-
Campus de Botucatu
Instituto de Biocincias PG-BGA
DETECO E ESTUDO SOBRE O EFEITO DA
METANFETAMINA E DO ECSTASY NO
DESENVOLVIMENTO DE IMATUROS DE TRS ESPCIES
DE CHRYSOMYA (DIPTERA: CALLIPHORIDAE) DE
IMPORTNCIA FORENSE
CAROLINA GONALVES PALANCH DE LIMA
Dissertao apresentada ao Instituto de Biocincias, Campus de
Botucatu, UNESP, para obteno do ttulo de Mestre no Programa de
Ps-Graduao em Biologia Geral e Aplicada e rea de concentrao em
Biologia de parasitas e microorganismos.
Dra. Patrcia Jacqueline Thyssen (orientadora)
BOTUCATU SP.
2009
-
1
Campus de Botucatu
Instituto de Biocincias
PG-BGA UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
Jlio de Mesquita Filho INSTITUTO DE BIOCINCIAS DE BOTUCATU
DETECO E ESTUDO SOBRE O EFEITO DA
METANFETAMINA E DO ECSTASY NO
DESENVOLVIMENTO DE IMATUROS DE TRS ESPCIES
DE CHRYSOMYA (DIPTERA: CALLIPHORIDAE) DE
IMPORTNCIA FORENSE
CAROLINA GONALVES PALANCH DE LIMA
Dissertao apresentada ao Instituto de Biocincias, Campus de
Botucatu, UNESP, para obteno do ttulo de Mestre no Programa de
Ps-Graduao em Biologia Geral e Aplicada e rea de concentrao em
Biologia de parasitas e microorganismos.
Dra. Patrcia Jacqueline Thyssen (orientadora)
BOTUCATU SP.
2009
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i
FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA SEO TCNICA DE AQUISIO E
TRATAMENTO DA INFORMAO DIVISO TCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO -
CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP
Bibliotecria responsvel: Selma Maria de Jesus
Lima, Carolina Gonalves Palanch de. Deteco e estudo sobre o
efeito da metanfetamina e do ecstasy no desenvolvimento de imaturos
de trs espcies de Chrysomya (Dptera: Calliphoridae) de importncia
forense / Carolina Gonalves Palanch de Lima. Botucatu: [s.n.],
2009. Dissertao (mestrado) Universidade Estadual Paulista,
Instituto de Biocincias, Botucatu, 2009.
Orientadora: Patrcia Jacqueline Thyssen Assunto CAPES: 21303002
1. Entomologia forense - Ecologia 2. Inseto - Aspectos biolgicos
CDD 595.74 Palavras chave: Biologia de necrfagos; Calliphoridae;
Ecstasy; Entomologia Forense; Metanfetamina
-
ii
A busca mais importante
para o ser humano a tentativa de
ter moral em nossas aes. Nosso
equilbrio interior e, at, nossa
prpria existncia depende disso.
Somente a moralidade em nossas
aes pode trazer beleza e
dignidade para nossa vida.
Albert Einstein (1879-1955)
-
iii
Who saw him die? I, said the fly
With my little eye, I saw him die.
-
iv
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Marcio e Ins, por serem responsveis pela minha
formao tica
e moral e por sempre apoiarem as decises que tomei durante toda
a minha vida.
Ao meu marido, Wagner, com amor, pelo incentivo nos momentos em
que o
cansao apareceu e pela pacincia nos momentos em que me
ausentei.
minha orientadora Dra. Patrcia J. Thyssen que muito alm da
orientao, me
ofereceu sua amizade o que tornou esse trabalho muito mais fcil
e prazeroso de ser
realizado.
Aos professores Dr. Wesley A. C. Godoy e Dr. Arcio Xavier
Linhares por
permitirem que meu trabalho fosse realizado em seus laboratrios
na UNESP Botucatu
e UNICAMP, respectivamente.
Aos colegas de laboratrio da UNESP por estarem sempre dispostos
a me ajudar,
em especial Juliana Alves Neves que alm de me ajudar na realizao
dos experimentos
me acolheu de braos abertos em sua casa nos perodos em que
fiquei em Botucatu;
Juliana Zibordi Gio pela solicitude e por providenciar o padro
de anfetamina necessrio
para a realizao de parte dos meus experimentos e aos colegas
Thiago de Carvalho
Moretti, Carlos Chitos Alexandre Alves e Helton Borbs Otsuka por
suas
contribuies no campo da taxonomia de insetos.
Ao meu colega de profisso e mestrado, o perito criminal Edmilson
Martins, por
conseguir, legalmente, ecstasy para realizao de parte dos meus
experimentos, alm de
me proporcionar diversas dicas sobre atendimentos de locais de
crime e lies de vida.
Aos meus colegas de laboratrio da UNICAMP por, alm de ajudar na
realizao
dos experimentos, me proporcionarem momentos de diverso no meio
de tanto trabalho:
Marcos Leguinho Jos Alves Jr. por me ensinar a tcnica de
imunohistoqumica e me
divertir com suas imitaes; Maicon Radical Diego Grella por
passar sua experincia
com a criao das larvas e pelos docinhos deliciosos que trazia de
Rio Claro; Carina
Rice Mara de Souza por me ajudar com os experimentos fizesse sol
ou chuva, fosse
final de semana ou precisasse trabalhar at a madrugada; Bianca
Fadinha Cardoso e
Fabio Frango Rezende por serem solcitos todas as vezes que,
desesperadamente,
precisei de ajuda.
-
v
Aos professores Dr. Alessandro Francisco Talamini do Amarante,
Dra. Luciene
Maura Mascarini Serra e Dra. Carolina Reigada por suas
contribuies construtivas no
exame de qualificao.
s minhas colegas de profisso, perita criminal Elosa Auler
Bittencourt por me
apresentar minha orientadora e por disponibilizar um espao no
laboratrio de biologia
do Instituto de Criminalstica de So Paulo caso fosse necessrio;
s peritas criminais
Maria de Ftima Pedroso e Camila Delanesi Guedes por
quantificarem o MDMA
existente nos comprimidos de ecstasy usados no experimento.
Ao meu chefe e aos meus colegas peritos criminais da Equipe de
Percias
Criminalsticas Norte da Cidade de So Paulo do Instituto de
Criminalstica pelas
inmeras trocas de planto para que eu pudesse fazer as
disciplinas e realizar meus
experimentos.
minha grande amiga Francine Vilalta Chilliato e sua famlia por
me
hospedarem com muito carinho em suas casas nos perodos que
passei em Campinas.
-
vi
SUMRIO
Resumo
....................................................................................................
01
Abstract
....................................................................................................
02
1 - Introduo e Reviso Bibliogrfica
...................................................... 03
1.1 - Entomotoxicologia
...................................................................................
08
1.2 - Aplicaes da Entomotoxicologia
........................................................... 09
1.2.1 - Deteco de substncias txicas em larvas de insetos
necrfagos 10
1.2.2 - Acumulao biolgica (bioacmulo)
........................................... 14
1.2.3 - Atratividade na colonizao
......................................................... 16
1.2.4 - Efeito das drogas sobre o desenvolvimento larval
....................... 16
1.3 - Derivados anfetamnicos
.........................................................................
28
1.3.1 Toxicocintica
.............................................................................
30
1.3.2 Toxicodinmica
...........................................................................
30
1.3.3 - Dependncia e tolerncia
.............................................................
31
1.3.4 Metanfetamina
.............................................................................
31
1.3.5 Ecstasy
.........................................................................................
33
1.4 - Espcies de interesse forense deste estudo
.............................................. 38
2 - Objetivos Gerais
....................................................................................
40
3 - Deteco e estudo do efeito da metanfetamina no
desenvolvimento de imaturos de duas espcies de Chrysomya (Diptera:
Calliphoridae) de interesse forense
......................................................
41 3.1 - Introduo
................................................................................................
41
3.2 - Material e Mtodos
..................................................................................
43
3.3 - Resultados e Discusso
............................................................................
45
4 - Estudo do efeito do ecstasy no desenvolvimento de imaturos
de trs espcies de Chrysomya (Diptera: Calliphoridae) de interesse
forense
.....................................................................................................
51
4.1 - Introduo
................................................................................................
51
4.2 - Material e Mtodos
..................................................................................
52
4.3 - Resultados e Discusso
............................................................................
53
5 - Concluses Gerais
..................................................................................
63
6 - Referncias Bibliogrficas
....................................................................
64
-
1
RESUMO
A Entomologia Forense utiliza dados de desenvolvimento e
aspectos ecolgicos
de insetos que se alimentam de corpos em decomposio com o
objetivo de auxiliar a
resoluo de casos na rea forense. Uma das principais aplicaes,
entre outras, a
estimativa do intervalo ps-morte (IPM) que pode ser baseada no
ciclo biolgico de uma
dada espcie. Porm, a falta de informao ou conhecimento sobre as
variveis que
interferem de forma direta ou indireta sobre a taxa de
desenvolvimento de diferentes
espcies pode gerar dados imprecisos em relao idade do inseto e,
consequentemente,
ao IPM. Recentemente, devido ao aumento no nmero de bitos
relacionados ao abuso
de drogas, anlises toxicolgicas tm sido direcionadas a insetos
necrfagos, visando
complementar informaes acerca da causa da morte, assim como
garantir maior
acurcia ao clculo do IPM, uma vez que certas substncias
ingeridas antes do bito
podem alterar a taxa de desenvolvimento de algumas espcies que
se alimentam dos
tecidos de cadveres. Esse ramo mais recente da entomologia
forense conhecido como
Entomotoxicologia. No presente estudo objetivou-se observar o
efeito de diferentes
concentraes de metanfetamina e ecstasy, derivados anfetamnicos
que tiveram seu
consumo aumentado nas ltimas dcadas no Brasil, na taxa de
desenvolvimento de
imaturos dos califordeos Chrysomya albiceps (Wiedemann),
Chrysomya megacephala
(Fabricius) e Chrysomya putoria (Wiedemann), quando acrescidos
em dieta artificial
apropriada. A anfetamina, metablito da metanfetamina, no afetou
de forma
significativa o desenvolvimento larval de C. megacephala, no
entanto, aumentou o tempo
de desenvolvimento de imaturos de C. putoria, em especial a fase
de pupa. O MDMA,
principal componente do ecstasy, no alterou a taxa de
desenvolvimento larval de C.
albiceps e C. putoria, mas acelerou consideravelmente a de C.
megacephala. Atravs do
mtodo de imunohistoqumica tentou-se fazer a deteco de anfetamina
em larvas de C.
megacephala e C. putoria, porm os resultados mostraram-se
inconclusivos.
Palavras-chave: metanfetamina; ecstasy; Calliphoridae; biologia
de necrfagos; IPM;
Entomologia Forense; Entomotoxicologia.
-
2
ABSTRACT
Forensic Entomology uses data about development and ecology of
insects that
feed on corpses aiming to assist to solve forensic cases. One of
its main aplication,
among others, is to estimate the pos-mortem interval (PMI) that
can be based on the life
cycle of a specific species. However, the lack of information or
knowledge about the
variables that can change directly or indirectly the development
rate of different species
can lead to inaccurate data about the age of the insect and,
consequently, the PMI.
Recently, due to the increasing number of death related to drug
abuse, toxicological
analyses have been directed to necrophagous insects intending to
provide complementary
information about the cause of death, as well as to asure a more
acurate estimate of PMI,
once some substances ingested before death can modify the
development rate of some
species that feed on cadaver tissues. This new branch of
Forensic Entomology is known
as Entomotoxicology. The aim of the present study was to observe
the effect of different
concentrations of methamphetamine and ecstasy, two
amphetamine-like drugs which
abuse rose among Brazilians in the last decades, on the
development rate of immature of
Calliphoridae Chrysomya albiceps (Wiedemann), Chrysomya
megacephala (Fabricius)
and Chrysomya putoria (Wiedemann), when added to artificial diet
proper for them to
complete their development. Amphetamine, methamphetamines
metabolite, did not
affect significantly the larval development of C. megacephala,
although it increased the
time of development of C. putoria maggots, specially the pupa
stage. MDMA, the main
compound of ecstasy, did not alter the larval development rate
of C. albiceps nor C.
putoria but it accelerated, considerably, the development rate
of C. megacephala.
Through immunohistochemical analyses it was tried to detect
amphetamine in larvae of
C. megacephala and C. putoria, but the results were
inconclusive.
Key words: methamphetamine; ecstasy; Calliphoridae; necrophagous
biology; PMI;
Forensic Entomology; Entomotoxicology.
-
3
1 INTRODUO E REVISO BIBLIOGRFICA
Os artrpodes constituem um grande grupo de animais dos quais o
nmero de
espcies descritas trs vezes maior do que a quantidade de espcies
de todas as outras
espcies animais (Barnes & Rupert, 1993). Dentro do filo
Artrpoda, o subfilo Hexapoda
compreende a classe Insecta e outros trs grupos de animais sem
asas, Collembola,
Protura e Diplura, todos essencialmente terrestres, mas com a
existncia de grupos que
invadiram secundariamente ambientes aquticos (Brusca &
Brusca, 2007).
O sucesso dos insetos marcado pelo grande nmero de espcies e
indivduos e por
possurem a mais espetacular irradiao evolutiva dos Hexapoda, ou
seja, habitam quase
todos os habitats no meio terrestre e na gua doce e, ainda, a
superfcie dos oceanos e
regies litorneas marinhas (Barnes & Rupert, 1993; Brusca
& Brusca, 2007).
Alm disso, corpos de animais em decomposio atraem uma grande
variedade de
organismos, dos quais os artrpodes constituem fauna dominante,
utilizando este micro
habitat temporrio para se alimentar, viver e procriar (Von
Zuben, 2001).
A rea de estudo que aplica o conhecimento sobre o
desenvolvimento e aspectos
ecolgicos de insetos e outros artrpodes no auxlio de
investigaes, tanto criminais
como cveis, denominada Entomologia Forense (Catts & Goff,
1992; Hall, 2001).
Um dos primeiros casos documentados sobre entomologia forense
est relatado no
livro The washing away of wrongs, de autoria de Sung Tsu, um
advogado e investigador
chins do sculo 13, onde descrito um caso de assassinato prximo a
uma lavoura de
arroz na China. Ao perceber que os ferimentos da vtima poderiam
ter sido causados pela
ferramenta de trabalho utilizada por agricultores na lavoura,
policiais solicitaram que
fossem colocadas suas foices no cho e notou-se assim que, em
somente uma delas, havia
presena de moscas varejeiras que teriam sido atradas pela
presena no visvel de
sangue. Quando confrontado, o dono da foice admitiu o crime
(Benecke, 2001).
Em 1855, o mdico francs Bergeret reportou o primeiro caso de
entomologia
forense na era moderna estimando o intervalo ps-morte (IPM) com
base nas mudas de
larvas e pupas de moscas varejeiras encontradas no local
(Benecke, 2001; Greenberg,
1991). Mas o grande mrito na fundao desta cincia coube a Mgnin
(1894) em sua
obra denominada La faune des cadavres: application de
lentomologie a la medecine
-
4
legale descreve oito estgios de decomposio e a cada estgio
associou uma onda de
insetos que o colonizam e os quais ele deu o nome de
trabalhadores da morte
(Travailleurs de la mort).
A primeira onda formada pelas moscas (Diptera), dando como
exemplo os
gneros Musca e Calliphora que chegam fase de decomposio
denominada fresca (do
francs frais) e permanecem at a fase seguinte. Com o incio da
liberao do odor (fase
gasosa) surge a segunda onda que tambm ocupada por moscas,
pertencentes aos
gneros Lucilia e Sarcophaga. A terceira onda, cuja decomposio
cadavrica
caracterizada pela formao de cidos graxos (adipocera) e que
ocorre cerca de trs a seis
meses (em pases temperados) aps a morte tem-se a chegada de
espcies das famlias
Coleoptera e Lepidoptera (Mgnin, 1894).
Na fase de fermentao d-se incio a quarta onda onde as moscas
predominantes
so dos gneros Piophila e Anthomyia. Na fase de decomposio
denominada liquefao,
inicia a quinta onda formada por dpteros acaliptrados e
colepteros da famlia Silphidae.
A sexta onda composta por caros que iro absorver os lquidos
remanescentes das
demais fases. Quando os restos esto quase que todos secos
(esqueletizados), tem-se a
stima onda que composta por insetos da ordem Coleptera. A oitava
e ltima onda
composta por duas espcies, uma do gnero Tenebrio e uma do gnero
Plinus que
finalizaro a decomposio (Mgnin, 1894).
No caso do Brasil, essa sucesso pode ser um pouco diferente pelo
fato de ser um
pas de regio tropical e clima mais quente o que acelera o
processo de decomposio.
Wolff et al. (2001) realizaram um trabalho de sucesso ecolgica
em Medelim, na
Colmbia, no qual identificaram cinco estgios de decomposio e
fizeram consideraes
sobre as famlias que podem ser indicadores de perodos de
decomposio sucessivos.
Para a fase de decomposio fresca os indicadores seriam adultos
de Muscidae e
Sarcophagidae; para a fase de inchao ovos e larvas de
Calliphoridae e adultos de
Vespidae; para a fase denominada de ativa seriam larvas de
Sarcophagidae; para o
estgio avanado seriam as larvas de Piophilidae e para a fase
seca seriam as larvas de
Histeridae e Scarabaeidae (Wolff et al., 2001).
Segundo Lord e Stevenson (1986) a Entomologia Forense est
subdividida em
trs principais reas:
-
5
- Entomologia urbana: estudos relacionados a problemas, tais
como
litgios e aes civis, envolvendo artrpodes em imveis ou como
pestes
em casas ou jardins. Como exemplo podemos citar infestaes de
cupins
(trmitas), baratas entre outros que podem depreciar o valor de
mercado
de imveis ou causar danos que comprometam a segurana. Tambm
esto inclusos nesta rea processos legais relacionados com o mau
uso de
pesticidas;
- Entomologia de produtos armazenados/estocados: est relacionado
com
infestao ou contaminao de produtos comerciais em grande
escala
como, por exemplo, presena de insetos, ou parte deles, em barras
de
doce, moscas em ketchup ou aranhas em papel de banheiro.
Geralmente
esses casos tambm envolvem litgios;
- Entomologia mdico-legal/mdico-criminal: est relacionado com
o
envolvimento de artrpodes em eventos criminais, geralmente de
cunho
violento como assassinato, suicdio e estupro, porm tambm
esto
inclusas nesta rea outras violaes como abuso fsico e
trfico/contrabando.
Dentre as razes para utilizao de insetos nas investigaes
criminais podemos
citar o fato dos insetos serem geralmente os primeiros a
encontrar o corpo em
decomposio; alm do fato da fauna de artrpodes no corpo e ao
redor dele mudar numa
seqncia sucessional previsvel conforme progride a decomposio,
fato denominado
sucesso ecolgica; e porque atualmente, a fauna do cadver
ignorada como vestgio do
crime quando os investigadores processam o local da morte (Catts
& Goff, 1992).
Na rea da Entomologia Mdico-legal, uma anlise cuidadosa da
comunidade de
insetos encontrada num corpo em decomposio, associada ao
conhecimento da biologia
e ecologia do inseto e s condies ambientais do local, pode
fornecer indicaes
forenses valiosas que incluem a estimativa do IPM, movimentao do
cadver aps a
morte, associao de suspeitos com a cena do crime, indicao de
ferimentos prvios
morte e a presena de drogas ou toxinas no corpo em decomposio, o
que at poderia a
ajudar na determinao da causa da morte (Catts & Goff, 1992;
Goff & Lord, 2001).
-
6
Nuorteva (1974) mostra como os insetos puderam ser teis na
resoluo de dois
assassinatos em Helsinki, Finlndia. No quarto da casa onde havia
ocorrido um dos
crimes, havia quantidade considervel de sangue seco e diversas
moscas, dentre elas
Muscina stabulans (Diptera: Muscidae), espcie tambm encontrada
em uma camiseta
manchada de sangue contida dentro de um saco plstico em um lixo
prximo ao local. As
larvas coletadas da camiseta foram criadas em laboratrio e foi
notado que as de M.
stabulans apresentaram duas ondas de emergncia. Quando da
coleta, assumiu-se que a
oviposio tivesse ocorrido no dia em que a camiseta havia sido
encontrada
correspondendo, com base no tempo de desenvolvimento desta
espcie, a segunda onda
de emergncia. Ao calcular a data da possvel oviposio da primeira
onda de emergncia
foi percebido que a data coincidia com o dia em que ocorreu o
esfaqueamento, ligando a
camiseta encontrada ao local do crime.
Existem ainda reportados estudos onde foi possvel determinar
negligncia aos
cuidados de pessoas incapacitadas, como crianas ou idosos,
resultando em morte das
vtimas. O auxlio entomolgico, nesses casos, possibilitou imputar
dolo aos responsveis
pelo cuidado de tais pessoas (Benecke & Lessig, 2001;
Benecke et al., 2003).
De qualquer forma, a estimativa do IPM uma das aplicaes mais
amplamente
acessadas dentro da entomologia mdico-legal utilizando-se,
principalmente, do
conhecimento da biologia de moscas varejeiras (Diptera:
Calliphoridae), por serem estas
as primeiras a colonizarem os cadveres (Amendt et al.,
2004).
Para a estimativa de um IPM mais preciso necessrio levar em
considerao:
a. A identificao correta dos exemplares de insetos, pois a
estimativa baseada
no tempo de desenvolvimento da espcie e uma identificao errnea
pode
acarretar erros graves neste clculo (Catts & Goff,
1992);
b. A sucesso de insetos que colonizam cadveres, uma vez que cada
estgio da
decomposio atrai diferentes espcies de insetos e varivel em
relao
localizao geogrfica ou sazonalidade (Carvalho et al., 2004);
c. A disperso larval ps-alimentar na qual deve se considerar
pupas localizadas a
distncias variveis do cadver para no deixar de considerar as
larvas mais
velhas que o abandonaram (Von Zuben, 2001);
-
7
d. A anlise toxicolgica (rea de estudo denominada
entomotoxicologia) que
pode, em alguns casos, alterar a taxa de desenvolvimento larval
e, novamente,
levar a estimativas errneas (Bourel et al., 1999).
Os insetos mais freqentemente envolvidos na estimativa de IPM so
os dpteros
sendo este, tambm, o txon mais utilizado para anlises
toxicolgicas. As espcies
predominantes pertencem s famlias Calliphoridae (varejeiras),
Sarcophagidae (moscas
da carne) e Muscidae (moscas domsticas). As moscas pertencentes
a estas famlias so
altamente mveis, resistentes ao vo e tipicamente os primeiros
insetos a chegarem num
corpo em decomposio. Calliphoridae e Sarcophagidae podem chegar
minutos aps a
morte, principalmente em climas tropicais e estudos de
comunidades de carcaas tem
demonstrado que muscides geralmente atrasam a colonizao at o
perodo final do
estgio de decomposio fresco ou at o incio do estgio inchado
(Goff & Lord, 1994).
Quando uma fonte apropriada localizada, as moscas adultas comeam
a ovipor
ou a se alimentar da fonte protica para mais tarde ovipor. Em
cadveres sem feridas, os
stios preferenciais de oviposio sero, geralmente, os orifcios
naturais do corpo (olhos,
orelhas, nariz, boca e quando expostos nus e genitlias). Os
ferimentos ou sangue
podero fornecer stios preferenciais de oviposio, embora essa
atrao seja varivel
conforme espcies de moscas envolvidas e grau de ferimento (Goff
& Lord, 1994).
Os ovos das moscas varejeiras so pequenos (2-3 mm), alongados e
de cor
branco-amarelada. So tipicamente depositados em grandes
aglomerados, podendo
preencher os orifcios naturais ou locais de ferimentos. O estgio
de ovos para as moscas
varejeiras dura entre um a trs dias quando eclodem larvas
alongadas que possui na
extremidade anterior um par de ganchos orais que so usados para
alimentao e
locomoo. A parte posterior possui um par de espirculos pelo qual
as larvas respiram.
Elas crescem rapidamente passando por trs estdios ou instares
antes de alcanar o
tamanho mximo (Goff & Lord, 1994; Greenberg & Kunich,
2002).
O primeiro estdio dura cerca de um dia quando ocorre a muda para
o segundo
estdio que, por sua vez, pode durar um ou dois dias quando muda
para o terceiro estdio
que dura por cinco ou seis dias quando param de se alimentar e
entram e fase de pr-pupa
(Erzinlioglu, 2003).
-
8
Os ovos colocados num corpo eclodiro sincronizadamente
resultando em uma
massa de larvas que se movimentam sobre o corpo e se alimentam
como um grupo. Esse
comportamento resulta na disseminao de bactrias e produo de
enzimas digestivas
que possibilitam s larvas consumir maior parte do tecido mole de
maneira altamente
eficiente. O tamanho mximo das larvas atingido num perodo que
varia de dias at
semanas, dependendo da espcie envolvida, nmero de larvas
presente e condies
ambientais. Aps atingirem o tamanho mximo, as larvas sofrem uma
mudana
dramtica no comportamento, param a alimentao e comeam a migrar
para fora da
fonte alimentar. Essa migrao , geralmente, para uma rea seca
onde as larvas se
enterram no substrato e comeam a pupariar (Goff & Lord,
1994; Erzinlioglu, 2003).
A pupariao em moscas um processo complexo e seqencial que
transforma a
cutcula branca e mole da larva num puprio escuro e rgido. Nesse
puprio, a larva sofre
uma reorganizao celular onde ocorre o encurtamento e expanso
dela, retrao
irreversvel dos trs segmentos anteriores e contrao e estabilizao
da cutcula. O
perodo requerido para essa transformao varia conforme a espcie
da mosca e as
condies ambientais, principalmente temperatura. O puprio pode
permanecer intacto
por anos ao redor do corpo em decomposio podendo fornecer
informaes valiosas at
muito tempo depois de o corpo ter sido totalmente decomposto
(Greenberg, 1991; Goff &
Lord, 1994).
O ciclo de vida dos sarcofagdeos similar ao das moscas
varejeiras exceto pelo
fato de que eles no ovipositam, mas depositam larvas de primeiro
estdio no substrato
escolhido como fonte. Esse processo exige que a larva em
desenvolvimento seja mantida
por mais tempo no corpo da fmea do que um ovo. No entanto, o
nmero de
descendentes produzidos por fmea menor para essa famlia do que
para califordeos e
muscdeos (Goff & Lord, 1994).
1.1 Entomotoxicologia
A Entomotoxicologia um campo relativamente recente dentro da
Entomologia
Forense e que consiste na deteco e anlise da interferncia de
substncias txicas sobre
a biologia de insetos que se alimentam de carcaas para auxiliar
na identificao de
-
9
drogas e toxinas presentes em tecidos de corpos que tenham vindo
a bito por overdose
(Goff & Lord, 1994; Introna et al., 2001). Isto
especialmente til quando no possvel
coletar amostras de tecidos, sangue ou urina de cadveres por
estarem esqueletizados ou
em estado avanado de putrefao, servindo os insetos como
alternativa segura para tais
anlises (Pien et al., 2004).
As larvas so relativamente fceis de serem coletadas e mantidas
em laboratrio e
tambm podem apresentar menos contaminantes que alguns tecidos
comumente usados
para anlise toxicolgica (Carvalho et al., 2001;
Gangliano-Candela & Aventaggiato,
2001).
No entanto, a utilizao de insetos para anlise toxicolgica
quantitativa pode no
ser uma ferramenta confivel, pois existe uma srie de fatores que
influenciam na
concentrao da substncia tais como, a redistribuio ps-morte das
drogas no corpo
humano, a estabilidade das drogas nos restos humanos,
especialmente de onde as larvas
so retiradas e a farmacocintica de cada substncia a ser
considerada nos imaturos
(Campobasso et al., 2004; Tracqui et al., 2004). Por outro lado,
a no deteco de uma
substncia em larvas que se alimentam da carcaa no implica,
necessariamente, na
ausncia da mesma na fonte alimentar (Campobasso et al.,
2004).
Muitos estudos recentes tm detectado toxinas e substncias
controladas tanto no
inseto como nos restos quitinizados recolhidos de vtimas em
estgio avanado de
decomposio (Goff & Lord, 2001). Nesses casos, os insetos tm
sido homogeneizados e
processados de maneira similar realizada nos tecidos ou fluidos
mais tradicionalmente
analisados por diversos mtodos, tais como imuno-radio ensaio
(RIA), cromatografia
gasosa (GC), cromatografia gasosa associada espectrometria de
massa (GC/MS),
cromatografia de camada delgada (TLC), cromatografia lquida de
alta perfomance
associada espectrometria de massa (HPLC/MS) e imunohistoqumica
(IHQ) (Bourel et
al., 2001; Goff & Lord, 2001; Introna et al, 2001).
1.2 - Aplicaes da Entomotoxicologia
-
10
1.2.1 - Deteco de Substncias Txicas em Larvas de insetos
necrfagos
O uso abusivo de frmacos prescritos para tratamento mdico de
constante
interesse no mbito forense, pois pode determinar a tipificao da
morte a esclarecer, ou
seja, diferenciar se um caso de homicdio ou suicdio.
Beyer et al. em 1980 sugeriram o emprego de insetos como fonte
alternativa para
deteco de drogas quando tiveram um caso no qual o corpo de uma
mulher, de 22 anos,
foi encontrado 14 dias aps seu desaparecimento e o seu estado de
decomposio era de
quase completa esqueletizao no havendo tecido humano suficiente
para o exame
toxicolgico. No local havia um frasco vazio com capacidade para
100 comprimidos
conforme indicado no rtulo que informava se tratar de
fenobarbital (uma substncia da
classe dos barbitricos utilizada terapeuticamente como
anticonvulsivante) e cuja
fabricao datava de dois dias antes da data do desaparecimento.
Alm disso, essa moa
j apresentava histrico de doena mental e de diversas tentativas
de suicdio. No local
foram coletadas larvas da mosca Cochliomyia macelaria (F.)
(Diptera: Calliphoridae) que
foram utilizadas com sucesso como amostra para deteco de
fenobarbital por
cromatografia gasosa e confirmao por cromatografia de camada
delgada.
Num caso de um homem de 49 anos, morto h 67 dias, em estado de
completa
putrefao, Kintz et al. (1990a), visando verificar a validade do
emprego de insetos como
fonte alternativa para exames toxicolgicos, conseguiram
detectar, por cromatografia
lquida de alta presso, nos tecidos do cadver e em larvas de
califordeos coletados do
cadver a presena de cinco drogas: triazolam e oxazepam
(pertencentes classe dos
benzodiazepnicos que esto entre os frmacos mais prescritos e tm
ao anti-ansioltica,
anticonvulsivante, relaxante muscular e hipntico), fenobarbital
(um barbitrico prescrito
para tratamento de ataques de convulso), alimemazine (um frmaco
derivado das
fenotiazinas com ao anti-prurido alm de ao sedativa e
anti-nuseas) e clomipramine
(uma droga classificada como psicoativa de ao antidepressiva e
anti-ansioltica).
Tambm observaram que os picos endgenos nos cromatogramas obtidos
da extrao dos
imaturos eram menores que aqueles dos tecidos humanos.
Kintz et al. (1990b), num outro estudo de caso no qual um homem
de 65 anos,
desaparecido por seis meses foi encontrado morto e dele foram
coletados insetos
sarcosaprfagos da espcie Piophila casei (Piophilidae),
detectaram, por HPLC,
-
11
bromazepam (um diazepnico) e levomepromazina (uma fenotiazina de
poder sedativo).
Neste caso no conseguiram estabelecer relao entre a concentrao
da droga presente
no tecido humano e a existente nas larvas.
Em 1993, Goff et al. realizaram pesquisas experimentais com
Parasarcophaga
ruficornis, um sarcofagdeo muito freqente em corpos em
decomposio no Hava,
criando-os em tecidos de coelhos nos quais havia sido
previamente injetados amitriptilina
e nortriptilina, frmacos com fins antidepressivos e que esto
entre os mais utilizados em
casos de suicdio na regio de estudo considerada. A deteco feita
por HPLC mostrou
que o frmaco pode ser recuperado de forma eficiente ao se
examinar amostras de todos
os grupos tratados, confirmando que insetos so fontes
alternativas confiveis para a
realizao de exames toxicolgicos.
Sadler et al. (1995) em estudos com larvas de Calliphora vicina
criadas em
tecidos humanos provenientes de trs casos de suicdio por
overdose de medicamentos
prescritos conseguiram detectar, por HPLC, trazodone (um
componente psicoativo de
propriedades sedativa, ansioltica e antidepressiva),
trimipramine e amitriptilina
(pertencentes classe dos antidepressivos tricclicos de
propriedades sedativas e
ansiolticas) e temazepam (um benzodiazepnico) nas larvas em
concentraes menores
das existentes nos tecidos e observou que a concentrao das
drogas nas larvas diminuiu
aps oito dias, perodo associado pupariao. Os nveis de drogas
medidos devem
indicar absoro nos tecidos larvais, pois uma droga ser detectada
na larva, quando sua
taxa de absoro for maior do que a de excreo, e a droga atinge um
nvel na larva
acima do limite de deteco do mtodo analtico. Tambm constataram
que larvas de
Calliphora vicina tm uma capacidade de eliminar essas drogas,
fato observado quando
foram transferidas para uma dieta livre de drogas e aps um curto
perodo de tempo as
drogas j tinham sido eliminadas.
Outra preocupao o aumento do consumo de drogas de abuso, ou
seja, aquelas
que no so utilizadas com fins teraputicos, mas sim como forma de
entretenimento
como a cocana, a herona, a maconha, o ecstasy, a metanfetamina
entre outros.
Nolte e colaboradores, em 1992, ao coletarem larvas mortas de
Calliphora vicina
de um cadver pertencente a um usurio de cocana, de 29 anos,
esqueletizado,
conseguiram detectar nestes espcimes, por RIA e confirmado por
GC/MS, a presena de
-
12
cocana o que ajudou na determinao da causa da morte, uma vez que
nem no local nem
durante a necropsia foram encontrados vestgios que pudessem
indicar alguma forma de
morte violenta.
Goff et al. (1989; 1991) tambm observaram, atravs do mtodo de
imuno-rdio
ensaio, presena de cocana (uma droga alcalide estimulante) e
herona (um derivado
opiide com ao estimulante e analgsica), duas drogas com alta
taxa de abuso nos
EUA, em experimentos nos quais administraram essas drogas em
coelhos e os tecidos
destes foram servidos de substrato para desenvolvimento de
larvas de Boettcherisca
peregrina.
Introna et al. (1990) coletaram 40 fgados de corpos cujo exame
toxicolgico era
positivo para opiceos, ou seja, derivados do pio com ao
analgsica, e criaram, nestes
tecidos, larvas de Calliphora vicina. As larvas de 3o estdio
foram coletadas e analisadas
por RIA e constataram que a concentrao detectada nas larvas
correspondia s
concentraes de cada fgado no qual haviam sido criadas. Pien et
al. (2004) tambm
relataram relao proporcional de concentrao de nordiazepam e/ou
seu metablito
oxazepam (benzodiazepnico de efeito sedativo e relaxante),
detectado por LC-MS/MS,
em larvas de Calliphora vicina com a concentrao da droga
presente no substrato de
alimentao, ou seja, conforme aumentou a concentrao da droga na
dieta, aumentou a
concentrao nas larvas.
No entanto, Gunn et al. (2006) ao detectarem morfina (um opiide
usado no
tratamento sintomtico da dor e muitas vezes usado como droga de
abuso), por HPLC,
em larvas de Calliphora stygia, no constataram correlao entre as
concentraes
obtidas nos tecidos e a nas larvas, porm notaram que as
concentraes de morfina
obtidas nas larvas aumentavam conforme aumentava a concentrao da
droga no
substrato do qual se alimentavam. Por sua vez, Tracqui et al.
(2004) ao detectarem
benzodiazepnicos, barbitricos, antidepressivos, fenotiazinas,
opiceos entre outras em
larvas coletadas de cadveres e nos tecidos necropsiados,
observaram que as
concentraes de todas as larvas foram sempre menores que as dos
tecidos, mas no
conseguiram estabelecer correlao entre as concentraes nas larvas
e nos tecidos
humanos.
-
13
Goff et al. (1997), alm de detectarem em imaturos da mosca
sarcofgide,
Parasarcophaga ruficornis (F.), por LC/MS,
3,4-metilenodioximetanfetamina (MDMA),
popularmente conhecido como ecstasy (uma droga alucingena e
estimulante que teve
seu uso e produo aumentados nas ltimas dcadas), reportaram uma
concentrao
maior nos puprios do que a detectada nos tecidos dos quais as
larvas se alimentaram. O
fato da deposio das toxinas na cutcula dos insetos como um mtodo
de excreo
sugere outro mecanismo potencial para o acmulo de material
ingerido em tecidos mortos
de insetos. No entanto, Goff e colaboradores (1992) no obtiveram
um resultado positivo
quando tentaram detectar metanfetamina e seu metablito
anfetamina por RIA em larvas
do sarcofagdeo Parasarcophaga ruficornis, obtendo uma reao fraca
uniforme em
todos os grupos, o que pode ser resultado de uma reao
inespecfica para outra
substncia que no a metanfetamina ou seu metablito. Por isso
concluram que RIA no
seria um bom mtodo para deteco de metanfetamina quando for
utilizada dptera como
fonte alternativa para evitar resultados falso-positivos.
Bourel et al. (2001a) conseguiram detectar morfina, pelo mtodo
da
imunohistoqumica, em larvas de Calliphora vomitoria na qual cada
espcime positivo
mostrou colorao especfica da hemolinfa sob o tegumento enquanto
os controles e as
amostras negativas no apresentaram reao de colorao. A imunorreao
mostrou-se
mais forte no limite entre a exocutcula e a endocutcula, pois
houve reteno da morfina
devido natureza hidrofbica da epicutcula. Eles observaram que
nas larvas de C.
vomitoria morfina da hemolinfa excretada por clulas epidermais e
depositada prxima
aos poros dos canais na matriz cuticular. Dessa maneira a
cutcula atua como uma forma
de depsito, quando a cutcula larval do terceiro estdio
esclerotizada para formar o
puprio, a morfina depositada prximo aos poros dos canais
incorporada ao puprio.
Em 2001b, Bourel et al. tambm detectaram, por RIA, morfina em
puprio e
adultos de Lucilia sericata Meigen (Diptera: Calliphoridae) e em
pupas ressecadas de
Dermestes frischi Kugelmann (Coleoptera: Dermestidae). As
concentraes obtidas
foram maiores nos 2o e 3o estdio enquanto quase nenhuma morfina
foi detectada nos
estgios de pr-pupa ou em pupariao. Ainda, a concentrao detectada
nos puprios
foram maiores que nos adultos. Esses resultados confirmam que as
larvas excretam a
-
14
droga no perodo ps-alimentao. No entanto, parece que enquanto a
droga excretada
em rgos larvais, uma quantidade de morfina includa na cutcula do
puprio.
Campobasso et al. (2004) usaram tecidos obtidos de 18 corpos
necropsiados
relacionados com abuso de drogas. Nos tecidos e nas larvas foram
detectados os agentes
narcticos mais comuns como opiceos e cocana, geralmente,
associados com
antidepressivos (cloripramine, amitriptilina, nortriptilina,
levomepromazine e tioridazine)
e benzodiazepnicos. Todas as drogas detectadas nos tecidos
humanos foram detectadas
nos imaturos de Lucilia sericata. Opiceos foram detectados em 14
e em oito deles
tambm foi detectada cocana. Somente em um caso foi detectado
fenobarbital associado
aos opiceos e cocana.
Neste trabalho, as concentraes de opiceos no tecido heptico
foram maiores s
observadas nas larvas que tambm foi inferior das obtidas no
sangue o que consistente
com a metabolizao e eliminao das drogas durante o
desenvolvimento larval. Em
quatro casos, as larvas que ainda estavam se alimentando dos
tecidos apresentaram
concentraes maiores do que as observadas no sangue,
provavelmente devido ao
armazenamento de alimento no papo que se expande muito durante o
perodo de
alimentao e esvazia rapidamente aps essa fase e o contedo
estomacal rapidamente
digerido. Exceto pelos antidepressivos, todos os nveis de drogas
detectados nas larvas
ps-alimentao foram menores que nas larvas em fase de alimentao
(Campobasso et
al., 2004).
1.2.2 - Acumulao biolgica (Bioacmulo)
A acumulao biolgica a concentrao progressiva de uma substncia ao
longo
de uma cadeia alimentar, de forma a apresentar nveis mais
elevados nos tecidos de
organismos de nveis trficos mais altos (ACIESP, 1997). O
bioacmulo de uma
substncia ocorre no organismo quando a absoro de tal substncia
mais rpida do que
sua excreo/eliminao.
Dentre as aplicaes forenses podemos citar, alm de crime
ambiental, deteco
de envenenamento por substncia capaz de bioacumular e tambm a
determinao de
rea geogrfica de origem da vtima como no caso apresentado por
Nuorteva (1977) onde
moscas adultas coletadas de um corpo em decomposio de uma mulher
no identificada
-
15
encontrada numa rea rural de Inkoo, na Finlndia e analisadas
para contedo de
mercrio foram usadas para determinar a regio geogrfica de origem
da vtima. A baixa
concentrao de mercrio nas moscas adultas indicou que aquela
mulher era de uma rea
relativamente livre de poluio por mercrio. Quando a vtima foi
identificada, provou-se
que ela era uma estudante de Turku, na Finlndia, uma cidade
relativamente livre de
poluio por mercrio comprovando os achados entomolgicos.
Nuorteva & Nuorteva (1982) tambm recuperaram mercrio de
larvas de vrias
espcies de moscas varejeiras (Calliphoridae) criadas em tecidos
de peixes contendo
concentraes conhecidas do metal pesado mostrou bioacmulo nas
larvas em
desenvolvimento conforme se alimentavam do tecido contaminado e
este acmulo
parecia estar relacionado presena do mercrio na forma metilada.
O mercrio ingerido
foi retido at o estgio de pupa e detectvel nos adultos
emergentes. No foram
observados efeitos adversos do bioacmulo nem no adulto nem nas
larvas, exceto por
algumas vezes dificuldade em pupariao.
Como extenso a este estudo, adultos de besouros estafilindeos,
Creophilus
maxillosus (Linnaeu) foram alimentados com larvas criadas em
meio contendo mercrio,
e pde-se observar acmulo secundrio nestes insetos sem efeitos
adversos
diferentemente do que ocorreu com besouros tenebriondeos,
Tenebrio molitor (L.) que
apresentaram irregularidades no controle motor quando
alimentados de larvas
contaminadas por mercrio. Alm disso, observaram que larvas
criadas em peixes
coletados de uma regio da Iugoslvia tinham um coeficiente de
bioacmulo menor do
que as criadas em peixes coletados na Finlndia, pois a
porcentagem da forma metilada
do mercrio menor na Iugoslvia do que na Finlndia (Nuorteva &
Nuorteva, 1982).
Sohal & Lamb (1977; 1979) tambm demonstraram o acmulo de
vrios metais
(entre eles cobre, ferro e zinco) e clcio em tecidos de adultos
de mosca domstica,
Musca domestica (L.) e nenhum efeito negativo foi associado ao
bioacmulo desses
metais.
No entanto, Sadler et al. (1997) no conseguiram observar
bioacmulo de
barbitricos em larvas de moscas varejeiras, Calliphora vicina,
criadas em dieta artificial.
Alm disso, observaram que at compostos quimicamente semelhantes
pareceram ser
processados diferentemente pelas larvas. Tambm preveniram quanto
interpretao
-
16
quantitativa dos achados entomotoxicolgicos dado ao conhecimento
limitado da maneira
como drogas e toxinas so absorvidas pelos insetos imaturos.
1.2.3 - Atratividade na colonizao
A atratividade de colonizao um fator importante a ser
considerado na
Entomologia Forense principalmente nos casos envolvendo morte
relacionada a
envenenamento, pois este fator pode levar a concluses errneas
quando estimado o IPM
baseado no desenvolvimento larval.
Gunatilake & Goff (1989), por exemplo, detectaram o
inseticida organofosforado
Malathion em larvas de moscas de duas espcies de Calliphoridae,
Chrysomya
megacephala (Fabricius) e C. rufifacies (Macquart) coletadas dos
restos de um cadver.
significativo que as larvas das duas espcies de Chrysomya
indicavam um intervalo ps-
morte de cinco dias enquanto a vtima tinha sido vista viva pela
ltima vez oito dias antes
de ser encontrado o corpo, o que pode indicar que a presena de
Malathion teria atrasado
a oviposio por um perodo de dias. Alm disso, esperada uma fauna
maior de moscas
varejeiras e besouros predadores nesse espao de tempo (entre
cinco e oito dias) numa
rea aberta no Hava, o que sustenta a noo de que a ingesto de
Malathion teve uma
influncia negativa na colonizao do cadver por insetos.
Diferentemente do observado com o malathion, Borges & Melo
(1999), ao
trabalhar com carcaas de ratos injetados com ivermectina antes
de serem sacrificados e
colocados em campo, observaram que no havia diferena
significativa na atratividade
das carcaas entre o grupo controle e o experimental, que se
apresentaram semelhantes
tanto quantitativamente quanto qualitativamente.
1.2.4 - Efeito das drogas sobre o desenvolvimento larval
Ao fornecer uma estimativa de IPM, especialmente entre as
primeiras duas e
quatro semanas de decomposio, assume-se que o inseto desenvolver
em taxas
previsveis, dadas certas condies ambientais, sendo necessrio
considerar o efeito das
drogas no desenvolvimento destes insetos (Goff & Lord,
2001).
Estudos sobre a influncia das drogas no desenvolvimento dos
insetos podem ser
feitos atravs de dietas artificiais, acrescendo concentraes
conhecidas de droga ou
-
17
toxina ou, ainda, serem administradas oralmente ou por infuso
num modelo animal vivo,
sendo os tecidos de tal vertebrado utilizados como fonte de
alimento para as larvas de
insetos, permitindo que tais drogas ou toxinas sejam
metabolizadas pelo vertebrado antes
da ingesto pelo inseto (Goff & Lord, 2001).
Goff et al. (1989) em seus estudos sobre o efeito da cocana no
desenvolvimento
de larvas do sarcofagdeo Boettcherisca peregrina
(Rodineau-Desvoidy) em fgados de
coelhos previamente tratados com doses conhecidas da droga,
observaram dois padres
de desenvolvimento: as colnias controle e dose subletal (1/2xDL)
tiveram
aproximadamente a mesma taxa de desenvolvimento enquanto as
colnias de dose letal
(1xDL) e duas vezes a dose letal (2xDL) desenvolveram-se mais
rpido, ocorrendo
pupariao primeiro nestes dois grupos.
Carvalho (2004) tambm estudou o efeito da cocana no
desenvolvimento larval
de Chrysomya albiceps e C. putoria, duas espcies de interesse
forense no Brasil, onde
observou que na 6 e 18 hora de observao e pesagem, as larvas
controle de C. albiceps
se desenvolveram mais rpido que as expostas droga e o inverso
ocorreu com as larvas
de C. putoria. s 24 horas de experimento, o desenvolvimento de
C. albiceps do grupo
controle foi maior do que as expostas cocana, e nenhuma diferena
significativa foi
observada para C. putoria. Na pesagem de 30 e 42 horas,
verificou-se que no houve
diferena significativa no desenvolvimento de C. albiceps, mas as
larvas de C. putoria
expostas droga se desenvolveram significativamente mais rpido em
relao ao
controle. Tambm foi constatado que as larvas expostas ao fgado
contendo cocana
iniciaram e terminaram o processo de pupariao antes que as do
controle, com uma
diferena entre eles do incio ao fim deste processo de
aproximadamente 13 h. As
diferenas entre o tempo de emergncia dos adultos foram
significativas para ambas as
espcies expostas droga, sendo de aproximadamente 60 h em relao
ao controle.
Um caso interessante relacionado ao efeito da cocana no
desenvolvimento de
imaturos relatado por Lord (1990) onde o corpo de uma mulher
branca, de
aproximadamente 20 anos, foi descoberto prximo a uma regio de
pinheiros em
Spokane, Washington EUA. O cadver estava em fase inicial do
estgio inchado e
apresentava uma grande populao de larvas localizadas no rosto e
parte superior do
tronco. As larvas foram coletadas, criadas at adultos,
identificadas e classificadas em
-
18
trs classes, de acordo com o tamanho: entre seis e nove mm de
comprimento que seria
correspondente a um IPM de cerca de sete dias; menores que seis
mm que poderia indicar
que moscas teriam oviposto em diferentes tempos na carcaa e uma
nica larva de 17,7
mm recuperada da regio naso-farngea o que indicaria um perodo de
IPM de
aproximadamente trs semanas o que no era possvel conforme outros
dados existentes
sobre o caso. Foi suposto que a larva poderia ter migrado de
outro cadver, porm no foi
encontrado nenhum outro corpo na regio. Uma explicao alternativa
foi a de que o
crescimento da larva foi aumentado, pois estava localizado numa
regio nasal que
continha alguma concentrao de cocana. Uma investigao subseqente
revelou que a
vtima era usuria de cocana e tinha sido vista utilizando a droga
antes de morrer.
Goff et al. (1991), trabalhando com Boettcherisca peregrina,
investigaram o
efeito da herona, um opiide de uso recreativo muito freqente nos
EUA, no seu
desenvolvimento larval e os resultados apontaram para um
desenvolvimento mais rpido
dos grupos experimentais do que os grupos controles alm da
produo de larvas maiores
em todos os grupos tratados. O tempo de pupa durou mais para
todas as colnias
experimentais e pareceu ser proporcional quantidade de droga
administrada. O estudo
demonstrou que um erro de at 29 h ocorre quando a estimativa de
IPM baseada no
desenvolvimento larval cujo substrato contenha herona e entre 18
e 38 h se baseado na
durao do estgio de pupa.
Do mesmo modo, Karbouche et al. (2008), usando fgados de porcos
tratados com
soluo contendo concentraes conhecidas de codena, verificaram que
larvas de Lucilia
sericata desenvolviam mais rpido nos grupos tratados do que no
controle e que
diferena significativa no peso corporal larval tambm foi
verificada entre os grupos
experimentais (mais pesados) e o grupo controle. Em termos
quantitativos no foi
encontrada relao entre as concentraes existentes nos fgados e as
obtidas nas larvas.
Diferentemente do observado por Bourel et al. (1999) que
utilizaram coelhos
infundidos com hidrocloridrato de morfina, um derivado opiide de
poder analgsico, em
trs concentraes diferentes e observaram diferena no comprimento
das larvas de
Lucilia sericata criadas em tecidos experimentais em relao ao
controle nos tempos de
41 h e 69 h e, depois, nos tempos de 91, 116 e 140 h, no
entanto, no foram observadas
diferenas entre os grupos controle e de 25 mg/kg no tempo de 69
h, nem entre as larvas
-
19
dos grupos 12,5 mg/kg e 50 mg/kg nos tempos 69, 116 e 140 h. O
incio do estgio de pr-pupa ocorreu mais tardiamente no grupo 12,5
mg/kg. Quanto ao peso houve um
aumento at o estgio pr-pupa quando iniciou decrscimo at
estabilizar na fase de pupa.
Observaram ainda que a taxa de desenvolvimento do grupo
experimental de maior
concentrao foi mais devagar que a dos demais grupos.
No entanto, Grella & Thyssen (2008), em trabalho com larvas
do califordeo
Chrysomya megacephala, criadas em dieta artificial acrescidas de
Cloridrato de
oxycodone, um opiide analgsico semi-sinttico similar morfina,
muito prescrito para
tratamento de dores moderadas a dores intensas, no observaram
diferenas significativas
no desenvolvimento entre os grupos controle e os grupos
experimentais, sugerindo a no
metabolizao dessas drogas pelas larvas nem seu bioacmulo. Alm
disso, a no
influncia da droga se confirmou com uma alta taxa de viabilidade
de adultos para todos
os grupos.
Goff et al. (1993), testaram o antidepressivo amitriptilina em
P. ruficornis e no
observaram diferena significativa na taxa de desenvolvimento em
relao s
concentraes administradas. A durao do perodo ps-alimentao foi
maior nos
grupos tratados assim como a mortalidade larval. O perodo de
estgio de pupa tambm
foi maior nos grupos tratados com concentraes maiores que uma
dose letal.
Goff e colaboradores (1994) pesquisaram o efeito da
fenciclidina, uma droga de
abuso comum nos EUA (denominada PCP) e tambm utilizada como
tranqilizante
veterinrio, no desenvolvimento de imaturos do sarcofagdeo P.
ruficornis e no
observaram diferenas significativas na taxa de desenvolvimento
total dos insetos, porm
observaram uma diferena na durao do perodo ps-alimentar quando
as larvas dos
grupos experimentais desenvolveram mais rapidamente que as do
controle resultando
num intervalo entre trs e 17 h menor para os tratados.
Em estudos com metanfetamina (um derivado anfetamnico utilizado
como agente
aneroxgeno ou tambm como droga recreativa na forma de cristais
denominada ice)
realizados por Goff et al. (1992) houve aumento da taxa de
desenvolvimento do
sarcofagdeo Parasarcophaga ruficornis para as colnias
alimentadas com tecidos
contendo uma dose letal (1xDL) e duas vezes a dose letal (2xDL)
quando comparadas aos
-
20
grupos com meia dose letal (1/2xDL) e controle, que
desenvolveram na mesma taxa. A
mortalidade de pupas foi maior nas colnias 1/2xDL e 1xDL.
Carvalho (2004) estudou o efeito de outro derivado anfetamnico
muito utilizado
como inibidor de apetite no Brasil, a anfepramona, em larvas de
Chrysomya albiceps e C.
putoria onde verificou que esta droga no exerce efeitos
significativos no
desenvolvimento de imaturo de C. albiceps. No entanto, a partir
de 24 horas de contato
com a anfepramona, houve uma diferena significativa no
desenvolvimento das larvas de
C. putoria em relao ao controle, sendo que no fim das 54 horas,
o seu peso era quase o
dobro do controle. Tambm verificou que para C. putoria, as
diferenas no tempo de
pupariao foram significativas, com as larvas dos grupos
experimentais empupando
mais rapidamente que as controle. Foi observado que o tempo de
emergncia dos adultos
das duas espcies cujas larvas estiveram em contato com a
anfepramona foi menor que o
grupo controle, embora a diferena no tenha sido significativa
para C. albiceps,
enquanto que para C. putoria foi altamente significativo, com
uma diferena de 48 horas
entre o grupo experimental e o controle.
Goff et al. (1997), em trabalho sobre o efeito de outro derivado
anfetamnico, o
MDMA (principal componente do ecstasy), sobre o desenvolvimento
de imaturos de
Parasarcophaga ruficornis tambm observaram que entre as horas 24
e 114 de
desenvolvimento, os grupos controle e 2xDL desenvolveram mais
rpido que os demais
grupos e que a mortalidade larval e de pupa foi maior nas
colnias controle e 1/2xDL de
MDMA e menor nas colnias 2xDL. E quando considerado o tempo de
desenvolvimento
total (larva-adulto) o do grupo 2xDL foi menor.
Num trabalho com ivermectina, Borges & Melo (1999)
observaram que o
desenvolvimento das larvas foi retardado e um nmero menor de
larvas conseguiu
completar o desenvolvimento na carcaa tratada com o frmaco.
Em trabalho usando como animais modelo o coelho, Carvalho et al.
(2001),
estudou o efeito do diazepam (um benzodiazepnico muito prescrito
por mdicos) no
desenvolvimento de larvas de Chrysomya albiceps e C. putoria, e
constatou que larvas do
grupo controle se desenvolveram mais devagar que os grupos
experimentais, alm das
larvas dos grupos experimentais pesarem mais que as do controle.
Pien et al. (2004)
tambm constataram que as larvas de Calliphora vicina (Diptera:
Calliphoridae) dos
-
21
grupos experimentais eram mais pesadas que o dos grupos controle
quando realizaram
experimentos utilizando trs concentraes de nordiazepam (um
benzodiazepnico de
efeito sedativo e relaxante e o principal metablito do diazepam)
em larvas e puprios de
Calliphora vicina. Observaes dirias de larvas em estgio
ps-alimentar, e a deteco
do metablito do nordiazepam, o oxazepam, aps o segundo dia de
experimento, sugerem
que houve metabolizao e acmulo do frmaco estudado. Porm, no
geral, todos os
grupos (experimentais e controle) desenvolveram na mesma
taxa.
Musvasva et al. (2001) num trabalho com larvas de Sarcophaga
tibialis (Diptera:
Sarcophagidae) criadas em substrato contendo sdio-metohexital
(barbitrico e depressor
metablico) ou hidrocortisona (esteride comumente usado para
tratamento de
inflamaes e estimulante metablico) em diferentes concentraes
perceberam que a
presena de sdio-metohexital ou seus metablitos retardou
significantemente o
desenvolvimento larval de S. tibialis, principalmente quando em
pequenas doses bem
como a hidrocortisona e seus produtos de quebra, onde tambm foi
observado atraso
significante no desenvolvimento larval. Nos dois casos o estgio
de pupa pareceu ter uma
tendncia oposta ao do estgio larval.
OBrien & Turner (2004) verificaram que larvas de Calliphora
vicina criadas em
substrato contendo paracetamol acelera suavemente o
desenvolvimento larval durante os
dias dois e quatro, o que pode resultar numa diferena de,
aproximadamente, 12 h na
estimativa do IPM neste intervalo. Porm, de forma geral, nenhuma
diferena
significativa foi observada no desenvolvimento larval entre os
grupos experimentais e o
grupo controle.
Ferrari et al. (2008) verificaram, ao trabalhar com larvas de
Chrysomya albiceps
criadas em dieta artificial acrescida do hormnio testosterona,
que as larvas do grupo
experimental apresentaram mdia do peso corporal cinco vezes
maior do que a mdia de
peso corporal das larvas do grupo controle (6,0 mg e 1,2 mg por
larva, respectivamente) e
que a diferena verificada no tamanho era bastante ntida.
Grella et al. (2007) trabalharam com dietas artificiais
acrescidas de escopolamina,
uma droga muito usada como analgsico (princpio ativo do
Buscopam), onde criaram
imaturos de Chrysomya putoria, e puderam observar que os grupos
controle e tratamento
0,25xDL, tinham peso corporal maior do que os demais grupos
experimentais e que o
-
22
grupo 1xDL teve seu tempo de desenvolvimento larval aumentado em
relao aos demais
grupos. Alm disso, o grupo tratado com 2xDL teve 100% de
mortalidade no 2o estdio
larval, ou seja, no completou seu desenvolvimento. A
sobrevivncia observada mostrou-
se menor conforme o aumento de concentrao da droga na dieta.
Similarmente, Oliveira et al. (2009) trabalharam com buscopam,
cujo princpio
ativo o brometo de butilescopolamina, acrescido em dieta
artificial que foi usado como
fonte de alimento para imaturos de C. megacephala, onde
observaram uma diferena
significativa no tempo de desenvolvimento larval na diferentes
concentraes formando
um gradiente de diminuio de peso conforme aumentava a concentrao
da droga na
dieta. O tamanho larval tambm foi diferente sendo que quanto
maior a concentrao da
droga menor era a larva. Tambm observaram que quanto maior a
concentrao da droga
maior era a mortalidade principalmente nos estgios larvais. Alm
disso, a concentrao
de uma dose letal de rato no substrato utilizado como fonte de
alimento para as larvas
ocasionou um atraso de 54 h no desenvolvimento larval, o que
poderia alterar a
estimativa de IPM num caso envolvendo o uso dessa droga prvio
morte.
Um resumo dos trabalhos relacionados entomotoxicologia pode ser
observado
na Tabela 1.
-
23
Tabela 1. Resumo dos trabalhos sobre entomotoxicologia Classe do
Agente Txico estudado Agente txico Espcie
Mtodo de deteco Efeitos observados
Autores do Trabalho
Cochliomyia macelaria (Diptera: Calliphoridae)
GC/MS e TLC
Beyer et al.,1980 Fenobarbital
Calliphoridae (Diptera) HPLC Concentrao da droga nas larvas
menor do que a dos tecidos Kintz et al., 1990a
Calliphoridae (Diptera) GC/MS ou LC/MS
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos e
nenhuma relao entre
concentraes nas larvas com a nos tecidos
Tracqui et al., 2004
Amobarbital, Fenobarbital,
Tiopental, Barbital
Calliphora vicina (Diptera: Calliphoridae) HPLC No observou
bioacmulo Sadler et al., 1997
Barbitricos
Sdio-metohexital
Sarcophaga tibialis (Diptera: Sarcophagidae) Retardo
significativo do desenvolvimento larval
Musvasva et al., 2001
triazolam e oxazepam Calliphoridae (Diptera)
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos Kintz
et al., 1990a
bromazepam Piophila casei (Piophilidae) Nenhuma relao entre
concentraes nas larvas
com a nos tecidos Kintz et al., 1990b
temazepam Calliphora vicina (Diptera: Calliphoridae)
HPLC
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos Sadler
et al., 1995
Nordiazepam Calliphora vicina (Diptera: Calliphoridae) LC-
MS/MS
Relao proporcional entre concentrao nas larvas e nos tecidos
humanos; larvas mais
pesadas que as do controle Pien et al., 2004
Calliphoridae (Diptera) GC/MS ou LC/MS
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos e
nenhuma relao entre concentraes nas larvas e nos tecidos
Tracqui et al., 2004
Lucilia sericata (Diptera: Calliphoridae) GC/MS
Nveis de drogas detectados nas larvas ps-alimentao menores que
nas em alimentao
Campobasso et al., 2004
Chrysomya albiceps (Diptera: Calliphoridae)
Benzodiazepnicos
Diazepam Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae)
GC/MS Acelerao do desenvolvimento larval; larvas mais pesadas
que as do controle Carvalho et al.,
2001
-
24
Tabela 1. Continuao Classe do Agente Txico estudado Agente txico
Espcie
Mtodo de deteco Efeitos observados
Autores do Trabalho
Alimemazine Calliphoridae (Diptera) Concentrao da droga nas
larvas menor do que
a dos tecidos Kintz et al., 1990a
levomepromazina Piophila casei (Diptera: Piophilidae)
HPLC Nenhuma relao entre concentraes nas larvas e nos tecidos
Kintz et al., 1990b
Calliphoridae (Diptera) GC/MS ou
LC/MS
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos e
nenhuma relao entre concentraes nas larvas e nos tecidos
Tracqui et al., 2004
Fenotiazina
levomepromazine e tioridazine
Lucilia sericata (Diptera:
Calliphoridae) GC/MS Nveis de drogas detectados nas larvas
ps-alimentao menores que nas em alimentao
Campobasso et al., 2004
clomipramine Calliphoridae (Diptera) Concentrao da droga nas
larvas menor do que
a dos tecidos Kintz et al., 1990a
amitriptilina e nortriptilina
Parasarcophaga ruficornis (Diptera:
Sarcophagidae)
Nenhuma diferena significativa foi observada na taxa de
desenvolvimento; a durao do
perodo ps-alimentao e pupa maior assim como a mortalidade
larval
Goff et al., 1993
trazodone, trimipramine e amitriptilina
Calliphora vicina (Diptera:
Calliphoridae)
HPLC
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos Sadler
et al., 1995
Calliphoridae (Diptera) GC/MS ou
LC/MS
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos e
nenhuma relao entre concentraes nas larvas e nos tecidos
Tracqui et al., 2004
Antidepressivo
Cloripramine, amitriptilina, nortriptilina
Lucilia sericata (Diptera:
Calliphoridae) GC/MS Nveis de drogas detectados nas larvas
ps-alimentao menores que nas em alimentao
Campobasso et al., 2004
-
25
Tabela 1. Continuao Classe do Agente Txico estudado Agente txico
Espcie
Mtodo de deteco Efeitos observados
Autores do Trabalho
Paracetamol Calliphora vicina
(Diptera: Calliphoridae)
Acelerao do desenvolvimento larval durante os dias 2 4
resultando em diferena de,
aproximadamente, 12 h
OBrien & Turner, 2004
Escopolamina Chrysomya putoria
(Diptera: Calliphoridae)
Retardo do desenvolvimento de grupos com maior concentrao.
Grella et al., 2007 Analgsico
Buscopam
Chrysomya megacephala
(Diptera: Calliphoridae)
Retardo do desenvolvimento de grupos com maior concentrao.
Oliveira et al., 2009
Hidrocortisona Sarcophaga tibialis
(Diptera: Sarcophagidae)
Retardo significativamente o desenvolvimento larval
Musvasva et al., 2001
Hormnio
Testosterona Chrysomya albiceps
(Diptera: Calliphoridae)
Mdia do peso corporal cinco vezes maior do
que a do grupo controle Ferrari et al., 2008
Boettcherisca peregrine RIA
Acelerao do desenvolvimento larval quando em alta concentrao
Goff et al., 1989
Chrysomya albiceps (Diptera:
Calliphoridae) Estimulante Cocana
Chrysomya putoria (Diptera:
Calliphoridae)
Acelerao do perodo de pupariao resultando em diferena de,
aproximadamente, 13 h Carvalho, 2004
-
26
Classe do Agente Txico estudado Agente txico Espcie
Mtodo de deteco Efeitos observados
Autores do Trabalho
Herona Boettcherisca peregrina RIA Acelerao do desenvolvimento e
larvas
maiores que a do grupo controle Goff et al., 1991
Calliphora vicina (Diptera:
Calliphoridae) RIA Concentrao nas larvas correspondente
concentrao nos tecidos
Introna et al., 1990
Calliphoridae (Diptera)
GC/MS ou LC/MS
Concentrao da droga nas larvas menor do que a dos tecidos e
nenhuma relao entre concentraes nas larvas e nos tecidos
Tracqui et al., 2004
Lucilia sericata (Diptera:
Calliphoridae) GC/MS Concentraes no tecido maiores que a das
larvas
Campobasso et al., 2004
Calliphora stygia (Diptera:
Calliphoridae) HPLC Relao de proporcionalidade entre a
concentrao das larvas com a dos tecidos Gunn et al., 2006
Calliphora vomitoria (Diptera:
Calliphoridae) IHQ Deposio da droga na cutcula Bourel et al.,
2001a
Bourel et al., 1999 Lucilia sericata (Diptera:
Calliphoridae)
Deposio da droga na cutcula, retardo na taxa de desenvolvimento
larval do grupo experimental de maior concentrao
Morfina
Dermestes frischi (Coleoptera: Dermestidae)
RIA
Deposio da droga na cutcula Bourel et al.,
2001b
Codena Lucilia sericata
(Diptera: Calliphoridae)
Acelerao do desenvolvimento e larvas maiores que a do grupo
controle Karbouche et al.,
2008
Opiide
Cloridrato de oxycodone
Chrysomya megacephala
(Diptera: Calliphoridae)
Nenhuma diferena significativa foi observada quanto taxa de
desenvolvimento larval Grella & Thyssen,
2008
-
27
Tabela 1. Continuao Classe do Agente Txico estudado Agente txico
Espcie
Mtodo de deteco Efeitos observados
Autores do Trabalho
MDMA (ecstasy) LC/MS
Concentrao maior detectada em puprios; Acelerao do
desenvolvimento no grupo com
maior concentrao Goff et al., 1997
Metanfetamina (ice) RIA
Acelerao do desenvolvimento larval; RIA ineficiente para deteco
desta droga em larvas Goff et al., 1992
Alucingenos
Fenciclidina (PCP)
Parasarcophaga ruficornis (Diptera:
Sarcophagidae)
GC/MS Acelerao de 3-17 h na fase ps-alimentar Goff et al.,
1994
Chrysomya albiceps (Diptera: Calliphoridae) No houve diferena
significativa Derivado
anfetamnico
Anfepramona Chrysomya putoria (Diptera: Calliphoridae)
GC/MS Acelerao do desenvolvimento, de aproximadamente, 48 h
Carvalho, 2004
Chrysomya megacephala (Diptera:
Calliphoridae) Inseticidas Malathion
Chrysomya rufifacies
(Diptera: Calliphoridae)
GC Influncia negativa na colonizao do cadver por insetos
Gunatilake e Goff,
1989
Vermfugo Ivermectina Artrpodes sarcosaprfagos Sem efeito na
colonizao do cadver por
insetos; Retardo do desenvolvimento das larvas e menos larvas
completaram o desenvolvimento
Borges & Melo, 1999
Calliphoridae (Diptera) Bioacmulo nas larvas relacionado
presena
do mercrio na forma metilada; sem efeitos adversos
Creophilus maxillosus (Coleoptera:
Staphilinidae) Bioacmulo secundrio e sem efeitos adversos
Mercrio
Tenebrio molitor (Coleoptera:
Tenebrionidae)
Bioacmulo secundrio; apresentaram irregularidades no controle
motor
Nuorteva & Nuorteva, 1982 Metais pesados
cobre, ferro e zinco
Musca domestica (Diptera: Muscidae) Bioacmulo e sem efeitos
adversos
Sohal & Lamb, 1977; 1979
-
28
1.3 - Derivados Anfetamnicos
O termo anfetamnicos refere-se s substncias compostas pela
anfetamina e
seus derivados que, quimicamente, apresentam o esqueleto bsico
da -fenetilamina e
atuam como aminas simpatomimticas. As drogas derivadas da
anfetamina foram
criadas por laboratrios a partir de diversas substituies na
estrutura bsica da
anfetamina conforme mostra a Figura 1 (Chasin & Salvadori,
1996; Passagli &
Carvalho, 2007).
A primeira anfetamina foi sintetizada em 1887, sendo usada com
fins
teraputicos a partir da dcada de 1920 quando foram descobertas
suas propriedades
estimulantes centrais e supressoras de apetite sendo assim
utilizadas para o tratamento
de obesidade, narcolepsia, hipotenso e sndrome da
hiperatividade. J na Segunda
Guerra Mundial foram usadas pelos militares com o intuito de
retardar o aparecimento
de fadiga nos soldados. Atualmente, estudantes e motoristas de
caminho utilizam, o
popularmente denominado como rebite, como recurso para se manter
acordados e
alertas por maiores perodos de tempo e como forma de aumentar a
capacidade de
concentrao e raciocnio (Chasin & Salvadori, 1996; Passagli
& Carvalho, 2007).
Dentre os estimulantes, o abuso de anfetamnicos constitui um
srio problema
na escala mundial uma vez que por pertencerem a uma classe de
compostos no
catecolamnicos que produz uma acentuada ao estimulante no
sistema nervoso central
(SNC), mais persistente do que a cocana, os tornam mais
atrativos como frmacos de
abuso. Por aumentar o estado de alerta fsico e mental, os
anfetamnicos so muito
populares entre os indivduos que necessitam de prolongada viglia
(Chasin &
Salvadori, 1996).
No Brasil, a anfetamina e seus derivados, utilizados como
anorexgenos ou nos
distrbios de hiperatividade em crianas, tm sua comercializao
sujeita s exigncias
das portarias 27 e 28 de 1986 da Diviso Nacional de Vigilncia
Sanitria de
Medicamentos (DIMED), enquanto os utilizados em formulaes
como
descongestionantes nasais como a nazafolina, efedrina e
fenilefrina so de venda livre.
Os anfetamnicos com propriedades alucingenas so de uso proscrito
em nosso pas
(Chasin & Salvadori, 1996). Segundo relatrios do
International Narcotic Control
Board (INCB), o Brasil est entre os quatro pases com maior
consumo de inibidores de
-
29
apetite do mundo. Parte desse uso pode ser explicada pelo grande
apelo social
utilizao desses frmacos para o controle da obesidade.
Silva & Yonamine (2004) fizeram um levantamento no Brasil
onde constataram
que usurios de anfetamina foram encontrados nas regies nordeste,
centro-oeste e
sudeste e que 50% das amostras de urina coletadas eram de
companhias de transportes
rodovirios o que poderia explicar os resultados positivos
encontrados neste estudo
devido ao uso do femproporex para manter o estado de alerta por
mais tempo.
Devido s propriedades estimulantes da atividade motora, os
anfetamnicos
eram muito utilizados em competies esportivas, como agentes de
dopagem, visando
melhorar o desempenho em questes de minutos e, por isso, muito
utilizados nas
dcadas de 60 e 70. Atualmente, devido s metodologias mais
sensveis para deteco
dessas substancias no controle da dopagem houve uma substancial
diminuio no abuso
desses agentes nos esportes (Chasin & Salvadori, 1996).
Figura 1. Estruturas de compostos anlogos anfetamina: METH =
metanfetamina, AMPH = d-anfetamina e MDMA = ecstasy (Barr et al.,
2006).
-
30
Os anfetamnicos disponveis no mercado ilcito, freqentemente,
so
comercializados em pequenas cpsulas de gelatinas ou comprimidos.
Em alguns pases
esses derivados encontram-se como bases livres em veculo oleoso.
Praticamente todas
as misturas ilcitas contm os anfetamnicos na forma de
cloridrato, sulfato ou fosfato e
se encontram como ps, comprimidos ou cpsulas (Chasin &
Salvadori, 1996).
Segundo o Relatrio Mundial sobre Drogas de 2008 (World Drug
Report WDR), a
apreenso de derivados anfetamnicos em 2006 voltou a crescer
sendo similar ao pico
de apreenses realizadas em 2000, sendo que a apreenso de
metanfetamina
correspondeu a 33,1% do total e ecstasy a 9,4%.
1.3.1 - Toxicocintica
A anfetamina rapidamente absorvida pelo trato gastrointestinal.
Aps
administrao de 10 a 15 mg, o pico de concentrao plasmtica ocorre
entre uma e 2
horas, e a absoro geralmente se completa entre quatro e 6 horas.
Os anfetamnicos
so amplamente distribudos e as altas concentraes cerebrais
parecem estar
relacionadas a transportes especiais de penetrao na barreira
hematenceflica, que
ocorrem concomitantemente difuso passiva, o que explica a rpida
velocidade de
penetrao da anfetamina no crebro (Chasin & Salvadori,
1996).
Os compostos anfetamnicos so biotransformados, primordialmente
no fgado,
tendo como vias principais a hidroxilao aromtica, a -hidroxilao
na cadeia lateral,
desaminao oxidativa e N-desalquilao (Chasin & Salvadori,
1996). Os derivados
inativos so excretados pela urina, pequena parte convertida em
norefedrina e outra
parte (cerca de 30%) excretada pelos rins sem alteraes em 24
horas (Chasin &
Salvadori, 1996; Passagli & Carvalho, 2007).
1.3.2 - Toxicodinmica
Muitos autores creditam as aes dos anfetamnicos similaridade
estrutural
com a dopamina e norepinefrina podendo, assim, funcionar como
falsos
neurotransmissores. O mecanismo de ao mais provvel a liberao
direta dos
neurotransmissores das vesculas sinpticas, bem como a inibio da
recaptao dos
mesmos, com conseqente aumento na concentrao sinptica, alm de
serem
-
31
inibidores da MAO, enzima responsvel pela oxidao da
norepinefrina e serotonina
(Chasin & Salvadori, 1996).
1.3.3 - Dependncia e Tolerncia
Os anfetamnicos, em particular a anfetamina e a metanfetamina,
apresentam
um alto potencial de abuso e conseqentemente propiciam o
desenvolvimento de
farmacodependncia (Chasin & Salvadori, 1996).
Assim como ocorre com a cocana, os mecanismos envolvidos nas
propriedades
de reforo dos anfetamnicos parecem se relacionar com o aumento
extracelular de
dopamina no ncleo acumens (rea lmbica) e ncleo caudado (rea
subcortical motora)
(Chasin & Salvadori, 1996).
Embora esteja comprovada a dependncia dos anfetamnicos, h
controvrsias
quanto ao desenvolvimento ou no da neuroadaptao. A sndrome que
ocorre aps a
retirada do frmaco, aps uso crnico, caracterizada por fadiga,
hiperfagia, apatia,
letargia, ansiedade, distrbios do sono e depresso, que pode ser
profunda e de longa
durao (Chasin & Salvadori, 1996).
A tolerncia aos efeitos subjetivos e anorexgenos dos
anfetamnicos rpida e
h taquifilaxia. Doses normalmente utilizadas, seja nas prescries
mdicas ou na auto-
administrao, esto entre 20-40 mg, via oral, diariamente e
freqentemente
aumentada a valores situados entre 50-150 mg por essa via
(Chasin & Salvadori, 1996).
Com a inteno de obter ou prolongar as sensaes prazerosas,
obtidas aps a
injeo de frmacos de abuso, usurios crnicos utilizam doses
repetidas de anfetamina
ou metanfetamina que atingem 1 g por episodio ou 5-15 g por dia,
sendo que a DL50 da
anfetamina de 20-25 mg/kg e estudos com animais sugerem que
doses de 5 mg/kg
podem causar a morte, sendo que a menor dose letal relatada de
1,5 mg/kg (Chasin &
Salvadori, 1996).
1.3.4 - Metanfetamina
A metanfetamina um frmaco mais potente que a d-anfetamina e
facilmente
sintetizada em laboratrios clandestinos atravs de reagentes
qumicos facilmente
obtidos. Como droga de abuso, a metanfetamina tambm conhecida
pelos nomes de
-
32
speed, cristal, crank, meth, go e ice (Figura 2). O cloridrato
de metanfetamina usado
por via oral, por injeo intravenosa e por via intranasal
(Yonamine, 2004). A
metanfetamina, utilizada com fins recreacionais e com alto
potencial de abuso,
motivo de preocupao devido ao seu consumo via respiratria na sua
forma bsica,
denominada popularmente como ice, apresentar maior ao e ter os
efeitos mais
prolongados (Chasin & Salvadori, 1996; Passagli &
Carvalho, 2007).
Figura 2. Diversas formas de metanfetamina: em comprimidos
(rebite) para serem ingeridos oralmente, em cristais (crystal, ice)
e em pasta para serem usados por via
respiratria.
Muitos indivduos abusam simultaneamente do emprego de
barbitricos,
ansiolticos e lcool, alm dos prprios estimulantes, tanto para
combater a insnia
como a agitao que experimentam. Os barbitricos, de modo
particular, so utilizados
em combinao com os anfetamnicos para aumentar os efeitos
subjetivos dos
estimulantes (Chasin & Salvadori, 1996).
Segundo dados do Drug Enforcemente Administration (DEA), na
dcada de
1960, nos EUA, os produtos farmacuticos de metanfetamina estavam
disponveis e
eram altamente abusados. Com a mudana na dcada de 1970 para o
quadro de
substncias controladas houve uma reduo no abuso dessa droga.
Porm nos anos
1980 o abuso da metanfetamina ressurgiu e hoje considerada uma
droga de alto
potencial de abuso, ficando atrs somente de lcool e maconha nos
estados do oeste e
meio-oeste.
De acordo com o Levantamento Nacional sobre Droga e Sade
(National Survey
on Drug Use and Health) de 2004, aproximadamente 11,7 milhes de
americanos
maiores de 12 anos j tinham experimentado metanfetamina pelo
menos uma vez na
vida, o que representa 4,9% da populao dessa faixa etria.
Aproximadamente 1,4
-
33
milhes (0,6%) reportaram usar metanfetamina no ltimo ano prvio
pesquisa e
583.000 (0,2%) reportaram uso no ltimo ms prvio pesquisa. A
UNODC (Unit
Nation Office on Drugs and Crime) acredita que no mundo existam
entre 15 e 16
milhes de usurios de metanfetamina e o Brasil est enquadrado
como o pas com a
maior taxa de abuso na Amrica do Sul segundo o WDR 2008 (Figura
3), que tambm
reportou que na Amrica do Sul houve um aumento no nmero de
usurios de
anfetamnicos que entram nos pases, em sua maior parte, de forma
legal como
substncia prescrita.
Em 2006, segundo o WDR 2008, a quantidade de metanfetamina
apreendida no
mundo diminuiu em relao a 2000, porm um nmero maior de pases
reportou tal
apreenso (de 15 pases em 2000 para 30 em 2006), indicando uma
expanso em
termos geogrficos.
Figura 3. Padro de usurios de anfetaminas no mundo (WDR,
2008).
1.3.5 - Ecstasy
O MDMA foi sintetizado e patenteado pelo laboratrio Merck, na
Alemanha,
em 1912, sem uma definio de sua finalidade teraputica (Almeida
& Silva, 2003).
-
34
Nos ltimos 20 anos, anfetaminas modificadas tm sido sintetizadas
em laboratrios
clandestinos para serem utilizadas com fins no-mdicos, com o
objetivo de intensificar
as experincias sociais. Dentre elas, a mais conhecida no Brasil
o 3,4-
metilenodioximetanfetamina (MDMA, ecstasy), que uma anfetamina
modificada com
potentes efeitos estimulantes do sistema nervoso central e tem
seu uso associado aos
clubbers e suas festas denominadas raves (Ribeiro & Marques,
2002; Moro et al, 2006;
Quinton & Yamamoto, 2006), sendo, por esse motivo, conhecida
como Club drug
(Almeida & Silva, 2003; Moro et al, 2006).
O ecstasy habitualmente comercializado e consumido em
comprimidos, de
diversas cores e tamanhos, contendo cerca de 120 mg de MDMA e
seus efeitos duram
entre quatro e 8 horas (Ribeiro & Marques, 2002; Almeida
& Silva, 2003) (Figura 4).
Figura 4. Comprimidos de Ecstasy de diversas formas, cores e
smbolos.
De forma aguda, o MDMA tem diversos efeitos, perifrico e
central, levando
ativao psicomotora, euforia, diminuio do apetite e hipertermia
(Ribeiro & Marques,
2002; Quinton & Yamamoto, 2006). Devido s suas fortes
propriedades eufricas, o
MDMA tem uma taxa de abuso alta e o uso crnico pode levar a
comportamentos
psicticos e violentos (Quinton & Yamamoto, 2006).
O abuso dessas drogas um problema crescente nos EUA onde, de
acordo com
a Pesquisa Nacional sobre Uso de droga e Sade de 2003 (NSDUH),
2,1 milhes de
americanos maiores de 12 anos j experimentaram ecstasy. Alm
disso, a
Administrao e Servios sobre Substncia de abuso e Doena mental
(SAMSHA)
-
35
reportou um aumento de 54%, entre 1995 e 2002, nos atendimentos
relacionados ao uso
de anfetaminas dos prontos socorros (Quinton & Yamamoto,
2006).
No Brasil, segundo um levantamento nacional sobre o uso de
agentes
psicoativos, aproximadamente 0,6% dos entrevistados, maiores de
12 anos, relataram
ter consumido ecstasy ou outros agentes alucingenos pelo menos
uma vez durante a
vida (Moro et al., 2006). Evidncias como uma maior visibilidade
na imprensa
brasileira, aumento no nmero de apreenses de comprimidos e a
descoberta do
primeiro laboratrio clandestino de produo em So Paulo podem ser
indicativo de
que o nmero de usurios de ecstasy aumenta a cada ano (Almeida
& Silva, 2003). O
padro de usurios de ecstasy no mundo pode ser observado na
Figura 5.
Figura 5. Padro de usurios de ecstasy no mundo (WDR, 2008)
Embora MDMA seja considerada uma droga segura, ou seja, que no
representa
um perigo fsico, existe relatos de reaes adversas e mortes
relacionadas ao seu
consumo (Almeida & Silva, 2003). Muitas variveis, incluindo
dose, via de
-
36
administrao e regime, determinam a extenso pela qual o efeito
txico e
neuromodulatrio sero observados. Alm disso, diferenas na
sensibilidade tm sido
observadas entre diferentes linhagens de uma espcie e entre
gneros, indicando que
indivduos mais susceptveis mostraro sinais de toxicidade com
doses menores que
indivduos menos suscetveis (Aerts, 1997).
Tambm se deve levar em considerao que existe uma alta freqncia
de uso
do ecstasy em associao com outras drogas psicoativas o que
aumenta o risco de
reaes txicas (Almeida & Silva, 2003). Na Finlndia, Vuori et
al. (2002) reportaram
quatro casos de morte relacionada ao uso de MDMA associado
moclobemide, um
inibidor da MAO.
Estudos pr-clnicos revelaram que o MDMA produz um dano, a longo
prazo,
nos terminais dopaminrgicos e serotoninrgicos em mltiplas reas
do crebro
(Quinton & Yamamoto, 2006), pois estimulam a liberao de
neurotransmissores
monoamnicos como serotonina, noradrenalina e em menor extenso
dopamina (Inman
& Greene, 2003).
Reaes severas, por vezes com resultados fatais, tm ocorrido aps
a ingesto
de doses normais, o que parece indicar que em humanos este
efeito no seja dose-
relacionado. As principais complicaes que podem ser fatais na
overdose por
anfetaminas so a hipertermia (que pode ser fulminante), a
hipertenso, ataques
convulsivos, colapso cardiovascular, traumas e falncia renal
aguda (Aerts, 1997;
Ribeiro & Marques, 2002).
Alguns autores atribuem a hipertermia (temperatura corporal de
at 42o C)
liberao de grande quantidade de serotonina a partir de terminais
serotoninrgicos
induzida pelo MDMA (Moro et al., 2006). Essa resposta
hipertrmica tem mostrado ter
um papel importante no desenvolvimento de toxicidade dos
terminais 5-HT e DA a um
longo prazo (Quinton & Yamamoto, 2006), uma vez que depois
de repetidas injees
com alta dose de MDMA pode refletir em perda de terminais
nervosos de serotonina
(Aerts, 1997). Por isso, o controle da temperatura corprea o
meio mais importante
na preveno de reaes severas ao MDMA, o que indicado ser feito
com isotnico
ao invs de gua pura (Aerts, 1997).
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Os casos de convulso geralmente tm sua causa atribuda
hiponatremia e ao
edema enceflico por provvel intoxicao hdrica resultante da
ingesto abusiva de
gua em indivduos com sudorese intensa provocada pela elevao da
temperatura
corporal induzida pelo MDMA e agravada pela intensa atividade
fsica durante as festas
(Moro et al., 2006).
Arritmia cardaca , geralmente, notada em pronto-socorros e ,
provavelmente,
outra maneira de levar morte, especialmente naqueles que tem
predisposio para ter
anormalidades cardacas. O aumento da presso cardaca e aumento da
taxa cardaca
causada pelo MDMA podem ser deletrios em pessoas com problemas
cardacos
(Aerts, 1997).
MDMA pode causar danos no fgado, result