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19 19 19 19 19 Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias Parasites... furnish information about present-day habits and ecology of their individual hosts. These same parasites also hold promise of telling us something about host and geographical connections of long ago. They are simultaneously the product of an immediate environment and a long ancestry reflecting associations of millions of years. The messages they carry are thus always bilingual and usually garbled. As our knowledge grows, studies based on adequate collections, correctly classified and correlated with knowledge of the hosts and life cycles involved should lead to a deciphering of the message now obscure. Eventually there may be enough pieces to form a meaningful language which could be called parascript – the language of parasites which tells of themselves and their hosts both of today and yesteryear”. (H. W. Manter, 1966) Introdução Qualquer livro de História das Ciências chama a atenção para a influência das idéias de cada época e da cultura sobre a forma de pensar dos cientistas e dos médicos (Kuhn 1970). Talvez o estudo sobre a relação parasito-hospedeiro seja um dos que mais comprova essa observação. Usualmente, se- gundo Gillick (1985), o organismo sadio é considerado como uma fortaleza de saúde rodeada por todos os lados por inimi- gos dos quais deve se defender de forma contínua; esse modelo utiliza uma linguagem com claras reverberações béli- cas, já que fala de “mecanismos de defesa”, de “resistência”, de “agressão” e de “vitória sobre a doença”. Dessa mentali- dade originaram-se nas Faculdades de Medicina e nas Pós- graduações os tradicionais “Cursos de Agressão e Defesa” e em livros, capítulos sobre microrganismos rotulados como “Agressão e Defesa” (Raw et al. 2001). A maioria dos livros de imunologia atribui ao sistema imunológico a “função fisi- ológica de defesa contra infecções por agentes infectantes, englobando vírus, bactérias, fungos e ecto e endoparasitos” (Abbas et al. 2000). O poder do corpo de resistir à infecção e sua habilidade de proteger a si mesmo contra reinfecção são referidas como imunidade (Klein & Horejsi 1997). A termino- logia ou nomenclatura da imunologia expressa bem a menta- lidade bélica antropomórfica que impera nessa disciplina, em que linfócitos são rotulados de “assassinos” (killer) ou de “matadores naturais” (natural killer), neutrófilos são meta- foricamente denominados “bravos soldados” (Laskay et al. 2003) e o sistema imunológico dos mamíferos tem duas divi- sões da brigada de defesa (sistemas inato e adaptativo) (O’Neill 2005). Segundo esse mesmo autor, o sistema imunológico já foi considerado algo não muito mais sofistica- do que a muralha de um castelo. A ação verdadeira, acredita- vam os pesquisadores, ocorria depois que a muralha já tinha sido derrubada e as tropas (as células T e B) entravam em combate. Sabemos agora, continua O’Neill (2005), que a mu- ralha desse castelo está salpicada de sentinelas (os recepto- res tipo-Toll, TLRs, funcionam como tropas de reconheci- mento), que identificam o invasor e soam o alarme para mobi- lizar as tropas e organizar a defesa. Nesse contexto, os para- sitos são tradicionalmente considerados como grandes agressores dos quais os hospedeiros têm que se defender. Este capítulo tentará mostrar uma visão alternativa a essas idéias convencionais, oferecendo uma visão ecológica da co- abitação parasito-hospedeiro. Conceito de enfermidade infecciosa Perez Tamayo, em seu brilhante livro sobre El concepto de enfermidad – Su evolución através de la História (1988), após uma série de discussões sobre os conceitos ontológico, fisiológico e biomédico de doença, propõe um conceito mo- derno de doença, assim formulado: Doença é a incapacida- de de realizar uma ou mais funções biológicas com eficiên- cia normal, acompanhada de alterações perceptíveis fisi- camente por meio dos sentidos educados do médico ou suas extensões tecnológicas e independentemente do testemunho da pessoa enferma, com especificidade (quando possui) de- finida por alterações anatômicas e/ou funcionais, assim como por sua etiologia, sem juízos de valor e sem relação com o tempo e o espaço em que ocorre. É o objetivo do diagnóstico e do tratamento e a informação sobre ela cres- ce graças à investigação médica. A enfermidade pode ser grave ou trivial, sem que isso afete sua existência. Segundo Tamayo (1988), existem outros aspectos importantes que se referem ao conjunto de fenômenos gerais que caracterizam o padecimento, como: prevalência; morbidade; mortalidade; quadro clínico; evolução e resposta ao tratamento (história natural); suas causas (etiologia); os mecanismos fisiopato- lógicos e de outros tipos que explicam a existência e evolu- ção das lesões anatômicas, os transtornos funcionais e as manifestações clínicas (patogenia) e a soma de todos os fa- tores que determinam o destino mais provável do indivíduo afetado por um padecimento específico (prognóstico). Con- tinua Tamayo (1988): “Na atualidade, se aceita que todas as Interface Parasito-hospedeiro: Coabitologia – Uma Visão Diferente do Fenômeno Parasitismo Henrique Leonel Lenzi Marcos A. Vannier-Santos 3
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1919191919Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

“Parasites... furnish information about present-dayhabits and ecology of their individual hosts. These sameparasites also hold promise of telling us something abouthost and geographical connections of long ago. They aresimultaneously the product of an immediate environmentand a long ancestry reflecting associations of millions ofyears. The messages they carry are thus always bilingualand usually garbled. As our knowledge grows, studies basedon adequate collections, correctly classified and correlatedwith knowledge of the hosts and life cycles involved shouldlead to a deciphering of the message now obscure.Eventually there may be enough pieces to form a meaningfullanguage which could be called parascript – the languageof parasites which tells of themselves and their hosts both oftoday and yesteryear”.

(H. W. Manter, 1966)

Introdução

Qualquer livro de História das Ciências chama a atençãopara a influência das idéias de cada época e da cultura sobrea forma de pensar dos cientistas e dos médicos (Kuhn 1970).Talvez o estudo sobre a relação parasito-hospedeiro seja umdos que mais comprova essa observação. Usualmente, se-gundo Gillick (1985), o organismo sadio é considerado comouma fortaleza de saúde rodeada por todos os lados por inimi-gos dos quais deve se defender de forma contínua; essemodelo utiliza uma linguagem com claras reverberações béli-cas, já que fala de “mecanismos de defesa”, de “resistência”,de “agressão” e de “vitória sobre a doença”. Dessa mentali-dade originaram-se nas Faculdades de Medicina e nas Pós-graduações os tradicionais “Cursos de Agressão e Defesa” eem livros, capítulos sobre microrganismos rotulados como“Agressão e Defesa” (Raw et al. 2001). A maioria dos livrosde imunologia atribui ao sistema imunológico a “função fisi-ológica de defesa contra infecções por agentes infectantes,englobando vírus, bactérias, fungos e ecto e endoparasitos”(Abbas et al. 2000). O poder do corpo de resistir à infecção esua habilidade de proteger a si mesmo contra reinfecção sãoreferidas como imunidade (Klein & Horejsi 1997). A termino-logia ou nomenclatura da imunologia expressa bem a menta-lidade bélica antropomórfica que impera nessa disciplina, emque linfócitos são rotulados de “assassinos” (killer) ou de“matadores naturais” (natural killer), neutrófilos são meta-foricamente denominados “bravos soldados” (Laskay et al.2003) e o sistema imunológico dos mamíferos tem duas divi-

sões da brigada de defesa (sistemas inato e adaptativo)(O’Neill 2005). Segundo esse mesmo autor, o sistemaimunológico já foi considerado algo não muito mais sofistica-do que a muralha de um castelo. A ação verdadeira, acredita-vam os pesquisadores, ocorria depois que a muralha já tinhasido derrubada e as tropas (as células T e B) entravam emcombate. Sabemos agora, continua O’Neill (2005), que a mu-ralha desse castelo está salpicada de sentinelas (os recepto-res tipo-Toll, TLRs, funcionam como tropas de reconheci-mento), que identificam o invasor e soam o alarme para mobi-lizar as tropas e organizar a defesa. Nesse contexto, os para-sitos são tradicionalmente considerados como grandesagressores dos quais os hospedeiros têm que se defender.Este capítulo tentará mostrar uma visão alternativa a essasidéias convencionais, oferecendo uma visão ecológica da co-abitação parasito-hospedeiro.

Conceito de enfermidade infecciosa

Perez Tamayo, em seu brilhante livro sobre El conceptode enfermidad – Su evolución através de la História (1988),após uma série de discussões sobre os conceitos ontológico,fisiológico e biomédico de doença, propõe um conceito mo-derno de doença, assim formulado: Doença é a incapacida-de de realizar uma ou mais funções biológicas com eficiên-cia normal, acompanhada de alterações perceptíveis fisi-camente por meio dos sentidos educados do médico ou suasextensões tecnológicas e independentemente do testemunhoda pessoa enferma, com especificidade (quando possui) de-finida por alterações anatômicas e/ou funcionais, assimcomo por sua etiologia, sem juízos de valor e sem relaçãocom o tempo e o espaço em que ocorre. É o objetivo dodiagnóstico e do tratamento e a informação sobre ela cres-ce graças à investigação médica. A enfermidade pode sergrave ou trivial, sem que isso afete sua existência. SegundoTamayo (1988), existem outros aspectos importantes que sereferem ao conjunto de fenômenos gerais que caracterizam opadecimento, como: prevalência; morbidade; mortalidade;quadro clínico; evolução e resposta ao tratamento (histórianatural); suas causas (etiologia); os mecanismos fisiopato-lógicos e de outros tipos que explicam a existência e evolu-ção das lesões anatômicas, os transtornos funcionais e asmanifestações clínicas (patogenia) e a soma de todos os fa-tores que determinam o destino mais provável do indivíduoafetado por um padecimento específico (prognóstico). Con-tinua Tamayo (1988): “Na atualidade, se aceita que todas as

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do Fenômeno Parasitismo

Henrique Leonel LenziMarcos A. Vannier-Santos

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enfermidades têm uma história natural, conhecida para mui-tas delas e em estudo para as demais. Uma parte fundamentaldo que deve aprender um estudante de medicina durante suacarreira é precisamente a história natural das enfermidades,não somente para reconhecê-las, senão também para saber oque pode suceder em seus pacientes”. Conclui ele que a no-ção de história natural de uma doença é o grande triunfo oucrí de guerre (grito de guerra) dos ontólogos, entendidoscomo aqueles que admitem o conceito ontológico, em vez defisiológico, para doenças infecciosas. “O conceito ontológico(ontia: coisa, entidade) postula a existência de entidades pa-tológicas bem definidas, reconhecíveis pela presença de si-nais e sintomas característicos que freqüentemente obede-cem a uma etiologia específica e, além disso, possuem umahistória natural própria. Em sua forma mais exagerada ou ex-trema, o conceito ontológico de enfermidade afirma que estadesfruta de uma existência distinta à do organismo onde seencontra, numa realidade independente da realidade do en-fermo que a padece. Portanto, pode ser considerada um “pa-rasito” que penetra no organismo sadio e o habita, transfor-mando-o, dessa maneira, num enfermo. Segundo essa varie-dade de conceito ontológico, a enfermidade é uma forma infe-rior de vida parasitária cuja localização interna aproveita parase expressar por meio de vários complexos sintomáticos. Poroutro lado, o conceito fisiológico defende que a enfermidadeé somente uma manifestação de processos funcionais altera-dos e que não possui existência independente ou separadado organismo, nem como um “parasito”, nem como uma enti-dade, ou seja, um grupo bem definido de sintomas e sinaisque obedecem sempre à mesma causa e que devem ser trata-das sempre da mesma maneira. A enfermidade, de acordo como conceito fisiológico, é simplesmente a vida em condiçõesanormais; somente desvios quantitativos dos processos fisi-ológicos normais distinguem o enfermo do homem sadio”(Tamayo 1988). Na realidade, não há um dualismo antagônicoentre as duas proposições, ontológica e fisiológica, mas ambasportam parte da verdade, embora, na prática médica, ocorranítido predomínio da concepção ontológica, principalmenteem relação a doenças infecciosas. Todas as ações médicasvisam identificar o agente infectante ou parasitário (agenteetiológico específico) e eliminá-lo como se fosse um corpoestranho ou um inimigo do organismo. Simplesmente se ad-mite uma associação estatisticamente significativa entre oagente etiológico e o complexo sintomático conhecido comoentidade clínica ou anátomo-clínica. Na realidade, segundoTamayo (1988), “o indivíduo participa no desenvolvimentodo processo patológico como uma ‘caixa preta’: por um ladoingressa o agente etiológico e por outro sai a enfermidade,sem que se tenha informação precisa sobre o que ocorre nointerior da caixa. Desconhecem-se os mecanismos pelos quaiso elemento causal produz os transtornos que identificamoscomo a enfermidade, ou seja, sua patogenia”. Pode-se afirmarque os conceitos patogênicos atuais sobre doença, inclusiveas de caráter infeccioso e parasitário, são excessivamenteprimários, incompletos e embrionários, como tentaremos de-monstrar mais adiante.

Noções fundamentais sobre “o que é um servivo” – necessárias para entender o fenômenoda coabitação e do parasitismo

Segundo Maturana e Varela (1984), o elemento de distin-ção essencial entre ser vivo e inanimado é um tipo especial de

organização. A proposta desses autores é que os seres vivosse caracterizam por, literalmente, produzirem de modo contí-nuo a si próprios, caracterizando uma organização autopoética.Fundamentalmente, essa organização é proporcionada porcertas relações, mais facilmente percebidas no plano celular.Em primeiro lugar, os componentes moleculares de uma uni-dade autopoética celular deverão estar dinamicamente relaci-onados numa rede contínua de interações, que compõem ometabolismo celular. Em segundo lugar, esse metabolismoproduz componentes e todos eles integram a rede de trans-formações que os produzem. Alguns formam uma fronteira,um limite para essa rede de transformações. Portanto, de acor-do com essa teoria da autopoese, uma célula consiste numaunidade fechada em termos organizacionais, por ser uma redede componentes metabólicos na qual os componentes pro-duzem a própria rede (e os limites ou fronteiras da rede) que,por sua vez, os produz. Daí a idéia de uma organização circu-lar como atributo dos sistemas vivos, onde o produtor é igualao produto e o ser e o fazer são inseparáveis (Maturana &Varela 1984, Capra 1996, Emmeche & El-Hani 2000). Um pontosutil mas importante da definição de autopoese é o fato deque uma rede autopoética não é um conjunto de relaçõesentre componentes estáticos (como, por exemplo, o padrãode organização de um cristal), mas sim um conjunto de rela-ções entre processos de produção de componentes. Se essescomponentes param, toda a organização também pára. Emoutras palavras, redes autopoéticas devem, continuamente,regenerar a si mesmas para manter sua organização (Capra1996). A rede de componentes que corresponde ao sistemavivo é fechada em termos organizacionais, mas aberta emtermos materiais e energéticos, ou seja, ele está sempre tro-cando matéria e energia com o ambiente externo (Varela 1979,Maturana & Varela 1994, Maturana 1997). Kauffman (2000)definiu um ser vivo como um agente autônomo, quecorresponde a um sistema catalítico capaz de se reproduzir ede realizar um ou mais ciclos de trabalho termodinâmico. Se-gundo ele, um agente molecular autônomo realiza dois tiposde fechamento (closures): a) fechamento “catalítico”, ondetodas as reações a serem catalisadas o são [catalisadas] porelementos moleculares do sistema; b) fechamento de um con-junto de tarefas de trabalho que se propagam (set ofpropagating work tasks), pelo qual o agente autônomo com-pleta a construção de uma cópia tosca de si mesmo. Kauffmandestaca que nenhum dos dois tipos de fechamento pode serdefinido “localmente”. Nenhuma reação particular ou nenhu-ma interação (espontânea ou não) entre diversos processosbasta para especificar os fechamentos descritos. Eles decor-rem de propriedades tipicamente organizativas do agenteautônomo em seu ambiente. De fato, células atingem grandeordem de fechamento em alguns grupos amplos de tarefaspelas quais propagam sua organização. Em outras palavras,as células transmitem organizações supramoleculares ao sereproduzirem por meiose (Von Sternberg 2000), portanto ogenético não está no gene (Atlan 1999). O que é transmitidonão é somente uma estrutura molecular estática, mas um esta-do de atividade funcional, isto é, uma certa expressão da sig-nificação funcional do conjunto das estruturas celulares(Atlan 1999). Este conceito impõe o desafio de pensar a auto-nomia e a auto-organização dos sistemas (vivos e cognitivos)sem apelar para a idéia de “programa” e, portanto, sem imagi-nar um nível, localizado em alguma parte, de controle do pro-cesso auto-organizador. Nem o ambiente (influência externa),nem uma parte do sistema (influência interna) podem de-

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sempenhar este papel, mas sim o ciclo das interaçõesconstitutivas, o qual é, ao mesmo tempo, causa e resultadodas regulações (Ceruti 1995). O ser vivo, enquanto sistemaaberto em termos materiais e energéticos e que para manter-se necessita oscilar, termodinamicamente, em ciclos, sofre osefeitos da segunda lei da termodinâmica, que pode ser enun-ciada da seguinte maneira: “Em processos naturais, a ener-gia de alta qualidade tende a transformar-se em energia dequalidade mais baixa – a ordem tende para a desordem”(Hewitt 2002). Essa lei se refere à “qualidade” da energia,quando a energia torna-se mais difusa e finalmente acabadegenerando em dissipação. Isso equivale a dizer que a ener-gia “organizada” (concentrada e, portanto, energia de altautilidade ou qualidade) acaba degenerando em energia “de-sorganizada” (com baixa utilidade ou qualidade) (Hewitt 2002).A idéia de um rebaixamento na “qualidade” da energia estáembutida na idéia de entropia, uma medida de quantidade dedesordem em um sistema ou estado inerte de “equilíbrio”. Asegunda lei da termodinâmica estabelece que a entropia, afi-nal de contas, sempre aumenta. Isto é, a desordem aumenta, aentropia cresce. Sempre que um sistema pode distribuir livre-mente sua energia, ele sempre o faz de maneira que a entropiacresce, enquanto diminui a energia do sistema que permane-ce disponível para a realização de trabalho (Hewitt 2002).Schrödinger em seu livro O que é a vida (What is life? Thephysical aspect of the living cell, 1944) perguntou: Como umorganismo vivo evita a degradação? E responde, dizendo quea resposta óbvia é: comendo, bebendo, respirando,fotossintetizando etc. Continua ele, o termo técnico que en-globa tudo isso é metabolismo, que em grego significa trocaou intercâmbio. Em seguida lança outra questão: O que é,então, esse algo precioso contido em nossos alimentos e quenos defende da morte? É, segundo ele, a entropia negativa ouneguentropia. Portanto, um organismo permanece vivo noseu estado altamente organizado ao importar energia de altaqualidade de fora de si mesmo e ao degradá-la para sustentara estrutura organizacional [autopoética] do sistema(Scheneider & Kay 1997). Entropia e neguentropia, emboraconstituindo o caráter positivo e negativo da mesma grande-za, correspondem a processos antagônicos do ponto de vistada organização: desorganização e degenerescência, por umlado, reorganização e regeneração e até desenvolvimento ecomplexificação por outro (Morin 1977). A vida não passa,então, de uma forma particular da organização neguentrópicae a neguentropia está subordinada à idéia de organização, e ocaráter neguentrópico, por sua vez, precede, produz e envol-ve o caráter informacional (Morin 1977) (Figs. 1 e 2). Maisadiante, no texto, será justificada a razão da exposição dessesconceitos fundamentais, ainda que analisados de forma su-perficial.

O que é um parasito e o fenômenodo parasitismo?

Sobre esse tópico há uma divergência conceitual muitogrande nas definições existentes na literatura, implicandoconceitos confusos, equivocados, ultrapassados e impreg-nados de mentalidade bélica. Parasitismo, segundo Rey(2003), equivale a uma “relação ecológica, desenvolvida en-tre indivíduos de espécies diferentes, em que se estabeleceassociação íntima e duradoura e certo grau de dependênciametabólica entre os parceiros. Geralmente o hospedeiro pro-porciona ao parasito todos ou quase todos os nutrientes e ascondições fisiológicas requeridas por este. As relações para-sitárias entre as duas espécies podem ter-se desenvolvido hámilênios, como forma de co-evolução durante diversos perío-dos geológicos, ou ter-se instalado em época recente, emfunção de relações ecológicas novas”. O termo parasito deri-va do grego ðáñÜóéôï pela justaposição do prefixo pará, quesignifica junto, ao lado de; com sitos, equivalente a trigo noestado natural, alimentos sólidos, comida, alimentação. Por-tanto, “parasitismo pode significar, literalmente, alimentar-se ao lado de, referindo-se à associação em que um dos par-ceiros, em geral de pequeno porte, obtém benefício em detri-mento do outro, de maior porte, conhecido como hospedei-ro” (Ferreira et al. 2003). Então, pode-se inferir que parasitoassemelha-se, metaforicamente, à sicofanta, isto é, à pessoaque recebe gratuitamente alimento de um benfeitor rico, emtorno de conversa fiada, impudente e bajuladora (Harant 1955).Corresponde, também, entre os antigos gregos, à denuncian-te dos que exportavam figos por contrabando ou daquelesque roubavam figos de figueiras consagradas; pessoas ve-lhacas, embusteiras, impostoras, mentirosas e caluniadoras(Houaiss 2001). Mas para concluir o que vem a ser um parasi-to, é importante antes rever uma série de noções fundamen-tais que serão discutidas adiante.

Segundo Wilson (1992), “o mistério mais maravilhoso davida talvez seja o meio pelo qual ela criou tanta diversidade apartir de tão pouca matéria física. A biosfera, todos os orga-nismos juntos, constitui apenas cerca de uma parte em 10bilhões da massa da Terra. Está esparsamente distribuída numacamada de um quilômetro de espessura da terra, água e ar quese estende por uma superfície de meio bilhão de quilômetrosquadrados. Se o mundo fosse do tamanho de um globo co-mum de mesa e a sua superfície fosse observada lateralmentea distância de um braço, nenhum traço da biosfera seria visí-vel a olho nu. A vida, no entanto, dividiu-se em milhões deespécies – as unidades fundamentais – cada uma desempe-

Figura 1 - As organizações não-ativas e os sistemas energeticamentefechados só podem evoluir no sentido da entropia crescente (+), tendendoà desorganização e degenerescência. Por outro lado, uma organizaçãoautopoética ou produtora-de-si, através de um processo neguentrópico,remete para uma Gestalt ou configuração organizacional, tendendo àordem. Portanto, toda a organização pode efetivamente ser consideradacomo um ilhéu de neguentropia (–) (Morin 1977).

Figura 2 - Um tipo celular corresponde a um atrator de estado cíclico nocomportamento dinâmico do sistema genômico. Os tipos celulares sãoorganizações especiais e correspondem a padrões recorrentes estáveis econstritos de expressão gênica. Os tipos celulares, portanto, funcionamcomo atratores que expressam comportamentos persistentes do sistemagenômico. Diferenciação celular, então, consiste numa transição de umatrator para outro provocada por perturbação externa (Kauffman 1993).

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nhando um papel único em relação ao todo”. Continua Wil-son (1992), “para visualizarmos de outra maneira a tenuidadeda vida, imaginemos que estamos partindo do centro da Terrae caminhando para cima, em direção à superfície, num passonormal de passeio. Durante as doze primeiras semanas, atra-vessamos magma e rochas incandescentes, destituídos devida. A três minutos da superfície, faltando quinhentos metrospara percorrer, encontramos os primeiros organismos, bacté-rias que se alimentam de nutrientes infiltrados nos estratosprofundos onde se detecta a presença de água. Chegamosentão à superfície e, durante dez segundos, a vida irrompe demaneira deslumbrante aos nossos olhos: dezenas de milha-res de espécies de microrganismos, plantas e animais podemser vislumbrados na linha horizontal de visão. Meio minutodepois, quase todas as criaturas já desapareceram. Duas ho-ras depois, somente os mais tênues resquícios de vida per-manecem, consistindo basicamente em pessoas a bordo deaviões que, por sua vez, estão cheias de bactérias do cólon”.Após essa fantástica viagem imaginária e pedagógica, imagi-nada por esse grande naturalista, Edward Wilson, esquema-tizada na Figura 3, ele observou o que, a nosso ver, compõe apedra fundamental para se entender a noção de parasitismo.Diz ele: “A marca característica da vida é esta luta: a lutade uma imensa variedade de organismos de peso pratica-mente desprezível por uma quantidade infinitesimal de ener-gia. A vida opera em apenas 10% da energia do Sol quechega à superfície da Terra, sendo esta parcela fixada pelafotossíntese das plantas verdes. A energia disponível é entãodrasticamente atenuada ao percorrer as teias alimentares deum organismo a outro: muito a grosso modo, 10% dela pas-sam para as lagartas e outros herbívoros que comem plantase bactérias; 10% disso (ou 1% da energia original) vão paraas aranhas e outros carnívoros inferiores que comem os her-bívoros; 10% do restante para as aves insetívoras e outroscarnívoros médios que comem os carnívoros inferiores e as-sim por diante até os carnívoros superiores, que são consu-midos apenas por parasitos e necrófagos. Os carnívoros su-periores, incluindo águias, tigres e os grandes tubarões bran-cos, devido à posição que ocupam no ápice da teia alimentar,estão predestinados a ser grandes em tamanho e escassos

em número. Eles vivem com uma parcela tão diminuta da ener-gia disponível para a vida que estão sempre beirando o limiarde extinção, sendo os primeiros a sofrer quando o ecossistemaao seu redor começa a se deteriorar” (Fig. 4). Portanto, existeum fluxo de energia que flui dos seres autotróficos para osheterotróficos (Mannino 1995). Autotróficos (algas e plan-tas) são organismos capazes de utilizar fontes inorgânicas decarbono (como dióxido de carbono = CO2), nitrogênio (comonitratos, sais de amônio) etc. como materiais básicos parabiossíntese, usando ou luz solar (fotoautotrófico) ou energiaquímica (quimioautotrófico) (Lawrence 1995). Os organismosheterotróficos podem estocar energia pela síntese de molé-culas orgânicas e macromoléculas, mas eles devem obter aenergia pela ingestão de moléculas ricas em energia contidaem outros organismos. Em última análise, essa energia quími-ca provém de autotróficos (Mannino 1995). Então a cadeiaalimentar é composta de quatro níveis tróficos, assim especi-ficados: nível trófico 1: autotróficos ou produtores; níveltrófico 2: consumidores primários (herbívoros); nível trófico3: consumidores secundários (carnívoros); nível trófico 4:consumidores terciários (comem outros carnívoros p. ex.: ga-vião) (Mannino 1995). Existe mais um último nível representa-do pelos decompositores. Os onívoros como os humanos seencaixam desde consumidores primários até terciários. Nascadeias alimentares, quando a energia passa de um níveltrófico para outro, ocorre perda de energia na forma de calor.Pode-se dizer que, quanto mais curta for a cadeia alimentar,maior será a energia disponível (Boschilia 2001, Pinto-Coelho2002). A teia alimentar compreende o conjunto de cadeiasalimentares de uma comunidade. A cadeia alimentar é geral-mente linear, corresponde a uma grande simplificação da teiadas relações tróficas e mostra apenas um caminho seguidopela matéria e energia dentro de um ecossistema; já nas teiasalimentares ocorrem inúmeras relações entre os componen-tes de uma comunidade (Boschilia 2001, Pinto-Coelho 2002).

Decorrente do exposto acima se pode inferir o ponto crí-tico de um ser vivo: manter a organização e informaçõesinternas, isto é, combater a entropia ou tendência entrópicacom neguentropia, pois se a entropia diminui, aumenta aorganização e informações internas ao organismo, caso con-

Figura 3 - Caminho imaginário do centro da Terra até a atmosfera, mostrando a distribuição dos organismos vivos na biosfera. Esquema baseado emtexto de Wilson (1992).

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trário, com aumento da entropia, ocorre o oposto (Fig. 5). Epara efetivarem sua neguentropia, combatendo a entropia,todo o ser vivo heterotrófico é obrigado a comer um outro servivo animal ou vegetal. Os humanos, em cada refeição e nosrestaurantes, são um exemplo cabal disso, digerindo vegetaise vários tipos de outros animais. Os canibais chegavam acomer outros seres humanos. Portanto, no nível da biosfera,além da teia alimentar, existem as redes alimentares que incor-poram as hierarquias de níveis tróficos da cadeia de alimen-tos, além de incluir as relações alimentares entre populaçõesno ecossistema (Mannino 1995). Em contraste com a energiaderivada do Sol, existem também os ciclos químicos ou bio-geoquímicos ou ciclos de nutrientes que se movimentam dasporções biótica e abiótica dos ecossistemas, consistindoos ciclos do carbono, nitrogênio e água (Mannino 1995,Boschilia 2001).

As espécies, na teia alimentar, estão dispostas em hierar-quias: a primeira é a pirâmide de energia, uma conseqüênciadireta da lei da diminuição do fluxo de energia, isto é, umaparcela relativamente elevada de energia do Sol que incidesobre a Terra e vai para as plantas embaixo, sendo gradual-mente reduzida até a quantidade diminuta que chega aos gran-des carnívoros no alto. Quanto mais longe um nível tróficoestiver do nível dos produtores, menor será a quantidade deenergia recebida. Uma pirâmide de energia nunca será inver-tida, pois um nível trófico terá necessariamente maior quanti-dade de energia do que o nível trófico seguinte (Boschilia2001). A segunda pirâmide é composta pela biomassa (pirâ-mide de biomassa), que corresponde ao peso ou à massa dosorganismos. De longe, a maior parte do volume físico do mun-do vivo está contido nas plantas. A segunda maior quantida-de pertence aos necrófagos e outros decompositores – bac-térias, fungos, térmitas – que juntos extraem as últimas miga-lhas da energia presa em tecidos mortos e resíduos de todosos níveis da teia alimentar e, em troca, devolvem elementosquímicos nutrientes degradados para as plantas (Wilson 1992).Apenas uma pequena parcela da massa adquirida por meiode alimentos é transformada em matéria viva. Grande parcelaserve como fonte de energia e é eliminada para o meio ambi-ente na forma de resíduos respiratórios (CO2, H2O) e excreção(uréia). Como foi frisado anteriormente, a vida opera em ape-nas 10% da energia do Sol que chega à superfície da Terra,fixada pela fotossíntese das plantas verdes. Na disputa, en-tão, pelo alimento (energia), que tipos de relações ocorrementre os diversos seres vivos? Podem ocorrer relações amis-tosas, expressas pela “associação entre espécies diferentes,que podem ser tanto de animais com animais, de vegetaiscom vegetais, como de animais com vegetais. Um caso extre-mo entre associações amistosas de seres vivos ocorre nofenômeno da simbiose (óõìâßùóç - sym – junto + bios – vida).Nesse tipo de associação, uma espécie necessita da outrapara sua sobrevivência. O exemplo mais conhecido desimbiose é o líquen (liquênicos/obrigatórios ou facultativos),associação de dois vegetais, uma alga e um fungo” (Fróes1988). A flora intestinal bacteriana, no homem, é outro exem-plo de simbiose (Fróes 1988). Por outro lado, há dois tiposfundamentais de relações inamistosas entre os seres vivos:predatismo e parasitismo. “Indiscutivelmente, o melhor exem-plo de relações inamistosas ocorre entre os predadores. En-tende-se por predadores todos os seres vivos que se alimen-tam à custa de outros. Além de grandes carnívoros ou deaves de rapina, os herbívoros também são predadores, por-que vegetais também são seres vivos. O homem, alimentan-do-se de animais e vegetais, também é um predador” (Fróes1988). A predação ocorre tanto no mundo macroscópico comono microscópico. Por exemplo, paramécios, verdadeiros “her-bívoros” do mundo microscópico, alimentam-se principalmen-te de bactérias e algas (Fróes 1988). Amoeba discoides, emdeterminadas ocasiões, praticam a predação associativa, istoé, quatro ou cinco amebas envolvem a presa, imobilizando-a,enquanto uma trata de devorá-la (Fróes 1988). Fróes tambémdestaca a ocorrência de curiosas adaptações no mundo dosparasitos. Por exemplo, ser devorado por outros, às vezes, éuma condição indispensável para a sobrevivência. Ovos deAscaris lançados no meio exterior precisam de mais ou menosquinze dias para formarem no seu interior uma pequena larva.A única maneira desse parasito alcançar novamente a faseadulta é a de que o homem ingira ovos com larva (Fróes 1988).Em certos casos, como nos cestóides, quando o parasito pre-

Figura 4 - Atenuação acentuada dos níveis de energia no decurso das teiasalimentares.

Figura 5 - O ser vivo, ao aumentar a organização e a informação,diminui a entropia. O ser vivo vive uma tragédia dialética. Alimenta asua morte ao desenvolver-se e expandir-se. Essa formidável com-plexidade, em que entropia/neguentropia, desorganização/organização,degenerescência/regeneração, vida/morte estão intimamente ligadas emisturadas, de modo evidentemente complementar, concorrente eantagônico, encontra sua expressão mais densa e mais completa nafórmula de Heráclito: “Viver de morte, morrer de vida” (Morin 1977).

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2424242424 Interface Parasito-hospedeiro • H. L. Lenzi, M. A. Vannier-Santos

cisa de dois hospedeiros para completar seu ciclo de vida,essa necessidade de ser ingerido se estende aos dois hospe-deiros. Ambas as Taenia saginata e T. solium parasitam ohomem em sua fase adulta. Na sua fase jovem ou larvária, a T.saginata parasita o gado e a T. solium o porco. Quando ohomem come carne bovina ou suína crua ou mal cozida, oscisticercos vão dar origem a novas tênias adultas (Fróes 1988,Rey 2001). Os cisticercos, tipo específico de forma larvária,encontram-se principalmente no tecido muscular, na pele ouno sistema nervoso dos vertebrados que se comportam comohospedeiros intermediários do parasito (boi, porco) (Rey2003). Toxoplasma gondii faz com que seus hospedeiros in-termediários, os roedores, se dirijam aos felinos que ospredarão e serão os hospedeiros definitivos (vide infra). Ou-tras formas de ocorrências curiosas são a existência de reló-gios internos, como a periodicidade das microfilárias deWuchereria bancrofti e os parasitos-bala. Dictyocaulus vivi-parus, parasito de pulmões de bovinos, tem suas larvas elimi-nadas nas fezes do hospedeiro. Para afastar-se das fezes, jáque os bovinos não pastam a grama junto às suas fezes, aslarvas aproveitam esporângios de fungos que se desenvol-vem nas proximidades das fezes, montando em cima deles eaguardando o momento de sua “explosão”, que pode lançá-las até a três metros de distância, caindo em grama distantedas fezes, ficando disponíveis à ingestão por algum bovinoque está pastando (Fróes 1988). Existem vários exemplos deinterações parasito-hospedeiro que provavelmente aumen-tam a predação e transmissão, nos quais é difícil estimar onível de aumento da predação em hospedeiros infectados(Messier et al. 1989). Alces americanos infectados comEchinococcus granulosus são provavelmente mais suscetí-veis à predação por lobos (Mech 1966). Um outro exemploclássico de manipulação do hospedeiro intermediário peloparasito, alterando seu comportamento, refere-se ao moluscoterrestre, Succinea, que alberga o estágio larval do trematódeoLeucochloridium (Rennie 1992). Esse parasito desenvolvecercárias a partir de esporocistos, mas essas permanecemnos esporocistos, que formam sacos de ninhadas (broodsacs)pulsantes nos tentáculos do molusco, tornando-os pareci-dos com lagarta, com cores vivas, mais facilmente perceptí-veis ou atrativas para ave predadora. Uma vez no intestinodo pássaro, o verme pode maturar e reproduzir-se (Moore2002). Outro exemplo intrigante de relação parasito-hospe-deiro, com mudança de comportamento do hospedeiro, éexemplificado pelo Dicrocoelium dendriticum (“lanceta”).Esse parasito, trematódeo do fígado, atinge o estágio adultoem grandes mamíferos herbívoros, que usualmente não sãoconsiderados predadores de formigas. Moluscos pulmona-dos terrestres (Cionella lubrica) ingerem ovos eliminadosnas fezes dos herbívoros e ficam infectados, liberandocercárias em bolas viscosas expelidas da cavidade do manto.Essas bolas são carregadas para ninhos de formigas (Formicafusca) e devoradas. Quando as cercárias de D. dendriticumingressam na cavidade corporal das formigas, começam amigrar para o pólo cefálico e uma ou duas metacercárias for-mam um cisto de parede delgada na parte anterior do gângliosubesofagiano, entre os nervos que servem ao aparelho bu-cal; o resto dos parasitos permanece na hemocele. As formi-gas infectadas comportam-se normalmente durante o dia, masquando a temperatura cai, elas sobem para a ponta das folhasde capim, abrindo e fechando as mandíbulas, e após entramnum tipo de torpor, ancoradas por suas mandíbulas. Passama ter dificuldade de deslocar-se da posição assumida, ficando

disponíveis à ingestão por herbívoro que esteja pastando aodiminuir a temperatura à tarde ou na manhã seguinte. Assimque a temperatura sobe, as formigas infectadas retornam àatividade normal (Anokhin 1966, Carney 1969, Moore 2002).A toxoplasmose crônica em roedores é outro exemplo de mu-dança de comportamento provocada por parasito. Está asso-ciada com comportamento alterado, levando a um aumentodo risco de predação por felino e a uma suposta vantagempara o parasito. Infere-se que os cistos neurotrópicos detoxoplasma exercem um efeito no comportamento do animal,diretamente ou através da liberação de produtos metabóli-cos. Mesmo em humanos, toxoplasmose de longa duração,tem sido vinculada à formação de lesões focais no cérebro ea desvios de personalidade (Holliman 1997). Os parasitos tam-bém utilizam, freqüentemente, os hospedeiros, por variadosmecanismos de exploração, alguns atingindo formas dramáti-cas para o hospedeiro e outros sendo mais atenuados porlongos processos de coabitação. Um dos exemplos mais in-trigantes é o parasito isópode Cymothoa exigua, que essen-cialmente substitui a língua de peixes abocanhadores(Lutjanus guttatus); a língua fica reduzida a um coto e oisópode passa a ocupar o espaço inicialmente tomado pelalíngua, podendo inclusive funcionar como esta (Brusca &Gilligan 1983, Moore 2002). Vespas parasitóides necrotróficasdepositam seus ovos em lagartas de inseto, que se conver-tem em alimento para as larvas em crescimento (Zimmer 2000).Schistosoma mansoni explora as respostas do hospedeiropara continuar e manter seu ciclo. Ao dispersar seus ovos eprodutos por vários sítios do organismo, provoca uma inten-sa reação na medula óssea (Lenzi & Lenzi 1990, Lenzi et al.1995) que contribui para a formação de granulomasperiovulares. Esse fenômeno foi qualificado por Damian (1987)como um exemplo de exploração do sistema imunológico peloparasito, tornando possível sua propagação. Torres e Pinto(1945), analisando lesões intestinais em tatus machos(Euphactus sexcinctus) experimentalmente infectados com S.mansoni, sugeriram, pela primeira vez na literatura, que a libe-ração dos ovos para as fezes era devida ao processo inflama-tório periovular. Doenhoff et al. (1978, 1981) e Dunne et al.(1983) forneceram a primeira evidência de que a passagem deovos de S. mansoni através da parede intestinal de camun-dongos experimentalmente infectados depende de mecanis-mos imunológicos. Damian (1987), como Torres e Pinto (1945),também propôs que o granuloma é o agente responsável pelotranslado dos ovos para o lúmen intestinal, devido à mobili-dade de linfócitos T e B, plasmócitos, neutrófilos, fibroblastos,macrófagos e células gigantes. De fato, Lenzi et al. (1987,1991), ao analisarem secções seriadas de intestino de camun-dongos infectados, observaram que os ovos liberados paraas fezes estavam sempre envolvidos por células inflamatóri-as, especialmente eosinófilos e monócitos. Essa observaçãofoi confirmada em três modelos diferentes: Swiss Webster(Rodentia, Muridae), Calomys callosus (Rodentia, Cricetidae)e Nectomys squamipes (Rodentia, Cricetidae), e possibilitouconcluir que a excreção de ovos é dependente do estágioexsudativo pré-granulomatoso provocados por ovos deesquistossoma. Esse estágio tem uma característica lítica eno intestino destrói, focalmente, componentes constitutivosda matriz extracelular do córion, formando uma onda celulardirecionada para a luz intestinal, que corrói a membrana basaldo epitélio, causando destruição ou desgarre do epitéliosuperposto aos pré-granulomas exsudativos, formando ca-nais para a passagem dos ovos para o lúmen intestinal (Lenzi

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2525252525Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

et al. 1987, 1991, 1997). Além da esquistossomose, a tubercu-lose pode ter sua transmissão favorecida pelas reaçõesgranulomatosas (Doenhoff et al. 1978, 1981). Dracunculusmedinensis é um filarídeo que se beneficia da resposta infla-matória para concluir seu ciclo biológico, manipulando o com-portamento humano. A inflamação produzida é caracterizadapor uma intensa queimação que valeu ao parasito os epítetosde serpentes ígneas ou de fogo ou verme-dragão (dracunculusé diminutivo de draco = dragão). O desconforto produzidopelo parasitismo força o homem a imergir o membro afetado(geralmente perna) em coleções de água doce onde estãoesperando os copépodos, que serão os hospedeiros interme-diários do helminto. O ciclo se completa quando estes crustá-ceos são ingeridos juntamente com a água.

Dos exemplos dados, deduz-se que: a) as relações entreos seres vivos não são estáticas, mas dinâmicas no tempo eno espaço; b) os organismos vivem obrigatoriamente eminterações simbióticas, isto é, simbiose significa simplesmen-te, segundo Bush et al. (2001), “organismos vivendo juntos”.Então que tipos de simbiose podem ocorrer? Esses autores(Bush et al. 2001) propõem oito tipos de relações simbióticas:1) foresia: relação ecológica entre indivíduos de duas espéci-es diferentes, em que uma fornece à outra transporte ou abri-go, sem interações tróficas. São exemplos o transporte deovos e larvas do berne (Dermatobia hominis) por várias es-pécies de insetos hematófagos sobre os quais a mosca-do-berne põe seus ovos e a polinização realizada pelo transportede pólen de uma flor para outra por borboletas (Bush et al.2001, Rey 2003); 2) comensalismo (Lat. com = junto + mensa =mesa): simbiose em que ocorre uma relação trófica e transfe-rência de energia entre os simbiontes. O benefício ganho éunidirecional, em que um parceiro se beneficia e o outro nãoé prejudicado e nem auxiliado. Um exemplo freqüentementecitado é a relação entre tubarões e rêmoras (melhor peixe-piloto, pois não há foresia). Quando os tubarões se alimen-tam de grandes presas, espalham pedaços de carne. Essessão aproveitados pelas rêmoras, ocorrendo, então, transfe-rência indireta de energia (Bush et al. 2001); 3) mutualismo:na relação mutualística, ambos os simbiontes não somente sebeneficiam, como nenhum deles pode sobreviver sem o ou-tro. Líquens configuram um exemplo clássico de associaçãoque pode ser obrigatória entre um fungo e uma alga (existemlíquens facultativos e os simbiontes podem ser separados).Nesse caso, o fungo confere proteção e umidade para a algae essa, por sua vez, fornece nutrientes para o fungo. A rela-ção entre ruminantes e microrganismos em seus estômagos étambém mutualística (Bush et al. 2001), bem como aquela en-tre térmitas e microrganismos que degradam a celulose; 4)exploração: nas interações exploratórias, o benefício só ocor-re em uma direção e, conseqüentemente, alguma forma dedesvantagem ou dano ocorre no parceiro. Várias categoriasdesse tipo de exploração podem ser reconhecidas baseadasprimariamente no número de hospedeiros atacados pelosimbionte e o subseqüente destino do organismo atacado.Se mais de um organismo é atacado, mas não morto, então oagressor é chamado micropredador caracterizando a 5)micropredação: organismos hematófagos como os mosqui-tos, algumas sanguessugas e moscas que picam, por exem-plo, são micropredadores altamente bem-sucedidos (Bush etal. 2001); 6) predação: quando mais de um organismo é ata-cado e sempre morto por um predador; 7) parasitóide: quan-do somente um organismo é atacado e sempre morto, entãoo agressor é rotulado de parasitóide, a maioria dos quais são

himenópteros (ordem de insetos, incluindo espécies solitári-as ou sociais, compreendendo formigas, abelhas e vespas) edípteros (os dípteros adultos são geralmente conhecidoscomo mosquitos, moscas, borrachudos e mutucas). Por exem-plo, uma vespa fêmea adulta pode depositar seus ovos nointerior ou sobre um inseto. As larvas, ao serem liberadas,passarão a consumir o hospedeiro até matá-lo (Bush et al.2001); 8) parasito: aplica-se à situação em que o agressorataca somente um hospedeiro, mas sem matá-lo (Bush et al.2001) (Fig. 6). Na maioria das vezes, o parasitismo provocadano ao hospedeiro, todavia existem situações que mostrampotenciais benefícios em ser parasitado (veja item Conclu-sões). Os parasitos podem também ser subdivididos emendoparasitos e ectoparasitos. Os endoparasitos vivem nosórgãos ou tecidos internos de seu hospedeiro e incluemprotozoários, platielmintos digenéticos, cestóides,nematóides, acantocéfalos, muitas bactérias e todos os vírus(Bush et al. 2001, Rey 2003). Os ectoparasitos, por sua vez,são parasitos animais ou vegetais que vivem na superfíciedos tegumentos de seus hospedeiros, como os piolhos eácaros. Note-se que esse conceito é impreciso, pois aquelesque se aprofundam na pele (como Tunga penetrans ou aslarvas de D. hominis), bem como os que habitam as cavida-des nasais, podem ser considerados tanto ecto comoendoparasitos (Rey 2003). Outro método dicotômico de clas-sificar os parasitos se baseia em seu tamanho (Bush et al.2001). Os macroparasitos são grandes e podem ser vistossem a ajuda de microscópio. Eles podem ser endoparasitoscomo os platielmintos digenéticos, cestóides, nematóides eacantocéfalos ou ectoparasitos como os artrópodes e amaioria dos platielmintos monogenéticos. Os microparasitos,como o nome indica, são microscópicos e podem também serendo- ou ectoparasitos, intra- ou extracelulares ou ambos. Osmicroparasitos eucarióticos são principalmente protozoários.A maioria dos parasitos obrigatórios consiste em forma adul-ta. Suas larvas podem incluir formas parasitárias obrigatóriase/ou apresentar estágios de vida livre. Os parasitos facultati-vos são caracterizados por adultos de algumas espécies quecomumente têm vida livre, mas ocorrendo uma oportunidade,sua progênie pode tornar-se parasitária. A maioria deles éprotozoário e uns poucos são nematóides e isópodes. Parasi-tos podem também albergar outros parasitos, os quais sãochamados hiperparasitos. São usualmente constituídos porbactérias ou vírus, mas também alguns protozoários, cestóidese crustáceos foram encontrados parasitando outros parasi-tos (Garham 1981).

Price (1991) argumenta que todos os organismos se jun-taram ou se agruparam em associações simbióticas de com-plexidade biótica crescente, propiciando avanços ma-croevolucionários além daqueles explicados pelo gradualismo.Uma simbiose pode começar como um parasitismo e evoluirpara uma associação mutualística, tornando-se tão obrigató-ria que as unidades originais passam a atuar como um únicoorganismo. Comunidades constituídas por essas unidadesformam a base para as principais radiações neste planeta.Price (1991) também enfatiza que a origem de simbiontes pro-vavelmente deriva de relações parasito-hospedeiro e resultaem simbiose mutualística, provendo as bases para extensamacroevolução e radiação adaptativa. Então a simbiose, comoserá discutido mais adiante, é uma grande força criativa(Margulis 1993, 2001, Sapp 1994, Paracer & Ahmadjian 2000,Margulis & Sagan 2002a). O argumento de Price (1991) para aaquisição de simbiontes benéficos a partir de parasitos é o

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viver intimamente com outros organismos, por isso apresen-tam uma predisposição, ou pré-adaptação, para tornar-semutualistas simbióticos (Price 1980). Um exemplo clássicodessa deriva foi a transição do parasitismo mitocondrial parao estado de organela (Margulis 2001). Jeon et al. (Jeon &Lorch 1967, Jeon 1972, 1987, Jeon & Jeon 1976, Jeon & Ahn1978) desenvolveram um excelente modelo com a infecção deuma cepa de bactéria em uma cepa de Amoeba proteus. Inici-almente, as bactérias provocaram efeitos deletérios, mas emsomente 200 gerações (18 meses) a população de Amoebatornou-se intensamente dependente das bactérias. Estabele-ceu-se uma associação mutualística e, em 10 anos, 100% dascélulas formaram clones na presença das bactérias. Em tempoevolucionário, 10 anos são quase instantâneos. Esse exem-plo ilustra um desvio extraordinariamente rápido de parasitopara mutualista, processo que provavelmente tem se repetidomilhões de vezes na evolução da vida (Price 1991). Após es-sas análises, pergunta-se: É o Homo sapiens um parasito noconceito clássico? Isso pode ser bem exemplificado na suadieta de ser onívoro ou polífago, aqui esquematicamente re-presentada na dieta de um europeu médio (até aos 70 anos):quatro bois, 20 suínos, 8 carneiros, 400 frangos, 250 kg depeixe, 3.000 kg de pão, massa, arroz, 7.000 kg de frutas e legu-mes, 600 kg de manteiga, óleo, margarina, além de 35.000-45.000 litros de água (Giordan 1997). O homem coabita comanimais domésticos, mantendo criações, que são sacrificadaspara sua alimentação diária (plantações de vegetais, fazen-das de gado, chiqueiros para suínos, galinheiros para gali-nhas etc.) (Diamond 2002). Além disso, o homem praticoucanibalismo, utiliza e utilizou seus semelhantes como cobaiashumanas (Goliszek 2003) e é o maior exemplo de maldade den-tro do reino animal (Thompson 2002). Pode-se ver o modo devida parasitário no Homo sapiens sapiens quando este sealimenta de leite (e derivados), mel, partes de alguns vegetais(sem matá-los), como couves, ou ainda quando é feita a apre-ensão das caças de animais como falcões e cães, especial-mente “treinados” (utilizando o instinto de predadores).Muitos autores consideram os cucolídeos parasitas, uma vezque esses se alimentam à custa de outra espécie, mas issonão se aplica ao “auge” da evolução (nós...). Da mesma for-ma, o homem monta cavalos, entre outros animais, mas issonão costuma ser caracterizado como um exemplo de foresia.

Mas a situação mais marcante e interessante a ser exami-nada, referente ao homem como parasito, é o estado de fetoem desenvolvimento no útero materno: ali se instala ummicroquimerismo em que células-tronco do feto (CD34, CD38,CD3) passam para a circulação da mãe, podendo gerar célulasdescendentes, já comprovadas, por mais de 20 anos. As célu-las fetais persistem no pós-parto e podem estar associadascom o desenvolvimento de desordens na mãe como escle-rodermia, lúpus eritematoso sistêmico, líquen plano e doen-ças da tireóide (Herzenberg et al. 1979, Bianchi et al. 1996,Aractingi et al. 2000, Bianchi & Romero 2003, Johson &Bianchi 2004). Em algumas complicações da gravidez comopré-eclâmpsia, poli-hidrâmnio, erupção polimórfica da gravi-dez, trabalho pré-parto e aneuploidias fetais cromossômicasespecíficas, o tráfego feto-materno está aumentado (Bianchi& Romero 2003). Por outro lado, há também fluxo de célulasda mãe e de ácidos nucléicos para o feto, os quais têm sidodocumentados em cordão umbilical e em tecidos de necropsiade neonatos não transfundidos (Bianchi & Romero 2003).Como as mães receberam células de seu(s) concepto(s), elassão, conseqüentemente, duplas microquimeras (Fig. 8). De

RELAÇÕES SIMBIÓTICAS

FORESIA: sem interação tróficas

COMENSALISMO: interação trófica indireta

EXPLORAÇÃO: interação trófica direta prejudicial

MUTUALISMO: interação trófica direta benéfica

PREDADOR: exploração que sempre mata muitos hospedeiros

PARASITÓIDE: exploração que sempre mata um hospedeiro

MICROPREDADOR: exploração que raramente mata muitoshospedeiros

PARASITA: exploração que raramente mata um hospedeiro

Figura 6 - Esquema dos vários tipos de relações simbiótica existentesentre os seres vivos (Bush et al. 2001).

seguinte: quando duas espécies interagem ocorrem váriasrelações possíveis, completando a classificação de Bush etal. (2001) já exposta: competição (–, –), para amensalismo(0, –), predação e parasitismo (+, –), comensalismo (+, 0) emutualismo (+, +) (Fig. 7). Entre todas essas relações, a ten-dência geral será pela seleção natural: reduzir os efeitos ne-gativos e favorecer os positivos. Assim, o parasitismo podeevolver para neutralismo, comensalismo e mesmo simbiosemutualística (Price 1991). Isso não significa, todavia, que to-dos os organismos, em última análise, deveriam rejubilar-senuma “orgia de beneficência mútua” (May 1981); associa-ções mutualísticas são comumente antagonistas a uma ter-ceira espécie (Addicott 1981). Os parasitos evolucionam ao

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2727272727Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

fato, o fluxo bidirecional feto-materno de células e de ácidosnucléicos está agora bem estabelecido através do uso detécnicas moleculares, incluindo as reações de cadeia depolimerase (PCR) convencional e em temporeal, assim comohibridação in situ por fluorescência. Em adição, antígenosleucocitários humanos (HLA) depositam-se na pele da mãe.A extensão do tráfego feto-materno pode ser afetada por trêsgerações de parentesco por HLA (concepto, mãe, avó). As-sim, as conseqüências da gravidez se estendem além da ges-tação (Bianchi & Romero 2003). Então, se o feto explora ohospedeiro (mãe) mas raramente provoca sua morte, encaixa-se na definição de Bush et al. (2001) para parasito (an-teriomente citada). É importante ressaltar que o exemplodo parasitismo fetal dá-se entre indivíduos da mesmaespécie.

Para finalizar este tópico, convém frisar a diferença entreparasito e fenômeno do parasitismo (no sentido deletério parao hospedeiro), já que nem sempre estão associados. Portan-to, segundo Rey (2003), a patogenicidade não é caráter obri-gatório dos parasitos, que podem se mostrar indiferentes sobesse aspecto (como sucede, p. ex. com Trypanosoma rangeli,Pentatrichomonas hominis e várias espécies de amebas in-testinais do homem) ou, mesmo, benéficos (como p. ex. naespirometrose de camundongos, que crescem mais quandoparasitados) (veja adiante).

Restrições das inter-relações entresistemas complexos

Duas noções são aqui importantes para entender melhoreste tópico: 1) a integração extrema dos subsistemas que com-põem um organismo impõe severas restrições aos processosde mudança biológica; 2) os organismos, no caso os hospe-deiros, são sistemas muito complexos (ou seja, ricamenteinterconectados), somente podendo evoluir de forma sensí-vel se a ligação entre as suas subunidades for imperativa-mente fraca (Dent et al. 1997). Esses dois aspectos conceituaisgeram um problema: Como os parasitos são integrados ouincorporados nesse ambiente (organismo do hospedeiro) de

Figura 7 - Caminhos evolucionários previstos, num sistema interativo, na relação entre duas espécies (segundo Price 1991).

alta restrição? Mas antes de responder a essa questão, con-vém elucidar melhor a noção de restrição em um sistema com-plexo. Alexander (1964) ilustra esse ponto, utilizando umametáfora arquitetônica: “Se a luz não penetra suficientementenuma casa, por exemplo, e se acrescentam janelas para reme-diar este defeito, esta mudança pode efetivamente aumentaro fluxo de luz que entra, mas pode também revelar demasiada-mente a vida privada dos moradores. Para ter mais luz, pode-ríamos também aumentar a dimensão das janelas. Mas istoseria nocivo para a solidez das paredes, e a casa poderiadesabar. Trata-se de exemplos que mostram como diferentesvariáveis estão ligadas umas às outras [...]. Manifestamente,visto que estão interligadas, não é possível modificá-las in-dependentemente, uma a uma”. Schneider e Kay (1997) sali-entam que os próprios genes exercem o papel de restringir oprocesso de auto-organização de um ser vivo às opções comalta probabilidade de sucesso. Eles são o registro da auto-organização bem-sucedida. Os genes não são o mecanismodo desenvolvimento, mas sim a auto-organização. Os geneslimitam e restringem o processo de auto-organização. Em ní-veis hierarquicamente superiores, outros dispositivos exer-cem esse papel restritivo. A habilidade regenerativa de umecossistema é uma função das espécies disponíveis para oprocesso de regeneração (Schneider & Kay 1997). Voltandoagora à questão formulada, duas possíveis situações, pelomenos, podem ocorrer: a) hospedeiro com ligação forte (=alta restrição) ao interagir com parasito também com ligaçãoforte (= alta restrição), ocorrerá restrição ou rechaço uni oubilateral; b) hospedeiro com ligação fraca (= baixa restrição)ao interagir com parasito com ligação fraca ou forte, poderásuceder aceitação ou incorporação.

Mas o que determina ou facilita as interações parasito-hospedeiro, isto é, o que faz com que eles se encontrem noespaço e no tempo? As diferentes populações de organis-mos, incluindo os hospedeiros e parasitos, não estão disper-sas de maneira difusa, nem misturadas ao acaso, mas distri-buem-se elas próprias por segregação e agregação, segundodistribuições características que representam o “modelo decampo” ou “atratores” do sistema do qual participam e/ou

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do qual são constituintes (modificado a partir de Ceruti 1995).Os atratores são, então, facilitadores de aproximação e/ouagregação entre diversos organismos, criando condições paraque isso ocorra. Ambientes ecológicos que favorecemendemias ou interações entre certos organismos (p. ex.: umailha distante com certas características ecológicas, pântanosetc.) podem ser considerados como atratores ou “modelos decampo”. Ao ocorrer a aproximação entre organismos distin-tos cresce a possibilidade de interações intersistêmicas, con-duzindo naturalmente à noção das fronteiras, através dasquais se dão as relações entre os sistemas ou as relaçõesentre o sistema e seu ambiente, então considerado como ocontexto do sistema (Esteves de Vasconcelos 2003). As fron-teiras não são sistemicamente concebidas como barreiras,mas sim como o “lugar de relação” ou o “lugar das trocas”entre sistemas distintos ou entre sistema e ambiente. Hoje,numa perspectiva sistêmica novo-paradigmática, concebem-se tanto o sistema quanto suas fronteiras como resultantesde distinções do observador (Esteves de Vasconcelos 2003).Quando distintos sistemas passam a se aproximar e se agre-gar, as fronteiras intensificam a aproximação dos “lugares derelação ou de trocas”, podendo ocorrer os fenômenos derechaço ou de associação fraca, seguida por adesão, que vaidepender de semelhanças e contra-semelhanças oucomplementaridade ou identificação e contra-identificaçãomoleculares entre os ligantes e os receptores. Após a adesão,poderá ou não ocorrer invasão e penetração, com ou semespalhamento ou difusão do organismo invasor pelo interiordo organismo hospedeiro. O importante processo biológico– a adesão seletiva entre células ou componentes do parasi-to e hospedeiro – depende de forma crucial da intensida-de absoluta das interações fracas: se essas forem apenas umpouco mais fracas, as ligações seriam impossíveis. Se, aocontrário, forem só um pouco mais fortes, as células ou com-ponentes teriam muita dificuldade em se separar um(a) do(a)outro(a), uma vez estabelecidas essas ligações (Dent et al.

1997). Tradicionalmente a relação parasito-hospedeiro foi tra-tada como um binômio estímulo (parasito) e resposta (hospe-deiro), desconhecendo a existência fundamental de um ter-ceiro componente imprescindível e determinante do sucessoda relação, chamado, com bases em idéias de Piaget (1967),assimilação a um esquema conexo, estruturalmente existenteno hospedeiro albergador, que depende, portanto, de suaconexidade interna intrínseca. Se nesse processo de assimi-lação ou captação de algo existente no meio o organismocaptador não se modifica, o comportamento consiste em sim-ples reposição dos elementos consumidos pelo funcionamento(reposição, por exemplo, da glicose e do oxigênio). Porém, seo objeto a ser assimilado, no caso um parasito, oferecer resis-tência à assimilação, o processo de assimilação sofre modifi-cações em dois sentidos: 1) tenta transformar o “objeto a serassimilado” em algo “assimilável”; 2) provoca modificaçõesnas próprias estruturas de assimilação, construindo novosmodelos que permitam “assimilar” o objeto a ser assimilado(Lima 1999). Essas modificações no aparelho assimilador sãochamadas por Piaget (1967) acomodação, que corresponde àreestruturação do esquema (estratégia) de assimilação (nãohá acomodação senão no curso de uma assimilação). A aco-modação é a “aprendizagem” ou o aumento do conhecimen-to, modificação operativa na forma de agir. Diante de umadificuldade (problema), o organismo: a) recua ou desiste daatividade; b) deforma a situação para adaptá-la aos esque-mas de assimilação; c) reestrutura o esquema de ação (aco-modação) (Lima 1999). Feita a reestruturação, o organismopassa a dispor de um novo esquema de ação que deve seralimentado (diz-se que houve uma “equilibração (auto-regulação) majorante” (que aumenta). A equilibração é ma-jorante (logo, não é simples feedback negativo ouhomeostase) porque a cada reequilibração eleva-se o níveloperativo do sistema (Piaget 1967, Lima 1999) (Fig. 9). Porexemplo, as respostas secundárias, terciárias etc. de anticorposà introdução de um antígeno no sistema imunológico expres-

Figura 8 - Microquimerismo fetal e materno.

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sam respostas de equilibração majorante. É importante desta-car que todo o esquema de assimilação tende a alimentar-se,isto é, tende a incorporar os elementos que lhe são exteriorese compatíveis com sua natureza (Lima 1999). Por esta razãoocorrem particularidades ou “especificidades” nas relaçõesparasito-hospedeiro e os hospedeiros não costumam ser uni-versais, mas seletivos. A partir das idéias de Piaget (1967)infere-se também que a experiência de algum parasito assimi-lado por parte de um hospedeiro é irreversível. Nunca poderámais ser removida ou anulada a partir do processo de assimi-lação-acomodação-equilibração. Isto é, um indivíduo que foiinfectado ou parasitado por um ou mais agentes infecciososserá sempre um indivíduo diferente de sua fase de “inex-periência parasitária”, mesmo que tenha sido tratado e “cura-do”. Em sistemas complexos não há redução de experiências,mas sim equilibrações majorantes. Essas considerações tam-bém explicam as interferências de uma infecção sobre outra(s),pois cada infecção ao exigir assimilação-acomodação-equilibração acaba repercutindo, negativa ou positivamente,no processo de assimilação-acomodação-equilibração daoutra. Por exemplo, a bactéria Rhodococcus equi, que ocorreem eqüinos, não é normalmente assimilada por indivíduoshumanos sem infecção por HIV, mas, ao contrário, em indiví-duos infectados é facilmente assimilada. Isto é, a infecçãopor HIV altera o esquema de assimilação do indivíduoinfectado. É importante destacar que o agente parasitário étambém um ser vivo complexo e não um objeto inerte, comocostuma ser usualmente tratado principalmenente nos livrosde imunologia. Como conseqüência, ele também deve modifi-car seus esquemas de assimilação para viabilizar a interaçãocom o hospedeiro. Portanto, a relação parasito-hospedeiro ésimétrica. Segundo Maturana e Varela (1984) isso significaque duas (ou mais) unidades autopoéticas podem estaracopladas em sua ontogenia quando suas interações adqui-rem um caráter recorrente ou muito estável. Dado que a uni-dade autopoética tem uma estrutura particular, as interações,se forem recorrentes entre unidade [parasito] e meio [hospe-deiro], constituirão perturbações recíprocas. Ainda de acor-do com Maturana e Varela (1984), nessas interações, a estru-tura do meio apenas desencadeia as modificações estrutu-rais das unidades autopoéticas (não as determina nem asinforma). A recíproca é verdadeira em relação ao meio. Oresultado será uma história de mudanças estruturais mú-

tuas e concordantes, até que a unidade e o meio se desinte-grem: haverá acoplamento estrutural (Maturana & Varela1984). Essa desintegração na relação parasito-hospedeiropode ocorrer por morte de um dos integrantes ou por separa-ção dos mesmos.

Parasitismo molecular e aquisição de genomas –o conceito de infectron (parasito molecular)

Embora a teoria evolutiva de Darwin tenha proporciona-do uma estrutura intelectual para o entendimento dos pro-cessos de especiação e a unidade de formas de vida, a teorianunca satisfez os biólogos evolucionistas (Paracer &Ahmandjian 2000). O mito do darwinismo está chegando aoseu fim (Chauvin 1997) e cada vez mais se admite que “aseleção natural não pode explicar a origem das novas varia-ções, mas apenas a sua extensão ulterior (Endler 1986). Acres-centa Goodwin (1993): Os organismos são a causa e conse-qüência de si próprios [...] não é a seleção natural a causa dosorganismos”. “Não são os genes a causa dos organismos [...]os organismos não têm causa: são a sua própria causa. Masisso não conduz ao misticismo se pensarmos nas caracterís-ticas emergentes da auto-organização [...] e considerarmosque um organismo resulta de um atrator biológico [...] Nada éacrescentado do exterior, tudo vem do interior, do próprioorganismo [...] Não há lugar para uma qualquer mística, parauma causa exterior”.

As idéias evolucionárias, atualmente, estão sendo refei-tas com base na linguagem do equilíbrio pontuado, poli-morfismo genético, evolução molecular, seleção sexual, coma adição, agora mais recentemente, dos conceitos decoevolução e simbiose (Paracer & Ahmandjian 2000). Pelagenômica funcional se está também percebendo quão grandeé o abismo entre “informação” genética e significado biológi-co, e o próprio conceito de gene está sendo seriamente re-pensado (Keller 2002). Portanto, para discutir os tópicos des-se item do texto será necessário elucidar alguns aspectosconceituais, fundamentais para sua intelecção.

O genoma está sendo cada vez mais considerado umaestrutura dinâmica, fluida e não mais estática e fixa, ocorren-do, então, a fluidez genômica e a influência de normasepigenéticas gerando novas informações de seqüências (VonSternberg et al. 1992, Von Sternberg 1996). Classicamente foideterminado que o DNA codifica seqüências polipeptídicas egenomas são modelados como arranjos lineares de domínioscodificantes de proteínas e de sítios reguladores associados.Porém, análises de seqüência e mapeamento do genoma têmdemonstrado que somente uma pequena percentagem do to-tal do DNA eucariótico está devotada à codificação de pro-teína (Von Sternberg 2000). No caso do genoma humano, me-nos de 3% dos nucleotídeos cromossomais compreendemgenes no sentido tradicional e o mesmo parece aplicar-se aoutros organismos multicelulares (Bernardi 1995). Isso signi-fica que a clássica distinção genótipo-fenótipo, apresentadana forma do código genético/relação de proteínas, refere-se asomente 1-5% do DNA de muitos filos. Esse DNA corres-ponde ao DNA de expressão (descriptor DNA), responsávelpelo código genético estandardizado, o qual é explícito eindependente do contexto (Von Sternberg 2000). O segundotipo de DNA, chamado DNA não-gênico (non-genic DNA) ouDNA construído (constructed DNA), é dependente do con-texto e não manifesto unicamente na seqüência nucleotídica.A grande quantidade do DNA não-gênico corresponde a um

Figura 9 - A relação entre parasito e hospedeiro depende de esquemas deassimilação, que sofrem contínuas acomodações, visando equilibraçõesmajorantes por auto-regulação (Piaget 1967).

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complicado arranjo de domínios reguladores, sítios de liga-ção à matriz nuclear; seqüências de macro-, mini- emicrossatélites; pseudogenes; elementos nucleares interca-lares curtos (short interpersed nuclear elements = SINEs);elementos intercalares longos (long interpersed nuclearelements = LINEs); elementos tipo-retrovirais; transposons emuitas outras extensões ou trechos de nucleotídeos não-clas-sificados (Von Sternberg 2000, Strachan & Read 2002). Embo-ra esses elementos não-gênicos não apresentem qualquerfunção diretamente relacionada ao fenótipo, são deter-minantes da arquitetura genômica reguladora e de códigostridimensionais ou de conformação. Isto é, o espaçamento epermutação de elementos não-gênicos influenciam padrõesde transcrição gênica, já que essas seqüências podem adotarestruturas secundárias e terciárias singulares, específicas paraloci no contexto da cromatina e podem também servir comosorvedouros para proteínas nucleares (Von Sternberg 2000).Um aspecto singular desses códigos de conformação é queeles se originam de interações proteína-proteína-DNA e as-sim, diferentemente do código genético clássico, resultam damescla entre o DNA de expressão (descriptor DNA) e oconstruído (DNA-proteínas ligantes). Portanto, volta-se a fri-sar que o código genético estandardizado é explícito e inde-pendente do contexto, enquanto a informação derivada deconcatenações de seqüências cromatínicas singulares erepetitivas é dependente do contexto e não está manifestaexclusivamente na seqüência nucleotídica primária (VonSternberg 2000). Os cromossomos não são estáticos, mas sãogeneticamente fluidos no nível seqüencial e as seqüências,que medeiam a sua fluidez dependem de regulação celular(McClintock 1978, 1984, Von Sternberg 1996a). Agora se sabeque a informação pode ser geneticamente transmitida viacromatina e/ou conformações cromatina-citoesqueleto e essetipo de hereditariedade epigenética tem significado fenotípico(Von Sternberg 2000). Essa nova concepção renasce, em par-te, o lamarkismo (Jablonka & Lamb 1995, Bessol 2000). Brink(1960), um estudante de paramutação (= condição em que umalelo influencia a expressão de outro no mesmo locus quandoeles estão combinados num heterozigoto) propôs que ogenoma tem duas funções: 1) função genética: responsávelpela transmissão da informação, baseada em cromossomo,de uma geração para a próxima; 2) função paragenética: sen-sitiva ao ambiente celular e a estados cromatínicos her-davelmente modificados em resposta a sinais recebidos e in-terpretados (Brink 1960, Jorgensen 1993, 1994, Jablonka &Lamb 1995, Meyer & Saedler 1996). A primeira função édarwinista e a segunda lamarkiana. As células, então, podemcomandar e escrever seus próprios genomas (Shapiro 1991,1992, 1997, Von Sternberg 1996a), indicando que as configu-rações de DNA são o resultado de um sistema inteligentecitoplasmático-cromossômico (Hameroff 1987, Shapiro 1991,1992, 1997, Von Sternberg 1996a), em que os estados celula-res, englobando a forma, influenciam alterações genômicasestruturais e simbólicas, atualizando os atratores morfológicos(= recursividade teleomórfica) (Von Sternberg 2000).

O aspecto dinâmico do genoma e as característicasde sua composição, rica em elementos de transposição(transposons, retrovírus endógenos, retrotransposons,retropseudogenes) (Strachan & Read 2002) mudaram drama-ticamente o conceito da árvore da vida (= “árvore” da vidarevisada) (Dootlittle 1999, 2000) (Fig. 10). Segundo Dootlittle,o padrão de evolução não é linear e arboriforme como Darwinimaginou. Embora os genes sejam transmitidos verticalmentede uma geração para a outra, a herança vertical não é o único

processo importante que tem afetado a evolução das células.A transferência lateral ou horizontal de genes tem tambémocorrido, como um processo exuberante e diferente, no cursoda evolução. Essa transferência compreende a distribuiçãode genes isolados ou conjuntos completos de genes que mi-gram, não de uma célula fonte ou materna para seus descen-dentes, mas se processa através das barreiras entre as espé-cies. Isso faz com que os eucariotas tenham emergido nãodas arqueas, mas de uma célula precursora que foi produtode qualquer número de transferências gênicas horizontais –eventos que legaram parte bacteriana, parte arqueana e partede outras coisas (Dootlittle 1999). Então a história da vidaresulta da aquisição e integração de genomas (Margulis &Sagan 2002a). Baseados nessa concepção, Margulis e Sagan(2002) definem espécie do seguinte modo: dois seres vivospertencem à mesma espécie quando o conteúdo e o númerode genomas integrados, inicialmente independentes, que osconstituem, são os mesmos. Esse conceito de que organis-mos, em comum, com o mesmo número e tipo de genomasintegrados pertencem à mesma espécie, baseia-se no reco-nhecimento de que todos os organismos nucleados são com-postos (Margulis & Sagan 2002a). Isto é, todos os organis-mos nucleados evoluíram ou originaram-se de simbiose, comintegração de genomas, podendo-se falar, em senso lato, deparasitismo molecular ou genômico. Em outras palavras, cadaser vivo, de bactéria a mamífero, é um consórcio de seresvivos (Tosta 2001). Esse consórcio pode ser íntimo, atingin-do a individualidade do genoma ou estruturas extra-genô-micas. Considera-se que o organismo humano seja compostode 1013 células, enquanto as várias superfícies do corpo po-dem estar colonizadas por aproximadamente 1014 célulasmicrobianas procarióticas e eucarióticas nativas, atingindo aproporção de 10 células microbianas por cada célula humana(Savage 1977). Esse número de bactérias parece ser bemmaior, já que uma pessoa sadia é colonizada por mais de 1012

bactérias na pele, 1010 bactérias na boca, e 1014 bactérias notrato alimentar (Samuelson 2003). Em torno de 10.000 micror-ganismos, incluindo vírus, bactérias e fungos, são inaladosdiariamente por cada habitante de cidade (Samuelson 2003).Tosta (2001) em seu artigo pergunta: Quais são as conse-qüências de tal extensa e prolongada associação entre huma-nos e micróbios? Responde propondo que os micróbios ehumanos, na realidade todos os seres vivos, estão conec-tados por redes funcionais, as quais atuam promovendo adiversidade, a adaptação e a coevolução. Cunhou também otermo infectron para abarcar o grande número de DNAsexógenos que invadem o genoma e interferem em sua organi-zação ou função. Segundo Tosta (2001), as principais carac-terísticas dos infectrons são: 1) um genoma inteiro ou partedele; 2) de qualquer fonte ou origem para qualquer alvo; 3)transferência horizontal ou vertical; 4) ação curta ou prolon-gada; 5) transferência natural ou artificial; 6) causa alteraçõesestruturais ou funcionais no genoma hospedeiro. Considera,também, que todas as conexões dentro ou entre comunida-des microbianas, ou entre essas comunidades e o hospedei-ro, que acarretam troca gênica, são conexões infectrônicas.Diferente das conexões não-infectrônicas, as infectrônicasprovocam diversidade (Tosta 2001). Os infectrons ou ele-mentos transferíveis (TEs) seriam, então, parasitosmoleculares.

A literatura apresenta numerosos e fascinantes exemplosde transferências gênicas. Com o aparecimento dos peixescartilaginosos com mandíbulas, os condrictes, surgiram oslinfócitos B e T, que se caracterizam por possuírem recepto-

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res específicos [imunoglobulina e receptor T (TCR)] que for-mam rearranjo gênico. Para que o rearranjo ocorra, é necessá-ria a participação dos genes RAG 1 e RAG 2, os quais codifi-cam componentes da V(D)J recombinase (V = variável; D =diversidade; e J = joint ou junção) ou codificam fatores detranscrição ou outros tipos de proteínas que ativam a maqui-naria da V(D)J recombinase. A parte fascinante desta históriafoi a descoberta de Oettinger et al. (1990), do grupo de D.Baltimore, os quais detectaram que os genes RAG em mamí-feros, aves e anfíbios têm regiões codificadoras sem íntrons eestão muito próximas umas das outras, caracterizando umasituação rara em genomas de vertebrados. Esses genes têmaspecto de uma unidade carreada para o interior do genoma apartir de um organismo unicelular, como uma levedura ouuma bactéria, em que genes justapostos e sem íntrons sãocomuns. Esses autores concluíram que os RAGs foram partede retrotransposons e tiveram a função de rearranjar o DNAem sua vida prévia. É possível que os ancestrais dos genesRAG tenham sido horizontalmente transferidos numa linha-gem de metazoa, em algum ponto recente da evolução (peixescartilaginosos?). Então foram infecções virais que provoca-ram a virada do sistema pré-linfocitário para linfocitário!

Pesquisadores começaram a caracterizar as moléculas queparticipam na interação entre espermatozóide e óvulo. Es-tudando espermatozóide de hamster, camundongo ou deCaenorhabditis elegans, detectaram uma molécula dímera dafamília ADAM, rotulada de fertilina, cujo domínio extracelularda subunidade alfa apresenta uma região hidrofóbica de apro-ximadamente vinte aminoácidos, que se assemelha a regiõesfusogênicas de proteínas de fusão virais, as quais medeiam afusão de envelopes virais com as células que eles infectam(Blobel et al. 1992, Podbilewicz 1996, Evans et al. 1997). Issosugere que foi por meio de infecções por vírus que algunsanimais, na evolução, adquiriram a capacidade de se reprodu-zir sexualmente pela fusão de duas células haplóides diferen-tes, isto é, de um espermatozóide com um óvulo. A fertilizaçãode um óvulo por um espermatozóide se assemelha a uma in-fecção! Evidências dessa ordem vão lançando hipóteses decomo começou a reprodução sexuada com células germinaishaplóides distintas. A ontogênese da placenta humana de-pende da formação do sinciciotrofoblasto, a qual é mediadapor uma proteína de envelope de retrovírus endógenos (famí-lia Herv-W) denominada sincitina (Mi et al. 2000, Rote et al.2004). Essa produz a fusão celular e a imunossupressão local

Figura 10 - “Árvore” da vida revisada, segundo Dootlittle (2000), mostrando transferências horizontais e verticais entre os seres vivos e origem,não em um precursor único, mas em comunidade de ancestral comum de células primitivas.

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na placenta e depende de proteínas originadas de provírusresidentes em nosso genoma (Muir et al. 2004).

Esses achados (RAGs, fertilina e sincitina) exemplificam aimportância de transmissões horizontais no transcurso dafilogenia, mostrando que nós somos resultado de um verda-deiro embaralhamento gênico entre seres distintos. Na reali-dade, somos uma “salada de genes” provenientes de diver-sos tipos de ancestrais! Uma verdadeira humilhação para osantropocentristas e racistas!

Imase et al. (2000), usando PCR, revelaram a transmissãohorizontal de seqüências de retrovírus de camundongo dostipos A e C do hospedeiro para S. japonicum. Seqüências deretrovírus de camundongo do tipo A foram também detecta-das em DNA extraído de cercárias de S. japonicum e S.mansoni indicando também a ocorrência de transmissão ver-tical.

O genoma de um vírus (o conjunto de seu DNA ou RNA)pode colonizar permanentemente seu hospedeiro, adicionan-do genes virais ao organismo invadido e até tornando-separte fundamental de seu material genético. Portanto, os ví-rus geram efeitos mais rápidos e diretos do que os de forçasexternas, que simplesmente selecionam variações genéticasinternas geradas lentamente. A enorme população dos vírus,combinada com suas taxas aceleradas de replicação e muta-ção, faz deles a maior fonte mundial de inovação genética. Egenes de origem viral podem viajar, invadir outros organis-mos e contribuir para mudanças evolutivas (Villarreal 2004).Villarreal, juntamente com outros pesquisadores, Phillip Bell,da Universidade Macquarie em Sidney, Austrália, argumen-tam que o próprio núcleo celular é de origem viral. O adventodo núcleo – que diferencia eucariotas (organismos cujas cé-lulas contêm núcleos verdadeiros), incluindo os humanos,dos procariotas, como as bactérias – não pode ser explicadoapenas com a adaptação gradual. O núcleo pode ter evoluídode um vírus de DNA grande e persistente que passou a seabrigar permanentemente nos procariotas (Villarreal 2004). Épossível ainda que o núcleo das células eucarióticas tenhaadvindo de uma simbiose de arquibactéria (Archea) em bac-térias (eubactérias) (Horiike et al. 2001, 2002).

Nossas mitocôndrias guardam muitas semelhanças bio-químicas com bactérias, sustentando a teoria endossimbióticada origem dessas organelas (Margulis 2001), como sensibili-dade a antibióticos e iniciação da transcrição por formil-metionina, características compartilhadas com inúmeras bac-térias patogênicas. As caudas de actina, reguladas por Arp2/3, que são produzidas durante a infecção por Listeria mono-cytogenes, podem também ser detectadas em mitocôndriasde levedura (Strauss 1999). Isso faz lembrar que no continuumde transição entre parasito e mutualista obrigatório e até aformação de uma nova espécie, os simbiontes lançam mão deconhecidas estratégias parasitárias para o estabelecimentoe manutenção dos consórcios (Bermudes & Joiner 1993).

Recentemente, Nitz et al. (2004), da equipe de Antonio R.L. Teixeira, demonstraram a transferência genética de DNA decinetoplasto mitocondrial de Trypanosoma cruzi para paci-entes humanos com doença de Chagas. Essa transferênciafoi reproduzida experimentalmente em coelhos e galinhas. Emcromossomos humanos foram identificados cinco loci comosítios de integração, ocorrendo a incorporação de DNA deminicírculos do parasito em elementos LINE-1 ou em genesde betaglobulina. Verificaram, também, a integração de KDNAem linha germinal de galinha, ocorrendo transmissão verticalem progênie livre de infecção. Esses dados mostram como a

simbiose parasitária produz inovações evolutivas, como jáfoi frisado anteriormente (Bermudes & Joiner 1993).

Bastante disseminadas, as bactérias Wolbachia, gênerode bactérias da ordem Rickettsiales, são “pensionistas” comum interesse de longo prazo em seu hospedeiro invertebrado.Elas vivem no interior das células e são transmitidas à gera-ção seguinte invadindo os ovos de seu hospedeiro (Hurst &Randerson 2002). São encontradas como simbiontes damaioria das filárias patogênicas (como Wuchereria bancrofti,Brugia malayi, Onchocerca volvulus e outras). Nas infec-ções filarianas experimentais de animais, o tratamento pro-longado com antibióticos (como tetraciclina ou oxitetraciclina)possibilita eliminar a bactéria, bloqueando ao mesmo tempo areprodução das filárias. Com doses menores de antibióticos,as microfilárias produzidas apresentam bloqueio da diferen-ciação do estádio L3 para verme adulto, razão pela qual apresença de Wolbachia parece indispensável ao ciclo repro-dutivo dessas filárias e, portanto, à sua patogenicidade (Rey2003). Espécies de Wolbachia infectam uma grande quanti-dade de invertebrados, crustáceos e nematóides (Rigaud1999). Ao redor de 16% de todas as espécies de insetos por-tam essa bactéria, que, como as mitocôndrias é herdada atra-vés de citoplasma materno (Werren 1997, Wilkinson 1998).Vários exemplos mostram que essas bactérias contribuempara a diversidade da vida. Em bicho-de-conta (woodlouse),Wolbachia infectam glândulas salivares e convertem em-briões de machos em fêmeas (Paracer & Ahmadjian 2000).Fêmeas de vespas infectadas só produzem filhas, enquantofêmeas não-infectadas desenvolvem machos (Hurst et al.1993). Insetos portadores de Wolbachia de diferentes cepassão mutuamente incompatíveis, não podendo interprocriar,ocorrendo, então, especiação entre insetos (Werren 1997).

Os humanos receberam uma grande quantidade de mi-crorganismos ao conviver com animais domésticos, os quais,às vezes constituem verdadeiros presentes letais (Diamond2002). Segundo Diamond, ocorreram quatro fases na evolu-ção de uma doença humana a partir de um precursor animal. Aprimeira fase é ilustrada por várias doenças que adquirimosde vez em quando diretamente de animais domésticos. Entreelas estão a síndrome da arranhadura do gato, a leptospirosede cães, a psitacose de galinhas e papagaios e a brucelose devacas. Na segunda fase, um antigo agente patogênico animalevolui até o ponto em que é transmitido diretamente entrepessoas e causa epidemias. No entanto, a epidemia desapa-rece por várias razões, como a cura por meio da medicina, oua interrupção quando todos em volta já foram infectados e setornaram imunes ou morreram. Por exemplo, uma febre desco-nhecida denominada O’nyong-nyong apareceu no leste daÁfrica em 1959 e contaminou milhões de africanos. Foi causa-da provavelmente por um vírus de macaco transmitido aosseres humanos por mosquitos. O fato de os pacientes se re-cuperarem depressa e se tornarem imunes a um novo ataquecontribuiu para que a doença desaparecesse rapidamente(Diamond 2002). Uma terceira fase no ciclo evolutivo de do-enças mais importantes é representada por antigos agentespatogênicos de animais que se alojaram em seres humanos,não desapareceram, e ainda podem, ou não, vir a se tornargrandes assassinos da humanidade. A febre de Lassa consti-tui um exemplo, observada pela primeira vez na Nigéria em1969, derivada provavelmente de um vírus de roedor, queprovoca uma doença fatal (febre hemorrágica). Mais estuda-da e conhecida é a borreliose, causada por uma espiroquetaque é contraída pela picada de carrapatos que vivem em ratose veados. Encaixa-se também nessa fase a aids, derivada de

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3333333333Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

um vírus do macaco e constatada pela primeira vez em sereshumanos em 1959 (Diamond 2002). A fase final dessa evolu-ção é representada pelas mais importantes e antigas doençasepidêmicas restritas aos seres humanos. Essas doenças de-vem ter sido as sobreviventes evolutivas dos muitos agentespatogênicos que tentaram saltar dos animais para nós – e amaioria fracassou (Diamond 2002).

A interface parasito-hospedeiro

Esta parte do texto visará mostrar, de forma mais detalha-da, alguns mecanismos moleculares utilizados pelo parasitopara aderir, penetrar e invadir o hospedeiro, mimetizar suasmoléculas e ativar ou suprimir suas respostas celulares. Comoparasito e hospedeiro são seres com histórias filogenéticasparcialmente equivalentes, decorrentes de genes transmiti-dos vertical ou horizontalmente, exibem muitas moléculassemelhantes ou contrassemelhantes, possibilitando o conví-vio estrutural.

Mecanismos de reconhecimento parasito-hospedeiroO reconhecimento do hospedeiro pelo parasito é bastan-

te eficiente, mas não é completamente preciso, fato que expli-ca o parasitismo acidental de humanos por larvas deAncylostoma caninum (larva migrans cutânea) e Toxocaracanis (larva migrans visceral). Esses aparentes “equívocos”podem dar origem às chamadas “parasitoses emergentes”,nas quais o patógeno explora novos nichos ecológicos emdistintos hospedeiros, como no parasitismo entérico por adul-tos de A. caninum em humanos (Prociv & Croese 1996) e nainfecção cutânea de indivíduos imunossuprimidos por tripa-nossomatídios monoxênicos (Dedet & Pratlong 2000), quenormalmente são encontrados apenas parasitando insetos.

O reconhecimento pode ser promovido pelo aumento daprobabilidade de encontro ocasionado por diferentes tiposde tropismo, os quais operam como atratores, favorecendo oconvívio e o contato entre diferentes organismos com conse-qüente aproximação entre parasito e hospedeiro. O geo-tropismo negativo e hidro- e termotropismo positivos facili-tam a penetração percutânea de larvas de nematóides comoAncylostoma sp., Necator americanus e Strongyloidesstercoralis. O fototropismo e o tigmotropismo (estímulo pelocontato) de cercárias de Schistosoma sp. também participamda etapa inicial de reconhecimento parasito-hospedeiro.

Em patógenos transmitidos por artrópodes, observa-seum tropismo pela região de glândulas salivares como emPlasmodium sp., pela probóscide como em Leishmania spp.ou pelas peças bucais como em W. bancrofti e O. volvulus.Nestes dois filarídeos, o termotropismo positivo das larvasinfectantes é um fator fundamental para o direcionamento àderme do hospedeiro vertebrado.

Em parasitos heteroxênicos, cuja transmissão entre hos-pedeiros é dependente do predatismo, pode haver mudançascomportamentais que favoreçam o processo. Sabe-se quecrustáceos como Amphipoda ou Isopoda, que são predadospor aves, para as quais são transmitidos os Achantocephalapor aqueles albergados, verifica-se uma mudança defototropismo negativo para positivo, aumentando marca-damente a probabilidade de predação pelo próximo hospe-deiro, o mesmo ocorrendo entre artrópodes e roedores e pei-xes e aves, na transmissão de parasitos (Moore 2002).

Na espécie humana estão descritas mudanças compor-tamentais, como inquietação e perda de noções de limites ou

timidez, que promovem o predatismo por felídeos, na nature-za, mas em sociedade podem aumentar as chances de aciden-tes automobilísticos ou o número de parceiros sexuais. Ossinais e sintomas de uma infecção também podem promover atransmissão de patógenos. O aumento na ferocidade de cãescom o vírus da raiva, a polidipsia em aves com Trichomonasgallinae (transmitido pela água ingerida), o ato de tossir ouespirrar em indivíduos com infecções nas vias respiratóriaspodem facilitar o acesso do patógeno a novos hospedeiros.Analogamente, o trânsito intestinal aumentado, observadonas diarréias, promove a dispersão de patógenos intestinais,incluindo vírus, bactérias, protozoários e helmintos. A febretambém favorece a hematofagia pelos insetos vetores de di-ferentes infecções, que são atraídos pelo estímulo térmico,bem como por compostos voláteis derivados do metabolis-mo de bactérias corineiformes existentes na pele.

O reconhecimento de células e tecidos do organismo hos-pedeiro por protozoários é comumente realizado através dereceptores de superfície. Em Entamoeba histolytica, recep-tores com atividade lectínica reconhecem Gal/GalNAc, medi-ando a adesão dos trofozoítas às células do epitélio intesti-nal. Adesinas de Trichomonas vaginalis medeiam a adesãoao epitélio vaginal e mucinas (Alderete et al. 1998). Proteínase glicosaminoglicanos de matriz extracelular também podemintermediar a adesão de diferentes protozoários com outrospatógenos. Parasitos como Toxoplasma, Leishmania,Trichomonas e Candida reconhecem componentes de matrizextracelular como fibronectina, laminina, entre outros.

Mecanismos de invasão parasitáriaA derme e mucosas atuam como barreiras mecânicas à

penetração de patógenos. Parasitos transmitidos por ar-trópodes hematófagos são introduzidos nos tecidos subcu-tâneos pelas peças bucais de seus vetores que dilaceram aderme, enquanto fungos patogênicos como Sporothrixschenkii e Fonsecae pedrosoi atingem os tecidos do hospe-deiro através de farpas, que ocasionam soluções de continui-dade em tegumentos. Outros parasitos são dotados de dife-rentes conjuntos de enzimas hidrolíticas, que degradam es-ses tecidos, possibilitando a invasão. Glândulas de penetra-ção de cercárias de Schistosoma sp. secretam proteases, comouma serina proteinase, que degradam a elastina da derme.Larvas filarióides de N. americanus secretam aspartilproteinases, que hidrolisam componentes da pele humana.

Os parasitos dispõem de um sofisticado e variado arsenalde adaptações e estratégias de escape dos mecanismos efe-tores do sistema imunológico de seus hospedeiros (Camus etal. 1995). Dotados de considerável variabilidade e tempos degeração mais curtos, os patógenos podem evoluir de formarápida, contra-atacando eficientemente os mecanismos dedefesa dos mamíferos.

O conhecimento detalhado das estratégias empregadaspor diferentes patógenos para estabelecer infecções possibi-lita o desenvolvimento de medidas profiláticas e terapêu-ticas.

A invasão de diferentes tipos celulares do hospedeirorepresenta um importante mecanismo de escape parasitário,conferindo uma proteção eficiente contra sua respostaimunológica. A fagocitose ou invasão celular por protozoáriosparasitas, como T. cruzi, Leishmania sp., T. gondii e Plas-modium sp., constitui forma eficaz de evasão das respostasinata e adaptativa do sistema imunológico. Ao invadirem ascélulas hospedeiras esses protozoários são capazes de mo-

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3434343434 Interface Parasito-hospedeiro • H. L. Lenzi, M. A. Vannier-Santos

dular a composição e funcionamento dos compartimentos davia endocítica ou vacúolos parasitóforos. Protozoários dofilo Apicomplexa penetram nas células hospedeiras (que mui-tas vezes não são fagócitos profissionais) utilizando secre-ção de conteúdo do complexo apical (estrutura que dá nomeao filo), constituído por roptrias, micronemas e grânulos den-sos (Roberts & Janovy Jr. 1996). Os vacúolos parasitóforoscontendo T. gondii e Mycobacteria não sofrem acidificaçãoou fusão com lisossomos, possibilitando a sobrevivência eproliferação dos microrganismos. Parasitos do gêneroLeishmania sobrevivem e proliferam em vacúolos acidificadose fusogênicos (De Souza & Vannier-Santos 1996). O metabo-lismo da forma amastigota é totalmente adaptado e até au-mentado em pH ácido. Embora ocorra a fusão e o parasitopermaneça na luz do vacúolo, foi observado que o glicolipídiolipofosfoglicano (LPG) de L. (L.) donovani retarda a fusãocom lisossomos (Dermine et al. 2000), facultando a diferenci-ação nas formas amastigotas. Foi também relatado, de formanão confirmada, o escape do vacúolo por parte do parasito(Bogdan et al. 1990). A presença de Leishmania no interior decélulas apresentadoras de antígenos tem grande importânciana resposta imunológica durante a leishmaniose.

Formas tripomastigotas e até amastigotas de T. cruziinfectam diferentes tipos celulares em humanos e em outrosanimais. A invasão pelo T. cruzi tem a participação de recep-tores para TGF-β (transforming growth factor-β) na célulahospedeira (Ming et al. 1995). A adesão dos tripomastigotasdetermina rápidos aumentos no cálcio citoplasmático, provo-cando um deslocamento dependente de cinesina e subse-qüente fusão dos lisossomos com a membrana plasmática,ocasionando a formação de um vacúolo que engloba o para-sito. No interior do vacúolo assim formado, os tripomastigotastransferem resíduos de ácido siálico de glicoproteínaslisossomais, como a lgp120, para um aceptor na superfície doparasito e inserem uma proteína, Tc TOX, semelhante à C9 ecom atividade perforina, que lesa a membrana vacuolar, dei-xando o microrganismo livre no citoplasma da célula hospe-deira onde se prolifera sob a forma amastigota. Promastigotasde Leishmania utilizam componentes do complemento comoC3b e C3bi para serem fagocitados por macrófagos e célulasdendríticas (De Souza & Vannier-Santos 1996, Mosser &Brittingham 1997), enquanto amastigotas recrutam recepto-res para a porção Fc das imunoglobulinas para chegar aointerior dos fagócitos (Kima et al. 2000).

Mecanismos de escape do sistema imunológico –Protozoários

Imunidade inata - A primeira defesa contra diferentespatógenos é a derme, revestida por tecido epitelial. Na pele, oepitélio pode estar queratinizado e, nas mucosas, possui cé-lulas que secretam mucinas, que ajudam a bloquear a adesãoe promover a expulsão de microrganismos. A produção desialomucinas, durante a infecção por protozoários cavitários,como Entamoeba histolytica, pode dar lugar à secreção desulfomucinas. Outra defesa inata do organismo é a ativaçãoda via alternada do sistema complemento. Tripomastigotasde T. cruzi expressam T-DAF, gp58/68 e gp160, que atuam deforma semelhante ao DAF (decay-accelerating factor) docomplemento, impedindo a formação do complexo de ataqueà membrana.

Formas promastigotas metacíclicas de L. (L.) major apre-sentam uma película (coat) de lipofosfoglicano (LPG) comaproximadamente o dobro das dimensões daquela das

procíclicas (não infectantes para mamíferos), não possibili-tando o acesso do complexo lítico C5b-C9 à membrana doprotozoário. Promastigotas metacíclicos também expressamníveis aumentados da metaloproteinase gp63, que cliva C3b,formando o fragmento inativo C3bi e impedindo a formaçãodo complexo C5b-C9. LPG e gp63 são fundamentais para re-sistência ao complemento por parte das Leishmania.Mutantes de Leishmania, desprovidas dessas moléculas(mutantes null), são altamente suscetíveis à lise pelo sistemacomplemento e, embora menos virulentas para camundon-gos, são capazes de estabelecer a infecção. Formas sanguí-neas de T. brucei empregam grande quantidade de uma pro-teína de superfície, semelhante à gp63 de Leishmania, parase evadir do sistema complemento do hospedeiro. Afosforilação de fatores do sistema complemento, como C3, C5e C9, por ecto-cinase(s) de Leishmania, também apresentapapel protetor contra as diferentes vias de ativação da casca-ta do complemento.

Uma forma arrojada de explorar a imunidade inata peloparasito está relacionada à sobrevivência em neutrófilos. Es-ses leucócitos têm elevada atividade microbicida, maspatógenos como Erlichia, L. major, Salmonella sp., M. leprae,Yersinia enterocolitica, Bordetella pertussis, Neisseriagonorrhoeae, Legionella pneumophila, Histoplasmacapsulatum e Chlamydia sp. desenvolveram mecanismos deinvadir essas células sem deflagrar o surto respiratório e/ou afusão fagossomo-lisossomo (revisto em Laskay et al. 2003).Foi observado que neutrófilos infectados com L. (L.) majortêm sua apoptose retardada e produzem IL-8 e quimiocinasdo tipo proteínas inflamatórias do macrófago [macrophageinflammatory protein (MIP)-1α e MIP1β], que têm atividadequimiotática para monócitos. Quando os neutrófilos final-mente entram em apoptose, são fagocitados pelos macrófagosrecém-chegados, portando os parasitos clandestinos. Dessaforma, um “bravo soldado” atua como um “cavalo de Tróia”(Laskay et al. 2003).

Trabalho realizado por Freire-de-Lima et al. (2000) demons-trou que T. cruzi também pode explorar a eliminação de célu-las apoptóticas. Esse protozoário, bem como T. gondii, é ca-paz de inibir (macrófagos e célula neuronal) ou deflagrar(macrófagos e células T) a morte celular programada por dife-rentes mecanismos. P. falciparum induz à apoptose linfocitária,enquanto parasitos do gênero Leishmania, ao inibir aapoptose de macrófagos, induzem à de linfócitos T CD4+ eCD8+ (revisto por Lüder et al. 2001).

Variabilidade antigênica - Um mecanismo freqüentementeempregado por parasitos na evasão do sistema imunológicoé a variação antigênica, bem caracterizada em tripanossomosafricanos e em Giardia lamblia. T. brucei pode expressar maisde 100 tipos antigênicos e aproximadamente 2.000 genes paraglicoproteína variável de superfície [variable surfaceglycoprotein (VSG)], que corresponde a cerca de 10% doDNA total do protozoário. A resposta humoral pode eliminaraté 99% dos tripomastigotas circulantes, mas os remanes-centes refazem a parasitemia e assim sucessivamente até amorte do hospedeiro. Parasitos intracelulares, como Plas-modium sp., utilizam a variação antigênica como forma deevitar que os eritrócitos circulantes sejam reconhecidos poranticorpos e eliminados. A proteína PfEMP-1 de P. falciparum,expressa na superfície de hemácias, além de apresentar vari-ação clonal, medeia a adesão dos eritrócitos a moléculas comoCD36 e ICAM-1 das células endoteliais, provocandomarginação eritrocitária, com conseqüente escape da elimi-nação por hemocaterese, principalmente no baço.

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3535353535Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

Ativação policlonal de células B - Parasitos como L. (L.)donovani podem também induzir à ativação policlonal de cé-lulas B, com produção exacerbada de imunoglobulinas emgeral, resultando no desvio da resposta imunológica parafenótipo Th2, não protetor nas leishmanioses. A ativaçãopoliclonal de células B, na doença de Chagas, determina ahiperprodução de imunoglobulinas IgM, que se ligam à su-perfície de tripomastigotas, bloqueando o reconhecimentopor IgGs protetoras para o hospedeiro. A presença de domí-nios repetitivos na proteína de superfície de circunsporozoíta(CSP) pode induzir a uma ativação policlonal independentedo timo (super-antígenos), com a produção de anticorpos debaixa afinidade e não-protetores. A ativação policlonal podeser responsável pela produção de auto-anticorpos na maláriahumana.

Mimetismo molecular - Vários parasitos são dotados deprodutos gênicos com seqüências semelhantes às proteínashumanas. Tal propriedade não apenas confere proteção pormimetismo molecular mas também possibilita um diálogo(cross-talk) bilateral entre parasito e hospedeiro. A habilida-de de mimetizar componentes do hospedeiro não somenteproporciona a evasão do reconhecimento imunológico, comotambém interfere na modulação deste, com possível induçãode respostas auto-imunes, como relatado em T. cruzi. Oglicosilfosfatidilinositol, que ancora proteínas de superfíciede merozoítas de Plasmodium, tem efeito insulino-mimético eaumenta a produção de TNF-α e IL-1 em macrófagos, provo-cando as características febres maláricas. Proteínas de P.falciparum podem apresentar seqüências semelhantes àtimosina-1, um hormônio tímico que regula a diferenciação delinfócitos. Um caso interessante de mimetismo é expressopela considerável similaridade entre a molécula de perforinaou NK-lisina de células T citotóxicas e as proteínas formado-ras de poros de E. histolytica, conhecidas como amebaporos(Leippe 1997). Isso exemplifica como uma proteína de nossosistema imunológico pode ser mimetizada para destruir célu-las efetoras, como neutrófilos e macrófagos, além de outrostipos celulares.

Uma das formas sofisticadas de mimetismo empregadapor protozoários parasitos é a expressão de fosfatidil-serinana superfície, mimetizando uma célula ou corpo apoptótico.Amastigotas de Leishmania apresentam esse fosfolipídiosinalizador e ganham acesso aos macrófagos, sem que essessejam estimulados. Ao contrário, os macrófagos que in-ternalizam células apoptóticas têm atividade suprimida. Em T.cruzi, esse tipo de mecanismo promove significativamente asobrevivência e proliferação intracelular do parasito e depen-de de prostaglandinas, TGF-β e do metabolismo de argininaem poliaminas (Freire-de-Lima et al. 2000).

Quando se considera o mimetismo molecular, cabe salien-tar que muitos produtos gênicos, que hoje desempenham re-levantes funções, como hormônios e neurotransmissores noorganismo humano, são produzidos por microrganismos, queprovavelmente os desenvolveram (Le Roith et al. 1983) e queparasitos como Schistosoma , Leishmania, Giardia,Trichomonas, Echinococcus, Taenia e Onchocerca apresen-tam receptores para moléculas do hospedeiro como insulina,FGF (fibroblastic growth factor), VLDL (very low densitylipoprotein), EGF (epidermal growth factor), TNF-α (tumornecrosis factor), IL-7 (interleukin-7), TGF-β (transforminggrowth factor-β), progesterona etc. (revisto em Inal 2004).Neste contexto, vale ressaltar o conceito de Stephen Jay Gould(1989), segundo o qual a natureza é, não uma engenheira, masuma “engenhoqueira”.

Degradação de imunoglobulinas - Diferentes protozoáriosparasitos têm a capacidade de realizar a proteólise de imu-noglobulinas, impedindo a aglutinação, a opsonização e afixação de fatores do sistema complemento. Trofozoítas de E.histolytica hidrolisam moléculas de IgA nas mucosas eTrichomonas vaginalis também degradam imunoglobulinashumanas. Tal efeito é produzido em E. histolytica por ecto-enzimas com atividade cisteíno-proteinase.

Cobertura focal (capping) e eliminação (shedding) deimunocomplexos - Tripanossomatídeos, como T. cruzi eLeishmania spp., assim como E. histolytica, agregam focal-mente ligantes polivalentes como anticorpos e lectinas, emáreas circunscritas da membrana plasmática (patches), queconfluem formando calotas ou coberturas focais (capping)de onde os complexos ligante-receptor ou antígeno-anticorposão liberados em um processo dependente de energia, co-nhecido por eliminação (shedding). Esse processo também éobservado em Plasmodium, na liberação de CSP de es-porozoítas circulantes.

Defesas antioxidantes - A presença de mecanismosantioxidantes pode constituir importante estratégia de esca-pe e de virulência de diferentes patógenos, já que mecanis-mos efetores da resposta imune dependem em grande parteda geração de espécies reativas de oxigênio, como: o ânionsuperóxido (O2

•–); radicais hidroxila (HO•–); ânions hidroxila(HO–); óxido nítrico (NO). Trofozoítas do protozoário primiti-vo G. lamblia são desprovidos dos principais mecanismosantioxidantes enzimáticos, mas utilizam proteínas com altosníveis de resíduos de cisteína e, portanto, os grupamentostiol exercem intenso efeito antioxidante. Enzimas com ativida-des antioxidantes, como catalase, superóxido dismutase,glutationa peroxidase e glutationa-S-transferase estão pre-sentes em vários protozoários parasitos. Vale ressaltar queglutationa-S-transferases relacionadas a proteínas parasitá-rias podem atuar como fatores imunomoduladores (Ouaissiet al. 2002). Nos tripanossomatídios encontram-se complexosda poliamina espermidina com duas moléculas de glutationa,formando a bisglutationilespermidina ou tripanotiona. Essesparasitos contam com sistemas enzimáticos como tri-panotiona redutase e peroxidase (triparedoxina). Amastigotasde Leishmania apresentam altos níveis de catalase esuperóxido dismutase, enquanto promastigotas tendem a nãoativar o surto respiratório. Enzimas como peroxiredoxinas es-tão presentes em protozoários como T. gondii, T. vaginalis,E. histolytica, Leishmania e Plasmodium, bem como emhelmintos.

P. falciparum, por degradar hemoglobina com a liberaçãode ferriprotoporfirina IX, que tem atividade peroxidásica, estáconstantemente sujeito ao estresse oxidativo e, como conse-qüência, desenvolveram superóxido dismutases e peroxidasesdependentes de tioredoxina (Müller 2004). S. mansoni tam-bém se nutrem por hematofagia e produzem grupamentosheme livres e suas enzimas antioxidantes constituem impor-tantes alvos para a vacinação (LoVerde et al. 2004). Tantoesse trematódeo quanto P. falciparum agregam grupos hemepara sua destoxificação pela formação de hemozoína (Olivei-ra et al. 2000, Chen et al. 2001). Assim sendo, compostosquinolínicos, que inibem essa agregação, podem ser uma va-liosa ferramente na quimioterapia da esquistossomose (Oli-veira et al. 2004).

A produção deficiente de intermediários reativos de oxi-gênio pode favorecer a amebíase invasiva (Moran et al. 2002)

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3636363636 Interface Parasito-hospedeiro • H. L. Lenzi, M. A. Vannier-Santos

e a lectina de E. histolytica, que reconhece Gal/GalNAc noprocesso de adesão à superfície dos enterócitos, parece es-tar associada ao desequilíbrio de sistemas antioxidantes dacélula hospedeira (Rawal et al. 2004).

Modulação da apresentação de antígenos - Na invasãotissular por trofozoítas de E. histolytica ocorre a inibição daexpressão de antígenos Ia do sistema principal de histocom-patibilidade (MHC) e antígenos solúveis produzidos por elareduzem a expressão de MHC da classe II em macrófagosmurinos, induzida por IFN-γ através de um mecanismo de-pendente da produção de prostaglandina E2 (PGE2), já queesse efeito é parcialmente revertido pela adição deindometacina. Vale salientar que trofozoítas de E. histolyticaproduzem PGE2 (Wang & Chadee 1995). Amastigotas deLeishmania, em vacúolos parasitóforos de macrófagos,endocitam e degradam moléculas de MHC-II e inibem a ex-pressão de moléculas co-estimuladoras, como B7-1. Além demacrófagos, antígenos de leishmânia podem também ser apre-sentados por células dendríticas, mas essas tem seu desen-volvimento e migração suprimidos pelo parasito (revisto porAntoine et al. 2004).

Modulação da sinalização celular - Patógenos intracelu-lares adquiriram a capacidade de manipular os intrincadosmecanismos de transdução de sinais das células hospedei-ras, criando ambientes menos inóspitos e, portanto, favorá-veis à sua sobrevivência e proliferação. O uso de microrga-nismos para estudos sobre a sinalização celular foi denomi-nado microbiologia celular (Cossart et al. 1996).

Numerosas estratégias foram delineadas por diferentesmicrorganismos para desacoplar ou desviar a sinalização derespostas microbicidas. Patógenos, como T. cruzi, L. (L.)donovani, P. falciparum, E. histolytica, S. typhimurium eHIV, aumentam os níveis de cálcio intracelular em duas a cin-co vezes nas células do hospedeiro. Tal alteração pode supri-mir significativamente as respostas de macrófagos, monócitos,linfócitos T e células endoteliais (Olivier 1996). Parasitos dogênero Leishmania constituem importantes paradigmas daparasitologia e imunologia. As subpopulações de linfócitosTh1 e Th2 foram descobertas no estudo da leishmaniose.

A infecção de macrófagos por Leishmania determina ainibição da produção de radicais de oxigênio e nitrogênio einibe a resposta ao IFN-γ, que é bloqueada pela interferênciaparasitária na fosforilação de resíduos de tirosina, afetandoparticularmente a via das cinases Janus (Janus kinases, JAK,Janus, o deus das portas na mitologia grega) e a atividade deSTAT-1 (signal transducer and activator of transcription-1). Tal efeito pode resultar da ativação de fosfotirosinafosfatases, que apresentam domínios homólogos à Src (SH2),como a SHP-1, e são ativadas por L. (L.) donovani. A infecçãopor Leishmania inibe a atividade de cinases ativadas pormitógeno (mitogen-activated protein kinase, MAPK), comoERK 1/2 (extracellular signal regulated kinase) (revisto porVannier-Santos et al. 2002, Martiny & Vannier-Santos 2005).Tal efeito pode ser devido ao LPG ou a enzimas com atividadefosfotirosina fosfatase (YopH) tanto do hospedeiro quantodo parasito (Martiny et al. 1999). O uso de uma YopHmicrobiana para inativar a sinalização da célula hospedeira ébem caracterizado na infecção por Yersinia sp. Assim afosforilação, que é necessária para a invasão das formaspromastigotas (Martiny et al. 1996), deve ser revertida parapossibilitar a sobrevivência de amastigotas (Vannier-Santoset al. 2002, Martiny & Vannier-Santos 2005). O LPG de

Leishmania também inibe a atividade de PKC dos fagócitos(Vannier-Santos et al. 2002, Denskers & Butcher 2005). Emconjunto, essas alterações determinam a supressão da sínte-se de IL-12, expressão de MHC-II e respostas microbicidas,como o surto respiratório e a produção de NO. A infecçãopelo T. cruzi também provoca a ativação de (p38) MAPK, bemcomo de NF-κB, que são ativados por fosforilação em res-posta à ligação de mucinas ancoradas por GPI a receptorestipo Toll (toll-like receptors), como o TLR2. O estímulo con-tinuado dessa via acarreta, subseqüentemente, respostasdeficientes. A mucina de T. cruzi ocasiona ativação de pro-teína fosfatase 2A, inibindo as respostas de macrófagos.Toxoplamsa gondii é conhecido como um patógeno com altopotencial imunoestimulante e níveis séricos elevados de IL-12 e TNF-α são registrados na infecção murina. Tal respostapode ter se desenvolvido para contra-atacar a alta virulênciade taquizoítas, evitando a letalidade de muitas cepas, permi-tindo que a doença chegue à fase crônica. Entretanto, experi-mentos realizados in vitro mostram que a infecção portaquizoítas inibe a síntese de IL-12 e TNF-α, a expressão deMHC-II, bem como a atividade NO-sintase de macrófagos(Denkers & Bertcher 2005). A infecção pelo T. gondii suprimea translocação dos heterodímeros NF-κBp50:p65 para o nú-cleo da célula hospedeira.

A produção de IL-2 na amebíase depende da atividadePKC, podendo ser promovida por éster de forbol e ionóforode cálcio. Receptores para proteínas de matriz extracelularnos parasitos deflagram respostas de fosforilação, que me-deiam a invasão tissular.

Modulação da síntese de citocinas e linfocinas: imuno-modulação - Ao longo da evolução, protozoários parasitosdesenvolveram sofisticadas estratégias de escape, inibindoe/ou subvertendo os mecanismos da resposta imunológica,em benefício próprio. Protozoários apresentam receptores paramoléculas sinalizadoras de metazoários, incluindo linfocinase citocinas, como o GM-CSF (Barcinski & Costa-Moreira 1994),o qual pode exercer efeito protetor sobre L. (L.) amazonensis.Um exemplo curioso dessa exploração do sistema imunológicoé ilustrado também pela resposta proliferativa de T. brucei aoIFN-γ. Antígenos do protozoário induzem à síntese dessacitocina, central na resposta imunológica celular, que passa aatuar como um fator de crescimento parasitário. Além disso,os altos níveis de IFN-γ suprimem a atividade de IL-2, impe-dindo respostas proliferativas de células T.

Em geral, as infecções por protozoários intracelulares sãomarcadas por respostas protetoras do tipo Th1, caracteriza-das pela produção de IL-12 e IFN-γ, enquanto no parasitismopor helmintos (extracelulares) predominam respostas do tipoTh2, nas quais são sintetizadas IL-4, IL-10 e TGF-β (Jankovicet al. 2001). Entretanto, os parasitos podem desviar as res-postas para o fenótipo oposto, isto é, não-protetor, que podedecorrer da disfunção de células dendríticas, retardando asrespostas de células T, com o conseqüente aparecimento delinfócitos CD4+ produtores de IL-4 (Jankovic et al. 2004).

Antígenos de T. cruzi induzem à produção de IL-10 e TGF-β por macrófagos. Assim como T. brucei, T. cruzi tambéminibe a expressão de receptores pra IL-2. Células NK têm umpapel protetor em diferentes infecções por protozoários pa-rasitos (Korbel et al. 2004). Macrófagos infectados portripomastigotas de T. cruzi produzem IL-12, que dispara aprodução de IFN-γ por células NK in vivo. Na leishmaniose,as células NK têm importante função, não pela atividadecitotóxica, mas pela produção de IFN-γ, particularmente no

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3737373737Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

início da infecção. Na toxoplasmose e na malária, as célulasNK produzem IFN-γ em resposta a IL-12 secretada pormacrófagos e células dendríticas. Promastigotas metacíclicosde L. (L.) major não somente induzem à síntese de IL-12, comotambém suprimem ativamente a transição do seu gene, redu-zindo os níveis de IFN-γ e, conseqüentemente, a ativação demacrófagos. Na leishmaniose humana, IL-10 inibe as respos-tas proliferativas e citotóxicas, bem como a produção de IFN-γ por células mononucleares de sangue periférico, enquantoIL-12 restabelece as respostas em células de pacientes comleishmaniose visceral (Barral-Netto et al. 1998). Trofozoítasde E. histolytica modulam a resposta Th1 pela indução da IL-4 e IL-10. Os trofozoítas produzem PGE2 que, juntamentecom outros produtos do parasito, inibem as respostas demacrófagos. Durante a formação de abscessos hepáticos,observa-se uma anergia celular que decorre da ação deantígenos amebianos, que suprimem a atividade de IL-2. Res-postas oxidativas de macrófago são suprimidas por E.histolytica via MLIF (monocyte locomotion inhibitory factor).

Mecanismos de escape do sistema imunológico – Hel-mintos - Com a exceção de Trichinella spirallis, que tem umafase larvar intracelular, os helmintos passam toda a vida ex-postos ao sistema imunológico e, ainda assim, as helmintíasessão freqüentemente caracterizadas por elevada cronicidade.A sofisticação das estratégias de escape empregadas peloshelmintos chega a ponto de incluir a utilização de moléculas ecélulas do sistema imunológico para seu benefício. O desen-volvimento de S. mansoni depende da atividade de linfócitosCD4+ (Davies et al. 2001) e a extrusão dos ovos dessetrematódeo depositados no plexo hemorroidário (S. mansonie S. japonicum) ou vesical (S. haematobium) é mediada pelanecrose dos tecidos adjacentes pela reação inflamatória de-pendente de TNF-α, o que não se observa em hospedeirosimunocomprometidos (ver item “O que é um parasito e o fe-nômeno do parasitismo”).

Expressão antigênica - A existência de antígenos crípticos,em diferentes grupos de helmintos, explica, ao menos em par-te, a baixa reatividade do sistema imunológico a essesmacroparasitos. A maior parte dos antígenos da bainha demicrofilárias de W. bancrofti e das superfícies larvares de E.granulosus (cistos hidáticos) e de cisticercos de Taenia sp.está disposta na face interna e, portanto, não exposta aoreconhecimento imunológico. Esquistossômulos deSchistosoma sp., ao invadir a derme e migrar pela circulaçãoaté os pulmões deixam de expressar a maioria dos antígenosparasitários e passam, inclusive, a apresentar moléculasdo hospedeiro. O tegumento de esquistossômulos deSchistosoma sp. constitui uma estrutura muito relevante nosucesso da infecção, formando um sincício no qual os núcle-os estão protegidos abaixo da camada muscular do helminto.É delimitado por duas unidades de membrana, sendo que amaioria dos antígenos está oculta na membrana interna. Amembrana externa apresenta altas concentrações dofosfolipídio anfipático, lisofosfatidilcolina, que tem proprie-dades semelhantes ao detergente dodecilsulfato de sódio(SDS) sendo, portanto, capaz de lisar células hospedeiras,como os leucócitos e eritrócitos aderentes. Essas células dei-xam proteínas de suas membranas na superfície do verme,que incorpora e/ou adsorve antígenos do sistema ABO, LewisX, fatores H, MHC classe I, complemento, fator de decaimentode complemento (decay acceleralating factor, DAF), masnão moléculas do grupo sanguíneo Duffy. Na infecção murina,

os esquistossômulos, ao chegarem aos pulmões, passam aexpressar acentuada redução na expressão de antígenos pa-rasitários, concomitante à expressão de antígenos de célulasdo hospedeiro. A presença dessas moléculas impede o reco-nhecimento do parasito pelos mecanismos imunológicos.

Subversão da ação de imunoglobulinas - Parasitos, comoS. mansoni, são capazes de degradar as moléculas deanticorpos e de expressar receptores para a porção Fc dasimunoglobulinas, impedindo funções de opsonização, fixa-ção de complemento, bloqueando ainda, estereoquimicamen-te, o reconhecimento de diferentes haptenos. Epítopos decarboidratos de S. mansoni provocam respostas independen-tes de células T, associadas à geração de anticorpos IgM eIgG2, que não medeiam a morte de esquistossômulos poreosinófilos, bem como promovem IgE e outras IgGs, que pro-tegem essas formas larvares.

Modulação da síntese de citocinas e linfocinas: imuno-modulação - Helmintos trematódeos, como Schistosoma sp.,e nematóides, como os filarídeos W. bancrofti e O. volvulus,induzem imunossupressão da resposta imunológica dos hos-pedeiros mamíferos. Tal fenômeno confere proteção aos da-nos decorrentes da inflamação por H. pylori e P. falciparumem hospedeiros co-infectados com helmintos. A infecção porhelmintos pode suprimir as respostas inflamatórias aalergenos e alotransplantes (Maizels & Yazdanbakhsh 2003).

Nas infestações por nematóides intestinais, as linfocinasde perfil Th2 exercem importante papel protetor. IL-3 e IL-9induzem mastocitose nas mucosas, IL-13 está associada àhiperplasia de células epiteliais caliciformes e ao aumento daprodução de mucinas, enquanto IL-4 está relacionada ao au-mento da contratilidade das células musculares intestinais.Esses efeitos, em conjunto, podem culminar com a expulsãodo verme da luz intestinal.

No caso de larvas de helmintos, que migram pelos teci-dos, como Schistosoma sp., N. americanus, Ancylostoma sp.,Strongyloides sp. e microfilárias, tanto a resposta humoralquanto a eosinofilia podem exercer um papel protetor. Emgeral, os eosinófilos têm pouca ação sobre os vermes adul-tos, e, mesmo sobre larvas, os efeitos somente foram confir-mados in vitro. O significado funcional da eosinofilia em vá-rias parasitoses, principalmente helmintíases, permanece ain-da um enigma (Dent et al. 1997, Ovington & Behm 1997, Lenziet al. 1997). Embora os anticorpos sejam considerados impor-tantes na resistência às helmintíases, nem todas as subclassesde imunoglobulinas exibem papel protetor.

Dados obtidos em infecções humanas por S. mansoni e B.malayi indicam mobilização de diferentes populações celula-res em indivíduos com distintas manifestações clínicas. Indi-víduos suscetíveis apresentam numerosas células T regula-doras (Treg) e fenótipo Th2 modificado, com predominânciade IgG4 sobre IgE. Indivíduos com exacerbada sintomatologiaapresentam intensas respostas Th1 e baixas concentraçõesde IgG4. Indivíduos resistentes, por sua vez, apresentam po-pulações Th1, Th2 e Treg balanceadas e, embora apresentemníveis consideráveis de IgG4, demonstram títulos aindamaiores de IgE.

É possível que nas infecções agudas as células dendríticasapresentem antígenos para linfócitos Th0, que dão origem aTh2 produtores de IL-4 e IL-5, que induzem respectivamenteà produção de IgE por linfócitos B e eosinofilia. Nas infec-ções crônicas, contrariamente, a apresentação de antíge-nos por macrófagos, alternativamente ativados, induz o

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3838383838 Interface Parasito-hospedeiro • H. L. Lenzi, M. A. Vannier-Santos

surgimento de linfócitos com um fenótipo Th2 modificado,com secreção de IL-4 e IL-10, mas não IL-5, culminando emsíntese de IgG4 e geração de células Treg produtoras de TGF-β (Maizels & Yazdanbakhsh 2003).

O tipo de acila encontrado na liso-fosfatidilserina de S.mansoni pode levar ao reconhecimento desse fosfolipídiopor células dendríticas, através de receptores tipo Toll (Toll-like receptor- 2, TLR2), que passam a secretar IL-10, ativan-do células Treg.

Patobiologia do parasitismo

A coabitação entre diversos seres, regra fundamental danatureza, nem sempre é pacífica, podendo resultar em váriostipos de doenças. Esse assunto pode ser estudado com maisprofundidade e extensão nos bons livros de patologia. Aquiesse assunto será abordado de forma bem sucinta e geral. Defato, segundo McCall (1975), algumas questões fundamen-tais deveriam ser respondidas: “Quais são os mecanismosespecíficos e não-específicos da resposta do hospedeiro parao parasitismo aberrante que provoca doença? Quais são osagressores e como atacam (mecanismos de virulência)? Porque parasitos pacíficos, que normalmente são mantidos sobcontrole, às vezes são capazes de invadir os tecidos do hos-pedeiro sem sofrer obstáculos?”

Na patobiologia da interação parasito-hospedeiro usual-mente atuam, com pesos variáveis de caso para caso,determinantes do hospedeiro e do parasito, como foi apre-sentado anteriormente de forma mais detalhada.

Determinantes do hospedeiro na patobiologia doparasitismo

O hospedeiro, quando infectado, pode apresentar reaçõeslocais (interações locais) e sistêmicas. As interações locaispodem ser de quatro tipos básicos: a) inflamatória; b)imunológica; c) hiperplásica; d) neoplásica e dependem doestado extra ou intracelular dos parasitos (McCall 1975, Lenziet al. 1991). Parasitos extracelulares, em geral bactérias gram-positivas (Streptococcus, Staphylococcus, Pneumococcus,Clostridia, Diphteria, Antrax e outras) e gram-negativas[Meningococcus, Gonococcus (pode ser um parasitointracelular facultativo), Haemophilus, bacilos entéricos,Bordetella, Pasteurella, Bacteroides, Shigella, Vibriocholerae e outras] provocam uma resposta inflamatória agudaem que predominam os neutrófilos e, posteriormente,monócitos e macrófagos. A reação inflamatória decorrentenão é teleologicamente benéfica para o hospedeiro, podendodestruir o(s) agente(s) invasor(es), bem como lesar o própriohospedeiro (p. ex.: abscessos líticos e destrutivos).Clostridium perfringens e outros organismos que secretampotentes toxinas causam rápido e grave dano tecidual, compredomínio e morte celular. As lesões contêm escassas célu-las inflamatórias, assemelhando-se a infartos. Similarmente,E. histolytica provoca úlceras colônicas e abscessos hepáti-cos, caracterizados por extensa destruição tecidual, comnecrose liquefativa, na ausência de infiltrado inflamatório(Samuelson 2003).

Os parasitos intracelulares incluem algumas bactérias(M. tuberculosis, Brucellae, L. monocytogenes e Sal-monella), a maioria dos fungos, protozoários e todos os víruse riquétsias. As reações inflamatórias costumam ser mais len-tas e prolongadas que as inflamações agudas aos parasitosextracelulares e são caracterizadas pelo predomínio de

monócitos/macrófagos, linfócitos e fibroblastos, com menornúmero de neutrófilos e/ou eosinófilos. Alguns parasitosintracelulares (M. tuberculosis, Leishmaniae, vários fungosetc.) e ovos de helmintos suscitam o desenvolvimento dereação granulomatosa, que pode ser mais bem estudada emlivros e artigos especializados (Ioachim 1983, Lenzi et al.1998).Os vírus podem provocar inflamação citopática-proliferativa,caracterizada por dano a células individuais do hospedeiro,com pouca ou sem reação inflamatória. Podem também indu-zir as células afetadas a se agregarem, formando policárions(p. ex.: sarampo, herpesvírus) (Samuelson 2003). Às vezes,algumas infecções podem causar intensas reações cica-trizantes, como cirrose do fígado (infecção crônica por HBV),salpingite gonocócica crônica e pneumonite intersticialfibrosante. As reações imunológicas a parasitos são tambémbastante variadas e complexas, podendo contribuir para le-sões cardíacas (febre reumática, miocardite crônica chagásica),renais (glomerulonefrites, nefrites intersticiais), vasculares(vasculites, púrpuras...), dérmicas (dermatites alérgicas...).Atualmente, atribui-se participação de processos infeccio-sos na patogenia da aterosclerose, embora essa tese nãotenha sido comprovada. Microrganismos como herpesvírus,citomegalovírus e Chlamydia pneumoniae têm sido detecta-dos em placas ateroscleróticas, mas não em artérias normais.Evidências da participação de C. pneumoniae nessa doençasão mais fortes; estudos sugerem que uma terapia antibióticaapropriada para esse organismo reduz os eventos derecorrência clínica em pacientes com doença cardíacaisquêmica (Schoen & Cotran 2003). Reações hiperplásicasem órgãos linfóides são bastante comuns em infecções devariadas etiologias, chegando algumas a provocar quadrospseudolinfomatosos, como a mononucleose infecciosa. Vári-os agentes infecciosos podem induzir a reações tumorais nohospedeiro, como os papilomavírus humanos (tipos 16, 18,31, 33, 35, 39, 45, 52, 56, 58 e 59), responsáveis por neoplasiaintraepitelial cervical, o vírus Epstein-Barr, determinante delinfoma de Burkitt, o herpesvírus humano 8 associado asarcoma de Kaposi, o vírus da hepatite B, com hepatocarci-noma, e a bactéria H. pylori, provocadora de gastrite e deMALTomas (marginal zone – associated lymphoma) (Kumaret al. 2003, Feller & Diebold 2004, DeVita et al. 2005).

As reações do hospedeiro podem também ser sistêmicas,caracterizadas por eventos metabólicos e bioquímicos (eleva-ção de proteínas de fase aguda, de hormônios da síndromede estresse, de ácidos graxos livres no plasma, triglicerídios efosfolipídios, lipoproteínas, gliconeogênese, conversão deglicose para lactato, supressão da glicólise e ativação de pro-cessos de coagulação) (McCall 1975); reações cardiovas-culares (diminuição da resistência periférica, aumento da fre-qüência cardíaca, queda da pressão arterial, podendo deter-minar choque, coagulação intravascular disseminada e co-lapso cardiovascular com choque ) (McCall 1975); febre, re-ações hematológicas [respostas neutrofílicas, eosinofílicas(helmitoses), monocitárias, anemia (malária), linfocitose (ví-rus), linfócitos atípicos (mononucleose infecciosa) e outros].

Determinantes do parasito na patobiologia doparasitismo

Os determinantes do parasito compreendem: 1 - proprie-dades invasivas, decorrentes de características das cápsulas(Diplococccus pneumoniae, Haemophilus influenzae,Klebsiella pneumoniae, Bacillus anthracis, S. aureus,Pasteurella pestis), presença de proteína M na superfície(Streptococci-grupo A), secreção de enzimas extracelulares

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3939393939Dinâmica das Doenças Infecciosas e Parasitárias

[hialuronidases (Streptococci-grupo A), coagulases (S.aureus), quinases (Staphylococci, Streptococci), co-lagenases (Clostridium perfringens)]; 2 - liberação deexotoxinas, que inibem a síntese protéica e processosoxidativos (Corynebacterium diphteriae); expressam açãoanticolinérgica (C. botulinum, C. tetani); têm efeito citolítico(C. perfringens); são citotóxicas para vasos sanguíneos(Streptococci-grupo A); necrotizantes para epitélio bronqui-al e produzem linfocitose (Bordetella pertussis); alteram oequilíbrio hídrico e eletrolítico no intestino pela ativação deadenilciclase (Vibrio cholera); 3 - liberação de endotoxinaspor bactérias gram-negativas (Escherichia, Shigella e espe-cialmente Salmonella), que compreendem complexoslipopolissacarídios-LPS, que têm ação pirogênica, emética ediarréica. Choque e necrose maciça das adrenais às vezesocorrem em sepse meningocócica atribuídos a efeito tipoSchwartzman, induzido por endotoxina. Choque e colapsocardiovascular são ocorrências freqüentes em sepse gravepor gram-negativos (McCall 1975, Madigan et al. 1997); 4 -penetração intracelular, com inibição de certas vias metabó-licas, alterações funcionais em organelas e incorporação noDNA (como visto no item “O que é um parasito e o fenômenodo parasitismo); 5 - organotropismo é expresso por Menin-gococcus para meninges, Pneumococcus para trato respira-tório inferior, Cholerae bacillus para trato gastrintestinal,Rickettsia para vasos sanguíneos, Trichinella para múscu-lo, Filaria para vasos sanguíneos e linfáticos, protozoáriosda malária para eritrócitos, arbovírus para sistema nervosocentral e fígado, herpesvírus para pele e sistema nervoso,vírus da hepatite para fígado, sarampo para glândulas saliva-res etc. (McCall 1975).

Conclusão e perspectivas

A abordagem deste artigo, ainda que bastante incomple-ta, procurou encaixar o “fenômeno parasitismo” dentro deuma visão ecológica, como foi proposta por Ferreira em 1973,portanto há três décadas. Esse autor cita Levine (1968), paraquem a “parasitologia é um ramo da ecologia na qual umorganismo é o ambiente para outro”. O romancista e filósofoArthur Koestler (1905-1993) chamou de “holarquia” a coexis-tência de seres menores em totalidades maiores (Koestler1978). Segundo Margulis e Sagan (2002a), a maioria das pes-soas, ao contrário, acha que a vida na Terra é hierárquica –uma grande cadeia de seres, com humanos no topo. A palavracriada por Koestler, segundo Margulis, é isenta de implica-ções de “superioridade” ou de que um dos componentes daholarquia controle os outros de algum modo. Também os com-ponentes receberam de Koestler um novo nome. Não sendomeras partes, eles são “hólons” – totalidades que tambémfuncionam como partes. Portanto, segundo Margulis e Sagan(2002b), a vida na Terra não é uma hierarquia criada, mas umaholarquia emergente, surgida da sinergia auto-induzida dacombinação, da interação e da recombinação. Dentro dessaperspectiva, a parasitologia deveria ser chamada decoabitologia, pois é um ramo da ciência que estuda a relaçãoentre os seres coabitantes. O enfoque tradicional,antropocêntrico e militarista está turvando a visão para no-vas formas de analisar o “fenômeno parasitismo”.

O parasitismo nem sempre leva a danos no hospedeiro e,em determinadas condições ambientais, pode até mesmo serbenéfico para ambos os simbiontes (Lincicombe 1971, Munger& Holmes 1988, Thomas et al. 2000). Atribui-se a raridade de

sífilis terciária na África à alta prevalência de malária (Bush etal. 2001). A malária representou uma forma de terapia, a“malarioterapia”, muito empregada no passado para o trata-mento de neurossífilis (Chernin 1984, Collins & Jeffery 1999),sugerida também para o tratamento da borreliose ou doençade Lyme (Heimlich 1990), da aids (Chen et al. 1999, 2003) e atédo câncer (Greentree 1981).

Embora a infecção pelo T. gondii esteja associada à for-mação de tumores (Ryan et al. 1993), principalmente em paci-entes imunossuprimidos, a infecção crônica pode ter um efei-to antitumoral em murinos (Conley & Remington 1977). Esseparasito pode ainda reverter a múltipla resistência a drogasexpressa em células tumorais humanas e de murinos (Varga etal. 1999). Atualmente, em especial com as técnicas de clonageme transfecção, protozoários (Vaccaro 2000), vírus (Rolph &Ramshaw 1997) e bactérias (Locht 2000, Flo et al. 2001) po-dem ser de grande utilidade terapêutica. Além disso,patógenos, como o B. thuringiensis, e himenópteros para-sitóides são empregados em controle biológico de pragas.Os parasitos, em geral, constituem excelentes modelos expe-rimentais, tendo servido de objeto de estudo para muitas des-cobertas importantes. Vale ressaltar que os grandes avançosalcançados pela biologia molecular seriam impossíveis sem oparasitismo viral em bactérias.

O parasitismo pode dar origem ao mutualismo (Yamamura1993) e estar adaptado (resistente) ao parasitismo, podendoconferir ao hospedeiro uma vantagem competitiva frente aoutros organismos. Da mesma forma que os colonizadoreseuropeus “utilizaram” seu patógenos para subjugar os opo-nentes, assim também o Paramecium tetraurelia empregabactérias endossimbiontes, como Caedibacter taeniospi-ralis, como um armamento contra cepas suscetíveis, da mes-ma forma que o verme Parelaphostrongylus tenuis é usadona competição entre cervídeos da América do Norte (Poulin2000). A dinâmica de populações entre espécies competido-ras, como coelhos (Oryctolagus cuniculus) e lebres (Lepuseuropaeus), é determinada pelo vírus do mixioma e o helmintoGraphidium strigosum, ambos patógenos, que apresentamdiferentes graus de virulência nesses dois hospedeiros ma-míferos. Analogamente, a presença de esporozoário Adelinatribolli determina o sucesso competitivo entre os coleópterosTribolium confusum e T. castaneum (revisto em Hudson &Greenman 1998). Os parasitos freqüentemente provocammaior letalidade nos hospedeiros novos ou acidentais do quenaqueles com os quais evoluíram (co-evoluíram). Assim ainfecção de T. gondii em gatos domésticos (Felis catus) podeameaçar seriamente espécies que tenham permanecido geo-graficamente isoladas como, por exemplo, animais selvagensda Austrália.

Plantas, como a Ipomopsis aggregata e a Gentianellacampestris, têm seu desenvolvimento aumentado pela her-bivoria ou parasitismo (Agrawal 2000). A infecção de esqui-los Spermophilus richardsonii pelo Trypanosoma oto-spermophili é normalmente deletéria para os hospedeiros,mas quando esses estão submetidos a uma dieta deficienteem vitamina B6 (piridoxina), os animais parasitados têm maiorsobrevivência e aumento do crescimento. Acantocéfalos ecestódeos intestinais podem acumular metais pesados, favo-recendo a sobrevivência de seus hospedeiros em ambientespoluídos. Analogamente, os plasmídios são normalmente pre-judiciais às bactérias, mas, em presença de antibióticos, po-dem conferir-lhes resistência (revisto por Thomas et al. 2000).As sanguessugas medicinais (Hirudo medicinalis), que fo-ram muito úteis no passado, salvando muitas vidas, voltaram

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ao uso hoje em dia, ajudando na reconstituição vascular detecidos com congestão venosa pós-operatória. Entretanto,esses anelídeos necessitam da ajuda de uma bactéria do gê-nero Aeromonas para realizar a digestão do repasto sanguí-neo. Essa bactéria, por sua vez, pode provocar infecções emindivíduos submetidos à sangria pelo hirudíneo, sendo, por-tanto mutualista para o hospedeiro invertebrado e parasitopara o hospedeiro vertebrado. Outros parasitos hematófagos,como o Ancylostoma caninum, são muito estudados, visan-do a aplicações médicas decorrentes do lucrativo mercadodos anticoagulantes, pois esses podem até ter efeitos inibitó-rios sobre metástases de células de melanoma humano invivo (Donnelly et al. 1998, Konigsberg & Cappello 1998).

Com a prolongada co-evolução parasito-hospedeiro, éesperável que a ruptura desse consórcio simbiótico possagerar alterações patológicas como alergias, asma e manifes-tações auto-imunes (Lynch et al. 1999). Alguns estudos indi-cam que a eliminação de helmintos intestinais pode promoverdoenças auto-imunes como colites ulcerativas, síndrome deCrohn e talvez esclerose múltipla (Elliott et al. 2000, Hunter &McKay 2004), que são doenças raras em áreas endêmicas depaíses subdesenvolvidos em que ocorrem as principaisparasitoses intestinais. Moléculas parasitárias estão sendoestudadas como drogas imunomoduladoras. [Vale lembrar quecerca de 80% dos linfócitos B humanos estão associados àmucosa intestinal e que cada metro de intestino produz diari-amente cerca de 0,8 g de IgA, aproximadamente o mesmo queuma glândula mamária em lactação (revisto em Falk et al.1998)]. Um estudo realizado pela equipe do Dr. Weinstock, daUniversidade de Iowa, indica que a infecção por helmintospode até mesmo reverter quadros de auto-imunidade (Newman1999). Diversos parasitos, portanto, figuram como comensaise quase mutualistas, podendo até ser vantajosos, impedindoas auto-agressões, sendo necessário analisar a ecologia des-sas associações simbióticas de uma forma mais ampla e dinâ-mica. É importante destacar que os tipos de relações ecológi-cas entre os seres vivos não são excludentes nem estáticos,não devendo, portanto, ser aceitos de forma absoluta e/ouimutável e os parasitos nem sempre são os “vilões” da estó-ria (ou da história).

Reid (2004), estudioso de probióticos, chama a atençãopara o fato de que os microrganismos povoam este planetadesde aproximadamente 3,9 bilhões de anos antes de nós.Portanto são os humanos que devem se adaptar a eles e nãoao inverso. Pergunta Reid: “Que acontecerá no futuro?” Épossível, diz ele, que a longevidade e a qualidade de vida

possam ser aumentadas, programando recém-natos para sercolonizados por grupos seletos de bactérias. Ele discute quea microbiota de uma criança que nasce pela vagina materna édiferente daquela de uma criança nascida por cesárea. Per-gunta ele: “Que temos feito para selecionar os organismosque permanecerão conosco durante a vida, e quais são asimplicações de sua composição e funções? Um estudo temdemonstrado que diferentes espécies de Lactobacillus po-dem modular a capacidade de células dendríticas intestinaisde induzir respostas Th1/Th2/Th3, alterando, assim, os pa-drões de defesa do hospedeiro (Christensen et al. 2002). Achegada de B. thetaiotaomicron – e provavelmente outrosconstituintes da microbiota – em fases bem precoces da vidaparece regular angiogênese intestinal e o desenvolvimentopós-natal (Stappenbeck et al. 2002).

Esses exemplos foram aqui colocados para demonstrar anecessidade de “mudar o olhar” sobre o fenômeno da coabi-tação dos humanos com seres tidos como “parasitos”. A boacoabitação dependerá de uma melhor compreensão da rela-ção entre ser(es) coabitante(s) e o hospedeiro. As seguintesreferências bibliográficas contribuirão para mudar a perspec-tiva do olhar: Ferreira (1973), Trager (1986), Brooks &McLennan (1993), Lenzi et al. (1997), Bush et al. (2001), Tosta(2001), Margulis e Sagan (2002).

No futuro será também importante explicar, experimental-mente, o fenômeno do parasitismo ou da coabitação entre osseres vivos dentro da concepção de Sistemas Autopoéticosde Maturana e Varela ou M,R de Rosen (Rosen 1958a, Letelieret al. 2003). Esses modelos têm sido negligenciados pela gran-de maioria dos biólogos experimentais. Essa negligência poderefletir, segundo Letelier et al. (2003), o fato de que ambas asteorias são ainda incompletas no aspecto fundamental decomo mapear seus conceitos teóricos (estrutura, organiza-ção, circularidade etc.) com entidades experimentais. Até opresente momento, esses sistemas não são Turing-computáveis no sentido de que a hipótese de Turing-Churchnão se aplica a eles, necessitando a procura de novasmetodologias computacionais e matemáticas (Rosen 1958b,1964, 1991). Portanto, a futura intelecção do fenômenoparasitismo (coabitação) necessitará da cooperação entreparasitologistas, infectologistas, imunologistas, patologistas,biólogos experimentais, biólogos teóricos, ecologistas, ma-temáticos, especialistas em inteligência artificial e em ciênciada computação, além de outros. Há ainda um longo caminhoa trilhar para se entender a linguagem dos parasitos, isto éseu “parascripto”.

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