-
VALRIA FARIA CARDOSO
ASPECTOS MORFOSSITTICOS DA LGUA KAIOW (GUARAI)
Tese apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas como requisito parcial
para a obteno do Ttulo de Doutora em Lingstica.
Orientadora: Prof.Dr. Lucy Seki
CAMPINAS
2008
-
ii
Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca do IEL -
Unicamp
C179a
Cardoso, Valria Faria.
Aspectos morfossintticos da lngua Kaiow (Guarani) / Valria Faria
Cardoso. -- Campinas, SP : [s.n.], 2008.
Orientador : Lucy Seki.
Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas,
Instituto
de Estudos da Linguagem.
1. ndios Kaiow - Lnguas. 2. ndios - Lnguas - Morfossintaxe.
3. Gramtica comparada e geral - Casos. 4. Voz inversa. I.
Seki,
Lucy. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de
Estudos
da Linguagem. III. Ttulo.
tjj/iel Ttulo em ingls: Morphosyntactic aspects of Kaiow
(Guarani) language.
Palavras-chaves em ingls (Keywords): Indians Kaiow Language;
Indians Language Morphosyntax; Grammar, comparative and general
Case; Inversion voice.
rea de concentrao: Lingstica.
Titulao: Doutor em Lingstica.
Banca examinadora: Profa. Dra. Lucy Seki (orientador), Prof. Dr.
Dercir Pedro de Oliveira, Prof. Dr. Frantom Bezerra Pacheco, Profa.
Dra. Tnia Maria Alkmin, Profa. Dra. Cristina Martins Fargetti. Data
da defesa: 08/08/2008. Programa de Ps-Graduao: Programa de
Ps-Graduao em Lingstica.
-
iii
-
v
MINHA AMADA ME LLLLUZIAUZIAUZIAUZIA (IN MEMORIAM);
AOS MEUS AMADOS: PAI AAAANTNIONTNIONTNIONTNIO E IRMOS
WWWWELITONELITONELITONELITON E FFFFBIOBIOBIOBIO;
E AOS MEUS AMADOS FILHOS: SSSSOFIAOFIAOFIAOFIA E JJJJOO OO OO OO
VVVVITORITORITORITOR; DEDICO.
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vii
AGRADECIMETOS
Aos Kaiow, pela acolhida em suas comunidades e pela generosidade
ao transmitirem
ensinamentos sobre a cultura e a histria de seu povo. Em
especial, Floriza de Souza
Filho (Nhandesy), ao Helio Jorge da Silva (Nhanderu), ao Ernesto
Fernandes Ortiz, ao Eliel
Benites e Zlia Regina Benites Duarte, informantes, amigos e
colaboradores da pesquisa.
minha orientadora, Profa. Dra. Lucy Seki, que entendendo as
particularidades dos
momentos vividos ao longo do processo, soube ser paciente e
consentir, soube ser amiga e
incentivar. Com carinho e admirao, meus sinceros
agradecimentos.
Profa Dra. Cristina Martins Fargetti e ao Prof. Dr. Frantom
Bezerra Pachco, pelas
vrias sugestes e preciosa participao na banca de qualificao da
tese.
s Profas. Dras. Maria Bernadete Marques Abaurre e Maria Filomena
Sndalo e ao Prof.
Dr. Angel Cobera Mori, pela orientao e valiosas sugestes feitas
na qualificao fora de
rea de tese, rea de Fontica e Fonologia.
Aos Profs. Drs. Dercir Pedro de Oliveira, Frantom Bezerra
Pachco, Angel Humberto
Corbera Mori, Jonas Arajo Romualdo e s Profas. Dras. Cristina
Martins Fargetti, Tnia
Maria Alkmin e Maria Bernadete Marques Abaurre, por terem aceito
compor a banca de
defesa desta tese.
Aos Profs. Drs. Angel Corbera Mori, Jairo Morais Nunes, Lucy
Seki, Mary Kato, Maria
Bernadete Marques Abaurre, Maria Filomena Sndalo, Ingedore Koch,
Edwiges Morato e
Eduardo Guimares, professores da Unicamp, pela ampla contribuio
para formao
lingstica.
Ao amigo Antnio Jos Filho, pela apresentao ao povo Kaiow.
-
ix
Ao Prof. Dr. Dercir Pedro de Oliveira, pela amizade e pelo apoio
e incentivo desde o
mestrado na UFMS.
Aos companheiros de rea de pesquisa: Ilda de Souza, Antnia Alves
Pereira, Raynice
Geraldine Pereira da Silva, Mnica Veloso Borges, Frantom Bezerra
Pacheco, Glucia
Vieira Cndido, Flavia Alves, Maria Pankararu, Nambl Gakran,
Rogrio Vicente Ferreira,
Vitria Spanghero-Ferreira, Mateus Coimbra de Oliveira, Walquria
Neiva Praa, Manoel
Gomes dos Santos, entre outros, pelos bons momentos no IEL.
Ao setor de Ps-Graduao do IEL/Unicamp, pelo competente
desempenho de suas
funes.
CAPES, pelo auxlio concedido (Bolsa PQI), que permitiu o
desenvolvimento das
atividades desta pesquisa.
Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), pela concesso de
licena e pelo
incentivo para cursar o doutorado, e aos colegas de trabalho do
Departamento de Letras do
Campus Universitrio de Alto Araguaia.
Profa. Cssia Regina Tomanin, pela amizade, pela leitura e
sugestes oferecidas ao
trabalho.
Aos amigos: Marlon Leal Rodrigues, Roberto Leiser Baronas, Hlio
Clementino dos
Santos, Osmar Quim, Albano Dalla Pria, Edileusa Gimenes Moralis,
Rosimar Rodrigues de
Oliveira, Cssia Regina Tomanin, Gislaine Aparecida de Carvalho e
Gilberto Cardoso da
Fonseca, pela torcida e pelo companheirismos de sempre.
s amigas de sempre: Maria da Conceio Carvalho dos Santos, Ilda
de Souza, Vanilda
Guimares, Custdia de Souza e Marinalva Corra pelas preces e
pelas palavras de
encorajamento.
-
xi
Aos meus pais: Antnio Tiburcio Cardoso e Luzia de Faria Cardoso
(in memoriam), por
todo amor consagrado e pela compreenso e incentivo que souberam
dedicar sempre.
Ao meu irmo Weliton Cardoso, pelo estmulo, pelo carinho e pelo
exemplo de dedicao
aos estudos.
Ao meu irmo Fbio Augusto Cardoso, minha cunhada Amanda Zotelli e
minha
sobrinha Lorena Zotelli Cardoso, pelo carinho, incentivo e apoio
de sempre.
Aos meus amados filhos: Sofia Cardoso Gergen e Joo Vitor Cardoso
Clementino, pelo
amor dedicado, pela companhia e pela felicidade proporcionada
cotidianamente.
E, principalmente, ao meu Deus, o meu Senhor.
-
xiii
RESUMO
A presente tese tem por objetivo oferecer uma descrio e anlise
de aspectos
fundamentais da morfossintaxe do Kaiow (Guarani), que permita um
conhecimento
plausvel de sua gramtica. Inicialmente, a tese traz consideraes
respeito do povo
Kaiow e sua lngua, alm de tratar da metodologia empregada na
pesquisa lingstica de
campo. Posteriormente, apresentada a descrio seguida de anlise
gramatical do Kaiow
que projetou a pesquisa a uma anlise primeira da marcao de caso
e de voz inversa. Neste
trabalho, defende-se a idia de que o Kaiow uma lngua
Ativa/Inativa (Ciso
Intransitiva), e que a marcao de caso intra-clausal apresenta
cises motivadas por
operaes morfossintticas e pela pragmtica, o que resulta em
diferentes configuraes da
marcao de caso na lngua: nominativo/acusativo,
ergativo/absolutivo ou
ergativo/acusativo. Quanto voz inversa, pode-se concluir que a
anlise sobre inverso
proposta por Payne (1994) para as lnguas Tupi-Guarani, aplica-se
ao Kaiow, e, pelo que
se observa pelas anlises, essa uma lngua de inverso semntica
motivada pela hierarquia
de pessoa.
PALAVRAS-CHAVE: 1. Kaiow (Guarani); 2. Lnguas Indgenas; 3.
Morfossintaxe; 4. Caso;
5. Inverso.
-
xv
ABSTRACT
In this dissertation a description and an analysis of
fundamental aspects of Kaiow
(Guarani) morphosyntax are presented. It results in a plausible
knowledge of the grammar
of this language. First, considerations on Kaiow people and its
language are made. It is
also presented a discussion on the methodology adopted in the
fieldwork of linguistic
research. Second, the description is presented followed by
grammatical analysis of Kaiow
that projected the research to a first analysis of case marking
and inverse voice. In this
dissertation, the idea of Kaiow as an Active/Inactive (Split-S)
is claimed. Splits motivated
by morphosyntatic operation and by pragmatics are presented in
intra-clausal case marking.
It results in different configurations of case marking in the
language:
nominative/accusative, ergative/absolutive or
ergative/accusative. Concerning the voice
inverse its is possible to conclude that Paynes (1994) analysis
of inversion on Tupi-
Guaran languages is to Kaiow. The semantic inverse motivated by
the person hierarchy
was also reveled through the analysis.
Key-words: 1. Kaiow (Guaran); 2. Indigenous Language; 3.
Morphosyntax; 4. Case; 5.
Inversion.
-
xvii
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Consoantes 26
Quadro 2. Vogais 27
Quadro 3. Realizao e representao dos fonemas 27
Quadro 4. Categoria de posse 34
Quadro 5. Pronomes clticos 35
Quadro 6. Prefixos relacionais 38
Quadro 7. Tipos semnticos de adjetivos 62
Quadro 8. Sries de prefixos e clticos pronominais marcadores de
pessoa 67
Quadro 9. Categoria de Voz 80
Quadro 10. Organizao dos morfemas de Tempo 89
Quadro 11. Aspecto 90
Quadro 12. Advrbios temporais 99
Quadro 13. Advrbios locativos 100
Quadro 14. Advrbios Interrogativos 101
Quadro 15. Pronomes pessoais e Pronomes Clticos 104
Quadro 16. Pronomes Diticos 107
Quadro 17. Pronomes interrogativos 108
Quadro 18. Posposies em posio de adjunto 111
Quadro 19. Posposies em posio de complemento 114
Quadro 20. Sries de prefixos e clticos pronominais marcadores de
pessoa e caso 140
Quadro 21. Prefixos da srie I e relacionais marcadores da
no-pessoa do discurso e caso 140
Quadro 22. Marcadores de pessoa no predicado 167
Quadro 23. Sries de marcadores de pessoa e caso 168
Quadro 24. Alinhamento em Guarani Antigo 170
Quadro 25. Portmanteau 171
-
xix
Quadro 26. Marcadores de caso 177
Quadro 27. Estratgias de codificao de caso 178
Quadro 28. Codificao de (A) e (O) 183
Quadro 29. Ciso de caso e inverso semntica em Kaiow 184
-
xxi
ABREVIATURAS E SMBOLOS
A sujeito de predicados transitivos
Abs absolutivo
Acus acusativo
Adv advrbio (adverbial)
Alat alativo
Asp aspecto
At ativo
aten atenuativo
Benif benefactivo
cf. confira
Caus causativo, causa
Comit comitativo
Compl completivo
Cons consecutivo
Cop cpula
Dat dativo
Desc descritivo
Det determinante
dim diminutivo
Dir direcional
Erg ergativo
excl exclusivo
Foc foco
Fut futuro
hip hipottico
Imin iminentivo
Imp imperativo
-
xxiii
Inat inativo (estativo, descritivo)
incl inclusivo
ind indefinido
Iness inessivo
Inf informante
Int intensificador
Inter interrogativo
Instr instrumental
Loc locativo
N nome
Nom nominativo
neg negao
O objeto
OI objeto indireto
Ptc partcula
Pass passado
Perl perlativo
Perm permissivo
Pres presente
pl plural
Pont pontual
poss posse (possessivo)
Posp posposio
rec recproco
refl reflexivo
rel relacional
rem remoto
rep reportivo
sg singular
S sujeito intransitivo
-
xxv
Sa sujeito intransitivo ativo
SAdj sintagma adjetival
SAdv sintagma adverbial
SN sintagma nominal
So sujeito intransitivo descritivo
SP sintagma posposicional
SV sintagma verbal
Subj subjuntivo
T tempo
TAM tempo, aspecto e modo
Top tpico
V verbo
Vintr verbo intransitivo
1 zero (morfema) ou categoria vazia (ncleo de sintagma)
[ ] realizao fontica
/ / representao fonolgica
{ } morfema
cliticizao
- fronteira de morfema
/ >/ (obstruinte glotal)
* agramatical
~ variao, alternncia
-
xxvii
SUMRIO
Resumo
Abstract
Lista de Quadros
Abreviaturas e Smbolos
1 ITRODUO 1
2 KAIOW: O POVO E SUA LGUA 5
2.1 Os Guarani 5
2.2 Os Kaiow: demografia e localizao 8
2.3 Aspectos scio-histrico-culturais dos Guarani Kaiow 10
2.4 Os Kaiow e sua nova realidade 13
2.5 Filiao gentica e estudos lingsticos prvios sobre o Guarani e
o Kaiow 16
2.5.1 Estudos realizados sobre o Guarani 18
2.5.2 Estudos lingsticos sobre o Kaiow 19
3 COSIDERAES SOBRE A PESQUISA LIGSTICA 23
3.1 Metodologia e Tcnicas da Pesquisa de Campo 23
3.1.1 O Corpus 25
3.1.2 Colaboradores 25
3.2 Apresentao dos dados no corpo do trabalho 26
4 CLASSES DE PALAVRAS 31
4.1 Nomes 32
4.1.1 Categoria de Posse 33
4.1.1.1 Pronomes clticos marcadores de pessoa e nmero 35
4.1.1.2 Prefixos Relacionais 36
-
xxix
4.1.2 Categoria de Nmero 41
4.1.3 Categoria de Gnero 42
4.1.4 Marcao de Caso 44
4.1.5 Breves consideraes sobre a Categoria de Tempo Nominal
47
4.1.6 Outras operaes derivacionais 51
4.1.7 Propriedades estruturais dos nomes 53
4.1.8 Propriedades distribucionais dos nomes 54
4.1.9 Negao do nome 58
4.2 Verbos 59
4.2.1 Tipos de verbos 59
4.2.1.1 Verbos Transitivos 60
4.2.1.2 Verbos Intransitivos 60
4.2.1.2 Verbos Intransitivos Ativos 60
4.2.1.3 Verbos Intransitivos Inativos 61
4.2.1.4 Cpula 66
4.2.2 Categoria de pessoa e nmero 66
4.2.2.1 Marcadores de pessoa e nmero no verbo transitivo 67
4.2.2.2 Marcadores de pessoa e nmero no verbo intransitivo
72
4.2.2.2.1 Marcadores de pessoa e nmero no verbo intransitivo
ativo 72
4.2.2.2.2 Marcadores de pessoa e nmero no verbo intransitivo
inativo 73
4.2.2.2.3 Marcadores de pessoa e nmero no verbo copulativo
75
4.2.3 Prefixos de Relacionais: uma outra alternativa de anlise
77
4.2.3.1 Prefixos Relacionais: como Categoria de Voz em verbos
transitivos 77
4.2.4 Categorias de Tempo, Modo e Aspecto (TAM) 80
4.2.4.1 Categoria de modo 81
4.2.4.1.1 Indicativo 81
4.2.4.1.2 Imperativo 82
4.2.4.1.3 Subjuntivo 84
4.2.4.1.4 Consecutivo 85
-
xxxi
4.2.4.2 Tempo 85
4.2.4.2.1 Tempo Passado 85
4.2.4.2.2 Tempo Futuro 87
4.2.4.3 Aspecto 90
4.2.4.3.1 Aspecto Pontual {ma} j 90
4.2.4.3.2 Aspecto Completivo {-pa} com variao alomrfica {-mba}
acabar, terminar 91
4.2.4.3.3 Aspecto Iminentivo {-pota} querer, poder 91
4.2.4.3.4 Aspecto Permissivo {-katu} poder 92
4.2.4.3.5 Aspecto Atenuativo {mi)} por favor 92
4.2.5. Outros morfemas afixados no verbo 93
4.2.5.1 Morfema Causativo {-mo} Transitivizador 93
4.2.5.2 Morfema Causativo Comitativo {NweRe- ~ Re-} com verbos
copulativos 93
4.2.5.3 Morfema Causativo {-uka} com verbos transitivos 94
4.2.5.4 Morfema descontnuo de negao {na- ... -i} 95
4.2.5.5 Morfema desiderativo {-se} 96
4.2.6 Propriedades estruturais dos verbos 97
4.3 Advrbios 98
4.3.1 Subclasses de Advrbios 99
4.3.1.1 Temporais 99
4.3.1.2 Locativos 100
4.3.1.3 Advrbios interrogativos 101
4.4 Pronomes 103
4.4.1 Pronomes pessoais 103
4.4.2 Pronomes pessoais clticos 105
4.4.3 Pronomes diticos 107
4.4.4 Pronomes interrogativos 108
4.5 Posposies 110
4.5.1 Tipos de posposies 110
4.5.1.1 Posposies em posio de adjunto 110
-
xxxiii
4.5.1.2 Posposies em posio de complemento 113
4.6 Partculas 116
4.6.1 Partcula {ete} de verdade, mesmo, realmente 116
4.6.2 Partcula {Re} a toa, sem razo, por nada 117
4.6.3 Partcula {eteRe} intensiva 117
4.6.4 Partcula {tee} prprio, verdadeiro 118
4.6.5 Partcula {te} foco 118
4.6.6 Partcula {awe} tambm 119
4.6.7 Partcula {hikwa} todos 119
4.6.8 Partcula {hina)} continuativo 119
4.6.9 Partcula {kweR} pluralizadora 120
4.6.10 Partculas {ani )} negao 120
4.6.11 Partculas {t(po)}, {pa}, {nipo} interrogao 121
4.6.12 Partculas inter-clausais {wa/e}, {Ramo )}, {RiRe} e {ha}
122
4.6.13 Partculas de tempo/aspecto {mo)/a)}, {kuRi}, {aRa)}, {mi
)} e {ma)} 123
5 MORFOSSITAXE ITRA-CLAUSAL 125
5.1 Identificao de Predicados 125
5.1.1 Predicados Verbais 125
5.1.1.1 Predicado Verbal Transitivo 126
5.1.1.2 Predicado Verbal Intransitivo 127
5.1.1.2.1 Predicado Verbal Intransitivo Ativo 127
5.1.1.2.2 Predicado Verbal Intransitivo Inativo 128
5.1.1.3 Predicado Verbal Copulativo 129
5.1.2 Predicados No-Verbais 130
5.1.2.1 Predicados Possessivos 130
5.1.2.2 Predicados Equativos 131
-
xxxv
5.1.2.3 Predicados Locativos 131
5.2 Identificao dos Argumentos 132
5.2.1 Funes Gramaticais Nucleares dos SNs 132
5.2.1.1 Funes gramaticais nucleares internas dos SNs 133
5.2.1.1.1 SN em funo de (A) 133
5.2.1.1.2 SN em funo de (Sa) 134
5.2.1.1.3 SN em funo de (O) 135
5.2.1.1.4 SN em funo de (So) 138
5.2.1.2 Funes gramaticais nucleares oblquas do SN 139
5.2.2 Funes Gramaticais Perifricas dos SNs 141
5.2.2.1 SN em funo de tpico 141
5.2.2.2 SN em funo de foco 142
5.3 Ordem dos Constituintes 143
6 MORFOSSITAXE DA SETEA 147
6.1 Oraes Independentes 147
6.1.1 Oraes Declarativas 147
6.1.1.1 Oraes Declarativas Afirmativas 147
6.1.1.2 Oraes Declarativas Negativas 149
6.1.2 Oraes Interrogativas 150
6.1.3 Oraes Imperativas 153
6.2 Oraes Dependentes 154
6.2.1 Completivas 155
6.2.2 Relativas 156
6.2.2.1 relativizao de (S) 156
6.2.2.2 relativizao de (A) 157
6.2.2.3 relativizao de (O) 157
6.2.2.4 relativizao de Oblquo 157
6.2.3 Adverbiais 158
6.2.3.1 Temporais 158
-
xxxvii
6.2.3.2 Causais 159
6.2.3.3 Condicionais 160
6.2.4 Coordenadas 160
6.2.4 1 por justaposio (parataxe) 160
6.2.4 2 por partcula coordenativa {ha} 160
6.2.4.2.1 Conjuntiva 161
6.2.4.2.2 Disjuntiva 161
6.2.4.2.3 Coordenao de Constituintes 161
7 CISES A MARCAO DE CASO E IVERSO SEMTICA 163
7.1 Sistema Ativo/Inativo, Split-S, Ativo/Agentivo 163
7.2 Marcao de caso entre predicados bi e monoargumentais em
Kaiow 165
7.3 Marcao de Caso Intra-clausal 168
7.3.1 Aspectos morfossintticos dos prefixos da srie III 171
7.3.2 Ciso acusativa e o caso marcado pela srie III 173
7.3.3 Estratgias de marcao de caso intra-clausal 176
7.3.3.1 Marcadores de pessoa e caso 177
7.3.3.2 Cises no caso morfolgico 177
7.4 Inverso Semntica em Kaiow 180
8 COSIDERAES COCLUSIVAS 187
REFERCIAS 191
APDICE 201
Sistematizao da Fonologia Kaiow: nasalizao e/ou oralizao 203
AEXOS 249
Anexo A: Mapa - Localizao das reas Kaiow/Guarani no MS 251
Anexo B: Texto Kaiow 253
Anexo C: Fotos Kaiow 259
-
1 ITRODUO
A cincia da linguagem, tendo como objetivo a compreenso da
natureza da linguagem humana, fenmeno que se caracteriza pela
unidade na diversidade, manifestando-se em cada lngua de forma
particular, deve apoiar-se em ampla base emprica, partindo-se do
princpio de que para conhecer a linguagem humana necessrio conhecer
os limites de sua variao, o que pode ser alcanado atravs do estudo
de suas diferentes manifestaes. O conhecimento dos fenmenos de
novas lnguas ou leva confirmao de princpios estabelecidos com base
em dados de lnguas j estudas, ou, ao revelar a existncia de
fenmenos no considerados nas formulaes tericas, contribui para o
desenvolvimento da cincia ao possibilitar, com a incorporao destes
fenmenos, a introduo de reajustes e/ou reformulaes de hipteses e
teorias. (SEKI, 2003 p.2).
A presente tese tem por objetivo oferecer comunidade acadmica
uma proposta de
descrio e anlise de aspectos fundamentais da morfossintaxe do
Kaiow1 (Guarani), que
lhe permitam um possvel conhecimento de sua gramtica. Com o
desenvolvimento desta
pesquisa, buscamos contribuir para o conhecimento de dialetos e
lnguas indgenas da
Famlia Tupi-Guarani, bem como de outra filiao gentica, alm de
procurarmos cooperar
com o desenvolvimento de novas formulaes tericas, ou ainda,
possibilitar (...) reajustes
e/ou reformulaes de hipteses e teorias (Seki, op. cit).
Com este trabalho de documentao de aspectos gramaticais do
Kaiow, esperamos
tambm subsidiar a elaborao de dicionrios, gramtica de referncia
e materiais de leitura
visando auxiliar trabalhos em escolas de educao bilnge das
comunidades indgenas de
Mato Grosso do Sul e de outras localidades.
A descrio e anlise de aspectos fundamentais da morfossintaxe do
Kaiow
projetaram-nos a uma anlise primeira de seu sistema de marcao de
caso e de marcao
de voz. A abordagem lingstica que nos propomos seguir se
fundamenta na perspectiva
terica tipolgico-funcional, e deste ponto de vista, a lngua
tomada como um sistema de
ao social comunicativa. De tal modo, a lngua tanto uma
ferramenta usada pelas pessoas
num processo comunicativo, como um sistema simblico formal.
Portanto, a
1 O termo Kaiow uma variao de kaagwa habitantes da mata.
Observamos grafias alternativas para o nome Kaiow: Caiu, Kaiw,
Kaajova e Kaiov.
-
2
conceptualizao e a descrio de uma lngua envolvem analisar suas
propriedades
sistemticas formais e sua interpretao, levando em conta o carter
comunicativo e
interacional da linguagem.
Nossa proposta de analisar aspectos morfossintticos da lngua
Kaiow, numa
abordagem tipolgico-funcional, ampara-se, basicamente, nos
trabalhos de: Givn (1984,
1990, 1994); Andrews (1985), Dixon (1979, 1994); T. Payne
(1997); D. Payne (1994); Seki
(2000); Palmer (1994); Comrie (1989); Croft (1991); entre
outros.
Como o trabalho consiste na descrio de aspectos da gramtica
Kaiow, no h, a
rigor, uma ordem temtica a ser obedecida. Assim, as anlises
morfossintticas apresentam-
se divididas em tpicos que constituem quatro captulos desta
tese, seguindo os dois
captulos introdutrios: Kaiow: o Povo e sua Lngua e Consideraes
sobre a Pesquisa
Lingstica; findando com o captulo que traz as consideraes
conclusivas, alm do artigo
Sistematizao da Fonologia Kaiow: nasalizao e/ou oralizao
(Cardoso, 2007), em
apndice, que resultado da qualificao em Fontica e Fonologia, sob
orientao da Profa.
Dra. Maria Bernadete Marques Abaurre (IEL/Unicamp). A proposta
de sistematizao da
Fonologia Kaiow no integra como captulo desta tese, por
entendermos que o aporte
terico (no-linear) destoe da perspectiva tipolgica-funcional que
ampara o presente
trabalho. A necessidade de anexar a referida anlise fonolgica
est no fato de a utilizarmos
na apresentao dos dados do Kaiow (cf. 3.2 e apndice).
Desta forma, o texto que ora se inicia, apresenta-se da seguinte
maneira:
No captulo intitulado Kaiow: o Povo e sua Lngua, apresentamos
fatos da
histria do povo Guarani e de suas disperses do ponto de vista
geogrfico, demogrfico e
lingstico, alm de tratamos de estudos precedentes que, na rea da
linguagem, referem-se
ao Guarani e ao Kaiow, para, posteriormente, tratarmos da
distino entre lngua e/ou
dialeto Kaiow. Estes aspectos so baseados, principalmente, em
trabalhos de historiadores
e antroplogos, como: Schaden (1974), Mlia (1992), Brand (1997,
1998), Vietta (1998),
Pereira (1999), entre outros, e de lingistas como Rodrigues
(1984/5, 1994), Grannier
(2002), Guedes (1991), entre outros.
No captulo Consideraes sobre a Pesquisa Lingstica, tratamos
aspectos
relacionados metodologia e tcnicas de pesquisa de campo, coleta
de dados, ao corpus
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3
utilizado na descrio e anlise lingstica, alm de referirmos
apresentao desses dados
no corpo do trabalho.
No captulo de nmero quatro, desenvolvemos a caracterizao formal
das Classes
de Palavras do Kaiow, a partir de propriedades morfossintticas
prototpicas apresentadas
por Payne (1997): as propriedades estruturais e as propriedades
distribucionais.
As propriedades estruturais, por meio do exame das operaes
flexionais e
derivacionais, exibem a estrutura interna de diferentes
categorias (ou classe de palavras)
como razes e seus marcadores gramaticais. As propriedades
distribucionais fazem com
que as categorias sejam distribudas em sintagmas, clusulas e
textos. Por exemplo, o nome
serve como ncleo de sintagmas nominais, sujeitos e objetos de
clusulas e tpicos de
textos.
O captulo quinto, intitulado Morfossintaxe Intra-clausal,
tratamos de identificar
predicados e constituintes sintagmticos (argumentos) de oraes
independentes. Com
relao aos constituintes sintagmticos, mais especificamente sobre
as funes gramaticais
dos SNs, tomamos por base terica o trabalho de Andrews (1985)
que, em seu texto
intitulado The major functions of the noun phrase, identifica
funes gramaticais internas
(nucleares e oblquas) e funes gramaticais perifricas (presas e
livre), co-relacionadas s
funes semnticas e pragmticas. As relaes gramaticais esto,
freqentemente, sendo
pensadas como relaes entre argumentos e predicados em nvel de
estrutura lingstica,
independentes de influncias semnticas e pragmticas. Entretanto,
para a descrio
lingstica, o importante reconhecer que as relaes gramaticais tm
funes universais
na comunicao e, que ao mesmo tempo podem ser definidas em termos
de propriedades
formais especficas de cada lngua. As propriedades formais mais
diretamente ligadas s
relaes gramaticais so as seguintes: a marcao de caso; a
concordncia verbal (ou cross-
reference) e a ordem de constituintes.
No sexto capitulo, tratamos de aspectos elementares da
morfossintaxe da sentena.
Apresentamos uma descrio dos tipos de oraes independentes
seguida das oraes
dependentes, apontando para a existncia de morfemas
nominalizadores e de partculas que
incidem em oraes subordinadas e/ou coordenadas. As estratgias de
combinaes e de
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4
contrastes entre oraes principais e subordinadas necessitam de
trabalhos aprofundados e
no configuram como objeto do presente trabalho de tese.
No stimo captulo, Cises na Marcao de Caso e Inverso
Semntica,
analisamos as estratgias de marcao de caso intra-clausal, tendo
como apoio terico,
basicamente, os trabalhos de Dixon (1979 e 1994). Quanto a
proposta de anlise de
construes inversas e diretas para o Kaiow, apoiamo-nos no texto
de Payne (1994) e nos
trabalhos de Givon (1994) e Gildea (1994). De acordo com Dixon
(1994), os termos
referentes marcao de caso: ergativo e ergatividade, assim como,
acusativo e
acusatividade, podem ser usados: i ) para descrever o caminho
que as funes sintticas
(gramaticais) so marcadas em clausulas simples (oraes
independentes) transitivas e
intransitivas, que podem ser ergativamente morfolgica ou
acusativamente morfolgica (ou
intra-clausal), e ii ) para descrever contrastes sintticos numa
lngua em que se pode
combinar clausulas simples com sentenas complexas, por meio da
coordenao,
subordinao, complementao, etc, caracterizando-a como acusativa
sinttica ou ergativa
sinttica (ou inter-clausal). O primeiro destes dois caminhos o
que basicamente norteia
trabalho da presente tese.
Nas Consideraes Conclusivas, resumimos os principais pontos
discutidos na
tese.
O trabalho inclui ainda trs Anexos, contendo: no anexo A- mapa
da localizao
das reas Kaiow/Guarani; no anexo B - o texto Kaiow: mi )) ))ta
)) )) kua )) )) ha aNNNNwaRRRRete A
menina (moa) e a ona, com glosas e traduo livre; e no anexo C
Fotos de ambientes e
pessoas das comunidades indgenas: Jaguapiru e Boror
(Dourados-MS), Amambai
(Amambai-MS) e Caarap (Caarap-MS).
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2 KAIOW: O POVO E SUA LGUA
Neste captulo trazemos informaes gerais a respeito da comunidade
indgena
Guarani. Fatos da histria desse povo e de suas disperses do
ponto de vista demogrfico,
geogrfico e lingstico, que decorreram nos seguintes grupos
Guarani: Mby, Nhandewa e
Kaiow (Brasil).
2.1 Os Guarani
Na poca da chegada dos primeiros europeus ao Brasil, o nmero de
lnguas
indgenas era em maior nmero do que hoje. A causa maior desta
reduo foi o
desaparecimento dos povos que as falavam, em conseqncia das
campanhas de extermnio
ou caa a escravos, movida pelos europeus, ou em virtude das
epidemias de doenas
contagiosas trazidas por estes, deflagradas involuntariamente
(em alguns casos
voluntariamente) no seio de muitos povos indgenas; ou pela reduo
progressiva de seus
territrios de coleta, caa e plantio, ou, ainda, pela assimilao,
forada ou induzida, aos
usos e costumes dos colonizadores.
Cada lngua indgena brasileira no s reflete, assim, aspectos
importantes da viso de mundo desenvolvida pelo povo que a fala, mas
constitui, alm disso, a nica porta de acesso ao conhecimento pleno
dessa viso de mundo que s nela expressa. As mltiplas vises de mundo
dos povos indgenas brasileiros - com todo o complexo cultural,
social e emocional a elas associado - tm importncia crtica para o
conhecimento humano por se ter desenvolvido, durante alguns
milhares de anos, com total independncia histrica em relao s
tradies culturais asiticas e europias, que caracterizam a civilizao
ocidental. (RODRIGUES, 1994. p. 27)
Historicamente, os Guarani mantiveram contato com os europeus
nas duas primeiras
dcadas do sculo XVI e esse convvio foi se ampliando e
intensificando nas dcadas
seguintes. Os colonizadores portugueses os contataram,
primeiramente, no litoral sul de So
Paulo e, a partir da, foram desbravando as comunidades mais
meridionais, at a costa sul
de Santa Catarina.
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6
Os exploradores e colonizadores espanhis tiveram contato com
grupos Guarani
tambm na costa catarinense e, posteriormente, entrando pelo Rio
da Prata, na confluncia
dos rios Paraguai e Paran e, mais ao norte, na regio de
Assuno.
Em meados do sculo XVI, os espanhis instituram, no Paraguai, o
sistema de
encomiendas2, legtima escravizao dos ndios, provocando as
primeiras revoltas
indgenas do Cone Sul e movimentos messinicos dos Guarani.
Nos dois sculos que se seguiram, grupos Guarani foram alvo de
prticas de
escravizao, caa por bandeirantes e objeto de ao missionria,
sobretudo no sistema
jesutico das Redues3. Esses aspectos reunidos e associados aos
diversos movimentos
migratrios dos Guarani, configuraram diferenas lingsticas e
culturais que permitem
distinguir, entre os Guarani atuais, pelo menos quatro grandes
grupos e dialetos: os
Nhandewa, os Mby e os Kaiow, presentes no territrio brasileiro,
e os Chiriguano,
presentes na Bolvia.4 H grupos Mby, tambm, na Argentina, alm de
no Brasil e no
Paraguai.
Segundo Schaden (1974), Os Guarani do Brasil Meridional podem
ser divididos
em trs grupos: os andva (aos quais pertencem os Apapokva, que se
tornaram famosos
pelo trabalho de Curt Nimuendaj), os Mb e os Kayov.5 Estes
grupos so tambm
denominados no Brasil e no Paraguai, como Kaiow ou Pai-tavyter;
Mby ou Kaygu;
Nhandeva ou Chirip Guarani.
2 O termo encomiendas refere-se ao sistema cuja finalidade era
organizar a utilizao da mo-de-obra indgena. (...). Esse sistema,
que regulamentava os servios prestados pelos ndios aos
conquistadores, teria representado uma ruptura nas relaes menos
normatizadas e pautadas por mecanismos de aliana e parentesco, que
at ento vigia entre os poucos espanhis e os muitos Guarani (Necker
1979). A implantao das encomiendas talvez responda, assim, pela
intensificao das rebelies indgenas, que j haviam sido violentamente
reprimidas desde, pelo menos, o incio dos anos 1540. (FAUSTO,
2005). 3 Redues eram aldeamentos indgenas controlados por padres
jesutas com a finalidade de desenvolver o trabalho de disseminao de
hbitos e de costumes europeus e a catequese. A reduo era uma forma
de retirar os ndios de seu convvio comum e natural entre os nativos
e lhes dar a oportunidade de se transformarem em bons cristos. 4
Informaes obtidas no site:
http://www.labeurb.unicamp.br/elb/indigenas/guarani.html e
registradas por Wilmar da Rocha DAngelis. (acesso em 25 de outubro
de 2007). 5 A grafia do alfabeto Guarani usada nas 22 reas indgenas
da regio da Grande Dourados emprestada do Guarani Paraguaio. Assim
sendo, vale elucidar que as palavras andva, Mb e Kayov, expressas
por Schaden, tm as respectivas correspondentes: Nhandewa, ou ainda,
Nhandewa/Chirip; Mby e Kaiow.
-
7
Os grupos Guarani, aqui tratados como Nhandewa, Mby e Kaiow so
tidos,
respectivamente, por Meli (1992) como: Av kat et, Mby e Pai
-Tavyter6.
Ressaltamos que, no Paraguai tambm se fala o Guarani Jopara, o
Guarani
mesclado como o Castelhano, que falado, sobretudo, pela populao
camponesa.
No Brasil, esses grupos Guarani vivem nos estados de Mato Grosso
do Sul, Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paran, So Paulo, Rio de Janeiro e
Esprito Santo.
A presena de ndios Guarani em regies to extensas se explica por
uma tradio
de migrao atribuda busca da Terra Sem Males7, informa Meli
(1992). Essa ampla
disperso populacional denuncia conseqentemente que a disperso da
lngua Guarani no
um fato contemporneo.
(...) do ponto de vista geogrfico e demogrfico, o Guarani era, s
vsperas da chegada dos europeus neste continente, a lngua mais
geral que se falava na bacia do Rio da Prata (...). Alm de, no
sculo XVI, dominar tambm vasta regio do interior dos atuais estados
do Sul do Brasil (MELI, 1992, p.37).
Pela disperso acima descrita, difcil estabelecer o nmero de
falantes do Guarani
(mesmo excluindo-se o Guarani paraguaio). Segundo Almeida &
Mura (2003)8, h no
Brasil perto de 90 reas Guarani oficialmente reconhecidas, afora
dezenas de outras com
maior ou menor informao e que, somente, em territrio brasileiro,
as estimativas da
populao Guarani giravam em torno de 34 mil pessoas para o comeo
desta dcada.
Citamos:
6 A palavra Pa }i-tavytera ) faz (...) clara alusion a su modo
de ser reliogioso: pa }i sera el ttulo com que dioses y habitantes
Del paraso saludan y se dirigen la palavra, y tavyter: (los futuros
habitantes del poblado del centro de la tierra). (MELI, 1992, p.
247). 7 Paraso mtico Guarani localizado ao leste, ao sol nascente,
segundo definio de Borges (2000). 8 Estas e outras informaes de
Almeida e Mura (2003) podem ser obtidas no site de ISA:
http://www.socioambiental.org/pib/epi/guarani_kaiowa/pop.shtm,
acesso em novembro de 2007.
-
8
Apesar da ausncia de recenseamentos ou pesquisas demogrficas
mais acuradas, h indcios, por amostragem de reas onde foi possvel
censo bem aplicado, de que os Guarani apresentem, de um modo geral,
altas taxas de fecundidade e crescimento populacional. No Brasil,
tomando-se por base, sempre, clculos aproximados, haveria
aproximadamente 34.000 indivduos, sendo entre 18.000 e 20.000
Kaiowa, entre 8.000 e 10.000 andeva e entre 5.000 a 6.000 Mbya,
localizados principalmente no Mato Grosso do Sul. Na Argentina a
populao guarani quase exclusivamente Mbya e concentra-se na
provncia de Misiones em torno de 4.000 pessoas. A populao Mbya
atual estaria, segundo essa projeo, em torno de 14.000 a 15.000
pessoas. Cada subgrupo e cada regio dentro dos territrios guarani
apresentaro, no entanto, especificidades quanto a sua situao
demogrfica ou na relao entre espao disponvel a uma determinada
comunidade e a extenso de terra existente. (ALMEIDA & MURA,
2003, p.1)
2.2 Os Kaiow: demografia e localizao
A populao Guarani (Kaiow e Nhandewa) em Mato Grosso do Sul,
segundo
Brand (1998), est distribuda em oito reservas e quatorze
aldeias, totalizando 22 reas
indgenas e estimada em 25 mil pessoas. Essas reas indgenas esto
situadas em uma
faixa de terra de cerca de 150 quilmetros de cada lado da regio
de fronteira do Brasil com
o Paraguai, o que compreende, hoje, a poro leste setentrional do
Paraguai e o Mato
Grosso do Sul.
O mapa abaixo aponta para a regio sul do Mato Grosso do Sul, na
fronteira do
Brasil com a Paraguai, e a imagem captada por satlite delineia o
territrio tradicional do
povo Kaiow.9
9 A pgina do site da FUNAI da qual retiramos o referido mapa e a
imagem de satlite:
http://www.funai.gov.br/ultimas/Brasil%20Indigena/Revista%20Funai_01.pdf
-
9
Fonte: FUNAI (2008).
Num outro mapa (Anexo A), podemos observar a localizao (com a
denominao)
de cada uma das reas indgenas Kaiow/Guarani no Mato Grosso do
Sul.
Vale ressaltar que temos a presena de grupos familiares Nhandewa
em
praticamente todas as reservas10 e aldeias da regio da Grande
Dourados11, especialmente
em duas reservas Porto Lindo, Jacare e Piraju. Os Nhandewa so os
nicos que se
autodenominam Guarani.
10 Segundo Brand (1998, p.21), o termo reserva designa extenses
de terra demarcadas pelo governo brasileiro entre os anos de 1915 a
1928. 11 L-se em Brand (1998, p. 21): A regio da Grande Dourados
compreende aqui um total de 30 municpios, localizados hoje dentro
do que, historicamente, considerado territrio tradicional
Kaiow/Guarani.
-
10
2.3 Aspectos scio-histrico-culturais dos Guarani Kaiow
Historicamente, os Kaiow tm buscado refgio nas regies de mata,
onde
constroem suas aldeias. A destruio destas aldeias est
relacionada diretamente ao avano
do desmatamento e implantao das fazendas.
Segundo Almeida e Mura (2003), os Guarani jamais se organizaram
no espao
territorial de forma homognea, estruturados em aldeias redondas,
semicirculares ou em
fileiras de casas como concebido no imaginrio do homem
ocidental. Os ava
contemporneos esto assentados em ncleos comunitrios constitudos
idealmente por
3 a 5 grupamentos macro familiares que conformam divises
autnomas por eles
denominadas, hoje em dia, de tekoha.12
Por intermdio de documentos da FUNAI (BRASIL, 2004), referimos
que:
Os Kaiow vivem organizados em parentelas (te'yi). Essa unidade
pode ser descrita como: a) um grupo de residncia, j que ocupa uma
parte das terras de uma aldeia -tekoha e detm uma noo clara da poro
de terra que ocupa; b) um grupo de atuao econmica, pois no seu
interior desenvolve-se intenso intercmbio de bens e servios, dentro
dos princpios que regem a economia de reciprocidade kaiow; c) um
grupo de atuao poltica, pois a base do sistema de representao por
intermdio do cabea de parentela (hiu), que rene seus descendentes e
aliados pelo carisma, representa-os e por eles fala nas reunies
gerais (aty), as quais renem os representantes de todas as
parentelas (teyi) que dividem uma mesma aldeia (tekoha), devendo
defender os interesses do seu grupo familiar acima de qualquer
outro interesse. (BRASIL, 2004)
12 De acordo com o documento da FUNAI (BRASIL, 2004), a palavra
tekoha, etimologicamente, composta pela fuso de teko, sistema de
valores ticos e morais que orientam a conduta social, ou seja, tudo
o que se refere natureza, condio, temperamento e carter do ser e
proceder Kaiow, e ha, que como sufixo nominador, indica a ao que se
realiza. Assim, tekoha, pode ser entendido como o lugar
(territrio), no qual uma comunidade Kaiow (grupo social composto
por diversas parentelas) vive de acordo com sua organizao social e
seu sistema cultural (cultura). (FUNAI 2004). Para o antroplogo
Pereira, o tekoha um espao prenhe de significados. Fora dos limites
do seu tekoha, sim, tudo est repleto de vazios, no h vida Guarani.
(PEREIRA, 1995, apud BRAND, 1998, p.23). Para alm deste tekoha
estaria apenas um lugar da imortalidade, a chamada Terra sem Mal
yvy mar ey, espao onde a condio humana abandonada, para que, no
homem, possa realizar-se a condio de deus (MELI, 1989, apud. BRAND,
1998, p 23).
-
11
Informamos o que acrescenta Pereira (1999) a respeito do
tekoha:
No discurso dos kaiow, os parentes consangneos aparecem como os
principais operadores na constituio e manuteno de uma parentela
teyi e mesmo do tekoha. Os casamentos realizam alianas com outros
grupos familiares, o que resulta na sua consolidao, ampliao e
fortalecimento. (PEREIRA, 1999, p.97).
Entre estes tekoha e por todo o territrio Guarani, processam-se
as mais variadas
formas de efervescente movimento de traslados, orientados por
relaes familiares. Esse
constante caminhar (oguata) pode representar visitas, mudanas,
passagem, casamentos
etc. Entretanto, esta movimentao no deve ser confundida com
migrao ou
nomadismo.
Na Aldeia Jaguapiru, circunvizinha cidade de Dourados (MS),
pudemos conhecer
uma moradia tipicamente Kaiow, a casa grande, denominada pela
comunidade de
tap////i gwasu (cabana grande) ou oga dZZZZekutu (casa fincada).
(cf. Foto de Cardoso, 2006).
A casa grande, construo tpica de numerosas tribos do grupo
Tupi-Guarani, dos elementos
mais imponentes da cultura material dos Kayov. (SCHADE. 1974, p.
26).
FOTO: por Valria Faria Cardoso (2006).
-
12
Tradicionalmente, os Kaiow so agricultores de floresta tropical,
praticando a caa
como principal fonte de alimento protico, sendo a pesca e a
coleta, atividades subsidirias.
O desenvolvimento de atividades produtivas est diretamente
conectado com as unidades
sociolgicas a partir das quais essa sociedade est
organizada.
De acordo com seus saberes tradicionais, os Kaiow conhecem e
fazem uso de
recursos de fauna e flora que ainda esto presentes no ambiente.
O grupo menciona e
classifica em sua prpria lngua um grande nmero de animais e
plantas, especificando suas
caractersticas, propriedades e formas de uso.
O calendrio econmico anual est intrinsecamente relacionado ao
calendrio das
festas e rituais religiosos. Alm do milho e da mandioca,
cultivam amendoim, alguns tipos
de feijes, cana-de-acar, cars, batatas, mbakuku (uma espcie de
tubrculo), e algumas
plantas frutferas como o mamo, a melancia e plantas introduzidas
como a manga, a
laranja e a banana. Cultivam tambm algumas espcies no comestveis
como o urucum, o
fumo e o algodo.
Os Kaiow so reticentes ao dar informaes sobre sua vida
cerimonial, mas
algumas cerimnias continuam a ser efetuadas, como ni )) ))mo ))
))ngarari, festa dos primeiros
frutos, realizada em janeiro. Tradicionalmente, ocorre a Festa
da Chicha que d-se por
meio de trabalhos coletivos que renem elementos de vrias
famlias. A chicha uma
bebida fermentada, de baixo valor alcolico, feita de milho, ou
ainda, de caldo de cana
fermentado, misturado com milho ou batata.
Segundo Schaden, o cultivo do milho, entre os Guarani, assume
importncia
incomparavelmente superior a qualquer outra espcie vegetal, uma
vez que, Todas as
atividades que se referem produo de milho constituem ou podem
constituir ensejo para
cerimnias religiosas, mormente entre os Kayov. [...] Em suma,
tudo o que diz respeito ao
milho se associa ao mundo sobrenatural. (SCHADEN, 1974, p.
37)
A tinta do urucum (RRRRuku }) tambm considerada sagrada entre os
Kaiow, que
ponderam sobre seu uso, uma vez que, o abuso pode acarretar
sanes sobrenaturais.
Schaden menciona o fato de que:
-
13
Todos os objetos cerimoniais dos Kayov, inclusive a cruz (kurus)
usada pelos homens e o basto (taku) das mulheres, o banquinho
(apyk) e o altar (yvyr), so esfregados com urucu depois de se
raspar um pouco a superfcie das peas para a tinta pegar melhor.
(SCHADEN, 1974, p.45).
Por fim, registramos o fato de que os Kaiow, em suas cerimnias
religiosas,
colorem tambm o rosto com uma camada de urucum.
2.4 Os Kaiow e sua nova realidade
O confinamento da populao Kaiow e Nhandewa dentro destas
reservas e aldeias
tem demonstrado ser uma poltica altamente desastrosa, no s para
este, mas tambm para
outros grupos indgenas, pois o crescimento demogrfico e sua
superpopulao aumentam a
presso extrativista dos recursos naturais, principalmente para o
preparo das roas
itinerantes que, aos poucos, vo extinguindo a vegetao natural,
provocando a degradao
do meio ambiente.
Conforme Teodoro (1998):
A situao dos Kaiow/Guarani modificou-se no momento em que suas
terras foram invadidas pela populao no-ndia: primeiro a explorao da
erva mate, pela Mate Laranjeiras e depois, a criao da poltica do
povoamento, promovida, pelo SPI a partir de 1915. Mais tarde, o
governo Vargas implantou um processo de colonizao dessas reas, no
projeto conhecido como marcha para o oeste, com o intuito de
proteger essas terras contra o avana dos estrangeiros. O propsito
era, tambm, o de incrementar a produo agrcola. Terras indgenas
invadidas, ataques armados por vingana, ndios escravizados por
fazendeiros, vivendo em condies subumana, foi o resultado desse
projeto governamental. (TEODORO, 1998, p.136)
-
14
De acordo com Brand13:
O confinamento dentro das Reservas, que atinge seu auge nas
dcadas de 1980 e 1990, cria uma realidade altamente complexa, onde
se destacam problemas novos como a superpopulao, a sobreposio de
aldeias e chefias, a restrio na mobilidade geogrfica, o gradativo
esgotamento dos recursos naturais, entre outros. Estes elementos
colocam em cheque antigas prticas e vivncias sociais, gerando a
necessidade de reordenao do modelo de organizao social, tendo em
vista absorver esta nova realidade. (BRAND, 2007. p.1).
e, assim sendo, Brand complementa que:
... junto com a perda do territrio, vieram as escolas e as
Igrejas Evanglicas, em especial as Igrejas Neopentecostais,
preocupadas em ajudar os ndios a viverem, ou melhor, a sobreviverem
em um cenrio no qual o seu modo de vida e seus saberes
historicamente acumulados pelos antepassados tornaram-se suprfluos
e imprestveis. Este processo histrico, extremamente desfavorvel aos
Kaiow/Guarani, est na base dos inmeros problemas atualmente
vivenciados por eles, destacando-se o intenso consumo de bebidas
alcolicas e o elevado nmero de suicdios. (BRAND, 2007, p.1)
Na opinio de Vietta, trata-se de:
... repensar o estatuto das lideranas polticas, as prticas
religiosas, a produo econmica, a concepo da famlia extensa como
elemento estruturador, frente a emergncia de um novo modelo de
organizao que se impe. Ou seja, procurar novos lugares para as
coisas, dar significado prprio a nova realidade. (VIETTA, 1997,
p.70).
A atual situao vivenciada, pelos Kaiow/Guarani de extrema
dificuldade, pois
so inmeros os problemas relacionados, particularmente, com a
quebra de valores e papis
tradicionais. Citamos:
13 O texto intitulado: Memria e Histria como elementos
fundamentais na formao dos professores indgenas Kaiow e Guarani de
Brand, est disponvel no site:
http://www.mestradoeducacao.ucdb.br/projeto21.htm. Acesso em
dezembro de 2007.
-
15
... alto ndice de suicdio e alcoolismo; a reproduo da organizao
familiar; as dificuldades para garantir a produo econmica, o que
gera um alto ndice de desnutrio, especialmente entre as crianas,
bem como a permanncia de um quadro generalizado de doenas
relacionadas direta ou indiretamente, baixa qualidade alimentar; a
macia entrada das Igrejas Neopentecostais, especialmente nestes
ltimos anos, frente desestruturao das prticas religiosas
tradicionais; o papel da escola formal e o baixo aproveitamento de
seus alunos, entre outros. (VIETTA & BRAND, 1998, p.11).
Os Kaiow/Guarani exercem trabalho assalariado realizado sob
forma de contratos
coletivos em usinas de produo de lcool, como cortadores de
cana-de-acar, ou ainda,
em fazendas (fora das reas indgenas), como cultivadores de
roas.
De acordo com Vietta & Brand (1998), os problemas atualmente
vivenciados pelos
Kaiow/Guarani esto intimamente ligados ao extremo contato deles
com a sociedade
envolvente, tendo, como conseqncias mais comuns: a perda de
parte significativa do
territrio tradicional; o confinamento de um grande contingente
populacional nas reservas
indgenas; a degradao ambiental das reas ocupadas e;
conseqentemente, a necessidade
de garantir a maior parte da economia fora da aldeia.
Gressler, em seu texto intitulado Aspectos histricos do
povoamento e da
colonizao do Estado de Mato Grosso do Sul de 1988, afirma
que:
Politicamente, os Kaiows (sic) nunca foram uma unidade, no
sentido em que encaramos um grupo como um todo, com um chefe nico.
O poder poltico estava diretamente relacionado s lideranas
religiosas, lideranas essa a cargo dos chefes de famlia extensas,
ou seja, quanto maior a famlia, maior o prestgio de seu lder,
prestgio este ampliado, se o lder fosse um grande Pa (chefe
religioso), cantador e curador. Assim, o poder poltico estava
dividido, embora essa organizao no implicasse num enfraquecimento
do grupo como totalidade. Com a penetrao das frentes econmicas da
sociedade nacional em sua rea, um desses lderes era escolhido para
servir de intermedirio entre Kaiows (sic) e civilizados, tomando,
posteriormente, o ttulo de Capito. (GRESSLER, 1988, p. 49).
-
16
Vietta (1998) confere representao simblica das aldeias, para as
comunidades
indgenas Kaiow/Guarani14, como sendo um espao que no oferece
mais as condies
necessrias para a reproduo das relaes sociais que ainda esto
presentes no imaginrio
destas comunidades. Segundo a autora:
Neste novo quadro, os caciques passam a ocupar uma posio
secundria, no lhes cabendo mais o envolvimento em questes polticas
ou de carter mais estrutural. Nas reservas, e menos nas aldeias
menores, os rituais (rezas) que deveriam ser cotidianos acontecem
com pouca freqncia, e quando ocorrem, atraem um pequeno nmero de
pessoas, na maioria, ligadas ao grupo familiar do rezador. (...) Os
rituais de passagem foram abandonados e o papel dos rezadores nas
prticas de cura tambm foi profundamente relativizado. Alguns
atribuem o abandono das rezas ou prticas de cura ao fato dos
caciques utilizarem bebidas alcolicas industrializadas durante os
rituais, porm, este apenas um dos elementos neste quadro de mudana.
(VIETTA, 1998, p. 56-57).
2.5 Filiao gentica e estudos lingsticos prvios sobre o Guarani e
o Kaiow
Do ponto de vista gentico15, o Kaiow considerado dialeto da
lngua Guarani,
pertencente ao subgrupo I da famlia Tupi-Guarani. Esta famlia
constituda de um
conjunto de lnguas que se reconhece descenderem de uma lngua
anterior, neste caso pr-
colombiana e no documentada historicamente. Convencionou-se
chamar Proto-Tupi-
Guarani a lngua ancestral da famlia Tupi-Guarani, sendo sua
existncia concluda a partir
de correspondncias sistemticas entre os sons, as gramticas e os
vocabulrios das lnguas
desta famlia.
A famlia Tupi-Guarani e outras nove famlias lingsticas indgenas
so
reconhecidas como aparentadas geneticamente num nvel mais
remoto, constituindo um
conjunto adjacente, a que se chama tronco lingstico, nesse caso
o tronco Tupi.
14 Vietta (1998), ao utilizar a expresso Kaiow/Guarani,
refere-se aos aspectos comuns aos dois grupos Guarani que vivem no
Mato Grosso do Sul, os Kaiow e os Nhandewa. 15 Critrio lingstico
que permite classificar as lnguas em conjuntos com origem comum
mais prxima ou mais remota, as 180 lnguas indgenas brasileiras se
distribuem por pouco mais de 40 conjuntos, a que se costuma dar o
nome de famlias lingsticas. (Rodrigues, 1999).
-
17
No que se refere lngua Guarani, devemos considerar a priori a
distino
comumente feita entre Guarani Antigo e Guarani Atual.
Grannier, em sua tese intitulada Aspectos da morfossintaxe do
Guarani Antigo,
assume o termo Guarani Antigo como sendo:
... a denominao corrente para as variedades da lngua Guarani
faladas e documentadas nos sculos XVII e XVIII em regies sob o
controle da Coroa Espanhola, que correspondem hoje ao norte da
Argentina (Provincia de Misiones), ao Paraguai e ao oeste do Sul do
Brasil (Estados do Paran a Rio Grande do Sul). (GRANNIER, 2002, p.
5).
Devido disperso geogrfica, demogrfica e lingstica do Guarani,
acreditamos
no ser possvel estudar o Guarani Atual, seno tratando de cada
falar especificamente: o
dos Kaiow, dos Nhandewa ou dos Mby.
Segundo Rodrigues (1984/5a), a famlia Tupi-Guarani um grupo de
moderada
diferenciao interna, dentro do qual se podem distinguir pelo
menos oito subgrupos. O
primeiro subgrupo da famlia Tupi-Guarani constitudo pelo Guarani
Antigo e pelas
lnguas e/ou dialetos Mby, Xet, Nandva, Kaiw, Guarani Paraguaio,
Guayab, Tapiet,
Chiriguano e Izoceo. (RODRIGUES, 1984/5, p.27)
Para alm da classificao gentica do Guarani, tido como lngua, e
do Kaiow, tido
como dialeto desta lngua, podemos considerar relevantes outros
critrios em busca de uma
melhor definio para o que vamos considerar o Kaiow, lngua ou
dialeto.
Consideramos que em se tratando de linguagem indgena, a distino
entre lngua e
dialeto necessita ter seus termos revistos. Guedes (1991) afirma
que: "em relao aos povos
autctones ou s minorias tnicas do Brasil dificilmente questes
relativas distino entre
lngua e dialeto so colocadas. Assume-se que so lnguas"
Ao tratar das classificaes genticas das lnguas indgenas do
Brasil, Rodrigues
expe que: Se as lnguas de um mesmo subgrupo, ou mesmo de
subgrupos distintos
devem ser chamadas de "lnguas" distintas ou de "dialetos" de uma
mesma "lngua"
-
18
questo muito relativa, porque relativos so os conceitos de
"lngua". (RODRIGUES,
1984/5b, p.1). 16
Do ponto de vista poltico-social, a relatividade entre
considerar o Kaiow uma
lngua ou um dialeto Guarani, assume propores nada relativas, uma
vez que a
denominao do falar assume um papel importante nas reivindicaes
culturais e polticas
dos povos indgenas. Citamos alguns aspectos que esto diretamente
ligados identificao
da linguagem dos Kaiow e que devem ser garantidas: a reconquista
de terras, a busca da
auto-identificao, a valorizao de sua cultura e o desenvolvimento
de sua lngua.
Como se tem visto, a questo da delimitao lngua/dialeto mais uma
questo
poltica do que lingstica, ou seja, o que faz uma variedade
lingstica adquirir status de
lngua o desenvolvimento cultural e o reconhecimento do povo que
a utiliza.
Ressaltamos, aqui, que os Kaiow auto-denominam sua fala como
sendo lngua
Kaiow. Assim sendo, doravante, assumimos que a variedade falada
por 20 25 mil
Kaiow, que vivem no Mato Grosso do Sul (Brasil), a lngua
Kaiow.
2.5.1 Estudos realizados sobre o Guarani
Os primeiros estudos da lngua Guarani datam j do sculo XVI, mas
o primeiro
trabalho publicado, e de grande envergadura, foi a obra do
missionrio jesuta Antonio Ruiz
de Montoya, distribuda em dois conjuntos: Tesoro de la lengua
Guarani (Madrid, 1639) e
Arte y Vocabulario de la lengua guarani (Madrid, 1640). A Arte
de Montoya serviu de
base para publicaes de uma nova gramtica do Guarani, nas prprias
misses jesuticas,
em 1724, por obra de Pe. Paulo Restivo (cf. Meli, 1992). O
Guarani, da poca das misses
jesuticas, operou como lngua geral em uma significativa parcela
dos domnios espanhis
at o sculo XVIII, includo parte do sul do Brasil.
16 O texto intitulado: As Lnguas Gerais Sul-Americanas. de Aryon
Rodrigues (1984/5b), est disponvel no
site: http://www.unb.br/il/lablind/lingerais.htm, acesso em: 20
de novembro de 2007.
-
19
Segundo Grannier (2002), na primeira metade do sculo XX, foram
publicadas
diversas gramticas e dicionrios do Guarani, como por exemplo, El
Idioma Guarani, do
padre Antonio Guasch, em 1944, no Paraguai; Breve Diccionrio
Guaran-Castellano
Castellano-Guaran, de Antonio Ortiz Mayans, em 1941, na
Argentina; El idioma guarani
metodo practico para la enseanza elemental, de Eduardo Saguier,
em 1946, na Argentina.
De acordo com Grannier (op. cit), nas ltimas dcadas, outros
dicionrios e
gramticas foram publicados sobre a lngua Guarani: Diccionrio
guaran-espaol y
espaol-guaran, de Peralta e Osuna (1950); La Gramtica de la
Lengua Guarani, de
Krisvoshein de Canese (1983); Gran Diccionario, de Ortiz Mayans
(1990); Guarani a su
alcance, de Meli (et. al. 1992) e a importante obra La lengua
guarani del Paraguai
(1992), tambm de Meli. Para a autora, nessa obra Meli faz um
admirvel estudo da
histria da lngua guarani, analisando as mudanas sociolingsticas
ocorridas no Paraguai
em conseqncia do contanto com o guarani e o espanhol. (GRANNIER,
2002, p 35).
Num outro texto intitulado: O Guarani: uma bibliografia
etnolgica, Meli, Saul &
Muraro (1987, apud GRANNIER, op. cit) elencam vrios tipos de
estudos e a quantidade
de publicaes disponveis sobre o Guarani.
No que se refere a outros trabalhos de anlise do Guarani
realizados com objetivos
cientficos, destacamos aqui o trabalho de Emma Gregores e Jorge
Surez, publicado em
1967, com o ttulo A Description of Colloquial Guarani, referente
ao Guarani paraguaio, o
de Maura Velzquez-Castillo, tambm sobre o Guarani paraguaio,
publicado em 1996, o
livro intitulado The Grammar of Possession: Inaliability,
Incorporation and Possessor
Ascension in Guarani e os trabalhos de Grannier: Fonologia do
Guarani Antigo, de 1990 e
Aspectos da Morfossintaxe do Guarani Antigo, de 2002.
2.5.2 Estudos lingsticos sobre o Kaiow
Atualmente, as comunidades indgenas da Regio da Grande Dourados,
em suas
escolas de ensino bilnge, utilizam a Conveno Ortogrfica Guarani
adotada pelo
Ministrio de Educao do Paraguai (oficializada neste pas na dcada
de 50), alm de
-
20
tomarem gramticas oriundas desta lngua17 como modelo no processo
ensino
aprendizagem, o que evidencia a necessidade de se consolidar um
estudo sistemtico do
dialeto Kaiow, que busque fundamentar o fortalecimento da
identidade cultural deste
povo.
Os estudos lingsticos sobre o Kaiow, de modo geral, so poucos.
Os principais
materiais existentes foram escritos por membros do Summer
Institute of Linguistics (SIL).
No Brasil, os principais estudos lingsticos realizados pelos
missionrios so: Bridgeman
(1960, 1961 e 1981) e Harrison & Taylor (1958 e 1971) e
Taylor & Taylor (1966a) e um
vocabulrio mdico pode ser encontrado em Garcia (2000).
Narrativas em Kaiow podem
ser encontradas em Taylor & Taylor (1966b), em Taylor (1997)
e em Garcia (2003).
Apresentamos, sumariamente, os assuntos tratados em alguns
destes textos, dentre outros.
Bridgeman escreveu os artigos intitulados: Kaiw (Guarani)
phonology (1961) e A
.ote on Stress in Kaiw (1960). Naquele, a autora trata de vrios
aspectos da estrutura
fonolgica, tais como: os fonemas com atestao, descrio,
especificao inter-fonmica,
aspectos da prosdia, fatores paralingsticos, acento, ritmo,
entre outros; neste, Bridgeman
discute a tenso entre acento lexical e acento sentencial de
discursos (textos) em
Kaiow.
Bridgeman escreveu o livro O Pargrafo na fala dos Kaiw-Guarani
(1981), em
que descreve aspectos relativos ao discurso (texto), perodo e
pargrafos gramaticais do
Kaiow, com enfoque tagmmico.
John Taylor, em 1984, publica dois artigos sobre o Kaiow, um
intitulado
Marcao temporal na lngua kaiw e outro A interrogao na lngua
kaiw. Num outro
artigo intitulado .asalization in Kaiw (1971), Taylor trabalha
com Harrison, e fazem
referncia ao processo de retrocesso de nasalizao em Kaiow, isto
, as vogais orais que
antecedem uma vogal nasal tnica no se nasalizam. Para esses
autores, nasalidade tida
como um trao pertencente aos morfemas, tidos como unidades
super-segmentais.
17 Citamos algumas destas Gramticas do Guarani do Paraguai:
Guasch (1996); Ortiz (1994) e Guasch & Ortiz (1991).
-
21
Harrison & Taylor antes de tratarem de aspectos relativos ao
processo de
nasalizao em Kaiow, escreveram o texto intitulado Kaiw phonemes
and syllable
struture, em 1958.
O livro intitulado .hande rembypy: Nossas origens, organizado
por Garcia (2003)
compe transcries e tradues de textos da cultura Guarani,
produzidos pelo ndio
Kaiow, Aniceto Ribeiro.
Temos o conhecimento de dois livros produzidos por falantes
Kaiow/Guarani: o
primeiro livro18: Upicha rohai: ore kuatia e'e peteha, por
Gonsalves et al. (1993)
constitudo de 35 textos que abrangem aspectos histricos, sociais
e culturais dos falantes
desta lngua e o segundo: Tesai ome' vy'a: sade d alegria, por
Peralta et al. (1998)
disserta, basicamente, sobre a preveno da populao indgena quanto
contaminao por
doenas sexualmente transmissveis.
Em Cardoso (2001), sob o ttulo Um estudo de categorias
sintagmticas da lngua
Kaiow/Guarani, realizamos um estudo sobre categorias
sintagmticas amparada no
modelo de Princpios e Parmetros da Teoria da Gramtica Gerativa
(Chomsky, 1986),
correlacionando-o aos estudos sobre a tipologia das lnguas
(Greenberg, 1966). Neste
trabalho, tomamos como objeto especfico de estudo a ordenao
paramtrica (Stowell,
1989) das categorias sintagmticas lexicais: SN, SV, SA e SP, e
funcionais: SFl (SAgr e
ST) e SDet.
Em 2005, Jos Filho defende a tese intitulada A Performatividade
na Linguagem
da resistncia Kaiow/Guarani, na qual trata da resistncia
cultural e lingstica
implementada pelos Kaiow como objeto de anlise no domnio da
performatividade da
linguagem.
Lembramos, tambm, dos trabalhos de anlise lingstica realizados
para o Mby,
por Guedes (1991) e por Martins (1996 e 2003) e para o .handewa,
por Costa ( 2003a e
2003b) e por Dooley (1982a, 1982b, 1991a, 1991b e 1999).
Destacamos, por fim, que a anlise dos dados, a formulao e a
verificao de
nossas hipteses teve o suporte terico lingstico baseado na j
mencionada perspectiva 18 Os autores dos livros em Kaiow, assim
como, as escolas indgenas da Regio da Grande Dourados adotam uma
grafia semelhante grafia do Guarani paraguaio de forma consensual e
no convencionada.
-
22
tipolgico-funcional, e que a pesquisa lingstica, tambm, contou
com leituras sobre outras
lnguas amerndias, tais como: Kamaiur, por Seki (2000, 1990);
Ikpeng, por Pachco
(2001); Guarani Antigo, por Grannier (2002); Tupinamb, por
Rodrigues (1990, 1996);
Panar, por Dourado (2001); Aguaruna, por Corbera (1994, 1998);
Kadiwu, por Sndalo
(1997 e 2004); Av-Canoeiro, por Borges (2006); Shanenaw, por
Cndido (2004);
Wapixana, por Santos (2006); Kinikinau, por Souza (2008);
Satere-Maw, por Silva
(2005); Asurini do Xingu, por Pereira (2004); entre outros.
No captulo que segue, tratamos da metodologia e tcnicas
utilizadas na pesquisa
lingstica de campo.
-
3 COSIDERAES SOBRE A PESQUISA LIGSTICA
A pesquisa lingstica realizada in loco baseada numa metodologia
de trabalho de
campo proposta por autores descritivistas como: Kibrik (1977);
Comrie & Smith (1977);
Bouquiaux (1992); Samarin (1967); entre outros.
Segundo Samarin (1967), o trabalho lingstico de campo ,
principalmente, um
modo de obter dados para a anlise de fenmenos lingsticos, que
envolve consideraes
sobre os aspectos: comunidade comportamento scio-cultural;
participantes o(s)
informante(s) (falante nativo) e pesquisador lingstico
envolvidos por meio de contato
social, alm de consideraes a cerca da metodologia a ser usada
durante a pesquisa de
campo.
Acreditamos que o corpus lingstico no deve ser reduzido a
processos mecnicos
para a anlise de estruturas gramaticais, bem como os textos
coletados no devem obter
tradues literais. Primamos pelos diferentes tipos de obteno de
dados em busca da mais
completa caracterizao do corpus lingstico.
3.1 Metodologia e Tcnicas da Pesquisa de Campo
Nossa pesquisa lingstica sobre a lngua Kaiow foi realizada junto
s
comunidades indgenas Jaguapiru e Boror, ambas aldeias
circunvizinhas ao municpio de
Dourados, e na reserva indgena de Caarap. O povo Kaiow vive em
22 comunidades
indgenas na Regio da Grande Dourados, Estado de Mato Grosso do
Sul (Brasil). Segundo
Brand (1998), a populao Kaiow, no estado, estimada entre 20.000
e 25.000 pessoas.
As tcnicas de coleta de dados envolvem sempre a observao e
compreenso
seletiva por parte do investigador, no entanto, especificamos
melhor outros aspectos das
tcnicas que foram por ns utilizadas nesta etapa da pesquisa:
i ) tcnica de elicitao de nomes de objetos e conceitos que
pertencem
competncia do informante. Tal tcnica valoriza a nomeao por meio
de palavras
contextualizadas;
-
24
ii ) tcnica de elicitao interativa, que possibilitara a coleta
de textos por meio de
perguntas de tipo: O que isto?; Como feito isto?; Como chama
esta parte?; A mulher
pode usar isto?; entre outras;
iii ) tcnica de elicitao por meio de questionrio previamente
elaborado. Tal
questionrio possibilitou a coleta de paradigmas mais completos
cerca da morfologia
flexional de nomes e verbos Kaiow; entre outros, e
iv) tcnica de utilizao de material de apoio que permitam a
coleta de maior
variedade na nomeao, como por exemplo: livros com imagens do
corpo humano; fotos de
familiares; livros com imagens diversas, entre outros;
Destacamos que a coleta de dados foi realizada, principalmente,
por meio de
gravaes de textos produzidos numa situao bastante natural, pois
assim, nos
asseguramos do real uso da intuio lingstica do falante. Entre os
tipos textuais podemos
mencionar os mitos, as histrias pessoais, costumes, relatos do
cotidiano da comunidade,
entre outros.
Por fim, vale mencionar que, por meio da tcnicas (no. iii ),
coletamos dados de
assuntos especficos, cuja anlise ainda no estava suficientemente
esclarecida.
Fez parte de nossos procedimentos metodolgicos a seleo de
informantes, pois os
falantes, com os quais realizamos a pesquisa lingstica, foram
aqueles que se auto-
identificaram como pertencentes ao grupo indgena Kaiow.
Realizamos a gravao de nossos dados com o auxlio de diferentes
tipos de
equipamentos. Utilizamos, simultaneamente, um gravador analgico,
com uso de fitas
cassetes; um gravador digital e um notebook, no qual instalamos
o programa computacional
audacity19, que nos possibilitou a coleta de dados em wave, esse
operando como elemento
facilitador na etapa de transcrio dos dados. A utilizao
precavida de diferentes tipos de
equipamentos nos permitiu a obteno de dados com qualidade
acstica, uma vez que,
falhando um dos equipamentos, o(s) outro(s) continuava(m) a
captar os dados.
Coletamos dados falados por pessoas do sexo feminino e
masculino, de diferentes
faixas etrias. Num segundo momento, realizamos, em conjunto com
professores indgenas
19 Este programa computacional pode ser obtido por meio do site:
http://audacity.sourceforge.net/download/.
-
25
bilnges, parte da transcrio e da elaborao de glosas lingsticas
e, por fim, a anlise
dos dados pode ser feita como o apoio destes profissionais.
Ressaltamos, por fim, a
generosidade e a sabedoria deste povo.
3.1.1 O Corpus
O corpus utilizado na anlise consiste em um conjunto de dados
coletados em
diferentes momentos da pesquisa de campo. Dados coletados, entre
os anos 1998 a 2000,
foram, previamente, por ns utilizados na anlise resultante na
dissertao de mestrado
intitulada Um estudo de categorias sintagmticas da lngua
Kaiow/Guarani, (Cardoso,
2001). Estes dados, especificamente, foram coletados junto aos
falantes Kaiow que vivem
na Reserva Indgena Caarap, municpio de Caarap-MS. Os dados
coletados, entre 2003 a
2006, foram coletados junto a falantes Kaiow das aldeias
Jaguapir e Boror,
circunvizinhas cidade de Dourados-MS e junto a uma informante da
comunidade indgena
de Amambai, municpio de Amambai-MS.
O conjunto de dados coletados em pesquisa lingstica de campo
incluem textos,
questionrios previamente elaborados e dados elicitados, o que
gera um relevante banco de
dados da lngua Kaiow.
3.1.2 Colaboradores
Para obteno de dados lingsticos contamos com o apoio e auxlio de
vrios
falantes da lngua Kaiow, todos bilnges (Kaiow Portugus). Em
relao coleta de
dados coletados na Reserva de Caarap, pudemos contar com o
auxlio dos professores
Kaiow:
1. Alcio Soares Martins (professor da Escola Mbokaja)
2. Rogrio V. Mota (professor da Escola Loides Bonfim)
3. Eliel Benites (professor da Escola .handejara)
4. Ldio Cavalhero Veron (professor da Escola Mbokaja)
-
26
Quanto obteno de dados nas aldeias circunvizinhas cidade de
Dourados,
pudemos contar com outros colaboradores tambm bilnges (Kaiow
Portugus):
5. Helio Jorge da Silva (.ha)nderu - chefe espiritual de uma
parentela)
6. Floriza de Souza Filho (.ha)ndesy auxiliar em trabalhos
espirituais e esposa do
.ha )nderu)
7. Ernesto Fernandes Ortiz ( Professor da Escola Ara Por)
Em Amambai, contamos com a colaborao da professora Kaiow:
8. Elda Vasques Aquino (nica informante da aldeia de
Amambai-MS)
3.2 Apresentao dos dados no corpo do trabalho
A presente tese conta com dados do Kaiow transcritos
foneticamente, na primeira
linha. Na segunda, apresentamos uma transcrio morfofonolgica, em
que as palavras
morfossintticas esto separadas por espaos, os morfemas afixais
por hfen (-) e os clticos
por meio do sinal (). Por fim, a terceira linha traz as glosas e
uma traduo livre que se
encontra alinhada direita, entre aspas simples.
Como mencionamos anteriormente, nossa proposta de sistematizao
da fonologia
Kaiow (Cardoso, 2007) encontra-se em anexo. Por ora, expomos
quadros snteses desta
proposta.
O sistema fonolgico consonantal do Kaiow constitudo de quinze
fonemas,
sendo: cinco obstruntes, cinco sonorantes e outros cinco fonemas
contnuos. Apresentamos
o lugar de articulao de cada fonema no quadro (1) abaixo:
-
27
Quadro 1. Consoantes
O Kaiow tem um sistema de seis vogais que podem ser orais ou
nasais:
Quadro 2. Vogais
VOGAIS ORAIS VOGAIS NASAIS
Anterior Central Posterior Anterior Central Posterior
Fechada i u
Aberta e a o
Fechada i )) )) )) )) )) )) )) )) u )) )) )) ))
Aberta e )) )) )) )) a )) )) )) )) o )) )) )) ))
No quadro (3), apresentamos os fonemas, seus fones (ou alofones)
e exemplos
respectivos realizao de cada um desses fones.
Quadro 3. Realizao e representao dos fonemas
Fonema Fone/alofone Realizao Fontica e Fonolgica traduo
/ p / [ p ] [p/eta] /p/eta/ caracol
/ t / [ t ] [taRavE] /taRawe/ barata-do-mato
/ k / [ k ] [m )k )j )] /moko ) / dois
/ kw / [ kw ] [kwaa] /kwaa/ saber
/ / / [ / ] [s/] /so/o/ carne
/ m / [ m ]
[ mb ]
[ b ]
[ku)nu)mi] )
[tuku)mb]
[bopiRi] ~ [mbopiRi]
/kunumi)/ /tuku)mo/
/mopiRi/
menino
corda
morcego
/ n / [ n ]
[ nd ]
[ d ]
[Si)Ri)no )]
[ma )nddZu]
[de] ~ [nde]
/SiRino )/
/ma )niu/
/ne/
beija-flor
algodo
vo