CASO CLÍNICO Febre Reumática Internato – ESCS/HRAS Orientadora: Dra. Sueli Falcão Apresentação: Camila Venturim e Laura Haydée Coordenação: Sueli R. Facão www.paulomargotto.com.br Brasília, 28 de fevereiro de 2012
CASO CLÍNICOFebre Reumática
Internato – ESCS/HRASOrientadora: Dra. Sueli Falcão
Apresentação: Camila Venturim e Laura Haydée
Coordenação: Sueli R. Facãowww.paulomargotto.com.br
Brasília, 28 de fevereiro de 2012
CASO CLÍNICO• Identificação: F.A.S., 13 anos,
70 kg, sexo masculino, pardo, natural de Brasília, residente em Candangolândia.
• Q.P: “Febre e dor nos joelhos há 1 semana”.
CASO CLÍNICO• H.D.A: Há 3 anos a mãe relata que a
criança iniciou quadro de febre intermitente (40ºC) que melhorava com Paracetamol, associada a dor nos joelhos, constante, de intensidade moderada, sendo maior em joelho D, com piora progressiva e sem sinais flogísticos locais. Nega fator de melhora e piora. Alguns dias depois, relatou dor em tornozelos com as mesmas características porém em menor intensidade.
CASO CLÍNICO• Permaneceu febril e com dores
articulares por 1 semana, sendo então levado ao P.S do HRAS onde foi iniciado antibioticoterapia, recebendo alta no mesmo dia.
CASO CLÍNICO• A criança não obteve melhora do
quadro e a mãe relata que a trouxe por mais 2 vezes ao HRAS recebendo orientações e alta.
• A dor nos joelhos e tornozelos piorou, tornando-se incapacitante e a criança persistiu com febre. A mãe retornou ao hospital e a criança foi então internada e iniciado tratamento adequado.
CASO CLÍNICO• Fez uso de:• Penicilina Benzatina 1.200.000 UI;• AAS;• Prednisona 50mg + Calcium 500mg
12/12h (21/07/08); • Prednisona 60 mg (28/07/08);• Paracetamol SOS;• AINE SOS.
• Antecedentes Pessoais:• Nascido de PN, a termo, 3.400g,
sem intercorrências neonatais.• Desenvolvimento neuropsicomotor
normal.• Vacinação atualizada (sic).• Tem história de rinite e 1 episódio
de pneumonia sem necessidade de internação.
CASO CLÍNICO
• Aos 4 anos foi internado por 1 semana no HRS devido à celulite periorbitária
• Teve vários episódios de amigdalite bacteriana tratados com penicilina benzatina.
• Nega alergias, traumas, transfusões e cirurgias.
• Antecedentes Familiares: • Mãe, 29 anos, hígida. Pai hígido. Avô
cardiopata. • Nega outras doenças na família.
CASO CLÍNICO
• Hábitos de vida:• Reside em casa de alvenaria,
com 2 pessoas, sem animais.• Dieta hipossódica e hipolipídica.• Caminha 1km/dia em 13
minutos e refere cansaço leve.
CASO CLÍNICO
CASO CLÍNICO• Exame físico: • FC: 90bpm. FR: 19 irpm. • PA:110 x 40 x 0mmHg.• B.E.G., corado, hidratado, eupnéico
em decúbito dorsal, acianótico, anictérico, afebril.
• A.R: Boa expansibilidade, sem sinais de esforço respiratório. MVF s/ RA.
CASO CLÍNICO• A.C.V:Tórax simétrico, precórdio calmo, ictus
visível e palpável no 4º EIC, na linha hemiclavicular E, medindo 2 polpas digitais, ausência de frêmito, RCR, 2T, BNF com sopro diastólico ++/6+ em foco aórtico. Pulsos periféricos palpáveis, simétricos, em martelo d’água.
• ABD: Plano, RHA presentes, flácido, sem massas palpáveis ou VMG, indolor à palpação.
• EXT: Bem perfundidas, sem edemas.
07/07 12/07Glic 87
Uréia 19 24Creat 0,7 0,4
Ca 8,9 -Na 139 139K 3,8 3,8Cl 103 101
EXAMES COMPLEMENTARES
07/07 12/07Hb 11,1 10Ht 33,4 31,1
VCM 83,3 83,6Leu 16.400 17.500Seg 70 77Bast 07 02Linf 18 15
Mono 04 06Eos 01 00Plaq 205.000 287.000VHS 58 60
07/07 12/07 05/08 08/08PCR - 18,4 <
0,32<
0,32TGO 11 - - -TGP 08 - - -
CKMB 06 - - -α-Glic - - 110 103ASLO - - 958 863
EAS 07/07 12/07Dens 1.025 1.015pH 06 05Hb traços 0
Nitrito neg -Bilirrubina 0 0
Prot + 0Leuc raros rarosCED raros 3 p/cBact - -
EXAMES COMPLEMENTARES
• Radiografia Joelho D: Normal.• Radiografia de Tórax e SAF:
Normais.• C3: 197.• C4: 43,2.• FR: <10,9.• PPD: Não reativo.• Cintilografia cardíaca: Negativo para
cardite ativa.
FEBRE REUMÁTICA• Complicação não supurativa da
faringoamigdalite • Estreptococo beta-hemolítico
do grupo A (EBGA) • Resposta imune tardia em
populações geneticamente predispostas
Epidemiologia• Associada à pobreza e às más
condições de vida • Grande problema de saúde pública nos
países em desenvolvimento • Afeta crianças e adultos jovens: 5 a 18
anos • Cardite: sequela crônica, incapacitante,
em fases precoces da vida
• EBGA:15%-20% das faringoamigdalites e quase todas de origem bacteriana
• Obs: impetigo não está relacionado à FR
• Brasil:10 milhões de faringoamigdalites estreptocócicas por ano, 30.000 novos casos de FR, 15.000 podem evoluir com acometimento cardíaco
• Principal causa de cardiopatia adquirida nos países em desenvolvimento
• CRC (cardite reumática crônica): 1-7 casos/1.000 em algumas capitais brasileiras
Resposta imune• Anticorpos e linfócitos T
dirigidos contra antígenos estreptocócicos reconhecimento de estruturas do hospedeiro autoimunidade cardite grave, poliartrite e coreia de Sydenham
Cardite reumática -Anticorpos fixam-se à parede do
endotélio valvar aumento da expressão de VCAM I atração de quimiocinas e infiltração celular por neutrófilos, macrófagos e, principalmente, linfócitos T inflamação, destruição tecidual e necrose
• Nódulos de Aschoff: exercem a função de células apresentadoras de antígeno para as células T patognomônico para FR!
• Reação cruzada + apresentação continuada de antígenos no sítio da lesão amplificação da resposta imune e a ativação de clones autorreativos de linfócitos T
• Resposta celular (Th1) cardite grave e sequela valvar
• Resposta humoral (Th2) coreia e artrite
• A divisão dos critérios é baseada na especificidade da manifestação
• Outros sinais e sintomas: -epistaxe -dor abdominal -anorexia -fadiga -perda de peso -palidez
Artrite• Autolimitada e sem sequelas • Edema na articulação ou dor + limitação
de movimentos• Assimétrica e migratória• Afeta grandes articulações,
particularmente dos membros inferiores• Muito dolorosa, apesar de não mostrar
sinais inflamatórios intensos • Boa resposta aos AINEs
Coreia de Sydenham• Início insidioso labilidade emocional e
fraqueza muscular• Movimentos rápidos involuntários
incoordenados, que desaparecem durante o sono e são acentuados em situações de estresse e esforço
• Acometem músculos da face, lábios, pálpebras e língua e são, com frequência, generalizados
• Disartria e dificuldades na escrita podem ocorrer, além de tiques e transtorno obsessivo compulsivo
• Duração 2-3 meses
• OBS.: coreia como única manifestação ou acompanhada somente por artrite solicitar anticorpo antinúcleo para descartar a possibilidade de lúpus eritematoso sistêmico
Cardite• Sequelas e óbito • Presente em 40%-70% dos
primeiros surtos • Manifesta-se com pancardite • Lesões valvares determinam
quadro clínico e prognóstico
• Pericardite: -sempre associada à lesão valvar -presença de atrito e/ou derrame
pericárdico -abafamento de bulhas -dor ou desconforto precordial
• Miocardite-abafamento de B1-galope protodiastólico -cardiomegalia -insuficiência cardíaca congestiva
(lesão valvar)
• Endocardite:-marca diagnóstica da cardite-fase aguda:regurgitação mitral,
seguida pela aórtica-fase crônica: estenoses valvares
Classificação• Cardite subclínica: -exame cardiovascular normal-RX e ECG normais, com exceção do
intervalo PR -ecodoppler: regurgitação mitral e/ou
aórtica em grau leve • OBS: difícil diferenciação com
regurgitação fisiológica!
• Cardite leve: -taquicardia desproporcional à febre, -abafamento de B1-sopro sistólico mitral -área cardíaca normal -RX e ECG normais, com exceção do
intervalo PR-ecodoppler: regurgitações leves ou
moderadas, VE com dimensões normais
• Cardite moderada: -taquicardia persistente -sopro de regurgitação mitral mais
intenso, sem frêmito, associado ou não ao sopro aórtico diastólico
-sopro de Carey Coombs (mesodiastólico, foco mitral)
-sinais incipientes de IC: aumento da área cardíaca e congestão pulmonar
-ECG: extrassístoles, alterações de ST-T, baixa voltagem, prolongamento dos intervalos do PR e QT
-Ecodoppler: regurgitação mitral ou associada à aórtica e aumento das câmaras esquerdas (manifestações leve a moderadas)
• Cardite grave: -IC -arritmias, pericardite e sopros relacionados a
graus mais importantes de regurgitação mitral e/ou aórtica
-exame radiológico: cardiomegalia e sinais de congestão pulmonar significativos
-ECG: sobrecarga VE e, às vezes, VD-Ecodoppler: regurgitação mitral e/ou aórtica e
câmaras esquerdas aumentadas
Eritema marginatum • Bordas nítidas, centro
claro, contornos arredondados ou irregulares
• Lesões múltiplas, indolores, não pruriginosas, podendo haver fusão, resultando em aspecto serpiginoso
• Poupa a face
Nódulos subcutâneos • Múltiplos,
arredondados, de 0,5-2 cm, firmes, móveis, indolores e recobertos por pele normal, sem características inflamatórias
• Fortemente associados à cardite grave e regride com seu tratamento
Tratamento da febre reumática aguda
• Erradicar o EBGA • Suprimir o processo inflamatório• Minimizar as repercussões
clínicas sobre o coração, articulações e sistema nervoso central
• Promover o alívio dos principais sintomas
Medidas gerais• Hospitalização: (IIa-C) -cardite moderada ou grave -artrite incapacitante -coreia grave • Repouso: (IIa-C) -repouso relativo por 2 semanas-cardite moderada ou grave por 4 semanas • Controle da temperatura: -paracetamol -dipirona
• Erradicação do estreptococo Penicilina Benzatina
-reduzir a exposição antigênica -impedir a propagação de cepas
reumatogênicas na comunidade • Tratamento da artrite: -AAS (I-A) -Naproxeno
Tratamento da artrite• AAS: 80-100 mg/kg/dia, dividida em
4 tomadas e em adultos, 6-8 g/dia • Reduzir para 60 mg/kg/dia após 2
semanas de tratamento, caso tenha ocorrido melhora dos sinais e sintomas, devendo ser mantida por um período em torno de 4 semanas (I-A)
• Naproxeno: boa alternativa, sendo 10-20 mg/kg/dia, em 2 tomadas
Tratamento da cardite• Controle do processo inflamatório: -corticóide na cardite moderada e grave (I-B) -prednisona (1-2 mg/Kg/dia): dose plena 2-3
semanas, dependendo do controle clínico e laboratorial (PCR e VHS)
-reduzir 20%-25% da dose a cada semana-tratamento de 12 semanas na cardite
moderada e grave e de 4-8 na cardite leve
• Pulsoterapia: -metilprednisolona IV (30 mg/Kg/dia)
em ciclos semanais intercalados na cardite reumática grave refratária ou nos pacientes que necessitam de cirurgia cardíaca em caráter emergencial (I-C)
-primeira opção nos pacientes graves e com IC de difícil controle, ou que não tenham condições de receber corticóide VO (IIb-B)
• Controle da insuficiência cardíaca (IC): IC leve ou moderada: diuréticos e restrição hídrica-furosemida 1-6 mg/kg/dia -espironolactona 1-3 mg/kg/diainsuficiência aórtica importante: IECA -captopril 1-2 mg/kg/dia, -enalapril 0,5-1 mg/kg/diadisfunção ventricular confirmada pelo ecocardiograma ou
de fibrilação atrial: digoxina-7,5-10 mcg/kg/dia em crianças -0,125-0,25 mg/dia em adultosfibrilação atrial: considerar anticoagulação
Tratamento da coréia • Leve e moderada:-repouso e permanência em ambiente calmo,
evitando estímulos externos-benzodiazepínicos e fenobarbital • Grave:-haloperidol 1 mg/dia em 12/12h, aumentando 0,5 mg
a cada 3 dias, até dose máxima de 5 mg ao dia (I-B)
-ácido valproico 10 mg/kg/dia, aumentando 10 mg/kg a cada semana até dose máxima de 30 mg/Kg/dia (I-B)
-carbamazepina 7-20 mg/kg/dia (I-B) • Corticosteróides (IIb-B)
Profilaxia• Primária: -reconhecimento e tratamento das infecções estreptocócicas-prevenir o primeiro surto de FR • penicilina benzatina (I-B) -suscetibilidade comprovada do EBGA -ação bactericida -eficácia clínica e bacteriológica da droga -baixa incidência de efeitos colaterais -boa aderência ao esquema instituído -baixo espectro -baixo custo-resistência não registrada do EBGA
• Fenoximetilpenicilina (penicilina V): droga de escolha para uso oral (I-B)
• Amoxicilina e ampicilina: 10 dias• Cefalosporinas de primeira geração • Eritromicina: alergia à penicilina (I-B)
• Secundária: -portador de FR prévia ou cardiopatia reumática
comprovada-prevenir colonização ou infecção de via aérea
superior pelo EBGA -prevenir recorrências da doença -reduzir a severidade da cardiopatia residual • Penicilina benzatina 1.200.0000 U por IM
profunda nos pacientes acima de 20 Kg e 600.000 U nos abaixo de 20 Kg, a cada três semanas (I-A)
• Alergia à penicilina: -sulfadiazina 500 mg até 30 kg e 1 g acima
de 30 kg (I-B) -controle de hemograma a cada 15 dias nos
primeiros 2 meses de uso e, posteriormente, a cada 6 meses
-se leucócitos < 4.000/mm³ e menos de 35% de neutrófilos: substituir!
• Alergia à sulfa e à penicilina: eritromicina
Procedimentos com recomendação de profilaxia• Todos que envolvam manipulação de
tecido gengival, da região periapical ou perfuração da mucosa oral (biópsia, remoção de sutura e colocação de bandas ortodônticas)
• Procedimento invasivo do trato respiratório que envolve incisão ou biópsia da mucosa respiratória
• Procedimento que envolve pele infectada, estruturas cutâneas, ou tecido músculo-esquelético
Bibliografia• Diretrizes Brasileiras para o diagnóstico,
tratamento e prevenção da Febre Reumática (2009)
• Prevention of infective endocarditis: Guideline from American Heart Association (2007)
• Hilário, MOE, capítulo 36.3, pgs. 813-821• “Febre reumática: revisão sistemática”,
Rev Bras Clin Med. São Paulo, 2011 mai-jun;9(3):234-8