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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE
BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL
MARISA ALBUQUERQUE CORDEIRO
CONTINUIDADE E RUPTURA NAS APROPRIAÇÕES DA TRADIÇÃO MARXISTA
NO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DE SUAS
EXPRESSÕES NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL
FORTALEZA
2013
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MARISA ALBUQUERQUE CORDEIRO
CONTINUIDADE E RUPTURA NAS APROPRIAÇÕES DA TRADIÇÃO MARXISTA
NO
SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DE SUAS
EXPRESSÕES
NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço
Social da Faculdade Cearense, Centro de Ensino Superior do
Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de
Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Profa. Dra. Cristiane Porfírio de Oliveira do
Rio.
FORTALEZA
2013
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MARISA ALBUQUERQUE CORDEIRO
CONTINUIDADE E RUPTURA NAS APROPRIAÇÕES DA TRADIÇÃO MARXISTA
NO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DE SUAS
EXPRESSÕES NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Monografia apresentada ao curso de graduação
em Serviço Social da Faculdade Cearense, Centro
de Ensino Superior do Ceará, como requisito
parcial para a obtenção do grau de Bacharel em
Serviço Social.
Aprovada em ____ de ____________ de ______
______________________________________________
Profa. Dra. Cristiane Porfírio de Oliveira do Rio – UECE
______________________________________________
Profa. Ms. Renata Gomes da Costa – FaC
______________________________________________
Prof. Dr. Estenio Ericson Botelho de Azevedo – UECE
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Ao exército mundial do trabalho que luta por um mundo novo e
nosso!
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente, por justíssimo grau de contribuição, a
minha querida e tão
amada família: A minha valiosa mãe Socorro Albuquerque, mulher
forte e de luta, amiga
essencial na travessia desse exaustivo e, também, prazeroso
processo, que pacientemente me
“segurou nos braços” toda vez que eu pensei não conseguir e, de
mãos dadas, caminhou
comigo durante toda a minha vida me ensinando a maior lição de
amor – a lutar! –, a ti sou e
serei eternamente grata, não apenas pelo amor desmedido, mas
pela sabedoria e o
ensinamento doce de enfrentar os amargos obstáculos da vida. Ao
meu irmão Marcílio
Albuquerque de Castro pela referência de responsabilidade e
pelos inesquecíveis
ensinamentos sobre confiança e seriedade, homem pelo qual sou fã
e quero um bem danado!
A minha irmã Marília Albuquerque pelo apoio e o companheirismo,
mesmo pelos cotidianos
conflitos de “irmã”, os afáveis momentos em que vivemos juntas
são os que permanecem em
minha memória; vocês dois são o meu bem-querer. A minha doce
cunhada Edineide Santos,
que mais tenho como irmã, e mulher pela qual não escondo as mais
profundas admirações,
agradeço pelas sinceras horas consumidas em conselhos e
conversas durante essa fase
monográfica, carinhos e risadas, obrigada por ser sempre esta
mulher inspiradora! Aos meus
docinhos mais lindos e cheirosos desse mundo Annelise e Isabelle
que, com sua sabedoria
questionadora de crianças, sempre me inspiraram a mostrar-me
como exemplo de amizade e
amor. E, por fim, mas não menos importante, ao meu pai Jairo
Alves Cordeiro que mesmo
ausente sempre esteve presente neste coração preocupado,
agradeço por me proporcionar as
mais belas autoanálises e reflexões e perdoe-me por não dizer-te
pessoalmente o quanto és por
mim amado. Obrigada por terem sonhado comigo e possibilitado a
materialização de mais um
sonho!
As minhas amadas e melhores amigas: A Isabela Nepomuceno pela
inquebrantável
fidelidade e paciência com as minhas ausências, estresses e
desesperos com essa monografia,
obrigada pelo total apoio, por estar comigo nos momentos mais
importantes de minha vida e
pela sincera amizade, minha grande amiga, é uma honra tê-la como
confidente! A Izabel Mota
por toda ternura e compreensão sobre a minha ausência em nossos
momentos mais
particulares de alegria, pela oportunidade de aprender a cuidar
e defender a quem se ama, pelo
amor sempre tão carinhoso de uma amizade verdadeira. Sou grata
pelo presente que é tê-las,
amigas!
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As minhas companheiras de turma: Angélica Braga, Carla Lúcia,
Daiane Faustino
(Maria do Bairro), Evilene Pessoa (Vivi), Jamylly Maciel (nega),
Paula Fahd (a tia que ganhei
de presente!), Mayara Rodrigues e Raquel Machado pelas
experiências partilhadas, pelo
compartilhamento dos mais lúcidos conflitos que provêm do
questionamento e da crítica e
pelas mais deletérias incidências nas múltiplas células sociais
que engendram o meu ser em
construção. Vocês são inesquecíveis, as amo! A Jamile Castro,
Glauciane Silva, Andréa
Ribeiro, Soraia Andrade, ao Fábio Silva, Cláudio Henrique e
os/as demais companheiros, não
apenas de turma, mas que pude conhecer ao longo da formação, que
compartilharam do difícil
exercício profissional já nos caminhos da graduação, agradeço
pelo carinho e a
espontaneidade, pela troca constante de experiências e amparo,
vocês marcaram a minha
formação intelectual.
Aos amigos, parceiros, camaradas e companheiros de LUTA que fiz
no Movimento
Estudantil de Serviço Social (MESS): Isa, Emilie, Marcelo,
Alfredo, Myrna, Fabíola, Aritana,
Carol, Júlio, Heber, Léo por terem sido a minha ESCOLA de
militância, pelas lutas travadas,
ombro a ombro, pelas angústias sentidas, mas também pelas
catarses extravasadas, as bebidas
e as culturais vivenciadas; por construírem coletivamente, mesmo
em meio aos tempos de
barbárie e ofensiva do capital, o sonho de uma sociedade livre,
emancipada e cheia de
camaradagem! A tantos lutadores que não pude citar e, em
síntese, a ENESSO (Executiva
Nacional de Estudantes de Serviço Social) que, uma vez
mergulhados na militância junto com
a classe trabalhadora, jamais perderam a ousadia e a coragem de
conquistar corações e
mundos revolucionários, pois acreditamos, assim como disse
Gramsci, que viver é tomar
partido! A vocês, um poema de Valdenízia Peixoto:
Quando eu escolhi sozinha, fazer Serviço Social
Me disseram que seria uma pobre assalariada,
E que iria viver rodeadas de gente suja e mal cheirosa.
Me disseram que eu só serviria para defender “mirim”,
Me disseram que médicos, enfermeiras, advogados e psicólogos
sempre mandariam
em mim,
Me disseram que eu deveria procurar outra profissão que “desse”
dinheiro
Enfrentei tudo o que me disseram.
E consegui vencer os três primeiros semestres de “conflito” do
curso.
Quando eu entrei pro Centro Acadêmico
Me disseram que iria atrapalhar meus estudos
Me disseram que ali era espaço de drogas e bebedeira
Me disseram que as pessoas dali gostavam de baderna e
“anarquia”
Enfrentei tudo e já não estava mais sozinha
Foi então que parei...
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Refleti, entendi e aprendi a me apaixonar!
Aprendi a conhecer, aprendi a respeitar,
Aprendi a agir coletivamente,
Aprendi que ética não se compra, se constrói no coletivo.
Aprendi a indignar-se,
Aprendi a chorar, a emocionar,
inclusive com a derrota.
Aprendi também a beber, a fumar...
Afinal é preciso liberar tensões!
Aprendi a falar, gritar e calar.
Aprendi a amar, e amar, e amar, e amar...
Aprendi o significado das cores do arco-íris,
Aprendi a organizar para desorganizar
Aprendi que “a questão social é multifacetária e suas refrações
aparecem
caleidoscopicamente na totalidade, na qual o fio condutor é o
cotidiano”.
Aprendi que liberdade não “é fumar um Free”,
Liberdade é o princípio primeiro rumo ao “humano genérico”!
Aprendi tudo! E aprendi que tenho muito mais a aprender.
As minhas “compas” de CQAS (Comissão das quase-Assistentes
Sociais): Angélica
Barbosa, Ariadna Monteiro, Jacqueline Pereira, as Patys (Façanha
e Melo) e Sara Rebeca
Sales pela inestimável contribuição ao meu processo de formação
profissional e na luta para
que “a justiça social se implementasse antes da caridade por
meio da viabilização dos direitos
humanos e principalmente sociais dos usuários da gratuidade do
transporte público para as
pessoas com deficiência”, estar com vocês foi de “aaaaaampla
experiência”. As minhas
queridas supervisoras de campo Ana Roberta Almeida e Angela
Freitas pelos momentos
instigantes de aprendizado e descortinamento da unidade entre
teoria e prática, pela paciência
com as quedas ao longo do caminho, mas acima de tudo pela
infinita competência de exercer
um Serviço Social radicalmente humano e crítico.
Aos meus amados professores assistentes sociais: Daniel Rogers,
Cynthia Studart,
Eveline Alves, Vivian Matias, Kelma Nunes, Valney Rocha, Letícia
Peixoto, Lauri Sales, Ana
Paula Pereira, e àqueles que deixei de citar muitíssimo obrigada
pelos valiosos momentos de
aprendizado, pelas experiências e dúvidas compartilhadas, pelos
deliciosos instantes de
carinho, riso e também sensatez, cada um de vocês será carregado
não apenas em minhas
melhores reflexões profissionais, mas em meu coração pela
admirável competência e
compromisso ético-político com os valores defendidos pela nossa
profissão! Também quero
agradecer aos queridos professores Mário Henrique, Alexandre
Carneiro, Radamés Rogério,
Márcia Mourão, Eloísa Bezerra (in memorian), Hamilton Teixeira
pela coragem de encarar
este grande desafio que é ensinar a pensar! Agradeço imensamente
a todos!
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Aos camaradas de luta do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade),
especialmente
Afrânio Castelo e Marcelo Ramos, e do PCB (Partido Comunista
Brasileiro), Caroline
Magalhães, Emmanuel Teixeira e Léo Santos; que tão imensamente
contribuíram para o meu
crescimento político e intelectual, pelas conversas camaradas,
pelos presentes literários que
tanto me subsidiaram na construção deste escrito monográfico e o
empenho na luta pela
construção de uma sociedade verdadeiramente comunista e
popular.
Ao “menino” que encheu minha poesia de amor, Felipe Munhoz, com
quem tenho
vivenciado uma história de sinceras trocas; pela compreensão,
paciência e o imenso apoio
dado (inclusive com nossas pesquisas na madrugada) durante este
momento tão importante
para a minha vida profissional, pela presença sempre doce e o
tão dedicado incentivo, pelo
cheiro, a “fé e a dedicação” sou profundamente grata.
A professora Renata Gomes que, em decorrência da banca de
defesa, tanto colaborou
para a qualidade deste trabalho, pela dedicação e as preciosas
observações e apontamentos
para a sua conclusão. Sua doçura e comprometimento foram
indispensáveis nesse intenso
processo de novas descobertas. Sou muito grata!
A minha estimada orientadora Cristiane Porfírio que com sua
dedicação e competência
intelectual tornou-se uma grande referência profissional, fonte
de inspiração e incentivo na
minha formação marxista. Por ter me acompanhado neste projeto
monográfico desde os seus
primeiros germes na experiência de monitoria junto à disciplina
Capitalismo e Questão Social
em 2012 até a sua concretização. Muitíssimo obrigada por
acompanhar o meu
amadurecimento, pelo incentivo a vivenciar novas experiências,
pelas tantas vezes que, com
sua doçura e serenidade, me acalmou com as palavras “certas”,
pelo grande aprendizado que
foi construir contigo este trabalho. Estarão sempre comigo seus
afetuosos conselhos e
rigorosos ensinamentos. Obrigada!!!
Por fim, meu enorme agradecimento a todos/as que contribuíram de
alguma maneira
para a construção deste trabalho!
-
“Eis aqui minhas mãos:
não tenho receio de mostrá-las,
antes com verrugas que
em bolsos guardadas.
Eis minhas verrugas,
orgulho-me em tê-las,
é parte do meu ofício
de construtor[a] de estrelas.
Gastarei as verrugas
na lixa da prática,
queimarei as verrugas
com o ácido da crítica.
e aprenderei com as marcas
que as estrelas se fazem ao fazê-las
por isso
são estrelas.”
(Mauro Luís Iasi, Sobre o ofício de construir estrelas e o risco
das verrugas).
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RESUMO
O presente estudo toma como objeto de investigação analisar as
expressões da interlocução do
Serviço Social brasileiro com o aporte teórico-metodológico
marxiano e a sua tradição –
marxista; buscando compreender como se tem dado estas
apropriações na trajetória da
profissão, através de uma investigação de suas expressões na
formação profissional de uma
dada unidade de ensino, a Faculdade Cearense (FaC). É importante
sinalizar que este estudo
resulta da nossa experiência de monitoria junto à disciplina
Capitalismo e Questão Social do
curso de Serviço Social da FaC, através da qual tivemos a
oportunidade de problematizar as
incidências do pensamento marxiano em nossa profissão, e
justifica-se pela necessidade de
discuti-las em maior profundidade através de suas principais
polêmicas. Nesse sentido,
partimos do pressuposto que a relação entre Serviço Social e
“marxismo” – não despojada de
suas contradições fundamentais – é determinada pelos múltiplos
aspectos sócio-históricos
engendrados no capitalismo dos monopólios e, em especial, no que
tange aos seus
rebatimentos no ensino superior. O presente estudo é de natureza
qualitativa, pautado no
método heurístico do materialismo histórico-dialético e
consistiu em amplo estudo
bibliográfico de pesquisas na área, além da utilização de
entrevista e questionários para a
coleta dos dados. O primeiro capítulo realiza uma análise da
conjuntura sócio-histórica
contemporânea do modo de produção capitalista e os processos de
reestruturação do capital
nas dimensões político-econômicas, sociais e ídeo-teóricas e
seus rebatimentos no Serviço
Social, observando que é nessa tensão entre capital e trabalho
que se constitui a tradição
marxista como uma ruptura com a ciência burguesa. O segundo
capítulo traz o exame da
trajetória histórica das apropriações do pensamento marxiano e
da tradição marxista no
Serviço Social brasileiro, com ênfase na sua relação dialética
de ruptura e continuidades, que
acenam uma trajetória problemática até nos dias mais atuais.
Nesse sentido, fez-se pertinente
contextualizar os impactos de tais apropriações no conjunto
profissional, observando, em
especial, os seus principais tensionamentos, tomando como
subsídio empírico a experiência
do curso de Serviço Social de uma unidade de ensino superior
privada, a Faculdade Cearense,
na qual investimos a investigação contida no terceiro capítulo
deste estudo. Na conclusão, é
apresentado um exame da pesquisa realizada, buscando sinalizar
criticamente tais debates os
quais têm possibilitado um avanço na direção social do projeto
ético-político profissional,
bem como desencadear reflexões diante da atual conjuntura
adversa, tendo em vista as
possibilidades de uma formação profissional comprometida com a
racionalidade crítico-
dialética.
Palavras-chave: Serviço Social. Tradição Marxista. Formação
Profissional.
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ABSTRACT
This study takes as its object of investigation analyze the
expressions of the interlocution of
the Brazilian Social Service with the referential
theoretical-methodological Marxian and its
tradition - Marxist; seeking to understand how has been given
appropriations in the trajectory
of the profession, through an investigation of its expressions
in the training professional of a
given teaching unit, the Faculty of Ceará (FaC). It is important
to signal that this study
resulted from our experience of monitoring of Capitalism
discipline and Social Issues of the
Course of Social Service FaC, through which we had the
opportunity to discuss the
implications of Marxian thought in our profession, and is
justified by the need to discuss them
in greater depth through its main controversies. Accordingly, we
assume that the relationship
between social service and "Marxism" - not stripped of its
fundamental contradictions - is
determined by multiple aspects socio-historical engendered in
capitalism of the monopolies,
with particular in respect to its repercussions in teaching
higher. This study is qualitative in
nature, based on the heuristic method of historical
materialism-dialectical and consisted of
extensive bibliographic research in the area, besides the use of
interviews and questionnaires
to collect data. The first chapter makes an analysis of the
socio-historical contemporary
situation of capitalist mode of production and processes of the
restructuring of capital in the
political and economic dimensions, social and ideo-theoretical
and its repercussions in social
service, noting that it's in this tension between capital and
work that itself constitutes the
Marxist tradition as a break with the bourgeois science. The
second chapter provides an
examination of the historical trajectory of the appropriations
of Marxian thought and the
Marxist tradition in Brazilian Social Work with an emphasis on
its dialectical relationship of
ruptures and continuities, that beckon a trajectory problematic
to at the days more presents.
Accordingly, became appropriate to contextualize the impacts
than such appropriations on the
professional group, noting in particular its main tensions,
taking as input the empirical
experience of Social Service course of a unit of private higher
education, the Faculdade
Cearense, in which we invest the investigation contained in the
third chapter of this study. In
the conclusion, is submitted a review of research held, looking
critically signal such debates
which have enabled a breakthrough in social direction of the
project ethical-political
professional, as well as initiate reflections on the current
adverse situation, in view of the
possibilities of a training professional committed to the
critical-dialectical rationality.
Keywords: Social Service. Marxist tradition. Vocational
Training.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 1. Cursos de Serviço Social ofertados no período de
1990-20002, segundo natureza
jurídica.....................................................................................................................................
43
Quadro 1. Distribuição das matérias, disciplinas e componentes
curriculares do núcleo de
fundamentos teórico-metodológicos da vida
social...............................................................
110
Quadro 2. Distribuição das matérias, disciplinas e componentes
curriculares do núcleo de
fundamentos da formação sócio-histórica da sociedade
brasileira........................................ 111
Quadro 3. Distribuição das matérias, disciplinas e componentes
curriculares do núcleo de
fundamentos do trabalho
profissional....................................................................................
112
Quadro 4. Organização e identificação das monografias por
temática................................. 124
-
LISTA DE TABELAS
1. Estrutura do desemprego em países de capitalismo avançado, no
período de 1990-2010,
ilustrando o aumento da taxa nos últimos
anos.......................................................................
30
2. Despesas da União com Educação Superior no Brasil (em bilhões
de reais)...................... 41
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LISTA DE SIGLAS
ABESS – Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social
ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço
Social
ANAS – Associação Nacional de Assistentes Sociais
ANDES-SN – Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de
Ensino Superior
BM – Banco Mundial
CBAS – Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais
CBCISS – Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de
Serviços Sociais
CENEAS – Comissão Executiva Nacional de Entidades Sindicais de
Assistentes Sociais
CE – Código de Ética
CFAS – Conselho Federal de Assistentes Sociais
CFESS – Conselho Federal de Serviço Social
CRAS – Conselho Regional de Assistentes Sociais
CRESS – Conselho Regional de Serviço Social
EaD – Ensino a Distância
ENESSO – Executiva Nacional de Estudantes em Serviço Social
FaC – Faculdade Cearense
FHC – Fernando Henrique Cardoso
FHTMSS – Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos do
Serviço Social
FMI – Fundo Monetário Internacional
IC – Internacional Comunista
IES – Instituição de Ensino Superior
IFES – Instituições Federais de Ensino Superior
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira
IPECE - Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do
Ceará
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MARE – Ministério da Administração e da Reforma do Estado
MEC – Ministério da Educação
MESS – Movimento Estudantil de Serviço Social
MPC – Modo de Produção Capitalista
NAFTA – Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (North
American Free Trade
Agreement)
-
OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OMC – Organização Mundial do Comércio
ONU – Organização das Nações Unidas
OPEP – Organização dos Países Exportadores de Petróleo
PCUS – Partido Comunista da União Soviética
PDRE – Plano Diretor da Reforma do Estado
PEP – Projeto Ético-Político
PL – Projeto de Lei
PPCSS – Projeto Pedagógico do curso de Serviço Social da FaC
PPI – Projeto Pedagógico Institucional da FaC
PPP – Parceria Público-Privado
PROUNI – Programa Universidade Para Todos
PT – Partido dos Trabalhadores
REUNI – Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão
das Universidades
Federais
SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
UECE – Universidade Estadual do Ceará
UFA – Unidade de Formação Acadêmica
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura
URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
-
SUMÁRIO
Introdução...............................................................................................................................
18
CAPÍTULO 1 - Tradição Marxista e Serviço Social: determinações
histórico-sociais
contemporâneas......................................................................................................................
22
1.1 Capitalismo contemporâneo e a ofensiva
neoliberal....................................................
23
1.1.2 A subordinação da educação ao capital: a questão do ensino
superior........................ 34
1.2 Introduzindo um debate à teoria social crítica de Marx e o
cenário do marxismo
hoje...........................................................................................................................................
46
1.2.2 A hegemonia pós-moderna no capitalismo contemporâneo: a
reatualização do
conservadorismo e o Serviço
Social........................................................................................
60
CAPÍTULO 2 - Tradição Marxista e Serviço Social: os
(des)caminhos entre
continuidade e
ruptura..........................................................................................................
70
2.1 Primeiras aproximações do Serviço Social à tradição
marxista: apropriações
ideológicas e a vertente da intenção de ruptura com o
tradicionalismo profissional.............. 71
2.2 As apropriações epistemológicas da tradição marxista no
Serviço Social a partir do
contexto de consolidação acadêmica da intenção de
ruptura................................................... 81
2.3 Apropriações ontológicas da tradição marxista: a maturação
profissional no debate da
vertente
crítico-dialética...........................................................................................................
91
CAPÍTULO 3 - Tradição Marxista e Serviço Social: a tônica do
debate na formação
profissional na
FaC..............................................................................................................
102
3.1 A proposta das Diretrizes Curriculares da ABEPSS e o
currículo pleno para o curso de
Serviço Social da
FaC............................................................................................................
103
3.1.2 A disciplina “Fundamentos Históricos, Teóricos e
Metodológicos do Serviço Social
IV” e o estudo do método em Marx: esboço de uma análise
crítica...................................... 115
3.2 Trabalhos de Conclusão de Curso e perspectivas
metodológicas: o marxismo é mesmo
o referencial teórico
hegemônico?.........................................................................................
122
3.2.1 Perspectivas marxistas: situando
problemáticas......................................................
126
-
3.2.2 Para uma crítica da crítica: expressões contemporâneas da
formação profissional no
debate
marxista......................................................................................................................
135
Considerações
finais.............................................................................................................
140
Referências............................................................................................................................
145
Apêndices..............................................................................................................................
152
-
18
INTRODUÇÃO
“Voltarei a estes temas tantas vezes quanto o indicar
o curso da minha investigação e da minha polêmica. [...]
Novamente repito que não sou
um crítico imparcial [...]. Meus juízos se nutrem de meus
ideais, de meus sentimentos, de minhas paixões.”
(José Carlos Mariátegui).
O interesse pelo estudo da interlocução do Serviço Social com o
pensamento marxiano
e a sua tradição historicamente denominada marxista surgiu
essencialmente pela experiência
de quase quatro anos no Movimento Estudantil de Serviço Social
(MESS) e de nossa inserção
e discussões na experiência de monitoria da disciplina de
Capitalismo e Questão Social do
curso de Serviço Social da Faculdade Cearense (FaC) ministrada
pela Professora Doutora
Cristiane Porfírio, que nos estimulou uma gradual aproximação à
teoria social crítica de Marx,
bem como de seus “seguidores”. À medida que tal vertente
teórico-metodológica foi sendo
observada no desenvolvimento de nossa formação profissional,
surgiam também alguns
questionamentos sobre a sua influência no Serviço Social,
especialmente pela dita conquista
da atual direção social da profissão vinculada a um projeto
societário radicalmente
democrático e, portanto, sem exploração de classe.
Antes de nos atermos à apresentação mais aprofundada deste
trabalho, consideramos
essencial elucidar o que nós entendemos por “tradição marxista”.
No decorrer de nosso
estudo, visualizamos que o pensamento marxiano, pós-Marx, foi
alvo de inúmeras
interpretações, tanto no que concerne ao seu aperfeiçoamento,
quanto às depreciações mais
colossais, impondo-se não só a existência de um único marxismo,
mas “dos marxismos”.
Entretanto, cabe-nos concordar com Netto (1989, p. 95, grifos do
autor), para quem a
pluralidade nas abordagens acerca do universo teórico marxiano
não é algo infinito ou
indefinido. Esta vertente teórico-metodológica, englobando a
obra marxiana e também as suas
interpretações equivocadas ou não, historicamente conhecida por
tradição marxista, de
acordo com o referido autor, dispõe de fronteiras que podem ser
precisadas por um triplo
critério: “o método crítico-dialético, a teoria do
valor-trabalho e a perspectiva da revolução”.
Nesse sentido, o que entendemos por tradição marxista está aí
esclarecido. Em vista disso, é
importante que o leitor observe esta questão para não incorrer
nas diversas armadilhas do
reducionismo.
-
19
Já dispostas as nossas indagações a respeito do tema,
salientamos que a investigação
sobre as apropriações da tradição marxista no Serviço Social,
nos exigiu uma análise crítica
das determinações sócio-históricas na sociedade capitalista
contemporânea, especialmente, no
que tange aos seus mecanismos de ofensiva à classe trabalhadora
e à vertente teórico-
metodológica que é orientada por uma racionalidade
crítico-dialética, infirmando tanto a
destruição da razão, que se expressa no irracionalismo, quanto à
miséria da razão, operada
pelo racionalismo burguês, que a reduz ao tratá-la como um
procedimento formal.
Temos como pressuposto que a interlocução do Serviço Social com
a tradição marxista
é determinada pelos múltiplos aspectos histórico-sociais
engendrados no capitalismo dos
monopólios e, por isso, sua maior ou menor elucidação está
permeada por complexas
mediações que extrapolam o campo próprio do Serviço Social.
Estas mediações, por sua vez,
comparecem sintonizadas com o combate à razão instaurado em
decorrência da entronização
do projeto social capitalista, cenário em que surge o pensamento
crítico marxiano pautado
num rompimento radical com a ciência burguesa.
Do ponto de vista teórico-metodológico, para apuração de nosso
pressuposto, nos
utilizamos de um referencial pautado numa racionalidade
crítico-dialética capaz de nos
possibilitar, no terreno da complexidade do real, a compreensão
da essência oculta por detrás
da aparência fenomênica do objeto (LUKÁCS, 2003).
À vista disso, partindo do chão histórico que determina as
atuais expressões das
relações sociais, fomos buscar no materialismo
histórico-dialético, a passagem dos contrários
para dentro uns dos outros, isto é, na ação recíproca, a relação
dialética entre sujeito e objeto
no processo da história. Considerando, substancialmente, que
neste chão histórico capitalista,
as dimensões da luta entre as classes (burguesia e proletariado)
também se apresentam na
batalha das ideias (KONDER, 2009) e são nelas que se encontram
as alternativas para a
superação das problemáticas engendradas acerca do objeto. Sem
esquecer, antes, que “a arma
da crítica não pode substituir a crítica das armas” (MARX, 2010,
p. 44) e a superação das
inversões das ideias pressupõe a abolição do sistema material
que as engendra.
Nesse sentido, à luz do supracitado referencial, a relevância
deste trabalho consiste em
analisar, acuradamente, como se tem expressado as apropriações
da tradição marxista no
Serviço Social brasileiro, no que tange, especialmente, ao
espaço da formação profissional.
Com esse objetivo, investigamos as suas manifestações no projeto
acadêmico-profissional do
-
20
curso de Serviço Social da FaC, tomando como referência a
interlocução realizada nos
recentes estudos monográficos publicados.
No entanto, para cumprir o objetivo de nossa investigação fez-se
necessária a
compreensão do contexto sócio-histórico contemporâneo do modo de
produção capitalista e
de seus instrumentos de reprodução em tempos de crise, em
especial, no que tange às
investidas ídeo-teóricas, no qual se deu/dá a interlocução do
Serviço Social com a tradição
marxista; contextualizar os rebatimentos de tal interlocução no
campo mais geral da profissão
para, em seguida, dispô-los de maneira mais aproximada numa dada
unidade de ensino em
Serviço Social, entendendo-os enquanto expressões particulares
do movimento histórico de tal
interlocução na profissão e implicações ao avanço de seu
desenvolvimento.
Desse modo, no primeiro capítulo investigamos as transformações
ocorridas no modo
de produção capitalista, em decorrência de sua crise evidenciada
no giro dos anos 1970, a
partir da qual se observa até os dias de hoje inúmeros processos
restauradores nas dimensões
político-econômicas, sociais e ideoculturais na vida social.
Analisando principalmente seus
impactos no contexto brasileiro, através da ofensiva neoliberal,
com enfoque na subordinação
da educação aos interesses do capital, quando há um massivo
processo de abertura e
investimento no ensino superior privado, no qual se insere o
Serviço Social. Em seguida
buscamos analisar a questão do marxismo por meio de uma
sintética incursão no pensamento
marxiano, debatendo o processo de desenvolvimento dessa tradição
na história e os ataques
que esta tem sofrido a partir do embate à ideologia
contemporânea da burguesia, o pós-
modernismo; discutindo como este tem se relacionado com o
Serviço Social através da sua
busca de empobrecimento da razão.
No capítulo segundo investigamos as apropriações da tradição
marxista no Serviço
Social brasileiro desde as suas expressões iniciais, que datam
da década de 1970, englobando
a instituição da autocracia burguesa (FERNANDES, 1976) no Brasil
que perdurou desde o
ano de 1964 a 1985; até as interlocuções mais recentes do
conjunto profissional, tomando
como referência a indicação asseverada por Santos (2007a;
2007b), que reitera uma
sistematização na trajetória histórica desta relação, expressa
em três momentos: apropriações
ideológicas, epistemológicas e ontológicas da vertente
crítico-dialética. Nesse sentido,
ousamos problematizar, a partir destes três momentos, os
equívocos e inequívocos da
articulação da profissão ao pensamento marxiano e sua tradição,
observando, especialmente
que esta acontece numa sucessiva relação dialética de ruptura e
continuidades.
-
21
No terceiro capítulo apuramos, de maneira mais aproximada a
partir de nossa inserção
no campo empírico da investigação, as expressões da interlocução
do Serviço Social com a
tradição marxista na formação profissional. Inicialmente,
apresentamos os aspectos que
articulam o currículo pleno para o curso de Serviço Social da
FaC às orientações teórico-
metodológicas da ABEPSS (1996); para, em seguida, levantar
alguns dos traços presentes na
referida interlocução, a partir da disciplina de Fundamentos
Históricos, Teóricos e
Metodológicos do Serviço Social (FHTMSS) IV e na leitura
crítico-analítica dos estudos
monográficos recentemente publicados pelos/as estudantes de
Serviço Social da FaC.
Nessa direção, identificamos as principais problemáticas
presentes na interlocução da
profissão com o pensamento marxiano e a tradição marxista,
alçando alternativas para o
campo da formação profissional que seja capaz de possibilitar
não só o aperfeiçoamento das
questões teórico-metodológicas no âmbito do Serviço Social, mas
possam contribuir, no plano
da construção teórica, para a renovação do pensamento social
marxista no Brasil e, além, para
as formas de resistência da teoria às impostações reiteradas
pela ofensiva ídeo-teórica
burguesa à razão crítico-dialética.
-
22
CAPÍTULO 1
TRADIÇÃO MARXISTA E SERVIÇO SOCIAL: DETERMINAÇÕES
HISTÓRICO-SOCIAIS CONTEMPORÂNEAS
O presente capítulo tem como objetivo expor, por via da
abstração e de uma análise
aproximativa, as determinações histórico-sociais que
circunscrevem nosso objeto de estudo na
contemporaneidade. Nesse sentido, traçamos uma análise acerca
das transformações ocorridas
no modo de produção capitalista, a partir de seus processos
restauradores nas dimensões
político-econômicas, sociais e ideoculturais. Para isso,
realizamos, primeiramente, um recorte
histórico partindo da investigação dos anos 1970 até o momento
atual, abordando
especialmente o processo de crise do modo de produção
capitalista e seus impactos na vida
social brasileira através da ofensiva neoliberal, com enfoque na
subordinação da educação aos
interesses do capital. Em seguida buscamos analisar a questão do
marxismo por meio de uma
sintética incursão no pensamento marxiano, debatendo o processo
de desenvolvimento dessa
tradição na história e os ataques que esta tem sofrido a partir
do embate com a ideologia
contemporânea da burguesia, o pós-modernismo; discutindo como
este tem se relacionado
com o Serviço Social através da busca pelo empobrecimento da
razão.
Para tanto, utilizamos como recurso heurístico na análise das
transformações do modo
de produção capitalista as contribuições de Karl Marx (2011),
bem como da literatura crítica
de tradição marxista, expressa nas análises de David Harvey
(1996), Ricardo Antunes (2000),
Ana Elizabete Mota (2009) e Elaine Behring (2008); além dos
estudos de Aníbal Ponce
(2007), Vânia Cardoso da Motta (2007), Larissa Dahmer Pereira
(2007) e Roberto Leher
(1999; 2004) no debate sobre a educação. Na discussão do
pensamento marxiano e da questão
do marxismo, nos referenciamos no pensamento de Marx (2011),
Marx; Engels (2007)
Vladmir Lenin (2006), Istvan Mészáros (2006), Leandro Konder
(2009), José Paulo Netto
(2006; 2009), além do estudo de Marcelo Braz (2011). Em seguida,
Carlos Nelson Coutinho
(2010), Fredric Jameson (1985), Josiane Soares Santos (2007) e
Ivete Simionatto (2009) é que
comparecem como subsídio na análise da hegemonia pós-moderna no
capitalismo
contemporâneo e seu reflexo na reatualização do conservadorismo
no Serviço Social.
-
23
1.1 Capitalismo contemporâneo e a ofensiva neoliberal
Para compreendermos a histórica relação travada entre o Serviço
Social e a tradição de
inspiração marxiana/marxista faz-se necessária uma leitura
dialético-materialista que situe o
real em seu nível de complexidade à luz da sua perspectiva de
totalidade, na tentativa de tecer
as implicações objetivas que dão base à situação do marxismo na
contemporaneidade em sua
conexão ao Serviço Social brasileiro. Com esta afirmação
queremos dizer que a apreensão da
dinâmica atual da realidade social, assentada no modo
capitalista de produção 1, em suas
múltiplas determinações aparece como um dos eixos fundamentais
para a elucidação de nossa
questão no presente debate, pois é nela que transitam as
expressões concretas de nosso objeto.
Deste modo, a utilização da crítica marxista da economia
política aparece como
referência teórico-metodológica essencial deste processo de
pesquisa, uma vez que é capaz de
nos auxiliar – pela abstração, recursos heurísticos, categorias
teóricas (não esvaziadas de seu
conteúdo concreto, mas consideradas como “formas de ser”) e
conteúdos analíticos – a trazer
os componentes sócio-históricos que alicerçam a atual relação
entre o Serviço Social e
marxismo 2. Para tal efeito, nos ancoramos na famosa distinção
que Marx estabelece entre o
método de exposição e o método de pesquisa.
A investigação tem de apoderar-se da matéria, em seus
pormenores, de analisar suas
diferentes formas de desenvolvimento e de perquirir a conexão
íntima que há entre
elas. Só depois de concluído esse trabalho é que se pode
descrever, adequadamente,
o movimento real. Se isto se consegue, ficará espelhada, no
plano ideal, a vida da
realidade pesquisada, o que pode dar a impressão de uma
construção a priori. (Marx
2011, p. 28).
1 O capitalismo é um modo de organização da produção social
historicamente determinado, sucedendo às
organizações escravista e feudal, tendo nesta última o solo
histórico que possibilitou a sua ascensão no século
XVIII. Tem como uma de suas classes fundamentais a burguesia e
em sua base de desenvolvimento da vida
econômica a produção generalizada de mercadorias (BRAZ; NETTO,
2006), a partir de uma apropriação privada
da riqueza socialmente produzida (pelo proletariado, outra
classe que constitui este modo de produção), em que
esta é destituída dos instrumentos e produtos de seu trabalho.
Para saber mais sobre a constituição e
antagonismos do modo histórico de produção capitalista consultar
a obra Economia Política de José Paulo Netto
e Marcelo Braz (2006), além da obra de Ernest Mandel, O
Capitalismo Tardio, para compreender as formas
específicas de cada período do modo de produção capitalista
(1982). 2 Concordamos com Netto (2006) em sua compreensão de que
não há um marxismo, mas vários marxismos de
diferentes alternativas e vertentes (muitas vezes opostas umas
às outras). Nesse sentido, sinalizamos ao leitor a
cautela com nosso uso do termo, para evitar reducionismos,
sugerindo-se que a partir do pressuposto de Netto,
compreenda que a acepção é designada antes no sentido de
sistematizar estas vertentes em sua relação à obra de
Marx, independente de suas considerações teóricas, do que uma
tentativa de subestimar as complexas vertentes
que conformam a “tradição marxista” ou reduzi-las a um conceito
único, homogêneo e imaculado. Mas
entendendo que estas possuem um triplo critério a partir da
compreensão de Marx: a perspectiva do método
crítico-dialético, a teoria do valor-trabalho e a perspectiva da
revolução. (NETTO, 1989).
-
24
Assim, por consequência do método de pesquisa, nossa análise
consistirá em
desmistificar os nexos internos que existem por trás do nosso
objeto de estudo, em que, por
último, aparece o método de exposição, depois que o método de
pesquisa tenha possibilitado a
apreensão adequada do objeto. Portanto, é somente a partir deste
movimento que poderemos
revelar a relação necessária entre o objeto, seus “nexos
internos” e a aparência invertida que
se manifesta em suas expressões cotidianas visíveis.
Consequentemente, os escritos iniciais deste Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC)
estão centrados na crítica sócio-histórica dos processos que
permeiam o cenário atual da
sociedade capitalista, delimitado a partir do seu processo de
crise e reestruturação produtiva,
nos marcos da década de 1970, em que pretendemos investigar suas
transformações político-
sociais e ídeo-teóricas e, em especial, seus rebatimentos no
Serviço Social através do embate
travado à tradição marxista, que se configuram no adensamento do
pensamento pós-moderno
3 como reatualizador do racionalismo conservador burguês.
Uma análise marxista do Modo de Produção Capitalista (MPC) nos
subsidia a
compreender que a busca por acúmulo de lucro (leia-se
mais-valia) é uma característica
imanente deste sistema historicamente determinado 4 (Marx,
2011). Para isso, o capitalismo
cria as bases de orientação para o seu objetivo fulcral: o
crescimento, que ocorre
essencialmente através da exploração do trabalho vivo na
produção. Isso significa que a
característica fundamental do capitalismo está fundamentada na
relação antagônica de classe
entre capital e trabalho, na qual o primeiro aparece como uma
relação social que se
personifica na figura do capitalista, que detém os meios de
produção, e o segundo na figura do
trabalhador, isto é, naquele que é desprovido dos meios
necessários à realização do seu
trabalho 5.
Soma-se a isto a característica do MPC encontrada no dinamismo,
que decorre das suas
leis gerais que impele os capitalistas a buscarem inovações para
obtenção do lucro
3 Tomando-o, de acordo com Santos (2007a), como uma expressão do
pensamento formal-abstrato articulado à
positividade capitalista. 4 Conferir nota de rodapé n. 1.
5 Para fins de esclarecimento ao leitor é preciso asseverar que
nosso posicionamento remete às condições
históricas do trabalho na sociabilidade regida pela lógica da
mercadoria, isto é, capitalista, que submete as
potencialidades criadoras do trabalho humano a uma realização
alienada, que é condição inseparável de sua
reprodução na sociabilidade humana. Para efeito, realizamos
timidamente na seção 1.3 uma análise sobre os
aspectos da ontologia do ser social, concebidos por Marx,
discutindo a diferença entre o trabalho como base
fundante do ser social e a sua alienação nos moldes da sociedade
regida pela produção capitalista.
-
25
(crescimento), à medida que se saturam os mercados anteriormente
explorados. Por isso, de
acordo com Harvey (1996), Marx foi capaz de nos mostrar que
todas estas características da
lógica burguesa de sociabilidade são perduravelmente
contraditórias e estão intrínsecas ao seu
método de (re) produção.
E é justamente quando o MPC entra em crise, seja pela sua
tendência ao crescimento
(que gera uma superacumulação) ou pelos antagonismos gerados no
conflito entre capital e
trabalho, que ele forja novas maneiras de equilíbrio e
manutenção de sua ordem social
(econômica e política). A reestruturação organizacional do
sistema regulatório é quase sempre
a saída mais efetiva para perpetuá-lo, principalmente quando
suas leis determinantes
compelem os capitalistas às inovações nos mercados individuais
quando o mercado está
saturado, estimulando novas formas de competitividade orientadas
para o crescimento
(extração de mais-valia).
Numa análise sócio-histórica, observa Mészáros (2009) que nas
últimas décadas o MPC
encara o acirramento de seus antagonismos internos, que se
expressam atualmente numa
profunda crise estrutural6
, iniciada fenomenicamente, como citado anteriormente, nos
primórdios da década de 1970. Como sustenta Harvey (1996), a
partir deste decênio são
observadas mudanças abissais nas práticas culturais, políticas e
econômicas que aparecem
através da alteração do modo de acumulação do capitalismo e,
consequentemente, seu modelo
de regulamentação social e política.
Em meados da década de 1960/1970, após o longo período de
expansão do pós-Segunda
Guerra Mundial, caracterizado pelo aumento das taxas de
crescimento econômico, alta nos
salário e emprego a partir da estratégia de intervenção estatal
sob o molde keynesiano,
vivenciado em alguns países da Europa Ocidental, permitindo o
aumento da produtividade do
trabalho e de mercadorias, através da internacionalização da
produção, o capitalismo e seu
padrão taylorista-fordista/keynesiano de produção já se
encontravam em meio a graves
problemas, indicando – para uso da expressão meszariana - uma
crise estrutural sem
precedentes na sua história.
6 A crise que situamos corresponde às contradições inerentes ao
sistema de produção capitalista em seu atual
estágio de desenvolvimento mundial. As inflexões geradas na vida
da classe trabalhadora, expressas no
desemprego, no subemprego, na terceirização, no endividamento
estrutural, na fragilização dos direitos sociais,
demonstram a incidência do capital especulador como ameaça não
somente à economia real, mas às esferas
sociais e naturais, colocando em risco a própria espécie humana.
Para uma análise mais aprofundada consultar
Mészáros (2002, 2009).
-
26
A saturação do mercado interno, representada pelo excesso de
produção do setor
manufatureiro internacional, além da ausência de correspondência
entre a produção de massa
e o seu consumo, forçou o deslocamento do investimento para a
área das finanças, causando
uma hipertrofia da esfera financeira, a partir do final da
década de 1970 (HARVEY, 1996).
Esta problemática se deu especialmente com o acirramento da
disputa internacional, através
da reconstrução das economias europeia e japonesa, que reduzia
as taxas de lucro de seus
rivais – especialmente os Estados Unidos da América (EUA).
Com estas indicações, o padrão fordista-keynesiano enfrentava
ainda (1 a profunda
recessão de 1973 operada pelo excesso de fundos – o que
resultava numa forte inflação,
acrescida pelo choque dos preços do petróleo – acentuação da
crise influenciada pela medida
operada pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de
Petróleo) como pressão sobre os
EUA e o Ocidente, desestabilizando a economia mundial; (2 o
poder da força de trabalho –
representado pela organização sindical e a intensificação das
lutas entre capital e trabalho –; e
(3 a falência do princípio organizativo da rigidez.
Havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital fixo
de larga escala e
de longo prazo em sistemas de produção em massa que impediam
muita
flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estável em
mercados de
consumos invariantes. Havia rigidez nos mercados, na alocação e
nos contratos de
trabalho (especialmente no chamado setor „monopolista‟). E toda
tentativa de
superar esses problemas de rigidez encontrava a força
aparentemente invencível do
poder profundamente entrincheirado da classe trabalhadora
(Harvey, op. cit., p. 135,
grifos nossos).
A análise de Antunes (2000, p. 31), recolhida nos substratos do
pensamento de
Meszáros, assevera que este cenário não sinalizava apenas mais
uma das crises cíclicas do
MPC, mas esboçava o declínio do longo período de acumulação de
capitais, que ocorreu
durante o auge do padrão taylorista-fordista/keynesiano, com a
fase dos “anos dourados” do
segundo pós-guerra, indicando que a crise era “[...] a
manifestação [...], tanto do sentido
destrutivo da lógica do capital, presente na intensificação da
lei de tendência decrescente do
valor de uso das mercadorias, quanto da incontrolabilidade do
sistema de metabolismo social
do capital”.
Voltando às análises de Harvey (1996), é neste contexto que se
identifica a emergência
do que ele denominou acumulação flexível, considerada um novo
padrão de acumulação, que
tem por base a flexibilidade dos processos de trabalho, oposta à
rigidez do fordismo, sob a
organização do modelo toyotista de produção, combinando a
reciclagem do MPC com sua
-
27
necessidade orgânica de fragilização da organização da classe
dominada (a classe
trabalhadora) através do controle do trabalho.
Como sinalizado anteriormente, oposta ao princípio organizativo
da rigidez identificada
no modo taylorista-fordista de produção, a acumulação flexível
promoveu alterações nos
processos de trabalho, através da redução do tempo de giro do
capital pelo uso de novas
tecnologias produtivas, introduzindo novas formas de controle do
trabalho e emprego – e
também do consumo, a partir do seu caráter volátil expresso
especialmente no chamado
emprego flexível, baseado na subcontratação. Outro fator
determinante foi a diminuição do
tempo de uso dos produtos, na fala de Harvey (1996, p. 148).
[...] a aceleração do tempo de giro na produção teria sido
inútil sem a redução do
tempo de giro no consumo. A meia vida de um produto fordista
típico, por exemplo,
era de cinco a sete anos, mas a acumulação flexível diminuiu
isso em mais da
metade em certos setores [...]. A acumulação flexível foi
acompanhada na ponta do
consumo, portanto por uma atenção muito maior às modas fugazes e
pela
mobilização de todos os artifícios de indução de necessidades e
transformação
cultural que isso implica.
Retomando o debate travado por Antunes (2000), observa-se que
este processo da
lógica capitalista de produção aparece como uma “resposta à sua
própria crise”, que para o
autor representa um quadro mais complexo e crítico em que o
sistema capitalista adentra: é a
expressão de uma crise estrutural, sem precedentes em toda a sua
trajetória de constituição,
que demonstra sua inviabilidade e sua característica
ontologicamente incontrolável, em que a
tendência decrescente da taxa de lucro é o destaque. A partir de
sua inferência,
[...] iniciou-se um processo de reorganização do capital e de
seu sistema ideológico e
político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o
advento do
neoliberalismo, com a privatização do Estado, a
desregulamentação dos direitos do
trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal, da qual a
era Thatcher-Reagan
foi a expressão mais forte; a isso se seguiu também um intenso
processo de
reestruturação da produção e do trabalho, com vistas a dotar o
capital do
instrumental necessário para tentar repor os patamares de
expansão anteriores
(ANTUNES, op. cit., p. 31).
Estas tendências nos orientam a identificar as medidas que
visaram reestruturar o MPC,
principalmente através das fusões patrimoniais, articulando
capital industrial e financeiro,
promovendo a formação de oligopólios globais, com a concentração
e centralização de
-
28
capitais. Antunes (2000) defende que a própria crise do
taylorismo-fordismo foi uma
expressão fenomênica da crise estrutural do capital, de que as
medidas referenciadas acima
são as equações mais evidentes.
Ademais essas mudanças, iniciou-se uma abertura de novos espaços
para a expansão
dos excedentes acumulados – incorporando as economias
periféricas e do Terceiro Mundo ao
processo de reprodução do capital, no sentido de salvar o MPC da
evidente crise estrutural
destacada pela tendência decrescente da taxa de lucro – e nos
termos tão bem colocados de
Harvey (1996), pela compressão espaço-temporal que o capital
engendra como consequência
de suas próprias orientações para o crescimento. Nos estudos de
Mota (2009), a incorporação
das economias do Terceiro Mundo foi representativa desse
processo de reestruturação
capitalista, através da busca constante de novos mercados de
investimento, contudo,
incorporadas de maneira extremamente precária, subordinada e
dependente. Em suas palavras,
A plena incorporação das economias periféricas ao processo de
reprodução ampliada
do capital ocorreu nos anos 70 do século XX, quando os países
então chamados
subdesenvolvidos transformam-se em campo de absorção de
investimentos
produtivos. A seus Estados nacionais coube a continuidade –
embora com novas
características – do papel de indutores do desenvolvimento
econômico, propiciando
uma base produtiva integrada às necessidades dos oligopólios
internacionais, graças
ao apelo ao crédito externo para o financiamento daquela base e
da sua expansão
(MOTA, 2009, p. 57-58).
Contudo, na década seguinte esse processo toma novos
desdobramentos, especialmente
através dos resultados da incorporação dos países
subdesenvolvidos, que foram obrigados a
exportar capitais para quitar suas dívidas adquiridas pelos
empréstimos realizados; da
reorganização do sistema financeiro global e do investimento à
inovação tecnológica; das
mudanças no mundo do trabalho, apresentando alterações na
divisão internacional do
trabalho; e, por último, mas não menos importante, da ofensiva
ideopolítica neoliberal, tão
necessária à manutenção da hegemonia do capital, que atua
especialmente no sentido de
fragilizar a organização política dos trabalhadores e amenizar
as contradições do conflito
entre capital e trabalho, através da subordinação dos Estados
nacionais à lógica de
acumulação de capitais, bem como da instauração de bases
político-econômicas para uma
posição mais defensiva – do que ofensiva – pelo movimento
operário.
Nos fins da década de 1980 com a queda do Muro de Berlim e o
colapso do chamado
“socialismo real” sobre a esquerda, abriu-se uma nova fase que
se materializou pelo projeto
-
29
de restauração capitalista, através do novo imperialismo e pela
mundialização da economia,
organizando suas bases doutrinárias e políticas em uma ofensiva
antidemocrática,
especialmente no Consenso de Washington 7, que serviu como
orientação de ajuste das
economias periféricas ao modo de reprodução do capitalismo
mundial. (MOTA, 2009).
Desta maneira, Mota (2009) observa que o novo imperialismo vem
sendo exercido
atualmente pelos Estados Unidos, por meio de estratégias que
visam recuperar sua influência
econômica, no sentido de revitalizar o seu controle sobre o
sistema financeiro internacional,
caucionando o aumento de juros sobre a dívida externa dos países
de Terceiro Mundo.
Caracterizado por Ferreira (2012, p. 213) como uma revolução
tecnocientífica, o
processo de restauração da ordem econômica capitalista
alimentou-se do uso da pesquisa
científica no âmbito do setor militar e industrial
norte-americano, alterando os padrões da
produção, que ocasionou uma profunda hierarquização
internacional, instituindo a
diferenciação entre as economias que detêm as tecnologias
avançadas das que são
dependentes de sua importação, o que representou um “divisor de
águas na história recente da
economia mundial”. Sua compreensão é que
[...] a globalização econômico-financeira representou a
conclusão do movimento de
subordinação formal da totalidade da atividade econômica do
planeta à lógica dos
processos de produção e reprodução ampliadas do capital. Este
movimento
anteriormente teve como obstáculo, ainda que relativos à sua
configuração cabal, a
existência das economias do socialismo real e o intervencionismo
estatal das
economias capitalistas de modernização tardia. Tratava-se,
portanto, de um novo
ciclo de mundialização econômica, ou ampliação do mercado
capitalista mundial, o
qual conduziu às suas últimas consequências a conquista do mundo
pelo capital
(FERREIRA, 2012, p. 222).
Como consequência, vivenciamos um cenário de crescimento das
desigualdades sociais,
de renda e regionais, a pobreza, a exploração desenfreada da
força de trabalho e as ameaças
da crise financeira. O desenvolvimento de novas tecnologias
gerou excedentes de força de
trabalho, que possibilitaram ao capital o retorno a estratégias
absolutas de extração de mais-
valia e novos padrões de dominação, mesmo nos países
capitalistas mais avançados, como os
EUA e o Nafta - Tratado Norte-Americano de Livre Comércio; a
Alemanha na Europa; e o
Japão, na liderança dos países asiáticos – que na segunda metade
da década de 1990, foi
7 O Consenso de Washington foi elaborado em 1989 por
representantes do Fundo Monetário Internacional
(FMI), Banco Mundial (BM) e pela Organização Mundial do Comércio
(OMC), como um programa político de
orientação aos países da América Latina ao ajustamento
econômico. Consistiu na construção de um programa de
propostas impostas aos países latino-americanos como
consequência de suas dívidas externas, nas quais estavam
fixadas medidas de redução dos gastos públicos,
desregulamentação do mercado de trabalho, privatizações das
empresas estatais, investimento estrangeiro direto etc. (MOTA,
2009; PINHEIRO (Org.), 2012).
-
30
criticamente atingida pela crise, com o acirramento da
competição intercapitalista.
(ANTUNES, 2000).
Para Antunes (2000), apesar do significativo avanço tecnológico
engendrado pelo
patamar de desenvolvimento das forças produtivas, pôde-se
observar, a partir do processo de
reestruturação do padrão de acumulação capitalista, uma
intensificação da jornada de trabalho
(ao invés da possibilidade de reduzi-la em escala mundial), a
total precarização das condições
de trabalho da força humana, o desemprego em dimensão estrutural
e a degradação do meio
ambiente em escala globalizada, por meio da alienação das
relações metabólicas entre homem
e natureza que, no sistema capitalista, corresponde à primazia
da produção de mercadorias, ao
invés da satisfação das necessidades humanas.
Na tabela abaixo (tabela 1.) podemos observar, como nos últimos
vinte anos, mesmo em
algumas das principais economias do capitalismo desenvolvido, as
taxas de desemprego vêm
se desenvolvendo numa ordem crescente na década de 1990, com uma
posterior queda nos
Estados Unidos, no ano de 1995. No Japão, um dos países
asiáticos atingidos pela crise, a
tendência também é crescente, obtendo uma queda de 4,6% em
relação aos anos 2000. O pico
do desemprego na última década foi em 2009, o ano da crise
financeira internacional, com um
número de 198 milhões de pessoas desempregadas, de acordo com
dados da Organização
Internacional dos Trabalhadores (OIT). A estimativa é que para
os próximos cinco anos, o
contingente de desempregados deva chegar a 210 milhões.
Tabela 1. Estrutura do desemprego em países de capitalismo
avançado, no período 1990-2010, ilustrando
o aumento da taxa nos últimos anos.
Fonte: Trading Economics, 2013.
Quanto ao Brasil, sua incorporação ao processo de reconfiguração
capitalista sob os
moldes do novo imperialismo ocorreu logo após um período de
abertura e ascenso das lutas
-
31
democráticas durante a década de 1980, na qual as conquistas
expressas com a Constituição
Federal de 1988 representaram um avanço na obtenção de direitos
sociais como saúde,
educação e proteção social 8, que, no entanto, logo foram
revertidos como consequência da
efetivação do processo de inserção do país ao modelo neoliberal
já nos anos da década de
1990.
Para Santos (2007, p. 20), os ajustes neoliberais, engendrados
como imperativo da
lógica capitalista para a reprodução da dominação, bem como para
o aumento da sua
liberdade mercadológica, se expressam principalmente através da
desregulamentação das
economias e dos direitos dos trabalhadores, edificando uma
“reforma” no Estado para que
este renove sua funcionalidade ao capital. Assim, o que ocorre é
um processo de “Estado
mínimo para os trabalhadores e máximo para o capital, uma vez
que, malgrado sua “redução”
o Estado continua intervindo para garantir as condições mais
propícias à extração da mais-
valia”.
Behring (2008), por sua vez, analisa detalhadamente o processo
de desestruturação e
subsunção do Estado brasileiro aos anseios do capitalismo
contemporâneo e o denomina de
contrarreforma 9 do Estado, uma vez que as políticas neoliberais
representam as condições e
orientações para a inserção de determinado país na dinâmica
internacional do capitalismo,
demolindo as conquistas antes garantidas pela pressão da
organização coletiva dos
trabalhadores ou pelas formas anteriores de organização do
Estado com funções sociais
explicitamente estabelecidas. Nesta ordem, o Estado adquire cada
vez menos um caráter
social em detrimento da oferta de subsídios à maior liberdade de
mercado. Na fala da autora
(2008, p. 58, grifos do original):
Em relação ao Estado, portanto, existem fortes repercussões dos
processos (da) [...]
reestruturação produtiva e (da) mundialização [...] que
configuram as linhas gerais
de uma verdadeira contrarreforma. Esta adquire maior ou menor
profundidade,
8 É necessário alertar que a seguridade social brasileira,
instituída pela Carta Constitucional de 1988, apesar de
apresentar elementos inovadores, é caracterizada por um sistema
híbrido, compondo direitos seletivos
(Assistência), universais (Saúde) e aqueles derivados do
trabalho (Previdência). (PEREIRA, 2006). 9 Aqui advertimos a
atenção do leitor para a inversão ideológica exposta no termo
„reforma‟. Amparando-nos no
estudo de Behring; Boschetti (2008), consideramos que a
apropriação do termo está fundamentada numa
estratégia político-ideológica para a conquista de legitimidade
intelectual e moral do processo de implantação do
neoliberalismo no Brasil, através da inversão que faz do termo
historicamente utilizado pelo viés
socialdemocrata e socialista (acrescido de todas as suas devidas
críticas, obviamente, e antes do processo de
abandono do primeiro pelo ideal de esquerda), submetendo-o a uma
utilização pragmática, como se toda
mudança fosse uma reforma, especialmente no âmbito econômico. As
autoras utilizam o termo contrarreforma
para situar o caráter reacionário e direitista das mudanças
estabelecidas no país. Para maior explicação deste
debate, conferir a obra de Behring e Boschetti, Política Social:
fundamentos e história, 2008.
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dependendo das escolhas políticas dos governos em sua relação
com as classes
sociais em cada espaço nacional, considerando a diretiva de
classe que hegemoniza
as decisões no âmbito do Estado. Escolhas que se relacionam e
resultam também do
tempo histórico em que esta contrarreforma se instaura nas
diferentes formações
sociais.
Ao longo dos anos 1990 os efeitos desse processo sobre o Brasil
podem ser observados
especialmente no discurso avassalador em torno das [contra]
“reformas” orientadas para o
mercado como consequência da reorganização internacional do
capitalismo, através,
primeiramente, do governo Collor com sua agenda de abertura
econômica e privatizações,
propalada antes com uma proposta falida de Reforma
Constitucional e, depois, com vetos e
emendas presidenciais, tratando a política social de forma
minimalista e com um viés
estritamente neoliberal. E, em segundo lugar, a partir da era
Fernando Henrique Cardoso
(FHC) com a instituição do Plano Real em 1994, redimensionando
uma nova relação do país
com os organismos internacionais (FMI e BM) a partir da
renegociação da dívida pública e a
concessão de novos empréstimos; e do Plano Diretor da Reforma do
Estado através do
Ministério da Administração e da Reforma do Estado em 1995
(PDRE/MARE) com o
objetivo de “reformar” a administração pública, uma vez que os
problemas do Estado
nacional brasileiro eram considerados como consequência de suas
próprias falências sobre
suas funções básicas e do agravamento da crise fiscal e da
inflação – pura ideologia
dominante, haja vista que as problemáticas eram bem mais
complexas tanto no âmbito
econômico quanto social e a adoção de tais políticas incidiram
com expressividade na vida da
população brasileira. (BEHRING, 2008).
Em relação à classe trabalhadora, observa Behring (2008, p.
60-65), a profundidade
desta contrarreforma está na tônica conduzida às privatizações e
ao desmonte dos direitos
sociais garantidos pela Carta Constitucional brasileira de 1988,
em especial à proteção social
– que teve um forte impacto através dos ataques à previdência
social como consequência da
“crise fiscal” do Estado. Assim, através da contrarreforma, foi
preconizado o corte dos gastos
estatais na esfera social para o equilíbrio do mercado, com a
intensificação da redução do
déficit fiscal.
O impacto desse processo à organização da classe trabalhadora
aparece como uma
intensa ofensiva antidemocrática que a torna mais complexa e
fragmentada, fazendo regredir
as marchas instauradas pelo cenário de redemocratização do país,
atingindo principalmente a
sua organização de classe através dos partidos e enfraquecendo
substantivamente sua
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organização sindical. O cenário das forças de esquerda
identificadas com as ideias marxianas,
após todas as inferências da crise capitalista, não seria
diferente. Com a inflexão da classe
trabalhadora e a fragilização da sua organização pelo partido
político, à tradição marxista caiu
o peso da frustração com a “queda” do socialismo real, gerando,
assomado das políticas
neoliberais, um apassivamento do proletariado, mas também a
oportunidade da autocrítica
para submergir de tal crise que repercutia em suas estratégias.
No aspecto de suas condições
objetivas, a classe trabalhadora sofre um processo de
intensificação da pobreza e de
crescimento do desemprego, que chega a níveis estruturais;
observa-se uma tendência, cada
vez mais crescente, à precarização dos espaços de trabalho,
expressa nas terceirizações e na
flexibilização dos contratos, que acaba por reforçar uma postura
defensiva por parte da classe
trabalhadora.
Nesse sentido, compreendemos com Behring (2008, p. 66) que uma
análise do
capitalismo sempre estará incompleta sem uma abordagem do seu
mecanismo ideológico de
manutenção. Sabemos que para a garantia de sua sustentação
econômica, política e social, o
capitalismo, além das condições objetivas da crise, dispõe de
estratégias ideológicas e
culturais, dentre as quais, aparece a tentativa de construção de
uma falsa consciência, a partir
da disseminação de uma cultura conservadora e antidemocrática
fundada na esfera do
mercado, que tem obtido resultados eficazes na radicalização das
lutas sociais e o
consentimento entre as classes, sob um véu que obscurece as
reais relações coisificadas no
seio da sociedade capitalista. Deste modo, observa-se que no
neoliberalismo, o MPC tem as
bases de sua hegemonia ideo-cultural, contribuindo para a
potencialização do fetiche da
mercadoria sobre as relações humanas e sociais, obscurecendo os
processos de exploração e
dominação engendrados pelo capital.
Um dos traços marcantes da ofensiva ideológica neoliberal
descritos ainda na obra de
Behring (2008) é o ascenso do pensamento pós-moderno. Em seus
estudos ela nos expõe a
partir dos estudos de Harvey (1996), que a “condição
pós-moderna” aparece como uma visão
de mundo representativa das relações capitalistas de produção.
Santos (2007) também analisa
as bases de instituição do pós-modernismo, considerando que
apenas é possível uma
consciência que responda ao padrão da acumulação flexível com
características efêmeras e
temporárias. Sustenta ainda que, em meio à insegurança do
desemprego, esta consciência é
marcada por incertezas e é tão descartável quanto às mercadorias
produzidas pelo capitalismo.
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O contexto da ideologia (na acepção marxiana de „falsa
consciência‟) abrange as mais
diversas esferas da vida social, através da cultura e política.
Assimila os mecanismos de
comunicação, do conhecimento, das organizações coletivas e de
classe, da juventude etc. e os
subsume aos seus interesses no sentido de torná-los uma saída
para a crise. Assim, estabelece-
se o que a autora caracteriza como cultura da crise, que é
reforçada pela ideologia burguesa
no seu empenho ao desmonte da resistência da classe
trabalhadora. Para Santos (2007, p. 27)
esta é a lógica cultural do capitalismo contemporâneo que tem
favorecido o seu padrão de
acumulação, a “expansão de uma hegemonia ideo-cultural” que
contribui para a instauração
de um clima de vazio ideológico “expresso na ausência de um
projeto societário que se
oponha a ele”.
Nesta esteira, o processo educativo aparece como um potente
instrumento para às saídas
do capital em crise, uma vez que é atrelado ao setor econômico,
de um lado para a formação
do trabalhador útil à produção, de outro, para a manipulação das
consciências e neutralização
da luta entre as classes sociais, eximindo da educação seu
caráter emancipatório. Na seção
que se segue analisaremos como o processo educativo, no âmbito
do ensino superior, é
apropriado pelo capitalismo contemporâneo como uma saída
estratégica à tendência
decrescente das taxas de lucro.
1.1.2 A subordinação da educação ao capital: a questão do ensino
superior
A partir da ontologia marxiana, buscamos compreender por meio
dos processos atuais
de ofensiva neoliberal, como a educação tem adquirido um valor
inestimável para a
manutenção da ordem metabólica do capital (MESZÁROS, 2002;
2009), especialmente
através das alianças entre os organismos internacionais –
principalmente o Fundo Monetário
Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM), que vêm impondo
mudanças significativas nas
universidades latino-americanas, em consequência da articulação
„periférica‟ e submissa
destes países ao capitalismo central sob o discurso do
desenvolvimento socioeconômico, da
qual tratamos sumariamente na seção anterior. Recentemente
alguns estudos têm abordado o
movimento de subsunção do conhecimento aos imperativos do
mercado capitalista, no qual a
educação, “que deveria formar o homem para sua emancipação, tem
sido atrelada ao trabalho
alienado, enraizando o caminho da barbárie humana” (FRERES;
RABELO; MENDES
SEGUNDO, 2010, p. 34-35).
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Através do estudo de uma sociedade dividida em classes, o
marxista argentino Aníbal
Ponce (2007) situa a educação como um fenômeno social de
superestrutura que tende a ser
moldado historicamente pelo modelo de sociedade vigente. Em sua
análise, desde a divisão da
sociedade em classes, o autor compreende que a educação foi
apropriada pela classe
dominante como um instrumento manipulador para a classe
dominada.
Na sua obra, Ponce observa que nas comunidades primitivas, por
exemplo, onde não
havia divisão de classes, a terra era propriedade comum e unida
por laços de sangue, os
indivíduos eram livres, homens, mulheres e crianças conviviam
democraticamente em função
de sua reprodução, através da socialização de tudo que era
produzido. Havia uma divisão
rudimentar do trabalho em função do sexo e da idade. O processo
de aprendizado se dava pela
necessidade dos membros do grupo de relacionar-se com a natureza
e os outros membros, a
partir da observação e da própria prática, de acordo com a
capacidade de cada um e a
finalidade comum de todos, desde as crianças até os adultos
(Ibid., p. 17 et seq.).
Os fins da educação nesse tipo de sociedade, informa o autor,
derivavam da própria
estrutura homogênea do ambiente social, uma vez que os
interesses do grupo eram comuns e
se realizavam igualitariamente com cada um do grupo, espontâneo
e integralmente. Integral,
pois cada membro bem apreendia tudo o que se elaborasse e
recebesse na comunidade, e
espontâneo à medida que não existia nenhum tipo de instituição
para limitá-los.
Conforme a comunidade primitiva foi lentamente se transformando
numa sociedade
dividida em classes, a partir, também, do desenvolvimento das
formas de trabalho, dividindo
as funções exercidas pelos membros do grupo, que demandavam
administração da justiça, das
guerras, do sistema de irrigação etc., este conceito de educação
foi deixando de ser adequado,
pois conforme a organização social começava a complexificar-se,
passou-se a se requerer
certos conhecimentos para o desempenho de determinadas funções.
A educação a partir de
então aparece como uma fonte de domínio.
[...] Desde esse momento, os fins da educação deixaram de estar
implícitos na
estrutura total da comunidade. Em outras palavras: com o
desaparecimento dos
interesses comuns a todos os membros iguais de um grupo e a sua
substituição por
interesses distintos, pouco a pouco antagônicos, o processo
educativo, que até então
era único, sofreu uma partição: a desigualdade econômica entre
os ‘organizadores’
- cada vez mais exploradores – e os ‘executores’ – cada vez mais
explorados –
trouxe, necessariamente, a desigualdade das educações
respectivas. (PONCE, op.
cit., p. 26, grifos do original).
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O que queremos aqui ressaltar é que a educação adquire
específica conotação dentro das
sociedades divididas em classe, diferente da que vigorou nas
sociedades primitivas10
. Para o
mesmo autor, a educação imposta pela classe que domina tem três
finalidades essenciais: “1º
destruir os vestígios de qualquer tradição inimiga, 2º
consolidar e ampliar a sua própria
situação de classe dominante, e 3° prevenir uma possível
rebelião das classes dominadas”
(PONCE, 2007, p. 36).
Já durante a antiguidade, a partir do século VI a. C., o caráter
de classe da educação
grega, especificamente em Esparta, se concentrava na instrução
militar, em que se recorria à
severa crueldade para transformar homens e mulheres em fortes
soldados. O ideal máximo da
educação era assegurar a superioridade militar sobre a classe
dominada – que se caracterizava
por um imenso número de escravos – através da rígida disciplina
na prática de ginástica.
Segundo Ponce, poderíamos caracterizá-la desta maneira:
Quando a olhamos friamente, surge em toda a sua extensão o
caráter de classe da
educação espartana. Sociedade guerreira [...], Esparta se
apropriava e vivia às
expensas do trabalho alheio. Integralmente dedicado à sua função
de dominador e de
guerreiro, o espartano nobre não cultivava outro saber que não o
das coisas das
armas, e não só reservava para si esses conhecimentos, como
castigava ferozmente,
nas classes oprimidas, todo e qualquer intento de compartilhá-lo
ou de apropriar-se
dele. Mas, não contente com acentuar as diferenças de educação
segundo as classes,
o espartano ainda se esforçava por manter submissos e
embrutecidos os escravos,
por meio do terror e da embriaguez. Enquanto, por um lado, a
educação reforçava o
poder dos exploradores, frenava, pelo outro, as massas
exploradas. (Ibid., p. 42,
grifos do original).
Apesar de longa, a citação é bastante esclarecedora também para
a situação de Atenas,
contudo, esta por ser maior produtora de mercadorias, o caráter
militarista da educação era
bem menor se comparado à Esparta. Contudo, assevera o mesmo
autor que, com o aumento
da riqueza, o número de escravos crescia exponencialmente, sendo
que para cada cidadão
livre existiam pelo menos dezoito escravos. Portanto, apesar das
diferenças, também era
interesse do Estado ateniense investir na preparação física de
seus “cidadãos” para a vida
militar: “[...] palestras, ginásios [...], tudo estava preparado
para isso. As representações no
10
Não nos interessa, neste estudo, fazer uma evolução histórica
dos processos educativos desde a constituição
das organizações sociais iniciais até os dias atuais, nem da
resistência operada pelas classes que foram
dominadas dentro de cada período, uma vez que nossa pesquisa
está centrada no momento atual em que se
configura o processo educativo, especialmente no nível superior.
Contudo, o fio condutor do nosso estudo se dá
a partir de um método histórico-dialético, em que necessitamos
redimensionar o passado para a compreensão do
presente, e para isso nos utilizamos de alguns exemplos do
desenvolvimento da história para aludirmos ao
cenário neoliberal. Para o leitor que desejar, especificamente,
uma análise da evolução histórica da educação e
suas específicas configurações dentro de cada período
sócio-histórico, recomendamos o estudo de Manacorda
(2001) e a própria obra de Aníbal Ponce (2007).
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teatro, a conversa nos banquetes, as discussões na Ágora
reforçavam nos jovens a consciência
da sua própria classe, como classe dominante” (PONCE, 2007, p.
44).
Tanto em Esparta quanto em Atenas, havia um grande desprezo pelo
trabalho, sendo
valorizadas apenas as atribuições intelectuais e de guerra, que
reforçavam o caráter virtuoso
da nobreza. Aos escravos, cabiam as atividades de cultivo da
terra. Citando Aristóteles, Ponce
observa que a recusa do trabalho está centrada na rejeição do
escravo. Nesta relação (trabalho-
escravo), Aristóteles proibia que se ensinasse aos jovens o
trabalho assalariado e a arte
mecânica, uma vez que estes além de deformar a beleza do corpo,
retiravam do pensamento a
capacidade da elevação. Nesse sentido não fica tão difícil
perceber a concepção de cidadania
que se tinha entre os gregos: o privilégio de constituir a
classe dirigente. Esse era o ideal da
educação grega, formar os homens da classe dominante para
construir uma sociedade
“democrática”, baseada na política e na elevação do pensamento
(Ibid., p. 45 et seq.).
Com o desenvolvimento da universidade no século XI até XVIII,
foi construída, a partir
do acúmulo de forças gestadas da sociedade feudal na transição
para o capitalismo, uma
verdadeira comuna intelectual, acirrando, a nosso ver, de vez, o
caráter classista que tem
permeado a história do processo educativo, sendo considerada a
primeira organização
francamente liberal da Idade Média. Ainda amparados no estudo de
Ponce (2007), observa-
se, ainda no cenário da universidade, os indícios de ascensão da
burguesia sobre a sociedade
feudal, pois seu secular princípio religioso foi sendo
questionado e substituído pela filosofia e
a lógica, a escolástica, o Renascimento e o Humanismo.
Aqui, ousamos sumariar alguns aspectos socio-históricos da
educação situando-os em
sua relação de classe em alguns momentos da história, pois,
assim como Marx e Engels
(2004), compreendemos que é pela divisão entre o trabalho
material e intelectual que ocorre a
divisão do trabalho 11
e, consequentemente, a divisão da sociedade em classes – ainda
que
sejam classes em si (isso depende do desenvolvimento das forças
produtivas que acirram os
antagonismos inerentes aos interesses de cada classe). É com a
divisão do trabalho na
sociedade burguesa que a educação aparece submetida aos
interesses da classe dominante,
11
“A divisão do trabalho só surge efetivamente a partir do momento
em que se opera uma divisão entre o
trabalho material e intelectual. A partir deste momento, a
consciência pode supor-se algo mais do que a
consciência da prática existente, que representa de fato
qualquer coisa sem representar algo de real. E
igualmente, a partir deste instante ela se encontra em condições
de se emancipar do mundo e de passar à
formação da teoria „pura‟, da teologia, da filosofia, da moral
etc. Mas mesmo quando essa teoria, essa teologia,
essa filosofia, essa moral etc., entram em contradição com as
relações existentes [...]” (MARX; ENGELS, 2004,
p. 24, grifo dos autores).
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correspondendo aos seus anseios manipulatórios e
instrumentalizadores sobre a classe
trabalhadora, deteriorando-a em seus aspectos físicos e
espirituais. Diz-nos os autores (2004)
que os “poderes intelectuais do trabalho desaparecem e
desembocam no outro extremo”
(Ibid., p. 28). E este outro extremo é engendrado pelo trabalho
coletivo na manufatura, pois
aquela deformação de que falamos “é inseparável mesmo da divisão
do trabalho na sociedade
[...]” (op. cit., p. 32).
Manacorda (2001), a respeito da compreensão marxista acerca da
função civilizadora do
capital através da educação, nos diz que Marx não nega as
conquistas históricas da burguesia
no campo da instrução – laicidade, estatalidade, universalidade,
gratuidade, aspectos literais,
morais, intelectuais, filosóficos etc. –, mas a critica pela
incapacidade de realizá-las
concretamente. Para Manacorda (Ibid., p. 296), o que a tradição
marxista traz de novo à
compreensão da educação “é [...] uma assunção mais radical e
consequente dest