Top Banner
Quarto22 Setembro’15 Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências
27

C i i B d o - UC

Feb 09, 2022

Download

Documents

dariahiddleston
Welcome message from author
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
Page 1: C i i B d o - UC

Quar

to22

Setem

bro

’15

AnaCristina Brandão

Do Livrodas

Ausências

Page 2: C i i B d o - UC

Quarto22

Page 3: C i i B d o - UC

This isRoom Twenty Two.

And on the other side of its doors lies

an adventure thatis as fascinating

as it is inexplicable.

Page 4: C i i B d o - UC
Page 5: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

76

Page 6: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

98

Page 7: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

1110

Page 8: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

1312

Page 9: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

1514

Page 10: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

1716

Page 11: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

1918

Page 12: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

2120

Page 13: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

2322

Page 14: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

2524

Page 15: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

2726

Page 16: C i i B d o - UC
Page 17: C i i B d o - UC

Do Livro das Ausências, de Ana Cristina Brandão, parece ser construído por sucessivos pentimen-tos1. Palavra de origem italiana que remete para o processo da pintura, pentimento pode-se traduzir por arrependimento, remorso. Lillian Hellman (1905-1984) no seu segundo livro de memórias, Pentimento: A Book of Portraits2, descreve:

«A medida que o tempo passa, a tinta velha em uma tela muitas vezes se torna transparente. Quando isso acontece, é possível ver, em alguns quadros, as linhas originais: através de um ves-tido de mulher surge uma árvore, uma criança dá lugar a um cachorro e um grande barco não está mais em mar aberto. Isso se chama penti-mento, porque o pintor se arrependeu, mudou de ideia. Talvez se pudesse dizer que a antiga concepção, substituída por uma imagem ulterior, é uma forma de ver, e ver de novo, mais tarde.3»

Apreender a construção das gravuras de Ana Cristina, o modo como seu pensamento plástico se edificou ao longo do tempo, exigia conhecer seu ateliê, sua biblioteca, os objetos e imagens (fotos, recortes e gravuras) que ela colecionou por anos. Quando a gravadora evoca «das

PARA ALÉM DA MEMÓRIA

Do Livro das Ausências

31

Page 18: C i i B d o - UC

Ausências» e a este vácuo refere-se a um livro, esperamos encontrar o «objeto» físico. Mas sabemos que é apenas um jogo, e que também não há «arrependimento», mas paralelos que nos desafiam a preencher estas lacunas, suas refe-rencias e aquilo que desconhecemos da artista.

Ao nos convidar a habitar este espaço de falta, de compunção da sua escrita com imagens e signos que antes obsoletos ganham significa-ções. São dispositivos que nos atravessam em uma trama delicada e paciente.

Sublinharíamos que este de «ver de novo» é o atualizar dessa origem particular do proces-so criador. As múltiplas telas serigráficas que Ana Cristina em alguns momentos usa como carimbo, aproximando não o arrependimento, mas a justaposições de ideias como um mar tempestuoso, sobrepõem reminiscências. Memórias construídas de outros lugares e de outras pessoas.

O trabalho da serigrafia ganhou grande reper-cussão como um processo industrial, advindo de outros processos de rotulagem e estamparia como a litografia, proporcionou no século XX uma aceleração da reprodução de imagens

comerciais. Ana Cristina distingue o seu trabalho de criação realizado por um artista dos traba-lhos destinadas ao uso comercial, industrial ou puramente reprodutivo. Seu processo e técnica de impressão gera cópias únicas. Sua proposta não é buscar nesse material um substituto para matrizes convencionais de gravura, mas em-preender as possibilidades que podem apontar do seu uso para a gravura contemporânea.

É preciso lembrar que estas peças únicas, se enlaçam na «cópia» de outros elementos que podem se repetir como sinais. Mas nunca uma mesma construção, jamais uma história contada de uma mesma maneira. Como se as histórias que ela nos traz exigissem muitas modulações na voz, muitos labirintos na memória. Como Ariadne ela nos presenteia imagens como fios condutores para que escapemos do labirinto.

A superfície de sua gravura desdobra-se em camadas, opera a lógica do palimpsesto, embora ela nunca raspe ou limpe a superfície gravada, esta substituição opera-se naquilo que evocamos: o «arrependimento», o tempo na construção da gravura, o tempo como uma fita de Moebius criando espaços virtuais e contínuos.

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

3332

Page 19: C i i B d o - UC

Ana Cristina diz encontrar as referências que precisa no espaço do seu ateliê. De nada mais precisa. Mas é assim que se aproxima de um lugar completo e absoluto.

Ancorada em seu processo Ana Cristina vai além da auto-referência. Heterogênea em sua construção condensa uma sensibilidade per-meável aos problemas da arte, deste «ver de novo», interroga-nos a cada momento o estatuto das imagens.

1 1900–05; < Italian, equivalent to penti (re) to repent

(< Latin paenitëre to regret) + -mento –ment. penti-

mento. (n.d.). Dictionary.com Unabridged. Retrieved

October 24, 2015, from Dictionary.com website:

http://dictionary.reference.com/browse/pentimento

2 HELLMAN, Lillian. Pentimento: A Book of Portraits.

New York: New American Library, 1973. “Old

paint on a canvas, as it ages, sometimes becomes

transparent. When that happens it is possible, in

some pictures, to see the original lines: a tree will

show through a woman’s dress, a child makes way

for a dog, a large boat is no longer on an open

sea. That is called pentimento because the painter

“repented,” changed his mind. Perhaps it would be

as well to say that the old conception, replaced by

a later choice, is a way of seeing and then seeing

again. That is all I mean about the people in this

book. The paint has aged and I wanted to see what

was there for me once, what is there for me now.”

3 HELLMAN, L. Pentimento: um livro de retratos. Trad.

Elsa Martins. Martins. Rio de Janeiro: Francisco

Alves, 1981.

Sebastião Brandão Miguel->

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

3534

Page 20: C i i B d o - UC

Ana Cristina Brandão é a actual directora da prestigiada Escola Guignard, uma Escola de Belas Artes fundada em 1944 por Alberto da Veiga Guignard em Belo Horizonte, hoje integrada na Universidade do Estado de Minas Gerais. Marcada por um grande liberalismo didáctico, que lhe foi incutido pelo seu fundador, esta escola tem sido uma fecunda incubadora de artistas, com expressão em muito diversas modalidades. Nos últimos anos, o curso de Doutoramento em Arte Contemporânea do Colégio das Artes da Universidade de Coimbra tem podido contar entre os seus alunos com docentes da Escola Guignard, que têm prestado um valioso con-tributo para a dinâmica deste núcleo de artes. Com a presente mostra Ana Cristina Brandão respondeu a um convite do Professor António Olaio, director do Colégio das Artes, que assim pretende dar maior visibilidade à produção ar-tística da escola de Minas Gerais, estimulando os contactos entre ambas as instituições.

A primeira impressão do visitante será a da extrema harmonia e da recíproca potenciação de sentidos entre a obra exposta e o espaço

PARA A constRução DE uMA MItogRAfIA PEssoAL

enquadrante. As 22 gravuras encontram-se reunidas numa peça criada pelo arquitecto João Mendes Ribeiro para integrar uma exposição de desenhos seus. Concebida como estrutura circular composta por um aro metálico de que se suspende uma cortina de tela semitransparente, que se pode correr fechando ou entreabrindo o espaço interior, a peça viria posteriormente a receber o polissémico nome de «Quarto 22». Aliada à simplicidade e à brancura total da estrutura, esta designação gera associações com a ideia de um quarto de hospital, devendo adiantar-se que, em determinado período da sua existência, o belo edifício do Colégio das Artes funcionou como espaço hospitalar. O facto ganha mais e inesperadas implicações em face de um pormenor de ordem biográfica: médico tisiologista e radiologista, o pai de Ana Cristina Brandão proibiu a identificação de cada paciente por um número.

A luminosidade translúcida do Quarto cria uma sugestão de intimismo, estabelecendo-se, tal como num hospital, uma relação dialéctica entre o princípio de recolhimento e o de ex-posição. Ao interior acede-se por um degrau

Do Livro das Ausências

37

Page 21: C i i B d o - UC

metálico, igualmente branco, sentindo-se o visitante convidado a ascender a um espaço privado e iniciático. Conhecedora da designação atribuída à estrutura, a artista intencionalmente enviou para a exposição 22 peças, que entram em sintonia com o Quarto 22 a vários títulos: dando-se a conhecer, num movimento para o exterior, as gravuras resultam de e representam um movimento na direcção da interioridade, da autorreflexão, do mergulho no eu. Nesse sentido, por exemplo, ressalta a presença obsidiante de elementos biográficos nas gravuras. Fiel a um percurso já longo nesse sentido, Ana Cristina Brandão inscreve na quase totalidade destas gravuras as letras a, b e c, iniciais do seu pró-prio nome, em tipos e corpos diferentes, em posições e constelações diferentes, gerando relações diferentes com os restantes elementos da gravura e proporcionando diferentes leituras. A interrogação do mundo parte, nesta artista, da interrogação da sua própria circunstância, da sua existência como ser humano inserido num espaço concreto, num tempo concreto. Particularmente importante parece a sua ins-crição numa família, ganhando os objectos

comuns e singelos, de uso quotidiano pelos membros da família, uma dignidade que os faz transcender a símbolos existenciais. Assim por exemplo as chaves, que ocupam um lugar central no conjunto das obras agora expostas, remissí-veis todas elas a cada uma das pessoas, a cada um dos espaços, a cada um dos móveis do seu agregado familiar. Ou as lâminas da barba, ou o jogo com reproduções anatómicas que lhe são familiares dos espaços profissionais em que se movia o seu pai, ou as fotografias pessoais, ou os documentos escritos, herdados do avô. Todo este imaginário pessoal é, porém, trabalhado no sentido de uma expressividade objectiva. É assim que a reprodução anatómica de uma mão de dedos afastados e recurvos, por exemplo, adquire ressonâncias expressionistas de busca, de desejo de mais, de interrogação do que está para além do imediatamente alcançável, do que está acima.

Outro aspecto em que as obras expostas entram em concordância com a sua envolvên-cia é o da simplicidade cromática: a paleta da totalidade das gravuras passa pelo branco, pelo antracite e pelo negro, pelo amarelo areia ou

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

3938

Page 22: C i i B d o - UC

pelo castanho ferrugem e, em breves aflorações, por um vermelho sanguíneo, muito presente no restante da obra desta gravurista. O suporte de muitas composições é um papel amarelecido, com manchas acastanhadas, desenhadas pelo tempo. Esta opção entra em confluência com a economia de cores, identificando a experiência do tempo e da sua passagem como vector que atravessa todo o conjunto. O largo espaço con-cedido ao branco na maioria das composições confere-lhes uma discrição e uma leveza que estimulam a cooperação do leitor destas obras.

O percurso da exposição sugere, aliás, um movimento do mais claro e mais simples para o mais denso, perturbado e complexo. A primeira gravura explora exclusivamente um dos motivos centrais da mostra, precisamente a chave. Como que dispostas em mostruário, concebido como despretensiosa folha quadriculada traçada com a carretilha que pertenceu à avó da artista, as chaves, de diverso formato e tamanho, insis-tentemente concitam a ideia simultânea de acesso e de ocultação. As linhas, numeradas à margem sempre com números ímpares — 1, 3, 5, 7, 9 —, confluem com o motivo da chave

para a ideia de mistério a desvendar. A mesma sensação se desprende de duas gravuras ocu-padas centralmente com o motivo das escadas, traçadas a negro com uma pincelada irregular, sugerindo a ideia de ascensão, de necessidade de ascensão, de rumo a seguir, mas também de esforço e precariedade, de aberto. Este motivo, também ele recorrente, muitas vezes estabelece um jogo de sentidos com os das chaves e dos números — 7 chaves + 1 (a decisiva?), numa das gravuras. A estes sinais acresce o da porta fechada, quase despercebida, minúscula: acesso ao pequeno, afinal o grande enigma, que cada um é chamado a resolver. Ou o das aves e do seu movimento, rumo à liberdade.

Outras gravuras retomam o padrão do quadri-culado, diversamente preenchido, transmitindo a espécie de patchwork assim constituído — talvez de modo muito feminino — a consciência de que os grandes conjuntos se constituem a partir dos elementos simples.

Muito presente nestas gravuras é também o jogo com elementos de escrita, seja com folhas escrituradas que pertenceram ao avô da artis-ta, com citações de Roland Barthes, do livro

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

4140

Page 23: C i i B d o - UC

A Câmara Clara, ou, por exemplo, com fragmen-tos do poema «Os meus versos», de Florbela Espanca, retirados do seu livro Charneca em Flor. Nesta última gravura, duas flores de igual traçado, uma num tom mais claro e aberto, a outra, num castanho outonal, enquadram fragmentos da obra da poetisa portuguesa, sugerindo a passagem do tempo a erosão a que tudo e todos estão sujeitos.

O conjunto avança no sentido da complexidade. Para o final da mostra, encontra-se a gravura com a já referida mão, impessoal e descarnada, patética no seu expressionismo, a que aliás se contrapõe uma outra virada para baixo, repou-sada, com traços de humanidade, de feminili-dade, uma mão amadurecida e personalizada pela sugestão de um anel. Uma outra gravura apresenta duas figuras hieráticas, de perfil, como na arte egípcia, dispostas em oposição espe-cular, aparentemente um homem e uma mulher, que se enfrentam ligados por uma torrente de símbolos de escrita, difusos, que vão de rosto a rosto. Comunicação íntima? Ou comunicação impossível? Seja como for, num plano inferior explora-se o valor do gesto: uma mão como que

se estende a convidar ao diálogo. Nas últimas gravuras, o branco cede a primazia ao negro, às linhas fortes, convulsas, manchas a preto que se contorcem, movidas por tensões muito fortes, gerando uma impressão de perturbação, de labirinto — e a pequena chave insinua-se pelos meandros assim criados. Finalmente, a última peça retoma a primazia do branco, esbatendo, na sua claridade, as tensões anteriores.

Apesar de nuclearmente atravessada pela ideia da passagem do tempo, esta exposição não transmite uma ideia de melancolia triste, antes a de aceitação e de consagração das coisas pequenas da existência, numa celebração da festa da vida.

Maria António HörsterProfessora jubilada Faculdade de Letras Universidade de Coimbra

->

Ana Cristina Brandão Do Livro das Ausências

4342

Page 24: C i i B d o - UC

Livro

EdiçãoColégio das Artesda Universidade de Coimbra

CoordenaçãoAntónio olaioJosé Maçãs de Carvalho

TextosSebastião MiguelMaria António Hörster

Fotografiasvítor Garcia

Designbrunadesousa.com

impressãoNozzle, Lda

Ano de Edição2016

ExpoSição

AutorAna Cristina Brandão

Título Do Livro das Ausências

CoordenaçãoAntónio olaioJosé Maçãs de Carvalho

MontagemTomás Antunes

Secretariadoisabel Teixeirapaula Lucas

identidade Q22brunadesousa.com

produçãoColégio das Artesda Universidade de Coimbra

Page 25: C i i B d o - UC

Quarto 22, lugar desenhado por

João Mendes Ribeiro. Uma sala circular, parede de cortina branca, estrutura

para pendurar 22 imagens.

Page 26: C i i B d o - UC
Page 27: C i i B d o - UC

Colé

gio

das

Art

esU

niversid

ade d

e Coim

bra