Universidade Federal de Sergipe Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Núcleo de Pós-Graduação e Pesquisa em Psicologia Social Mestrado em Psicologia Social JACKELINE MARIA DE SOUZA BULLYING: UMA DAS FACES DO PRECONCEITO HOMOFÓBICO ENTRE JOVENS NO CONTEXTO ESCOLAR São Cristóvão – Sergipe 2013
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Universidade Federal de Sergipe
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Núcleo de Pós-Graduação e Pesquisa em Psicologia Social
Mestrado em Psicologia Social
JACKELINE MARIA DE SOUZA
BULLYING: UMA DAS FACES DO PRECONCEITO HOMOFÓBICO ENTRE JOVENS NO CONTEXTO ESCOLAR
São Cristóvão – Sergipe
2013
JACKELINE MARIA DE SOUZA
BULLYING: UMA DAS FACES DO PRECONCEITO HOMOFÓBICO ENTRE JOVENS NO CONTEXTO ESCOLAR
Dissertação Apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Psicologia Social do Centro de
Ciências de Educação e Ciências Humanas da
Universidade Federal de Sergipe como requisito
parcial para obtenção do grau de mestre em
Psicologia Social.
Orientador: Joilson Pereira da Silva
Coorientador: André Faro
São Cristóvão – Sergipe 2013
COMISSÃO JULGADORA Dissertação da Discente Jackeline Maria de Souza, intitulada BULLYING: UMA DAS
FACES DO PRECONCEITO HOMOFÓBICO ENTRE JOVENS NO CONTEXTO
ESCOLAR defendida e aprovada em 05/03/2013, pela Banca Examinadora constituída
pelos Professores Doutores:
_______________________________________________________ Prof. Dr. Joilson Pereira da Silva (orientador)
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
________________________________________________________ Prof. Dr. André Faro (coorientador)
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
________________________________________________________ Prof. Dr Elder Cerqueira-Santos (examinador)
Universidade Federal de Sergipe (UFS)
________________________________________________________ Prof ª. Dr ª. Marlizete Maldonado Vargas (examinadora externa)
Universidade Tiradentes (UNIT)
DEDICATÓRIA
A minha família que sempre me incentivou a buscar o conhecimento e qualificação
profissional, me apoiando sempre nas minhas decisões.
A todos que torceram por mais essa conquista e que direta ou indiretamente contribuíram para
que essa produção fosse possível.
AGRADECIMENTOS
Aos professores do núcleo de pós-graduação em Psicologia Social da Universidade
Federal de Sergipe, pela oportunidade e por terem acreditado em uma aluna que até
então não tinham nenhum contato.
Ao meu orientador Joilson Pereira da Silva, o qual além de professor dedicado se
mostrou um ótimo amigo e um apoio sempre presente.
Ao meu coorientador André Faro pelo excelente modelo de profissional e por cada
conhecimento compartilhado.
Aos meus professores da graduação na Universidade Federal do Vale do São Francisco,
que me introduziram no mundo da pesquisa e tornaram essa conquista possível.
Aos amigos do mestrado Naiara França, Carina Feitosa e Thiago Souza que fizeram
essa jornada mais prazerosa e me confirmaram que sim, existe amizade no mestrado.
As alunas da graduação Renata, Juliana e Nayana, e mais uma vez, Thiago, sem os
quais não teria sido possível realizar a coleta desses dados no tempo em que foi
realizado e pela parceria nas discussões. Vocês foram excelentes amigos e
companheiros fundamentais para meu amadurecimento profissional.
À minha família e todos os amigos de Petrolina-PE que suportaram comigo a saudade e
se fizeram presentes mesmo na distância.
A todos que me receberam em Aracaju, fazendo com que eu passasse a gostar dessa
cidade e dela sentisse falta.
Aos jovens, gestores e professores que colaboraram para que a pesquisa fosse realizada,
cedendo o campo e respondendo cada questionário.
A todos aqueles que lerem esse material e refletirem sobre o tema, não deixando que
esse conhecimento se limite aos papéis.
A verdadeira modéstia do homem de ciência não
está em crer que o seu trabalho tem pouco valor,
mas em admitir e desejar que seja aperfeiçoado
(Louis D‘hainaut).
RESUMO
Entre as diversas formas de se compreender a violência escolar, atualmente vem se
destacando uma forma específica denominada bullying. Conceitualmente, o bullying é
definido como uma violência repetitiva, podendo ser física ou psicológica, direta ou
indireta, que é estabelecida em uma relação desigual de poder entre pares, produzindo
conseqüências negativas para o alvo. No presente estudo é feita uma aproximação desse
fenômeno com a homofobia, sendo o bullying uma das formas de manifestação desse
preconceito no âmbito escolar. Diante disso, o presente estudo teve como objetivo geral
analisar o bullying em jovens das escolas públicas de Aracaju, bem como, a relação de
sua manifestação com a homofobia. Participaram 808 jovens com idade média de 14,9
anos (DP = 1,98), oriundos de 9 escolas da rede estadual da cidade de Aracaju-SE. O
procedimento de coleta de dados ocorreu nas escolas, de forma coletiva e durante um
período da aula cedido pelo professor. A coleta foi dividida em duas etapas: (1) entrega
dos Termos de Consentimentos Livre e Esclarecidos (TCLE) aos alunos e explanação
sobre a pesquisa; (2) no dia seguinte, retornava-se para recolher os TCLEs assinados
pelos responsáveis e aplicação do questionário. Dentre os participantes, a maioria foi do
sexo feminino (57%), pardos (52%) e afirmou pertencer a alguma religião (93%). Os
instrumentos utilizados foram um questionário de bullying, escala de homofobia e o
questionário de saúde geral (QSG). Para análise dos dados utilizou-se a estatística
descritiva e inferencial. Os resultados indicaram que, entre os participantes, 32% se
definiram como alvos de bullying, 12% autores, 22% alvos/autores e 34% somente
testemunhas. A homofobia foi descrita entre os alvos como responsável por 9% dos
casos de bullying – somente entre os meninos essa porcentagem representou 22% dos
casos; e entre as meninas 2%. Observou-se que o grupo de autores de bullying,
apresentam maiores escores de homofobia, se diferenciando estatisticamente (p < 0,05)
dos grupos de alvos. Além disso, percebe-se que o bullying interfere no bem-estar
psicológico dos sujeitos, sendo os grupos de alvo-autores e alvos os participantes com
menor bem-estar, diferenciando estatisticamente dos demais.
Palavras-chave: bullying; homofobia; bem-estar.
ABSTRACT
Among the various ways to understand the school violence, currently has been
highlighting a specific form called bullying. Conceptually, the bullying is defined as a
repetitive violence, physical or psychological, may be direct or indirect, that is
established in an unequal relationship of power between pairs, producing negative
consequences to the target. In the present study is an approximation of this phenomenon
with homophobia and bullying one of the forms of manifestation of that prejudice
within schools. Given this, the present study had as general objective to analyze the
bullying on young people from public schools of Aracaju, as well as the relationship of
their demonstration with homophobia. Attended 808 young with an average age of 14.9
years (SD = 1.98), from 9 State schools of the city of Aracaju-SE. the procedure of data
collection occurred in schools, in a collective way and during a period of class assigned
by the teacher. The collection was divided into two steps: (1) delivery of Term of free
and Clarified Consent (TFCC) to students and explanation of the research; (2) the next
day, returned to collect the TFCC signed by responsible and application of the
questionnaire. Among the participants, the majority were female (57%), Browns (52%)
and claimed to belong to any religion (93%). The instruments used were a questionnaire
of bullying, homophobia and the general health questionnaire (GHQ). For data analysis
was descriptive and inferential statistics. The results indicated that, among the
participants, 32% self-identified as targets of bullying, 12% authors, 22% and 34%
authors targets only witnesses. Homophobia has been described between the targets as
responsible for 9% of the cases of bullying – only among boys this percentage
represented 22% of the cases; and 2% among girls. It was observed that the Group of
authors of bullying, homophobia, scores are more differentiating statistically (p < 0.05)
of the target groups. In addition, it is noticed that bullying interferes with the
psychological well-being of the subjects, being the target groups-authors and targets
participants with lower well-being, differentiating statistically.
Keywords: bullying; homophobia; well-being.
SUMÁRIO
Introdução .............................................................................................................. 1 Capítulo I ............................................................................................................... 5 1.1 Juventude e violência escolar ..................................................................... 5 1.2 Bullying: um tipo de violência escolar ....................................................... 13 1.2.1. Conceito o bullying ........................................................................... 15 1.2.2. Personagens envolvidos no bullying e motivação para a sua ocorrência ........................................................................................
19
1.2.3. Consequências negativas do bullying ................................................ 24 1.2.4. Produções científicas acerca do bullying ........................................... 28 Capítulo II.............................................................................................................. 36 2.1. Preconceito ............................................................................................... 36 2.2. Novas expressões de preconceito .............................................................. 39 2.3. Preconceito contra homossexuais: o caso da homofobia ............................ 41 2.4. Preconceito e bullying .............................................................................. 48 2.5. Discriminação e bullying .......................................................................... 51 2.6. Preconceito no contexto escolar: a questão da homofobia ......................... 53 2.7. Produções científicas sobre homofobia e bullying ..................................... 59 Cap III - Aspectos Metodológicos .......................................................................... 66 3.1. Objetivo Geral .......................................................................................... 66 3.2. Objetivos Específicos ............................................................................... 66 3.3. Delineamento e abordagem....................................................................... 67 3.4. Participantes ............................................................................................. 67 3.5. Local ........................................................................................................ 68 3.6. Instrumentos ............................................................................................. 69 3.6.1. Questionário de bullying ................................................................... 69 3.6.2. Escala de homofobia manifesta e sutil ............................................... 70 3.6.3. Escala de Saúde Geral ....................................................................... 73 3.7. Procedimentos .......................................................................................... 73 3.8. Considerações Éticas ................................................................................ 75 3.9. Análise de dados ....................................................................................... 76 Capítulo IV – Resultados ....................................................................................... 78 4.1. Bullying ................................................................................................... 78 4.1.1. Alvos ................................................................................................ 79 4.1.2. Autores ............................................................................................. 82 4.1.3. Alvos/autores .................................................................................... 83 4.1.4. Testemunhas ..................................................................................... 86 4.2. Análise Fatorial da escala de saúde geral ................................................... 87 4.3. Bullying e bem-estar psicológico ............................................................... 88 4.4. Análise Fatorial da escala de homofobia manifesta e sutil .......................... 89 4.5. Homofobia manifesta e sutil ...................................................................... 92 4.6. Relação entre bullying e homofobia ........................................................... 94 4.6.1. Relação entre bullying e homofobia manifesta .................................. 94 4.6.2. Relação entre bullying e homofobia sutil .......................................... 95 Capítulo V – Discussão .......................................................................................... 97
5.1. Bullying: compreensão acerca dos resultados observados .......................... 97 5.2. Bullying e Bem-estar Psicológico .............................................................. 104 5.3. Homofobia entre escolares adolescentes de Aracaju-SE ............................. 106 5.4. Bullying e Homofobia: aproximações empíricas ........................................ 109 Capítulo VI – Considerações Finais ....................................................................... 116 Referências ............................................................................................................ 124 ANEXOS ............................................................................................................... 145 Anexo A - Questionário de bullying ................................................................. 145 Anexo B - Escala de homofobia manifesta e sutil ............................................. 149 Anexo C – Escala de Saúde Geral .................................................................... 151 Anexo D - Modelo do TCLE ............................................................................ 152 Anexo E - Documento de aprovação do comitê de ética ................................... 153
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1. Distribuição da amostra por ano de escolaridade ..................................... 68 Tabela 2. Distribuição dos grupos de acordo com os papéis assumidos nas relações de bullying em função do sexo ..................................................
79
Tabela 3. Conteúdo utilizado no bullying em função do sexo ................................. 80 Tabela 4. Percepção de testemunhas defensoras e eficácia da defesa ...................... 81 Tabela 5. Sentimentos e pensamentos descritos pelos autores de bullying ao desenvolver tal prática ............................................................................
83
Tabela 6. Conteúdo utilizado no bullying contra alvos/autores em função do sexo ........................................................................................................
84
Tabela 7. Percepção de testemunhas defensoras e eficácia da defesa ...................... 84 Tabela 8. Sentimentos e pensamentos descritos pelos alvos/autores de bullying ao desenvolver tal prática........................................................................
86
Tabela 9. Reações comportamentais e emocionais das testemunhas ao presenciar uma situação de bullying ........................................................................
87
Tabela 10. Análise fatorial da escala de Saúde Geral .............................................. 88 Tabela 11. Diferenças significativas entre as médias de bem-estar em função dos papéis de bullying ...................................................................................
89
Tabela 12. Análise fatorial das escalas de homofobia manifesta e sutil ................... 91 Tabela 13. Estatística descritiva dos escores de homofobia manifesta e sutil nos diferentes grupos da variável sexo ..........................................................
92
Tabela 14. Estatística descritiva dos escores de homofobia manifesta e sutil nos diferentes grupos que possuem contato ou não com homossexuais ..........
93
Tabela 15. Percentual do número de sujeitos por papéis de bullying e sexo ............ 94
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1. Distribuição da amostra a depender do papel assumido na relação de bullying ...................................................................................................
78
Figura 2. Comparação entre as médias de bem-estar psicológico em função dos papéis de bullying ....................................................................................
89
Figura 3. Comparação entre as médias de homofobia manifesta em função dos papéis de bullying ....................................................................................
95
Figura 4. Comparação entre as médias de homofobia sutil em função dos papéis de bullying ..............................................................................................
96
1
INTRODUÇÃO
As agressões envolvendo o contexto escolar tornou-se uma problemática social
bastante divulgada nos meios jornalísticos e no cotidiano das pessoas. No meio
científico esse tipo particular de violência vem ganhando visibilidade e o que antes era
considerado ―brincadeira‖ hoje recebe o nome de bullying. Embora o termo seja em
inglês, ele já se encontra bem difundido na literatura nacional, havendo certa
uniformidade em seu conceito. Como pontos principais, este fenômeno pode ser
caracterizado pelas ações repetitivas de abuso (físico, verbal, material ou exclusão) na
relação desigual de poder entre pares. Ainda que tenha se tornado comum o seu estudo
no âmbito escolar, vale ressaltar que esta não se trata apenas de um problema
educacional, mas, principalmente, social e da saúde, uma vez que afeta diretamente a
qualidade de vida e o bem-estar dos envolvidos.
Enquanto fenômeno social, o bullying apresenta uma aproximação com o
conceito de preconceito, uma vez que vai definir grupos mais vulneráveis para se
tornarem alvo de ataques. Como pode ser orientado pelo preconceito racial, religioso,
regional ou ainda oriundo da diversidade sexual, o presente trabalho realiza uma
delimitação nesta última forma de preconceito, chamada homofobia. Quanto a isso,
importante salientar que o conceito de homofobia compartilhado no estudo em questão
está para além de discriminações com pessoas que possuem relações afetivo-sexuais
com outras do mesmo sexo, sendo dirigido para todos aqueles que estipulam o dualismo
masculino/feminino e todos os estereótipos em torno de cada um desses papéis sociais.
Diante do exposto, observa-se que a escola não é um ambiente imune a (re)
produzir os fenômenos sociais da violência e do preconceito e, acima de um ambiente
de ensino formal, é também um espaço de socialização e produção de saúde e
2
adoecimento. Consciente a tais questões, a pesquisa tem como objetivos analisar a
ocorrência de bullying entre jovens das escolas públicas de Aracaju, verificando de que
forma essa prática afeta seu bem-estar e a relação de sua manifestação com a
homofobia.
Com base no acervo disponível na biblioteca da Universidade Federal de Sergipe
acerca dos trabalhos de conclusão de curso, bem como dissertações e teses, além de
produções científicas encontradas na internet, destaca-se a ausência de estudos dessa
natureza na cidade de Aracaju e dos benefícios que a produção científica pode trazer
para o contexto social no momento em que se tem conhecimento da realidade local
como primeiro passo para o planejamento de ações efetivas que contribuam para o
desenvolvimento e qualidade de vida dos sujeitos.
Em busca pelo aprofundamento da problemática aqui comentada, o trabalho está
organizado em dois capítulos teóricos. O primeiro deles apresenta uma introdução
acerca da violência escolar e da compreensão que se tem em torno da juventude,
buscando situar o leitor no cenário questionado e a visão que se tem sobre os
participantes da pesquisa. Em seguida é dissertado sobre o tipo de violência escolar
denominada bullying, atentando para as especificidades desse conceito e os possíveis
papéis assumidos nessa relação. Além disso, está sendo feito um paralelo entre esse
evento e as suas consequências negativas, chamando atenção para a questão da saúde no
contexto escolar. Por fim apresenta-se o resultado de um levantamento bibliográfico em
torno das investigações empíricas sobre bullying no Brasil, possibilitando uma
compreensão ampla das pesquisas e as lacunas existentes nessa produção científica
nacional.
O segundo capítulo, por sua vez, pretende apontar a relação entre preconceito e
bullying, uma vez que este é entendido, na pesquisa em evidência, como uma
3
manifestação comportamental específica dessa hierarquização entre os grupos. Para
tanto, é explicitado o que significa ter preconceito, bem como suas aproximações e
diferenciações com o conceito de bullying. Além do preconceito, essa mesma reflexão é
realizada em relação à discriminação. Porém, uma vez que dentro do preconceito existe
uma série de formas de expressões e grupos alvos, realiza-se um recorte acerca do
bullying homofóbico e como este ocorre no âmbito escolar. O capítulo encerra-se com a
apresentação de pesquisas realizadas sobre bullying e homofobia no contexto nacional,
enfatizando as repercussões que essa realidade vem tendo no legislativo brasileiro.
Uma vez realizadas as colocações teóricas, o texto segue com os objetivos da
pesquisa e o método adotado com a finalidade de se atingir tais objetivos (capítulo III).
Continuando, os resultados da pesquisa (capítulo IV) são descritos em subtópicos, a
saber: Resultados da estatística descritiva; Bullying e análise dos questionários por
papéis (alvos, autores, alvos/autores e testemunhas); Análise fatorial da escala de saúde
geral; Bullying e bem-estar psicológico; Análise fatorial das escalas de homofobia
manifesta e sutil; Homofobia manifesta e sutil; e finalmente, a relação entre bullying e
homofobia.
No capítulo V é feita uma discussão em torno dos resultados obtidos e sua
analogia com a literatura existente acerca dos temas abordados. Nessa sessão há
subdivisões semelhantes aos resultados, iniciando o texto sobre bullying, seguindo para
a relação entre essa agressão e bem-estar psicológico; depois se realiza a compreensão
sobre quais variáveis interferem na homofobia entre os escolares, para então fazer a
relação entre bullying e o preconceito homofóbico.
No último capítulo são feitas as considerações finais acerca da pesquisa. Aqui
são comentadas as limitações do trabalho, bem como sugestões para pesquisas futuras,
pensadas a partir do levantamento de novas questões suscitadas por este estudo.
4
Ressalta-se ainda o presente trabalho segue as normas da sexta edição da APA,
conforme pode ser verificado em Correia, Lima, Lopes e Mouro (2012).
Os fatos sociais demandam respostas da ciência e, desta forma, impulsionam a
produção de conhecimento o qual ganha relevância na medida em que busca assumir
um compromisso social. Com o tema da violência não foi diferente. Na década de 70 a
violência política teve uma maior visibilidade, tornando-se pauta de investigações. No
final da década de 80, o tema destaque foi a violência doméstica, compreendida desde a
violência contra a mulher à violência infantil, tendo suas discussões relacionadas com o
momento histórico da luta pela igualdade entre os gêneros e pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), mobilizando organizações civis e estaduais (Almeida &
Almeida, 2004).
No Brasil, as crianças e os jovens são considerados os grupos mais vulneráveis e
vitimizados pela violência (Malta et al, 2010a). Com base nessa realidade, o primeiro
capítulo tem como objetivo discutir a violência e, mais especificamente, a violência
escolar denominada bullying, debatendo a concepção de cada um desses termos. Porém,
antes disso, cabe sinalizar ao leitor o entendimento acerca de juventude adotado no
presente referencial teórico, já que este será o público de investigação.
Bem como outras faixas etárias, a juventude pode ser concebida como uma
―representação ou criação simbólica, fabricada pelos próprios indivíduos tidos como
jovens, para significar uma série de comportamento e atitudes a eles atribuídos. Ao
mesmo tempo é uma situação vivida em comum com certos indivíduos‖ (Groppo, 2000,
6
p.8), ou seja, nessa perspectiva, a juventude seria uma representação e uma situação
social.
Revendo a literatura, observa-se que a noção de juventude tem como principais
critérios a faixa etária – delimitando essa fase a partir de uma idade – fundamentada por
definições fisiopsicológicas e o critério sociocultural, no qual é relativizada a faixa
etária, já que os comportamentos juvenis variam em decorrência de fatores sociais. De
acordo com esse segundo critério, busca-se uma desnaturalização da juventude,
embasada no pressuposto de que este não é um grupo homogêneo, pois está marcado
por diversidades e contradições, em virtude da classe social, gênero, etnias, oposição
urbano-rural, relação nacional-global (Groppo, 2000).
Tal leitura social demanda uma compreensão de ―juventudes‖, uma vez que esta
não é uma construção única, mas sim representativa de um determinado contexto com
características sociais, políticas e econômicas singulares, estando sujeita a alterações ao
longo do tempo (Oliveira & Rosa, 2010). Desta forma, a influência do meio vai atuar de
forma crucial para o desenvolvimento do pensamento juvenil (Arpini, 2003).
Algumas vezes utilizados como sinônimos, cabe aqui diferenciar três conceitos
comuns na literatura: puberdade, adolescência e juventude. O conceito de puberdade foi
criado pelas ciências médicas e faz menção às mudanças corporais no processo de
maturação do corpo infantil para o corpo adulto. A Psicologia e a Pedagogia criaram a
concepção de adolescentes, a qual foca as mudanças de comportamento observadas na
transição para a fase adulta. Já o termo juventude é mais utilizado pela Sociologia e
focaliza este período como a fase de transição entre as funções sociais da infância e as
funções sociais da fase adulta (Groppo, 2000).
Refletindo sobre essas nomenclaturas, observa-se que, embora cada uma delas
foque seu olhar em um determinado fator (biológico, individual/personalidade e
7
societal), de modo geral elas trazem como ponto comum a compreensão dessa fase
como um período de transição para a fase seguinte – adultez. Nesse ponto, a crítica se
faz coerente no sentido de que o jovem é sempre visto como um futuro adulto, uma fase
de preparação, e não como um sujeito do agora, que vive uma fase a ser experienciada
nesse momento, com demandas próprias e não apenas oriundas de uma transição para a
fase adulta, vista como o ápice do desenvolvimento.
Além da desnaturalização da juventude, compete a desmistificação da mesma.
Geralmente vista como promotora do novo e da rebeldia, Groppo (2000) chama atenção
para o fato de ela não ser progressista nem conservadora por natureza, todavia uma
força potencial de transformação da sociedade e aberta às oportunidades, estando sujeita
aos valores de uma época e de uma cultura.
Essa organização social que influencia a construção da juventude atualmente é
marcada pela seguinte lógica social: ―Quem é malandro obtém sucesso; esse é o modelo
para os adolescentes, é o espelho que a sociedade oferece‖ (Novo, 1996, citado por
Arpini, 2003, p.45). Os jovens passam então a ser a ―vitrine dos conflitos sociais‖ e
importante público para as investigações acerca da violência (Waiselfisz, 1998, citado
por Oliveira & Rosa, 2010, p.114).
Ainda nessa lógica,
a ideia de que a força resolve os conflitos tem se generalizado ao nível do cotidiano a ponto de podermos dizer que estamos nos familiarizando com a violência. Este fenômeno está se tornando tão explícito a tal ponto que nos acostumamos com essa violência e isto tem contribuído para sua naturalização (Novo, 1996, citado por Arpini, 2003, p.44).
Destaca-se que não há um conceito único acerca do que seja violência, ou seja, o
conceito utilizado no presente trabalho não se refere a um modelo exclusivo, mas sim
em tendências observadas a partir da revisão de literatura. Velho (1996, citado por
Marra, 2007) concebe violência como tudo aquilo que é imposto por outrem, violando
assim o seu desejo. Esta imposição pode ser da ordem física ou simbólica e ser anterior
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ao ato em si, já que a ameaça do uso da agressão física já é percebida como
manifestação violenta.
Zaluar e Leal (2001, citado por Abramovay, 2005) ressaltam como violência o
não reconhecimento do outro enquanto sujeito, a negação da dignidade humana, a
ausência de compaixão e o uso da palavra. Todas essas ações se fazem violentas na
medida em que é negada ao sujeito a oportunidade de argumentação e negociação. Além
desses pontos, Abramovay (2005) e Di Giorgi e Di Giorgi (2010) advertem as violações
dos direitos como um indicativo para a categorização de um fenômeno como violento,
sejam elas manifestadas a partir do preconceito de raça, gênero, geração, classe social,
orientação sexual e outros.
Portanto, a noção de coerção ou força, associado a um prejuízo provocado à
vítima é o cerne dos conceitos de violência aqui adotados que, dentre as várias
perspectivas, compartilha de uma visão social desse abuso, a qual está interligada a
estruturas políticas. A análise da violência exige direcionar um olhar para além de
manifestações individuais, compreendendo-a como a expressão de um coletivo situado
em um determinado contexto histórico e social. Assim, é tida como uma relação que,
como tal, não pode ser analisada fora do ambiente no qual acontece.
Sendo a escola o terceiro local onde mais ocorre a violência contra a juventude,
ficando atrás da rua e do domicílio (Malta, et al., 2010a), para se falar em violência
escolar, se faz necessário refletir sobre o papel que essa instituição assume no cenário
social e cultural brasileiro. Enquanto instituição de educação formal, seu principal
objetivo seria favorecer o desenvolvimento do aluno e assim contribuir para uma
sociedade mais justa e desenvolvida economicamente (Stelko-Pereira & Williams,
2010).
Ainda segundo essas autoras:
9
A escola é fundamental para o pleno desenvolvimento do indivíduo, devendo ser um dos contextos sociais que estimule as habilidades intelectuais, as habilidades sociais e a absorção crítica dos conhecimentos produzidos em nossa sociedade. A escola deve ser importante no tempo presente e no tempo futuro, sendo referência para o aluno de um local seguro, prazeroso e no qual ele pode se conhecer, conhecer aos seus próximos e a sociedade em que vive, projetando como quer atuar no mundo (p.47).
Essa visão positiva do papel da escola não necessariamente condiz com sua
atuação, podendo atuar como uma agência de controle que exige como requisito a
disciplina e a normatização dos comportamentos juvenis. Quando em uma intensidade
exacerbada, esta pode contribuir para um sentimento de aprisionamento da vida
adolescente, favorecendo a violência nesse meio (Marra, 2007).
Embora no campo do ideal a escola seja vista como ―a instituição da alteridade,
do estranhamento e da mestiçagem – marcas indeléveis da medida de
transformabilidade da condição humana‖ (Aquino, 1998, p. 138), Di Giorgi e Di Giorgi
(2010) destacam que, na prática, este espaço constitui-se como sendo um castigo para os
trabalhadores, a prática de estudar considerada um tormento pelos alunos, aos quais são
negados a condição de sujeito.
Nesses casos, é notado um descompasso entre as expectativas sociais da função
da escola e a sua atuação junto aos jovens. Segundo Abramovay (2005), o ambiente
escolar vem atuando na perspectiva de reproduzir as desigualdades observadas na
sociedade, o que é uma oposição à sua expectativa social, que tem nela a visão de um
ambiente para o exercício da cidadania e da democracia.
Além desse descompasso, observa-se uma dissonância entre a cultura escolar e a
cultura juvenil. Nessa relação, a escola tem uma visão reducionista do jovem,
desconsiderando as diversas identidades na busca da normatização de comportamentos.
Isto interfere na comunicação e nas relações estabelecidas nesse espaço, contribuindo
para a violência, ou seja, favorece a tensão nas relações estabelecidas na comunidade
escolar. Ressalta-se que embora essa tensão não seja algo atual, a mesma só passa a ser
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compreendida como violência na década de 90. Até então, somente a agressão física era
caracterizada desta forma (Abramovay, 2005).
Em sua revisão de literatura e em uma perspectiva psicológica, Martins (2005)
sugere a diferenciação entre dois tipos de violência, a violência reativa e a proativa. Na
reativa, o comportamento seria motivado por condições antecedentes que provocam
uma reação emocional explosiva, levando o sujeito a enfrentar essa situação usando da
violência. Ao ser xingado, o estudante tem sua raiva eliciada e manifesta essa emoção
em forma de comportamento violento, como bater ou agredir verbalmente o autor dos
xingamentos; ou ainda reagir de forma violenta com a professora em resposta a alguma
decisão tomada por ela e que desagrada esse sujeito. Ou seja, nessas situações a
violência ocorre como consequência de uma situação anterior. Já na violência proativa,
a pessoa utiliza desse meio como forma de atingir um resultado desejado. Por exemplo,
um adolescente que deseja ser popular entre os pares e, para isso, vitimiza outros jovens
a fim de mostrar poder. Diferente do caso anterior, no qual a violência apresentava-se
como uma reação, nesse tipo de violência o sujeito tem um objetivo e para atingi-lo usa
a agressão como meio.
Compreender essa diferenciação pode ser útil na medida em que orientam
programas de intervenção na diminuição da violência. No primeiro caso uma sugestão
seria o trabalho com base no autocontrole, enquanto no segundo caso seria mais
eficiente uma intervenção que levasse em consideração as estratégias cognitivas para
alcançar objetivos.
Conforme a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2009
com estudantes de escolas públicas e particulares de todas as capitais dos estados
brasileiros e do Distrito Federal, foram identificadas as seguintes situações de vivência
da violência pelos jovens: insegurança no trajeto casa-escola (6,4%) e na escola (5,5%);
11
envolvimento em brigas com agressão física nos últimos 30 dias (12,9%), com arma
branca (6,1%) ou arma de fogo (4,0%); agressão física por familiar (9,5%). Embora esse
número tenha variado a depender da localidade, um resultado foi comum: o maior
envolvimento dos meninos nas situações de violência (Malta, et al., 2010a).
Ainda que nos resultados da pesquisa tenham sido descritos somente as médias
nacionais e das cidades que mais destoaram desse valor – e nesse caso a cidade de
Aracaju não foi citada – pelos gráficos apresentados no artigo, pode-se chegar a alguns
valores aproximados. Com média menor do que a nacional, percebe-se em Aracaju os
casos de insegurança no trajeto casa-escola (5%) e na escola (5,4%); envolvimento em
brigas com agressão física no último mês (12%); utilização da arma de fogo (3,2%). As
médias acima das nacionais foram percebidas nas seguintes variáveis: utilização de
arma branca (6,3%) e agressão física por familiar (10,8%).
Outro dado observado foi a frequência de alunos que deixaram de ir à escola
porque não se sentiam seguros neste local (5,5%). Essa média se distingue quando são
avaliados os contextos públicos e privados, sendo 6,2% e 2,9%, respectivamente. Esse
número pode parecer pequeno quando se pensa em porcentagem (5,5%), contudo,
quando se transforma em sujeitos, ele equivale a um número de aproximadamente 3355
jovens afastados de sala de aula em virtude da violência escolar no Brasil. Em Aracaju-
SE a média foi bem próxima da nacional (5,4%), entretanto, não foi possível calcular o
número de participantes que representam essa porcentagem, em virtude de não estar
descrito no trabalho o quantitativo de sujeitos que compuseram a amostra nessa cidade.
Com base nesses resultados, os autores dos estudos destacam a necessidade de se
discutir a temática com profissionais ainda em formação das áreas de educação e saúde.
Essa seria uma tentativa de reverter um quadro no qual os profissionais afirmam não
12
saber como lidar com o fenômeno e inseri-los no planejamento curricular, bem como
envolver os pais na problemática.
Em outra pesquisa realizada por Njaine e Minayo (2003), de acordo com os
profissionais da escola, o comportamento dos jovens de usar da agressividade como
afirmação dentro do grupo se daria devido à necessidade de ―se mostrar‖, pensando com
isso alcançar prestígio e respeito no grupo, ou seja, que ―vão me achar um máximo‖. Já
para os jovens, a causa e aumento da violência escolar podem ser compreendidos
através de quatro motivos básicos, nessa ordem: (1) a agressividade do próprio aluno;
(2) o descaso da escola frente a essa realidade; (3) a influência da mídia; e por fim, (4) a
negligência das famílias.
De acordo com Estévez, Jiménez e Musitu (2008), a motivação para a violência
entre os jovens estaria no objetivo de ter um status social elevado; ter o poder e
controlar os demais alunos; impor suas normas; desafiar os sujeitos de autoridade e
opor-se aos mecanismos de controle da escola. Ainda segundo esses autores, alguns
fatores que também colaboram para a ocorrência da violência nesse local, seriam: a
estrutura pobre dos centros, a falta de motivação dos professores, a tolerância à
violência, o ambiente negativo de sala de aula, convivência com amigos que apresentam
comportamentos violentos, relação negativa entre professores e alunos, e rejeição social
pelos pares.
Baseados nessas motivações e causas, esses mesmos autores recomendam
estratégias para a prevenção dessas violências, dentre as quais podem ser destacadas a
maior participação do aluno nas decisões escolares, fazendo com que este crie uma
identificação e vínculo afetivo com esse espaço; apresentação no cotidiano escolar de
um modelo positivo de conduta por parte dos profissionais; e incluir ao conteúdo das
aulas a educação de valores, estimulando a democracia e inclusão. Especificamente em
13
sala de aula, podem ser realizadas estratégias, como: dar mais responsabilidade aos
alunos na resolução dos conflitos, propor atividades de cooperação e não de competição,
debater temáticas que exijam uma reflexão crítica por parte dos alunos.
Visto a necessidade e relevância de se explanar sobre a violência escolar, é
importante delimitar o tipo específico de violência que se está abordando neste trabalho.
Para isso, volta-se à leitura da atualidade, na qual uma nova configuração social e das
normas que regem o comportamento em sociedade, dá visibilidade a uma violência
denominada bullying. Sendo um tema ainda pouco explorado no contexto brasileiro e
que tem sua relevância justificada pelo momento histórico-cultural no qual a sociedade
se incomoda com o problema, tirando-o do patamar de ―normalidade‖, essa temática
assume para si um conceito próprio e passa a ser visto não mais como algo naturalizado
e aceitável, mas como um problema social que produz sofrimento e interfere na
qualidade de vida das pessoas.
Desta forma, não se tem como intenção discutir exaustivamente a violência
escolar de modo geral ou da juventude, e sim da especificidade do bullying. Contudo,
para isso, julgou-se como relevante introduzir a temática da violência para situar melhor
do que se está tratando, bem como esclarecer o ponto de vista teórico que se tem acerca
dos participantes (jovens).
1.2. Bullying: Um tipo de violência escolar
Tendo em vista a dificuldade de encontrar uma palavra nas diferentes línguas
que representasse o que a comunidade científica vem chamando de bullying, optou-se
por adotar esse termo inglês em todo o mundo, facilitando a comunicação entre os
pesquisadores. Entretanto, na língua portuguesa algumas palavras ainda são adotadas
14
como sinônimos da mesma, a saber: maus tratos, vitimização, intimidação,
agressividade e violência entre pares (Francisco & Libório, 2009). Porém, dada a
justificativa acima, na pesquisa em evidência o termo está adotado na forma original do
inglês bullying.
Embora os estudos acerca do bullying tenham iniciado nas décadas de 60 e 70 na
Escandinávia, e tenha tomado proporções mundiais nas décadas de 80 e 90, esse fato
somente mobilizou a opinião pública, chamando a atenção dos pais e educadores,
quando passou a estar associado a casos de suicídios em virtude do sofrimento gerado
pela experiência de vitimização (Antunes, 2010).
Desta forma, o bullying pode ser considerado um fenômeno ao mesmo tempo
novo e antigo. Novo, na medida em que recebe uma nomenclatura própria, passando a
ser estudado somente recentemente; antigo, em virtude de que desde sempre pôde ser
observado na história das relações escolares entre pares. Além disso, pode ser
considerado mundial, uma vez que sua incidência é observada em todos os países nos
quais já foram realizadas pesquisas, independente da etnia, cultura e condições
econômicas (Fante, 2005). O bullying também é observado nas diversas faixas etárias e
instituições públicas e particulares (Calbo, 2009).
Apesar de sempre ter existido, essa forma de violência vem chamando atenção
por envolver cada vez pessoas mais jovens e por estar tomando proporções cada vez
maiores que, por consequência, acaba recebendo destaque na mídia, tornando-se ponto
de discussões em diferentes espaços, contextos e grupos.
No Brasil, vários estudos têm sido realizados acerca de tal violência, no entanto,
quando se pensa nas especificidades do bullying, percebe-se que essa temática só tem
sido abordada no país ultimamente. Porém, embora recentes no Brasil, no cenário
mundial estes estudos já vêm sendo desenvolvidos desde a década de setenta, tendo
15
ênfase em países como Estados Unidos, Espanha e Reino Unido (Fante, 2005). Todavia,
quando comparadas, essas pesquisas apresentam algumas divergências, o que indica
que, mesmo que esse fenômeno seja universal em sua incidência, este não ocorre do
mesmo modo nos diferentes locais. Como diferenças percebe-se: nível de incidência do
bullying nas escolas; a idade com maior prevalência desse tipo de relação violenta;
diferentes dados sobre a autoestima do agressor e a relação entre a depressão, o estresse
e a violência (Musitu, Estévez, & Jiménez, 2009).
Na busca de um maior conhecimento sobre esse tema, os estudos vêm apontando
como resultados a incidência do bullying, o tipo de violência mais comum (verbal ou
física), o ambiente da escola no qual essa prática é mais recorrente (por exemplo,
recreio ou aula), as possíveis diferenças entre os sexos, bem como as consequências e
formas de enfrentamento desse fenômeno (Francisco & Libório, 2009; Musitu, Estévez,
& Jiménez, 2009).
1.2.1. Conceito de bullying
O bullying, considerado um estressor social crônico (Calbo, 2009), de acordo
com Olweus (1993, citado por Antunes, 2010), seria definido a partir da repetição de
ações negativas de um aluno, ou grupo, em direção a outro aluno. Essas ações negativas
podem ser compreendidas como aqueles atos de incomodar ou infligir o outro. Seria o
que os demais autores consideram como comportamento agressivo, contudo com
algumas especificidades.
Nas discussões sobre a conceituação do bullying, Smith (2002) destaca dois
pontos como sendo os principais na caracterização dessa agressão: a repetição desses
atos e a diferença de poder entre autor e alvo. Essa diferença de poder pode ser
16
justificada por diversos fatores, como o apoio recebido dos demais estudantes, diferença
de idade, de tamanho, desenvolvimento emocional e/ou físico (Cordeiro, Pepler, &
Craig, 2009). Neste sentido, Olweus (1993, citado por Antunes, 2010) destaca ainda que
em casos nos quais os envolvidos tenham o mesmo poder, essa violência não pode ser
classificada como bullying.
Diante do exposto, observa-se que os principais requisitos que diferenciam essa
forma de violência das demais são os critérios de repetição de agressões frente a alguém
que é percebido como mais ―fraco‖, ou que ocupa uma posição mais frágil, estando
impossibilitado de defesa. Ressalta-se que esse abuso de poder não está diretamente
relacionado com uma provocação por parte do alvo do bullying (Almeida & Almeida,
2004). Além disso, Tognetta e Vinha (2010) destacam como sendo pertencente ao ato
desta prática, a presença de um público de testemunhas que adquirem a função de
reforço para a ação do autor.
Lopes Neto (2005) acrescenta a essa conceituação a intencionalidade, a falta de
motivo aparente e a causa de sofrimento ao alvo como requisito para o bullying. Essa
intencionalidade, por sua vez, vai ser compreendida por Fante (2005) como um desejo
inconsciente e deliberado de maltratar outra pessoa. Ou seja, um conjunto de
comportamentos agressivos que se tornam intrínsecos às relações interpessoais, nos
quais os indivíduos mais fortes se divertem à custa de indivíduos mais fracos, por meio
de uma violência que recebe o nome de ―brincadeiras‖ e assim tentam disfarçar o
propósito de maltratar e intimidar.
Em síntese e em concordância com as perspectivas já apresentadas, Musitu,
Estévez e Jiménez (2009) esquematizam as características básicas do bullying como
sendo: a intencionalidade do dano por parte do autor; intimidações de ordem física,
verbal e/ou psicológica; a periodicidade dos atos violentos; a produção de um efeito
17
negativo para o alvo do bullying; o autor recebe apoio de um grupo; o alvo, além de não
ter provocado essa conduta agressiva, encontra-se indefesa; e a presença de uma relação
hierárquica de dominação e submissão entre autor e alvo.
Além desses critérios já comumente observados na literatura supracitada, outro
fator adotado no presente estudo pode ser importante para a compreensão e classificação
de um comportamento como bullying: a ocorrência entre sujeitos que ocupam uma
mesma posição hierárquica, isto é, entre pares. Neste sentido, não seria possível falar
em bullying entre professor (a)-aluno (a) ou pais-filhos (as), mas sim entre aluno (a)-
aluno (a), professor (a)-professor (a), irmã (o)-irmã (o). Esse critério também almeja
diferenciar esse conceito de outros já utilizados no meio científico, como exemplo o
assédio, já que este pode se assemelhar ao bullying, caso esse critério não seja utilizado.
Por assédio compreende-se uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que
atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, o que culmina por
expor o sujeito (trabalhador) a situações humilhantes e constrangedoras. Essas, por sua
vez, são capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica
durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Embora seja menos
comum, o assédio também pode ocorrer de subordinado para empregador e não apenas
de empregador para subordinado, fato mais comum (Nascimento, 2004).
Como pode ser percebido, apesar de terem algumas semelhanças – como a
repetição, a intencionalidade do dano e o sofrimento do alvo –, o assédio se caracteriza
mais pela agressão psicológica e pelo ambiente de trabalho. No entanto, esses pontos
ainda não são suficientes para distingui-lo claramente do bullying. Assim, o critério de
hierarquia parece diferenciar esses dois conceitos, já que o bullying ocorre entre pares,
enquanto que no assédio haveria uma diferença de hierarquia entre os envolvidos
(subordinado e empregador). Nessa perspectiva, o bullying seria uma modalidade de
18
violência específica na qual, além da repetição e intencionalidade, é fundamental
ocorrer na relação entre pares uma não hierarquia, ou seja, criança-criança, adolescente-
adolescente, ou ainda, adulto-adulto.
Essa semelhança entre assédio e bullying é possível em virtude deste último não
estar limitado ao contexto escolar, podendo ocorrer em diversos contextos, como
família e trabalho, bem como com sujeitos de diversas idades – crianças, jovens, adultos
(Cordeiro, Pepler, & Craig, 2009). Mesmo assumindo essa diversidade de locais e
sujeitos, esse fenômeno será estudado, no presente trabalho, em ambiente escolar e com
jovens. A escolha pela escola está fundada na alta ocorrência do bullying neste local, o
que pode estar ligado ao critério da periodicidade, já que a escola é o ambiente onde os
jovens se encontram com grande frequência e por tempo prolongado.
Uma classificação dentro desse conceito faz menção ao tipo de bullying
utilizado, podendo ser direto ou indireto. O direto é visto como aquele no qual a ação
agressiva age diretamente sobre o alvo, como por exemplo, agressões físicas e verbais.
O indireto, por sua vez, faz referencia à exclusão e discriminação do sujeito de seu
convívio social e, embora menos percebida, destaca-se que esta pode ser tão ou mais
prejudicial do que a forma anterior (Fante, 2005).
Diante desses conceitos, percebe-se que o construto bullying e os pontos
destacados pretendem demarcar o objeto de estudo e o diferenciar de outras formas de
violência. Além disso, observa-se que apesar de se modificarem alguns pontos, com a
inclusão ou exclusão de algo, de modo geral, o termo bullying é um conceito em torno
de uma manifestação comportamental de violência que está relacionado à discriminação
em virtude de alguma característica do sujeito ou do seu grupo de pertencimento.
Quanto à disseminação da violência escolar e do bullying, Abramovay e Rua
(2002) observam que esta pode ser compreendida a partir da ação de fatores que podem
19
ser classificados como exógenos e/ou endógenos. As questões exógenas, como o
próprio nome sugere, fazem menção a elementos que estão para além da dinâmica
escolar, como por exemplo, as questões de gênero, as relações raciais, as dinâmicas
familiares e os demais arranjos sociais. Os fatores endógenos, por sua vez,
correspondem a elementos diretamente relacionados à escola, como a série, o sistema
disciplinar e punitivo, bem como a qualidade do ensino e outros.
Destaca-se ainda a necessidade de entender o bullying a partir de uma leitura
contextualizada, tentando compreender o momento histórico, o ambiente no qual ocorre
e os sujeitos envolvidos. Só assim os estudos acerca desse fenômeno ultrapassarão o
limite de estudos descritivos, tal como vem sendo produzido atualmente. Outro
equívoco que essa descrição pode trazer é a leitura do bullying como algo estático, e não
como uma dinâmica que ganha formas na sua relação e está sujeita a constantes
mudanças.
Em síntese, enfatizam-se como principais critérios para a ocorrência do bullying
a repetição e a ocorrência entre pares. Uma vez em desacordo, o evento pode ser
compreendido como violência, assédio, agressão, mas não como bullying. Ressalta-se a
necessidade desses critérios em virtude da generalização de vários eventos como
bullying e ainda uma diferenciação com as demais formas de violência, justificando
uma nomenclatura própria.
1.2.2. Personagens envolvidos no bullying e motivações para a sua
ocorrência
Quando se trabalha com a temática do bullying, a maioria dos estudos utiliza
como nomenclatura para os envolvidos os seguintes rótulos: vítima, agressor e
20
testemunha. Contudo, tal como sugerido pela Associação Brasileira Multiprofissional de
Proteção à Infância e Adolescência (ABRAPIA), e na tentativa de não rotular ou atribuir
um julgamento de valor e culpabilidade, no presente trabalho, os dois primeiros termos
são substituídos, respectivamente, por: alvo e autor de bullying.
Em relação ao perfil dos sujeitos alvos de bullying, estes geralmente apresentam
uma imagem negativa de si mesmo, pouco interesse em atividades, sintomas
depressivos, comunicação pobre, déficit de habilidade social e sentimentos de solidão e
culpa (Musito, Estévez, & Jiménez, 2009). Catini (2004) aponta em sua revisão de
literatura, características como: ter poucos amigos, serem passivos, ansiosos, retraídos e
possuir baixa autoestima, o que facilita e reforça a vitimização. Deste modo, esse perfil
é facilmente percebido pelo autor de bullying como um bode expiatório, sendo,
portanto, um alvo em potencial, já que este não vai saber se defender, nem tão pouco
revidar os ataques (Fante, 2005).
Uma vez que se trata de uma relação, para haver bullying faz-se necessário, além
do alvo, a existência dos autores que, geralmente, têm sua conduta reforçada por um
grupo (testemunhas). Quanto ao perfil do autor, embora possam ser meninos e meninas,
estes são mais identificados como sendo do sexo masculino (Catini, 2004; Bandeira,
2009; Calbo, 2009). Adverte-se que essa prevalência de meninos é observada não
apenas quanto ao papel de autores, tendo, de modo geral, os meninos mais chances de se
envolver em diversos papéis de uma situação de bullying (Bandeira, 2009).
Contudo, importante observar de modo crítico esse dado e refletir sobre a
ocorrência do bullying entre os gêneros, pois como já notado, o números de meninas
envolvidas vem aumentando, e estas participam mais do bullying indireto e verbal,
enquanto que os meninos expressam maiores agressões físicas (Fante, 2005). Porém,
segundo o meio jornalístico, esse cenário vem se modificando e as meninas vêm se
21
envolvendo também, cada vez mais, nesse tipo de agressão. Desta forma, pode-se
perguntar se não existe uma subnotificação do bullying indireto, o que faria com que as
meninas fossem menos percebidas como autoras. Essa suspeita está fundamentada ainda
na visão da violência voltada mais para agressões físicas, sendo a verbal vista como
―brincadeira‖, não sendo assim percebida no ambiente escolar e menos reconhecida
pelos jovens como agressão. Consequentemente, as meninas podem não se identificar e
não serem identificadas como autoras.
No que tange aos autores de bullying, esses sujeitos são relatados na literatura
como possuindo a característica de manifestar pouca empatia, baixa habilidade em
resolver problemas (Bullock, 2002) e ser de uma família com estrutura disfuncional, na
qual a violência é aprendida como forma de relacionamento. São, ainda, postos como
impulsivos e possuindo baixa tolerância a frustração, apresentando dificuldade em se
adequar às normas (Fante, 2005). Segundo Estévez, Jiménez e Musitu (2008), além
desse perfil, o autor teria como motivação quatro necessidades básicas: a de se destacar,
de poder, de sentir-se diferente e de preencher um vazio emocional.
Outros estudos indicam que esses autores possuam uma maior tendência para
comportamentos de risco, como o consumo de álcool (Due, Holstein, & Jorgeensen,
1997). A longo prazo, os autores terão maiores dificuldades no desenvolvimento e
manutenção de relações positivas, se comparado aos demais sujeitos (Bullock, 2002).
As pesquisas de Arsênio e Lover (1996, citado por Tognetta & Vinha, 2008)
observaram um fenômeno que denominaram de ‗feliz agressor‘. Esses constataram que
os sujeitos participantes da pesquisa não representavam a agressão como algo ‗errado‘ e
moralmente condenável em si, atribuindo sentimentos positivos aos autores de bullying.
22
Esse achado permite então pensar a respeito do porquê de essa ação ser apoiada por
algumas testemunhas, e porque alguns autores continuam a praticá-la.
Outra possível forma de vivenciar o bullying diz respeito a assumir dois papéis,
o de alvo e autor dessa violência. Segundo Lopes Neto (2005), aproximadamente 20%
dos alunos autores também são alvos, sendo, portanto, alvos/autores. Segundo mesmo
pesquisador, esse sujeito teria como perfil uma baixa autoestima, o que o torna
vulnerável a se tornar alvo. Porém, ao mesmo tempo, este possui atitudes agressivas e
provocativas, o que o torna um autor em potencial. Na maior parte dos casos, esses
sujeitos são rejeitados, não tendo aceitação dos pares. Vale ressaltar que sintomas
depressivos, pensamentos suicidas e distúrbios psiquiátricos são mais frequentes nesse
grupo (Smith, 2004). Destaca-se ainda que esses sujeitos desempenham esses dois
papéis em relações diferentes, ou seja, em algumas relações esse sujeito encontra-se em
uma posição de submissão e, em outros, ele intimida.
A compreensão acerca desse grupo fica mais fácil se levar em consideração que
não existe um ―ser alvo‖/―ser autor‖, mas sim um ―estar alvo‖/―estar autor‖ em uma
determinada relação. Além disso, a desigualdade de poder que possibilita a agressão do
bullying trata-se sempre de uma variável contextual na qual uma posição submissa se dá
em relação a outra dominadora. Assim, em uma dada relação e contexto, exemplo na
sua sala de aula, um sujeito pode ocupar uma posição submissa em relação a um aluno
autor de bullying, enquanto que no intervalo, com outros alunos mais novos, possa se
tornar autor da agressão. Uma explicação teórica para esse fenômeno pode ser vista a
partir da premissa de que não se pode voltar sua agressão para alguém mais forte, então
se procura um alvo mais ―frágil‖ para dirigi-la (Aronso, 2002).
Mais um grupo possível são aqueles sujeitos que presenciam o ato de bullying,
sendo denominadas testemunhas. A depender de como reajam ao observar o ato de
23
agressão, estes sujeitos podem ser classificados como sendo testemunhas auxiliares,
incentivadoras ou defensoras. As auxiliares são aquelas que colaboram ativamente com
a agressão; as incentivadoras, por sua vez, não cometem a agressão principal em si, mas
participam desta na medida em que estimulam e apóiam o autor. Já as defensoras, agem
em defesa da vítima, seja impedindo diretamente o bullying ou chamando algum adulto
para evitar que a intimidação continue (Lopes Neto, 2005).
Conquanto esse conceito já seja trazido na literatura especializada, importante
refletir sobre o papel de testemunhas auxiliares. Em consonância à descrição dada pelo
autor (participante ativo da agressão), esse sujeito deixaria de ser testemunha e passaria
a ser também um autor. A diferença poderia estar na iniciativa do comportamento,
contudo, a agressão seria a mesma. Desta forma, para a pesquisa realizada, a
classificação do sujeito como testemunha ativa não existiria, sendo esse adolescente
considerado como autor de bullying.
Quanto ao perfil das testemunhas, grande parte (80%) condena a ação de
bullying, desejando dos professores uma intervenção que sane com essa violência, já
que estes simpatizam com os alvos e reconhecem que não são culpados pelo ocorrido
(Lopes Neto, 2005). Porém, interessante lembrar que muitas vezes essas testemunhas se
unem ao grupo de agressores ou não defendem os alvos por medo de se tornarem a
próxima vítima, ou ainda para se manter pertencentes ao grupo e não serem excluídos
(Fante, 2005).
Tognetta e Vinha (2008) chamam a atenção para o fato de que
o que está em jogo é necessariamente a ausência de um sentimento de indignação que permita a esse espectador assumir um posicionamento contrário à ações injustas. Por sua vez, essa indignação é proveniente de um ‗estar sensível‘ ao sentimento do outro, de uma espécie de co-mover-se ao outro (p.13).
Embora a ausência de empatia possa ser um dos fatores que facilitam a
existência de bullying entre os jovens, tais como os estudos de violência, não há como
24
selecionar uma causa única que justifique sua ocorrência nas escolas. Desta forma, o
bullying frequentemente começa pela não aceitação de uma diferença, seja ela qual for.
Geralmente essa diferença envolve características como religião, raça, orientação
sexual, estatura física, peso, cor dos cabelos e deficiências (visuais, auditivas e/ou
vocais). Assim, pode ser uma diferença de ordem social, sexual e física; ou estar
relacionada a aspectos como força, coragem e habilidades desportivas e intelectuais
(Fante, 2005).
Contudo, muito mais do que uma característica do alvo, Olweus (1993, citado
por Antunes, 2010) chama atenção para o fato de essa intimidação estar mais
relacionada à necessidade do agressor de encontrar ―desvios‖, do que à existência
dessas diferenças em si, já que, a priori, não existe uma pessoa perfeita, havendo sempre
um ponto que foge dos padrões estabelecidos. Além do mais, tão importante quanto
conhecer as motivações para as agressões, é também pesquisar as características do alvo
que o colocam nessa posição de submissão e o mantém nesse papel frente aos autores,
bem como essa violência afeta o bem-estar dos envolvidos.
1.2.3. Consequências negativas do bullying
Como descrito no tópico anterior, a participação no bullying pode se dá de
diversas formas, no entanto, de modo geral observa-se consequências negativas para
todos os envolvidos. Deste modo, torna-se de suma importância compreender o bullying
não apenas como um fenômeno social, por ter relação direta com a violência e os
arranjos sociais que os potencializam, nem somente escolar, por ter sua maior
ocorrência na escola; mas também como um problema de saúde pública, já que interfere
diretamente no bem-estar dos envolvidos.
25
Como pode ser percebido na literatura supracitada, o bullying traz
comprometimento que vão desde a esfera biológica, como dores de cabeça e insônia, até
campos das relações interpessoais e psíquicos, como baixa satisfação com a vida e bem-
estar. Não obstante, mesmo tendo ciência dessa esfera mais ampla, para o presente
trabalho, está sendo realizada uma ênfase na relação entre o bullying e o bem-estar
psicológico (BEP).
Os estudos do bem-estar como o aspecto positivo da saúde, para além da
ausência de doenças, trouxeram para as discussões não apenas os aspectos individuais e
ambientais, mas também coletivos e sociais, bem como os transtornos psíquicos leves.
Os estudos, nessa perspectiva, têm como grande representante Goldberg que, em 1962,
chamou atenção para o fato de que muitas pessoas, mesmo aparentemente saudáveis,
podem estar sofrendo de pequenos transtornos psicológicos (Siqueira & Padovam,
2008).
Os estudos nessa temática vêm sendo desenvolvidos com base em duas
perspectivas: a eudaimônica e a hedonista. A primeira dessas perspectivas, também
denominada Bem Estar Psicológico (BEP), tem sua base nos estudos de Ryff, iniciados
na década de 80, e compreende esse construto a partir de seis dimensões, a saber: (1)
autoaceitação, considerada o aspecto central da saúde mental, já que atitudes positivas
sobre si são a base para um funcionamento psicológico positivo; (2) relacionamento
positivo com outras pessoas, descritos a partir da empatia e afeição; (3) a autonomia são
seus indicadores, o locus interno de avaliação e independência acerca de aprovações
externas; (4) domínio do ambiente, a partir da participação e do controle do seu meio;
(5) propósito de vida, com objetivos e significados; e (6) crescimento pessoal, visto
como a abertura frente às novas experiências (Albuquerque, Martins, & Neves, 2008).
26
Esse modelo pressupõe que déficits nessas dimensões colocam em risco a saúde
do sujeito, sendo que os níveis de alteração psíquica variam em cada indivíduo a
depender dos seus atributos pessoais. A justificativa para isto está no fato de esses
atributos funcionarem como moderadores do impacto que os fatores ambientais têm
sobre a saúde. Segundo definição utilizada por Silva (et al, 2007), o bem-estar pode ser
compreendido como o grau em que cada pessoa julga favoravelmente a sua qualidade
de vida como um todo.
Em pesquisa realizada com adolescentes a fim de verificar os fatores associados
ao seu bem-estar, foi constatado que as variáveis baixo nível sócio-econômico e baixa
escolaridade dos pais apresentam associação negativa com o bem-estar psicológico.
Entre as variáveis relacionadas aos comportamentos em saúde, essa relação negativa foi
percebida nos seguintes pontos: sedentarismo, tabagismo e ingestão ou abuso de
bebidas alcoólicas no último mês. Já a religião esteve associada positivamente aos
níveis de bem-estar (Silva et al, 2007).
Na busca pela verificação das consequências que o bullying pode ter na
qualidade de vida dos sujeitos, Matos e Gonçalves (2009) enfatizam o fato de a
satisfação com a vida estar associada negativamente e significativamente com todos os
tipos de bullyings. Já o consumo de álcool e tabaco está associado positivamente e
significativamente com todos os comportamentos de bullying. Nesse mesmo estudo, as
autoras concluíram que os comportamentos de consumo de álcool, porte de arma e as
percepções relativas à insegurança na escola e à baixa satisfação com a vida, estão
associados ao envolvimento com o bullying. Porém, quanto ao consumo de tabaco, este
esteve associado somente aos alvos de boatos e piadas sexuais (tipo de bullying mais
frequente), sendo analisados pelas pesquisadoras como um mecanismo de fuga adotado
pelas vítimas.
27
Não obstante haja essas diferenciações de papéis, o bullying traz consequências
negativas para todos os seus envolvidos, sejam elas imediatas ou tardias (Lopes Neto,
2005). Para aqueles sujeitos que vivenciam o bullying como alvo da agressão tem-se
como consequências, além do sofrimento, a queda no rendimento escolar e
comprometimento no desenvolvimento social e emocional; comportamentos agressivos
ou depressivos e sintomatologias de fundo psicossomático, como: enurese, taquicardia,
cefaleia, insônia, ansiedade, estresse, pensamento de vingança e suicídio, além do uso e
Como já foi descrito anteriormente, o presente trabalho busca uma compreensão
acerca da relação entre os eventos de bullying e preconceito no contexto escolar. Para
tanto, uma vez que já foi explicitado o seu conceito no capítulo anterior, aqui é
apresentada a compreensão que se tem acerca do preconceito. Com a amplitude desse
construto e dos dados presentes da literatura que chamam atenção para a presença da
homofobia nas escolas, realiza-se, ainda, um recorte acerca desse tipo de preconceito.
Por fim, este capítulo é concluído por uma revisão de literatura nacional em torno dos
trabalhos que aproximam o bullying e a homofobia.
2.1. Preconceito
Pensando os estudos acerca do preconceito em nível de Brasil, observa-se que
até a década de 90 os trabalhos brasileiros nessa temática eram inexistentes nos manuais
de Psicologia Social, parecendo ser os brasileiros indiferentes ao tema já abordado nos
EUA desde a década de 20. Ressalta-se que essa indiferença pode ser justificada, entre
outros motivos, pela crença de que o Brasil não era um país no qual houvesse
preconceito racial (Lima, 2011).
Em relação ao conceito, tem-se de modo simplificado, que o preconceito pode
ser compreendido como uma atitude hostil ou negativa em direção a um determinado
grupo, baseada em generalizações incompletas ou deformadas (Aronson, 2002). Essa
generalização, ou seja, a atribuição de características idênticas às pessoas que compõem
um mesmo grupo, recebe o nome de estereótipo.
37
Segundo revisão realizada por Techio (2011), além do processo de
generalização, os estereótipos podem ser conceituados como um processo humano
duradouro e de difícil mudança, dado o seu caráter rígido e consensual, mesmo sendo
controlado por influências sociais e individuais. Assim, essas estruturas cognitivas são
crenças, conhecimentos e expectativas socialmente compartilhadas acerca de um
determinado grupo, funcionando na significação das condutas dos seus membros, na
diferenciação e justificativa dos comportamentos entre os grupos.
Tal processamento cognitivo de generalização não necessariamente está
relacionado a um processo negativo, visto que pode ser benéfico na medida em que é
funcional e adaptativo, pois agiliza e simplifica uma leitura de mundo. Em outras
palavras, atua como espécie de um atalho mental, podendo ser correto, incorreto,
positivo ou negativo (Techio, 2011). É no estereótipo pejorativo e incorreto que se
encontra seu aspecto negativo, podendo influenciar na percepção que se tem da outra
pessoa e enviesando a forma como esta é enxergada, já que sempre se busca por pontos
que reforcem o rótulo empregado, influenciando os comportamentos dirigidos a essa
pessoa que, na maioria das vezes, é atravessada pelo desrespeito e violação dos seus
diretos.
Diante do exposto, importante salientar que os estereótipos positivos e negativos
fazem parte dos processos cognitivos humanos, porém, em pessoas preconceituosas, são
ativados os estereótipos negativos (Augoustinos & Walker, 1995 citado por Nunan,
2003). Essa generalização desempenha, a depender da situação, a função tanto de causa
quanto de consequência do preconceito, e ambas geram a discriminação.
Uma vez compreendido os conceitos acima, pode-se definir preconceito como
―uma atitude a nível individual entre grupos e seus membros que cria ou mantém
hierarquias nas relações entre os grupos‖ (Dovidio, Hewstone, Glick, & Esses, 2010,
38
p.7). Desta forma, o preconceito social pode ser compreendido como a articulação entre
estereótipos desfavoráveis associados a sentimentos de rejeição, resultado de
comportamentos discriminatórios.
Quando se fala em preconceito como produto de arranjos sociais e culturais,
significa falar que esse processo é transmitido a partir do convívio com outras pessoas,
no qual se é aprendido contra quem e como manifestar esse preconceito (Lima, 2011). A
partir do contato social pode-se aceitar ou rejeitar essa norma que orienta
comportamentos discriminatórios. Assim, uma vez assumida essa perspectiva histórica e
social do preconceito, tem-se que investigar e intervir não apenas nas normas, crenças e
atitudes preconceituosas, mas também nos arranjos sociais, econômicos e políticos que
produzem essas crenças e normas (Rex, 1992 citado por Lima, 2011). Vale ressaltar
ainda que essa ênfase nos aspectos históricos para o estudo do preconceito só passou a
fazer parte da Psicologia nas décadas de 60 e 70 com teorias sobre normas sociais e
identidade social.
Ao longo dessa história e das diversas formas de se entender o preconceito,
embora possa ter observado uma variedade nos tipos de preconceito e nos grupos alvos
das discriminações – por exemplo, racismo, homofobia, idadismo, sexismo e vários
outros –, de acordo com Lima (2011), essas diferentes formas possuem alguns pontos
comuns, são eles:
a) a ênfase e hierarquização da diferença entre os grupos; b) os sentimentos de antipatia contra alguém, simplesmente porque pertence a um grupo; c) a uniformização ou homogeneização dos membros do grupo, alvos de preconceito; d) uma resistência social e cognitiva à desconfirmação de crenças e expectativas negativas em relação a esse grupo, mesmo quando as evidências favoráveis ao grupo são fortes. Como também a essas formas de preconceito e construção de ‗modelos de ser‘, ou protótipos, que atuam como normas que definem quem é ‗adequado‘ e quem não é (Lima, 2011, p.458-459).
Tal como tido até o momento, os estudos de preconceito apresentam uma
história ainda recente no Brasil, sendo que os pontos comuns citados continuam
39
investigados no cotidiano das relações. Também como destacado na compreensão que
se tem de preconceito, observa-se que este é visto como um fenômeno social por possuir
uma história de construção, estando em constante movimento. Esse movimento é
processado, por exemplo, a partir das normas sociais e vão ter importante influência nas
expressões do preconceito. Dentre essas normas destaca-se a norma do igualitarismo
imposta à sociedade a partir da Segunda Guerra Mundial. Com base nesse novo
contexto social, o preconceito foi se modificando e os estudos atualmente centram suas
investigações para o que Lima e Vala (2004) vão denominar de ―novas expressões do
preconceito‖.
2.2. Novas expressões de preconceito
Nesse novo contexto de normas sociais do igualitarismo e leis antipreconceito e
antidiscriminação, as pessoas nutrem em si o preconceito, contudo, possuem um
autoconceito de não preconceituosas, já que aprenderam que esta não é bem vista
socialmente. Dessa forma, acaba-se por instaurar um conflito, pois ao mesmo tempo em
que as pessoas manifestam comportamentos discriminatórios, possuem uma
autoimagem que é incompatível com essa conduta. Como solução para essa tensão,
utiliza-se justificativas que expliquem seu comportamento de forma não preconceituosa,
evitando que sejam censuradas nem por si, nem pelos seus pares. Esse modelo é
denominado Modelo da Discriminação Justificada (Pereira, Vala, & Costa-Lopes,
2010).
Em relação às normas que orientam o acontecimento ou evitação do
comportamento discriminatório, destacam-se os valores do igualitarismo como estando
relacionados às normas do antipreconceito (Katz & Hass, 1988). Em oposição, os
40
valores da meritocracia (competitividade, hierarquia e mérito) são responsáveis por
ativar o preconceito e o comportamento de discriminação (McCoy & Major, 2007;
o preconceito flagrante frente a grupos não heterossexuais, outros estudos têm
42
demonstrado a existência de um preconceito mais sutil com esse grupo (Lacerda,
Pereira, & Camino, 2002; Falcão, 2004).
Com a percepção dessa diversidade nas pesquisas, Castillo, Rodriguez, Torre,
Peres e Martel (2003) propuseram a elaboração de uma escala de preconceito sutil e
manifesto contra homossexuais, elaborada a partir da adaptação da escala de racismo de
Pettigrew e Meertens (1995). Esses autores tinham como objetivo verificar se tal como
no racismo, a homofobia vinha assumindo um caráter mais sutil e privado de
preconceito. Vale destacar que a pesquisa demonstrou, a partir da análise fatorial e
consistência interna, que as atitudes negativas são semelhantes em ambos os processos
(racismo e homofobia), tendo iguais dimensões nos preconceitos.
Segundo Castillo (et al, 2003), o preconceito manifesto tem como fatores a
rejeição, a intimidade e a percepção de ameaça que esse grupo representa, enquanto a
homofobia sutil estaria fundamentada na diferença de valores entre os grupos e na
ausência de sentimentos positivos.
N o caso do preconceito contra homossexuais, é importante compreender que até
então naturalizada, a heteronormatividade – postura que coloca o modo de se relacionar
heterossexual como sendo o ―correto‖ em detrimento das relações entre pessoas do
mesmo sexo –, só vem a ser reconhecida como um processo social, ou seja, como algo
que é socialmente produzido e consequentemente passível de problematização, a partir
da ação de intelectuais ligados aos estudos da sexualidade.
Anterior a esse momento, a naturalização da heterossexualidade e as explicações
biologicistas e religiosas – que colocavam respectivamente a homossexualidade no
quadro das patologias e condenavam essa prática afirmando ser pecado – fez com que
até meados do século XX o preconceito sexual e as práticas discriminatórias, frente às
minorias sexuais que formam o grupo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis,
43
Transexuais e Transgêneros), fossem negligenciados pelos estudos científicos
(Cerqueira-Santos & DeSouza, 2011).
Em suma, essa compreensão acerca da homossexualidade pode ser dividida em
quatro concepções e momentos históricos, a saber: (1) a visão da homossexualidade
como pecado, embasada nas concepções religiosas; (2) a desta como doença – fruto do
próprio termo ―homossexualismo‖, criado por um médico em 1869 e apoiado por uma
legislação e pela Psicologia, sendo esse termo excluído pela Organização Mundial de
Saúde somente em 1985; (3) uma concepção neutra, impactada pelos movimentos
feministas e reivindicatórios da década de 60; e (4) visão da construção social, já que a
homossexualidade ao longo da história foi percebida de diversas formas (desde positiva,
como a transmissão de conhecimento entre os homens, até negativa, como responsáveis
por castigos, como catástrofes naturais) e só pode ser compreendida dentro de um
cenário social e cultural.
Desta forma, assim como ressaltado por esse quarto ponto comentado acima,
romper essa barreira do discurso religioso ou biologicista não foi suficiente para se
pensar a heteronormatividade e a homofobia. Faz-se necessário compreender essa
norma e esse preconceito para além de um processo cognitivo individual, e considerá-lo
como envolvendo os arranjos culturais que estão implicados nesse processo. Uma vez
que o Brasil, e dentro dele o Nordeste, é considerado como tendo uma cultura machista,
com papéis bem demarcados de masculinidade, os estudos de gênero e sexualidade
devem ser abordadas na ciência desse arranjo social.
De acordo com Louro (2010), ao pensar o grupo de homossexuais, esses podem
ser considerados uma minoria social, não por representar um quantitativo menor, mas
sim por ser um indicativo de como os grupos dominantes subordinam os que dele se
diferem. Esse conceito retoma em sua base a comparação entre os grupos, no qual há
44
uma identidade legítima (homem, branco, heterossexual e de classe média) e todo
aquele que foge a esse perfil é encarado como ―diferente‖. Vale destacar que essa
diferença faz menção a determinados aspectos culturais, no caso aqui comentado, às
marcas de gênero que tornam a nossa sociedade ―generificada‖.
No contexto dos estudos sobre a homossexualidade, é comumente observado o
termo homofobia. Este foi utilizado pela primeira vez em 1969 pelo psicólogo George
Weinberg, e embora essa nomenclatura tenha sua etiologia ligada a processos psíquicos
individuais como a ―fobia‖, a literatura tem mantido o termo e atribuído a este uma nova
formulação, assumindo agora os processos sociais e políticos (Nardi, 2010). Entende-se
por homofobia o medo, ódio e aversão a gays, lésbicas, bissexuais, travestis e
transexuais – de modo a orientar tratamentos discriminatórios – fazendo com que os
homossexuais tenham seus direitos desrespeitados simplesmente pelo fato de irem de
encontro aos protótipos de masculino e feminino (Borges, Passamani, Ohweiler, &
Bulsing, 2011). Nessa lógica, haveria a ordem posta do biológico (macho-fêmea), que
determina uma forma de sexualidade (heterossexual) e um comportamento social
(masculino/feminino) (Borrillo, 2009). Trata-se, portanto, de um dispositivo de
regulação da sexualidade que objetiva à manutenção da heteronormatividade (Teixeira-
Filho, Rondini, & Bessa, 2011).
Assim, com a homofobia como a guardiã das fronteiras hetero/homo e de gênero
masculino/feminino, a discriminação volta-se não apenas para aqueles que desenvolvem
um comportamento afetivo-sexual com pessoas do mesmo sexo. São alvos também
todos aqueles que ultrapassem a norma binária bem demarcada, como por exemplo,
travestis, transexuais, bissexuais, homens afeminados e mulheres masculinizadas, já que
estes se afastam do modelo de referência socialmente construído e imposto (Borrillo,
2009).
45
Tal compreensão situa esses estudos nas discussões acerca do gênero. Recente, o
conceito de gênero surge no feminismo anglo-saxão na segunda metade do século XX
como alternativa ao de papel social, já que este conceito mais antigo era visto como
limitações por ter um caráter funcionalista e uma herança de compreensão organicista
no modo de compreender as diferenças entre os sexos. Já o conceito de gênero traria
atenção para as relações de poder e as assimetrias nas relações sociais marcadas pelo
sexismo (Toneli & Araújo, 2009). Desta forma, esse conceito vem desnaturalizar,
desconstruir o inerente, atribuindo às construções sócio-históricas, o que até então tinha
uma conotação natural/ biológica, logo, se é algo natural, aquele que foge à regra é
patológico (Galinkin & Idmael, 2011).
Os estudos de gênero, até então focados no local social da mulher e nas relações
desiguais de poder entre os gêneros femininos e masculinos, somente no final da década
de 80, início de 90, passou a expandir seus estudos para temas como: masculinidade,
mudanças que vinham ocorrendo nas relações sociais entre os sexos, bem como outras
identidades de gênero, como lésbicas, gays, transexuais, transgêneros e relações afetivas
e sexuais para além do modelo heterossexual (Galinkin, Santos, & Zauli-Fellows,
2010).
Na sociedade ocidental, a construção se deu em torno do patriarcalismo, sistema
no qual os papéis masculinos (esposo e pai) submetem a mulher à sua autoridade. Nesse
contexto, incumbe à mulher o papel social do privado, passivo, sensível; enquanto que
ao homem competem as atividades públicas, fortes e ativas. No entanto, embora durante
muito tempo esse modelo tenha sido explicativo dos sistemas de relações entre os
gêneros, atualmente se fala de uma valorização das características masculinas. Essa
valorização poderia estar justificando o porquê dos homens que rompem esses papéis
definidos de gênero estarem mais vulneráveis a se tornar alvos de preconceito do que as
46
mulheres que incorporam as características ditas masculinas. Seria como se estas
tivessem progredido, enquanto que os homens estariam passando para um nível inferior
(Strey, 2009).
Essa diferenciação dos gêneros aparece também nas relações entre pessoas do
mesmo sexo, por exemplo, nas relações entre dois homens, aquele que possui
características afeminadas está em uma relação desigual de poder com o masculinizado,
sendo assim as características femininas desvalorizadas. Além disso, essa relação
encontra-se não apenas nas relações de casais, mas entre os grupos de homossexuais
bichas (afeminados/passivas) e bofes (másculos/ativos), sendo os primeiros mais
estigmatizados no endogrupo (Rios, 2009). Nessa relação estreita, Madureira (2010)
chama atenção para o fato de o sexismo funcionar como um obstáculo para a superação
da homofobia, se retroalimentando nas práticas cotidianas.
Pelo fato de esses limites impostos para homens e mulheres extrapolarem os
comportamentos afetivos e sexuais, e controlarem os comportamentos sociais, uma
segunda distinção do termo homofobia é feita por Borrillo (2009), a saber: homofobia
geral e homofobia específica. De acordo com este autor, a homofobia geral seria uma
manifestação de preconceito contra todos aqueles que fujam aos padrões de masculino e
feminino; já a homofobia específica agiria contra grupos de gays e lésbicas.
Como o termo homofobia e homossexual comumente se vinculam à
homossexualidade masculina, alguns autores propuseram a utilização dos termos
lesbofobia e transfobia para os grupos de mulheres homossexuais e transexuais,
respectivamente (Asinelli-Luz & Cunha, 2011). Contudo, essas mudanças nos termos
não são uma unanimidade na literatura, e em virtude de estarem mais coesos com as
referências e produções científicas, no presente trabalho, os conceitos de homossexual e
homofobia são utilizados para ambos os sexos.
47
Nessa mesma relação de legitimação/negação das diferentes formas de
sexualidade, o modelo hegemônico de masculinidade impõe parâmetros do mesmo
modo para os heterossexuais, levando os mesmos a afirmarem sua sexualidade e
virilidade a partir de comportamentos agressivos. Assim, para construção de uma
identidade masculina é demandado a recusa aos papéis sociais comumente relacionados
ao feminino, como a delicadeza ou emoção. Nega esse estereótipo e assume-se como
mecanismo psicológico o insulto àquele que foge à regra e viola o perfil do ser
masculino. As humilhações sexistas são um desses mecanismos (Junqueira, 2009a).
Mesmo que tenha sido utilizado como exemplo o ideal de masculinidade, esse
preconceito não se limita ao universo masculino, já que, em oposição a esse ideal de
homem, também é criado um modelo de mulher sentimental e passiva. Este, por sua
vez, quando não é correspondido se torna alvo de discriminação. Muito embora, dado os
aspectos culturais de uma sociedade machista, é comum se observar na literatura a
ênfase na homossexualidade masculina.
Diante de todo o exposto, o estudo em evidência compartilha da compreensão de
que a homofobia poderia igualmente ser estendida para além de um comportamento
individual de uma postura anti-homossexual, passando a ser lido a partir de diversos
outros contextos, como no campo cultural, educacional, jurídico e político, entre outros.
Ou seja, muito mais que uma agressão física, a homofobia pode ser vista como um fator
de restrição para esses cidadãos que têm violados seus direitos mais básicos – o direito à
vida, saúde e educação (Junqueira, 2009b).
Entre esses direitos, destaca-se o direito à educação que, embora assuma uma
diversidade no Plano Nacional de Educação, na prática ainda é feita para alunos
heterossexuais. Para diante do livro didático ou das normas escolares, essa violação se
dá nas relações interpessoais e compromete diretamente esse direito dos jovens LGBTs
48
(lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) por terem estreita relação com a
evasão escolar ou baixo desempenho acadêmico (Levandoski, 2009). Uma das
manifestações possíveis dessa violação/violência pode ser observada na relação entre
bullying e preconceito ou, mais especificamente, no bullying homofóbico, no qual
alunos que fogem às normas estipuladas para homens e mulheres se tornam alvos de
agressões e exclusões repetitivas entre seus pares.
2.4. Preconceito e bullying
Em busca de uma aproximação entre os conceitos de bullying e preconceito,
compreende-se que ambas são dotadas de um sentido cultural e social, apesar de serem
dirigidos para uma minoria (Antunes, 2010).
Além das características físicas do sujeito, seu grupo de pertencimento, local de
origem e condições de vida podem também ser utilizados como pretexto para o bullying
que, diferente de outras discriminações, manifesta-se de modo peculiar, seguindo os
critérios já definidos no capítulo anterior. Um exemplo disso pode ser percebido no
bullying sofrido por crianças de uma etnia diferente, e que em virtude disso são
excluídas no ambiente escolar; nesse caso, o preconceito é a causa do bullying. Outra
forma de preconceito que é manifestada comportamentalmente em bullying é a
homofobia. Contudo, conquanto haja algumas semelhanças nesses conceitos, estes
raramente são estudados juntos, mesmo que essa relação já tenha sido apontada como
viável por outros autores (Espelage & Swearer, 2008).
Concordando com essa perspectiva, Antunes (2010) chama atenção para a
ausência de motivação aparente e a intencionalidade de causar danos ao alvo,
encontrados no conceito do bullying, possibilitando a aproximação entre esta prática e o
49
preconceito. Outra aproximação entre esses construtos são os fatores sociais que
tornam alguns grupos-alvos mais vulneráveis (Antunes & Zuin, 2008), sendo o bullying,
em alguma medida, uma das manifestações comportamentais do preconceito, se
aproximando do que se chama de discriminação. Considerando-se que ―a forma como o
outro é percebido define os contornos das relações interpessoais‖ (Salles & Silva, 2008,
p. 150) é fácil compreender como o preconceito interfere na percepção e,
consequentemente, no comportamento, gerando a violência em suas diferentes faces.
Percebe-se que ambos os fenômenos, ou pelo menos, quando o preconceito é
manifesto, parecem remeter à mesma base: a intolerância e à alteridade. Assim, essa
intolerância quanto às diferenças, que compõem o preconceito, seriam a base para a
agressividade irracional, que é o bullying. Essa cultura da intolerância é reforçada pela
primazia do individualismo, da corrida desenfreada pelo bem-estar individual e do não
reconhecimento do outro (Oliveira & Rosa, 2010). Logo, a diferença passa a ser
sinônimo de inferioridade e logo é rejeitada. As regras de convivência passam a ser
modificadas em virtude da conveniência momentânea, não havendo limite para o prazer.
Nesse cenário, o homem toma a si mesmo como modelo e estipula normas e pré-
concepções que os demais devem seguir, fixando uma imagem social do outro.
Contudo, quando esse outro não corresponde a essas expectativas, este se torna um
problema social que ―assusta e incomoda‖ e isso é utilizado como justificativa para atos
de agressão e desrespeito (Salles & Silva, 2008).
Mesmo tendo esse ponto em comum, ambos se diferenciam na medida em que o
preconceito vem passando para uma esfera mais privada e implícita. Essa mesma
camuflagem parece não ocorrer com o bullying, o qual ainda é reforçado pela presença
de um grupo de testemunhas que reforçam a sua ocorrência e motivam a ação do autor
que se sente superior nessa relação.
50
Nesse contexto de intolerância e da diferença como desvio da norma, o
preconceito é visto como a resistência às heterogeneidades grupais que, na busca pela
manutenção da norma, reafirmam uma opinião formada. Vale ressaltar que, por norma,
compreende-se o código comum na busca pela garantia da sobrevivência do grupo e os
valores morais dos mesmos. Aliás, essa norma não é algo imutável, ela está sujeita as
mudanças no tempo e contexto, não sendo algo universal, mas sim contextualizado
(França, 1998).
No entanto, embora haja semelhanças, as diferenças entre preconceito e bullying
devem ser destacadas. Uma delas é o caráter mais amplo que aquele assume nas
relações intergrupais, enquanto que este se dá mais na esfera interpessoal, estando mais
presente em um determinado público (crianças e adolescentes); o outro representa uma
questão mais ampla presente nas mais variadas fases do desenvolvimento humano,
envolvendo pessoas de diferentes gêneros, raças, idades, naturalidade e condição sócio-
econômica. O bullying está mais voltado para uma esfera comportamental, enquanto
que o preconceito envolve aspectos cognitivos, afetivos e comportamentais. Por
conseguinte, a manifestação do preconceito não se limita à esfera do bullying, ocorrendo
de diversas formas, mas este pode ter o preconceito como sua motivação.
Assim, mesmo tendo uma base comum (colocando a alteridade como
desigualdade), os conceitos aqui comentados não podem ser vistos como sinônimos, já
que o preconceito exige uma leitura mais ampla das relações intergrupais. Além disso,
destaca-se que a especificação de um conceito (bullying) contribui para trazer a tona
novas discussões, que até então poderiam estar sendo negligenciadas. Porém, somente
seu conceito descritivo é pouco para compreender essa realidade, fazendo necessária a
comunicação com outros construtos, como estereótipos, discriminação e normas sociais,
entre outros.
51
Desta forma, definido como manifestação comportamental de um preconceito, o
bullying pode ser tomado como uma forma de discriminação. Essa discriminação, por
sua vez, se diferencia das demais por ter uma série de critérios para sua classificação
como tal, sendo um evento dentro das tantas possibilidades de discriminação.
2.5 Discriminação e bullying
Uma vez observada essa aproximação entre o bullying e os comportamentos de
discriminação, cabe aqui explicitar como esse conceito está sendo compreendido. Por
discriminação entende-se um comportamento individual que cria, mantém ou reforça
hierarquias entre alguns grupos ou membros destes (Dovidio, Hewstone, Glick, &
Esses, 2010), sendo qualquer tratamento diferenciado, sutis ou não, de hostilidade,
desprezo e agressão. Seguindo essa mesma opinião, Kruger (2004) o conceitua como
um tratamento injusto, quer dizer, uma forma de relacionamento, avaliação e atendimento comparativamente desigual e desfavorável, proporcionado a uma coletividade humana ou individualmente a pessoas que a integram, precisamente porque são alvo de preconceitos sociais. Esse tratamento injusto pode assumir formatos diversos, dependendo da situação (Kruger, 2004, p.38).
Portanto, assume-se que a discriminação pode ser manifestada de diversas
maneiras na sociedade. Seguindo esse conceito, pode-se pensar uma aproximação entre
este fenômeno e o bullying, uma vez que quando este é motivado por preconceitos (por
exemplo, racismo, sexismo e homofobia), pode ser entendido como um componente
dentro dessa esfera maior. Dito de outro modo, seguindo os critérios de bullying como
relação entre pares, periodicidade e relação desigual de poder, associada ao
processamento cognitivo e afetivo do preconceito homofóbico, este pode ser entendido
52
como um tipo de discriminação, que na literatura está sendo especificado através do
termo ―bullying homofóbico‖.
Tal como é proposto atualmente para a problemática em estudo, já em 1951,
com a Lei Afonso Arinos (n° 1.390/51), a questão do preconceito e da discriminação
deixa o anonimato e passa a ser alvo de punição legal. No entanto, nesse momento o
foco estava ainda associado ao preconceito de raça. Somente com a Constituição de
1988 essa visão é ampliada a qualquer forma de discriminação e passa a ser considerada
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Destarte, o aporte
jurídico tenta, a partir da punição, erradicar a discriminação e tentar garantir o bom
convívio entre os cidadãos, bem como instaurar a igualdade de direitos para todos os
sujeitos (Bandeira & Batista, 2002).
Analisando em um cunho jurídico e organizacional, Bandeira e Batista (2002)
vão sinalizar que essas leis não foram suficientes para reverter o cenário de
discriminação no Brasil em virtudes de três pontos principais: (1) o desconhecimento
dos direitos por parte da população; (2) a presença dos valores que fundam o
preconceito e a discriminação nos próprios agentes responsáveis pelo fazer jurídico no
país; e (3) o excesso de formalismo e burocracia no campo jurídico o qual cria uma
barreira de acesso para a população demandante.
Contudo, embora esses artifícios legais possam contribuir para a efetivação da
norma antidiscriminação, estas não são suficientes para mudar o preconceito, mas sim
para alterar a forma como este se manifesta: passando de uma esfera pública para a
privada, de forma manifesta para sutil. Isso porque ―a atitude do preconceito é a
realização de leis sociais com base em valores morais, que nem sempre são ou nem
sempre representam a lei jurídica vigente na sociedade‖ (Itani, 1998, p.124).
53
Desta forma, uma vez que as normas, leis e preconceitos são fenômenos sociais,
ao se pensar o preconceito, a discriminação e o bullying, há de se considerar o contexto
no qual este ocorre: o ambiente escolar. Porém, deve-se considerar que a escola está
inserida em uma cultura mais ampla, e como tal, não está imune a ser um local de
produção e reprodução de preconceitos. Assim, torna-se um desafio para a educação não
apenas a alfabetização ou ensino do conteúdo programático com base nas ciências, mas
também o ensino da convivência pacifica entre as pessoas e o respeito às diferenças.
São diversas as formas manifestadas de preconceito, a saber: religioso, regional,
racial e sexual, entre outros, destacando-se aqui o preconceito sexual contra pessoas que
possuem relações homoafetivas ou que são percebidas como tais, visto que somente
essa percepção é suficiente para se tornar alvo desse preconceito e discriminação
denominada homofobia (Borrillo, 2009). Nesse cenário de preconceito ainda pouco
explorado, resta então ao sujeito que possui relações homoafetivas, três saídas: o
silêncio, a dissimulação ou a segregação, pois a norma heterossexual trouxe consigo
uma rejeição declarada (Louro, 2007). No ambiente escolar esse preconceito e
discriminação pode ganhar formas em diversas violências, entre elas o bullying,
tornando possível o diálogo entre essas duas formas de relações grupais e interpessoais.
2.6. Preconceito e discriminação no contexto escolar: A questão da homofobia
De acordo com Vianna e Ridenti (1998), a escola é um ambiente no qual
facilmente são observadas as diferenças entre os gêneros, terminando em culminar no
preconceito e na subordinação entre os mesmos. Essas diferenças podem ser
observadas, por exemplo, nas propostas de atividades diferentes para meninos e
54
meninas, o estereótipo de que o professor de educação infantil deve ser uma mulher e
esportes diferenciados entre os sexos.
Não obstante, mesmo sendo uma temática facilmente observada, esta
problemática durante muito tempo esteve invisível nos estudos científicos, estando à
diversidade étnica, sexual, religiosa e os preconceitos, negados no ambiente da escola
ou camuflados pela diferença entre as classes, já assumidas nesse contexto (Vianna &
Ridenti, 1998).
Itani (1998) faz uma reflexão no sentido de que é comum (o que não significa
aceitável) que os preconceitos e as atitudes de diferenças façam parte do cotidiano
escolar, na medida em que se leva para dentro do processo educativo aquilo que a
sociedade é. Além disso, esse encontro entre as pessoas também é capaz de construir
esses processos e não apenas reproduzi-los. Em sala de aula o professor não deve negar
a existência da diferença, ela existe e como tal necessita ser vista. Porém, esse
reconhecimento do diferente não implica uma desvalorização ou indiferença do mesmo
(Itani, 1998). Ou seja, não se trata de negar as diferenças, mas sim de uma tentativa de
mudança no quadro no qual ―a diferença é utilizada como expressão de vitimização para
favorecer interesses individuais‖ (Vianna & Ridenti, 1998, p.101). Esse fundamento se
torna ainda mais relevante pela consideração de que o preconceito é a mola central para
o processo de discriminação e da exclusão, por conseguinte da violência.
Significativo lembrar que para modificar esse quadro de preconceito é de suma
importância promover atividades que estimulem a cooperação entre os diferentes
grupos, para que estes possam ser percebidos como companheiros e não como rivais.
Nesse contato a mudança de comportamento estaria alterando as atitudes e os
preconceitos (Allport, 1979). Este meio é avaliado como mais adequado para promover
mudanças se comparados à mera veiculação de informações corretas que se
55
contraponham ao estereótipo, já que esta estratégia já foi avaliada como não sendo
eficaz, uma vez que as informações que se contradizem as crenças são frequentemente
rejeitadas, ignoradas ou distorcidas (Nunan, 2003).
A prática da heteronormatividade e do preconceito contra homossexuais podem
ser observados nos diversos espaços coletivos da sociedade, e segundo Louro (2007), na
escola não acontece o contrário. Assim, os sujeitos que fogem à norma
sexo/gênero/sexualidade e destoem da maioria social são colocados a margem. No
âmbito escolar essa exclusão é refletida na elaboração do projeto curricular, no qual a
atenção é voltada para aqueles que se encaixam no estereótipo concebido como
―normal‖.
Ainda sobre esse contexto, Junqueira (2009a) destaca ser esse um ambiente que
configura-se um lugar de opressão, discriminação e preconceitos, no qual e em torno do qual existe um preocupante quadro de violência a que estão submetidos milhões de jovens e adultos LGBT – muitos/as dos/as quais vivem, de maneiras distintas, situações delicadas e vulneradoras de internalização da homofobia, negação, autoculpabilização, auto-aversão. E isso se faz com a participação ou a omissão da família, da comunidade escolar, da sociedade e do Estado (p.15).
Na escola, assim como em outros contextos, a homossexualidade é encarada
como ―contagiosa‖, o que promove a exclusão dessas pessoas, tendo o conhecimento de
que a aproximação pode ser compreendida como uma identificação a tal identidade, o
que vem a reforçar a marginalização desse grupo (Louro, 2007). Outro fator que
contribui para tal fenômeno é a heterossexualidade presumida, o que faz com que os
professores conduzam suas aulas como se naquele contexto todos fossem iguais e a
homossexualidade não fizesse parte dessa realidade (Junqueira, 2009a).
O estudo da homofobia no ambiente escolar se torna relevante na medida em que
a sexualidade ainda é encarada como um tema tabu nas escolas e com o público
adolescente. A justificativa utilizada para não explanar a temática está centrada na
representação de que esse conteúdo diz respeito à intimidade do aluno, logo, deve ser
56
vivenciada no espaço privado da família, não cabendo a escola tal função. Além disso,
outra representação presente é a de que a abordagem do tema com jovens irá incentivar
e instigar tal prática, sendo este, portanto, vedado (Dinis, 2011).
Um desses reflexos sociais acerca dessa questão é a concepção dos professores
de que a escola não deve discutir a temática, ficando responsável somente por questões
universais, isto é, a norma heterossexual. Logo, exclui-se a homossexualidade do
currículo, mesmo das aulas de Educação Sexual, restringindo essas aulas a abordagens
biológicas da sexualidade (Borges, Passamani, Ohweiler, & Bulsing, 2011). Essa visão
também limita a função da escola na formação de cidadania e respeito aos direitos
humanos, se isentando da sua responsabilidade no combate aos preconceitos e
discriminações (Dinis, 2011).
Voltando ao conceito de homofobia geral, no contexto escolar, esse processo faz
com que crianças e jovens sejam rotuladas como homossexuais mesmo sem terem
nenhuma inclinação para o homoerotismo, simplesmente pelo fato de o menino ser
delicado, gostar de dançar e a menina por jogar futebol, preferir azul e gostar de filmes
de ação, entre outros. Essa visão, associada à ausência de uma postura institucional que
busque romper essa lógica, torna comum nas escolas as expressões homofóbicas e o
reconhecimento dessa prática como ―brincadeira normal de adolescentes‖ pelos
professores e, em consequência, são ignoradas (Borges, Passamani, Ohweiler, &
Bulsing, 2011).
Essa cultura centrada na vivência hetero da sexualidade produz nos alunos
homossexuais a necessidade de agregar qualidades na busca pela aceitação. Por
exemplo, ter as melhores notas, ser o melhor amigo das meninas, esportista ou contador
de piadas. Em alguns casos essa cobrança deixa de ser externa e é internalizada, estando
presente mesmo na ausência daquelas pessoas que inicialmente produziram essa
57
necessidade, acompanhando o sujeito na sua história de vida e em diversos contextos
(Junqueira, 2009a). Esse nível elevado de cobrança, a não aceitação e limitada inserção
social podem ser consideradas algumas das razões para o alto índice de suicídio entre
jovens homossexuais em outros países (Junqueira, 2009a). Vale ressaltar a inexistência
de dados dessa natureza para o contexto brasileiro.
No cenário mundial, o Brasil se destaca como o país que mais matam
homossexuais. Essa situação o caracteriza como um país homofóbico, já que designa
este outro como inferior na medida em que desrespeita a dignidade humana. Nesse
cenário, cabe refletir sobre a repercussão dessa cultura no âmbito escolar e de que forma
essa cultura heterossexista está mediando as relações que estão presentes desde o
ambiente escolar básico, passando por instituições de ensino superior e ganhando forma
de homicídios no país (Borges & Meyer, 2008).
De tal modo, a escola e os demais contextos educativos tornam-se um espaço
privilegiado de discussão do tema e propostas para diminuir a vulnerabilidade dessa
minoria social na busca pela efetivação dos seus direitos já garantidos pela legislação
brasileira na Constituição Federal e Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Essa
influência da escola na mudança de paradigmas preconceituosos é ainda mais relevante
se for considerada a sua participação nas histórias pessoais que lá são vivenciadas e que
afetam diretamente na construção das identidades sociais, já que este é um dos
primeiros locais de socialização de um sujeito. E que a depender de como essa
socialização seja vivenciada, pode contribuir de forma positiva ou não, podendo estar
associada a práticas que violem o direito de determinados grupos, por exemplo, o grupo
LGBT.
Destarte, lidar com as diferenças e buscar o convívio saudável se tornou um dos
grandes desafios para a escola, assim:
58
A intolerância, a ausência de parâmetros que orientem a convivência pacífica e a falta de habilidade para resolver os conflitos são algumas das principais dificuldades detectadas no ambiente escolar. Atualmente, a matéria mais difícil da escola não é a matemática ou biologia; a convivência, para muitos alunos e de todas as séries, talvez seja a matéria mais difícil de ser aprendida (Fante, 2005, p. 91). Observa-se, além disso, o despreparo da escola em lidar com o tema, já que esta
aponta algumas dificuldades para justificar seu não enfrentamento à homofobia, a saber:
a negação desse fenômeno no âmbito escolar; a hierarquização – nas quais outras
questões sociais são colocadas como prioridades e o preconceito sexual é posto em
segundo plano –; o apelo ao senso de oportunidade, em que a convivência sem
preconceitos e os direitos dos homossexuais são colocados a cargo do tempo, sendo
meta para as próximas gerações; e por fim, a antecipação fatalista, representada pela
falta de esperança frente à mudança de uma sociedade homofóbica em uma sociedade
verdadeiramente igualitária (Junqueira, 2009b).
Deste modo, é válida a discussão de que se apóie na escola um papel mais ativo
contra tais violências, seja ela motivada pela homofobia ou, em um nível mais amplo,
de desrespeito à alteridade, buscando romper com os discursos, dentro dessa instituição,
a fim de colaborar para a manutenção dessas desigualdades e fornecer subsídios para
que essas dificuldades sejam sanadas.
Segundo Junqueira (2009b) seria missão da educação,
tornar a escola um ambiente efetivamente educativo para todas as pessoas, numa perspectiva crítica, democrática, transformadora, libertária e emancipatória, requer, entre outras coisas, que nela a diversidade seja considerada, além de um direito, um fator de estímulo e de enriquecimento. (...) O respeito à diversidade é elemento imprescindível para se garantir a formação para cidadania e a qualidade do processo de ensino-aprendizagem – convém repetir, em favor de cada pessoa (p.404).
Por fim, pode-se refletir acerca do papel da escola e do fato do bullying pautado
pela homofobia ir de encontro com o que propôs o Ministério da Saúde a partir do
programa ―Brasil sem homofobia‖ (Conselho Nacional de Combate à Discriminação,
59
2004) que, dentre outros pontos, ressalta-se as seguintes recomendações: Garantir
segurança a todos, para que as minorias sexuais vivam em uma sociedade livre de
violência; Promover paz, justiça e valorização da diversidade humana em todas as suas
formas, inclusive dentro das famílias de origem; Educar as pessoas a fim de reduzir o
estigma público baseado na orientação sexual e educar os jovens para que eles cresçam
sem preconceito sexual.
2.7. Produções científicas sobre homofobia e bullying
Essa dimensão cultural tão comentada anteriormente, além de tornar mais
provável, pode indicar também o tipo mais frequente de bullying. Assim, tal como
observado nos estudos já citados, uma vez que se vive em uma cultura heterossexista, o
bullying motivado por preconceito contra homossexuais é normalmente observado
(Abramovay, Cunha, & Calaf, 2010).
Em pesquisa realizada por Toneli (2006), embora os jovens afirmassem que caso
descubram que um amigo é gay, estes não se afastariam dele, apesar de fazerem piadas,
se preocupam com o que os outros vão falar e necessitam de um acordo explícito no
qual o amigo homossexual afirme que nunca ―dará em cima dele‖, definindo muito bem
o limite dessa amizade. Em relação aos direitos dos homossexuais, nos grupos focais
ficou bastante demarcado que estes merecem os mesmos direitos que os heterossexuais,
porém, essa não foi uma visão unânime, sendo rejeitada pelos participantes do outro
grupo focal.
Esses dados trazem uma discussão qualitativa de como ainda hoje a
homossexualidade é colocada à margem do tema sexualidade, fazendo com que os
sujeitos que assim são percebidos se tornem alvos de limitações nas suas relações
60
interpessoais. Além disso, os mesmos ainda se tornam fonte de agressões que, entre os
jovens, recebe o nome de ―piadas e brincadeiras‖, mas que quando imposta a partir de
uma relação desigual de poder e uma periodicidade, torna-se a motivação para o
bullying, ocasionando todos os prejuízos e sofrimento que este pode acarretar.
Nessa temática de juventude dentro do ambiente escolar, preconceito sexual e
violência, Abramovay, Castro e Silva (2004) observaram que entre seis formas de
violência (atirar em alguém, estuprar, usar drogas, roubar, andar armado e bater em
homossexuais), bater em uma pessoa homossexual seria, para as meninas, o terceiro tipo
de violência mais grave, enquanto que, para os meninos, essa seria a sexta (última)
opção. Esse dado também parece dialogar com o fato de os meninos, além de mais
preconceituosos, no que tange ao preconceito sexual, têm aparecido nas pesquisas como
sendo os mais envolvidos no bullying (Fante, 2005; Bandeira, 2009), o que reforça a
hipótese da relação entre homofobia e bullying. Chegando a haver relatos de agressão
contra homossexuais, de desistência de alunos porque eram vítimas de agressões em
virtude de serem homossexuais, bem como da indiferença da escola frente essa situação,
ainda assim, há professores que relatam: ―mas não é nada tão grave não‖ (Abramovay,
Castro, & Silva, 2004, p.288).
O consentimento dessas práticas excludentes e legitimadas pelos atores
escolares, como professores e demais funcionários, estruturam uma dinâmica
institucional que ainda é pouco conhecida, se fazendo necessário mais pesquisas na área
que permitam conhecer como a homofobia se manifesta no âmbito escolar e quais as
causas e consequências dessa prática. Somente de posse de tal conhecimento poderão
ser pensadas intervenções efetivas. Desta forma, o mapeamento da violência escolar, em
especial frente a grupos minoritários, torna-se de suma importância para a
implementação de políticas educacionais verdadeiramente inclusivas.
61
Pesquisa realizada em trezes capitais brasileiras e no Distrito Federal, no Ensino
Fundamental e Médio da Rede Pública de ensino, adverte que, de modo geral, os
professores afirmam não saber como abordar o tema da homossexualidade em sala de
aula. A porcentagem desse tipo de resposta variou entre 30,5% em Belém a 47,9% em
Vitória. Ainda entre esse público, variou entre 12% e 20%, a depender do estado,
aqueles que acreditam ser a homossexualidade uma doença. Esses preconceitos nos
adultos acabam por se refletir em condutas passivas frente a cenas homofóbicas, ainda
que essa passividade seja sinalizada pelas vítimas como mais traumatizante do que a
própria passagem de discriminação diretamente. Os dados demonstram a urgente
necessidade de diálogo com essa classe, uma vez que estes estão diretamente ligados à
formação de opinião no ambiente escolar (Abramovay, Castro, & Silva, 2004). Dada
essa realidade, Louro (2007) afirma ser a escola o lugar do desconhecimento e da
ignorância em relação à sexualidade.
A pesquisa realizada com os alunos demonstrou que 33,5% dos meninos de
Belém, entre 40%-42% no Rio de Janeiro, em Recife, São Paulo, Goiânia, Porto Alegre
e Fortaleza e mais de 44% em Maceió e Vitória, assumem não gostar de ter colegas
homossexuais na mesma sala de aula. Esse índice de rejeição em compartilhar o
ambiente escolar com sujeitos homossexuais é ainda superior quando observado entre
os pais desses alunos. No Distrito Federal foi encontrado o menor valor (17,4%). Os
maiores valores foram observados nas capitais nordestinas Fortaleza e Recife, sendo
59% e 60%, respectivamente (Abramovay, Castro, & Silva, 2004).
Embora esses estudos supracitados não sejam específicos do bullying, mas sim
apresentarem um quadro de violência escolar, é possível cogitar a relação entre
homofobia e bullying. Nessa relação, uma vez que a cultura é um fator que interfere na
incidência e nas formas como esse fenômeno pode se manifestar, o mesmo difere a
62
depender do país, da região ou ainda da escola no qual o sujeito está inserido,
sinalizando a necessidade de estudos locais que possibilitem um diagnóstico e
posteriormente uma intervenção.
Em pesquisa semelhante realizada com pais, funcionários e estudantes,
observou-se que 35,6% dos entrevistados já haviam presenciado um episódio de
humilhação e 18,7% de agressão física dentro do ambiente escolar em virtude do aluno
ser homossexual. Porém, quando perguntado só entre estudantes, essa porcentagem foi
para 63,6%, o que indica que a discriminação ocorre em geral na ausência de adultos.
Nesse mesmo estudo, foi obtido o resultado de que 4% dos estudantes já haviam sofrido
discriminação de cunho homofóbico. O que chama atenção nesse dado é o fato de essa
porcentagem vim aumentando no período de 2004 a 2008, passando de 1,6% para 4%
(Asinelli-Luz & Cunha, 2011).
O estudo acerca da relação entre bullying e homofobia também são sugeridos
por outras pesquisas, por exemplo, no achado de que os agressores de bullying também
possuem mais atitudes negativas frente a jovens LGBT e uma maior utilização de
termos homofóbicos (Poteat, 2008). 88% dos estudantes falaram que as expressões
homofóbicas são utilizadas na frente de professores e funcionários e estes não fazem
nada (Harris Interactive & the gay, lesbian, and straight education network [GLSEN],
2005). Isso faz com que os alunos LGBTS não se sintam seguros na escola (22% x 7%
dos heterossexuais).
Como o bullying verbal é o mais comum entre os jovens, Roselli-Cruz (2011)
chama atenção para o fato de que 85% da agressividade dos palavrões utilizados na
escola se referem à sexualidade do ofendido e/ou de sua família, em especial à mãe, e à
homossexualidade. Diante desse resultado, a autora propõe que trabalhar o palavrão na
63
escola pode ser uma estratégia para o ensino da educação sexual, diminuição da
agressividade e da homofobia.
Com o objetivo de demonstrar o panorama de pesquisas realizadas e publicadas
no âmbito nacional, tem-se que, embora possam ser encontrados na literatura diversos
textos acerca da homofobia na escola e sobre violência escolar, uma busca realizada nos
bancos de dados scielo, Google acadêmico e periódicos da CAPES, realizada em julho
de 2012, observou-se que quando utilizadas as palavras ―bullying e homofobia‖ ou
―bullying homofóbico‖, não se tem uma produção tão vasta. Na literatura nacional
foram encontrados quatro trabalhos, sendo 100% desses em formato de resumo
expandido em anais de eventos. Ressalta-se ainda uma distinção nas datas de
publicação, sendo o tema já abordado na literatura internacional desde 1999 (Douglas,
Warwick, Whitty, Aggleton, & Kemp, 1999), enquanto que no Brasil as publicações
começaram somente onze anos depois, em 2010 (Peçanha & Devide, 2010).
Como pôde ser analisado nessa revisão, ainda são poucos e recentes os estudos
empíricos que abordam essas duas problemáticas juntas em nível nacional, já que os
trabalhos datam a partir do ano 2010 e nenhum deles teve como fonte o artigo científico
publicado em periódicos. Esses trabalhos tratam, principalmente, sobre a forma de
discriminação vivenciada na escola (Silva, 2011), relação do bullying, homofobia e
comportamento docente (França & Vieira, 2012), e forma de manifestação do bullying
homofóbico e proposição de ações para intervir nesse cenário (Richartz & Santana,
2012).
Discussões teóricas envolvendo esses termos-chave são encontradas desde 2008
e a forma de publicação também ainda são os anais de congressos. Desta forma, fica
clara a limitação de dados empíricos no contexto brasileiro que sustentem esse
pensamento teórico entre bullying e homofobia. Porém, vale destacar que na literatura
64
internacional, são observados dados empíricos tanto quantitativos, quanto qualitativos
que demonstram a maior vitimização entre jovens LGBTs, as consequências negativas
dessa prática, bem como sua relação com a proteção via suporte social (Poteat &
Sobre a identificação dos autores, os alvos do gênero masculino responderam
que eles são preponderantemente meninos (71%); 3% foram identificadas como
81
somente meninas e 24% afirmaram ser alvos tanto de meninos quanto de meninas. As
participantes do gênero feminino também identificaram os meninos como sendo os
autores na maioria dos casos (41%), porém, o número de meninas autoras foi maior
nesse grupo (30% dos casos); a agressão oriunda de sujeitos de ambos os gêneros foi
observado em 29% dos casos.
Ainda foi possível perceber na pesquisa que apenas 5% dos participantes que se
identificaram como alvos de bullying solicitaram ajuda a algum adulto frente a essa
situação de violência. Somente 17% pediram para cessassem a agressão e 54%
afirmaram que simplesmente ignoraram, não deram atenção. A representação de alunos
que afirmaram ter se defendido dessa situação foi de 24%.
Sobre a percepção de testemunhas defensoras e a eficácia dessa defesa, a maioria
dos alvos (63%) afirmou que os amigos o defenderam do bullying, e na maioria dos
casos (29%) o bullying foi cessado. Em oposição, 37% dos participantes afirmaram que
não houve defesa por parte dos amigos; nesses casos, em 25% os amigos sabiam da
ocorrência da agressão. Já em 12% os mesmos desconheciam que o amigo estava sendo
alvo de bullying (Tabela 4).
Tabela 4- Percepção de testemunhas defensoras e eficácia da defesa. Conteúdo Frequência % Houve defesa, mas o bullying continuou 44 17 Houve defesa e o bullying diminuiu 44 17 Houve defesa e o bullying cessou 74 29 Não houve defesa, pois os amigos não sabiam do bullying
31 12
Não houve defesa, mas os amigos sabiam do bullying 65 25 Total 258 100
Quanto à justificativa para sofrer bullying, a resposta mais frequente dos alvos
(40%) foi que esta ocorria como um tipo de brincadeira. Um percentual próximo de
sujeitos responderam não saber o porquê (32%). As demais respostas foram: em virtude
82
dele (o alvo) ser diferente (11%); outras razões não explicitadas na pergunta (11%);
porque os autores são mais fortes (5%); porque o sujeito enquanto alvo provocou o
autor (1%).
4.1.2. Autores
Assim como relatado pelos alvos, os autores afirmaram cometer mais bullying
de ordem verbal (74%), seguidos de violência física (13%). As demais formas
obtiveram baixas frequências, variando entre 2% e 4%. O bullying físico demonstrou
uma diferença entre os gêneros, sendo relatado por 17% dos meninos e somente 6% de
meninas.
Quanto ao sentimento e pensamento vivenciado no momento de fazer o bullying,
os jovens afirmam ter sido engraçado (38%), seguido de 19% que afirmaram ter se
sentido mal. Houve também aqueles que afirmaram se sentir bem ao fazer o bullying,
representando 4% dos autores. Mais uma vez houve diferenças quanto às respostas
apresentadas por jovens do gênero masculino e feminino. Aproximadamente o dobro
das meninas (14,3%) se comparada aos meninos (7,7%) afirmaram que praticaram
bullying porque acharam que fariam o mesmo com ela. Já os garotos praticaram em
maior quantidade que as meninas sob a justificativa de que os alvos mereciam castigo
(7,7% e 2,9%, respectivamente). Embora os meninos pratiquem mais bullying, estes
costumam relatar com maior frequência que se sentem mal nessa situação (21,5%) do
que as meninas (14,3%) (Tabela 5).
83
Tabela 5- Sentimentos e pensamentos descritos pelos autores de bullying ao desenvolver tal prática. Respostas Total
% (N) Meninos
%(N) Meninas
%(N) Não sentiu nada Sentiu-se bem
10 (10) 4 (4)
9,2 (6) 4,6 (3)
11,3(4) 2,9 (1)
Sentiu-se mal Sentiu pena do colega Achou engraçado
19 (19) 10 (10) 38 (38)
21,5 (14) 7,7 (5)
38,5 (25)
14,3 (5) 14,3 (5) 37,1 (13)
Eles mereciam castigo 6 (6) 7,7 (5) 2,9 (1) Acho que fariam o mesmo comigo Preocupou-se que algum adulto descobrisse
10 (10) 3 (3)
7,7 (5) 3,1 (2)
14,3 (5) 2,9 (1)
Total 100 (100) 100 (65) 100 (35)
4.1.3. Alvos/autores
Outro grupo de análise diz respeito aos sujeitos que, a depender da relação, são
alvos e autores de bullying. O tipo de bullying mais frequentemente sofrido por esse
grupo foi o verbal, exemplificado a partir de apelidos e xingamentos - 77%. Os demais
tipos foram menos frequentes, a saber: agressão física (6%), ameaças (6%), exclusão
(4%), dano material (1%) e calúnia (16%).
Acerca da percepção sobre a motivação para ocorrência do bullying, 66,1%
afirmaram que esta se dá em virtude de alguma característica fenotípica. Em seguida,
foi mencionado ―outros‖ (11,9%), bem próximo das ofensas de cunho homofóbico
(10,2%), racismo (9,0%) e a religião (2,8%). Porém, quando analisado por gênero, a
característica física fica com 71,6% das respostas nas meninas e 60,7% nos meninos.
Entre os participantes do sexo masculino, o segundo motivo mais frequente foram as
ofensas de cunho homofóbico (15,7%), enquanto nas meninas esse percentual foi de
4,6%. Nas participantes do sexo feminino, se eliminada a questão ―outros‖ (12,5%), a
segunda razão mais mencionada foi o racismo (10,2%) (Tabela 6).
84
Tabela 6 - Conteúdo utilizado no bullying contra alvos/autores em função do sexo. Conteúdo Total
Sobre a identificação dos autores de bullying no momento em que esses sujeitos
são alvos, foi observada uma preponderância do sexo masculino (56% dos casos), se
comparado os casos em que os autores são somente do sexo feminino (7%). Aqueles
que são alvos tanto de meninos quanto de meninas representaram 36% da amostra.
Também foi possível observar na pesquisa que apenas 6% dos participantes,
quando na posição de alvo, pediram ajuda a algum adulto frente a essa situação de
violência. Somente 14% pediram para os autores cessassem a agressão e 50%
afirmaram que simplesmente ignoraram, não dando atenção; 30% afirmaram ainda ter
se defendido dessa situação.
A respeito da existência de uma testemunha e de como essa age ao presenciar o
participante sendo alvo de bullying, estes afirmaram que 48% não tentaram nada para
defendê-los; destes, 12% não sabiam do bullying. Mais da metade, contudo, 52%
tentaram defender o alvo; entre esses casos, 18,1% o bullying continuou; 13,6% dos
casos diminuíram; e 20,9% encerraram (Tabela 7).
Tabela 7- Percepção de testemunhas defensoras e eficácia da defesa. Conteúdo N % Houve defesa, mas o bullying continuou 32 18,1 Houve defesa e o bullying diminuiu 24 13,6 Houve defesa e o bullying cessou 37 20,9 Não houve defesa, pois os amigos não sabiam do bullying
22 12,4
Não houve defesa, mas os amigos sabiam do bullying 62 35,0 Total 177 100
85
Quanto ao motivo que leva os autores a cometerem bullying contra os
participantes, 50% afirmaram que os autores fazem bullying contra ele por brincadeira;
28% afirmaram não saber o porquê, 10% por outras razões não explicitadas na pergunta,
7% porque os autores são mais fortes, 4% porque ele (o alvo) provoca o autor e 1%
porque ele (o alvo) é diferente dos demais. Destaca-se que desse 1% todos são do
gênero feminino, já que nenhum participante do masculino optou por essa opção.
Assim como os demais grupos, os alvo/autores relataram praticar mais bullying
do tipo verbal (78%), seguidos de violência física (8%). As demais formas foram as
calúnias (2%), ameaças (7%) e bullying material (5%). Uma diferença observada entre
os sexos faz menção ao bullying material (pegar/quebrar coisas ou dinheiro) ter sido
observado somente entre meninos, sendo inexistente entre as meninas.
Quando questionados sobre os sentimentos e pensamentos experienciados no
momento de fazer o bullying, os alvos/autores afirmaram ter sido engraçado (35,6%),
seguido de 18,6% que afirmaram que fizeram o bullying em virtude de que teriam feito
o mesmo consigo; e 18% falaram ter se sentido mal ao cometer essa prática. O número
de sujeitos que afirmaram ter se sentido bem nessa situação foi de 2,5%, bem próximo à
frequência dos sujeitos que afirmaram terem ficado preocupados com a ameaça de que
algum professor ou funcionário descobrisse (2,8%); 9,6% afirmaram não ter sentido
nada; 6,7% falaram que sentiram pena do colega alvo; e 6,2% afirmaram que os alvos
precisavam de um castigo (Tabela 8).
Nesse grupo e, com relação a essa questão, foram percebidas duas diferenças
entre os gêneros. A primeira delas foi o número de sujeitos que afirmaram não ter
sentido nada, sendo 15,8% nos homens e 3,4% nas mulheres. Já o número de meninas
86
foi maior na resposta de sentir-se mal (25,0%), enquanto nos meninos somente 11,2%
escolheram essa alternativa (Tabela 8).
Tabela 8 - Sentimentos e pensamentos descritos pelos alvos/autores de bullying ao desenvolver tal prática. Respostas Total
% (N) Meninos
% (N) Meninas % (N)
Não senti nada Sentiu-se bem
9,6 (17) 2,5 (4)
15,8 (14) 2,2 (2)
3,4 (3) 2,3 (2)
Sentiu-se mal Sentiu pena do colega Achou engraçado
18,0 (32) 6,7 (12) 35,6 (63)
11,2 (10) 9,0 (8)
34,8 (31)
25,0 (22) 4,6 (4)
36,3 (32) Eles mereciam castigo 6,2 (11) 4,5 (4) 8,0 (7) Acho que fariam o mesmo comigo Preocupou-se que algum adulto descobrisse
18,6 (33) 2,8 (5)
18,0 (16) 4,5 (4)
19,3 (17) 1,1 (1)
Total 100 (177) 100 (89) 100 (88)
4.1.4. Testemunha
Sendo esse grupo composto por sujeitos que afirmaram somente assistir cenas de
bullying, sem participar efetivamente, estes apresentaram, na sua maioria, as seguintes
respostas: pediu para que agressores parassem – 45,9%; se sentiu mal – 47,8%; ficou
com pena do alvo – 51,8%; e ficou com medo que isso pudesse acontecer consigo –
24,8%. As demais respostas assinaladas podem ser verificadas na Tabela 9 abaixo.
87
Tabela 9 - Reações comportamentais e emocionais das testemunhas ao presenciar uma situação de bullying. Conteúdo Frequência de
emissão da resposta
% de testemunhas
Ficou com pena do alvo 142 51,8 Sentiu-se mal 131 47,8 Pediu para que agressores parassem 126 45,9 Socorreu o colega que estava sofrendo bullying Não fez nada
62 62
22,6 22,6
Solicitou ajuda a algum professor ou funcionário da escola
56 20,4
Ficou com pena do autor Fingiu que não viu Não se sentiu incomodado Sentiu-se bem Ficou com medo que isso pudesse acontecer consigo
9 4 7 3 68
3,3 1,5 2,5 1,1 24,8
Nota. Nessa questão os participantes podiam responder mais de uma alternativa, o que justifica a soma da porcentagem ser superior a 100%. A porcentagem foi calculada em cima do número de sujeitos no grupo de testemunhas (274).
Vale ressaltar que entre os participantes que responderam não ter se incomodado
com a situação de bullying, 100% eram do gênero masculino, não sendo relatado o
incômodo por nenhuma participante do gênero feminino. Já as meninas apresentaram
maior medo de se tornarem alvo de bullying, 33,3% dos casos, enquanto que a
frequência dessa resposta entre os meninos foi de 16,3%.
4.2. Análise fatorial da escala de saúde geral
Uma vez observada a pertinência [KMO = 0,81 e Bartlettχ² (66) = 2118,574; p <
0,001], foi realizada a análise fatorial da escala, na qual percebeu-se uma
unidimensionalidade, que explicou 26,2% da variância das respostas e teve um alpha de
Cronbach de 0,73. No presente estudo, essa dimensão denomina-se bem-estar.
88
Tabela 10 - Análise fatorial da escala de Saúde Geral.
Itens da escala de Saúde Geral
Fator único 1. Tem podido concentrar-se no que faz? 2. Suas preocupações o fazem perder o sono? 3. Tem sentido que tem um papel útil na vida?
0,38 0,43 0,37
4. Tem sido capaz de tomar decisões? 5. Tem notado que está agoniado? 6. Tem a sensação de não superar as dificuldades? 7. Tem sido capaz de desfrutar das atividades? 8. Tem sido capaz de enfrentar os problemas? 9. Tem se sentido pouco feliz e deprimido? 10. Tem perdido a confiança em si mesmo? 11. Tem pensado que não serve para nada? 12. Tem se sentido razoavelmente feliz?
0,39 0,50 0,58 0,47 0,53 0,63 0,71 0,68
0,25
Alfa de Cronbach 0,73 Variância explicada 26,2%
Nota. Fator da escala de Saúde Geral – Bem-estar psicológico.
4.3. Bullying e bem-estar psicológico
Segundo a estatística descritiva, observa-se que o grupo com maior bem-estar
psicológico foi o de testemunha (3,6), seguida por autor (3,5), alvo (3,3) e por fim,
alvo/autor (3,2) (Figura 2). A análise de variância de um fator mostra ser pouco
provável que a diferença entre esses grupos se dê devido um erro amostral F(3,80) =
16,95 e p < 0,001. O teste post hoc (Tukey) identifica essa diferença como sendo entre
os grupos de autor e testemunha, se comparados aos grupos de alvo e alvo/autor (Tabela
11).
89
Figura 2 – Comparação entre as médias de bem-estar psicológico em função dos papéis de bullying.
Tabela 11 - Diferenças significativas entre as médias de bem-estar em função dos papéis de bullying.
Grupo Média Diferença entre as médias
p
Autor (M = 3,5)
Alvo 3,3 0,2 < 0,05 Alvo/autor 3,2 0,3 < 0,05
Testemunha (M = 3,6)
Alvo 3,3 0,3 < 0,001 Alvo/autor 3,2 0,4 < 0,001
As diferenças observadas nos escores de bem-estar são percebidas somente entre
os grupos de bullying, não havendo essa distinção em função do sexo [t(806) = -0,32, p
= 0,746].
4.4. Análise fatorial da escala de homofobia manifesta e sutil
No que diz respeito à escala de homofobia manifesta, os testes de Kaiser-Meyer-
Olkin e o de esfericidade de Bartlett indicaram a adequação para a realização da análise
90
fatorial exploratória [KMO = 0,72 e Bartlettχ² (45) = 1072,853; p < 0,001]. O
instrumento, por sua vez, organiza-se em torno de dois fatores. O primeiro deles,
composto pelos itens 2, 7, 8, 9 e 10 e está denominada como Aceitação da Condição
Homossexual. Já o segundo fator, composto pelos itens 1, 3, 4, 5 e 6, está nomeado de
Convivência entre Homossexuais e Heterossexuais. O fator 1 explica 23,5% da
variância e o teste de confiabilidade revela um alpha de 0,64. No fator 2 esse valor é de
0,60 e a variância explicada de 15,2%. Analisando a escala como um todo, o alpha é de
0,61 e os dois fatores juntos explicam 38,7% da variância.
A subescala de homofobia sutil também se apresenta de forma adequada para a
análise fatorial [KMO = 0,70 e Bartlettχ² (21) = 685,572; p < 0,001]. A organização dos
fatores se dá em 2 grupos. O fator 1, composto pelos itens 14, 16 e 17, recebe o nome
de Ausência de Sentimentos Positivos para com os Homossexuais. O alpha desse fator
0,63 e a variância explicada é de 28,7%. O segundo fator, denominado Diferença de
Valores entre Homossexuais e Heterossexuais, compõe-se pelos demais itens, a saber:
11, 12, 13 e 15 e tem alpha de 0,61. A variância explicada desse fator é de 18,1%. Na
escala como um todo, o alpha é 0,56 e a variância total 46,8%.
91
Tabela 12 - Análise fatorial das escalas de homofobia manifesta e sutil.
Itens da escala de Homofobia Manifesta Fatores
F1 F2 2. Os/as homossexuais, no fundo, são iguais aos heterossexuais. 0,58 7. Se no futuro tivesse uma filha, não me importaria que ela fosse lésbica
e tivesse relações íntimas com outra mulher. 8. Se fosse o caso, e numas determinadas condições, eu poderia sentir o
desejo de ter uma relação sexual com alguém do meu próprio sexo. 9. No trabalho, não me importaria que um homossexual, com os títulos e a
experiência adequada, fosse meu chefe.
0,78
0,54
0,43
10. Se fosse o caso, não me importaria com que um homossexual ou uma homossexual tivesse relações íntimas com alguém da minha família.
1. Existem muitos grupos de homossexuais que pressionam para conseguir cada vez mais direitos, mas os problemas dos heterossexuais são mais importantes.
3. Muitos homossexuais têm uma posição social e econômica bastante destacada, mas somente a obtiveram, pela condição e apoio que recebem dos outros homossexuais.
4. Eu não penso que os/as homossexuais precisam de medidas ou leis especiais que os favoreçam.
0,76
0,61
0,48
0,40
5. Homossexuais e heterossexuais nunca se sentirão bem juntos, ainda que sejam realmente amigos. 0,56
6. Pela sua própria condição, os/as homossexuais nunca alcançarão o mesmo nível de desenvolvimento pessoal que os heterossexuais. 0,69
F1 F2 11. Da mesma forma que os estrangeiros adotam as costumes do país
aonde chegam, penso que os/as homossexuais poderiam fazer o mesmo e ser mais discretos.
0,64
12. As ideias que os/as homossexuais podem passar para uma criança são diferentes das que lhe transmitiria um heterossexual. 0,60
13. Se os/as homossexuais se esforçassem realmente para integrar-se a sociedade, não precisariam fazer tantas mobilizações (por exemplo, parada gay) nem se esconder.
0,67
15. Eu acho que os valores religiosos e éticos dos/das homossexuais são diferentes aos dos heterossexuais. 0,47
14. Não acredito que haja muitas diferenças entre os valores e ideias de homossexuais e heterossexuais. 0,64
16. Geralmente sinto simpatia pelos/pelas homossexuais. 0,75 17. Geralmente sinto admiração pelos/pelas homossexuais que conheço. 0,81
Alfa de Cronbach (por fator) 0,63 0,61 Variância explicada (por fator) 28,7% 18,1% Nota. Alfa de Cronbach da escala de homofobia manifesta – 0,61 Variância explicada na escala de homofobia manifesta 38,7% Alfa de Cronbach da escala de homofobia sutil – 0,61 Variância explicada na escala de homofobia sutil – 46,8% Fatores da escala de Homofobia Manifesta: Aceitação da Condição Homossexual (dimensão 1) e Convivência entre Homossexuais e Heterossexuais (dimensão 2).
92
Fatores da escala de Homofobia Sutil: Ausência de Sentimentos Positivos para com os Homossexuais (dimensão 1) e Diferença de Valores entre Homossexuais e Heterossexuais (dimensão 2).
4.5. Homofobia manifesta e sutil
Nos dados de homofobia, tanto manifesta quanto sutil, verifica-se uma maior
homofobia entre participantes do gênero masculino, se comparados às do gênero
feminino (Tabela 13). Essa diferenciação é considerada estatisticamente significativa,
sendo t(806) = 6,69, p < 0,001 para o construto da homofobia manifesta; e t(806) =
7,72, p < 0,001 para os escores de homofobia sutil.
Tabela 13 - Estatística descritiva dos escores de homofobia manifesta e sutil nos diferentes grupos da variável sexo.
Variável Masculino Feminino Média Desvio padrão Média Desvio padrão
Homofobia manifesta
3,15 0,56 2,89 0,58
Homofobia sutil 3,43 0,62 3,06 0,69
No questionário sociodemográfico foi perguntado aos participantes se os
mesmos tinham algum amigo (a) próximo (a) ou familiar homossexual. Nesse quesito a
distribuição foi a seguinte: 53% afirmaram que sim e os demais 47% que não. Como
pode ser observada na Tabela 14, a média dos escores de homofobia manifesta é
superior entre aqueles sujeitos que afirmam não possuir nenhum contato próximo com
sujeitos homossexuais. Essa diferenciação é confirmada com o teste t, t(806) = 5,32, p <
0,001. Essa mesma diferença percebe-se nos escores de homofobia sutil, t(806) = 5,65,
p < 0,001.
93
Tabela 14 – Estatística descritiva dos escores de homofobia manifesta e sutil nos diferentes grupos que possuem contato ou não com homossexuais.
Variável Contato Sem contato Média Desvio padrão Média Desvio padrão
Swearer, S. M., Turner, R. K., Givens, J. E., & Pollack, W. S. (2008). "You're so gay!":
Do different forms of bullying matter for adolescent males? School Psychology
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143
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144
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145
Anexo A – Questionário de bullying
Para melhor compreensão do questionário, seguem alguns esclarecimentos:
Bullying – ato de agressão que se repete no dia-a-dia da escola e pode ser física (bater,
chutar, empurrar, roubar material) verbal (fofocas, xingamento, mentiras) ou de
exclusão (não querer essa pessoa no grupo e impedir que outras pessoas façam
amizade com ela) de um, ou mais alunos, contra outro aluno. Nessa situação a vítima
se incomoda com a agressão.
Homossexualidade – relação (afetiva e sexual) entre pessoas do mesmo sexo. Essas
pessoas são chamadas de homossexuais. Por exemplo: homens que namoram com
homens ou/e mulheres que namoram com mulheres.
Heterossexualidade - relação (afetiva e sexual) entre pessoas de sexos diferentes.
Essas pessoas são chamadas de heterossexuais. Por exemplo: homens que namoram
com mulheres e/ou mulheres que namoram com homens.
Vale lembrar que sua sinceridade é fundamental e que você não será identificado, ou seja, ninguém saberá o que VOCÊ respondeu. Desde já, muito obrigada pela participação!
INSTRUMENTO DE PESQUISA
Sexo: ( ) Masculino e sou heterossexual ( ) Masculino e sou homossexual ( ) Feminino e sou heterossexual ( ) Feminino e sou homossexual Idade: _______ Possui familiar ou amigo(a) próximo(a) que é homossexual: ( ) Sim ( ) Não Cor da pele: ( ) Amarela ( ) Branca ( ) Parda ( ) Indígena ( ) Preta ( )Outra:__________ Série: _________________ Tempo que estuda nesse colégio: _______________ Religião: ______________________ Possui irmãos: ( ) Sim ( ) Não Caso tenha, possui contato: ( ) Sim ( ) Não Ordem de nascimento: ( ) filho mais velho ( ) filho do meio ( ) filho mais novo Renda familiar: ( ) até 545,00 ( ) entre 545,00 e 1000,00 ( ) entre 1000,00 e 1500,00 ( ) mais de 1500,00 QUESTIONÁRIO 1
1- Quantos bons amigos você tem na escola? a) Não tenho nenhum bom amigo na escola. b) Eu tenho um bom amigo na escola.
146
c) Eu tenho 2 ou 3 bons amigos na escola. d) Eu tenho 4 ou 5 bons amigos na minha escola. e) Eu tenho mais de cinco bons amigos na escola.
2- Quantas vezes você sofreu bullying na escola?
a) Não sofri bullying na escola. (se você optou por este item, vá direto para a questão número 11)
b) Só 1 ou 2 vezes. c) De 3 a 6 vezes. d) Uma vez por semana. e) Várias vezes por semana.
3- Que tipo de bullying é mais usado contra você? (pode ser marcado mais uma opção) a) Me empurram, chutam, batem. b) Me ameaçam. c) Me colocam apelidos, me xingam ou riem de mim. d) Não me deixam conversar, ficar junto, brincar ou participar de atividades com
outros colegas. e) Quebram ou pegam minhas coisas ou meu dinheiro. f) Contam mentiras ou fofocas a meu respeito e tentam fazer com que os outros não
gostem de mim. g) Outras coisas. Expliquem o que fazem: ___________________________
4- Quando praticam bullying contra você, o que usam como motivo para tentar te agredir? a) Sua religião. Dê Exemplo: ____________________________________ b) Alguma característica física marcante, como altura, peso e outros
(qual:_____________________________________________________) c) Palavras que sugiram que você é homossexual.
Dê exemplo:________________________________________________ d) Palavras que indicam racismo.
Dê exemplo: ________________________________________________ e) Outro. Dê Exemplo:_________________________________________
5- Você costuma sofrer bullying praticado por um ou vários colegas?
a) Principalmente por 1 colega. b) Por 2 ou 3 colegas. c) Por 4 a 7 colegas. d) Por 7 a 9 colegas. e) Por mais de 10 colegas.
6- Você costuma sofrer bullying por meninos ou meninas?
a) Só por meninos. b) Principalmente por meninos. c) Só por meninas. d) Principalmente por meninas. e) Tanto por meninos quanto por meninas.
147
7- Como você se sentiu quando sofreu bullying na escola? (pode ser marcado mais uma opção) a) Não me incomodou. b) Fiquei preocupado sobre o que os outros pensaram de mim. c) Fiquei com raiva. d) Fiquei assustado. e) Não queria mais ir para a escola.
8- O que você fez quando sofreu bullying na escola? (pode ser marcado mais uma
opção) a) Eu chorei. b) Eu fugi. c) Não dei atenção, ignorei. d) Pedi que parassem. e) Pedi ajuda a um adulto. f) Eu me defendi. g) Fiz outra coisa. Explique: ______________________________________
9- Algum colega seu tentou impedir que você sofresse bullying na escola?
a) Não, eles não tentaram nada. b) Não, eles não sabiam que eu estava sofrendo bullying na escola. c) Sim, eles tentaram, mas o bullying continuou. d) Sim, eles tentaram e o bullying diminuiu. e) Sim, eles tentaram e o bullying parou.
10- Por que você acha que alguns colegas fazem bullying contra você?
a) Não sei. b) Por brincadeira. c) Porque são mais fortes. d) Porque eu provoco eles. e) Porque eu sou diferente dos outros. f) Porque eu mereço castigo. g) Outras razões. Diga quais são: __________________________________
11- Quando você viu alguns de seus colegas sofrerem bullying na escola, o que você
fez? (pode ser marcado mais uma opção) a) Nunca vi alguém sofrendo bullying na escola. (se você optou por este item, vá
direto para a questão número 13). b) Eu disse aos agressores que parassem. c) Pedi ajuda a direção, professor ou funcionário da escola. d) Eu socorri o colega que estava sofrendo bullying. e) Não fiz nada.
12- Como você se sentiu vendo um de seus colegas sofrendo bullying na escola?
(pode ser marcado mais uma opção) a) Me senti mal. b) Fiquei com pena da vítima. c) Fiquei com pena do agressor. d) Fingi que não vi. e) Não me incomodou.
148
f) Me senti bem. g) Fiquei com medo que isso pudesse acontecer comigo.
13- Quantas vezes você ajudou a fazer bullying contra outros colegas na escola?
a) Eu não ajudei a fazer bullying contra algum colega. b) Só 1 ou 2 vezes. c) De 3 a 6 vezes. d) Uma vez por semana. e) Várias vezes por semana.
14- Quando você fez bullying contra outros colegas na escola, normalmente você fez
sozinho ou acompanhado? a) Eu nunca fiz bullying contra outros colegas. (se você optou por este item, vá para
o questionário 2 na próxima página) b) Normalmente fiz sozinho. c) Fiz com 1 ou mais colegas. d) Fiz com 3 a 8 colegas. e) Fiz com mais de 8 colegas.
15- De que forma você fez bullying contra outros colegas na escola? (pode ser
marcado mais uma opção) a) Bati, dei pontapés, empurrei. b) Ameacei. c) Quebrei ou peguei as coisas e/ou dinheiro deles. d) Coloquei apelidos, xinguei ou ri deles. e) Não deixei eles conversarem, ficarem juntos, brincarem ou participarem de
atividades com outros colegas.com outros colegas. f) Espalhei mentiras e fofocas a seu respeito e tentei fazer com os outros não
gostassem deles. g) Outras coisas. Explique o que:
_____________________________________________
16- O que você sentiu quando fez bullying contra outros colegas de escola? a) Eu me senti bem. b) Foi engraçado. c) Senti que eles mereciam castigo. d) Não senti nada. e) Eu me senti mal. f) Eu senti pena do colega. g) Acho que eles fariam o mesmo comigo. h) Estava preocupado se algum professor, funcionário ou pais, descobrissem.
149
Anexo B – Escala de homofobia manifesta e sutil
1–C
onco
rdo
Tot
alm
ente
2 –C
onco
rdo
3 –
Não
co
ncor
do
nem
dis
cord
o
4 -
Dis
cord
o
5 –
Dis
cord
o T
otal
men
te
1. Existem muitos grupos de homossexuais que pressionam para conseguir cada vez mais direitos, mas os problemas dos heterossexuais são mais importantes.
1 2 3 4 5
2. Os/as homossexuais, no fundo, são iguais aos heterossexuais.
1 2 3 4 5
3. Muitos homossexuais têm uma posição social e econômica bastante destacada, mas somente a obtiveram, pela condição e apoio que recebem dos outros homossexuais.
1 2 3 4 5
4. Eu não penso que os/as homossexuais precisam de medidas ou leis especiais que os favoreçam.
1 2 3 4 5
5. Homossexuais e heterossexuais nunca se sentirão bem juntos, ainda que sejam realmente amigos.
1 2 3 4 5
6. Pela sua própria condição, os/as homossexuais nunca alcançarão o mesmo nível de desenvolvimento pessoal que os heterossexuais.
1 2 3 4 5
7. Se no futuro tivesse uma filha, não me importaria que ela fosse lésbica e tivesse relações íntimas com outra mulher.
1 2 3 4 5
8. Se fosse o caso, e numas determinadas condições, eu poderia sentir o desejo de ter uma relação sexual com alguém do meu próprio sexo.
1 2 3 4 5
9. No trabalho, não me importaria que um homossexual, com os títulos e a experiência adequada, fosse meu chefe.
1 2 3 4 5
10. Se fosse o caso, não me importaria com que um homossexual ou uma homossexual tivesse relações íntimas com alguém da minha família.
1 2 3 4 5
11. Da mesma forma que os estrangeiros adotam as costumes do país aonde chegam, penso que os/as homossexuais poderiam fazer o mesmo e ser mais discretos.
1 2 3 4 5
12. As idéias que os/as homossexuais podem passar para uma criança são diferentes das que lhe transmitiria um heterossexual.
1 2 3 4 5
13. Se os/as homossexuais se esforçassem realmente para integrar-se a sociedade, não precisariam fazer tantas mobilizações (por exemplo, parada gay) nem se esconder.
1 2 3 4 5
14. Não acredito que haja muitas diferenças entre 1 2 3 4 5
150
os valores e idéias de homossexuais e heterossexuais.
15. Eu acho que os valores religiosos e éticos dos/das homossexuais são diferentes aos dos heterossexuais.
1 2 3 4 5
16. Geralmente sinto simpatia pelos/pelas homossexuais.
1 2 3 4 5
17. Geralmente sinto admiração pelos/pelas homossexuais que conheço.
1 2 3 4 5
151
Anexo C – Escala de Saúde Geral
1 -
Não
2 –
Não
mai
s do
que
de
cost
ume
3 –
um p
ouco
m
ais
do q
ue d
e co
stum
e
4 –
mui
to m
ais
do q
ue d
e co
stum
e
1. Tem podido concentrar-se no que faz? 1 2 3 4
2. Suas preocupações o fazem perder o sono? 1 2 3 4
3. Tem sentido que tem um papel útil na vida?
1 2 3 4
4. Tem sido capaz de tomar decisões? 1 2 3 4
5. Tem notado que está agoniado? 1 2 3 4
6. Tem a sensação de não superar as dificuldades?
1 2 3 4
7. Tem sido capaz de desfrutar das atividades?
1 2 3 4
8. Tem sido capaz de enfrentar os problemas? 1 2 3 4
9. Tem se sentido pouco feliz e deprimido? 1 2 3 4
10. Tem perdido a confiança em si mesmo? 1 2 3 4
11. Tem pensado que não serve para nada? 1 2 3 4
12. Tem se sentido razoavelmente feliz? 1 2 3 4
152
ANEXO D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
Bullying e Recursos Psicossociais: da Homofobia à Violência Escolar
Senhores pais e/ou responsáveis, Seu filho está sendo convidado a participar da pesquisa intitulada ―Bullying: da homofobia à violência escolar‖. A participação não é obrigatória e a qualquer momento o participante pode desistir. A sua recusa também não trará nenhum prejuízo na sua relação com os pesquisadores ou com a instituição.
O objetivo do estudo é conhecer a incidência e caracterização do bullying na rede pública de ensino de Aracaju-SE, bem como analisar a ocorrência do bullying motivada pelo preconceito frente ao(à) aluno(a) percebido como homossexual e investigar como a experiência do bullying se relaciona com os recursos psicossociais – autoestima, resiliência e apoio social.
Para atingir esse objetivo a participação do seu filho consistirá em responder sete questionários, sobre a vida pessoal e escolar, sendo todas as questões fechadas (assinalar uma resposta). Esses questionários serão respondidos na própria escola em um horário cedido pelo professor. Embora não haja nenhum benefício financeiro em participar da pesquisa, aqueles que necessitarem de atendimento especializado serão encaminhados. Vale ressaltar que não há riscos relacionados à participação na pesquisa, sejam eles físicos ou danos morais, já que o anonimato do seu filho está garantido. Assim, a identidade dos participantes será mantida em sigilo, sendo os resultados utilizados somente para fins científicos e de forma coletiva. No entanto, ressalta-se que poderá haver um pequeno desconforto, uma vez que exige-se uma disponibilidade de tempo e de atenção ao responder às questões.
Diante disso, solicito que autorizem seu/sua filho(a) a participar desse estudo, que ocorrerá no próprio colégio durante o turno de aula. Sua autorização será confirmada mediante a assinatura no termo abaixo. Eu, _________________________________ autorizo _______________________________ a participar da pesquisa da mestranda Jackeline Maria de Souza, orientada pelo Professor Dr. Joilson Pereira da Silva. Declaro que estou ciente de todas as informações acima descritas e que todas as minhas dúvidas foram esclarecidas. Declaro ainda que o termo foi assinado em duas vias, uma ficando comigo e outra com a aluna responsável pela pesquisa. ________________________________ ________________________________ Responsável pelo participante Jackeline Maria de Souza
Aracaju-SE, ___ de ___________, 201_ O entrevistado poderá verificar a provação dessa pesquisa pelo Comitê de Ética através do endereço da internet www.saude.gov.br/sisnep Contato: Jackeline Souza (79) 9163-4461. E-mail: [email protected] Rua Isaias Amâncio de Jesus, n. 110, Condomínio Jardim Primavera, Bloco E, ap.01, Aracaju-SE.