que estarão presentes nas questões que seguem, objetivamos

deixar os membros das Comunidades livres para se expressarem, com o intuito de analisar o

discurso presente nas respostas.

Pesquisando o porquê de se consagrar em uma Comunidade Nova ou fundá-la,

perguntou-se: Porque você decidiu se consagrar ou fundar uma comunidade? As respostas

estão transcritas no quadro 11.

Eu fui rendida por amor a Jesus, em levar Jesus aos irmãos, para que eles tenham vida e a

tenha em abundância

Para ficar mais próximo do coração da trindade (consagração a Mª Santíssima). (ñ no

carisma ainda ñ tem)

Porque decidi viver 24 horas para anunciar o evangelho a toda criatura. E também aceitar

um chamado de Deus

Senti o apelo de Deus para vivermos mais intensamente a fraternidade e o apostolado

Pelo estado desumano que se encontrava a minha sociedade

Por uma vontade de corresponder a medida de Amor a qual fui amada. Por uma profunda

gratidão foi e é isso que me impulsiona

Porque vivi uma grande experiência com o Senhor

Primeiro pela fonte e autor do chamado, Deus e depois pela busca pessoal do sentido da

minha vida, do meu encontro com aquilo que me realiza enquanto pessoa

Porque descobri aqui minha vocação

Como aliança pelo chamado a viver uma vida santa.

Após a experiência fundante, decidi assumir o carisma derramado entre nós.

Quero me consagrar porque encontro na minha comunidade um modo de vida que me faz feliz

Eu decidi consagrar a minha vida para um sentido em minha e pode fazer algo mais para aos

pobres a partir de uma vida fraterna.

Pelo desejo de dar a vida no carisma pelo qual me senti atraída.

Eu decidi e desejo consagrar-se porque eu tive uma experiência pessoal do amor de Deus por

isso desejo dar a minha vida.

A consagração para mim é a aliança concreta com Deus.

Consagrar para uma vivência mais integral da vontade de Deus; Fundar não decidiu fundar

uma comunidade, aconteceu.

Não sou consagrada, porém meu objetivo dentro da comunidade é viver o carisma junto a

consagração.

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122

Me senti chamado a entregar de maneira definitiva minha vida a Deus.

Porque algo inquieta o meu coração e quero buscar em Deus e por Ele. Os apelos do meu

coração.

Para atender ao chamado de Deus em servi-lo na pessoa dos que sofrem pela ausência de

Deus e de boas condições de vida.

Para servir a Deus de forma mais profunda.

Porque senti um chamado de Deus para viver algo mais forte, um amor radical do Evangelho

e a Igreja.

Quadro 11 – Decisão de se consagrar/fundar uma CNVA

Analisando os destaques feitos nas falas transcritas em relação aos valores difundidos

pelas Comunidades, a partir dos cursos de formação, em especial o módulo II da Escola, que

versou sobre fundação das Comunidades e formação integral dos seus membros, pode-se

dizer que o acento no chamado de Deus que seria feito a cada pessoa, para viver uma forma

específica de vocação, um carisma, está diretamente em consonância com as lições da Escola.

A experiência com o Senhor é outro termo utilizado nas respostas que foi aprofundado na

Escola, como essencial para perceber o chamado de Deus na vida da pessoa, devendo ser

corroborada com passagens do Evangelho que direcionem esse chamado, que é a própria

realização pessoal.

Muitos (06) falam do chamado de Deus para fazer ou viver alguma coisa; outros de

uma resposta de amor e gratidão a Deus, aliança com Deus, por ter tido uma experiência

com o Senhor, como uma forma mais profunda de servir a Deus, outros falam de realização,

sentido da vida, vocação, felicidade.

Verificamos as respostas e percebemos certa homogeneidade nas mesmas, com

repetições de termos. Essas repetições são em virtude da assimilação de um discurso religioso

próprio dessas comunidades, que valorizam o lado espiritual, a relação pessoal com Deus, a

experiência individual de fé.

Analisando-as a partir da discussão teórica feita no capítulo 1, podemos identificar nas

falas se as pessoas, principalmente os fundadores das Comunidades, viveram um estado

nascente, conforme Alberoni.54 Pode-se citar a presença do renascer e da experiência de

transcendência. Os fundadores renascem, a partir do retorno às origens do Cristianismo, que

os leva a pensarem sua fé no momento em que se vive, a partir da experiência inicial cristã.

54 Ver Cap. I – subseção 1.4.3 – A experiência fundamental.

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A experiência de transcendência se encontra nas respostas referentes à experiência

religiosa, das quais destacamos: porque vivi uma grande experiência com o Senhor. Não só os

fundadores das Comunidades Novas, mas muitos que vivem uma experiência com Deus,

como os que almejam se consagrar em uma Comunidade Nova, dizem que estão nascendo

para uma nova vida. Na verdade, ficam “apaixonados” por Deus, porque levavam uma vida

sem amor. “A experiência metafísica existe até no apaixonar-se, quando o indivíduo

compreende que a vida que levava ignorava, na realidade, o amor. (...) Diante deste amor,

desta plenitude de vida e de ser, todo o mais parece murcho e insignificante” (ALBERONI,

1991, p. 95/96).

Entre as respostas que estão fundadas em uma consciência social, preocupando-se

com as necessidades da sociedade, destacam-se: para poder fazer algo pelos mais pelos

pobres a partir de uma vida fraterna; pelo estado desumano em que se encontrava a minha

sociedade; para atender ao chamado de Deus em servi-lo na pessoa dos que sofrem pela

ausência de Deus e de boas condições de vida. Sobre a função social da religião, João Décio

de Passos analisa que os grupos “passam a operar suas representações e práticas religiosas

como um protesto da ordem social e política estabelecida e a buscar novas legitimações”

(PASSOS, 2006, p.114).

Por fim, pode-se dizer que, de qualquer forma, a maioria das respostas demonstra uma

profundidade na experiência com o Sagrado, a partir da qual se foi tomada uma decisão de

mudança de vida e de intervenção na sociedade. Pode-se dizer, de um “aprisionamento” ou

uma necessidade de manter uma relação com o Sagrado, que passa a direcionar as vontades e

as decisões da pessoa.

Por outro lado, após investigar sobre a decisão de se consagrar/fundar uma

Comunidade, pergunta-se sobre qual é a maior dificuldade na decisão de se

consagrar/fundar, procurando encontrar as tensões existentes no momento da decisão. As

respostas encontradas estão no quadro 12:

Maior dificuldade foi deixar a minha maior riqueza, meus pais, minha família (consagrar).

Compreender o chamado de servos de Maria Santíssima. E de ñ responder o chamado.

Renunciar as minhas vontades e sonhos.

O medo da responsabilidade e a resistência ao novo por parte de outras pessoas, que geraram

incompreensões.

O medo de apresentar - algo diferente a sociedade que pudesse ver que é possível ser digno.

O deixar o que para mim era tão importante, família, projetos pessoais, etc.

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Me aceitar como fundador.

Vencer as resistências internas e externas, para um ato de entrega total.

Ter que romper com os relacionamentos.

O receio de não estar certo, insegurança.

O medo de responder ao chamado de Deus.

Saber que sou limitado e por isso poderia ter dificuldade em relacionar-se com os irmãos de

comunidade.

A aceitação da minha família quanto à minha escolha.

Espero o tempo de me consagrar por isso o bom Deus vai administrando as minhas

dificuldades.

Consagrar-se - não houve dificuldade, já era anseio do meu coração; fundar - aceitar que

tenha sido eleito para tal missão.

Para almejar a consagração a dificuldade que hoje encontro é "caminhar" com meu esposo –

somos comunidade de casais.

Abandonar minha vida.

Ser aquilo que Deus quer a aceitação da vontade de Deus que custou entrar na minha cabeça

e coração.

Perder minhas próprias vontades para buscar me esforçar em fazer a de Deus.

Prejudicada em razão do que foi explicado na resposta anterior.

Renunciar aos meus planos e sonhos.

Quadro 12 - Dificuldades em fundar uma comunidade ou nela se consagrar

Analisando as respostas, nota-se a presença de verbos que indicam dores como

deixar, renunciar, romper, abandonar. Também há repetição das palavras medo e receio,

sendo destacado em negrito algumas respostas mais significativas. O que reafirma a idéia dos

estudiosos da religião Rudolf Otto; Mircea Eliade (PASSOS, 2006), de que a experiência com

o divino e suas hierofanias traz em si contradições, como atração e temor.

Essas expressões revelam, por outro lado, a necessidade de um redirecionamento da

própria vida, de uma conversão, que pode ter sido imposta pela experiência com o sagrado ou

pelas exigências para se consagrar em uma determinada comunidade, principalmente para

aqueles que deixam seus empregos, estudos, família e vão morar em uma comunidade de

vida. Vale lembrar a característica de unanimidade da communitas, apresentada por Victor

Turner, identificada na condição do neófito que deve se esvaziar de todos os conhecimentos e

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adquirir a sabedoria do grupo no qual se insere, para os quais “é preciso mostrar-lhes que, por

si mesmos, são barro ou pó, simples matéria, cuja forma lhes é impressa pela sociedade”

(TURNER, 1974, p. 127)

De qualquer modo, sempre existe uma dificuldade nessa decisão, o que mostra que

não é algo tranqüilamente aceito pela pessoa nem pela sociedade. Há uma tensão, provocada

pelo estado de liminaridade e sua natural transitoriedade descrito por Turner (1974). A

consagração é considerada como um rito de iniciação, fruto de um processo ritual que

significa a mudança de “status”, ou seja, a mudança de vida e até de personalidade55.

A consagração, como prática religiosa expressa em um ritual, produz sentido e eficácia

para os membros das Comunidades Novas, em especial por ser uma experiência religiosa

carismática, na qual o ritual é operado de maneira espontânea, dando um “equilíbrio tênue

entre o consenso coletivo e a fruição individual” (PASSOS, 2006, p. 94)

Enfim, da análise dessas respostas, ainda se percebe que os fundadores sentem

dificuldade em aceitar essa condição, destacando-se a presença do medo da responsabilidade

de tal ato. Além disso, parece que a decisão de fundar uma comunidade não é plenamente

racional e pessoal, pois o verbo aceitar revela algo que se é posto, como um convite.

Complementando essas duas questões, para identificar a confirmação das respostas,

principalmente à pergunta sobre a decisão de se consagrar, questionou-se ainda: O que mais

lhe motivou a se consagrar/fundar uma comunidade? As respostas foram as seguintes:

Levar o amor de Jesus a tantas pessoas que necessita a experimentar o que eu experimentei

um dia. Por isso eu me consagrei.

Foi o amor que a Virgem Mª em c/ a comunidade.

A certeza do amor de Deus por mim. Saber que sou pérola preciosa.

Percebia uma urgência para evangelizar.

A alegria da restauração das pessoas.

A gratidão a Deus.

Jesus, o desejo de segui-lo.

O meu sentimento de pertença a Deus.

A experiência que fiz no primeiro contato com o carisma.

Não podia responder negativamente a Deus. Foi e é até hoje um ato de gratidão e oferta.

Vejo um sinal de contradição ao mundo que me atrai profundamente.

55 Ver Cap. I – subseção 1.3 – Comunidade e sociedade.

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Crescer na intimidade com Deus e pela vida fraterna.

Minha identificação com o carisma.

O que motiva a consagrar-se é o amor, a sede de se entregar ao Senhor.

A certeza de me aliar com um povo com chamado específico de lutar pelo reino.

consagrar - o desejo de pertença a Deus; Fundar - ser fiel à eleição de Deus.

Viver o carisma vida nova.

A evangelização dos jovens.

A busca do serviço de Deus e sentir-me bem na vida em comum com os irmãos. A vida

fraterna é o que desejo para minha vida.

O desejo de vê outras pessoas receber o que Deus me deu.

A alegria de ter conhecido Jesus.

Encontrei um novo sentido para a minha vida, uma felicidade concreta, e um amor por Deus

que me conquistou.

Quadro n° 13 - Motivações para se consagrar em uma CNVA

Verificando as respostas, podemos dizer que algumas delas possuem um caráter mais

subjetivo (motivações interiores), como o amor a Deus, a gratidão a Deus, sentimento de

pertença a Deu, identificação com o carisma. E outras revelam motivações exteriores ou em

relação ao outro como, por exemplo: o desejo de ver outras pessoas receberem o que Deus

me deu; uma urgência para evangelizar; vejo um sinal de contradição ao mundo que me atrai

profundamente; a certeza de me aliar com um povo com chamado específico de lutar pelo

reino; a evangelização dos jovens; a busca do serviço de Deus e sentir-me bem na vida em

comum com os irmãos.

A experiência fundante, aqui analisada em suas motivações, é expressa por João Décio

de Passos56, no livro “Como a religião se organiza – tipos e processos” (2006), como uma

experiência com um ser superior a partir da qual o grupo religioso se constitui, argumentando

que é uma experiência complexa, que envolve a cultura, a psique humana, atos de fé e fatos

históricos.

Quando Mircea Eliade (1992) aborda o tema da consagração, explica-o como se o que

existisse antes não mais importasse, por exemplo, quando há a consagração de um território.

“A ereção da Cruz equivalia à consagração da região e, portanto, de certo modo, a um ‘novo

56 Doutor em ciências sociais, professor associado do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da PUC-SP.

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nascimento’.(...) A terra recentemente descoberta era ‘renovada’, ‘recriada’ pela Cruz” (Ibid,

p. 35). Trazendo para a consagração da pessoa, como é o caso em análise, a motivação de

consagrar-se seria encontrar um lugar novo dentro de si, no qual pudesse “colocar a Cruz” e

ter uma relação direta com o sagrado, considerando o corpo humano como um Cosmos

(ELIADE, 1992).

Ainda no mesmo sentido, aprofundando um pouco o tema da consagração, agora se

verifica a experiência dos respondentes após a consagração, perguntando-lhes: O que mais lhe

motiva a permanecer na comunidade? O quadro 14 trás as respostas:

A necessidade em ajudar aquele que sempre nos procura e hoje eu não sei viver mais sem a

comunidade.

O amor de Jesus vivido fraternalmente.

A certeza de fazer e assumir o meu chamado que é me doar sem querer nada em troca só o

céu.

A convicção pessoal de que sou chamado por Deus para isso.

A transformação dos homens.

A força do Amor Redentor.

Fazer a vontade de Deus.

Amor misericordioso na minha vida na certeza "Se vivo, vivo pela misericórdia do Senhor."

O encontrar-se com a pessoa de Deus.

A certeza de que aqui me realizo e realizo a vontade de Deus.

O amor de Jesus Cristo que se expressa no serviço através do carisma da comunidade.

Buscar mais e mais a Deus - convivência fraterna. Amor aos irmãos - castidade.

O amor ao Deus eucarístico e aos meus irmãos.

Através do carisma da comunidade transformar a sociedade.

Minha identificação com o carisma.

A cada dia fica mais clara qual é a vontade de Deus para mim: doar a vida.

O chamado de Deus para dar a vida.

O amor do Senhor que transborda nos irmãos, a vida fraterna.

O amor a Jesus Eucarístico, a Nossa Senhora, e o carisma de servir a Igreja.

O desejo de ver a vontade de Deus tornar-se realidade no meio de nós.

Viver o carisma "santificação do matrimônio" na minha vida pessoal.

A certeza da minha vocação e o chamado, particular, único e irrepetível que abarca toda a

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minha vida.

O conhecimento de Deus, o meu chamado. O Amor pela comunidade (carisma).

O carisma da Misericórdia.

Como já disse a vida fraterna, a vivência dos irmãos e outras pessoas que precisam conhecer

a Deus.

A responsabilidade em vê que tem pessoas me seguindo (seguindo o Jesus que eu anuncio).

Em primeiro lugar, a certeza de que a vivência do carisma é uma via segura para a santidade.

Além disso, a vida fraterna.

A presença e o amor que Jesus tem por mim.

Perceber que a cada dia Deus me mostra a sua vontade e me dar forças para perseverar.

Quadro 14 - Motivações para permanecer na CNVA

Da análise dos discursos, observa-se que a permanência na comunidade provocou

respostas mais seguras por parte dos respondentes, pela presença das palavras certeza,

convicção, mostrando que, após a entrada na Comunidade Nova, as dificuldades vividas antes

diminuem, aumentando a certeza da decisão, o que aponta para a força da vivência

comunitária (TURNER, 1974), no sentido de os valores e as vivências das pessoas que fazem

parte da comunidade influírem bastante nos valores e vivências das pessoas que nela

ingressam.

Dividindo por temas, destaca-se as respostas que evocam a vida comunitária,

expressas na freqüência das palavras comunidade, a vida fraterna, como por exemplo: o

amor de Jesus vivido fraternalmente; buscar mais e mais a Deus – convivência fraterna.

Amor aos irmãos – castidade; como já disse, a vida fraterna, a vivência dos irmãos e outras

pessoas que precisam conhecer a Deus. O foco na vida comunitária (fraterna) aponta para os

estudos de Tonnies (1995) e Turner (1974), que diferenciam a vida comunitária da vida em

sociedade57, sendo a comunidade uma unidade orgânica, viva, na qual há uma unidade de

vontades humanas e a sociedade uma estrutura mecânica, pública (TONNIES, 1995), ou seja,

enquanto a comunidade expressa valores de afetividade pessoal, partilha, aproximação entre

os membros, igualdade, humildade, a sociedade possui papéis próprios, aos quais as pessoas

precisam se modelar (TURNER, 1974).

Outras respostas evocam a experiência religiosa propriamente dita, como, por

exemplo: a convicção pessoal de que sou chamado por Deus para isso; o encontrar-se com a

57 Ver Cap. I – subseção 1.3 – Comunidade e Sociedade.

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pessoa de Deus; o conhecimento de Deus, o meu chamado. Reforçando a idéia já exposta da

força da experiência religiosa na vida das pessoas.

Verifica-se, por outro lado, a repetição do tema amor, com diferentes focos,

expressando motivações interiores, como, por exemplo, a força do amor redentor; amor

misericordioso na minha vida; o amor de Jesus vivido fraternalmente. Essa repetição remete

à abordagem das comunidades emocionais, cujo valor maior é o sentimento de amor.

Entretanto, houve respostas com expressões dar a vida, doar a vida, demonstrando,

mais uma vez, solidariedade e altruísmo, como: a cada dia fica mais clara qual é a vontade

de Deus para mim: doar a vida; o chamado de Deus para dar a vida. E, por fim, respostas

que se remetem à identificação com o carisma da comunidade, como por exemplo: o amor

pela comunidade (carisma); o carisma da misericórdia.

Para verificar as vivências dos membros antes e depois do ingresso na Comunidade

Nova, perguntou-se: Qual a diferença entre sua vida antes de entrar na comunidade e

agora?”As respostas foram interessantes:

Eu era mais desocupada hoje não tenho mais tempo nem para mim.

São muitas as forma de ver o mundo, as pessoas, o sentido para viver e servir conceitos e

principalmente a fé que ante ñ era despertada em meu coração

E que antes eu vivia perdida sem saber se quer a minha identidade. Hoje tenho a certeza da

minha identidade e do valor de mulher.

Pois antes tinha sonhos meus, mas agora tenho sonhos que fazem todos em minha volta felizes.

A comunidade me amadureceu em todos os sentidos da minha vida, me deu valores que

permanecem.

Devido as crises houve grande crescimento.

Enorme. Hoje sou outra pessoa renovada pela graça de Deus.

As mudanças refletem-se especialmente em meu interior, é encontro, é integração, é

realização mesmo que vivendo com as dificuldades da vida.

Eu não tinha noção de como viver, agora encontrei o jeito, forma, meta.

Equilíbrio emocional, novos relacionamentos saudáveis, era um jovem desordenado com um

relacionamento da mesma forma, hoje, tenho meu emprego, casado, amando e servindo a

Igreja.

Foi tive experiências em outra comunidade. Estou em outra que acredito ser minha vocação -

A mudança de vida é estúpida - grande transformação nos valores, morais, sociais,

religiosos.

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Já caminhava há 10 anos no grupo de oração que originou a Comunidade. Portanto, em

termos de conversão e decisão pouco mudou. Porém, a ousadia, a confiança em Deus e a

disposição em tudo dar se tornou mais sólida.

A diferença é completa: no sentido moral, ético, profissional, afetivo, intelectual.

A maior diferença é que hoje percebo que sou digno e posso realizar muito em favor do outro,

a partir do amor de Deus.

Em todos os aspectos: mentalidade, amigos, trabalho, valores.

Antes de entrar na comunidade eu participava do grupo de oração, mas havia o desejo de

doar-se mais. Na comunidade tenho descobrindo mais qual é a minha identidade.

Antes da comunidade já vivia uma vida de Igreja, mas após a comunidade vivo isso com mais

intensidade.

A diferença é que eu buscava ansiosa para encontrar minha vocação e hoje me encontrei já

não existe mais inquietações, pois estou dentro do plano de Deus para mim.

Antes de entrar na comunidade eu era uma pessoa feliz, porém hoje me sinto "feliz e

realizado". Nada me falta.

Vivia no escuro, hoje na luz.

Viver totalmente desapegado de bens materiais.

Mesmo já sendo de caminhada, a minha vida mudou em relação à maturidade matrimonial.

Total e radical, noto um crescimento humano, espiritual e intelectual que não tinha antes de

entrar na comunidade.

Antes eu não tinha a experiência do Amor de Deus, e hoje a minha vida é para Deus é doada

para o serviço da comunidade.

Hoje sinto-me livre, satisfeita, completada.

Agora é a certeza absoluta de servir a Deus por amor e necessidade própria.

Antes eu só pensava em mim e hoje quando tenho que fazer algo penso em primeiro lugar na

comunidade.

Antes eu vivia da forma que queria, horário, vida financeira, hoje é a missão que indica os

meus passos.

Depois de entrar na comunidade, passei a viver minha fé com mais responsabilidade e

fidelidade.

Mudei bastante em relação à maturidade humana e espiritual, sou um novo homem sempre

em processo de conversão.

A motivação para superar os desafios, a confiança que não sou eu que faço, mas o Espírito

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que me leva, a alegria de viver.

Quadro 15 - Mudanças nos membros após aderirem à CNVA

Essas respostas revelam a experiência religiosa dos membros das comunidades,

identificada como experiência de plenitude. Segundo Mircea Eliade (1992), a existência

humana possui duas dimensões, um modo de ser sagrado e um modo de ser profano. Apesar

do homem na sociedade contemporânea ter perdido muito da dimensão do sagrado, quando

ele faz uma experiência religiosa, passa a ter um comportamento, uma visão de mundo

diferente da pessoa não-religiosa, a partir dessa experiência, principalmente diferenciando os

espaços sagrados dos espaços profanos. “Para o homem religioso essa não-homogeneidade

espacial traduz-se pela experiência de uma oposição entre o espaço sagrado – o único que é

real, que existe realmente – e todo o resto, a extensão informe, o que o cerca” (ELIADE,

1992, p. 26).

Em todas as respostas encontra-se a expressão de muitas mudanças interiores, assim

expressas: conceitos, identidade, valores, vida, moral, ético, intelectual, mentalidade,

maturidade humana e espiritual, como por exemplo: as mudanças refletem-se especialmente

em meu interior, é encontro, é integração, é realização mesmo que vivendo com as

dificuldades da vida; antes eu só pensava em mim e hoje quando tenho que fazer algo penso

em primeiro lugar na comunidade; mudei bastante em relação a maturidade humana e

espiritual, sou um novo homem sempre em processo de conversão.

As mudanças interiores refletem-se também em relação aos relacionamentos como a

família, amigos, casamento, como por exemplo: equilíbrio emocional, novos

relacionamentos saudáveis, era um jovem desordenado com um relacionamento da mesma

forma, hoje, tenho meu emprego, casado, amando e servindo a Igreja; mesmo já sendo de

caminhada, a minha vida mudou em relação a maturidade matrimonial.

Destaca-se a referência a mudanças intelectuais, como por exemplo: a diferença é

completa: no sentido moral, ético, profissional, afetivo, intelectual; total e radical, noto um

crescimento humano, espiritual e intelectual que não tinha antes de entrar na comunidade.

Essa referência mostra uma preocupação com os estudos dentro da comunidade.

Relacionando com a questão sobre o trabalho e o estudo na vida dos membros das

Comunidades, já havíamos percebido que há uma grande percentagem dos que estudam e

trabalham, além disso, pela observação participante nos cursos, constatou-se a ênfase dada à

leitura de livros espirituais, doutrinais, de formação humana, estudos bíblicos.

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Ainda se encontra expressões que demonstram mudanças ocorridas como se

realmente encontrassem um caminho bem melhor do que estavam antes: hoje sinto-me livre,

satisfeita, completa; vivia no escuro, hoje na luz; o que revela mudança completa após a

experiência religiosa (ELIADE, 1992).

Por fim, é encontrada maior consciência em relação ao outro: antes eu só pensava em

mim e hoje quando tenho que fazer algo penso em primeiro lugar na comunidade; antes eu

vivia da forma que queria, horário, vida financeira, hoje é a missão que indica os meus

passos. Com relação aos valores da vida comunitária, essas respostas enfatizam a dimensão

coletiva em detrimento de ações egoístas, corroborando a teoria de Tonnies, no que se refere

ao consenso como vontade própria de uma comunidade, “que representa a força e a

solidariedade social particular que associa os homens enquanto membros de um todo.”

(TONNIES, 1995, p. 243).

3.3.3.3 Relações da Comunidade com a Igreja e com a RCC

Em poucas perguntas, apenas 04, procurou-se saber sobre a relação da Comunidade

Nova de Vida e Aliança com a Igreja oficial, para identificar o grau dessa relação, se há

interferência direta da hierarquia da Igreja na Comunidade, se há ajuda financeira para o

sustento da Comunidade, se há ajuda espiritual, se há relação com a RCC e a influência da

figura de João Paulo II sobre a Comunidade.

Perguntou-se, em questão fechada, sobre o apoio local da Igreja Católica àquela

Comunidade. Sendo as possíveis respostas: Sim. Não. Qual? Espiritual/Padre e/ou

Financeiro.

A maioria de 83% afirma que recebe apoio da igreja católica local no que se refere à

espiritualidade, nenhuma diz receber apoio financeiro. No que se refere ao apoio financeiro,

ao não recebê-lo da Igreja local, não se sabe se porque as Comunidades não o buscam ou não

o querem, para se manterem independentes sem grandes vínculos organizacionais com a

estrutura hierárquica da Igreja. Quanto ao apoio espiritual, é tarefa dos sacerdotes, negá-lo

seria chocar-se com o seu papel.

Depois, questionou-se sobre a influência da espiritualidade da RCC na

espiritualidade da Comunidade. Essa resposta foi unânime, 100% respondeu que SIM, há

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influência da espiritualidade da RCC na espiritualidade da Comunidade58. Apesar de haver

uma influência espiritual, as CNVA constituem um movimento novo que não fazem mais

parte da estrutura do Movimento da RCC, podendo ser entendido como dissidência, o que não

deixa de gerar questões e tensões entre os líderes de ambas.

Ainda foi questionado sobre o papel de João Paulo II na vida da Comunidade,

perguntado: Qual a importância de João Paulo II na motivação de sua decisão por

fundar/fazer parte de uma Comunidade? Com as opções de respostas: muito importante,

pouco importante, essencial ou indiferente. Nessa questão, a resposta também foi unânime

indicando a grande importância ou essencialidade de João Paulo II na motivação da decisão

por fundar ou fazer parte de uma Comunidade.

Indagou-se, então, sobre a mudança na efervescência do movimento comunitário após

a morte de João Paulo II. A maioria afirmou que não houve mudança e, quando se afirma

que houve é no sentido de aumentar o fervor pela busca do exemplo; por ter certeza que ele

intercede por nós no céu; aumentou o desejo de doar cada vez mais a vida e ele é uma das

inspirações, quando em Toronto, no Canadá, ele disse: Vós sois o sal da terra e a luz do

mundo.

Conclui-se, pelas respostas às questões acima expostas, e pela observação

participante esboçada no início desse Capítulo, que a relação das Comunidades Novas com a

Igreja é antes de tudo de respeito, havendo um esforço de obediência à hierarquia e de

abertura de espaços para exposição de ensinamentos. Além disso, é explícita a necessidade

espiritual, pois a Igreja, na pessoa dos padres, administra os Sacramentos - ritos litúrgicos

considerados de grande importância para os membros das Comunidades.

3.3.3.4 Relações da Comunidade com a Sociedade

As questões que seguem enfatizam as relações existentes entre os membros das

Comunidades Novas de Vida e Aliança com as estruturas presentes na Sociedade, em vários

aspectos como, por exemplo, a convivência com pessoas que não fazem parte da

Comunidade; a visão em relação à sociedade atual e seus valores; enfim, quais as inserções

dos membros das CNVA na sociedade, em termos de divulgação da comunidade, procura de

conhecimentos extra-comunitários, participação em movimento social/popular/cultural.

58 Sobre o papel da RCC nas Comunidades Novas ver Cap. II – subseção 2.4.1 – Movimento da Renovação Carismática Católica.

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Investigou-se, a princípio, sobre possibilidade de viver fora da Comunidade. Para

essa questão foram dadas quatro alternativas para ser escolhida uma. À pergunta: Como seria

viver fora da Comunidade? deram-se as seguintes alternativas: seria fácil; seria impossível;

seria difícil; seria a mesma coisa de agora. As respostas estão expressas no gráfico 16.

Gráfico 16 – Como seria viver fora da CNVA

As respostas variaram apenas entre as duas alternativas intermediárias que têm o

mesmo sentido: seria impossível (34%) e seria difícil (66%). Ninguém marcou seria fácil ou

seria a mesma coisa de agora. Desse resultado pode-se concluir que quem está envolvido

com a comunidade não deseja sair dela e tem a impressão de que fora dela seria mais difícil

continuar com os mesmos costumes e valores. Além disso, supõe-se que seria, no mínimo

difícil, pelo menos logo no início, até pelas amizades construídas e os hábitos de vida. O que

corrobora com as características de comunidade assinaladas por Tonnies (1995), de

aproximação afetiva, relações privadas, vontades comuns.

Logo a seguir, em questão semelhante à anterior, fechada com múltiplas escolhas,

perguntou-se: Como seria viver sem a religião? Com as mesmas opções de respostas: seria

fácil; seria impossível; seria difícil; seria a mesma coisa de agora. O objetivo foi enfatizar a

diferença entre viver em comunidade e ter uma religião que se freqüenta e vivencia,

investigando se a relação entre elas é muito forte (saindo da comunidade também sai da

religião) ou se uma sobressai-se à outra (supondo-se que a religião seria mais forte que a

comunidade). O gráfico 17 expressa os resultados.

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Gráfico 17 – Como seria viver sem religião

A resposta reforça a questão anterior pois, mais uma vez, ninguém respondeu que

viver sem religião seria fácil ou não faria diferença. Entretanto, houve uma inversão entre as

duas alternativas intermediária: 72% assinalaram que seria impossível e 28%, que seria

difícil .

Essa resposta corrobora a concepção de Eliade (1995) de que o homem religioso não

consegue viver sem o sagrado.Victor Turner também fala da relação da estrutura (sociedade)

com a anti-estrutura (communitas), dizendo que uma não vive sem a outra, no sentido do

equilíbrio social, pois o exagero em uma delas pode provocar uma patologia.

Foi perguntado a seguir sobre qual a visão que o membro da Comunidade Nova tem

da sociedade atual, objetivando perceber se do interior da Comunidade os membros possuem

uma visão da sociedade diferente das daqueles que nunca estiveram na comunidade, como

aponta Victor Turner (1974) quando aborda sobre um processo de transição que passam

aqueles que estão na communitas, no qual se trabalha a humildade e a igualdade, para depois

se reintegrarem na sociedade. A questão foi respondida por todos, conforme quadro 16:

Eu vejo materialista egoísta precisando conhecer o amor de Deus.

Perdida em si mesma, como um bando de desvalidos, abandonado no campo de guerra, sem

saber o que fazer, nem como agir diante deles mesmos - ovelhas sem pastores.

Sem Deus e muito materialista.

Há sinais de esperança, conquistas, mas também muitas sombras. Desafios estão diante de

nós, pois o Evangelho é luz, sal e fermento.

Precisando enxergar uma visão humana.

Uma sociedade individualista, hedonista, descartável, onde há frieza e indiferença,

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necessitada de acolhimento e de uma evangelização personalizada.

Paganizada, sem valores morais.

Vejo uma sociedade individualista, egocêntrica e materialista. Que não se preocupa com os

outros.

Como uma pessoa doente, que muitos já desenganaram, porém que para os que têm fé ainda

apresenta esperança, por isso existimos.

Uma sociedade insegura.

Desordenada, onde prevalece a cultura de morte, o relativismo, uma crise ética e moral sem

precedentes.

Doente nos vários aspectos - e até mesmo diante da globalização, porque não dizer até mesmo

hedonista.

Necessitada de ter uma experiência pessoal com Jesus. Muitas pessoas precisam experimentar

o amor de Deus.

As pessoas estão cada vez mais isoladas e pensando em si, apegadas as coisas, não aos

relacionamentos e perdendo a fé. Descaracterizam a humanidade e tudo que provém dela.

Vejo como uma sociedade vazia que se deixa levar por tudo o que se dita pelos meios de

comunicação. Sem amor ou valores, falsamente feliz.

Uma sociedade desordenada que não valoriza a pessoa humana e super-valoriza o material,

é uma sociedade excludente.

Necessitada de encontrar um rumo.

Uma sociedade que tem buscado caminhar sozinha, tem esquecido Deus, por isso tantos

problemas, tantos erros, tanto sofrimento, é necessário voltar ao mestre da vida, para

vivermos bem.

Que precisa se encontrar com Deus, colocar Deus em 1° lugar em suas vidas. Deixar Deus

governar sua vida, ter uma experiência com Deus me chama pra isso.

Sem rumo pois buscam as coisas terrenas e esquecem de buscar as coisas do alto.

Necessitada de Deus.

Egoísta consequentemente não conhecem a Deus com profundidade.

Totalmente relativista e hedonista.

Pedindo "SOCORRO".

Consumista, hedonista, exclusivista que cultua o prazer, o bem estar a qualquer custo, ela é o

grande animal moderno.

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Uma sociedade que vive muito o poder, o ter para muitos Deus fica em 2° lugar.

Ela não estar da forma como estar por querer (hedonista, relativista, marxista, cultura de

morte, etc), mas por não conhecer Jesus.

Dessacralizada, descrente, secularizada, globalizada, com distorções sérias dos valores

morais, humanos, políticos e culturais. Sem deixar de ressaltar a cultura de morte hoje

estabelecida.

Individualista, consumista e em busca do novo, ou seja, cada vez mais moderna.

Consumista, egoísta, materialista, mas ao mesmo tempo infeliz sem saber na verdade o que

busca.

Decadente e carente de Deus.

Cada vez mais distante de Deus, egoísta, relativista, perda de valores.

Uma sociedade consumista, hedonista, sem valores essenciais de vida, respeito e

solidariedade.

Quadro 16- Visão da sociedade atual pelos membros das CNVA

Da leitura das respostas vê-se que, em todas elas, os membros das Comunidades

Novas têm uma postura crítica e uma visão pessimista da sociedade atual. Consegue-se

distinguir 3 tipos de respostas: (a) uma que aponta características que se associam à

modernidade, com as expressões: materialista, egoísta, individualista, hedonista,

consumista, relativista; outra (b) que aponta desequilíbrios, com o uso de palavras como

doente, desordenada, insegura, decadente e outra (c) que aponta para a necessidade de

valores humanos e religiosos como sem valores morais, falsamente feliz, descrente,

necessitada de Deus.

Apenas uma resposta foi um pouco otimista, dizendo “Há sinais de esperança,

conquistas, mas também muitas sombras”. Pode-se constatar que os líderes das Comunidades

Novas realmente não comungam com a sociedade atual. Alguns com uma postura de piedade

e misericórdia, dizendo que a sociedade precisa encontrar a Deus ou conhecer Jesus Cristo,

outros se contentam apenas em descrevê-la. Essas respostas corroboram a análise de Turner

sobre o rito de passagem pelo qual passam os que estão na comunidade.

Destaca-se ainda pelas respostas a necessidade da fundação de comunidades para

estabelecer um novo modo de vida para o homem, com valores distintos dos que prevalecem

na sociedade hoje. Pois a experiência fundante, na lição de Alberoni (1991), quer ser uma

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descontinuidade social, dessa experiência aparecem os sujeitos do estado nascente59, quando

as estruturas não mais satisfazem, e o cotidiano não dá mais resposta.

As comunidades são fundadas no ímpeto de viver novos valores, contrários aos da

sociedade atual, como reação ou resposta desses segmentos sociais (grupos que acreditam nos

valores cristãos) e este estado de coisas.

Indaga-se, no questionário, sobre os valores das pessoas que participam da

comunidade em relação aos valores das pessoas que não participam. A intenção foi

aprofundar o assunto, porque talvez fosse fácil responder sobre o panorama da sociedade atual

considerando-se fora dele. Mas a Comunidade Nova, na qual a pessoa está inserida, é ou não

diferente do restante da sociedade, na visão de quem estava respondendo ao questionário? A

pergunta foi a seguinte: Você percebe que as pessoas que participam da comunidade possuem

valores diferentes das que não participam? Respostas: Sim, Não. Por quê? Todos

responderam que sim, possuem valores diferentes. As justificativas são variadas, mas no

mesmo sentido das respostas anteriores, conforme o quadro 17:

Porque as que vivem na comunidade nos ajudam a construir nossa santidade então este

convívio nos leva a perceber esse valor.

Os valores cristãos, doutrinários, etc.

Porque essas pessoas tem um ideal: Deus.

Porque a evangelização humaniza-nos.

Porque temos uma visão da humanidade diferente, correspondemos com a vida.

Pela formação vai se formando uma mentalidade e valores diferentes.

Desejo de santidade.

Pelo novo de Deus, que se assume ou pelo menos se luta para assumir em luar dos valores

seculares.

Porque quando se tem um encontro verdadeiro com Cristo, tudo se transforma, é outro

"modus vivendus".

(as pessoas fora da comunidade) Se tornam mais tristes. Apegadas ao TER, ao PODER. Não

conseguem descobrir a FELICIDADE nas pequenas coisas.

A experiência de Deus, da fraternidade (vida comunitária), da formação e missionariedade as

tornam diferentes.

Por conta das mudanças causadas pela experiência pessoal com Jesus.

59 Ver Cap. I – subseção 1.4.1 – Os sujeitos do estado nascente.

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Percebo que o esforço muito grande de todos os irmãos de comunidade de aprender amar e se

deixar ser amado.

Porque a vida é direcionada a um alvo certo de acordo com a resposta que cada carisma é

chamado a dar no mundo.

O desapego, a renúncia, o desejo de ser o que Deus quer. Não que sejamos melhores, mas a

partir damos o sim a uma comunidade crescemos muito.

A medida que Deus vai fazendo a obra vão se valorizando e conhecendo seus valores.

Porque vivem uma experiência com Deus e esse contato vai modelando e nos devolvendo a

imagem e semelhança de Deus.

Porque são pessoas limitadas, mas vê o outro pelo que eles são não segundo os valores deste

mundo.

São formadas a viverem os conceitos evangélicos.

Porque cada dia mais Deus é prioridade em suas vidas.

O respeito e o temor à Deus, à Igreja, o valor do matrimônio e da família, o amparo ao

irmão, etc.

Devido a o ambiente espiritual e a experiência pessoal que tiveram com o amor de Deus.

As pessoas de comunidade vivem no mundo diferente. Buscam viver a santidade, testemunho.

(É diferente porque vive no mundo, mas não se deixam ser levadas pelas coisas do mundo.

Por conhecer Jesus, que é o Caminho, Verdade e Vida. Ele ordena nossa vida, com a Graça

do Espírito Santo.

Porque elas voltam a valores atualmente perdidos da pessoa humana.

Humanidade, felicidade, esperança, amor pelo outro e muita certeza do céu.

Porque testemunham, ou pelo menos, buscam testemunhar o carisma no meio em que vivem e

trabalham.

Porque as que participam tomam atitudes cristãs.

Porque são formadas e orientadas para viverem de acordo com os valores de Cristo.

Quadro 17 - Valores presentes na CNVA

Das respostas depreende-se que os líderes e fundadores das Comunidades Novas

consideram-se com valores diferentes da cultura atual, seja porque tiveram uma experiência

com Deus, ou porque são formadas com valores cristãos e com a doutrina católica, ou

porque lutam para viver esses valores, ou porque vivem em um ambiente diferente dentro da

comunidade.

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As comunidades religiosas cristãs, mais do que outros tipos de comunidade,

buscam a mudança de vida e a santidade, tanto como experiência mística propriamente dita,

como segundo um modelo moral. O apoio na experiência mística, como encontro com o

sagrado no interior da pessoa é base primordial para as comunidades cristãs de várias épocas,

em especial para as CNVA, que resgatam a mística de santos como Tereza D’ávila, São João

da Cruz, São Bento, como modelos para serem seguidos na chamada “vida de oração”. As

Comunidades Novas fazem retiros comunitários e pessoais de oração, pois a sua pedagogia é

no sentido de que as mudanças pessoais ocorrem em consequência da vida de oração pessoal

e comunitária60.

A formação na doutrina moral da Igreja e nos valores cristãos é outro apoio para a

mudança de vida e para a santidade, basta ver os inúmeros artigos formativos nos diversos

sites das Comunidades Novas, além de ter sido verificada na observação participativa

realizada na pesquisa de campo desta dissertação.

Perguntou-se, em resposta semi-aberta, se Você percebe que sua Comunidade é uma

resposta à atual sociedade?” Não. Sim. Em quais aspectos. A intenção foi verificar a

formação da comunidade como contra-proposta frente aos valores da sociedade atual. As

respostas foram unânimes, 100% respondeu que a sua Comunidade é uma resposta à atual

sociedade. Sobre em que aspectos a Comunidade é uma resposta, trazemos algumas respostas

abaixo:

- espiritual,

- religioso,

- educação da família e evangelização nos métodos,

- em todos os aspectos,

- restauração de casamentos e famílias em crise,

- os valores evangélicos que inspiram as ações da comunidade é uma grande

contribuição para a humanização do ser humano,

- como resposta ao culto do prazer, o remido manifesta o maior prazer que é Deus

com toda sua forma de ser e de viver,

- resgate da dignidade dos filhos de Deus,

- sendo um testemunho dentro da realidade do mundo

Sobre a abertura das NCVA para a sociedade, perguntou-se: A comunidade utiliza

algum meio de divulgação de sua existência/atuação?” O resultado demonstra que a maioria 60 As informações aqui expostas foram colhidas na observação participante e na convivência com membros de CNVA.

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de 78% realiza algum tipo de divulgação de sua existência e atuação. Perguntamos também

quais os meios utilizados para a divulgação, sendo uma questão aberta. Os resultados estão

expressos no quadro 18.

www.saleluz.com rádio, jornal, internet, blog rádio, site internet site internet floder, rádio, missões e trabalhos pastorais rádio, internet e propagandas publicitárias avisos em missas e boca a boca através do testemunho diante da Igreja e da sociedade site, folders, cartazes, divulgação em escolas quando divulga os eventos realizados pela comunidade rádio, internet e propagandas publicitárias informativo kairós informativo, casa de show católica em construção rádio, divulgação dos eventos rádio, folder bus door, eventos divulgados, cartazes, faixas através dos testemunhos de vida e da Igreja site - www.comxto.com boca a boca e avisos nas missas da comunidade www.saleluz.com www.saleluz.com através do próprio testemunho de seus membros panfletos, cartazes, site informativo bimestral, eventos, serviço de pregações e

animação. Quadro 18 - Meios de divulgação utilizados pelas CNVA

O resultado revela que o meio de divulgação mais utilizado é a internet, por meio de

sites, blogs, e-mail, 07 Comunidades Novas: Christós, Siloé, Sal e Luz, Remidos no Senhor,

Filhos da Misericórdia, Filhas de Maria e Maria Mater indicaram possuírem divulgação pela

internet. Outro meio muito utilizado é o rádio, indicado por 07 Comunidades. Apenas 02

indicaram possuírem informativo como meio de divulgação e outras 02 propaganda

publicitária. Uma indicou o “bus door”, outra o jornal, outra a construção de uma casa de

show e outra divulgação nas escolas.

É perceptível a variedade nos meios de divulgação, a presença da internet pode indicar

maior organização da comunidade ou uma característica própria para trabalhar com esse

meio. As Comunidades que não indicaram um meio de comunicação talvez ainda estejam na

fase inicial da fundação ou não possuem a características de trabalhar com divulgação.

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Foi perguntado ainda se os membros da comunidade procuram outros

conhecimentos, além da doutrina e da fé cristã católica, objetivando perceber a abertura

para a sociedade e a preocupação em manter diálogo com as ciências seculares. Essa é uma

questão fechada, de múltiplas escolhas: Sim, Não, Quais.

A maioria de 80% informou que procura outros conhecimentos. Os conhecimentos

indicados para múltipla escolha se referem à formação acadêmica universitária. As respostas

foram conforme o quadro 19:

Psicologia 66%

Sociologia 13,2%

Contabilidade 30%

Antropologia 26,4%

Teologia 59%

Outro 0,66%

Quadro 19 – Abertura dos membros das CNVA para outros conhecimentos

O resultado demonstra que a maioria procura a psicologia e a teologia, havendo

também quem se interesse por contabilidade, antropologia, sociologia e outros. O grande

interesse pela psicologia demonstra o aspecto afetivo-relacional dessas comunidades, estando

em consonância com a tendência atual da religiosidade no Brasil e no mundo.

Sobre a presença de voluntários trabalhando na Comunidade, com o intuito de

saber se há pessoas que conhecem a comunidade, não são comprometidos como membros ou

consagrados, mas se dispõem a servir, sem pagamento pelos serviços prestados.

A maioria das Comunidades, 60%, afirma a presença de voluntários, trabalhando em

serviços os mais variados, realizados pela Comunidade, seja de cunho de Evangelização,

como organização de eventos, rádio; seja de Projetos Sociais, como artesanato, creche da

comunidade, aula de artes; seja de organização da própria Comunidade, fábrica de produtos

de limpeza, serviços gráficos, serviços jurídicos e administrativos, recepção e secretaria. A

presença de voluntários revela a abertura dessas Comunidades para a participação de pessoas

em suas atividades que não são membros efetivos delas.

Ainda sobre o aspecto de abertura da Comunidade para o social, foi indagado se os

membros da Comunidade de Vida podem ou não trabalhar fora ou na Comunidade com

remuneração. Alguns não responderam a essa questão, entre os que responderam, as respostas

empataram, metade respondeu que “não” e a outra metade respondeu que “sim”, os membros

que residem podem trabalhar fora ou na Comunidade com remuneração.

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Esse índice de resposta de membros que podem trabalhar fora da Comunidade com

remuneração (metade dos questionários respondidos) demonstra que essas Comunidades não

são fechadas, ou seja, não há tendência ao sectarismo. Além disso, ao permitirem que seus

membros trabalhem, estão abdicando da presença mais freqüente dentro da Comunidade,

além de inseri-los na vida social comum, sem uma necessária vivência religiosa.

Sob o mesmo aspecto, foi perguntado ainda sobre a participação da Comunidade em

algum movimento social/popular/cultural. A maioria dos responderem, 57%, disse que não

participam de nenhum movimento social, popular ou cultural. Os que participam, citaram os

seguintes Movimentos: Conselho Municipal, Associação, Educação, Santas Missões,

Pastorais Sociais, visita aos doentes e assistencialismo.

Desse resultado, mesmo não sendo maioria, muitos respondentes (43%) diz participar

de movimentos, o que corrobora as demais respostas nesse aspecto, no sentido do

envolvimento dos membros dessas Comunidades com iniciativas populares não ligadas

diretamente à religião e até ligada à religião católica, mas fora do âmbito de sua Comunidade.

3.3.4 Apreciação geral dos resultados do questionário

Alguns pontos mais fortes presentes nas respostas às questões são os seguintes:

(a) A análise da relação entre o tempo de existência e a fase do processo comunitário e

se há alguma relação entre essas fases e a preocupação com a formação dos membros. Quanto

a isso, não podemos afirmar que as que têm mais tempo de existência estariam preocupadas

com a formação, com o número de membros diminuindo ou aumentando, porque a parte

quantitativa pode estar relacionada a outros fatores, como projeção na mídia, ênfase nas

orações emotivas, que atrairiam fiéis à comunidade.

(b) A que ponto as CNVA pesquisadas estão da institucionalização? Ressaltando que o

sentido de institucionalização aqui empregado diz respeito ao reconhecimento oficial da

CNVA pela Igreja Católica do Vaticano como uma nova forma de vida comunitária. Pelos

dados e pela leitura teórica realizados neste trabalho, as CNVA se encontram distantes da

institucionalização, levando em consideração que a mais antiga possui em média 20 anos de

existência e a mais nova 1 ano, ambos períodos curtos para uma institucionalização,

especialmente no âmbito da Igreja Católica, que possui uma estrutura imensa, tendo mais

dificuldades para incorporar novos movimentos.

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(c) Quanto à análise das relações interpessoais, ou de solidariedade, vê-se que existe

acentuada preocupação com uma boa convivência comunitária, além da preocupação com a

situação social atual.

(d) Quanto à experiência religiosa, verifica-se o acento no emocional e no subjetivo,

corroborando com a idéia atual de interesse pela religiosidade de forma emotiva e subjetiva.

Havendo ainda diversos relatos de hierofanias, que revelam a grande importância dada às

práticas religiosas pelos membros das CNVA.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta dissertação procurou-se mostrar as diversas faces das CNVA,

buscando apoio teórico e metodológico para compreender quais os mecanismos que envolvem

a fundação e os desdobramentos da vida comunitária nestas organizações religiosas católicas

da atualidade.

A pesquisa de campo foi realizada em encontros de formação que reúne líderes de

várias CNVA do Nordeste, espaço escolhido por privilegiar uma visão geral do estado atual

do conjunto dessas Comunidades. Foram colhidos dados por meio dos questionários, que

sugerem várias possibilidades de desdobramentos futuros, como por exemplo: (a) na relação

pessoal com o divino; (b) na importância dada à sociabilidade, (c) na necessidade de

consagrar-se a Deus; (d) na presença considerável de jovens, especialmente no início do

processo de fundação; (e) nos rituais litúrgicos; (f) na estrutura que privilegia a formação da

pessoa e a formação para o comunitário; (g) assimilação de aspectos da vida comunitária dos

primeiros cristãos (partilha, espontaneidade, liminaridade) e de aspectos da vida religiosa

institucionalizada (rituais litúrgicos, planejamento de formação, métodos de arrecadação de

dinheiro); (h) além de um processo incipiente de institucionalização, visto que a maioria – 11

- foi fundada na última década, algumas – 06 - na década de 1990 e apenas 02 na década de

1980 e de outras considerações feitas ao longo da dissertação.

Foram feitas várias análises específicas dos questionários, privilegiando uma visão a

partir da vivência dos membros (líderes e fundadores) das comunidades em suas relações

internas. Entretanto, os dados empíricos coletados permitem considerar a possibilidade de

aprofundar a pesquisa para explorar a relação entre a comunidade e a sociedade

contemporânea em suas características pós-modernas e perceber se essa forma de vida

comunitária responde aos anseios do homem contemporâneo, com relação aos valores e à

religião. Outra dimensão que sugere maior investigação diz respeito à organização econômica

da comunidade voltada para o modelo da partilha e da economia solidária. Além disso, um

estudo do dia-a-dia da Comunidade permitiria uma análise mais aprofundada das relações

internas entre os membros, para contrapor a teoria e o ideal comunitário com o ordinário real.

A teoria utilizada trouxe elementos imprescindíveis para a análise dos questionários

aplicados, como as características da comunidade em distinção com as da sociedade

(TURNER, 1974; TONNIES 1995). O percurso feito por entre movimentos e comunidades

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religiosas ao longo da história, permitiu comparações significativas com o que se vive hoje no

movimento das CNVA.

Constatou-se que a espiritualidade que une essas Comunidades Novas de Vida e

Aliança é semelhante à proposta pela Renovação Carismática Católica, com a ênfase dada ao

Espírito Santo e seus dons (línguas, profecias, ciência, sabedoria), ao louvor, à adoração ao

Santíssimo Sacramento, à espontaneidade na oração, à afetividade. Uma espiritualidade

essencialmente voltada para o emocional, como constata Hervieu-Léger (1993 apud Maia,

2008), que intensifica a vivência pessoal e comunitária em detrimento da institucional

A observação participativa e os questionários demonstram, a princípio, que as

características da liminaridade e communitas (TURNER, 1974) estão presentes no início do

processo de fundação das Comunidades Novas de Vida e Aliança – aquelas fundadas a menos

de 05 anos, e pode continuar por algum tempo presentes, pois elas estão sendo formadas às

margens da estrutura hierárquica da Igreja Católica, situação que pode durar muito tempo,

visto que o processo de reconhecimento de novos movimentos no catolicismo é em geral

muito lento.

As CNVA, assim como as comunidades das origens do franciscanismo, apresentam

características da communitas espontânea (TURNER, 1974) no decorrer do processo de

fundação, ao mesmo tempo em que vivem a pressão por uma estruturação, sob pena de não

subsistirem. Outro aspecto a comparar entre as duas experiências de communitas é a relação

com o dinheiro. Nos depoimentos e escritos dos membros das CNVA, é detectada a espera

pela providência de Deus, que não se refere a esmolar, como os primeiros franciscanos

faziam, mas a trabalhar com meios ligados aos seus objetivos e procurar benfeitores,

encontrando nessas iniciativas a providência. Há também relatos sobre a intervenção

miraculosa de Deus, como uma doação gigante para algo que a CNVA estava precisando

muito e não havia como conseguir. Mas são relatos esporádicos. É na rotina diária das

pequenas providências, aliada ao esforço pessoal e comunitário, que conseguem meios de

subsistência.

Por outro lado, comparando as motivações para fundar/consagrar-se em uma CNVA

com as características do estado nascente e da experiência fundamental abordados por

Francesco Alberoni (1991), verifica-se que os fundadores e/ou fundadoras (líderes) vivenciam

a experiência individual de conversão profunda que os leva a ver a vida de outra forma e a

não mais querer viver como antes, ou seja, constata-se uma renovação do pensar a própria

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vida conforme a revelação religiosa. A partir da qual, buscam construir um grupo que os

ajude a viver o que almejam.

Quanto ao crescimento numérico de cada CNVA, parece não haver estratégias para

aumento do número de membros, podendo permanecer comunidades com baixo número de

membros, ao lado de outras que possuem grande número, não sendo exigido um número

mínimo de fiéis para continuarem existindo. A característica do modelo da CNVA é de ter

uma capilaridade ao se multiplicar e se espalhar no espaço social, difundindo a sua moral

religiosa e experiência peculiar com o sagrado.

Do resultado, percebe-se que a religião é mais forte que a comunidade, para aqueles

que responderam ao questionário, pois a maioria admite ser difícil viver fora da comunidade,

mas impossível viver sem a religião. Esse resultado também demonstra que a comunidade, de

fato, existe por causa da religião e não ao contrário.

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REFERÊNCIAS

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