-
SumrioApresentao 2
Os impasses ou dificuldades do SUS 13
O Pacto pela Sade (buscando sadas para os problemas e impasses)
16
Referncias 17
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
Denizi Oliveira Reis, Eliane Cardoso de Arajo e Luiz Carlos de
Oliveira Ceclio
-
2
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
Apresentao
O Sistema nico de Sade (SUS), criado pela Lei no 8080, de 19 de
setembro de 1990, tambm chamada de Lei Orgnica da Sade, a traduo
prtica do princpio constitucional da sade como direito de todos e
dever do Estado e estabelece, no seu artigo 7, que as aes e servios
pblicos de sade e os servios privados contratados ou conveniados
que integram o Sistema nico de Sade (SUS) so desenvolvidos de
acordo com as diretrizes previstas no art 198 da Constituio
Federal, obedecendo ainda aos seguintes princpios:
I - universalidade de acesso aos servios de sade em todos os
nveis de assistncia;II - integralidade de assistncia, entendida
como conjunto articulado e contnuo das aes e servios preventivos e
curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os nveis de complexidade do sistema;III - preservao da
autonomia das pessoas na defesa de sua integridade fsica e moral;IV
- igualdade da assistncia sade, sem preconceitos ou privilgios de
qualquer espcie;V - direito informao, s pessoas assistidas, sobre
sua sade;VI - divulgao de informaes quanto ao potencial dos servios
de sade e a sua utilizao pelo usurio;VII - utilizao da
epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocao de
recursos e a orientao programtica;VIII - participao da
comunidade;IX - descentralizao poltico-administrativa, com direo
nica em cada esfera de governo:a) nfase na descentralizao dos
servios para os municpios;b) regionalizao e hierarquizao da rede de
servios de sade;X - integrao em nvel executivo das aes de sade,
meio ambiente e saneamento bsico;XI - conjugao dos recursos
financeiros, tecnolgicos, materiais e humanos da Unio, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municpios na prestao de servios de
assistncia sade da populao;XII - capacidade de resoluo dos servios
em todos os nveis de assistncia; eXIII - organizao dos servios
pblicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins
idnticos
As diretrizes do SUS so, portanto, o conjunto de recomendaes
tcnicas e organizacionais voltadas para pro-blemas especficos,
produzidas pelo Ministrio da Sade, com o concurso de especialistas
de reconhecido saber na rea de atuao, de abrangncia nacional, e que
funcionam como orientadores da configurao geral do sistema em todo
o territrio nacional, respeitadas as especificidades de cada
unidade federativa e de cada municpio Entre as principais
diretrizes, podemos lembrar:
Diretrizes para a Ateno Psicossocial: Portaria MS/GM no 678, de
30/3/2006 Diretrizes nacionais para o saneamento bsico: Lei no
11445, de 05/01/2007 Diretrizes Nacionais para a Ateno Sade das
Pessoas Ostomizadas (institudas pela Portaria MS/SAS no 400,
de 16/11/2009)
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
-
3
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
Diretrizes da Poltica Nacional de Sade Bucal, 2004 Diretrizes
para execuo e financiamento das aes de Vigilncia em Sade pela Unio,
Estados, Distrito Federal
e Municpios Portaria no 3252/2009 Diretrizes para a Programao
Pactuada e Integrada da Assistncia SadeDiretrizes para a Implantao
de Complexos Reguladores Diretrizes para a implementao do Programa
de Formao de Profissionais de Nvel Mdio para a Sade (PRO-
FAPS) Portaria no 3189/2009 Diretrizes para Implementao do
Projeto Sade e Preveno nas Escolas, 2006 Diretrizes para o controle
da sfilis congnita: manual de bolso, 2006 Diretrizes para o
fortalecimento para as aes de adeso ao tratamento para as pessoas
que vivem com HIV e AIDS Diretrizes para Vigilncia, Ateno e
Controle da Hansenase (Portaria MS/GM no 3125, de 07/10/10)
Estratgia Nacional de Avaliao, Monitoramento, Superviso e Apoio
Tcnico aos Centros de Ateno Psicossocial Pacto Nacional: Um mundo
pela criana e o adolescente do semirido Pacto Nacional pela Reduo
Mortalidade Materna e Neonatal, 2007 Lei no 11445, de 05/01/2007
Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento bsico
As diretrizes apontadas como exemplo, apesar de parecerem uma
coisa tcnica demais, acabam tendo bastante influncia no modo como
os sistemas municipais de sade so organizados, at mesmo porque, de
uma maneira geral, elas so acompanhadas de recursos financeiros
para a sua execuo
O SUS a expresso mais acabada do esforo do nosso pas de garantir
o acesso universal de seus cidados aos cuidados em sade que
necessitam para ter uma vida mais longa, produtiva e feliz Embora
saibamos que os bons indicadores de sade dependem de um conjunto de
polticas econmicas e sociais mais amplas (emprego, moradia,
saneamento, boa alimentao, educao, segurana etc), inquestionvel a
importncia de uma poltica de sade que, para alm da universalidade,
garanta a equidade, a integralidade e a qualidade do cuidado em
sade prestado aos seus cidados Todos os investimentos e esforos
visando implantao da Estratgia Sade da Famlia (ESF) do nosso pas
inclusive este curso do qual voc est participando s podem ser
entendidos no contexto da consolidao do SUS e da extenso dos seus
benefcios para milhes de brasileiros
O presente texto est organizado em trs partes Na primeira,
convidamos voc a percorrer uma linha do tempo que remonta, de forma
sinttica e inacabada, momentos da histria que criaram as bases para
a construo do SUS Queremos, com isso, compartilhar com voc uma
ideia do quanto o SUS fruto de uma construo histrica de d-cadas,
com seus avanos e recuos, mas que, afinal, resultou no atual
sistema de sade brasileiro Finalizam essa parte alguns dados que do
uma dimenso do SUS e sua importncia como poltica pblica Na segunda
parte, apontamos algumas das dificuldades e impasses vividos pelo
SUS, com destaque para aquelas que, de modo mais ou menos direto,
impactam no seu cotidiano como membro de uma equipe de Sade da
Famlia Por fim, na terceira parte, apontamos os principais
componentes do Pacto pela Vida, tal como formulado pelo Ministrio
da Sade, por meio de um intenso dilogo com setores organizados da
sociedade brasileira, buscando um reordenamento do SUS a partir da
retomada dos princpios mais fundamentais da Reforma Sanitria
Brasileira.
Saiba mais...
Reforma Sanitria a designao que se d plataforma poltica
defendida pelo Movimento Sa-nitrio Brasileiro, que representou uma
ampla articulao de atores sociais, incluindo membros dos
departamentos de medicina preventiva de vrias universidades,
entidades como o Centro Brasileiro de Estudos (CEBES), fundado em
1978, movimentos sociais de luta por melhores condies de sa-de,
autores e pesquisadores, militantes do movimento pela
redemocratizao do pas nos anos 1970 e 1980 e parlamentares que
faziam a crtica s polticas de sade existentes no Brasil. A Reforma
Sanitria inclua em sua pauta uma nova organizao do sistema de sade
no pas com vrias ca-ractersticas que o SUS afinal adotou , em
particular uma concepo ampliada dos determinantes sociais do
processo sade-doena e a criao de um sistema pblico de assistncia
sade, gratuito com garantia de acesso universal do cuidado para
todos os brasileiros.
-
4
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
1932
1923
Criao dos Institutos de A
posentadoria e Penses (IA
Ps)
Os IAPs foram criados no E
stado Novo de Getlio Var
gas Os
institutos podem ser vistos c
omo resposta, por parte do
Estado,
s lutas e reivindicaes d
os trabalhadores no conte
xto de
consolidao dos processos
de industrializao e urb
anizao
brasileiros Acentua-se o co
mponente de assistncia m
dica, em
parte por meio de servios
prprios, mas, principalme
nte, por
meio da compra de servios
do setor privado
Criao das Caixas de Aposentadorias e Penses (CAP)A Lei Eloy
Chaves cria as Caixas de Aposentadorias e Penses (CAP) Em um
contexto de rpido processo de industrializao e acelerada urbanizao,
a lei vem apenas conferir estatuto legal a iniciativas j existentes
de organizao dos trabalhadores por fbricas, visando garantir penso
em caso de algum acidente ou afastamento do trabalho por doena, e
uma futura aposentadoria Com as caixas, surgem as primeiras
discusses sobre a necessidade de se atender demanda dos
trabalhadores Nascem nesse momento complexas relaes entre os
setores pblico e privado que persistiro no futuro Sistema nico de
Sade
Linha do tempoApresentamos a voc um conjunto de datas que
marcaram o longo caminho da constituio do SUS como a princi-pal
poltica pblica de sade brasileira, destacando as contribuies dadas
por esses eventos na construo de nosso Sistema nico de Sade As
datas so marcadas por momentos de definio de polticas
governamentais, traduzidas em legislaes especficas, que de alguma
forma pavimentaram o caminho para o SUS Nesta linha do tempo,
deixamos de lado outros importantes marcos na histria do SUS, por
preferir listar os fatos que mais se relacionam com nosso
estudo
Boa leitura!
Este texto foi elaborado por trs professores do Departamento de
Medicina Preventiva da Universidade Federal de So Paulo, mdicos de
formao com especializao em Sade Pblica e atuao de longa data no
planejamento, na organizao e na gesto de servios pblicos de sade.
Trata-se de docentes em disciplinas de graduao, ps-graduao e
extenso, sempre na rea de Poltica, Planejamento e Gesto em Sade,
militantes da Reforma Sanitria Brasileira, cuja principal bandeira
tem sido a construo do SUS no nosso pas. Nos ltimos anos tm estado
intensamente engajados em mltiplas atividades voltadas para a
formao de profissionais de sade comprometidos com a defesa do SUS
como poltica pblica e com a produo do cuidado por equipes
multiprofissionais com prticas orientadas pelos princpios da
integralidade, qualidade e defesa intransigente da vida em todas as
suas dimenses.
-
5
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
Criao do Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS)Resultou
da unificao dos IAPs, no contexto do regime autoritrio
de 1964, vencendo as resistncias a tal unificao por parte
das
categorias profissionais que tinham institutos mais ricos O
INPS
consolida o componente assistencial, com marcada opo de
compra de servios assistenciais do setor privado,
concretizando
o modelo assistencial hospitalocntrico, curativista e mdico-
centrado, que ter uma forte presena no futuro SUS
1965
1977Criao do SINPAS
Em 1977 foi criado o Sistema Nacional de Assistncia e
Previdncia Social (SINPAS), e, dentro dele, o Instituto
Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social
(INAMPS), criado em 1974 e que passa a ser o grande rgo
governamental prestador da assistncia mdica basicamente
custa de compra de servios mdico-hospitalares e
especializados do setor privado possvel dizer que tal lgica
do INAMPS, que sobreviveu como rgo at a criao do
SUS, ainda se reproduz no interior do Sistema nico,
mesmo passados mais de 20 anos desde sua criao
-
6
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
1982
1986
Implantao do PAISEm 1982 foi implementado o Programa de Aes
Integradas
de Sade (PAIS), que dava particular nfase Ateno
Primria, sendo a rede ambulatorial pensada como a porta de
entrada do sistema Visava integrao das instituies pblicas
da sade mantidas pelas diferentes esferas de governo, em
rede
regionalizada e hierarquizada Propunha a criao de sistemas
de
referncia e contrarreferncia e a atribuio de prioridade para
a rede pblica de servios de sade, com complementao pela
rede privada, aps sua plena utilizao; previa a
descentralizao
da administrao dos recursos, a simplificao dos mecanismos
de pagamento dos servios prestados por terceiros e seu
efetivo
controle, a racionalizao do uso de procedimentos de custo
elevado e o estabelecimento de critrios racionais para todos
os
procedimentos Viabilizou a realizao de convnios trilaterais
entre
Ministrio da Sade, Ministrio da Previdncia e Assistncia
Social
e Secretarias de Estado de Sade, com o objetivo de
racionalizar
recursos utilizando capacidade pblica ociosa Podemos
reconhecer
nas AIS os principais pontos programticos que estaro
presentes
quando da criao do SUS
VIII Conferncia Nacional d
e Sade
A realizao da VIII Confer
ncia Nacional de Sade, c
om
intensa participao social, deu-
se logo aps o fim da ditadura m
ilitar
iniciada em 1964, e consagrou u
ma concepo ampliada de sad
e e o
princpio da sade como dire
ito universal e como dever d
o
Estado, atributos seriam plena
mente incorporados na Constit
uio
de 1988 A VIII CNS foi o grande
marco nas histrias das confern
cias
de sade no Brasil Foi a primei
ra vez que a populao participo
u das
discusses da conferncia Suas
propostas foram contempladas t
anto
no texto da Constituio Feder
al/1988 como nas leis orgnic
as da
sade, no 8080/90 e no 8142
/90 Participaram dessa confer
ncia
mais de 4 mil delegados, impuls
ionados pelo movimento da Refo
rma
Sanitria, os quais propuseram
a criao de uma ao institucio
nal
correspondente ao conceito
ampliado de sade, que env
olve
promoo, proteo e recupera
o
Registro da 8
Conferncia,
realizada em 19
86
Fonte: http://c
virtual-bvs.bire
me.br/tiki-read
_article.php?ar
ticleId=63
-
7
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
1987
1988
1987 - Criao dos SUDS
Nesse ano foram criados Sistemas Unificados e Descentralizados
de
Sade (SUDS), que tinham como principais diretrizes:
universalizao
e equidade no acesso aos servios de sade; integralidade dos
cuidados
assistenciais; descentralizao das aes de sade; implementao
de
distritos sanitrios Trata-se de um momento marcante, pois,
pela
primeira vez, o Governo Federal comeou a repassar recursos para
os
estados e municpios ampliarem suas redes de servios,
prenunciando
a municipalizao que viria com o SUS As Secretarias Estaduais
de
Sade foram muito importantes nesse movimento de
descentralizao
e aproximao com os municpios, que recebiam recursos
financeiros
federais de acordo com uma programao de aproveitamento mximo
de capacidade fsica instalada Podemos localizar nos SUDS os
antecedentes mais imediatos da criao do SUS
Registro da 8 Co
nferncia,
realizada em 1986
Fonte: Revista ISTO
Constituio Cidad
Em 1988 foi aprovada a Constituio Cidad, que estabelece a
sade
como Direito de todos e dever do Estado e apresenta, na sua
Seo II, como pontos bsicos: as necessidades individuais e
coletivas
so consideradas de interesse pblico e o atendimento um dever
do Estado; a assistncia mdico-sanitria integral passa a ter
carter
universal e destina-se a assegurar a todos o acesso aos servios;
esses
servios devem ser hierarquizados segundo parmetros tcnicos e
a
sua gesto deve ser descentralizada Estabelece, ainda, que o
custeio
do Sistema dever ser essencialmente de recursos governamentais
da
Unio, estados e municpios, e as aes governamentais submetidas
a
rgos colegiados oficiais, os Conselhos de Sade, com
representao
paritria entre usurios e prestadores de servios (BRASIL,
1988)
-
8
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
1990
1991
Criao do SUS
A Criao do Sistema nico de Sade (SUS) se deu atravs da Lei no
8080, de 19 de setembro de 1990, que dispe sobre as condies para a
promoo, proteo e recuperao da sade, a organizao e o funcionamento
dos servios correspondentes A primeira lei orgnica do SUS detalha:
os objetivos e atribuies; os princpios e diretrizes; a organizao,
direo e gesto, a competncia e atribuies de cada nvel (federal,
estadual e municipal); a participao complementar do sistema
privado; recursos humanos; financiamento e gesto financeira e
planejamento e oramento Logo em seguida, a Lei no 8142, de 28 de
dezembro de 1990, dispe sobre a participao da comunidade na gesto
do SUS e sobre as transferncias intergovernamentais de recursos
financeiros Institui os Conselhos de Sade e confere legitimidade
aos organismos de representao de governos estaduais (CONASS
Conselho Nacional de Secretrios Estaduais de Sade) e municipais
(CONASEMS Conselho Nacional de Secretrios Municipais de Sade)
Finalmente estava criado o arcabouo jurdico do Sistema nico de
Sade, mas novas lutas e aprimoramentos ainda seriam necessrios
(BRASIL, 1990)
Criao da Comisso de Intergestore
s Tripartite (CIT)
Criada a Comisso de Intergestores
Tripartite (CIT) com
representao do Ministrio da Sade, da
s Secretarias Estaduais de
Sade e das Secretarias Municipais de Sa
de e da primeira norma
operacional bsica do SUS, alm da Co
misso de Intergestores
Bipartite (CIB) para o acompanhamen
to da implantao e da
operacionalizao da implantao do rec
m-criado SUS As duas
comisses, ainda atuantes, tiveram um p
apel importante para o
fortalecimento da ideia de gesto colegia
da do SUS, compartilhada
entre os vrios nveis de governo
-
9
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
1993NOB-SUS 93
Nesse ano foi publicada a NOB-SUS 93, que procura restaurar o
compromisso da implantao do SUS e estabelecer o princpio da
municipalizao, tal como havia sido desenhada Institui nveis
progressivos de gesto local do SUS e estabelece um conjunto de
estratgias que consagra a descentralizao poltico-administrativa na
sade Tambm define diferentes nveis de responsabilidade e competncia
para a gesto do novo sistema de sade (incipiente, parcial e
semiplena, a depender das competncias de cada gestor) e consagra ou
ratifica os organismos colegiados com grau elevado de autonomia: as
Comisses Intergestoras (Tripartite e Bipartite) (BRASIL, 1993)
A populao foi a grande beneficiada com a incorporao de itens de
alta complexidade, que antes eram restritos aos contribuintes da
previdncia Com a grande extenso de programas de sade pblica e
servios assistenciais, deu-se o incio efetivo do processo de
descentralizao poltica e administrativa, que pode ser observado
pela progressiva municipalizao do sistema e pelo desenvolvimento de
organismos colegiados intergovernamentaisA participao popular
trouxe a incorporao dos usurios do sistema ao processo decisrio,
com a disseminao dos conselhos municipais de sade, ampliando as
discusses das questes de sade na sociedade (LEVCOVITZ et al,
2001)
-
10
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
1994O Programa Sade
da Famlia ou PSF no Brasil, conhecido
hoje como Estratgia Sade da Famlia, p
or no se tratar mais
apenas de um programa, teve incio em
1994 como um dos
programas propostos pelo governo federal
aos municpios para
implementar a Ateno Primria A Estrat
gia Sade da Famlia
visa reverso do modelo assistencial vigente
, em que predomina
o atendimento emergencial ao doente, na m
aioria das vezes em
grandes hospitais A famlia passa a ser o o
bjeto de ateno, no
ambiente em que vive, permitindo uma comp
reenso ampliada do
processo sade-doena O programa inclui a
es de promoo da
sade, preveno, recuperao, reabilitao
de doenas e agravos
mais frequentes No mbito da reorganizao d
os servios de sade,
a Estratgia Sade da Famlia vai ao encontro
dos debates e anlises
referentes ao processo de mudana do para
digma que orienta o
modelo de Ateno Sade vigente e que v
em sendo enfrentado,
desde a dcada de 1970, pelo conjunto de at
ores e sujeitos sociais
comprometidos com um novo modelo que
valorize as aes de
promoo e proteo da sade, preveno d
as doenas e ateno
integral s pessoas Esses pressupostos, tid
os como capazes de
produzir um impacto positivo na orientao
do novo modelo e na
superao do anterior calcado na superva
lorizao das prticas
da assistncia curativa, especializada e hosp
italar, e que induz ao
excesso de procedimentos tecnolgicos e
medicamentosos e,
sobretudo, na fragmentao do cuidado en
contram, em relao
aos recursos humanos para o Sistema nico d
e Sade (SUS), outro
desafio Tema tambm recorrente nos deba
tes sobre a reforma
sanitria brasileira, verifica-se que, ao longo
do tempo, tem sido
unnime o reconhecimento acerca da import
ncia de se criar um
novo modo de fazer sade
No Brasil, a origem do PSF remonta cria
o do Programa de
Agentes Comunitrios de Sade (PACS) e
m 1991 como parte
do processo de reforma do setor da sade, d
esde a Constituio,
com inteno de aumentar a acessibilidade
ao sistema de sade
e incrementar as aes de preveno e pro
moo da sade Em
1994, o Ministrio da Sade lanou o PSF c
omo poltica nacional
de Ateno Bsica, com carter organizativo e
substitutivo, fazendo
frente ao modelo tradicional de assistncia
primria baseada em
profissionais mdicos especialistas focais
Marca Oficial
Percebendo a expanso do Programa Sade da Famlia que se
consolidou como estratgia prioritria para a reorganizao da Ateno
Bsica no Brasil, o governo emitiu a Portaria no. 648, de 28 de maro
de 2006, na qual ficava estabelecido que o PSF a estratgia
prioritria do Ministrio da Sade para organizar a Ateno Bsica que
tem como um dos seus fundamentos possibilitar o acesso universal e
contnuo a servios de sade de qualidade, reafirmando os princpios
bsicos do SUS: universalizao, equidade, descentralizao,
integralidade e participao da comunidade mediante o cadastramento e
a vinculao dos usurios. Em 2011, a portaria GM no. 2.488/2011
revogou a portaria GM no 648/2006 e demais disposies em contrrio ao
estabelecer a reviso de diretrizes e normas para a organizao da
Ateno Bsica e aprovar a Poltica Nacional de Ateno Bsica para a
Estratgia Sade da Famlia (ESF) e para o Programa de Agentes
Comunitrios de Sade (PACS).
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Programa_Sade_da_Famlia
-
11
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
1996NOB 96
A edio da NOB 96 representou a aproximao mais explcita com a
proposta de um novo modelo de Ateno Para isso, ela acelera a
descentralizao dos recursos federais em direo aos estados e
municpios, consolidando a tendncia autonomia de gesto das esferas
descentralizadas, criando incentivo explcito s mudanas, na lgica
assistencial, rompendo com o produtivismo (pagamento por produo de
servios, como o INAMPS usava para comprar servios do setor privado)
e implementando incentivos aos programas dirigidos s populaes mais
carentes, como o Programa de Agentes Comunitrios de Sade (PACS), e
s prticas fundadas numa nova lgica assistencial, como o Programa de
Sade da Famlia (PSF) As principais inovaes da NOB 96 foram: a) a
concepo ampliada de sade considera a concepo determinada pela
Constituio englobando promoo, preveno, condies sanitrias,
ambientais, emprego, moradia etc; b) o fortalecimento das instncias
colegiadas e da gesto pactuada e descentralizada consagrada na
prtica com as Comisses Intergestores e os Conselhos de Sade; c) as
transferncias fundo a fundo (do Fundo Nacional de Sade direto para
os fundos municipais de sade, regulamentados pela NOB 96), com base
na populao e em valores per capita previamente fixados; d) novos
mecanismos de classificao determinam os estgios de habilitao para a
gesto, nos quais os municpios so classificados em duas condies:
gesto plena da Ateno Bsica e gesto plena do sistema municipal
(BRASIL, 1996) Na gesto plena da Ateno Bsica, os recursos so
transferidos de acordo com os procedimentos correspondentes ao PAB
Piso da Ateno Bsica A ateno ambulatorial especializada e a ateno
hospitalar continuam financiadas pelo Sistema de Informaes
Ambulatoriais (SIA-SUS) e pelo Sistema de Informaes Hospitalares
(SIH-SUS) No caso dos municpios em gesto plena do sistema, a
totalidade dos recursos transferida automaticamente
-
12
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
2002
2006
Norma Operacional de Assist
ncia Sade (NOAS-SUS)
No ano 2002 editada a Norma O
peracional de Assistncia
Sade (NOAS-SUS), cuja n
fase maior no processo
de regionalizao do SUS, a parti
r de uma avaliao de que a
municipalizao da gesto do sistem
a de sade, regulamentada e
consolidada pelas normas operacio
nais, estava sendo insuficiente
para a configurao do sistema de
sade por no permitir uma
definio mais clara dos mecanismo
s regionais de organizao da
prestao de servios Como verem
os adiante, o Pacto pela Vida
tem sua grande fora, exatamente e
m um novo ordenamento dos
processos de regionalizao do SU
S (BRASIL, 2002)
Como dissemos anteriormente, outras linhas do tempo poderiam ter
sido construdas. Por exemplo, o atual SUS tem uma vertente
importante na sua constituio, que aquela formada pelas polticas de
combate s grandes endemias que inauguram a genealogia das polticas
de sade no Brasil, ainda no final do sculo XIX. Um bom exem-plo
disso foi a polmica campanha contra a febre amarela conduzida por
Oswaldo Cruz naquele sculo, com armas prprias da Sade Pblica, em
particular o uso da epidemiologia, e medidas mais amplas de
saneamento, vacina e educao sanitria, muito menos do que assistncia
mdica propriamente dita. Seria possvel, portanto, construir outras
linhas do tempo nas quais a questo da assistncia mdica propriamente
dita teria menos importncia. Na verdade, o SUS pode ser visto como
desaguadouro tanto de uma linha do tempo que enfatiza a dimenso
assisten-cial como a que est sendo apresentada neste texto quanto
de uma linha do tempo que contaria a histria das vigilncias
epidemiolgica e sanitria e suas contribuies para o que hoje
denominamos de vigilncia em sade. Sabemos que essas duas vertentes
do SUS ainda permanecem como gua e leo, ou seja, no conseguem
realmente misturar-se para produzir a integralidade do cuidado.
Entre as muitas expectativas colocadas na Estratgia Sade da Famlia,
uma delas que consigamos um experimento dessa to desejada
mistura.
Pacto pela SadeO Pacto pela Sade um conjunto de reformas
institucionais
pactuado entre as trs esferas de gesto (Unio, estados e
municpios) do Sistema nico de Sade, com o objetivo de
promover inovaes nos processos e instrumentos de gesto Sua
implementao se d por meio da adeso de municpios, estados e
Unio ao Termo de Compromisso de Gesto (TCG), que, renovado
anualmente, substitui os anteriores processos de habilitao e
estabelece metas e compromissos para cada ente da federao As
transferncias dos recursos tambm foram modificadas, passando
a ser divididas em seis grandes blocos de financiamento
(Ateno,
Bsica, Mdia e Alta Complexidade da Assistncia, Vigilncia em
Sade, Assistncia Farmacutica, Gesto do SUS e Investimentos
em Sade) Mais informaes sobre o Pacto pela Sade sero
apresentadas na ltima parte do texto
-
13
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
Os impasses ou dificuldades do SUSApesar dos seus inegveis
avanos, como atestam os nmeros citados anteriormente, a construo do
SUS encontra vrios entraves, entre os quais destacamos, para os
propsitos do presente texto, apenas dois, at porque eles com
certeza impactam diretamente no seu trabalho como membro de uma
equipe de Sade da Famlia: a) o subfinancia-mento; b) as
insuficincias da gesto local do SUS
a) O subfinanciamento, isto , os recursos destinados
operacionalizao e ao financiamento do SUS, fica mui-to aqum de suas
necessidades Para Nelson Rodrigues dos Santos:
a atualizao do financiamento federal segundo a variao nominal do
PIB no vem sequer acom-panhado o crescimento populacional, a inflao
na sade e a incorporao de tecnologias Mantm o financiamento pblico
anual per capita abaixo do investido no Uruguai, Argentina, Chile e
Costa Rica e por volta de 15 vezes menor que a mdia do praticado no
Canad, pases europeus, Austrlia e outros Tambm fundamental ter
presente que a indicao de 30% do Oramento da Seguridade Social para
a Sade, como era previsto nas Disposies Constitucionais Transitrias
(DCT) da Consti-tuio, era o mnimo para iniciar a implementao do SUS
com Universalidade, Igualdade e Integra-lidade Se tivesse sido
implementada tal medida, hoje haveria R$ 106,6 bilhes para o
financiamento do sistema, e no aos R$ 48,5 bilhes aprovados para o
oramento federal de 2008 O financiamento do SUS marcadamente
insuficiente, a ponto de impedir no somente a implementao
progressi-va/incremental do sistema, como e principalmente de
avanar na reestruturao do modelo e pro-cedimentos de gesto em funo
do cumprimento dos princpios Constitucionais (SANTOS, 2007)
Para quem trabalha na Estratgia Sade da Famlia, tal insuficincia
sentida, principalmente, quando h necessida-de de se acessar os
outros nveis de maior complexidade do sistema, cuja oferta parece
sempre aqum das demandas
Destaque
Para finalizar esta primeira parte e compartilhar com voc o
orgulho dos avanos do SUS nestes seus 20 anos de criao, nada melhor
que o balano feito por Nelson Rodrigues dos Santos, militante
his-trico do Movimento Sanitrio Brasileiro, em 2008:
O SUS transformou-se no maior projeto pblico de incluso social
em menos de duas dcadas: 110 milhes de pessoas atendidas por
agentes comunitrios de sa-de em 95% dos municpios e 87 milhes
atendidas por 27 mil equipes de Sade de Famlia. Em 2007, 2,7 bilhes
de procedimentos ambulatoriais, 610 milhes de con-sultas, 10,8
milhes de internaes, 212 milhes de atendimentos odontolgicos, 403
milhes de exames laboratoriais, 2,1 milhes de partos, 13,4 milhes
de ultras-sons, tomografias e ressonncias, 55 milhes de sesses de
fisioterapia, 23 milhes de aes de vigilncia sanitria, 150 milhes de
vacinas, 12 mil transplantes, 3,1 milhes de cirurgias, 215 mil
cirurgias cardacas, 9 milhes de sees de radioqui-mioterapia, 9,7
milhes de sesses de hemodilise e o controle mais avanado de aids no
terceiro mundo. So nmeros impressionantes para a populao atual, em
marcante contraste com aproximadamente metade da populao excluda
antes dos anos 1980, a no ser pequena frao atendida eventualmente
pela caridade das Santas Casas (SANTOS, 2007).Esses avanos foram
possveis graas profunda descentralizao de competn-cias com nfase na
municipalizao, com a criao e o funcionamento das comis-ses
Intergestores (Tripartite nacional e Bipartites estaduais), dos
fundos de sade com repasses fundo a fundo, com a extino do INAMPS
unificando a direo em cada esfera de governo, com a criao e o
funcionamento dos conselhos de sade, e fundamentalmente, com o belo
contgio e a influncia dos valores ticos e sociais da poltica pblica
do SUS perante a populao usuria, os trabalhadores de sade, os
gestores pblicos e os conselhos de sade, levando s grandes
expectativas de alcanar os direitos sociais e decorrente fora e
presso social (SANTOS, 2007).
-
14
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
Por outro lado, o autor destaca que:
houve tambm a opo dos governos pela participao do oramento
federal no financiamento indireto das empresas privadas de planos e
seguros de sade por meio da deduo do IR, do cofi-nanciamento de
planos privados dos servidores pblicos incluindo as estatais, do no
ressarcimento ao SUS pelas empresas do atendimento aos seus
afiliados, pelas isenes tributrias e outros, que totalizava mais de
20% do faturamento do conjunto dessas empresas (SANTOS, 2007)
b) As insuficincias da gesto local do SUS. A gesto municipal dos
recursos do SUS vem funcionando ape-nas em parte sem desconsiderar
que os recursos para o SUS so insuficientes A gesto municipal
idealizada pelo projeto da Reforma Sanitria Brasileira como mais
eficaz, porque estaria mais prxima dos cidados e mais sensvel aos
seus anseios O SUS denomina como gesto local o conjunto de
atividades desenvolvidas pelos gestores munici-pais, visando
operacionalizao, na prtica e em seus contextos
sociopoltico-institucionais singulares, das grandes diretrizes
polticas do Sistema nico de Sade
Pesquisadores do Departamento de Medicina Preventiva da
Universidade Federal de So Paulo realizaram recente pesquisa em 20
pequenos municpios de duas regies de sade prximas a So Paulo Por
serem municpios pequenos, estes funcionaram como um verdadeiro
laboratrio de observao das reais condies de operacionalizao em
mui-tos municpios brasileiros, j que pouco mais de 80% dos
municpios do pas tm menos de 20 mil habitantes Vejamos alguns dados
sobre a operacionalizao real do SUS mostrados pelo estudo (CECLIO
et al, 2007):
A baixa resolutividade da rede bsica de servios montada no pas
desde a dcada de 1980, mas acele-rada nos anos 1990, fruto de uma
gesto do cuidado desqualificada, em particular pela realizao de uma
clnica degradada, pela baixa capacidade de construo de vnculo e
produo de autonomia dos usurios Tem havido grande dificuldade de
produo de alternativas de cuidado ao modelo biomdico e sua poderosa
articulao com o complexo mdico-industrial e acelerado processo de
incorporao tecnolgica Isso tem resultado em encaminhamentos
desnecessrios e excessivos e alimenta as filas de espera em todos
os servios de mdia e alta complexidade, alm de resultar: na
fragmentao dos cuidados prestados; na repetio desnecessria de meios
complementares de diagnstico e teraputica; numa perigosa
poliprescrio medicamentosa; na confuso e no isolamento dos doentes;
e inclusive na perda de motivao para o trabalho por parte dos
clnicos da rede bsica
Os modelos assistenciais e consequentes modos de organizao de
processos de trabalho adotados na rede bsica de sade tm resultado,
quase sempre, em pouca flexibilidade de atendimento das
necessidades das pessoas e em dificuldade de acesso aos servios em
seus momentos de maior necessidade, fazendo aumentar a demanda
desordenada pelos servios de urgncia/emergnciaDeficincia na formao
dos profissionais de sade, ainda muito centrada em prticas
curativas e hos-
pitalares, com consequente dificuldade de desenvolvimento de
prticas mais integrais e resolutivas de cuidado, incluindo a
capacidade de trabalhar em equipe, implementar atividades de promoo
e preveno em sade e ter uma postura mais tica e cuidadora dos
usurios do SUSDeficincia na gesto dos sistemas locorregionais de
sade que se traduz em: a) baixa capacidade de
fazer uma adequada regulao do acesso aos servios de sade voltada
para seu uso mais racional e produtivo; b) baixssima ou quase nula
capacidade de gesto do trabalho mdico, em particular avaliao e
acompanhamento
Saiba mais...
O modelo biomdico (biomedicina) construdo a partir da forte
nfase e valorizao da materiali-dade anatomofisiolgica do corpo
humano e a possibilidade de se produzir conhecimentos objetivos
sobre seu funcionamento normal e suas disfunes, o que permitiria
intervenes para a volta normalidade. Esse seria o papel principal
da medicina. Metaforicamente, podemos dizer que o cor-po pensado
como uma mquina. inegvel que a medicina tecnolgica, mesmo operando
com tal modelo reducionista, tem contribudo para uma formidvel
melhoria nos indicadores de sade, inclusive para o aumento da
perspectiva de vida. No entanto, hoje temos a compreenso de que
necessrio operar com uma combinao mais complexa de saberes,
enriquecida por outras contri-buies alm da biomedicina (psicanlise,
psicologia, cincias humanas, saberes populares etc.), se quisermos
ampliar no sentido de produzir um cuidado mais integral.
-
15
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
da produtividade, qualidade do trabalho e resolutividade desses
profissionais; c) baixa capacidade de planeja-mento/programao de
servios a partir de indicadores epidemiolgicos e estabelecimento de
prioridades para alocao de recursos; d) pouca ou nenhuma prtica de
priorizao de gesto de casos em situao de alta vul-nerabilidade dos
pacientes com o objetivo de garantir o uso dos mltiplos recursos
necessrios para o cuidado de forma mais racional e integradaO forte
protagonismo dos usurios, que ainda fazem uma clara valorizao do
consumo de servios mdico-
-hospitalares; a garantia de acesso ao atendimento mais rpido em
servios de urgncia/emergncia; e a busca por segurana e satisfao na
utilizao de tecnologias consideradas mais potentes, em particular a
utilizao de frmacos; a realizao de exames sofisticados; e o acesso
a especialistas Tais percepes seriam componente importante da
explicao da demanda sem fim por atendimento mdico que desqualifica
todos os parmetros de programao e planejamento dos servios de
sade
Todas essas explicaes talvez pudessem ser dispostas na forma de
uma complexa rede causal que, mesmo tendo seus ns crticos, acabam
todas, de uma forma ou de outra, contribuindo para a formao de
filas, demora no acesso e longas esperas Em ltima instncia,
reforando a reconhecida insuficincia de recursos necessrios para o
atendi-mento s necessidades das pessoas
Destaque
Santos, falando das dificuldades do SUS (SANTOS, 2007), aponta
para problemas parecidos. Observe:
a) a ateno bsica expande-se s maiorias pobres da populao, mas na
mdia na-cional estabiliza-se na baixa qualidade e resolutividade,
no consegue constituir-se na porta de entrada preferencial do
sistema, nem reunir potncia transformadora na es-truturao do novo
modelo de ateno preconizado pelos princpios constitucionais;b) os
servios assistenciais de mdia e alta complexidade cada vez mais
congestio-nados reprimem as ofertas e demandas (represso em regra
iatrognica e frequen-temente letal);c) os gestores municipais
complementam valores defasados da tabela do SUS na tentativa de
aliviar a represso da demanda, nos servios assistenciais de mdia e
alta complexidade;d) com o enorme crescimento das empresas de
planos privados, e consequente agres-sividade de captao de
clientela, as camadas mdias da sociedade, incluindo os ser-vidores
pblicos, justificam e reforam sua opo pelos planos privados de
sade;e) as diretrizes da integralidade e equidade pouco ou nada
avanam;f) a judicializao do acesso a procedimentos assistenciais de
mdio e alto custo s camadas mdia-mdia e mdia-alta da populao
aprofunda a iniquidade e a fragmentao do sistema;g) o modelo pblico
de ateno sade vai se estabilizando em pobre e focalizado aos 80%
pobres da populao, e em complementar e menos pobre aos 20%
com-pradores de planos privados.
Entende-se como judicializao do acesso a utilizao de aes
judiciais, amparadas no princpio cons-titucional da sade como
direito de todos e dever do Estado, para garantir o acesso a
medicamentos e procedimentos de alto custo. Apesar de ser, em
princpio, a realizao de um preceito constitucional, vrios gestores
e autores apontam para distores provenientes da articulao entre os
interesses das indstrias de medicamentos e equipamentos e alguns
mdicos que fariam a justificativa de suas indi-caes sem critrios
tcnicos bem definidos. Outro problema apontado que os estratos mais
pobres da populao, com menos acesso a um advogado, acabam sendo
preteridos em relao queles com melhores condies econmicas,
resultando na iniquidade apontada pelo autor.
Saiba Mais
-
16
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
O autor continua, ao afirmar que:
ao lado dos inestimveis avanos da incluso, com a expanso dos
servios pblicos, atendendo ne-cessidades e direitos da populao,
permanece ainda um inaceitvel porcentual de aes e servios evitveis
ou desnecessrios, bem como de tempos de espera para procedimentos
mais sofisticados, geradores de profundos sofrimentos com
agravamento de doenas e mortes evitveis S de hiper-tensos temos 13
milhes e de diabticos, 4,5 milhes na espera de agravamento com
insuficincia renal, doenas vasculares e outras, mais de 90 mil
portadores de cncer sem acesso oportuno radioterapia, 25% dos
portadores de tuberculose, hansenianos e de malria sem acesso
oportuno e sistemtico ao sistema, incidncias anuais de 20 mil casos
novos de cncer ginecolgico e 33 mil casos novos de AIDS, entre
dezenas de exemplos de represso de demandas (SANTOS, 2007)
Santos ainda aponta que:
Os gestores municipais e estaduais do SUS, os trabalhadores de
sade e os prestadores de servios encontram-se no sufoco e angstia
de atender os sofrimentos e urgncias de hoje e ontem, obri-gados a
reprimir demandas, sabendo penosamente que aes preventivas e de
diagnsticos precoces impediriam o surgimento da maior parte de
casos graves e urgentes, mas obrigados a priorizar os casos de
maiores sofrimentos e urgncias devido insuficincia de recursos A
reproduo do complexo mdico-industrial, os casos de corporativismos
anti-sociais e at de prevaricaes e cor-rupes encontram terreno
frtil nesse sufoco Este contexto extremamente adverso e
desgastan-te no justifica, contudo, passividades e conivncias com
irresponsabilidades sanitrias perante os princpios e diretrizes
constitucionais, na gesto descentralizada do SUS nem ao nvel
central O modo de financiar e institucionalizar a poltica pblica
com base no direito igualdade e vida ainda marginal, e muito
cuidado e dedicao devem ser tomados para que as imprescindveis
ino-vaes de gesto permaneam vinculadas viso e compromisso de futuro
e de sociedade pautados por esse direito
O Pacto pela Sade (buscando sadas para os problemas e
impasses)Na breve linha do tempo que vimos anteriormente, muitas
iniciativas foram tomadas para a implementao do SUS, a partir de
1990, com forte nfase na descentralizao e municipalizao das aes de
sade Esse processo de des-centralizao ampliou o contato de gestores
e profissionais da sade com a realidade social, poltica e
administrativa do pas Evidenciaram-se, com maior clareza, as
diferenas regionais, tornando mais complexa a organizao de uma rede
de servios que atendesse s diferentes necessidades dos brasileiros
Em princpio, a responsabilidade pela gesto do SUS era dos trs nveis
de governo, e as normas operacionais vinham regulamentando as
relaes e responsabili-dades dos diferentes nveis at 2006, momento
em que se instituiu o Pacto pela Sade, um conjunto de reformas nas
relaes institucionais e no fortalecimento da gesto do SUS O pacto
introduziu mudanas nas relaes entre os entes federados, inclusive
nos mecanismos de financiamento, significando, portanto, u m esforo
de atualizao e aprimoramento do SUS Para a adeso dos gestores ao
pacto, assinado um termo de compromisso, no qual se esta-belecem
compromissos entre os gestores em trs dimenses: Pacto pela Vida, em
Defesa do SUS e de Gesto.
No Pacto pela Vida so firmados compromissos em torno de medidas
que resultem em melhorias da situao de sade da populao brasileira A
partir dele, definem-se prioridades e metas a serem alcanadas nos
municpios, regies, estados e pas Atualmente so seis as prioridades
em vigncia:
1 Sade do idoso;2 Controle do cncer do colo do tero e da mama;3
Reduo da mortalidade infantil e materna;4 Fortalecimento da
capacidade de resposta s doenas emergentes e endemias, com nfase na
dengue, hansen-
ase, tuberculose, malria e influenza;5 Promoo da sade;6
Fortalecimento da Ateno Bsica
O Pacto em Defesa do SUS firma-se em torno de aes que contribuam
para aproximar a sociedade brasileira do SUS, seguindo estas
diretrizes:
1 A repolitizao da sade, como movimento que retoma a Reforma
Sanitria Brasileira, atualizando as discus-ses em torno dos
desafios atuais do SUS;
-
17
www.unasus.unifesp.br Especializao em Sade da Famlia
Unidades de Contedo
2 Promoo da cidadania como estratgia de mobilizao social tendo a
questo da sade como direito;3 Garantia de financiamento de acordo
com as necessidades do Sistema
Na dimenso do Pacto de Gesto so abordados:1 A regionalizao;2 A
qualificao do processo de descentralizao e aes de planejamento e
programao;3 Mudanas no financiamento
Na adeso ao pacto, os gestores assinam em conjunto o Termo de
Compromisso, no qual constam nos eixos prioritrios as metas a serem
atingidas anualmente ou bianualmente Existe um sistema
informatizado de monitora-mento, o SISPACTO, que contm indicadores
e metas atingidas do ano anterior e as pactuadas para o ano
seguinte So em torno de 40 indicadores, tais como: coeficiente de
mortalidade infantil; cobertura de Programa de Sade da Famlia;
proporo de internao por complicao de diabetes; proporo de sete
consultas ou mais de pr-natal; cobertura de primeira consulta
odontolgica programtica, entre outros
Esse mais um esforo para se traduzir, na prtica, as grandes
diretrizes do SUS construdas ao longo de muitos anos Sem a atuao
concreta dos gestores municipais, do controle social, e,
principalmente do aperfeioamento do trabalho de cada equipe, o SUS
permanecer no papel, sem ter um papel realmente transformador no
cuidado aos brasileiros Esse o desafio ao se pensar o SUS como
poltica No uma abstrao, mas um conjunto de aes concre-tas capazes
de transformar, para melhor, a vida das pessoas
Aps a leitura desta unidade, gostaramos que voc pudesse
refletir, em profundidade, sobre o que est ao seu alcance e da
equipe com a qual voc trabalha, para a concretizao dos princpios de
integralidade, equidade e qua-lidade estabelecidos pelo SUS O SUS
depende da atuao concreta de milhares de trabalhadores das equipes
da ESF espalhadas por todo o pas, para que suas possibilidades de
defesa da vida tornem-se realidade para milhes de brasileiros e
brasileiras!
RefernciasBRASIL Constituio (1988) Constituio da Repblica
Federativa do Brasil. 16 ed Organizao de Alexandre de Moraes So
Paulo: Atlas, 2000
______ Lei no 8080, de 19 de setembro de 1990 Dispe sobre as
condies para a promoo, proteo e recuperao da sade, da organizao e
funcionamento dos servios correspondentes e d outras providncias
(Lei Orgnica da Sade) Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 1990
______ Ministrio da Sade Norma Operacional Bsica do Sistema nico
de Sade/ NOB-SUS 96. Gesto plena com responsabilidade pela sade do
cidado Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 6 nov 1996 Disponvel em:
Acesso em: 06 dez 2011
As mudanas se do com a inteno de fortalecer os processos de
cooperao e solidariedade en-tre entes federados (Unio, estados e
municpios) e reafirma os princpios constitucionais do SUS. As
inovaes esto presentes na nfase dada s pactuaes regionais
celebradas e gerenciadas nos colegiados regionais de sade, na
medida em que se toma a regionalizao como eixo estruturante de
organizao das redes de Ateno Sade que possibilite ateno integral ao
usurio. So mais bem definidas as responsabilidades sanitrias dos
trs nveis de governo na implantao de polti-cas estratgicas como
Regulao, Educao na Sade, Gesto do Trabalho, Participao e Controle
Social, entre outras. No financiamento, os repasses de recursos
federais antes feitos por programas especficos passam a ser
realizados em cinco blocos: Ateno Bsica, Ateno Mdia e Alta
Comple-xidade, Vigilncia Sade, Assistncia Farmacutica e Gesto do
SUS, garantindo maior adequao s realidades locais.
Saiba Mais
-
18
UNA-SUS | UNIFESP www.unasus.unifesp.br
Polticas pblicas de sade: Sistema nico de Sade
______ Ministrio da Sade Portaria no 545 de 20 de maio de 1993.
Estabelece normas e procedimentos reguladores do processo de
descentralizao da gesto das aes e servios de sade atravs da Norma
Operacional Bsica- SUS 01/93, Braslia, 1993 Disponvel em: Acesso
em: 06 dez 2011
______ Ministrio da Sade Portaria no 373, de 27 de fevereiro de
2002 Norma Operacional de Assistncia Sade/NOAS-SUS 01/2002,
Braslia, DF, 2002 Disponvel em: Acesso em: 06 dez 2011
CECLIO, L et al O gestor municipal na atual etapa de implantao
do SUS: caractersticas e desafios RECIIS. Revista eletrnica de
comunicao, informao & inovao em sade, v 1, p 200-207, 2007
Disponvel em: Acesso em: 06 dez 2011
LEVCOVITZ, E; LIMA, L; MACHADO, C Poltica de sade nos anos 90:
relaes intergovernamentais e o papel das Normas Operacionais Bsicas
Cinc. sade coletiva, So Paulo, v 6, n 2, p 269-293, 2001 Disponvel
em: Acesso em: 06 dez 2011
SANTOS, N Desenvolvimento do SUS, rumos estratgicos e estratgias
para visualizao dos rumos Cinc. sade coletiva, Rio de Janeiro, v
12, n 2, p 429-435, abr 2007 Disponvel em: Acesso em: 06 dez
2011