LEONARDO LUCAS DO NASCIMENTO SIQUEIRA CARACTERIZAÇÃO CITOARQUITETÔNICA E NEUROQUÍMICA DO SISTEMA DOPAMINÉRGICO MESENCEFÁLICO DE TARTARUGA MARINHA (Chelonia mydas) Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Biologia Estrutural e Funcional da Universidade Federal do Rio Grande do Norte Natal-RN 2018
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CARACTERIZAÇÃO CITOARQUITETÔNICA E NEUROQUÍMICA DO … · Siqueira, Leonardo Lucas do Nascimento. Caracterização citoarquitetônica e neuroquímica do sistema dopaminérgico
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LEONARDO LUCAS DO NASCIMENTO SIQUEIRA
CARACTERIZAÇÃO CITOARQUITETÔNICA E NEUROQUÍMICA DO
SISTEMA DOPAMINÉRGICO MESENCEFÁLICO DE TARTARUGA
MARINHA (Chelonia mydas)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Biologia Estrutural e Funcional
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte
Natal-RN
2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE BIOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE MORFOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA ESTRUTURAL E
FUNCIONAL
CARACTERIZAÇÃO CITOARQUITETÔNICA E NEUROQUÍMICA DO
SISTEMA DOPAMINÉRGICO MESENCEFÁLICO DE TARTARUGA
MARINHA (Chelonia mydas)
ORIENTADORA
Simone Almeida Gavilan
CO-ORIENTADOR
Expedito Silva do Nascimento Júnior
Natal-RN
2018
Siqueira, Leonardo Lucas do Nascimento. Caracterização citoarquitetônica e neuroquímica do sistemadopaminérgico mesencefálico de tartaruga marinha (Cheloniamydas) / Leonardo Lucas do Nascimento Siqueira. - Natal, 2018. 75 f.: il.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grandedo Norte. Centro de Biociências. Programa de Pós-Graduação emBiologia Estrutural e Funcional. Orientadora: Profa. Dra. Simone Almeida Gavilan. Coorientador: Prof. Dr. Expedito Silva do Nascimento Júnior.
1. Quelônio - Dissertação. 2. Sistema nervoso - Dissertação.3. Citoarquitetura - Dissertação. 4. Neurotransmissores -Dissertação. 5. Dopamina - Dissertação. I. Gavilan, SimoneAlmeida. II. Nascimento Júnior, Expedito Silva do. III. Título.
RN/UF/BSE-CB CDU 598.13
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Leopoldo Nelson - Centro de Biociências - CB
Elaborado por KATIA REJANE DA SILVA - CRB-15/351
LEONARDO LUCAS DO NASCIMENTO SIQUEIRA
CARACTERIZAÇÃO CITOARQUITETÔNICA E
NEUROQUÍMICA DO SISTEMA DOPAMINÉRGICO
MESENCEFÁLICO DE TARTARUGA MARINHA (Chelonia mydas)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Biologia Estrutural e Funcional da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Aprovado em: 15 de maio de 2018.
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
Profa. Dra. Simone Almeida Gavilan
____________________________________
Prof. Dr. Expedito Silva do Nascimento Júnior
____________________________________
Prof. Dr. Flávio José de Lima Silva
Natal-RN
2018
AGRADECIMENTOS
Agradeço antes de tudo ao meu Deus que criou situações que me levaram a participar da
seleção de mestrado PPGBIOEF e por isso estou escrevendo esses agradecimentos agora. A
Ele toda glória e louvor por todas as coisas que faz, pela vida, por sua graça, amor e salvação.
Tudo começou no IFRN com a professora Mônica Almeida, irmã gêmea da professora
Simone. Então serei sempre grato pelo carinho e consideração que teve. Uma pessoa incrível
e sempre pronta a ajudar. Obrigado pela pessoa que és.
Por vários amigos do curso de Comércio Exterior que me incentivaram a seguir em frente em
um novo desafio. Em especial a minha amiga Regirlane e sua mãe, que me deram muito apoio
com conversas e orações.
A professora Simone Almeida que me recebeu muito bem no laboratório e aceitou me
orientar, me confiando desenvolver a pesquisa de um projeto desafiador e de muita
importância. Sou muito grato pela pessoa que és e a tenho como referência.
A minha amiga Alana, que me ajudou durante o processo seletivo para o mestrado. Ajudando-
me a revisar todo o assunto, mesmo não sendo da área. Obrigado pelo tempo que dedicou em
me ajudar.
Agradeço a toda equipe do Projeto Cetáceos da Costa Branca/UERN que acabou contribuindo
de várias maneiras para o desenvolvimento do projeto. Em especial aos que durante a
necropsia, retiraram os encéfalos utilizados neste trabalho. Sei o quanto é trabalhoso, obrigado
pela contribuição de vocês.
Obrigado a todos que fazem parte do laboratório de Morfofisiologia Comparada dos
Vertebrados. Obrigado a Rafael, Rebeca, Raquel e Silmara pelo tempo que vocês ofereceram
para me ajudar durante os procedimentos de laboratório.
Agradeço ao meu co-orientador, professor Expedito Nascimento, pelas orientações e pela
disponibilidade do laboratório de Neurociências (Labneuro). Sou grato a todos que fazem
parte do Labneuro, em especial, gostaria de destacar Regina pelo auxílio com os reagentes, a
Hélder, que deu o pontapé inicial e me ensinou como fazer os procedimentos, a Paulão, que
dedicou um pouco de seu tempo nas férias e me socorreu quando eu estava perdido na
imunoistoquima. Muito obrigados a todos.
Obrigado a minha família, pelo apoio. Em especial aos meus pais que sempre investiram na
educação de seus filhos. Obrigado mãe por criar todo o ambiente favorável para eu conseguir
me concentrar e por te levado café para mim todo o tempo (risos).
Agradeço a todos que de alguma forma contribuiu para que isso fosse possível.
LISTA DE ABREVIATURAS
CA: Catecolamina
DA: Dopamina
FLM: Fascículo longitudinal medial
GC: Griseum centrale
IP: Núcleo interpendicular
IS: Núcleo istmico
ISMC: Núcleo ístmico pars magnocelular
ISPC: Núcleo ístmico pars parvocelular
NIDT: Decussação tegmental do núcleo intersticial
nIII: Núcleo do nervo oculomotor
nIV: Núcleo do nervo troclear
nPM: Núcleo profundo mesencefálico
PV: Pendúnculo ventral do fascículo prosencefálico lateral
RA8: Homólogo reptiliano do grupamento A8 em mamíferos
Rs: Núcleo reticular superior
Ru: Núcleo rubro
SGC: Stratum griseum centrale
SGF: Stratum griseum et fibrosum superficiale
SGP: Stratum griseum profundum
SN: Substância negra
SNc: Subsância negra, pars compacta
SNr: Subsância negra, pars reticulata
SO: Stratum opticum
TSC: Núcleo central do torus semicircular
TT: Tracto tecto-talâmico
VTA: Área tegmental ventral
LISTA DE FIGURA
Figura 1. Síntese de dopamina, as enzimas envolvidas e sua liberação na fenda sináptica.
As meninges cobrem o encéfalo. A meninge externa ou duramáter é mais forte que a
meninge interna ou piamáter. Esta última é delicada e se encontra intimamente ligada à
superfície do encéfalo. Uma região vascular no encéfalo, conhecida como tela corióidea,
TE
LE
NC
ÉF
AL
O
DIE
NC
ÉF
AL
O
CÉREBRO
MÉDIO
1
2
4
3
4
5
6
7
2
ME
SE
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AL
O
ME
TE
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AL
O
MIE
LE
NC
ÉF
AL
O
VISÃO POSTERIOR VISÃO ANTERIOR
9
CÉREBRO ANTERIOR CÉREBRO POSTERIOR
8
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produz o líquido incolor cefalorraquídeo. Este líquido circula através dos ventrículos e
alcança os espaços epidurais (acima da dura-máter) e subdurais (abaixo da dura-máter) para
banhar o encéfalo (WYNEKEN, 2001).
Inicialmente, o encéfalo tem forma de tubo, mas logo sofre várias modificações ao
longo de sua extensão para dar origem as estruturas observadas em tartarugas adultas. Os
ventrículos laterais, terceiro e quarto ventrículo e aqueduto cerebral, por sua vez, são todos
vestígios da cavidade neural que permanecem nos adultos. Durante a ontogenia, o encéfalo é
proporcionalmente maior em recém-nascidos e juvenis que em subadultos e adultos
(WYNEKEN, 2001).
Embora existam trabalhos que descrevam a anatomia do SNC de tartarugas marinhas,
os que descrevem a citoarquitetura do seu encéfalo são inexistentes. Nesse sentido, o presente
trabalho utiliza animais provenientes de encalhes e que vieram à óbito para vencer essa
dificuldade. As primeiras descrições da citoarquitetura do encéfalo de tartarugas marinhas são
feitas na região mesencefálica e investigando os grupamentos neuronais dopaminérgicos,
assim como, da orientação de suas fibras. A investigação dos grupamentos neuronais
dopaminérgicos do mesencéfalo em tartaruga marinha é importante por fornecer informação
do sistema dopaminérgico em um grupo reptiliano, aumentando, assim, o entendimento
acerca do sistema nervoso em répteis. Além de providenciar informação útil no entendimento
das similaridades das estruturas nervosas entre os diferentes grupos de vertebrados.
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2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo geral
Caracterizar morfologicamente os núcleos mesencefálicos imunorreativos a
Tirosina Hidroxilase de tartaruga marinha.
2.2. Objetivos específicos
Identificar os núcleos neuronais imunorreativos a Tirosina Hidroxilase no
mesencéfalo de tartarugas marinhas;
Descrever a morfologia dos neurônios imunorreativos a Tirosina Hidroxilase
presentes no mesencéfalo de tartarugas marinhas;
Delimitar a citoarquitetura dos núcleos mesencefálicos imunorreativos a
Tirosina Hidroxilase a partir do método de Nissl.
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3. MATERIAIS E MÉTODOS
3.1. Área de coleta
O trabalho desenvolvido integrou um projeto maior intitulado “Monitoramento de
Praias do Litoral Potiguar/Cearense e Embarcado da Biota Marinha, em especial sobre
Mamíferos Marinhos e Quelônios”, resultante de uma condicionante ambiental exigida pelo
IBAMA à PETROBRÁS decorrente de indicação do Parecer Técnico
CGPEG/DILIC/IBAMA através do contrato de número 2500.005657510.2.
A pesquisa foi realizada em praias do litoral Noroeste do Rio Grande do Norte e
Ceará, entre os municípios de Caiçara do Norte - RN (5° 4'1.15"S; 36° 4'36.41"O) e
Icapuí/CE, (4°38'48.28"S; 37 °32'52.08"O), perfazendo uma extensão aproximada de 344 km
(Figura 12).
Figura 12. Localização da área de estudo, Bacia Potiguar, RN, Brasil.
3.2. Modelo experimental
Foram utilizados neste trabalho quatro encéfalos de tartarugas marinhas pertencentes a
espécie Chelonia mydas (Linnaeus, 1758) (Figura 13). Cada indivíduo recebeu um código de
identificação (TA1, TA2, TA3 e TA4). Dois eram machos e duas eram fêmeas. De todos,
apenas TA1 era adulto e os demais eram animais juvenis.
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C. mydas é uma espécie ameaçada de extinção de acordo com a lista da IUCN (2018).
É importante salientar que nenhum animal sofreu eutanásia neste estudo, foram utilizados
apenas os animais que vieram a óbito.
Figura 13. Exemplar juvenil da espécie Chelonia mydas. Fonte: WWF, 2018
De sete espécies de tartarugas marinhas existentes em todo o mundo, C. mydas é
considerada a segunda maior e a única que vai frequentemente à costa para descansar em
algumas regiões. Os adultos são herbívoros, alimentando-se de ervas marinhas, algas e outros
vegetais marinhos com a ajuda de seu bico afiado e serrilhado. Tartaruga-verde é encontrada
em regiões tropicais e subtropicais de todo o mundo, como observado na imagem abaixo
(Figura 14), onde o destaque laranja representa a distribuição desses animais (SEATURTLES,
2017).
Em relação a sua biologia, indivíduos da espécie C. mydas atingem a maturidade
sexual entre 20 a 40 anos. Quando adultos, medem entre 80 a 120 cm de comprimento,
atingindo até 300 kg. Quando filhotes medem entre 3 a 4 cm e pesam de 25 a 30 g. A
reprodução ocorre a cada dois ou quatro anos, com duas a cinco desovas por temporada, com
uma média de 80-120 ovos que duram, aproximadamente 60 dias para eclodirem (MTSG,
2017).
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Figura 14. Distribuição de tartaruga-verde (Chelonia mydas) ao longo de regiões tropicais e subtropicais de todo
o mundo. Fonte: IUCN, 2017.
3.3. Coleta de dados
Os animais utilizados no estudo foram provenientes de encalhes de tartarugas
marinhas nas praias da região da Bacia Potiguar. Ao registrar o animal vivo, o biólogo
acionava a equipe de resgate que realizava a translocação para a Base de Reabilitação de
Animais Marinhos localizada na Praia de Upanema, Areia Branca (Figura16). Os animais
recebem tratamento adequado ao seu quadro clínico pela equipe médica veterinária do projeto
Cetáceos da Costa Branca com vistas a sua recuperação e posterior soltura (Figura 15).
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Figura 15. (A) Biólogo atendendo a encalhe de tartaruga marinha registrada durante monitoramento junto com a
equipe de resgate, responsável pela translocação do animal até a Base de Reabilitação. (B) Recinto de tartarugas
marinhas da Base de Reabilitação de Animais Marinhos- PCCB-UERN, Praia de Upanema, Areia Branca. (C)
Tartaruga marinha recebendo atendimento da equipe médica veterinária do PCCB-UERN. (D) Animal com
melhora significativa em seu quadro clínico recebendo alimentação. (E e F) Soltura de tartarugas marinhas aptas
para a reintrodução ao seu habitat. Fonte: Projeto Cetáceos da Costa Branca – PCCB/UERN, 2018.
Quando porventura, alguns desses animais não resistiam e vinham a óbito, eram
imediatamente encaminhados para necropsia no Laboratório de Monitoramento de Biota
Marinha – UERN – Mossoró, dando prioridade a retirada do encéfalo no caso de animais
utilizados neste estudo (Figura 16).
Os técnicos que atuam no projeto possuem a licença ABIO (AUTORIZAÇÃO DE
CAPTURA, COLETA E TRANSPORTE DE MATERIAL BIOLÓGICO) e Cadastro no
SISBIO (Anexo 1).
A
F E
B
C D
32
Figura 16. Unidade de Necropsia instalada na Base de Reabilitação de Animais Marinhos- PCCB-UERN,
Mossoró- RN.
3.3.1. Remoção de Encéfalo, Fixação e Armazenamento
Para fixação dos encéfalos foram utilizados dois métodos. O primeiro foi por meio da
perfusão através do ventrículo, com a passagem de formol 10% precedido pela passagem de
solução salina. Esse método foi utilizado para um animal que havia morrido pouco antes e
estava em perfeita condições para passar pelo procedimento (TA1). Para os demais animais, o
encéfalo foi retirado com um tempo maior após o animal ter morrido (TA2 e TA3). Para estes,
os encéfalos foram retirados sem passar pela perfusão e foram fixados por imersão em formol
4%. Após a fixação inicial, os encéfalos passaram pela pós-fixação e, em seguida, foram
mantidos em sacarose 30%. O animal TA4 não passou pelo procedimento de fixação, pois foi
utilizado com o objetivo único de descrever a morfologia externa do encéfalo.
3.3.1.1. Perfusão Transcardíaca
Em tartarugas marinhas, o coração está localizado dentro do pericárdio. Seu limite
dorsal é com os pulmões enquanto o limite lateral é com os lobos do fígado. Existem quatro
compartimentos ou câmaras que subdividem o coração em tartarugas: seio venoso, dois
grandes átrios e um ventrículo. Da parte anterior e ventral do coração emergem os grandes
vasos. Um desses vasos é a aorta direita, que supre sangue para a cabeça, membros e parte
inferior do corpo, através do tronco braquiocefálico e posteriormente das artérias carótidas. O
acesso ao coração do animal foi feita com a retirada do plastrão. Os processos acrômios
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serviram como ponto de referência para a localização exata do coração. Foi feito um corte
longitudinal entre os processos acrômios e rebatida a musculatura peitoral lateralmente. A
partir do ventrículo e direcionado a aorta direita foi introduzida uma agulha (20mm x
0,55mm). O passo seguinte foi a passagem no sistema circulatório de solução salina a 0,9%
em tampão fosfato 0,1M, pH 7,4 (2 litros) como forma de limpar o sistema e potencializar o
efeito do fixador. Em seguida foram passados mais dois litros de solução fixadora composta
por formol 4%. A saída do fluxo vascular foi feito por corte no átrio direito.
Posteriormente, foi realizada a ruptura do crânio do animal com o auxílio de uma mini
serra elétrica, sendo retirado o encéfalo. O encéfalo foi armazenado em uma solução pós-
fixadora contendo formol 10% e sacarose a 30% durante um período de 24 horas (Figuras 18).
E por último, foi mantido em solução sacarose a 30% em tampão fosfato 0,1 M e PH 7,4 a 4º
C até ser submetido a microtomia.
3.3.1.2. Fixação por imersão
Dois animais (TA2 e TA3) não passaram pelo procedimento de perfusão. Ao invés
disso, depois de detectado o óbito do animal, eles tiveram seus encéfalos retirados. O passo
seguinte foi a fixação por imersão em formol 10% durante um média de 20 dias, até ser
detectado que o encéfalo estava consistente. Finalizada a fixação, os encéfalos passaram por
uma graduação crescente de sacarose (10%, 20% e 30%). E foram armazenados em sacarose
30% em tampão fosfato 0,1 M e PH 7,4 a 4º C até serem submetidos a cortes coronais pelo
procedimento de microtomia em criostato.
A B
C D
34
Figura 17. Tartaruga-verde (Chelonia mydas) juvenil macho que veio a óbito. (A) Visão dorsal. (B) Visão ventral. (C) Retirada de plastrão sem danificar os grandes vasos sanguíneos. (D) Incisão de agulha no ventrículo para passagem de solução fixadora (paraformaldeído 4%) pelo sistema sanguíneo do animal com auxílio de seringa. (E) Ruptura da região dorsal da caixa craniana para acesso ao encéfalo; (F) visão lateral do encéfalo.
Figura 18. Tartaruga adulta da espécie Chelonia mydas (tartaruga verde). (A) Ruptura da região dorsal da caixa craniana para acesso ao encéfalo; (B) (C) visão geral do encéfalo em relação à cabeça; (D) encéfalo retirado e encaminhado para o processo de pós-fixação.
3.3.2. Microtomia
Inicialmente, esperou o criostato (Luptec CM 2850) atingir uma temperatura média de
-20°C. Após isso, com o auxílio de uma cola especial (Tissue-T, O.C.T. Compound) o
encéfalo foi fixado longitudinalmente e em sentido rostrocaudal em um suporte para ser
cortado. No procedimento de microtomia, a espessura das secções coronais foi padronizada
E F
A B
C D
35
em 30μm e foram distribuídas em seis compartimentos. O primeiro compartimento, continha
tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 e foi utilizado para o método de Nissl. As secções do primeiro
compartimento obedeceram a ordem rostrocaudal, sendo mantidas uma isoladas das outras na
seguinte ordem: a, b, c, d, em diante. Os demais compartimentos (2, 3, 4, 5 e 6) continham
solução anticogelante e os cortes não foram isolados um dos outros, pois havia como colocá-
los em ordem tendo as lâminas montadas do Nissl. Após a microtomia, os cortes destes
últimos compartimentos foram mantidos em temperatura abaixo de 0°C até serem utilizados
em outro procedimento, como a imunoistoquímica para TH. Os cortes foram colocados nos
compartimentos de maneira cíclica. Primeiro, era colocado no compartimento 1a, depois nos
compartimentos 2, 3, 4, 5 e 6, em ordem crescente, até voltar para o compartimento 1b e
repetir todo o ciclo. A distância entre as secções de um mesmo compartimento foi de
aproximadamente 180 μm (Figura 19).
Figura 19. (A) Procedimento de corte do encéfalo utilizando criostato em temperatura média de – 20°C e
secções coronais de 30 μm. (B) Encéfalo de tartaruga marinha orientado em posição longitudinal, em sentido
rostrocaudal, e fixado a um suporte e envolvido por meio de uma cola especial. Após a retirada dos cortes do criostato com o auxílio de um pincel, eles são colocados em placas de ensaio de uso laboratorial. (C) A placa da esquerda contém solução anticogelante e foi destinada as secções que passaram (imunoistoquímica para TH)
C B
A
Compartimento 1 Compartimentos
a
b
c
g 2
3
4
5
6
36 ou passarão (outros procedimentos) por métodos imunológicos, enquanto a placa da direita foi destinada as secções que passaram pelo método de Nissl. O compartimento 1 recebeu as secções na ordem a,b,c,d em diante, os compartimentos 2, 4, 5 e 6 foram transferidos para recipientes com solução anticongelante e mantidos em temperatura menor que 0°C até serem usados.
3.3.3. Método de Nissl
Foi utilizado o método de Nissl como forma de delimitar a citoarquitetura do
mesencéfalo em tartaruga marinha. Um dos corantes usados neste método é a thionina, que
apresenta afinidade por corpos celulares, especialmente por uma das organelas, o retículo
endoplasmático rugoso. Os cortes do primeiro compartimento foram montados em lâminas
de vidro gelatinizadas, para isso, cada corte era retirado da placa de ensaio, colocado em uma
placa de petri ou prato de vidro contendo solução montagem e com o auxílio de um pincel era
direcionado para a lâmina até ser posicionado da forma preferida. Após esta etapa, as lâminas
com os cortes eram mantidos em temperatura ambiente por pelo menos 24 horas até secarem.
Após isso, foram submetidos ao método de Nissl,
O passo seguinte foi a submissão das lâminas com os cortes já secos no método de
coloração de Nissl, utilizando-se a thionina como corante para permitir uma melhor
demarcação das estruturas. O procedimento foi realizado em duas baterias. A primeira foi a
desidratação/diafanização do tecido e sua posterior reidratação (em sentido inverso) até ser
imerso na thionina. A segunda foi a passagem das lâminas por mais uma bateria de
desidratação. Antes de iniciar o procedimento, a thionina foi tirada da geladeira e quando
alcançou a temperatura ambiente foi aquecida em estufa a 50° C por pelo menos 15 minutos
antes do uso.
1. Primeira bateria:
(desidratação e diafanização)
a. Álcool 70 – de 2 horas à overnigth até no máximo 18 horas;
b. Álcool 95 I e II – 3 minutos cada;
c. Álcool 100 I e II – 3 minutos cada;
d. Xilol I e II – 3 minutos o primeiro e 30 minutos o segundo;
(Rehidratação – mesma bateria em sentido inverso)
e. Xilol I – 2 minutos;
f. Álcool 100 II e I – 2 minutos cada;
g. Álcool 95 II e I – 2 minutos cada;
h. Álcool 70 – 2 minutos;
37
i. Álcool 50 – 2 minutos;
j. Água destilada – 2 minutos;
(Coloração)
k. Thionina – 40 a 60 segundos
2. Segunda bateria:
(desidratação e diafanização)
a. Água destilada I e II – 5 batidinhas na primeira e 10 batidinhas na segunda;
b. Álcool 50 – 2 minutos;
c. Álcool 70 -2 minutos;
d. Álcool 95 I e II – 2 minutos cada;
e. Álcool 100 I, II e III – 2 minutos cada;
f. Xilol I e II – 2 minutos o primeiro e 4 minutos o segundo.
Por último, foram colocadas as lamínulas, fixadas com cola a lâmina, tendo o cuidado
para não ficarem bolhas que viessem atrapalhar na análise em microscópio.
A B
C
38 Figura 20. (A) Secção coronal do mesencéfalo de tartaruga marinha imersa em solução montagem para ser
posicionada em lâmina histológica gelatinizada. (B) Cortes já organizados em lâminas passando pelo procedimento de secagem em temperatura ambiente. (C) Lâminas passando pelas baterias do método de Nissl.
3.3.4. Imunoistoquímica para Tirosina Hidroxilase
Para aplicação do método de imunoistoquímica para tirosina hidroxilase, foi escolhido
um dos compartimentos mantidos em solução anticogelante em temperatura menor que 0°C.
Precedendo a técnica de imunoistoquímica, foi necessário realizar um pré-tratamento dos
cortes, na perspectiva de atenuar ou abolir a presença de artefatos. Para tal, as secções foram
lavadas durante cinco minutos em tampão fosfato 0,1 M, ph 7,4 e, posteriormente,
permaneceu por 20 minutos em solução de peróxido de hidrogênio H2O2 a uma concentração
de 0,03%. Durante todo o procedimento, os cortes ficaram em movimento em rotor
(velocidade de 40 rpm).
O próximo passo consistiu na incubação com anticorpo primário. As secções foram
colocadas em contato com uma solução formada pelo anticorpo anti-TH obtido em
camundongo (Sigma) em diluição de 1:5.000, soro normal de asno a 2% e Triton X-100 a
0,4% onde permaneceu em incubação por 20 horas em rotor com rotação lenta (40 rpm). Ao
fim deste período os cortes foram lavados cinco vezes durante cinco minutos cada lavagem
em tampão fosfato 0,1M, PH 7,4 para depois serem colocados em contato com o anticorpo
secundário anti-camundongo obtido em cavalo (Sigma) diluído a 1:1.000, por 90 minutos a
temperatura ambiente, sob agitação lenta, em rotor.
Após a incubação com o anticorpo secundário, os cortes foram submetidos mais uma vez
a cinco lavagens de cinco minutos cada em tampão fosfato 0,1M, ph 7,4. Em seguida, os
cortes foram colocados na solução do complexo avidina-biotina-HRP (protocolo ABC, Kit
elite da Vector), numa diluição de 1:100 em Triton X-100 a 0,4% contendo NaCl durante 90
minutos em rotação lenta. Para que fosse possível visualizar a reação, as secções foram
colocadas em meio contendo peróxido de hidrogênio (H2O2), como substrato, e a 3,3,4,4
tetrahidrocloretodiaminobenzidina (DAB), utilizada como cromógeno, durante 10 minutos.
Esta etapa foi realizada dentro de capela e com maior atenção, devido a toxicidade do
reagente DAB. Ao final, os cortes foram lavados por cinco vezes, cinco minutos cada, em
tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 em rotação lenta.
39
Os cortes foram montados em lâminas gelatinizadas e, após secas, foram imersas em
solução de tetróxido de ósmio a 0,05% com o intuito de intensificar a reação. A última etapa
foi a desidratação em baterias de álcool de graduação crescente até o álcool absoluto e
diafanização em xilol, sendo montadas as lamínulas ao final do processo.
Figura 21. Alguns dos procedimentos no método da imunoistoquímica. (A) Visão geral da bancada exibindo ferramentas utilizadas, como ponteiras de pipetas, solução tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 e Triton X-100 contendo cloreto de sódio, placa de ensaio imunológico, cestinha com fundo em tela para receber as secções e mantê-las em contato com as soluções oferecidas e rotor. (B) Cortes dentro de cestinhas com solução tampão fosfato 0,1 M, pH 7,4 passando pelo procedimento das lavagens através de rotação. (C) Pipetagem de anticorpo primário – uma das várias etapas em que se usam pipetas para colocar a quantidade correta, medidas em μl de reagentes. (D) Secções do mesencéfalo na etapa de imersão em meio contendo peróxido de hidrogênio como substrato e DAB como cromógeno para visualização da reação, procedimento que ocorre dentro de capela e com maior atenção devido a toxicidade do reagente DAB.
3.3.5. Obtenção das imagens e análise dos resultados
As secções do tronco encefálico, coradas pelo método de Nissl e/ou submetidas a
imunoistoquímica para TH foram examinadas ao microscópio óptico (Olympus BX41) em
campo claro. Imagens digitais foram obtidas de secções representativas usando uma câmera
digital (Nikon DXM1200) acoplada ao microscópio, sendo usadas as objetivas de 4X, 10X e
20X. Com o auxílio do software Canvas X 2018, as imagens foram analisadas, corrigidas
minimamente para brilho e contraste e os resultados foram documentados em
A B
C D
40
fotomicrografias. A partir das fotomicrografias foram construídos esquemas e ilustrações
usando como base o “A Stereotaxic Atlas of Forebrain and Midbrain of the Eastern Painted
Turtle (Chrysemis picta)” (POWERS; REINER, 1980) e a nomenclatura dos trabalhos Smeets
et al., (1987), Smeets (1988) e Power e Reiner (1993).
Para análise da área e perímetro dos corpos dos neurônios foi utilizado o software ImageJ.
Foram escolhidas duas secções representativas de cada grupamento (RA8, A9 e A10) ao
longo da extensão mesencefálica.
3.3.6. Análise Estatística
Para análise estatística foi utilizado Teste Anova de um fator para comparação do
perímetro e área dos corpos de neurônios imunorreativos a TH nas áreas de interesse. O teste
de tukey foi utilizado como teste de post hoc. Para todos os testes realizados, foi considerado
p<0,05 como sendo significativo.
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4. RESULTADOS
Durante o período de dezembro de 2016 a janeiro de 2018 foram coletados quatro
encéfalos de tartarugas marinhas. Dessas, uma foi classificada como adulta e três como
juvenis/subadultas. Três vieram a óbito no Centro de Reabilitação do Projeto Cetáceos da
Costa Branca e passaram imediatamente pelo procedimento de retirada do encéfalo. Uma
tartaruga marinha foi registrada já morta durante o monitoramento de praia por um dos
biólogos do PCCB/UERN e devido ao seu estado bem conservado, foi possível caracterizar a
morfologia externa do encéfalo ainda dentro da caixa craniana através de uma secção sagital
do crânio (Quadro 01).
Quadro 01. Exemplares de tartaruga-verde (Chelonia mydas) utilizados no estudo, com a descrição do seu sexo,
comprimento x largura (cm) e procedimento em que foi utilizado.
COD Espécie Sexo Comprimento x
Largura do
Casco (cm)
Procedimento aplicado
TA1 Chelonia mydas Fêmea 57,0 x 57,0
(Juvenil)
Descrição da morfologia externa
(foto), Método de Nissl e
Imunoistoquímica para TH.
TA2 Chelonia mydas Macho 91,0 x 82,0
(Adulto)
Método de Nissl e
Imunoistoquímica para TH.
TA3 Chelonia mydas Macho 41,0 x 38,0
(Juvenil)
Método de Nissl e
Imunoistoquímica para TH.
TA4 Chelonia mydas Fêmea 37,0 x 33,0
(Juvenil)
Descrição da morfologia externa
(foto).
Por tratar-se de animais em risco de extinção, a perfusão só pôde ser realizada após a
detecção do óbito do animal no Centro de Reabilitação do PCCB-UERN.
4.1. Morfologia Externa
O encéfalo de tartaruga-verde juvenil e adulta apresenta-se divido com delimitações
bem definidas. Em sentido rostral a caudal e em vista dorsal, observa-se nervos e bulbo
olfatório, cérebro, lóbulo óptico, cerebelo e medula. Em visão lateral e ventral é possível notar
os nervos ópticos e oculomotor, assim como outros nervos craniais (Figuras 22 e 23).
Em visão dorsal e sentido rostrocaudal, nota-se o bulbo olfatório fazendo limite com
os hemisférios cerebrais (telencéfalo) e estes, por sua vez, fazendo limite posteriormente com
a borda anterior dos lóbulos ópticos. O cerebelo está em posição mais caudal, fazendo
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fronteira com a borda posterior dos lóbulos ópticos. Na porção ventral e posterior do encéfalo
observa-se o tronco encefálico e dando continuidade, a medula (oblonga e espinal).
Figura 22. Encéfalo de tartaruga verde juvenil. De cima para baixo, são representadas as faces lateral, dorsal e
ventral do encéfalo e da esquerda para direita uma visão anteroposterior.
Figura 23. Visão para sagital da região cefálica de tartaruga-verde juvenil exibindo a (A) Morfologia externa do
encéfalo e alguns (B) nervos craniais destacados pelas setas.
A
B
Medula
Cerebelo
Nervo motor ocular comum
Lóbulo óptico Cérebro Bulbo olfatório
Nervo olfatório
Nervo óptico
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4.2. Microscopia
Através da técnica de imunoistoquímica para tirosina hidroxilase foi possível
identificar grupamentos neuronais no mesencéfalo de tartaruga-verde. O tegmento
mesencefálico de C. mydas contém células dopaminérgicas imunorreativas a TH que podem
ser agrupadas de três formas de acordo com a posição dos neurônios e a orientação de seus
dentritos: área tegmental ventral (VTA/A10), substância negra (SN/A9) e o equivalente
reptiliano do grupo A8 de mamíferos (RA8) (Figura 24).
A imunoistoquímica para TH junto com o método de Nissl permitiu descrever a
citoarquitetura dos grupamentos A10, A9 e RA8 em tartaruga marinha pela primeira vez
(Figuras 26, 27, 28, 29 e 30). Em secções coronais e com sentido rostrocaudal, é possível
identificar os grupamentos A9 e A10 em níveis mais rostrais. O primeiro possui localização
ventrolateral no tegmento mesencefálico e apresenta divisa citoarquitetônica ventral ao núcleo
rubro, e lateralmente faz limite com o pedúnculo ventral do fascículo prosencefálico lateral
(PV) e fascículo longitudinal medial (FLM). Em sua continuidade, faz limite dorsalmente
com o núcleo profundo mesencefálico (NPrM) e em níveis caudais dá lugar ao grupamento
RA8. A SN pode ser classificada em substância negra pars compacta (SNc), rica em corpos
de neurônios e seus processos, e pars reticulata (SNr), com menor quantidade de corpos de
neurônios e processos longos orientados, predominantemente, mediolateralmente.
A VTA encontra-se em posição ventromedial em níveis mesencefálicos rostrais. Em
seu limite mais dorsal, faz fronteira com as células do núcleo do nervo oculomotor (nIII) e
segue direção ventrolateral, se juntando com as células dopaminérgicas da SN lateralmente.
Em direção caudal, a VTA faz limite lateral com o núcleo interpendicular (IP), ventromedial
com o grupamento RA8 e, por último, em extremo caudal, faz limite ventralmente com o
núcleo reticular superior (Rs). Em todo a extensão mesencefálica é possível observar células
dopaminérgicas pertencentes a VTA. Porém, é em níveis mais caudais que há uma forte
marcação dos neurônios dopaminérgicos imunorreativos a TH. Os processos dos neurônios
dopaminérgicos na VTA são caracterizados por serem curtos.
Em níveis caudais, surge o grupamento RA8 como uma extensão da SN que está
localizada dorsolateralmente a VTA. Possui um menor número de corpos de neurônios e seus
processos, assim como os da SNr, são longos, porém, com orientação predominantemente
ventrolaterais.
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Os neurônios dos grupamentos RA8, A9 e A10 podem ser fusiformes e ovoides
bipolares ou triangulares multipolares (Figura 25). Os corpos dos neurônios do grupamento
RA8 possuem uma área média de 222 μm 2
, os de A9 uma área média de 296 μm ², enquanto
os de A10 possui uma área média de 200 μm ². Houve diferença significativa (p=0,004) entre
a média da área dos três grupos. O grupamento A9 possui corpos de neurônios com uma
média de área maior que os grupamentos RA8 (P=0,008) e A10 (P=0,0002).
Figura 24. Desenho esquemático de secção coronal através do mesencéfalo de tartaruga-verde (Chelonia mydas),
ilustrando a distribuição de corpos celulares dopaminérgicos imunorreativos a TH e suas fibras. (A) Mesencéfalo