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UNIO ESTVEL NO BRASIL: A proteo constitucional famlia
Daniela Kristina Vieira
RESUMO O presente trabalho de concluso de curso tem como
finalidade abordar a nova viso do direito de famlia frente aos
comandos constitucionais, no que se refere unio estvel. O
legislador, influenciado pelas mudanas sociais que sinalizavam para
o reconhecimento das unies fora do casamento diante da quantidade
de pessoas que optavam por esta forma de unio, entendeu necessrio
positivar a matria, mas o fez atravs do poder constituinte
originrio, que ao elaborar o texto constitucional em vigor previu,
ao lado do casamento, outras formas de famlia, entre elas, a
constituda pela unio estvel. Desta forma, tal estudo s pde ser
efetuado diante do fenmeno da Constitucionalizao do Direito Civil,
ou seja, a insero dos princpios constitucionais nas normas de
direito privado. Assim, levando em considerao tais abordagens, a
pesquisa se prope a analisar o instituto da unio estvel, sua
evoluo, conceito, requisitos, como tambm uma interpretao das normas
constitucionais e legais, abrangendo a questo dos alimentos e do
direito sucessrio. As referidas questes foram tratadas em leis
especiais e no atual Cdigo Civil, que baseado nos dispositivos da
Constituio regulamentou direitos dos conviventes para que aqueles
comandos fossem amplamente efetivados, no se tornando o artigo 226
da Constituio Federal letra morta no direito positivo
brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: Famlia, Direito, Casamento,
Constitucionalizao.
INTRODUO
Unio Estvel a convivncia entre homem e mulher, alicerada na
vontade dos conviventes, de carter notrio e estvel, visando
constituio de famlia. Alguns elementos importantes para a
configurao deste tipo de unio so extrados desse conceito:
fidelidade presumida dos conviventes, notoriedade e estabilidade da
unio, comunidade de vida e objetivo de constituio de famlia.
Com o advento da CF/88, a unio estvel entre o homem e a mulher,
no unidos pelo matrimnio, passou a ser reconhecida como uma
entidade familiar para efeito de proteo do Estado (art. 226, 3 da
CF/88).
Diante do assento legal, diversas pessoas, includos operadores
do direito, passaram a acreditar que o convivente teria certos
direitos no previstos em Lei.
As divergncias nesta rea do direito encontram explicaes na
legislao j ultrapassada de que os julgadores tm que se socorrerem
para compor os litgios que envolvam questes de unio livre, o que os
obriga a no se exaurirem nos textos legais, ou
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seja, que buscarem outras fontes do direito, sendo que o
legislador constitucional amenizou esta situao, sensibilizado pela
enorme proporo de unies livres presentes no cotidiano
brasileiro.
Quanto ao dispositivo constitucional, qualquer que seja a
interpretao que se queira dar, traduziu to-somente a boa inteno do
legislador que quis imprimir dignidade s famlias constitudas margem
da lei.
O atual texto constitucional trouxe uma grande evoluo no direito
de famlia, descaracterizando a unio estvel como sociedade de fato,
para dar-lhe o status de entidade familiar. Agora, no mais se
distingue a famlia pela existncia do matrimnio, solenidade que
deixou de ser seu nico trao diferencial, tambm, o tringulo: pai,
me, filho mudam de conformao. De acordo com a Lei, a adoo de uma
criana permitida aos solteiros, sendo o grupo reconhecido, tambm,
como famlia, recebendo a designao de famlia monoparental.
Justifica-se a presente monografia, porque a natureza
scio-jurdica da unio estvel, fato gerador alternativo e natural da
famlia, trata to-somente de uma relao de causa e efeito, pois,
tanto do casamento, quanto da unio estvel, surge o ncleo da
famlia.
Dessa forma, percebe-se que no mbito da interveno estatal no que
concerne a unio estvel, dever ter por finalidade to-somente regular
os efeitos patrimoniais, includos a os alimentos, obedecidos os
pressupostos para sua concesso, que poder advir salvo acordo prvio
em contrrio, da extino da unio estvel e isso, visa, tambm, definir
histrico e conceituao civil do instituto do casamento e da unio
estvel, estabelecendo um comparativo entre os mesmos como determina
o direito brasileiro, bem como, fazer uma pequena abordagem da
situao dos companheiros no que tange aos alimentos, regime de bens
e sucesso.
O objetivo geral analisar a evoluo histrica acerca do
desenvolvimento da unio estvel enfocando a proteo constitucional
dada famlia.
Especificamente, objetiva-se verificar o conceito e os
requisitos caracterizadores da unio estvel, para assim, compreender
quais tipos de relaes extraconjugais so aceitas como unio estvel e
,portanto, merecedoras do amparo legal e quais no podem ser
tuteladas pelo direito, como o concubinato. Convm tambm estudar a
importncia do reconhecimento constitucional unio estvel e seus
reflexos no direito civil, analisando os dispositivos do Cdigo
Civil, que disciplinam o direito do convivente. Ainda, objetiva-se
estabelecer as diferenas em relao aos direitos atribudos pelo Cdigo
Civil de 2002 ao convivente,
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analisando todos os aspectos discutidos pela doutrina, em
especial, a eventual a revogao total ou parcial das leis 8971/94 e
9278/96, pelo Cdigo Civil. Por fim, verificar se houve avanos no
atual Cdigo Civil, quanto aos direitos do convivente.
A monografia tem como suporte para seu embasamento as fontes de
pesquisa a investigao bibliogrfica de obras de renomados
doutrinadores nacionais.
Para realiz-la, utilizou-se a pesquisa de cunho terico
dissertativo, tendo como complemento artigos de revistas, textos,
livros, bem como, investigao na jurisprudncia dominante no Superior
Tribunal de Justia e no Supremo Tribunal Federal.
O tema relevante, pois se passado mais de vinte anos da
promulgao da Constituio Federal, ainda se tem dvidas, na doutrina e
jurisprudncia acerca do alcance da proteo dada pelo texto
constitucional unio estvel no Brasil. Apesar das leis posteriores e
do Cdigo Civil atual que tratou da matria, os conviventes no tem
total respaldo no ordenamento jurdico, mesmo tendo sido conceituada
como uma forma de entidade familiar e equiparada ao casamento.
Assim, o entendimento de como se efetiva essa proteo constitucional
unio estvel que justificou o estudo ora elaborado.
HISTRIA DA FAMLIA
A famlia como realidade social
A famlia no existiu desde sempre como a vemos hoje. E fato que,
atualmente, tambm no a conhecemos to bem, dadas as modificaes - em
algumas de suas bases e nas formas de estruturao que ela vem
sofrendo, e assim continuar, dada sua constante evoluo (GROENINGA,
2008, p. 19)
Em razo da origem do direito brasileiro, em geral, a evoluo da
famlia compreendida a partir do direito romano, o que permite uma
anlise dos costumes, dos primrdios e da evoluo da codificao at a
atualidade.
J para Wald (2002, p.9), a famlia brasileira, como hoje a
conceituamos, sofreu as influncias da famlia romana, da famlia
cannica e da famlia germnica.
Segundo Venosa (2004, p.16), ao estudar a histria da humanidade,
encontrar em todas as culturas, quer ocidentais, quer orientais, os
agrupamentos humanos. O homem, durante todo o existir da civilizao,
sempre buscou se reunir em torno de algo ou de algum, constituindo
dessa forma uma famlia, o segmento social de origem mais primitivo
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reconhecido. necessrio dizer que a famlia transcende a tica
jurdica. E em face disso, vrias
configuraes de famlia ficavam margem do Direito que, atualmente,
busca muito mais formas de incluso do que a excluso.
No entanto, no ser necessrio percorrer a histria da humanidade
para entender o conceito de famlia no direito brasileiro, pelo
simples fato de que o que mais interessa so as inovaes
constitucionais.
Segundo Groeninga (2008, p.19), as bases da constituio da famlia
devem ser buscadas no s na viso aportada pelo Direito, como tambm
nas fontes sociais, e tambm na especificidade do que nos faz
humanos.
A famlia, sob o conceito sociolgico, integrada pelas pessoas que
vivem sob um mesmo teto, sob a autoridade de um titular.(VENOSA,
2004, p.16)
Essa noo, sempre atual e frequentemente reconhecida pelo
legislador, coincide com a clssica posio do pater famlias do
Direito Romano, descrita no Digesto por Ulpiano. Temos clara noo
dessa compreenso quando, por exemplo, o art. 1.412, 2, do atual
Cdigo, ao tratar do instituto do uso, dentro do livro de direitos
reais, descreve que "as necessidades da familia do usurio
compreendem as de seu cnjuge) dos filhos solteiros e das pessoas de
seu servio domstico.(VENOSA, 2004, p.17)
A realidade social mostra, a todo instante, que hoje o direito
de famlia possui conceito e caractersticas muito amplas, alargadas
em um campo que se modifica constantemente, abraando temas e
conceitos jamais admitidos pela histria primitiva do direito de
famlia.
Foram enormes as evolues, aceitando-se, nos dias de hoje,
determinadas situaes que antes eram repudiadas, tais como a
igualdade dos filhos, igualdade entre os cnjuges, unio estvel e
entidade familiar, entre outros institutos jurdicos, sem a
necessidade de um estudo sobre a histria da famlia para entender
isso, bastando apenas olhar para a realidade atual.
A famlia como realidade jurdica
Escreve Venosa (2004, p.17) que:
Entre os vrios organismos sociais e jurdicos, o conceito, a
compreenso e a extenso de famlia so os que mais se alteraram no
curso dos tempos. Nesse
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alvorecer de mais um sculo, a sociedade de mentalidade
urbanizada, embora no necessariamente urbana, cada vez mais
globalizada pelos meios de comunicao, pressupe e define uma
modalidade conceitual de famlia bastante distante das civilizaes do
passado. Como uma entidade orgnica, a famlia deve ser examinada,
primordialmente, sob o ponto de vista exclusivamente sociolgico,
antes de o ser como fenmeno jurdico. No curso das primeiras
civilizaes de importncia, tais como a assria, hindu, egpcia, grega
e romana, o conceito de famlia foi de uma entidade ampla e
hierarquizada, retraindo-se hoje, fundamentalmente, para o mbito
quase exclusivo de pais e filhos menores, que vivem no mesmo
lar.
Como no poderia deixar de ser, as evolues no Direito de Famlia
obedecem s mudanas sociais e poderes que a influenciam. E, num
movimento dialtico, tambm o Direito de Famlia influencia as formas
de constituio das famlias (GROENINGA, 2008, p.20).
Hoje, o direito de famlia aponta novos paradigmas. O casamento
que antes era requisito fundamental para a legitimao da famlia, com
a Constituio Federal de 1988, deixou de ser, estendendo sua
conceituao, modificando-se, inclusive, o conceito de Direito de
Famlia, antes profundamente ligado aos efeitos do casamento, sendo
considerado o centro irradiador de suas normas bsicas.
A formalidade do casamento deixou de interessar ao Estado, que
passou a preocupar-se com a importncia do grupo familiar, qualquer
que seja sua origem, garantindo-lhe a proteo e os direitos postos
disposio da chamada famlia legtima.
Mudam os costumes, mudam os homens, muda a histria, s parece no
mudar a importncia para o indivduo de encontrar o seu refgio, qual
seja, o seio de sua famlia, dificilmente podendo ser substituda por
qualquer outra forma de convivncia social .
Por fim, no interessa que a famlia seja necessariamente biolgica
ou no, oriunda de matrimnio ou no, o que relevante a necessidade no
interior de cada ser humano de apego a algo ou algum, no importando
o lugar que o indivduo ocupe, se o de pai ou de me, ou se o de
filho.
O que importa pertencer a um meio, estar naquele lugar onde
possvel integrar e compartilhar valores, sentimentos, esperanas, e
se sentir, a caminho da realizao pessoal, social qualquer que seja
a realizao e esse meio.
No cabe ao legislador impor conceitos e padres de modelos de
famlia. A realidade social que deve se incumbir de definir tais
conceitos. O que cabe ao legislador legislar apenas sobre as relaes
patrimoniais da cada unio, no importando e nem colocando
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em discusso a forma em que ela se deu ou se constituiu, visto
que hoje prevalece a constitucionalizao do Direito, sobretudo do
Direito de Famlia.
A famlia, base da sociedade, no mais precisa recorrer-se ao
casamento para legitimar-se, sendo respeitada e protegida pelo
Estado aquela nascida pela livre e espontnea vontade dos
conviventes. No deixou o casamento de ser aquele ato formal,
gerador de efeitos e emanador de direitos e deveres familiares, mas
deixou de ser o requisito fundamental para o surgimento da famlia e
ao reconhecer esta realidade em sede constitucional, o legislador
avanou significativamente, permitindo que milhares e milhares de
famlias, antes sem sustentao legal, encontrassem guarida no novo
ordenamento jurdico.
Conceito de Famlia
So muitas as modificaes pelas quais a sociedade tem passado nos
ltimos tempos. Em consonncia com os tempos atuais de mudana de
paradigmas, caracterizado pela globalizao, facilidade e rapidez nas
comunicaes, maior liberdade e pluralidade nas formas de relaes, de
rnenor interferncia do Estado na famlia e de dissociao entre sexo,
casamento e procriao, as famlias tm se constitudo sob variadas
formas.
A famlia varia de acordo com as pocas, com as culturas e, mesmo,
dentro de uma mesma cultura, em conformidade com as condies
scio-econmicas em que est inserido o grupo familiar. Assim, a
questo que permeia as consideraes tecidas nesta monografia a busca
de um conceito de famlia que contemple sua universalidade, dentro
das especificidades de cada famlia.
Acerca das diversas acepes que o termo famlia encerra, Venosa
(2004, p.20) afirma que:
Desse modo, importa considerar a famlia em um conceito amplo,
como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vnculo
jurdico de natureza familiar. Nesse sentido, compreende os
ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem,
incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cnjuge,
que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreenso,
inclui-se o cnjuge, que no considerado parente. Em conceito
restrito, famlia compreende somente o ncleo formado por pais e
filhos que vivem sob o ptrio poder.
Segundo Hironaka (2006, p.7)
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Famlia uma entidade histrica, ancestral como a histria,
interligada com os rumos e desvios da histria ela mesma, mutvel na
exata medida em que mudam as estruturas e a arquitetura da prpria
histria atravs dos tempos (...); a histria da famlia se confunde
com a histria da prpria humanidade.
Verifica-se que a realidade cultural das famlias no Brasil mudou
ao longo do tempo, exigindo uma nova valorao por parte do
legislador e dos juristas, devendo seu conceito ser analisado sob
as atuais perspectivas. Existe atualmente projeto de Lei de n
2.285/2007, que tramita no Congresso Nacional, visando reformar o
conceito de famlia, j que o atual conceito no mais pertence tica do
direito civil diante das mudanas introduzidas pela Constituio
Federal de 1988 e pelo Cdigo Civil de 2002.
AS ENTIDADES FAMILIARES- DO CONCUBINATO A UNIO ESTAVEL.
Do concubinato como antecedente histrico da unio estvel
Para a compreenso de qualquer instituto jurdico, deve-se
preceder a um esboo de sua evoluo histrica, principalmente se a
finalidade do estudo de tal instituto de ordem cientfica, como
ocorre na presente monografia, porm, a unio estvel, instituto do
direito de famlia, nem sempre recebeu essa denominao, e muito menos
era amparada pela lei. Assim, para que se compreenda o instituto da
unio estvel, ser traado um breve histrico do concubinato, que,
embora, no atual ordenamento jurdico ptrio, seja considerado
diverso da unio estvel, porm j se confundiu como tal e, mesmo nos
dias atuais, ainda gera confuses de ordem terminolgica entre
leigos.
Isto , quando se refere evoluo jurdica, ou seja, ao histrico da
unio estvel, estar se referindo ao concubinato, posto que a unio
estvel, como hoje se conhece, surgiu com a Constituio Federal de
1988.
A unio livre entre homem e mulher sempre existiu e sempre
existir. Entende-se aqui, por unio livre, aquela que no se prende s
formalidades exigidas pelo Estado, ou seja, unies no oficializadas
e com uma certa durabilidade. Essas unies, registradas na histria,
s vezes acontecem tambm como relaes paralelas s relaes oficiais.
Antigamente, entre os gregos, a concubinagem no acarretava qualquer
desconsiderao e era, em certa medida, reconhecida pelas leis.
(LAROUSSE apud BITTENCOURT, 1965,
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p.40) No Imprio Romano no era diferente, pois o concubinato era
comum e frequente,
inclusive entre homens de grande moralidade, mas no produzia
quaisquer efeitos jurdicos.
No Baixo Imprio, torna-se o concubinato um casamento inferior,
embora lcito. Com os imperadores cristos comea a receber o
reconhecimento jurdico. Distinguem eles os filhos nascidos de
concubinato (liberi naturales), que se podem legitimar per
subsequens matrimo-nium dos vulgo quaesiti ou spuriti oriundos de
unies sexuais passageiras. Favorece-se, assim, a transformao do
concubinato em matrimnio atravs da legitimao dos filhos. (CHAMOUN,
1957, p.171)
Do perodo medieval at a Idade Moderna, o concubinato pode ser
definido nas palavras de Pereira (2006, p. 13-17), quando afirma
que:
Apesar de combatido pela Igreja, nunca foi evitado, nunca deixou
de existir. E se os canonistas o repudiavam de jure divino, os
juristas sempre o aceitaram de jure civile. Quem rastrear a sua
persistente sobrevivencia, por tantos sculos, ver que em todas as
legislaes em todos os sistemas jurdicos ocidentais houve tais
unies, produzindo seus efeitos mais ou menos extensos.
Miranda (apud BITTENCOURT, 1965, p.23) tambm discorreu sobre o
concubinato na Idade Moderna, salientou que:
A unio no-matrimonial s desponta como elemento de negociao
jurdica a partir da instituio do casamento civil, no sculo XVI, e
nos sculos posteriores acentuou-se a tendncia de legislar-se sobre
essa matria. Anteriormente a essa conquista de institucionalizao do
matrimnio, as ligaes estranhas a este no se apresentavam como
problema: existia uma disciplina legal a respeito, tal como no
Direito romano, em que o concubinato era considerado casamento
inferior, de segundo grau, e como no regime das ordenaes filipinas,
em que a ligao extramatrimonial prolongada gerava direitos em favor
da mulher.
O incio da mudana, em relao ao tratamento dispensado ao
concubinato, ocorreu na Idade Contempornea, a partir da primeira
metade do sculo XIX, quando os tribunais franceses apreciaram e
consideraram as pretenses das concubinas. A partir da, esta relao
passou a ser vista sob dois aspectos: sociedade com carter
nitidamente econmico e como obrigao natural, quando, rompida a
relao, havia promessa de certas vantagens ex- companheira.
Um julgado de um Tribunal Francs, datado de 1883, o marco
inicial da atual doutrina e concepo sobre o concubinato, conforme
afirma Miranda (apud BITTENCOURT, 1965, p.23):
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Sem nada a reclamar que se prendesse vida concubinria, a
concubina alegou haver entrado com bens prprios para a formao do
acervo do companheiro falecido. No podendo firmar-se inteiramente
na prova por ela apresentada, o tribunal admitiu os elementos
fornecidos como prova supletiva e mandou pagar-lhe a quarta parte
dos bens deixados pelo morto, a ttulo de servios prestados e da
contribuio de seus bens no acervo comum.
Assim, as decises dos tribunais franceses passaram a ter a mesma
orientao, tornando a jurisprudncia o referencial dos princpios da
sociedade em participao, sociedade universal de ganhos ou sociedade
de fato e do enriquecimento sem causa. Um julgado da Corte de
Paris, de 13/06/1872, j havia revolucionado o sistema de prova
sobre esta matria, admitindo presunes, acompanhadas de comeo de
prova escrita. Este julgado, alm de abrandar o sistema de prova,
consagrou o critrio da sociedade de fato.
E, a partir da, caracteriza-se como um marco importante da Idade
Contempornea no aspecto jurdico, e diferenciando-se de outros
tempos, os fundamentos de proteo concubina que eram vinculados
somente a uma relao comercial entre o homem e a mulher, mas sempre
margem da relao concubinria. Com estas decises dos Tribunais
Franceses, instalou-se uma nova concepo jurdica para o
instituto.
Foi nesta poca que se registrou a tendncia de os tribunais
reconhecerem que a sociedade resulta unicamente do fato da vida em
comum, sem exigir nenhuma prova para o contrato. Por volta de 1910,
os tribunais franceses comearam a reconhecer a validade na promessa
de indenizar, desconsiderando o precedente da seduo do homem contra
a mulher, e j se apoiava na teoria da obrigao natural. (MIRANDA,
2000, p.126)
O direito francs, pela primeira vez, em 1912, edita uma lei
referente ao assunto, ou seja, o que era tratado somente pelos
tribunais acabou transformando-se em ato legislativo. O termo
concubinato passou a integrar, ento, uma lei civil, estabelecendo
que o concubinato notrio era fato gerador de reconhecimento de
paternidade ilegtima. Essa lei influenciou para que vrias outras
leis sobre o tema surgissem e contribuiu decisivamente para a
evoluo doutrinria e jurisprudencial sobre o concubinato.
Pode-se dizer, portanto, que o surgimento do direito concubinrio
ocorreu na Frana, tendo sua importncia histrica influenciado todo o
direito ocidental, especialmente o brasileiro, que at pouco tempo
atrs era confundida com a unio estvel.
Reconhecimento da unio estvel pelo ordenamento jurdico
brasileiro
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No Brasil, como em outras legislaes extravagantes, a unio estvel
nunca foi
tipificada como crime. Os diplomas legais no a regulavam, mas
tambm, no a proibiam, o que se pode constatar desde as Ordenaes
Filipinas.
Mesmo as proibies de doaes feitas concubina, dispostas no Cdigo
Civil, no se constitui propriamente uma repulsa ao concubinato,
mas, sim, uma defesa do patrimnio da famlia. Ainda que essa afirmao
possa, em alguns aspectos, parecer contraditria, denota, de
qualquer forma, uma no-proibio, no-interdio do Estado a esse tipo
de relao.
Acerca do tema, assevera Bittencourt (1965, p.23) que:
A unio estvel no Brasil teve como incentivo trs fatores bsicos:
1) a incompreenso da Igreja quanto necessidade da realizao do
casamento civil como preliminar indispensvel ao casamento
religioso, fazendo com que, em todo pas fosse realizado inmeros
casamentos religiosos sem efeitos civis; 2) o exagerado formalismo
e as despesas para a habilitao do casamento civil, conduzindo a
massa operria preferir a unio livre; 3) a proibio de novo casamento
ao divorciado. A tais fatores no se pode deixar de acrescentar que,
nos pases que se convencionou chamar de terceiro mundo, o estado de
miserabilidade e a ignorncia da grande massa da sua populao
proporciona unio estvel, ou seja, de fato.
O desenvolvimento e evoluo do instituto da unio estvel recente
na legislao brasileira, apesar da unio afetiva entre um homem e uma
mulher sem as formalidades do casamento ser uma realidade
indiscutvel. Alguns doutrinadores alegavam ser juridicamente
irrelevante o estudo do tema, uns proclamando a imoralidade dessas
relaes e outros simplesmente as relegando ao plano do ilegtimo.
Os autores no costumavam levar em conta esse tipo de unio
afetiva para o direito social e, eventualmente, por algumas das
suas consequncias, para o direito das obrigaes. Contudo, foi o
Supremo Tribunal Federal que primeiro, com a devida relevncia,
contribuiu para a evoluo da construo jurisprudencial e doutrinria
da unio estvel, atravs das Smulas 380 e 382, in verbis:
380. Comprovada a existncia da sociedade de fato entre os
concubinos, cabvel a sua dissoluo judicial, com a partilha do
patrimnio adquirido pelo esforo comum. 382. A vida em comum sob o
mesmo teto, more uxrio, no indispensvel caracterizao do
concubinato.
Em suma, o que era tratado exclusivamente no campo do Direito
das Obrigaes, principalmente, com a Constituio de 1988, passa a ser
tratado pelo Direito de Famlia, no
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Cdigo Civil de 2002.
O legislador constituinte reconheceu a unio estvel como uma das
entidades familiares, juntamente com a famlia monoparental. Tambm,
tratou do tema a Lei n. 8.971, de 29/12/1994, que regula o direito
dos companheiros quanto aos alimentos e as sucesses. J a Lei n
9.278, de 13/05/1996, veio regulamentar o 3 do art. 226 da
Constituio Federal, que reconhece a unio estvel como entidade
familiar, disciplinando o reconhecimento deste tipo de unio, dos
direitos e deveres dos conviventes, da administrao do patrimnio,
dentre outras questes relativas ao tema. Porm, somente no texto do
Novo Cdigo Civil que se consolidou, definitivamente, a unio estvel,
dedicando a mesma todo um ttulo.
As unies livres, como ligaes estveis, nas quais se caracteriza a
convivncia more uxrio, ou seja, como marido e mulher, tm relevncia
no direito brasileiro, no apenas para permitir a anulao das doaes
feitas convivente, nem to-somente para permitir a investigao de
paternidade, mas, tambm para a conquista do direito ao benefcio da
previdncia social, conforme determina a Lei n 8.213, de 24-07-1991,
que atribui, no art. 16, I, a condio de beneficiria companheira.
Nesse sentido, decidiu o STF que, em caso de acidente de trabalho
ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela
morte do amsio, se entre eles no havia impedimento para casar.
A lei admite, inclusive, que a mulher possa adotar o sobrenome
do companheiro, desde que em carter excepcional e havendo motivo
pondervel (art. 57, 2 e s., da Lei n 6.015, de 31-12-1973),
portanto, no possvel ignorar a unio estvel, pois alm de ser um
fato, constitui, hoje, uma situao jurdica que enseja importantes
consequncias no campo jurdico, entre elas pode-se citar a questo
relativa sucesso e a outorga para alienao de imveis envolvendo
pessoas que mantm este tipo de relao.
Conceito de unio estvel
Constitui uma realidade scio-familiar das mais antigas da
histria da humanidade. No Brasil, as relaes margem do casamento j
eram consideradas como fato jurdico anteriormente ao Cdigo Civil de
1916. Com a evoluo da legislao a respeito, passou a ser conhecido
tambm como sociedade de fato pela jurisprudncia, unio estvel
pela
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Constituio Federal de 1988, recebendo ainda a denominao
companheiros (Lei n 8971/94) e, recentemente, conviventes (Lei n
9278/96).
Portanto, o conceito de unio estvel no de fcil determinao, pois
varia em face dos elementos que o meio, as condies, o nvel
educacional social e econmico das pessoas apresentam, alm de muitos
outros fatores sociais, culturais, econmicos e psicolgicos.
Para Viana (1999, p.29), a unio estvel a convivncia entre homem
e mulher, alicerada na vontade dos conviventes, de carter notrio e
estvel, visando constituio de famlia.
Alguns elementos importantes para a configurao da unio estvel so
extrados desse conceito: fidelidade presumida dos conviventes,
notoriedade e estabilidade da unio, comunidade de vida e objetivo
de constituio de famlia. (VIANA, 1999, p.29)
Elementos da unio estvel
No direito brasileiro, a jurisprudncia vem, ao longo da evoluo
do instituto da unio estvel, dando nova roupagem ao mesmo, pois tem
fornecido os elementos caracterizadores desta relao para que se
possa verificar suas consequncias, sua extenso e seus efeitos,
notadamente os de ordem patrimonial.
Pode-se dizer, embora no sejam pacficos no direito ptrio e no
comparado, como elementos que integram ou que caracterizam a unio
estvel, a durabilidade da relao, a existncia de filhos, a affectio
societatis, ou seja, o intuito dos membros de uma sociedade de
promover uma colaborao permanente, rumo a um objetivo comum,
coabitao, fidelidade, notoriedade, a comunho de vida, enfim, tudo
aquilo que faa a relao parecer um casamento. E, por fim, a posse de
estado de casado.
O art. 1 da Lei 9.278, ao definir a entidade familiar, traou
seus requisitos como sendo: a) convivncia duradoura, pblica e
contnua; b) convivncia entre um homem e uma mulher; c) convivncia
com objetivo de constituio de famlia. Ocorre que desses elementos
se extraem outros, como fidelidade, dever de assistncia moral,
entre outros, ou seja, preciso ressaltar que o conceito de
comunidade ou comunho de vida tem padecido intensas mudanas na
contemporaneidade.
Segundo Viana (1999, p.144), a unio estvel:
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(...) se apia em uma relao de fato, (...), sem fora vinculativa.
Temos uma convivncia notria como marido e mulher, com continuidade
das relaes sexuais, coabitao e fidelidade presumida. indispensvel
que a unio se revista de estabilidade, haja aparncia de
casamento.
Isto o que a jurisprudncia brasileira tem absorvido e traduzido
ao longo de sua histria, com a evoluo dos costumes, com a
Constituio de 1988 estabelecendo novas concepes para a famlia
erigida sem os laos do casamento, mas, principalmente, a partir
dessas unies estveis, como um fato social marcante no pas.
Portanto, os elementos caracterizadores da unio estvel so
aqueles que delineam o prprio conceito de famlia. No a falta de um
desses elementos aqui apresentados que descaracteriza a noo de unio
estvel.
O importante, ao analisar cada caso, saber se ali, na somatria
dos elementos, est presente um ncleo familiar, ou, na linguagem do
art. 226 da Constituio da Repblica, uma entidade familiar. Se a
estiver presente uma famlia, ter a proteo do Estado e da ordem
jurdica.
Assim, como a doutrina no pacfica quanto aos elementos que
caracterizam o instituto da unio estvel, discorrer-se- sobre os
elementos que entendem-se como os mais importantes, j que so mais
estudados pelos juristas.
Objetivo de constituio de famlia
A unio extramatrimonial entre um homem e uma mulher precisa
visar a
constituio de uma famlia para que possa ser caracterizada como
unio estvel: caso contrrio, o vnculo entre os conviventes no
estaria sujeito s regras de Direito de Famlia e, assim, no seria
abrangido pela norma contida na Constituio Federal, no artigo 226,
3. Verifica-se, portanto, na unio estvel, o objetivo de constituir
famlia por outra forma que no o casamento em decorrncia de fatores
diversos.
Est nsita na idia de constituio de famlia, o desejo dos
companheiros compartilharem a mesma vida, dividindo as tristezas e
alegrias, os fracassos e os sucessos, a pobreza e a riqueza, enfim,
formarem um novo organismo distinto de suas individualidades. E, da
mesma, forma, dentro da caracterstica referida, tem-se em vista ma
outra finalidade que tambm diz respeito ao casamento e que
naturalmente, se faz presente na unio exrtamatrimonial dotada do
objetivo da constituio de famlia: a procriao.(GAMA, 2001,
p.157)
Filhos so um elemento importante, mas no determinante, podem ser
apenas um
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elemento a mais ou a menos. Se fosse determinante, os casais sem
filhos, casados no civil e no religioso, no poderiam constituir uma
famlia, assim como aqueles que optaram por no ter filhos ou mesmo
no puderam t-los por razes biolgicas ou genticas.
Fidelidade
A unio estvel, como o casamento, tambm impe o dever de
fidelidade a ambos os conviventes e no apenas a um deles, ante a
regra constitucional. Como decorrncia da caracterstica da unicidade
de vnculo na unio estvel, resta inequvoca a presena da fidelidade
como dever existente entre os companheiros.
A fidelidade no companheirismo envolve o dever de lealdade entre
os partcipes, sob os aspectos fsicos e moral, no sentido de
abster-se de manter relaes sexuais com terceira pessoa, e mesmo de
praticar condutas que indiquem esse propsito ainda que no se
consume a traio. Envolve, portanto, tanto a infidelidade material
quanto moral.(GAMA, 2001,. P.232)
Tavares (2002, p. 232-233), quanto ao dever de fidelidade,
sustenta que pode ser entendido como o dever de lealdade, sob o
aspecto fsico e moral, de um dos cnjuges para com o outro, quanto
manuteno de relaes que visem satisfazer o instinto sexual dentro da
sociedade conjugal.
Desta forma, o no cumprimento desse dever pode ser de ordem
material, caracterizado pelo adultrio, quando um dos cnjuges tem
relao sexual fora do casamento, e imaterial, configurado pelo
quase-adultrio, se o cnjuge pratica atos com outra pessoa, que no
chegam cpula carnal, mas denunciam esse propsito. Independente da
corrente doutrinria, o certo que tanto a infidelidade material
quanto a moral do causa separao do casal.
Coabitao
O dever de coabitao significa a vida em comum, no domiclio
conjugal, abrangendo ainda a noo da satisfao do dbito conjugal, ou
seja, a manuteno frequ ente e peridica de relaes sexuais entre o
casal.
Esse amplo contedo do dever de coabitao decorre da necessidade
de integrao e
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desenvolvimento da sociedade conjugal, havendo no matrimnio o
jus ad copulam, ou direito prestao sexual, que, no entanto, no se
confunde com o jus in corpus, pois este implicaria o direito sobre
o corpo do outro cnjuge, que inexiste. (TAVARES, 2002, p.236)
No direito brasileiro no se considera o elemento da coabitao
como requisito essencial para caracterizar ou descaracterizar o
instituto da unio estvel, mesmo porque, modernamente, comum haver
casamentos em que os cnjuges vivem em casas separadas. A proteo
jurdica da unio em que os companheiros vivem em comum por tempo
prolongado, sob o mesmo teto ou no, mas com aparncia de
casamento.
A tendncia parece ser mesmo a de dispensar a convivncia sob o
mesmo teto para a caracterizao da unio estvel, exigindo-se, porm,
relaes regulares, seguidas, habituais e conhecidas, se no por todo
mundo, ao menos por um pequeno crculo.
Todavia, Faria (1996, p.21), ao cuidar dos elementos indicados
pela doutrina como necessrios configurao da unio estvel, afirma que
a coabitao demonstra a aparncia de casamento. Caracteriza a vida em
comum de cama e mesa. a vida em comum sob o mesmo teto.
Ainda, de acordo com esse posicionamento, Bossert (apud
FERREIRA, 1997, p.43) sustenta a importncia da coabitao na unio
estvel, pois na falta de domiclio comum a relao meramente
circunstancial, inexistindo vida compartilhada entre os
companheiros.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal, atravs da Smula 382, j
se posicionou sobre isto, esclarecendo que a vida em comum sob o
mesmo teto, more uxorio, no indispensvel caracterizao da unio
estvel.
Continuidade: lapso temporal
imprescindvel uma certa continuidade, durabilidade da relao. No
h um prazo para determinar a partir de quando a relao se
caracterizaria como unio estvel. No Brasil, convencionou-se, por
muito tempo, principalmente nos costumes, que o prazo era de cinco
anos. Provavelmente, este entendimento decorria da regra da Lei n.
6.515/77, antes da edio da Constituio Federal, onde havia
necessidade de separao prvia de fato de cinco anos para a concesso
de separao judicial.
Embora a jurisprudncia aps a atual Constituio comeasse a apontar
uma outra
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direo em matria de tempo para a caracterizao da unio estvel, a
Lei n. 8.971, de 29/12/1994, definiu que esse prazo de cinco anos,
e, havendo prole, ser menor. Na verdade, o que interessa sobre o
tempo in casu que ele caracterize a estabilidade da relao. Isto
pode se definir com dois anos, por exemplo, ou mesmo no acontecer
nem com dez anos de relacionamento.
Foi nesse sentido que a Lei n. 9.278, de 13/5/1996, veio
estabelecer que no h um prazo rgido para a caracterizao da unio
estvel, revogando, portanto, o prazo de cinco anos estabelecido na
lei anterior.
Consolidando essa tendncia de no se estabelecer um prazo rgido
para a caracterizao da unio estvel, veio o Cdigo Civil de 2002, que
tambm deixou em aberto a questo do prazo, permitindo assim a
elastizao e abertura do conceito de durabilidade e
estabilidade.
O Texto definitivo do novo Cdigo Civil tambm no exige o prazo
mnimo de convivncia para a caracterizao da unio estvel corno se fez
no passado e com a relao anterior do dispositivo citado no Projeto
do Cdigo Civil de 1975. A estabilidade da unio entre o homem e a
mulher deve ser definida no caso concreto e independe de perodo o
mnimo de convivncia. Anote-se, tambm, que o texto legal do Novo
Cdigo permite que se conceitue a unio estvel para pessoas separadas
de fato. (VENOSA, 2003, p.449).
Notoriedade
Outro elemento caracterizador o da notoriedade. Para Gonalves
(2006, p.130), a ligao afetiva h de ser notria, porm, pode ser
discreta. H situaes de aparente incompatibilidade, em que
conhecimento ou divulgao faz-se dentro de um crculo restrito de
amigos e pessoas da ntima relao de ambos.
A unio extramatrimonial, fonte originadora da famlia, datada de
estabilidade e representativa do nico vnculo dos partcipes, deve se
revestir de notoriedade, no sentido de ser reconhecida socialmente,
ainda que por um grupo restrito, como a unio de um homem e uma
mulher como se casados fossem.(GAMA, 2001, p.164)
Tal caracterstica sempre foi apontada como requisito pelos
doutrinadores. De qualquer forma, independendo de sua considerao
como caracterstica ou requisito, o importante identificar a
notoriedade com o sentido oposto ao clandestino, do oculto.
Os que vivem em unio estvel devem ser tidos como tais perante a
sociedade,
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embora a utilizao do nome do companheiro, pela mulher, no seja
requisito fundamental. Observa-se, ainda, que a notoriedade e
publicidade no se confundem, sendo
suficiente que a unio extramatrimonial seja conhecida por nmero
mais ou menos largo de pessoas. Exige-se, em suma, que a relao no
seja clandestina.
Distino entre concubinato e unio Estvel
Acerca do tema proposto, as variaes quanto denominao do
instituto so inmeras, mas o que se deve deixar claro que houve uma
evoluo, uma mudana, inclusive no que diz respeito a
terminologia.
Hoje, no Brasil, definitivamente, o termo concubinato se refere
a relaes adlteras, onde umas das partes, ou s vezes, as duas partes
so casadas.
O legislador entendeu conveniente distinguir a unio estvel do
concubinato, deixando de prever direitos e deveres para o que se
chama em sede doutrinria, de concubinato adulterino ou impuro.
Foi a Lei n 9.278/96 que mudou a terminologia at ento usada por
leigos e juristas. Rompeu-se com os conceitos mais tcnicos, j
sedimentados na doutrina, na jurisprudncia, nas leis anteriores e
na prpria histria do Direito de Famlia. Companheira ou concubina
agora convivente; concubinato convivncia. Temos, ento, um
substantivo comum de dois para designar os concubinos: o
convivente, a convivente.
A justificativa para essa inovao do legislador diz respeito ao
fato de que o termo concubinato tem, no Brasil, sentido pejorativo
entre os leigos, sendo ofensivo chamar uma mulher de concubina.
Entretanto, a expresso companheira no traz essa conotao negativa
e j foi consagrada na jurisprudncia como uma unio livre mais idnea
e respeitvel do que o concubinato. Todavia, a nova lei no repetiu
anterior, adotando, ao invs dessa expresso j to bem dissecada pela
jurisprudncia, a expresso convivente.
O concubinato propriamente dito ocorre nos casos em que duas
pessoas estabelecem uma relao afetiva, paralela ao casamento e uma
das pessoas, mantm duas ou mais relaes, uma oficial e outra(s)
extra-oficial (is). Mesmo que esta relao se assemelhe convivncia e
constitua, as vezes, uma sociedade de fato, passvel de
partilhamento dos bens adquiridos pelo esforo comum, no se pode
identific-la com a unio estvel.
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Em outras palavras, o Direito, atravs das Leis n. 8.971/94 e n.
9.278/96 e do Novo Cdigo Civil, no protege o concubinato. Alguns
autores preferem nomear essas relaes como concubinato impuro, em
oposio a concubinato puro ou honesto, que quando no h impedimento
legal para o estabelecimento da relao. um paradoxo para o Direito
proteger as duas situaes concomitantemente. Isto poderia destruir
toda a lgica do ordenamento jurdico brasileiro, que gira em torno
da monogamia.
Desta feita, o ordenamento jurdico no reconhece como entidade
familiar a relao existente entre pessoas que tambm seriam impedidas
de se casar, como os legalmente casados e as pessoas do mesmo
sexo.
A excluso decorre de previso constitucional, expressa no art.
226, 3 da Constituio Federal. Assim, o art. 1.727 do atual Cdigo
Civil dispositivo importante, porque, agora, o conceito de cubinato
no fica confiado exclusivamente as formulaes doutrinrias.
Alguns juristas, todavia, entendem que este artigo
inconstitucional, pois 1 .723 do Cdigo Civil, no seu 1, dispe que
as pessoas casadas no podem constituir unio estvel, mas as
separadas judicialmente ou de fato podem, como se estas nao
continuassem casadas. Desta forma, na hiptese de um companheiro (ou
ambos) serem separados de fato ou judicialmente, a unio estvel
havida entre eles no poderia jamais ser convertida em casamento, j
que eles estariam impedidos de casar.
Portanto, o vocbulo concubinato deve ser reservado para outras
espcies de unies extramatrimoniais, mas que, de nenhuma forma, se
constituem em modalidade de famlia.
J a unio estvel, que por muito tempo foi considerada concubinato
diz respeito unio de pessoas no casadas entre si, mas que por algum
motivo no querem ou no podem, em determinado momento, constituir
casamento, mas que vivem como se casadas fossem.
Ao cuidar da distino entre concubina e convivente, depois de
passado o perodo em que o tratamento de ambas as palavras tinha o
mesmo significado, revela-se a importncia da diferenciao.
O concubinato traduz-se numa relao espria, de convivncia
clandestina, ilegtima, e desse modo, no possui qualquer respaldo
jurdico nos seus efeitos, enquanto a unio estvel pode ocorrer nos
casos de pessoas que se casaram no exterior, e que no possuem
registro no Brasil, dos casamentos religiosos sem efeito civil, das
relaes extramatrimoniais mantidas entre pessoas separadas
judicialmente e, portanto, enquanto no a
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converterem em divrcio, so impedidas de contrarem novo
matrimnio.
Assim, o concubinato se constitui em uma relao adltera, que no
gera nenhum efeito jurdico, enquanto a unio estvel uma relao
reconhecida constitucionalmente, o que de plano, j indica que no se
trata de relao adulterina, pois o ordenamento jurdico brasileiro
reconhece to somente a monogamia.
Veja-se uma deciso do Tribunal de Justia de So Paulo que bem
reflete e traduz esta posio:
Concubinato Concomitncia com o casamento. A lei no contempla o
concubinato adulterino, isto , aquele mantido concomitantemente com
o casamento. A tal relao no se aplica o art. 5 da LICC que
determina que, na aplicao da lei, o juiz atender aos fins sociais a
que ele se dirige e s exigncias do bem comum. O dispositivo s deve
ser aplicado quando a situao de fato assim o reclamar, isto , desde
que existente uma separao de fato entre os cnjuges, a tornar o
concubinato honesto, como o reconhece a nova Constituio (3 CCTJ-SP,
Ap. n. 116.225-1, m. v. em 17/10/1989, rel. Des. Mattos Faria, RT
649/52).
Portanto, h ntida diferena no tratamento das relaes esprias,
adulterinas e a unio estvel. A proteo constitucional prevista no
artigo 226 da Constituio Federal alcana to somente as unies no
adlteras, onde os conviventes tenham outro impedimento que no o do
casamento, pois a se tem o concubinato e no a unio estvel.
UNIO ESTVEL NO BRASIL: A proteo constitucional famlia
Proteo famlia
Segundo Moraes (2004, p.66), a Constituio Federal de 1988 deve
ser entendida como a lei fundamental e suprema do Estado
brasileiro. Alm de conter normas referentes estruturao do Estado,
formao dos poderes pblicos, forma de governo e aquisio do poder de
governar, a Carta Constitucional deve prescrever os direitos, as
garantias e os deveres dos cidados, consagrando um sistema de
garantias de liberdade.
no direito das famlias em que mais se sente o reflexo dos
princpios eleitos pela Constituio Federal, que consagrou como
fundamentais valores sociais dominantes. Os princpios que regem o
direito das famlias no podem distanciar-se da atual concepo da
famlia dentro de sua feio desdobrada em mltiplas facetas. A
Constituio consagra alguns princpios, transformando-os em direito
positivo, primeiro passo para a sua aplicao.(DIAS, 2008, p.57)
Ainda Moraes (2004, p.46) diz que:
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A Constituio Federal h de sempre ser interpretada, pois somente
por meio da conjugao da letra do texto com as caractersticas
histricas, polticas, ideolgicas do momento, se encontrar o melhor
sentido da norma jurdica, em confronto com a realidade
scio-poltico-econmica e almejando sua plena eficcia
No caput do artigo 226, a Constituio Federal determina que,
constituindo a base da sociedade, a famlia deve ter especial proteo
do Estado.
A Constituio Federal de 1988 reconheceu uma nova ordem de
valores no mbito do Direito de Famlia. Ao consagrar a dignidade da
pessoa humana como fundamento da Repblica em seu art. 1, inciso
III, a Constituio Federal mudou a perspectiva de proteo da
famlia.
A Constituio Federal de 1988 traduziu importantes modificaes,
como: O princpio da dignidade da pessoa humana, em seu art.. I.,
Ill, e a igualdade entre cnjuges e entre filhos, alm de reconhecer
a famlia coma base da sociedade, no caput do art. 226, e limitar o
poder de interferncia de pessoa de direito publico ou privado na
comunho de vida instituda pelo casamento. Alm destas, a Constituio
trouxe a igualdade entre os cnjuges e filhos. Passaram a ser
reconhecidas as famlias formadas pelo casamento e unio estvel, e,
ainda, a famlia monoparental, formada por um dos genitores e seus
filhos.
So inmeras as modificaes pelas quais a sociedade tem passado nos
ltimos tempos, sobretudo a partir da segunda metade do ltimo sculo.
Em consonncia com os tempos atuais de mudana de paradigmas,
caracterizado pela globalizao, facilidade e rapidez nas comunicaes,
maior liberdade e pluralidade nas formas de relaes de menor
interferncia do Estado na famlia e de dissociao entre sexo
casamento e procriao, as famlias tem se constitudo de formas antes
impensadas.
As relaes estveis entre um homem e uma mulher passaram a ter
carter de legitimidade ao lado da famlia legtima, como entidade
familiar, ou seja, a atual Constituio Federal de 1988 considera-se,
portanto, como famlia a procedente de unio estvel, garantindo-lhe
proteo especial do Estado, independente da forma pela qual tenha
provindo a unio.
Corrobora esse entendimento, a lio de Oliveira (s/d, p.28):
A inovao deu-se com a Constituio Federal de 1988. Seu art. 226
define a famlia como base da sociedade, tendo especial proteo do
Estado; destaca a figura do casamento, mas no como pressuposto nico
de constituio da famlia; estende a proteo do Estado Unio estvel
entre homem e mulher, considerada como
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entidade familiar, devendo a lei facilitar sua converso em
casamento (art. 226, 3.); e menciona, tambm, como entidade
familiar, na comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes (art. 226, 4.).
Nota-se que houve um enorme avano no ordenamento jurdico no que
tange ao conceito de famlia, sendo hoje melhor abrangido pelo termo
entidade familiar. Seguindo o raciocnio do legislador
constitucional, o Cdigo Civil de 2002, tambm reconheceu a unio
estvel como sendo uma famlia, equiparada ao casamento em direitos,
deveres e obrigaes.
notrio que em nosso pas inmeros eram os casais, e ainda so, que
viviam e vivem sob o manto de um relacionamento conjugal, diferente
do casamento. Tais pessoas, por viverem uma relao no oriunda do
casamento que se constitui mediante ato solene, no poderiam ficar
margem da lei, como se fossem relaes indiferentes para o sistema
jurdico brasileiro. Hironaka advoga a ideia de que:
.
A famlia no s anterior, mas transcende a tica que o Direito tem
dela. E, nesta esteira, o Direito no mais tem estado s para
compreender e acompanhar as mudanas na forma e qualidade dos
relacionamentos, buscando o concurso de outras disciplinas. Em funo
das modificaes sociais e de um sentido mais interdisciplinar que o
Direito tem seguido, este tem atendido sua vocao no sentido de
abrigar muito mais formas de incluso do que excluso. Assim tem se
dado a mudana de paradigmas do Direito de Famlia (HIRONAKA, 2008,
p.32)
A realidade social urgia pela atual posio do legislador, e bem
certo que a lei precisava regulamentar estas situaes de fato,
conferindo proteo queles que se encontram em unio estvel, visto que
esta uma realidade gritante em nosso pas, no cabendo a qualquer que
seja e, principalmente ao Estado, desprezar os motivos que levaram
os indivduos a conviver a margem do casamento, sobretudo ao aspecto
econmico.
A forma a que se deva constituir uma relao conjugal, se mediante
casamento ou unio estvel, uma deciso ntima que cabe a cada indivduo
pessoalmente escolher e, ao Estado cabe apenas e exclusivamente
acolher essa unio, dispondo apenas sobre os seus reflexos jurdicos,
e no discutir se ela ou no legtima.
Esse , ou pelo menos deveria ser, o papel do Direito, visto que
hoje se preconiza substancialmente pela Constitucionalizao do
Direito, sobretudo do Direito Civil, que regula as relaes mais
ntimas ligadas ao ser humano. Portanto, acertou e muito o
legislador ao reconhecer a unio estvel e consagrar seus efeitos
jurdicos, no que tange aos direitos patrimoniais e sucessrios do
companheiro.
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Por fora desse fenmeno, qual seja o da constitucionalizao do
direito, deve as leis infraconstitucionais, no que tange ao Cdigo
Civil, que nos dias de hoje deixou de ser apenas uma legislao de
carter privado, se aderirem aos princpios da Proteo da Famlia, no
podendo de forma nenhuma haver discriminao entre uma entidade que
seja constituda pelo casamento e outra que seja constituda pela
unio estvel, visto que a prpria Constituio, que norma suprema,
consagra a no discriminao entre ambos os institutos.
Portanto, h de se ressaltar que, atendendo a preceitos
constitucionais (Art. 226, 3, da CF/88 ), o novo Cdigo Civil cuidou
de assegurar aos conviventes em unio estvel, reconhecimento legal,
gerando efeitos patrimoniais para os envolvidos, inclusive no que
concerne ao Direito Sucessrio.
Entidades familiares
A sociedade tem vivenciado o dinamismo de suas relaes e pode-se
dizer que a famlia foi um dos componentes sociais que mais sofreram
modificaes, e, por conseguinte, o prprio direito de famlia
necessitou acompanhar os avanos. No direito brasileiro, grande
modificao se notou com o advento da Constituio Federal de 1988, que
veio estabelecer a proteo famlia, estendendo esse conceito, que
agora abarca a unio estvel e a famlia uniparental.
A Constituio Federal objetivou a proteo famlia e aos filhos
havidos no casamento ou fora dele, e nessa esteira, o legislador
ordinrio, ao editar o Cdigo Civil de 2002 regulou a unio estvel,
instituto de origem constitucional.
Introduziu a Constituio Federal de 1988 uma nova ordem de
valores no mbito do Direito de Famlia brasileiro. Ao eleger a
dignidade da pessoa humana como fundamento da Repblica, em seu
artigo 1, inciso III, a Constituio Federal, mudou a perspectiva de
proteo de famlia.
A famlia margem do casamento uma formao social merecedora de
tutela constitucional porque apresenta as condies de sentimento da
personalidade de seus membros e a execuo da tarefa de educao dos
filhos. As formas de vida familiar margem dos quadros legais
revelam no ser essencial o nexo famlia-matrimnio: a famlia no se
funda necessariamente no casamento, o que significa que casamento e
famlia so para a Constituio realidades distintas. A Constituio
apreende a famlia por seu aspecto social (famlia sociolgica). E do
ponto de vista sociolgico inexiste um conceito unitrio de famlia.
(MUNIZ,1993, p.77)
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23
Morais (2004, p. 40) informa que a Constituio Federal definiu
trs espcies de entidades familiares: a constituda pelo casamento
civil ou religioso com efeitos civis, previsto no art. 226, 1 e 2
da Constituio Federal; a constituda pela unio estvel entre homem e
a mulher, devendo a lei facilitar sua converso em casamento,
previsto no art. 226, 3, e a comunidade formada por qualquer dos
pais e seus descendentes, prevista no art. 226, 4.
Tepedino (1997, p. 109) comenta que a Constituio de 1988 alterou
o objeto da tutela jurdica, deixando de enaltecer, como sempre
fizera em nome da paz domstica, apenas a famlia conjugal, passando
a proteger outras entidades familiares, independentemente da
formalidade ou informalidade de sua origem e at quando constituda
por apenas um dos pais, devendo qualquer comunidade familiar ser
preservada apenas como instrumento de tutela da dignidade da pessoa
humana.
A previso constitucional no sentido de reconhecer as relaes no
fundadas no casamento, denominadas de unio estvel, como entidade
familiar, fez com que a famlia deixasse de ser apenas aquela
matrimonializada pelos efeitos do casamento, visto que este sempre
foi uma das cerimnias mais emblemticas da sociedade.
a lio de Lisboa (2006, p.83) , para quem:
A finalidade do casamento estabelecida na sociedade moderna
ocidental e na ps- moderna difere em muito daquela originalmente
existente no direito romano, que passou por uma primeira fase em
que o matrimonio possua no apenas o desiderato de satisfao das
necessidades comuns dos cnjuges, mas, como relatam ries e Duby,
principalmente a procriao masculina, visando ao fortalecimento do
exrcito nacional, como meio de segurana e de se proporcionar a
expanso do imprio.
Assim, o novo Cdigo Civil Brasileiro, seguindo as inovaes
constitucionais, trouxe inovaes substanciais na parte do direito de
famlia, as quais ainda no foram assimiladas em seu todo pela
comunidade jurdica e sociedade em geral, trazendo dvidas e polmicas
a respeito da interpretao da lei, seu alcance e objetivo. Tais
inovaes, entretanto, trazem baila, inmeras tentativas de
interpretao e crticas por parte da doutrina e estudiosos do
direito, as quais sero analisadas no decorrer deste trabalho
monogrfico.
A famlia continua a ser a base da sociedade e goza de proteo
especial do Estado. Entretanto, o casamento no tem mais o mesmo
prestgio, sendo que no mundo
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24
moderno a idia de um relacionamento com vistas constituio de uma
famlia slida e estruturada, no mais se encontra justificativas
apenas em uma cerimnia religiosa, envolta por simbologias, crenas e
festividades.
Vislumbra-se, hoje, perante a sociedade, uma concepo plural de
famlia, que compreende no apenas as oriundas do matrimnio, mas
tambm as unies estveis e as monoparentais. Assim, passa-se a
privilegiar o bem-estar da pessoa humana, a promoo de sua
felicidade, deixando-se em segundo plano as estruturas formais,
passando a famlia a ser protegida no mais como uma estrutura
autnoma e superior, mas em razo de sua funo social frente
comunidade.
Assim, o importante a formao do ncleo familiar, no sendo
relevante a sua forma de constituio, se originada do casamento, ou
da unio estvel, ou mesmo, se formada por apenas um dos pais e o
filho, a denominada famlia monoparental. Portanto, com a Constituio
Federal, a unio estvel hoje reconhecida como unio legal.
Como anota Hironaka (2008, p. 127), pode-se, efetivamente, falar
em progresso nesse reconhecimento de direitos dos concubinos
porque, por laico que fosse o Estado brasileiro, as ideologias
legislativas e judiciais que o sustentavam (e ainda o sustentam)
eram fundadas basicamente numa lgica irracionalista de fundo
religioso para a qual o casamento vlido deve ser apenas aquele que
se formaliza de forma sacramental
A Consitituio Federal foi responsvel pelo reconhecimento legal
da unio estvel no Brasil, mas foram leis especiais e o Cdigo Civil
que depois a regularam, sempre pautados pelos comandos
constitucionais.
Ocorreu, portanto, relevante evoluo legislativa na famlia
consttuida margem do casamento, desde o reconhecimento da unio
estvel como entidade familiar, pela Constituicao Federal de 1988,
at a sua regulamentacao por leis especiais e a incluso do tema no
Cdigo Civil de 2002.
Leis especiais de unio estvel
Diante do mandamento constitucional de proteo unio estvel como
entidade familiar, foram editadas, em curto espao de tempo, duas
leis especiais sobre a matria.
Inicialmente, surgiu a Lei 8.971, de 29 de dezembro de 1994,
dispondo sobre os direitos de companheiros a alimentos, sucesso
(herana e usufruto) e meao em caso de morte, e que foi parcialmente
revogada posteriormente.
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25
Ocorre que adveio a Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, que deu
nova definio a unio estvel, estabelecendo os direitos e deveres dos
conviventes, tratando da assistncia material (alimentos) em caso de
resciso da unio estvel, garantindo o condomnio (meao) do bens
adquiridos na constncia da unio e a ttulo oneroso (salvo estipulao
contratual em contrrio), acrescentando o direito de habitao no
plano da sucesso hereditria, permitindo a converso da unio estvel
em casamento por requerimento ao Oficial do Registro Civil e
remetendo toda a matria competncia do juzo da Vara de Famlia,
assegurado o segredo de justia.
De rpida durao, essas leis resultaram vencidas na maior parte de
seu texto, embora sem revogao expressa, pela incorporao da matria,
com importantes alteraes, no vigente Cdigo Civil brasileiro.
Unio estvel no Cdigo Civil
O Cdigo Civil de 2002, influenciado pela Constituio Federal,
considerou a famlia como base da sociedade, sob especial proteo do
Estado, dando-lhe amplitude singular, indo alm ao reconhecer a unio
estvel entre o homem e a mulher como entidade familiar. Ao faz-lo,
corrigiu distores que as leis ordinrias continham que, numa certa
medida, confundia o estatuto da unio estvel com o concubinato.
A constitucionalizao do Direito Civil, tema j mencionado no
decorrer deste trabalho monogrfico, entendida como a insero
constitucional dos fundamentos de validade jurdica das relaes
civis, sendo mais do que um critrio hermenutico formal. O contedo
conceptual, a natureza, a finalidade de um dos institutos bsicos do
direito civil, a famlia, no mais o mesmo que veio do individualismo
jurdico. Sai de cena o indivduo, aqui entendido como uma pessoa
qualquer, para revelar uma pessoa humana, identificada, apontando a
afetividade como o valor essencial da famlia.
O vigente Cdigo Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, em
vigor desde 11 de janeiro de 2003, dedica um ttulo unio estvel,
compreendendo os artigos 1.723 a 1.726, alm de disposies esparsas
em outros captulos.
Constam, do referido ttulo, a conceituao de unio estvel como
entidade familiar, os requisitos e os impedimentos para a sua
formao, os direitos e deveres dos companheiros, a sujeio ao regime
de comunho parcial de bens, salvo contrato escrito, e a
possibilidade de ser requerida a converso da unio estvel em
casamento.
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A conceituao de unio estvel como entidade familiar, adotada pelo
artigo 1. 723 do Cdigo Civil, na esteira de quanto dispunha a Lei
9.278/1996, demanda a presena de requisitos objetivos, que so a
convivncia pblica, contnua e duradoura do homem e da mulher, e de
requisito subjetivo que a inteno de formar uma famlia.
Tambm, porque, na configurao da unio estvel, a inexistncia de
impedimentos matrimoniais de que trata o art. 1.521 do CC, com
ressalva para as situaes de pessoa separada judicialmente ou de
fato. Abre-se campo, assim, a subsistncia de uma unio estvel
paralela ao casamento ainda no desfeito sob a tica da justia.
A convivncia intuitu familiae pode existir mesmo que as partes
no vivam sob o mesmo teto, desde que se comprove, por outros
elementos circunstanciais, a unio efetiva e consolidada no plano
familiar e social. Tenha-se em conta que o art. 1. 724 do CC, ao
elencar os deveres dos companheiros no menciona a coabitao, a
significar inexistncia dessa obrigao do domiclio comum.
Distinguem-se o "companheiro" e o "concubino", aquele exclusivo
da unio estvel, e o segundo prprio da unio concubinria. A tanto se
dirige o art. 1. 727 do Cdigo Civil, com definio especfica do
concubinato, como sendo a relao no eventual de homem e mulher com
impedimentos matrimoniais, ressalvadas as excees do art. 1. 723,
1.
Os efeitos jurdicos da unio estvel, alm dos deveres e direitos
pessoais, abrangem direitos patrimoniais que j eram previstos em
leis extravagantes e aqueles dispostos no Cdigo Civil, que so os
alimentos, a meao pelo regime da comunho parcial, e a participao na
herana.
No obstante a similitude dos direitos assegurados aos
companheiros e aos cnjuges, subsistem algumas importantes diferenas
especialmente na esfera do direito sucessrio, exigindo esforo
interpretativo e propostas de mudanca legislativa para esta
entidade familiar.
Direito a Alimentos
A obrigao alimentar entre conviventes decorre do dever de mtua
assistncia, previsto no artigo 1.724 do Cdigo Civil. Ainda, o
artigo 1.694 do referido Cdigo, que coloca no mesmo plano os
parentes, cnjuges ou companheiros, facultando-lhes pedir uns aos
outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatvel
com a sua condio
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social, inclusive para atender s necessidades de sua educao.
A fixao da prestao alimentar obedece ao critrio de proporo entre
as necessidades de quem pede e dos recursos da pessoa obrigada.
Diante do Cdigo Civil, constata-se que os conviventes podem pr
fim unio estvel sem que se discuta culpa, sem cogitar de causa.
Neste caso, os alimentos sero devidos por qualquer um dos dois,
bastando que se instaure a necessidade de um para com o outro, para
que a obrigao se ponha.
que ao falar do elemento culpa, o Cdigo Civil, nos artigos 1.702
e 1.704, somente se referem aos casados e no aos companheiros.
Mesmo porque o dever familiar incompatvel com a ideia de culpa.
Apregoa a doutrina, que os alimentos devem ser fixados por um
perodo de tempo razovel para que o credor possa obter os meios para
se manter, findo esse tempo, os alimentos deixaro de ser
devidos.
Cessa a obrigao alimentar do ex companheiro nos casos de nova
unio estvel ou casamento do alimentando conforme o artigo 1.708 do
Cdigo Civil.
Outro artigo relevante diz respeito transmisso da obrigao
alimentar aos herdeiros prevista no artigo 1.700, como tal se
entendendo que responde a herana, no limite de suas foras, desde
que o alimentando continue necessitado.
Finalmente, tem-se a vedao da renncia ao direito a alimentos,
embora admitida sua dispensa.
Informa Oliveira (2008, p. 159) que neste caso, vindo a ser
proposta a ao de alimentos mais tarde, j no haveria a presuno da
necessidade de quem pede, o que significa a exigncia de prova
segura a cargo do reclamante.
Do Regime de comunho parcial
Dispe o artigo 1.725 do Cdigo Civil que na unio estvel, salvo
contrato escrito entre os companheiros, aplica-se s relaes
patrimoniais, no que couber, o regime da comunho parcial de
bens.
Portanto, os bens adquiridos a ttulo oneroso pelos companheiros,
em nome prprio, de cada um, ou de ambos, na constncia da unio,
pertencem a ambos os companheiros, devendo ser partilhados, com a
observncia das normas que regulam o regime
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da comuno parcial de bens.
Este o regime oficial de bens, que prevalece na unio estvel se
os convivente no contratarem de forma diversa. Foi selecionado,
pelo legislador ptrio, desde a promulgao da Lei do Divrcio, em 1977
, inicialmente, para o casamento, e se traduz pelo fato de
comunicar-se apenas os bens adquiridos na constncia do casamento,
e, modernamente, da unio estvel, e revelando, por isso mesmo, um
acervo de bens que pertencero exclusivamente ao marido, ou
exclusivamente mulher, ou que pertencero a ambos. Por essa razo,
tambm chamado pela doutrina de regime legal ou supletivo.
Nas palavras de Rodrigues (2004, p. 178), esse regime:
(...) traduz, basicamente, na excluso da comunho os bens que os
cnjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa
anterior e alheia ao casamento, como as doaes e sucesses, e em que
entram na comunho os bens adquiridos posteriormente, em regra, a
ttulo oneroso. Trata-se de um regime de separao quanto ao passado e
de comunho quanto ao futuro.
Diante disso, o patrimnio total engloba o patrimnio comum do
casal que so os bens comunicveis, o patrimnio da esposa e o
patrimnio do marido, sendo estes ltimos formados por bens
particulares incomunicveis. Assim, esse regime, alm de frear a
dissoluo da sociedade conjugal, torna mais justo a diviso dos bens
por ocasio da separao judicial.
Os bens que se comunicam nesse regime esto dispostos no art.
1.660 do Cdigo Civil. Segundo o mencionado artigo, os bens
adquiridos onerosamente na constncia do casamento, ainda que s em
nome de um dos cnjuges, so comunicveis, pois presumem-se frutos do
esforo comum, integrando dessa forma a meao.
Os bens adquiridos por fato eventual, tambm so comunicveis,
mesmo com concurso de trabalho ou despesa anterior de apenas um dos
cnjuges. O fato eventual o que acontece sem a interveno da pessoa
que se beneficia com seu resultado, podendo ser humano, tais como
prmio de loteria, jogo de aposta, ou tambm natural, como os meios
de aquisio de propriedade mvel ou imvel, sem contraprestao do
proprietrio.
So tambm comunicveis a doao, herana ou legado em favor de ambos
os cnjuges, muito embora sejam gratuitos, desde que o doador ou
testador tenha manifestado vontade nesse sentido. Seguindo esta
tica, o legislador ainda faz meno s benfeitorias. Se elas forem
realizadas nos bens particulares de cada cnjuge, aderem ao bem
principal, sendo incomunicveis nesse sentido, mas diante da presuno
de terem sido realizadas por
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esforo comum, na constncia do casamento, so comunicveis.
Diz Lobo (2003 p. 139):
(...) o mesmo bem pode estar sujeito a regimes patrimoniais
distintos: o particular, nas condies em que se encontrava na data
do casamento; e o comum, no montante correspondente aos
melhoramentos recebidos aps o casamento.
Prosseguindo, os frutos civis ou naturais, ressalta a doutrina,
percebidos na constncia do casamento ou pendentes ao tempo em que
cessar a comunho, tambm constituem bens comunicveis, por serem
ganhos posteriores ao casamento, uma vez que o que caracteriza esse
regime a composio de uma sociedade, que se constitui de um
patrimnio comum produzido aps o casamento.
Os companheiros, podem, por contrato escritro, estipular outro
regime de bens, mas de qualquer forma a administrao do patrimnio
cabe a ambos os companheiros.
A sucesso do companheiro sobrevivente
O Cdigo Civil trata desse instituto no art. 1.790, o qual se
segue:
A companheira ou o companheiro participar da sucesso do outro,
quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigncia da unio estvel,
nas condies seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, ter
direito a uma quota equivalente que por lei for atribuda ao filho;
II - se concorrer com descendentes s do autor da herana, tocar-lhe-
metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com
outros parentes sucessveis, ter direito a um tero da herana; IV -
no havendo parentes sucessveis, ter direito totalidade da
herana.
Pereira (2006 p. 149) afirma que o companheiro, na ordem de
vocao hereditria foi bastante desprestigiado na nova lei civil,
sendo chamado a concorrer inclusive com colaterais.
Segundo o autor:
O Cdigo Civil de 2002 situou o companheiro em posio pior na
ordem da vocao hereditria: na ausncia de descendentes e de
ascendentes, e a partir da vigncia do novo diploma, o companheiro
passou a ser chamado em concorrncia com outros parentes sucessveis,
e no mais na qualidade de herdeiro nico (...) apenas quando o de
cujus no tiver parente sucessvel algum que se atribuir ao
companheiro a herana em sua integralidade. Identifica-se, no ponto,
injustificvel retrocesso.
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Para Diniz (2008, p. 143), quem est em situao desvantagosa na
legislao sucessria atual, tambm o companheiro e no o cnjuge.
H desigualdade de tratamento entre cnjuge e convivente
sobrevivo, pois aquele , em certos casos, herdeiro necessrio
privilegiado, podendo concorrer com descendente, se preencher
certas condies, ou com ascendente do falecido. O convivente, no
sendo herdeiro necessrio, pode ser excludo da herana do outro, se
ele dispuser isso em testamento, pois s tem direito sua meao quanto
aos bens adquiridos onerosamente na constncia da unio estvel. A
relao matrimonial na seara sucessria prevalece sobre a estabelecida
pela unio estvel ( DINIZ, 2008, p.146).
Interessante frisar, ainda, o pensamento de Venosa (2004, p.
118), o qual em posicionamento semelhante ao trazido colao por
Pereira, afirma ter havido retrocesso no direito sucessrio dos
conviventes, haja vista que:
(...) existe um retrocesso na amplitude dos direitos hereditrios
dos companheiros no Cdigo de 2002, pois, segundo a lei referida, no
havendo herdeiros descendentes ou ascendentes do convivente morto,
o companheiro sobrevivo recolheria toda a herana. No sistema
implantado pelo art. 1790 do novo Cdigo, havendo colaterais
sucessveis, o convivente apenas ter direito a um tero da herana,
por fora do inciso III .
Venosa, ainda, comenta que o Cdigo Civil de 2002 deixou de
garantir expressamente o direito de habitao do companheiro, caso o
nico bem deixado pelo de cujus seja o imvel que serve de habitao
para os conviventes, embora de forma discutvel, mas plenamente
defensvel, se possa vislumbrar a extenso do direito de habitao ao
companheiro, em funo do disposto no art. 1831 do CC .
Portanto, conforme expresso por Venosa (2004, p. 121), a
legislao civil atual falha e retrgrada em relao aos direitos do
Companheiro em situao de unio estvel, colocando-o ora em situao
desfavorvel (em concorrncia com colaterais na diviso da herana),
ora lanando dvida sobre direitos amplamente reconhecidos aos
cnjuges como no caso do direito de habitao.
Contrrio viso at aqui apresentada, Lisboa (2006, p.56), observa
que a nova legislao civil tende a ser mais favorvel em certos
aspectos ao direito do companheiro suprstite do que a figura do
cnjuge. De acordo com o mencionado jurista, percebe-se um
tratamento diferenciado indesejado ao convivente na sucesso, se
contrastado com o dispensado ao cnjuge sobrevivente. Ambos tm
direito meao, por se tratar de matria
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relativa ao direito de famlia.
Contudo, ao preceituar normas sobre o direito sucessrio, o
legislador viabiliza a sucesso em favor do convivente em qualquer
situao, bastando que o cnjuge sobrevivente no concorra sucesso
pelas razes do art. 1830, e que a aquisio dos bens tendo sido feita
a ttulo oneroso, durante a vigncia da unio estvel. J o cnjuge
suprstite nem sempre suceder, quando o autor da herana tiver
deixado descendentes e o regime de bens do casamento civil poca da
morte inviabilizar o concurso herana.
Assim, na viso do referido autor, tal situao determinante no
sentido de se demonstrar um posicionamento mais favorvel da
legislao ptria em face do companheiro suprstite.
Primeiramente, cumpre alertar que o companheiro sobrevivente,
paralelamente a eventual direito sucessrio, poder tambm exercer no
processo de inventrio na qualidade de condmino ou meeiro, buscando
a sua participao sobre os bens em funo do regime patrimonial
adotado durante a unio estvel.
Conforme j mencionado, a Constituio Federal, em seu art. 226, 3
reconheceu a unio estvel como entidade familiar, sendo esta uma
realidade social constante. Logo, o convivente pode suceder nos
bens deixados pelo outro convivente ante a ocorrncia de sua
morte.
Para tanto, indispensvel que a unio estvel tenha durado por um
perodo de tempo considerado razovel, lapso temporal este que deve
ser analisado casuisticamente pelo julgador, para os fins de
configurao dos seus pressupostos, quais sejam, a convivncia pblica
e o relacionamento contnuo e duradouro, sem conotao de
eventualidade.
Converso da unio estvel em casamento
Ao definir a unio estvel como entidade familiar, a Constituio
Federal, em seu art. 226, 3, determina que a lei facilite sua
converso em casamento.
Coube ao legislador ordinrio, portanto, efetivar o mandamento
constituciomnal. Assim, o artigo 1.726 do Cdigo Civil prescreveu
que a unio estvel poder converter-se em casamento, mediante pedido
dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
Para facilitar, era preciso que a lei criasse mecanismos
simplificadores do pedido de converso. Todavia, a disposio do
artigo 1.726, segundo Oliveira (2008, p.166), longe de
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estabelecer qualquer facilidade, obriga a um procedimento
judicial que, na verdade, dificulta a converso da unio estvel em
casamento, quando seria mais simples a celebrao direta do casamento
na via cartorria.
Para efetuar a converso determina que as partes devem requer-la
ao juiz de direito, que, ante as circunstncias, decretar a
converso. Em caso de deferimento judicial, feito o devido assento
no Registro Civil, dispensando-se, dessa forma, o processo de
habilitao em casamento.
Tal complicao no faz sentido quando certo que tanto a antiga lei
da unio estvel, Lei 9.278/1996, quanto o Cdigo Civil de 1916, no
continham semelhante exigncia, contentando-se com a atuao do
registrador civil, tanto na habilitao matrimonial quanto no
procedimento de converso da unio estvel em casamento.
Teria sentido a interveno judicial se houvesse a possibilidade
de deferir efeitos retroativos ao termo inicial da unio estvel,
como acontece em outros pases, mas o direito brasileiro no
expressou tal possibilidade, referindo-se apenas possibilidade de
converso, que se efetua a partir do correspondente ato do registro
civil.
CONCLUSO
Do exposto, pode-se concluir que os avanos fantsticos foram
registrados numa rea to absolutamente retrgrada, at muito pouco
tempo, para o ordenamento jurdico brasileiro. O estabelecimento de
igualdade entre os cnjuges e entre os filhos representam o auge
desse processo.
Impe-se, finalmente, esboar as concluses do presente estudo: - O
destinatrio da proteo consagrada no artigo 226, 3, da CF no cada um
dos partcipes da unio concubinria, em face do outro, mas a entidade
familiar vista como um conjunto.
A Constituio, embora no tenha igualado a unio estvel ao
casamento, manifestou, atravs de seu reconhecimento, que houvesse a
aproximao dos dois institutos at onde possvel for, baniu a
discriminao da outra relao, fazendo-a emergir do mundo dos fatos
atravs do reconhecimento da lei, como j havia tratado de faz-lo a
jurisprudncia dos nossos tribunais.
No entanto, restou ao legislador ordinrio fixar o alcance da
expresso proteo do Estado. Finalmente, urge a necessidade de criao
de legislao complementar da
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matria, que dite regras especficas sobre o patrimnio comum,
bens, aquestos, direito herana, que se fixe alimentos aos
conviventes, para que haja implementao e aplicao plena do instituto
da unio estvel no Direito de Famlia.
Dado o exposto, pode-se concluir que a lei distanciou-se em
pontos cruciais da doutrina, bem como a jurisprudncia, j
assentaram, como por exemplo, a necessidade de os conviventes
habitarem o mesmo teto para s assim caracterizar a unio estvel.
A despeito disso, reflete mais uma tentativa do Estado de
regular a conduta dos membros da sociedade, conduta esta que no
poder ser regulada seno por um mnimo exigvel, tendo-se por escopo
to somente as injustias ocorrida em caso concreto, em virtude de
sua natureza mesma.
Contudo, presta-se esta pesquisa para to-s levantar a polmica,
sob o ngulo da unio estvel, como a presuno relativa de serem comuns
os bens adquiridos a ttulo oneroso, o tratamento da matria pela
Vara de Famlia, a imposio da obrigao de prestar alimentos ao
convivente que dele necessitar, a aceitao da unio, desde que
duradoura, notria, pblica e contnua, como tipo constitucional de
entidade familiar que merece a proteo dos poderes pblicos, que
representam avanos importantes.
Ainda resta muito a ser feito e consolidado, especialmente no
mbito dos tribunais. Reconhece-se, oportuno, que a devida
compreenso do tema e de suas novas possibilidades jurdicas
reivindiquem debates mais acirrados nos centros de estudo e nas
Universidades, preparando os futuros profissionais a lidarem com as
questes ainda obscuras ou dbias no universo da temtica, de modo a
capacit-lo para identificar e construir solues jurdicas justas e
adequadas.
No resta dvida de que o Direito de Famlia, entre os ramos das
cincias jurdicas, foi o que experimentou maiores transformaes nos
ltimos tempos. Antes, submetido a um olhar retrgrado do sistema,
teimava em no admitir a existncia de unies de fato que, com toda a
aparncia de uma entidade familiar, convivendo bem na sociedade.
Competiu a uma doutrina avanada e aos precedentes dos tribunais
ditar as novas linhas que passaram a comandar tais relaes,
finalmente reconhecidas em dispositivo da Constituio de 1988.
Conclui-se, no entanto, que a legislao que regulamentou a norma
constitucional, no se mostra suficiente para a soluo de todos os
conflitos que porventura surjam dessas relaes de afeto, quando
rompidas. Exemplo disso a presuno que a lei elegeu para estabelecer
um regime condominial de bens entre os conviventes. Ressalvando a
possibilidade
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do contrato escrito pacificar o conflito, mas no previu a
reverso compulsria das partes ao estado anterior, na hiptese de
desobedincia aos princpios do equilbrio contratual e da boa- f dos
contratos e da ocorrncia de qualquer fato que possa viciar a
vontade de um dos contratantes.
Assim, a invalidade de ajustes dessa natureza pode-se dar pelo
reconhecimento de erro, dolo, coao ou fraude. Tambm, possvel a
reviso do contrato pela excessiva onerosidade que desequilibra a
relao, ou pela ofensa ao princpio da boa-f que, em contratos da
espcie, fator preponderante. Admite-se, inclusive, ausncia de
prejuzo se a boa-f foi irrefutavelmente ferida, como tambm nulidade
a clusula ou do contrato na ausncia de m-f, mas com significativo
prejuzo.
Adota-se como conduta jurdico-processual as regras
civilistas-obrigacionais, pela absoluta ausncia de regulamentao
suficiente para tratar de to importante questo. Reconhece-se que a
ideia de aplicar princpios e regras de Direito de Famlia vantajoso,
mas dada a insuficincia apregoada e at pela maior abrangncia de
conceitos, mantm-se o raciocnio fundamentado nas leis civis, sem
desfazerem dos princpios que regem as unies de afeto, como o
respeito mtuo e considerao.
A novidade do instituto poder dirigir a doutrina e jurisprudncia
no sentido de consolidar uma ou outra posio. Todavia, deve-se
admitir que o hbito arraigado de examinar questes entre casais
unidos informalmente sob o prisma dos conceitos civis, so difceis
de extinguir do pensamento jurdico. Os avanos acontecero e sero
notveis, a continuar o progresso cientfico que hoje marca o Direito
de Famlia.
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