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A POSSIBILIDADE DA INSERO DA CASTRAO QUMICA
NO DIREITO BRASILEIRO MODERNO
THE POSSIBILITY OF THE INSERTION OF THE CHEMICAL CASTRATION
IN THE MODERN BRAZILIAN RIGHT
1
ELOISE TREVISAN PADIAL
RESUMO: Diante dos acontecimentos do
Brasil durante os ltimos tempos, envolvendo
delitos contra a liberdade sexual, cujas vtimas
so, principalmente, inimputveis e semi-
imputveis, ressurgiu uma discusso sobre a
aplicao de uma pena com carter peculiar a
estes tipos de ofensores. Ento, discorreu-se
sobre a possibilidade da adoo da castrao
qumica, ou seja, a administrao de
progesterona, que agiria na causa hormonal
dos impulsos sexuais. Tal tratamento seria
aplicado de forma concomitante com a pena
tradicionalmente prevista pelo Cdigo Penal,
em casos em que especialistas julgassem
necessrio. Essa medida adotada,
atualmente, em inmeros pases, dentre eles
Itlia, Gr-Bretanha e nos Estados da
Califrnia, Flrida, Gergia, Texas, Louisiana e
Montana, nos Estados Unidos da Amrica.
Porm, a legislao ptria, em sua lei mxima,
a Constituio Federal, probe a aplicao de
penas corporais ou degradantes; assim, at
que ponto existe o bice legislativo para a
adoo de tal tcnica em nosso pas?
Devemos considerar que esta uma questo
delicada e emergente, e que necessita de uma
ateno especial de profissionais de diversas
reas, conforme discorreremos a seguir.
Palavras-chave: pena, castrao qumica.
ABSTRACT: Ahead of the events of Brazil
during the last times, involving delicts against
the sexual freedom, whose victims are, mainly,
no imputable and half-imputable, resurged a
quarrel on the application of a penalty with
peculiar character to these types of ofensores.
Then, it was discoursed on the possibility of the
adoption of the chemical castration, that is, the
progesterone administration, that would act in
the hormonal cause of the sexual impulses.
Such treatment would be applied of
concomitant form with the penalty traditionally
foreseen by the Criminal Code, in cases where
specialists judged necessary. This measure is
adopted, currently, in innumerable countries,
amongst them Italy, Great-Britain and in the
States of California, Flrida, Gergia, Texas,
Louisiana and Montana, in the United States of
America. However, the native legislation, in its
maximum law, the Federal Constitution, forbids
the application of corporal penalties; thus, until
point exists the legislative obstacle for the
adoption of such technique in our country? We
must consider this is a delicate and emergent
question, and that it needs a special attention of
professionals of diverse areas, as we will
discourse to follow.
Key-words: penalty, chemical castration.
Sumrio: 1 Consideraes histricas e o tratamento dispensado aos
delitos sexuais - 1.1
Tratamento dispensado aos delitos sexuais -
3.1 Regulamentao e uso da castrao qumica - 3.2 Princpio
constitucional:
dignidade da pessoa humana Concluso Referncias.
2 Conceito e caractersticas da penas - 2.1 Pena
privativa de liberdade: ser ela eficaz? - 3 A possibilidade da
castrao qumica no Direito Penal
Brasileiro -
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Advogada, formada em Direito pela Universidade Estadual de
Maring (UEM). Ps graduanda pela Escola da
Magistratura do Paran (EMAP); e-mail:
[email protected].
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1 CONSIDERAES HISTRICAS E O TRATAMENTO DISPENSADO AOS
DELITOS SEXUAIS
No se pode negar que o Direito seja um fato cultural e social e
o Direito Penal,
como ramo autnomo desta cincia, est inserido neste contexto como
produto da
experincia cultural de uma civilizao, cuja construo no se isola
no tempo, mas
decorrente de uma longa evoluo histrica das instituies penais,
de tal modo que a
forma daquelas em dado momento s poder ser compreendida se
relacionada com
seus antecedentes histricos (SILVA, 2004, p. 503-515).
Antes da inveno da escrita, numa fase denominada Pr-histria do
Direito
(GILISSEM, 2003, p. 31), a forma de realizar o controle da
sociedade era transmitida
oralmente, marcada por revelaes sagradas e divinas. O ilcito
confundia-se com a
quebra da tradio e com a realizao de atitudes contrrias ao que
as divindades
haviam proclamado, num direito consuetudinrio e desuniforme
constitudo por um
conjunto disperso de usos, prticas e costumes, reiterados por um
longo perodo de
tempo. Todavia, a inexistncia da escrita no significou
necessariamente a existncia
de um direito primitivo, vez que inmeros povos atingiram nveis
avanados de sua vida
social e jurdica sem a conhecerem (os Maias e os Incas na
Amrica, por exemplo).
Por vezes, o grupo social conhecia algum tipo de organizao
centralizada,
com a sano aplicada pelo chefe, ou seja, o detentor do poder, os
quais emitiam
normas com carter repressivo. Neste contexto, a pena surgiu como
uma resposta
individual agresso sofrida pelo sujeito, como uma forma de
exteriorizao dos
prprios instintos, sem qualquer preocupao com a
proporcionalidade.
Houve, assim, uma fase inicial, denominada vingana privada, onde
a regra
era a reao do ofendido contra a agresso sofrida. Inicialmente,
era algo pessoal,
restrita s partes envolvidas no conflito; porm a reao da vtima
passou a se estender
aos parentes e at mesmo ao grupo social (tribo) do qual o
agressor fazia parte.
Sucedeu-se a esta fase a vingana divina, perodo em que o castigo
deveria
estar de acordo com a grandeza do deus ofendido (NORONHA, 2004,
p. 21). Tal
argumento justificou a aplicao, pelos sacerdotes, de penas
cruis, severas e
desumanas.
Merece especial destaque nesta fase o Cdigo de Hamurabi, adotado
na
Babilnia, que introduz a primeira idia de proporcionalidade das
penas, atravs Pena
de Tailo, usada como forma de delimitao dos castigos: se
devolvia leso por leso,
morte por morte. Apesar dessa aparente proporcionalidade, as
penas estabelecidas
eram drsticas e de aplicao imediata, culminando em um direito
penal extremamente
severo.
Na Grcia e Roma o Direito Penal perdeu as bases teocrticas,
alcanando o
maior grau de laicizao que possuiu na Antiguidade as penas
abandonaram a
crueldade, sua principal caracterstica. As prticas penais da
Idade Mdia, por sua vez,
foram fruto da integrao de preceitos do Direito Romano, Direito
Cannico e Direito
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Brbaro. A pena variava de acordo com a condio social e poltica
do ru, visava
estritamente intimidao do sujeito e era executada utilizando-se
de meios
extremamente cruis, o que culminou no procedimento
inquisitorial, iniciado
aproximadamente no final do sculo XII e que objetivava
primordialmente combater
toda e qualquer forma de contestao aos dogmas da Igreja
Catlica.
Neste perodo houve a criminalizao do adultrio, da bigamia, do
estupro, da
sodomia, do rapto e do lenocnio, o que revela a preocupao em
relao aos desejos,
ressaltando o princpio de que qualquer forma de relacionamento
sexual deve ter como
finalidade a procriao (ROLIM, 2005, p. 47-59).
A legislao portuguesa, a qual merece destaque por ter
influenciado de forma
significativa a legislao brasileira, era baseada nos forais. No
mbito das penas
observava-se a aplicao de sanes cruis e essencialmente
desiguais, variando de
acordo com a classe econmica do ru, sem qualquer observao ao
princpio da
proporcionalidade.
Posteriormente iniciou-se, no decorrer do Iluminismo, uma fase
denominada
Perodo Humanitrio do Direito Penal, influenciado pelas idias
racionalistas do sculo
XVIII e pelo jusnaturalismo. Apregoou-se, sobretudo, a reforma
das leis e da
administrao da justia, com idias de liberdade e igualdade para
todos os homens e
imps-se exigncias humanitrias, como a abolio dos delitos de
magia, tortura e das
penas corporais. O Direito passou, ento, a ser encarado como uma
instituio
resultante da interao entre o Estado e a sociedade.
Como grande expoente dessa fase temos Cesar Bonesana, Marqus
de
Beccaria que, influenciado pelas idias de Rousseau e
Montesquieu, publicou a obra
Dei delitti e delle pene (Dos delitos e das penas, 1764). Esta
se transformou,
posteriormente, em smbolo da reao liberal ao desumano panorama
penal ento
vigente (MIRABETE, 2003, p. 38) e o direito nele postulado
objetivava substituir o
direito primitivo e brbaro das monarquias absolutistas por um
Direito Penal de cunho
humanista (SILVA, 2004, p. 507). Firmou em sua obra alguns dos
postulados do Direito
Penal Moderno, como a extino da pena de morte e sanes cruis e
estabeleceu,
ainda, o princpio da legalidade dos delitos e das penas (atravs
do qual a pena no
pode transgredir a pessoa do condenado), a inadmissibilidade da
tortura para o
interrogatrio e extino das ordlias, entre outros postulados como
o princpio da
igualdade, o princpio da humanidade, o princpio da
proporcionalidade, o princpio da
anterioridade penal, etc.
Tais idias permearam as obras de vrios autores da primeira
metade do sculo
XIX, os quais foram reunidos sob a denominao de Escola Clssica,
que buscou
sistematizar as idias do Iluminismo atravs da razo. O grande
representante dessa fase
foi Carrara, para o qual o estudo do criminoso era focado em sua
correo e recuperao e
o crime era visto como uma fora fsica e uma fora moral,
correspondendo atualmente ao
elemento objetivo e ao elemento subjetivo do crime. Assim, a
pena deveria existir apenas
enquanto necessria para a recuperao do delinqente.
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Com a descoberta da Amrica, em 1492, por Cristvo Colombo,
iniciou-se
um contato inimaginvel com outras civilizaes, at ento
desconhecidas. Os
espanhis e portugueses no reconheceram a condio de sujeito de
direito dos ndios
e realizaram inmeras aes destinadas ao genocdio, tanto fsico
quanto cultural,
dessa populao.
Pode-se afirmar, ainda, que colonizou-se o esprito dos ndios
atravs da
introduo da religio europia. Houve uma interferncia direta na
sexualidade deste
povo, com a dominao da ndia e o respeito puramente aparente pela
mulher europia;
nasceu, ento, o bastardo o mestio, filho do colonizador com a
ndia, e o crioulo (o
branco nascido no mundo colonial) (WOLKMER, 2003, p.
291-292).
Apesar da existncia de diversas tribos em diferentes estgios de
evoluo,
em nenhuma delas era possvel encontrar um sistema penal
organizado, estando suas
idias ligadas ao direito costumeiro e encontrando abrigo na
vingana privada,
vingana coletiva e na Pena de Tailo.
At o ano de 1512 vigorara as Ordenaes Afonsinas e as Manuelinas
at
1569, sendo substitudas pelo Cdigo de D. Sebastio em 1603.
Posteriormente
passou a ser aplicada as Ordenaes Filipinas, que refletiam o
direito penal dos tempos
medievais, com penas severas e cruis.
Proclamada a Independncia do Brasil, em 1822, houve necessidade
de
reestruturao legislativa; todavia, o Cdigo Criminal do Imprio
somente foi
sancionado em 1830. De ndole liberal, mas adaptado a pratica
escravocrata vigente,
este fixava um esboo de individualizao da pena, previa a
existncia de atenuantes e
agravantes e estabelecia um julgamento especial para pessoas
menores de 14 anos; a
pena de morte, ainda, passou a ser utilizada apenas para crimes
cometidos por
escravos. Todavia, deve-se ressaltar que a lei era antinmica,
vez que a sociedade de
baixo nvel de conscincia jurdica, patrimonialista e escravocrata
e a natureza liberal
das leis confrontava-se, existindo na prtica normas liberais
para os homens livres e
outras feitas para o elemento servil.
Em 01 de janeiro de 1942 entrou em vigor o Cdigo Penal
(Decreto-lei n. 2848,
de 07.12.1940), originado projeto de Alcntara Machado e revisado
por Nelson
Hungria, Roberto Lyra, Narclio de Queiroz e Vieira Braga, o qual
continua sendo a
legislao penal fundamental do Brasil. uma legislao ecltica,
recebendo os
postulados da Escola Clssica e Positiva e baseando-se no que
havia de melhor nas
legislaes modernas liberais, principalmente nos Cdigos italiano
e suo. Rigoroso,
rgido, autoritrio no seu cunho ideolgico, possuindo como
princpios bsicos: a
adoo do dualismo culpabilidade-pena e periculosidade; a adoo de
medida de
segurana; a considerao a respeito da personalidade do criminoso;
aceitao
excepcional da responsabilidade objetiva.
Com a abertura poltica iniciada a partir de 1979 fez-se uma
reforma
legislativa, alterando-se a parte geral do Cdigo Penal e
apresentando uma viso em
conformidade com os Direitos Humanos. Adotaram-se novas medidas
penais para os
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crimes de pequena relevncia, objetivando evitar o encarceramento
de seus autores
por um curto lapso temporal e enfatizando a culpabilidade como
indispensvel
responsabilidade penal. Erradicaram-se as medidas de segurana e
eliminou-se a
possibilidade de perpetuao da pena, ao estabelecer o limite
mximo de 30 anos.
Retomou-se a pena de multa e deu-se ao juiz a possibilidade de
aplicao de penas
mais elevadas aos crimes cometidos com violncia ou ameaa como
tentativa de
resposta ao progressivo aumento da violncia urbana e da
criminalidade em geral.
1.1 TRATAMENTO DISPENSADO AOS DELITOS SEXUAIS
A definio de crime sexual, no decorrer da histria, foi sempre
pautada em
dois pressupostos bsicos: a desigualdade entre os sexos e o
controle da sexualidade
feminina pelas instituies do casamento e da famlia.
Era notria a preocupao das legislaes em punir a sodomia
correspondente, s vezes, apenas s relaes homossexuais e o
estupro, no sentido
genrico de posse sexual de mulheres mediante seduo ou violncia
(FAUSTO, 2001,
p. 194-195). O Livro V do Cdigo Filipino, lei portuguesa
aplicada tambm no Brasil, previa
a pena de morte na fogueira para os acusados (as) destas
prticas, que ainda teriam os
bens confiscados e os descendentes considerados inbeis e
infames. Tal pena estendia-
se queles que dormissem fora com mulher, mas sem a cominao das
penas
acessrias; caso a vtima fosse prostituta ou escrava a execuo da
pena ficaria ao arbtrio
do rei, o que denota a variao da aplicao da lei em relao classe
social.
Com a reforma liberal do sculo XVIII iniciou-se a tendncia a
no-
criminalizao das prticas homossexuais, pois estas passaram a ser
consideradas
condutas desviantes por pesquisas mdicas, que as atriburam
causas fisiolgicas;
porm, a discriminao continuou.
No Brasil, o Cdigo Criminal do Imprio no puniu o
homossexualismo, mas o
considerou crime de atentado ao pudor. O Cdigo Penal de 1890
trouxe tipificao para
o crime de atentado violento ao pudor, defloramento e estupro o
atentado violento ao
pudor abrangia todo tipo de relao sexual no consentida, com
exceo das relaes
normais, ou seja, coito vaginal (FAUSTO, 2001, p. 194-195).
Assim, alguns
doutrinadores afirmavam que o marido no poderia ser ru no crime
de estupro, vez que
a prestao sexual normal era um dos deveres do casamento somente
poderiam ser
sujeito ativo do crime de atentado violento ao pudor.
Por muito tempo, em virtude do reflexo do desuso da legislao
penal como
instrumento garantidor da estabilidade da famlia, em conseqncia
da mudana dos
padres de relacionamento afetivo, o Cdigo Penal trouxe os crimes
sexuais com o
rtulo de crimes contra os costumes. Em recente mudana, com a Lei
n. 12.015,
publicada em 10 de agosto de 2009, a denominao foi alterada para
crimes contra a
dignidade sexual, denotando maiores evolues nesta seara.
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notrio que os delitos sexuais possuem, como uma de suas
caractersticas,
a disparidade evidente entre a criminalidade real e a
criminalidade apurada, o que
conseqncia de inmeros fatores dentre os quais se cita a
resignao, as
composies entre as partes (oscilantes entre a indenizao em
dinheiro e o
casamento), o desejo da vtima de evitar exposio pblica, etc.,
gerando o que a
doutrina denomina de cifra negra.
2 CONCEITO E CARACTERSTICAS DAS PENAS
A pena a mais importante das conseqncias jurdicas do delito. a
sano
imposta pelo Estado quele sujeito que transgrediu a norma penal
positivada. Consiste
na privao ou restrio de bens jurdicos, com lastro na lei,
imposta pelos rgos
jurisdicionais competentes ao agente de uma infrao penal (PRADO,
2006, p. 524).
As penas, para que possam atingir o seu objetivo legal, devem
ser dotadas de
certas caractersticas, quais sejam, a legalidade (art. 5, inciso
XXXIX, CF a pena deve
ser regulamentada por lei prvia), a pessoalidade (art. 5, inciso
XLV, CF nenhuma
pena passar da pessoa do condenado), a proporcionalidade (cada
crime deve ser
reprimido considerando o mal por ele causado), a
inderrogabilidade (praticado o crime,
a imposio da pena deve ser certa e a pena cumprida) e a
humanidade.
Nesse contexto deve-se salientar o princpio da humanidade ante a
vedao
de aplicao de penas insensveis e dolorosas, o que ocorre no
artigo 5, inciso XLVII,
da Constituio Federal, com o intuito de respeitar a integridade
fsica e moral do
condenado (artigo 5, inciso XLIX, Constituio Federal).
A finalidade da pena , essencialmente, a retribuio, ou seja, a
compensao
do mal causado pela conduta delituosa e a preveno de novos
crimes. Tambm, busca
promover a readaptao social do delinqente. O transgressor da
norma penal punido
por ter praticado um ato tpico, antijurdico e culpvel, tendo
como conseqncia a
imposio da pena criminal.
Existem, ainda, os fins preventivos da pena, os quais so
divididos em gerais e
especiais. A preveno geral tida considerando o efeito
intimidatrio que a pena
capaz de produzir, inibindo a realizao de condutas delituosas
pelos cidados em
geral, em virtude do medo de sofrer a aplicao de uma sano penal
como efeito pela
transgresso da norma. Por seu turno a preveno especial pode ser
entendida como a
atuao da pena sobre a pessoa do delinqente, com o intuito de
evitar que este volte a
delinqir no futuro.
imperioso ressaltar que a pena deve ser tida como a ultima ratio
do sistema, ou
seja, o direito penal deve possuir um carter subsidirio,
protegendo os bens de maior
valor. No Brasil so aplicadas, atualmente, as penas pecunirias,
restritivas de direito e
privativas de liberdade, conforme determina o artigo 32 do Cdigo
Penal Brasileiro.
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Penas pecunirias so aquelas que acarretam a diminuio ou a
perda
completa do patrimnio do condenado, sendo dividida em duas
modalidades: a multa
(pagamento de determinada importncia ao autor da infrao penal) e
o confisco (perda
de bens do criminoso). Em linhas gerais, a multa tem figurado
como substitutivo das
penas privativas de liberdade de curta durao e aplicada, tambm,
em conjunto com
a pena privativa de liberdade.
As penas restritivas de direitos tm o intuito de retirar ou
diminuir os direitos do
infrator, sem abstra-lo do convvio social; funciona como
alternativas de punio s
rupturas das normas de conduta social. O artigo 43 do Cdigo
Penal vigente as
enumera; todavia, para sua aplicao faz-se necessrio a presena de
determinados
pressupostos objetivos e subjetivos, os quais esto elencados no
artigo 44 da referida
Lei. Por sua vez, o artigo 92, tambm do Cdigo Penal estabelece
tambm algumas
restries ante a condenao por determinados crimes, quais sejam, a
perda de cargo,
funo pblica ou mandato eletivo, a incapacidade para o exerccio
do ptrio poder, a
tutela ou curatela e a inabilitao para dirigir veculo.
Modernamente a pena mais utilizada a privativa de liberdade, a
qual afeta
diretamente o direito de locomoo do condenado. Pode ensejar a
completa privao
de liberdade atravs do enclausuramento do sujeito em um
estabelecimento penal
(PRADO, 2006, p. 541) ou, ento, simplesmente na limitao do jus
libertatis,
constrangendo o ru a permanecer em determinado lugar (esta
modalidade no est
prevista no Cdigo Penal em vigor).
Para a aplicao da pena o Brasil adota, com algumas modificaes,
o
Sistema Progressivo, o qual leva em considerao o comportamento e
aproveitamento
do preso durante o cumprimento da pena. O sentenciado, assim,
poder melhorar
gradativamente sua condio atravs da boa conduta e do trabalho,
desde que cumpra
certos requisitos impostos pela Lei de Execuo Penal (Lei
7.210/84): cumprimento de,
pelo menos, um sexto da pena no regime anterior, com deciso
motivada pela
progresso do regime, bem como prvia manifestao do Ministrio
Pblico e do
defensor.
2.1 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE: SER ELA EFICAZ?
indiscutvel que, diante da prtica de conduta que transgride a
norma, faz-se
necessria a aplicao de uma punio de forma eficaz e exemplar.
Ainda, esta deve
servir de advertncia (para que a pessoa tenha conscincia de sua
existncia e a evite),
acontecer prxima do fato gerador, permitir que aquele que a
receba compreenda os
motivos porque a est recebendo e, tambm, possibilitar a
discriminao das aes
que ensejam punio.
A privao de liberdade comumente cumprida nas instituies de
excluso
(penitencirias). Nessas edificaes de caractersticas peculiares
criam-se certos
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estigmas; unem-se indivduos das mais variadas culturas e classes
sociais em um local
onde a vida coletiva uma constante. Ocorre, assim, um fenmeno
denominado
prisionizao, com profundas modificaes na carreira moral e nas
crenas relativas a
si mesmo, vez que h a adoo, em maior ou menor grau, do modo de
pensar, dos
costumes, dos hbitos da cultura geral da penitenciria (THOMPSON,
1980, p. 23).
Cria-se um organismo prprio, com uma legislao que vai alm da
fronteira dos
sistemas legalizados.
Somadas s mudanas que ocorrem com a forma de falar, de vestir e
de se
comportar do sujeito incluso no sistema penal, h a perda da
capacidade de adquirir
hbitos que so freqentemente exigidos da sociedade em geral, o
que se torna um
grande bice para a ressocializao. Esta segregao, adicionada ao
contato com
inmeros delinqentes que h anos eivam na carreira criminosa,
embrutecidos pelo
sistema e sobre os quais a pena de priso incapaz de produzir
efeitos positivos, so
fatores determinantes para que o interno desenvolva ainda mais a
sua tendncia
criminosa, impossibilitando a recuperao e aumentando os ndices
de reincidncia.
Cria-se, dentro da priso, uma sociedade que est margem do
que
concebemos como aceitvel. H uma tentativa de fazer sociais os
que, de forma
simplista, chamamos de anti-sociais estes so dissociados da
comunidade livre e, ao
mesmo tempo, associados a outros anti-sociais (BITENCOURT, 1993,
p. 59), o que
acaba por deflagrar um antagonismo. Em virtude das condies
materiais e humanas,
na maior parte das prises do mundo o objetivo ressocializador
torna-se inatingvel.
Assim, pode-se afirmar, categoricamente, que o sistema prisional
est cada
vez mais fadado ao fracasso; isto se justifica, principalmente,
pela inverso de valores
que ocorre no ntimo do apenado a partir da sua segregao no
ambiente carcerrio e,
muitas vezes, pela inabilidade de lidar com as mudanas que
ocorrem no ambiente
social aps o cumprimento da pena o que, aliado estigmatizao, o
afasta das portas
do trabalho formal, podendo conduzi-lo novamente s trincheiras
do crime.
Ainda, existe um agravante. Dentro do sistema carcerrio h um
Cdigo de
Honra prprio, com valores morais e crimes inaceitveis como, por
exemplo, o estupro,
cujos autores sofrem as mais srdidas retaliaes dos prprios
presos tais sujeitos
so violentamente agredidos dentro da priso, muitas vezes com
requintes de
crueldade. Em grande parte das vezes as agresses no so
prevenidas e tampouco
evitadas pelas autoridades carcerrias.
Via de regra, os estupradores deveriam ser segregadas dentro das
prises
para que tais agresses fossem evitadas; todavia, por causa da
superlotao das
instituies prisionais, normalmente isto no possvel. Deve-se
salientar, tambm,
que o dio que os presos nutrem pelos estupradores compartilhado,
em muitos casos,
pelos funcionrios da penitenciria, os quais acabam por ignorar
essa violncia (seja
por um critrio subjetivo, seja para no se indispor com o poder
da massa carcerria).
Ante o exposto pode-se afirmar que a estrutura real de uma
instituio
carcerria no contribui para a ressocializao do recluso; ao
contrrio, ao invs de
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convenc-lo da necessidade de uma vida dentro dos ditames da lei,
afastando-o do
crime e introduzindo valores fundamentais da sociedade, acaba
por fortalecer as
tendncias criminosas do indivduo. Todavia, em que pese as
irregularidades
identificadas no sistema prisional, o presidirio sempre deve ser
encarado como um
sujeito suscetvel de recuperao, independente de quo incompatvel
o seu
temperamento possa se demonstrar em relao a este propsito ou quo
chocante
tenha sido o seu crime.
Faz-se necessrio, assim, que as inclinaes criminosas que
persistem no
sujeito sejam suprimidas atravs de estmulos benficos ou pela
eliminao de
estmulos que possam conduzi-lo criminalidade. Para tanto, o
reeducando deve ser
inserido em novos contextos, sendo lhe indicado caminhos e
perspectivas saudveis
de condutas, condizentes com o disposto no ordenamento
jurdico.
Todavia, esta teraputica criminal s ser concretizada se,
previamente,
houver exame psicolgico e mental do criminoso, com o intuito de
individualizar a
execuo criminal s assim lograr-se- xito com o tratamento.
3 A POSSIBILIDADE DA INSERO DA CASTRAO QUMICA NO DIREITO
PENAL BRASILEIRO
Nos ltimos tempos a sociedade, tanto no mbito nacional
quanto
internacional, tem se deparado com inmeros crimes contra a
liberdade sexual,
2
principalmente queles relacionados a crianas e adolescentes , o
que propiciou
extensas discusses entre mdicos e juristas sobre a possibilidade
de aplicao de
medidas que pudessem solucionar de fato o problema, agindo na
causa da
criminalidade.
Recentes pesquisas concluram que as causas dos impulsos
sexuais
transviados podem ser inmeras, carecendo de anlises
criminolgicas apuradas para
diferenci-las e, assim, trat-las de forma adequada. Um dos
tratamentos atualmente
em voga denomina-se castrao qumica.
A castrao uma prtica bastante antiga, onde o indivduo privado de
seus
rgos reprodutores. Utilizando-se do mtodo tradicional para
conter impulsos sexuais
compulsivos, tentou-se a remoo cirrgica dos testculos, rgos
responsveis por
95% da testosterona produzida naturalmente pelo corpo. Todavia,
tal mtodo seria
extremamente invasivo e irreversvel, acarretando inmeros efeitos
colaterais, bem
como um flagelo corporal.
2
Deve-se enfatizar que a principal agresso a crianas e
adolescentes denominada pedofilia, um tipo de
parafilia anteriormente caracterizada neste trabalho.
Entretanto, resta-nos ressaltar, mais uma vez, que a
pedofilia no tida como crime por si s uma doena que pode ensejar
crimes tipificados no nosso
ordenamento jurdico, tendo entre eles, como mais emblemtico, o
estupro contra vulnervel (artigo 217-A,
Cdigo Penal). No podemos afirmar, via de regra, que todo pedfilo
criminoso.
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Visando conter os avanos do cncer de prstata surgiu a castrao
qumica
que, posteriormente, passou a ser utilizada como bice ao
comportamento de pessoas
envolvidas em crimes sexuais. A primeira proposta de castrao
qumica surgiu nos
Estados Unidos atravs da injeo de uma substncia destruidora das
vlvulas que
controlam a entrada e sada de sangue nos corpos cavernosos do
pnis, impedindo sua
ereo. Porm, tal mtodo, considerado irreversvel, acabaria por
inutilizar o sistema
reprodutor masculino de forma perene.
Posteriormente, aps inmeras pesquisas, chegou-se ao mtodo
mais
comumente utilizado, qual seja, a administrao de repetidas doses
de acetato de
3
medroxiprogesterona , de forma oral ou injetvel. Este
medicamento atua na glndula
hipfise, situada no crnio, sob a base inferior do crebro,
inibindo a produo de
testosterona e, conseqentemente, diminuindo a libido e tornando
falha a irrigao do
pnis, frustrando a ereo. No causa conseqncias definitivas e
irreversveis.
Mesmo diante de tantas reaes adversas, os defensores dessa
prtica
exibem estatsticas positivas os ndices de reincidncia passaram
de 70% (com
relao aos indivduos que ficaram apenas encarcerados) para 5%
dentre aqueles que
foram submetidos ao tratamento (AZEVEDO, 2007, p. 104-105).
Os pesquisadores argumentam que, principalmente para os sujeitos
presos
em virtude de condenao por delitos sexuais, apenas a restrio da
liberdade no
soluciona evita a reincidncia vez que os criminosos normalmente
usam o tempo em
que ficam reclusos para preparar fantasias sexuais ilcitas e
imorais e maneiras mais
eficazes de pratic-las sem a interferncia policial.
Dessa forma, pode-se afirmar que a priso aumentaria as
tendncias
agressivas em criminosos sexuais enquanto que a castrao qumica
seria dirigida
raiz da causa do desvio sexual compulsivo.
A administrao da mediao de forma regular fundamental para o xito
do
tratamento. Apesar dos benefcios, esta prtica pode acarretar
aumento de peso, mal-
estar, hipertenso, trombolismo, fadiga, hipoglicemia,
ginecomastia, atrofia da genitlia
masculina, cncer eptico e depresso.
Para que a pena seja individualizada de forma correta em sua
execuo faz-se
imperioso a realizao de um exame criminolgico meticuloso no
condenado, com o
intuito de diagnosticar as causas do comportamento e, assim,
aplicar a medida cabvel.
Deve-se considerar, entretanto, que nem todo sujeito portador de
parafilia
(doenas capazes de fazer com que o indivduo tenha um
comportamento sexual
atpico) ser um criminoso; muitas vezes, esta pessoa consegue
controlar seus
impulsos sexuais, no transgredindo a norma penal. Por sua vez, a
premissa contrria
tambm verdadeira: nem todo sujeito que pratica um crime sexual
portador de
parafilia, pois o comportamento criminoso pode ser resultado da
conjugao de
inmeros outros fatores na verdade, em sua maioria as parafilias
no so
3
Tal substncia o princpio ativo do medicamento Depo-Provera, o
mais utilizado para este fim.
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comportamentos criminosos. Diante dos dados obtidos em pesquisas
constatou-se que
a melhor abordagem teraputica aquela realizada com a associao de
programas
comunitrios de tratamento, psicoterapia e interao
medicamentosa.
3.1 REGULAMENTAO E USO DA CASTRAO QUMICA
A castrao qumica como forma de penalidade legalmente permitida
em
legislaes aliengenas. Alguns Estados americanos, como a
Califrnia, Gergia,
Flrida, Texas, Lousiana e Montana utilizam a castrao qumica como
requisito prvio
para a concesso da liberdade condicional aos criminosos sexuais;
aos delinqentes
primrios, facultada a escolha de submeter-se a este mtodo
medicamentoso ou
castrao permanente por meio de interveno cirrgica, enquanto os
criminosos
reincidentes esto obrigados a submeter-se ao segundo
procedimento. No Estado da
Flrida necessrio prvio aconselhamento mdico para que o
tratamento seja aderido
a interrupo do tratamento implica em violao da condicional,
constituindo novo delito.
Em pases como Argentina, Colmbia, Chile e Mxico existe o debate
sobre a
possibilidade da insero de tal procedimento no ordenamento
jurdico, estendendo a
possibilidade aos sacerdotes, diante da grande incidncia destes
em delitos de pedofilia.
Na Gr-Bretanha instituiu-se a castrao qumica voluntria destinada
a um
pequeno grupo de agressores sexuais, combinando medicamentos de
efeito anti-
depressivo e anti-libido, objetivando diminuir a reincidncia. O
governo francs, por seu
turno, defende o reforo da castrao qumica como medida para
evitar a reincidncia
de criminosos sexuais e debate a possibilidade desta medida, j
prevista no
ordenamento jurdico, ser obrigatria, independente da manifestao
de vontade do
condenado.
Na Espanha o tema tambm objeto de debate. Na Polnia, o
parlamento
aprovou recentemente uma Lei que prev a castrao qumica, de forma
compulsria,
para condenados por crimes de estupro de menores de 15 anos e
incesto. No Brasil, a
castrao qumica apontada por alguns mdicos como alternativa de
tratamento para
aqueles indivduos que possuem distrbios sexuais.
Atualmente tramita no Senado Federal o Projeto de Lei n. 552 de
2007, de
autoria do Senador Gerson Camata, que objetiva-se acrescentar o
artigo 216-B ao
Cdigo Penal, com o intuito de cominar a pena de castrao qumica
quando o autor
dos crimes tipificados nos artigos 213, 214, 218 e 224 do
referido diploma legal for
diagnosticado como pedfilo, conforme o Cdigo Internacional de
Doenas. Assim, os
crimes referidos no tipo penal que justificariam a aplicao da
pena de castrao
qumica seriam os de estupro, atentado violento ao pudor
(revogado pela Lei n.
12.015/09), corrupo de menores e a presuno de violncia nesses
crimes
(dispositivo igualmente revogado pela Lei n. 12.015/09).
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Neste novo Projeto de Lei preocupou-se em estabelecer a idade da
vtima para
a configurao do delito; ainda deu-se a facultatividade ao
procedimento de castrao,
com reduo de pena em um tero no caso de tratamento hormonal ou
na extino de
punibilidade caso a opo seja pela interveno cirrgica de efeitos
permanentes.
Ainda, esta redao determina o que castrao qumica e a diferencia
da castrao
cirrgica, o que no ocorria anteriormente.
Tal Projeto de Lei tem causado inmeros debates alguns
estudiosos
defendem sua inconstitucionalidade, pois este vai de encontro o
princpio da dignidade
da pessoa humana, salvaguardado na Constituio Federal de
1988.
3.2 PRINCPIO CONSTITUCIONAL: DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Direitos fundamentais so aqueles valores bsicos norteadores da
vida em
sociedade so intimamente ligados com a idia de dignidade da
pessoa humana e
limitao do poder e esto inseridos na Constituio Federal
possuindo, assim,
supremacia formal e material.
No Brasil os direitos fundamentais so normas de aplicao imediata
(art. 5,
2, CF); no podem ser abolidas nem mesmo por meio de Emenda
Constitucional
sendo, portanto, considerados clusulas ptreas (art. 60, 4, IV),
sendo o pice de
toda a legislao ptria.
O sistema de valores constitudo por estes direitos afeta a
interpretao de
qualquer norma jurdica, cuja base axiolgica a dignidade da
pessoa humana, valor
bsico e um dos fundamentos do Estado Democrtico de Direito,
consolidada no direito
ptrio pelo artigo 1 da Constituio Federal.
A dignidade da pessoa humana, como direito fundamental,
manifesta-se na
autodeterminao consciente e responsvel da prpria vida (MORAES,
2007).
Dispe, assim, sobre quais as mnimas determinaes que devero
constar em um
estatuto jurdico, nunca menosprezando a estima que merece cada
ser humano como
sujeito mpar de direitos e obrigaes.
Este postulado critrio para o estabelecimento dos fins tutelveis
pelo Direito
Penal, bem como para a limitao dos meios que podero ser
empregados. Com
relao ao objeto tutelado, apenas queles que se refiram pessoa
merecem proteo.
Em sentido contrrio, parte da doutrina moderna tem primado pela
relativizao da
dignidade da pessoa humana, defendendo a pulverizao deste
princpio em relao a
todos outros, devendo ser observado o princpio da convivncia das
liberdades.
Outro princpio decorrente da dignidade da pessoa humana o da
humanidade das penas, que probe as penas cruis ou degradantes e
as de carter
perptuo. Tal princpio probe penas que violem a vida em seu
ncleo, bem como a
integridade fsica e psquica do indivduo, a autonomia e a
igualdade, com o intuito de
subjugar a pessoa. Com relao limitao da liberdade, o referido
princpio determina
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que sua restrio deve ser apenas com relao a liberdade de
locomoo, devendo ser
respeitada a liberdade de pensamento, de crena, de ensino e
outras.
Neste contexto, categrica a afirmao de grandes nomes do
direito
4
brasileiro (AZEVEDO, 2007, p. 104-105): qualquer projeto de lei
objetivando inserir a
castrao qumica como pena no Brasil inconstitucional. Tal
assertiva baseada na
possibilidade deste procedimento acarretar a impotncia sexual no
indivduo,
impedindo-lhe de procriar.
A Constituio Federal, em seu artigo 5, inciso XLIX, de maneira
enftica,
probe punio que se utiliza qualquer meio capaz de ofender a
integridade fsica e
moral do ser humano. Ainda, veda, em seu artigo 5, inciso XLVII,
e, a imposio de
penas cruis e determina, em seu artigo 5, inciso III, que ningum
ser submetido a
tortura nem a tratamento desumano ou degradante.
Deve-se mencionar que nos termos do artigo 22, inciso I, da
Constituio
Federal a competncia para legislar sobre o direito penal
exclusiva da Unio. Assim,
ainda que fosse admitida a aplicao da castrao qumica pela
legislao, isto deve
ser feito atravs de Lei Federal.
Ademais, a necessidade de incluso dessa pena por meio de
Emenda
Constitucional importaria em reconhecer, ainda que de forma
tcita, que se trata de uma
limitao ao direito individual, o que tornaria a Emenda
inconstitucional pela violao de
clusula ptrea (artigo 60, 4, IV, CF), a menos que a prpria norma
que tutele a
garantia ou o direito individual preveja a possibilidade de
limitao.
Dessa forma tem-se, a princpio, que a insero da castrao qumica
no
direito brasileiro como pena seria invivel. Porm, diante das
estatsticas colhidas nos
pases onde a castrao qumica utilizada, este procedimento deve
ser observado
como alternativa para a diminuio da reincidncia tambm no Brasil,
com o intuito de
proteger toda a sociedade.
O posicionamento da Comisso de Conciliao, Justia e Cidadania,
rgo do
Senado Federal responsvel pela anlise do Projeto de Lei n.
552/2007 defende,
todavia, a castrao qumica como forma de penalidade, a ser
inserida no Cdigo Penal
e em adequao com o princpio da proporcionalidade, considerando-o
constitucional.
Ainda que esta tese da constitucionalidade total da medida no
seja aceita pela
maioria da doutrina vigente, notrio que, caso a castrao qumica
fosse introduzida no
direito ptrio como forma de benefcio penal aos sujeitos que
praticaram crimes contra a
liberdade sexual (desde que constatada que a causa de tal
comportamento tenha origem
patolgica, atravs de meticuloso exame criminolgico), com adeso
voluntria do
indivduo, sua inconstitucionalidade afastada, pois os direitos e
garantias fundamentais
no so ilimitados, vez que encontram limites nos demais direitos
igualmente
4
Desta posio compartilham o advogado Alberto Wunderlich,
coordenador do Observatrio de Violncia da
Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e Srgio Salomo Shecaira,
ex-presidente do Conselho Nacional de
Poltica Criminal e Penitenciria e ex-presidente do Instituto
Brasileiro de Cincias Criminais (IBCCrim).
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consagrados pela Carta Magna. Assim, tem-se que a castrao
qumica, na medida em
que diminui os ndices de reincidncia criminal, traz benefcios
sociedade, os quais so
maiores e mais relevantes do que os malefcios causados ao
sujeito na sua esfera
individual, obtendo-se uma harmonizao entre os bens jurdicos em
conflito.
Dando outro enfoque para este mesmo tema, numa abordagem
considerando
os preceitos da biotica, nos deparamos com uma discusso antiga
acerca da
disposio do prprio corpo quando este considerado so.
Invocando-se o princpio
5
da beneficncia , pode-se afirmar que determinadas intervenes
desta natureza so
possveis quando comprovado os benefcios ao paciente. Ainda, o
direito de disposio
sobre o prprio corpo, com o intuito de tratamentos mdicos,
permitido
expressamente pelo artigo 13 do Cdigo Civil. Com a castrao
qumica busca-se o
direito a um equilbrio psicofsico, ou seja, direito a uma vida
saudvel; assim, a
submisso voluntria a tratamentos mdicos no pode ser negada aos
cidados num
Estado Democrtico de Direito.
Ainda, no se deve fazer juzo de valor pessoal sobre a castrao
qumica,
questionando se o procedimento moral ou amoral; um comportamento
tido como
amoral na atualidade pode se tornar um comportamento
juridicamente aceito mais
tarde, em virtude do desenvolvimento da prpria organizao
social.
Ante o exposto, a dignidade da pessoa humana deve ser tutelada
com
observncia ao respeito autonomia de vontade; assim, deve ser
tida como uma forma
de autodeterminao consciente e responsvel da prpria vida pelo
ser humano,
sujeito de direitos e obrigaes, e no como uma disposio
constitucional absoluta e
intransponvel, que no possa sofrer restries, de forma ponderada,
considerando as
peculiaridades do caso concreto.
4 CONCLUSO
A violncia sexual pode ser considerada uma das violaes mais
severas a
qual um indivduo pode ser sujeitado, gerando implicaes tanto em
sua esfera pessoal
(dificuldades de ajustamento em relacionamentos, perda de
motivao e insatisfao
sexual, transtornos psquicos, dentre outros, de difcil
recuperao, alm de
conseqncias do ato em si prprio, como uma gravidez indesejada ou
doenas
sexualmente transmissveis) quanto na social (dificuldades para
receber e expressar
sentimentos e emoes, com a conseqente adoo de um comportamento
evitativo e
de comportamentos sociais inadequados e at mesmo perversos,
gerando a
incapacidade de conviver em grupo). Tambm, o ciclo
vtima-agressor poder culminar
em aumento na criminalidade futura, gerando novos
agressores.
5
O princpio da beneficncia corolrio da medicina hipocrtica e
preceitua o dever de buscar o bem estar do
paciente e a tutela de seus interesses.
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Em virtude dessas inmeras conseqncias e do nmero nefasto de
crimes
dessa natureza que vm assolando a sociedade e pela facilidade de
comunicao entre
os adeptos dessas condutas (com ressalva ao grande nmero de
delitos divulgados
pela internet que incluem, muitas vezes, atos com requintes de
crueldade), faz-se
necessria especial ateno, pois as penalidades habituais
raramente geram
resultados positivos para essa classe de criminosos.
Conforme anlise realizada no presente trabalho monogrfico, as
causas do
comportamento sexual transviado e que transgride as normas
morais, socialmente e
juridicamente aceitveis podem ter inmeras origens, as quais
perpassam desde
fatores biolgicos a fatores psicolgicos e sociolgicos. Na
maioria das vezes, ainda,
tem-se que o comportamento resultante da conjugao de mltiplos
fatores.
As penas previstas na legislao atual para os crimes contra a
dignidade
sexual no obtm resultados satisfatrios, o que pode ser
constatado pelos altos
ndices de reincidncia. A pena privativa de liberdade, assim,
acaba por realizar um
efeito contrrio ao seu fim: ao invs de promover a ressocializao
do preso, causa-lhe
o fenmeno denominado prisionizao, com reforo de suas tendncias
criminosas.
Assim, o indivduo devolvido sociedade, na maior parte das vezes,
em condies de
periculosidade ainda maiores do que as que ele possua quando foi
segregado,
aumentando, dessa forma, os ndices de reincidncia.
A castrao qumica, como forma alternativa de apenamento de
tais
delinqentes, tem sido aplicada com bastante xito nos pases que a
adotaram.
Todavia, para que ela produza resultados satisfatrios, faz-se
necessrio um exame
criminolgico acurado do delinqente, realizado por perito
capacitado, com o intuito de
diagnosticar a origem do impulso criminoso. Com estes dados
conclusivos em mos
ser constatado qual o tratamento adequado, vez que cada ser
humano um sujeito
nico, dotados de caractersticas peculiares.
No ordenamento jurdico brasileiro a castrao qumica encontra
algumas
barreiras para sua implementao, pois o pas possui albergado em
sua Constituio
Federal princpios de defesa da dignidade humana, com a vedao da
tortura e de
penas capazes de ofender a integridade fsica e moral do apenado,
o que considerado
um direito indisponvel dos indivduos. Todavia, o que se
constata, de fato, nas
penitencirias superlotadas, uma real afronta a tais garantias
constitucionais.
O procedimento da castrao qumica, dessa forma, a priori no
poderia ser
aplicado, no Brasil, com o status de pena, em virtude das vedaes
constitucionais
expressas. Todavia, poderia ser tido como um benefcio penal
queles que,
voluntariamente, entendessem o contexto patolgico que culminou
no comportamento
criminoso e aderissem, dessa forma, prtica mencionada. Em
virtude da possibilidade
de reverso, no poderiam ser considerados uma violncia a
integridade fsica de tais
indivduos e nem um retrocesso s penas corporais, largamente
utilizadas durante a
histria. Em nenhum momento esta submisso voluntria ao
tratamento, com
conseqente incentivo pela reduo da pena poderia ser visto como
algo cruel, ou
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eivado de qualquer afronta ao princpio da proporcionalidade das
penas.
Para a obteno de xito com o tratamento, a aplicao da castrao
qumica
dever ser realizada em estabelecimento prisional diferenciado e
que proteja os
criminosos de qualquer tipo de violncia fsica ou psquica, em
conjunto com o
tratamento psicolgico. A interao medicamentosa dever ser
realizada com cautela,
somente em casos estritamente necessrios, conjugando
medicamentos para a
conteno da libido e para o tratamento de transtornos
psicolgicos, se houverem.
Por bvio, para a implementao de tais polticas far-se-
necessrio
investimento Estatal; todavia, os custos no sero to altos se
comparados com os
benefcios auferidos: com a diminuio da reincidncia, diminuem-se
os gastos com
medidas preventivas criminalidade e h a conseqente diminuio da
populao
carcerria. Tambm, pode-se estabelecer um critrio de renda para
que os particulares
colaborem com a manuteno do sistema de tratamento, fornecendo
auxlio financeiro
para os gastos que tero o sujeito submetido a essa pena.
Alm disso, gastos com o sistema prisional sero necessrios em
breve, bem
como novas estratgias de aplicao das penas, objetivando a
ressocializao dos
condenados, diante do sucateamento atual do referido sistema.
Isto posto, pode-se
afirmar que o nus estatal no ser elevado se comparado com o bnus
para a
sociedade.
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Recebido em: Agosto/2010
Aceito em: Dezembro/2010
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Eloise Trevisan Padial