AS ORAÇÕES ADVERBIAIS REDUZIDAS DE GERÚNDIO NAS … · Segundo Neves (2008, p. 26), as orações subordinadas adverbiais formam uma classe “cujo tratamento é bastante complexo,
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AS ORAÇÕES ADVERBIAIS REDUZIDAS DE GERÚNDIO NAS VARIEDADES DO PORTUGUÊS
Ana Maria Paulino COMPARINI1
RESUMO: O objetivo central deste estudo é verificar, nas variedades lusófonas, a forma de expressão das orações adverbiais reduzidas de gerúndio, levando em conta a necessidade de descrever e explicar empiricamente as línguas a partir da definição de um fenômeno particular da estrutura delas, e de testar os fundamentos metodológicos da Gramática Discursivo-Funcional (GDF). PALAVRAS-CHAVE: Adverbiais. Funcionalismo. Variedades Lusófonas. Gerúndio. Introdução2
Este estudo pretende analisar a forma de expressão das orações adverbiais
reduzidas de gerúndio, as quais têm sido incluídas, pela tradição lingüística, entre os
processos de subordinação, sendo, assim denominadas, por apresentarem o verbo na
forma não-finita e por dispensarem um nexo subordinativo explícito. As orações
adverbiais reduzidas de gerúndio são equiparadas às orações desenvolvidas, ou seja,
àquelas que apresentam o verbo na forma finita e um conectivo explícito.
Segundo Lehmann (1988), no processo de redução, tal como no processo de
‘decategorização’ gradual, perdem-se as propriedades de uma oração, isto é, perdem-se
1 Pós-Graduação - Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas – UNESP – São José do Rio Preto – SP – Brasil. Endereço para correspondência: Travessa Breda, 58 – Franca – SP – Brasil CEP: 14400-620 - E-mail: [email protected]. 2 O presente trabalho faz parte do projeto de pesquisa denominado Construções subordinadas nas variedades lusófonas: uma abordagem discursivo-funcional, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Gramática Funcional (GPGF) da UNESP/São José do Rio Preto coordenado por Erotilde Goreti Pezatti. A proposta do projeto é examinar as construções subordinadas nas variedades portuguesas, a fim de descobrir as motivações funcionais subjacentes às estruturas morfossintáticas usadas para codificar as relações subordinadas e as situações conceituais que elas expressam.
condicionais. Para Kury (1987), as reduzidas de gerúndio podem se apresentar como
causais, concessivas, condicionais, modais e temporais. Alega o autor que “muitas vezes
uma oração adverbial reduzida de gerúndio se presta a mais de uma classificação, e nem
sempre é possível fixar-nos numa delas como sendo a melhor” (p. 109).
Conforme Braga (2002, p. 240), que investigou amostras de um corpus falado, o
registro oral do português do Brasil revelou que “as orações reduzidas de gerúndio
podem codificar relações semânticas diferenciadas, referendando, assim, as descrições
das gramáticas tradicionais”. E, concordando com Kury (1987), a autora postula que “a
identificação da relação semântica codificada pelas as orações de gerúndio é muitas
vezes problemática, já que elas tendem a favorecer a superposição de relações
proposicionais” (p.242).
Em nosso corpus de análise, foram observadas duas ocorrências (tabela 1), que
autorizam duas interpretações. Observem-se os enunciados:
(1) - como o pró[...], como a própria sociedade é estática, tanto é que você, fazendo uma análise histórica, você sabe que nós começamos numa, numa, fase de produção escravista, passamos para uma fase de produção, eh, feudal onde existia o servo e o escravo e não se parou por aí. (Bras87: Economia e Sociedade, grifo nosso).
(2) - os subsídios que eram dados nos, nos clubes não eram suficientes para a sobrevivência.
então é daí que o nosso desporto começou a, a quebrar-se. mas olhando para esse momento em que, as pessoas já estão a despertar a atenção nisso, nós vemos que há de novo uma participação na área desportiva. (Moç97: Sentimento Desporto, grifo nosso)
É possível indicar, igualmente para as duas ocorrências, dois diferentes valores
semânticos: temporal e condicional:
- em (1), é possível fazer uma leitura temporal, se entendermos como: ...ao fazer
uma análise histórica...; ou uma leitura condicional: ...se você fizer uma análise
- em (2), podemos perceber uma leitura temporal como: no momento em
que/quando olhar para esse momento, destacando que a própria palavra momento
reforçaria a idéia de temporalidade; ou uma leitura condicional em: ...se olhar para esse
momento.
Para Braga (2002), as orações de gerúndio, pela própria redução a que são
submetidas, têm maior tendência a exibir essa aglomeração de sentidos, requerendo um
esforço maior por parte do ouvinte na identificação do significado. Segundo Decat
(1999), provavelmente as superposições de relações proposicionais podem ser
decorrência de gêneros discursivos diferentes, de diversificados graus de formalidade ou
do próprio sotaque sintático do falante.
Ainda tratando das relações semânticas, a tabela 1 ilustra os resultados
encontrados em nossa análise:
Tabela 1: Valor semântico das orações adverbiais reduzidas de gerúndio Modal Condicional Temporal Concessiva Causal Temp/Cond. Total
n. % n. % n. % n. % n. % n. % 6 23 8 30 7 27 1 4 2 8 2 8
26
Os resultados encontrados apontam que a maioria das ocorrências codifica
relações semânticas com valor condicional (30%), temporal (27%) e modal (23%), as
quais podem ser ilustradas pelos respectivos exemplos:
(3) - se o es[...], se pode alcançar um apoio do Estado, muito bem! mas se não pode, pode fazer qualquer coisa. Por exemplo, uma pessoa formada pode, com o pequeno que, no, no, qualquer soma que tiver, pode arranjar uma máquina, eu também comecei assim, em princípio com uma máquina, duas, três, quatro e cinco e pouco a pouco a pessoa se desenvolve, tendo vontade. (To-Pr96:Costureira, grifo nosso)
(4) - eh, portanto, eh, eu, da forma em que eu vivi, não é, já estando num, num, portanto,
num órgão assim de informação, eu poderei comentar a minha vida a muitos daqueles que também vive a me[...], a mesma situação. (Ang97: Jovem Gaspar, grifo nosso)
(5) - e finalmente Hopkins vem pela primeira vez falar de substâncias acessórias dos
alimentos, abrindo caminho para, para as vitaminas, que só vêm a ser descobertas neste século, como eu já vos falei, por Funk, em mil novecentos e onze. (PT89: PaiMedicina, grifo nosso)
Em (3), verificamos a realização do estado de coisas dependente é apresentado
como possível; o falante prediz o que pode acontecer, uma vez que há a implicação de
que, se o estado de coisas dependente ocorrer, o mesmo se observará com o principal,
ou seja, se a pessoa tiver vontade, ela se desenvolve. Na ocorrência (4), observamos um
valor temporal, em que os dois estados-de-coisas, o principal e o dependente, ocorrem
simultaneamente, o que é reforçado pelo uso do advérbio de tempo já junto ao verbo de
estado. Em (5), a ocorrência modal indica a maneira pela qual ocorre o evento expresso
na oração principal, em outras palavras, descreve o modo como Hopkins vem pela
primeira vez falar de substâncias acessórias dos alimentos.
Há ainda ocorrências que expressam relação de causa (8%), como em (6), a qual
é responsável por conectar dois estados-de-coisas, em que o dependente (que é factual)
fornece a motivação para a ocorrência do principal:
(6) - portanto, digamos que aquela diferença entre a cidade e o campo está-se a esbater... - ah, absolutamente! acho que sim. ma[...], e mais a mais, pronto, jovens, eh, sabendo
precisamente isso, os jovens do campo querem-se parecer mais com os jovens da cidade, apesar de isso não ser nenhuma vantagem, nem ser nada de... (Pt96: MeioPequeno, grifo nosso)
e relação de concessão (4%), em que a oração adverbial reduzida de gerúndio descreve
uma parte de informação tendo em vista que a informação contida na oração principal
não seria esperada, como mostra o exemplo (7):
(7) - que bom! ah, isso é bom. mas você deve ter sofrido imenso durante aquele, aquele tempo. - um bom bocado. e o que é, é que foram, parecendo que não, foram três anos! três anos a sofrer! (PT97: MalDesconhecido, grifo nosso)
Marcadores Discursivos (73%) e Função Retórica (88%), o que pode denotar certo grau
de dependência das orações adverbiais. É interessante observar que as três ocorrências
marcadas pela presença de função retórica são aquelas em que as duas orações
(principal e dependente) expressam Atos Discursivos, pois de acordo com Hengeveld e
Mackenzie (2008) a dependência entre dois Atos Discursivos indica que o falante
atribui diferente estatuto comunicativo para cada ato e é mostrada na representação
subjacente por meio da presença de uma função retórica no Ato Discursivo Subsidiário,
como podemos ver em (8), a seguir, que apresenta a função retórica de Orientação, uma
vez que o falante orienta/direciona seu interlocutor no desenvolvimento de seu discurso:
(8) - [...] também falando um bocadinho das condições sociais, o Gaspar, por exemplo, tem à sua disposição um meio como um televisor, um, as suas condições, eh, em casa, tem meios que, que lhe sirvam para dizer que leva uma vida regular... (Ang97: Jovem Gaspar, grifo nosso)
O Nível Representacional diz respeito aos aspectos semânticos de uma
expressão linguística. Na GDF, o termo semântica se restringe: (i) ao modo em que uma
língua se relaciona ao mundo real ou imaginário que ela descreve e (ii) ao significado de
estruturas lexicais isoladas do modo como são usadas na comunicação. Assim, no Nível
Representacional as estruturas linguísticas são descritas em termos da denotação que
fazem de uma entidade e, portanto, a diferença entre as unidades desse nível é feita em
termos da categoria denotada.
Dois critérios foram analisados no Nível Representacional: a identidade dos
participantes das orações envolvidas, ou seja, a correferência de participantes e a
factualidade. Foram consideradas como factuais as orações encaixadas que descrevem:
(i) propriedade ou relação como aplicável; (ii) estados-de-coisas como reais; (iii)
conteúdos proposicionais como verdadeiros ou (iv) Atos discursivos como assertivos. A
tabela 3 ilustra a análise:
Tabela 3: Critérios do Nível Representacional Correferência Factualidade
Há Correferência Não há Corref. Não se aplica Factual Não-factual n. % n. % n. % n. % n. % 14 54 3 23 9 23 20 77 6 23
Segundo Hengeveld e Mackenzie (2008), o rebaixamento das orações
subordinadas concerne, entre outros fatores, à realização de argumentos dentro da
oração subordinada, podendo ser distinguidos dois diferentes casos: (i) um argumento
não pode ser expresso dentro da oração subordinada, (ii) um argumento é expresso de
uma maneira que seja diferente de sua marcação da oração principal. Verificamos que
em 54% de nossas ocorrências há correferência entre os participantes das orações
envolvidas. Essa identidade entre participantes denota certo grau de rebaixamento das
orações reduzidas de gerúndio em relação à principal. A ocorrência (9) ilustra um caso
em que há correferência obrigatória entre participantes, em que o sujeito não aparece
expresso na oração rebaixada; em (10) e (11), verificamos, respectivamente, um caso
em que não há correferência entre os sujeitos e um caso em que o critério de
correferencialidade não se aplica:
(9) - porque ela terá direito a que se lhe transmita o direito ao arrendamento desde que o seu com[...], companheiro não seja casado, portanto, seja solteiro, viúvo ou divorciado ou desde que, sendo casado, esteja separado judicialmente da mulher. (PT89: LeiCotidiano , grifo nosso)
(10) - ... que além de você mostrar o filme, não foi assim só para a gente ver o filme. teve um fundamento, você fez aprender, ensinar para a gente também, vendo o filme... e a letra da música. (Bra93: FestaEstudante, grifo nosso)
(11) - ficou todo raspado, do, do meu lado, do lado que eu conduzia com o lado em que ele conduzia, tiveram que tirar portas, foi um friso todo novo, aquilo ficou tudo bonito! quase que valeu a pena! depois de tantos problemas; mas enfim... - e, e tirando isso não tem havido mais problemas com o carro? (PT72: AoVolante)
Em relação ao critério factualidade, podemos perceber que a maior parte de
nossas orações reduzidas de gerúndio (77%) podem ser consideradas factuais. Isso se
deve ao fato de essas orações descreverem, em sua maioria, conteúdos proposicionais
apresentados como verdadeiros, como em (12), ou por introduzirem estados-de-coisas
considerados reais, como em (13), respectivamente:
(12) - mas eu... acho que, talvez hoje já não se lembrem bem, que a primeira instituição de carácter superior, tirando uma vaga escola médico-cirúrgica do século dezanove que nunca funcionou para formar gente aqui, a primeira instituição de ensino superior foram os Estados Gerias Universitários... (ang97: Ensino Angola, grifo nosso)
(13) - eu cheguei a recorrer - porque depois as vizinhas começaram a chatear a cabeça à
minha mãe e nos meios pequenos há sempre aquela tendência "o seu, o seu Pedro anda embruxado". chegaram-me a levar à bruxa, a essas senhoras que dizem que fazem... magias negras e não sei quê, cheguei a recorrer a esse tipo de gente, levando só dinheiro possivelmente... inventaram para ali umas histórias quaisqueres para, para comer algum dinheiro, e eu... (PT97: Mal Desconhecido, grifo nosso)
Nossa análise considerou, também, critérios do Nível Morfossintático. Segundo
Hengeveld e Mackenzie (2008), os Níveis Interpessoal e Representacional tratam da
formulação, isto é, da transição das intenções conceituais para as estruturas linguísticas
específicas. A codificação é uma tarefa dividida entre os níveis Morfossintático e
Fonológico. A tarefa do Nível Morfossintático é pegar o input duplo de entrada dos
níveis Interpessoal e Representacional e fundir os dois em uma única representação
estrutural que seja convertida em uma construção fonológica no nível seguinte. Assim,
foram analisados os seguintes critérios no Nível Morfossintático: tipo de oração
principal e de inserida (Move, Ato, Conteúdo Comunicado, Conteúdo Proposicional,
Episódio, Estado Coisas, Propriedade Lexical); tipo de operador (conjunção,
preposição, relativo, zero); forma verbal da oração dependente (indicativo, subjuntivo,
gerúndio, particípio, infinitivo); posição da oração subordinada em relação à matriz
(inicial, medial, final); codificação do sujeito do evento dependente (lexical,
pronominal, zero, quando recuperado pelo contexto, ou oração sem sujeito). As tabelas
4 e 5 são representativas dos resultados obtidos no Nível Morfossintático:
Tabela 4: Critérios do Nível Morfossintático
Tipo oração principal Tipo oração inserida Ato Conteúdo
Proposicional Estado de
Coisas Ato Conteúdo
Proposicional Estado de
Coisas Propriedade
Lexical n. % n. % n. % n. % n. % n. % n. % 3 12 5 19 18 69 3 12 9 35 8 30 6 23
Em relação ao tipo de oração principal, percebemos que a grande maioria se
constitui em estados-de-coisas (69%), algumas em Conteúdos Proposicionais (19%) e
apenas 12% em Atos Discursivos.
Entendemos que a maior incidência de estados-de-coisas se deva ao fato de as
orações principais constituírem-se em entidades que, segundo Hengeveld e Mackenzie
(2008), podem ser locadas em um tempo relativo e avaliadas em termos de seu estatuto
de realidade, podendo (não) ocorrer, (não) acontecer, ou (não) ser o caso em algum
ponto ou intervalo no tempo, como ilustra a ocorrência (14):
(14) - a água da chuva, é, são, zonas que continua a chover intensamente. essa água da chuva cai directamente no solo, desagregando esse solo e arrastando-o depois para os rios. (Ang97: Guerra e Ambiente, grifo nosso)
A tabela 4 nos revela, ainda, que 35% das orações adverbiais reduzidas de
gerúndio encontradas em nosso corpus de análise caracterizam-se como Conteúdos
Proposicionais, consideradas constructos mentais que não existem no espaço ou no
tempo, podendo ser avaliadas em termos de sua verdade. De acordo com Hengeveld e
Mackenzie (2008), proposições podem ser factuais (quando são partes do conhecimento
ou opinião moderada sobre o mundo real), ou não-factuais (quando são esperanças ou
desejos com relação a um mundo imaginário). Dada a sua natureza, os Conteúdos
Proposicionais são caracterizados pelo fato de que podem ser qualificados em termos de
atitudes proposicionais (certeza, dúvida, descrença), e/ou em termos de sua origem ou
fonte (conhecimento partilhado, evidência sensorial, inferência). No exemplo (15)
vemos Conteúdo Proposicional não-factual da oração dependente, pois apresenta uma
condição:
(15) - eh, olhando para todo esse panorama ambiental, assim, é possível fazer-se qualquer coisa para evitar que esta degradação seja ainda acentuada nos próximos tempos que, já que as consequências são visivelmente graves? (Ang97: Guerra e Ambiente, grifo nosso)
Percebemos, também, na tabela 4, orações reduzidas que se caracterizam como
estados-de-coisas (30%); Propriedades Lexicais (23%), e como Atos Discursivos (12%).
São exemplos, respectivamente: (16), relatando um acontecimento factual em uma
ocorrência com valor semântico temporal; (17) com valor modal factual e (18), na qual
aparecem dois Atos Discursivos dependentes e função retórica de Orientação na oração
dependente:
(16) - no seu equilíbrio de... ele rever-se no lar, o homem agasalhou-se. não há dúvida que manteve-se ali fiel ao, ao lar, lutando sempre com a pena para fazer sobreviver ao lar, porque não havia outro rendimento que não fosse a pena dele. (PT97: Amores Camilo, grifo nosso)
(17) - eh, os portugueses, conforme o que eu tinha ouvido, os pais me contaram de que
conseguiram não fazer desaparecer a, a religião tradicional, mas a, conseguiram assim introduzir o cristianismo em Timor, utilizando assim a, um, uma, uma maneira muito, muito, muito suave, digamos assim, que, para aqueles que, na altura, queriam que os filhos fossem assim educados nas escolas, tinham que aceitar a ser baptizados. (TL99: Identidade Povo, grifo nosso)
(18) - e voltando um bocadinho no tempo e no espaço, eh, como é que começam a aparecer
então, para além da, daqueles casos isolados que já disse, os primeiros doutores, ou aqueles que aparecendo talvez fossem os assimilados daquela altura, com um nível mais ou menos equiparado ao doutoramento? há casos isolados, como é que se explica estas, bom, estes que aparecem? (Ang97: Guerra e Ambiente, grifo nosso)
A tabela 5, abaixo, apresenta os resultados da análise dos critérios: Posição da
oração Subordinada em relação à matriz e Codificação do Sujeito do evento dependente
também no Nível Morfossintático.
Tabela 5: Critérios do Nível Morfossintático Posição da subordinada Codificação do Sujeito
I m f l p z / n. % n. % n. % n. % n. % n. % n. % 9 35 5 19 12 46 0 0 2 8 13 50 11 42
Todas as ocorrências de orações subordinadas reduzidas de gerúndio são aqui
apresentadas sem nenhum tipo de operador, o que é próprio das reduzidas e,
principalmente, em posição final em relação à principal (46%). Esse resultado é
indicativo de relação entre estados-de-coisas, como ilustra a ocorrência (16), aqui
repetida:
(16) - no seu equilíbrio de... ele rever-se no lar, o homem agasalhou-se. não há dúvida que manteve-se ali fiel ao, ao lar, lutando sempre com a pena para fazer sobreviver ao lar, porque não havia outro rendimento que não fosse a pena dele. (PT97: Amores Camilo, grifo nosso)
Quanto à codificação do sujeito do evento dependente, percebe-se um equilíbrio,
pois em 13 ocorrências (50%) é possível recuperar o sujeito no próprio contexto por
meio de anáfora zero, como em (19), e em 11 ocorrências (42%) as reduzidas
apresentam-se sem sujeito (20):
(19) - mas, acho que sim, está bem, mas um jogador sente sempre, não é, fazer uma falta a um gajo ou fazer uma falta a uma mulher é sempre, não se sente bem à vontade. ou se está uma mulher à baliza, não é, a gente não vai mandar um bojardão sabendo que pode acertar na cabeça da mulher [...] (PT95: Futebol, grifo nosso)
(20) - ah, o primeiro aspecto é que, se o conseguir, deverá tentar resolver a dissolução do casamento através do divórcio por mútuo acordo. será aconselhável, será preferível. para isso terá que resolver fundamentalmente três problemas, se é que eles existem todos. Havendo filhos menores terá que resolver o problema dos filhos menores, entrar em consenso com a mulher sobre... chamada regulação do poder paternal dos filhos menores. (PT89: Lei Cotidiano, grifo nosso)
Esses dados são bastante interessantes, uma vez que a redução de argumentos
inerente à formação das orações reduzidas nos leva a caracterizá-las como formas
rebaixadas, levando, nos termos de Lehmann (1988), a adquirir propriedades não-
finitas, a ponto de tornar-se um constituinte nominal de uma oração matriz.
Finalmente, a tabela 6, aponta os resultados em relação ao critério Quebra
Entonacional, analisado no Nível Fonológico:
Tabela 6: Critérios do Nível Fonológico Quebra Entonacional
Presença Ausência n. % n. % 11 42 15 58
Esse critério parece relevante na medida que a quebra entonacional pode sugerir
a (não) dependência entre a oração principal e a subordinada. Em nosso corpus 58% não
apresentaram qualquer tipo de acidente prosódico, reforçando a idéia de dependência
em relação às orações reduzidas de gerúndio. Os exemplos (21) e (22) ilustram a
presença e ausência de quebra entonacional, respectivamente:
(21) - havia muita terra abandonada, começou a ser, eh, trabalhada, e havia um uso abusivo, com a plantação de cereais, que de algum modo também começou a ser... repensado, e começou a faz[...], começaram a fazer-se culturas de uma outra dimensão, não é, deixando os pousios, fazendo culturas rotativas, enfim, digamos que houve uma gestão mais racional da terra. de qualquer das formas, houve... aqui questões político-partidárias... (PT97: Trabalho Posse Terra, grifo nosso)
(22) - [...], a fortuna foi adquirida no Brasil e que ele que era um homem bastante adinheirado, mas que era homem para ir ao Porto com umas côdeas de pão no bolso, para chegar a casa só comer à noite para não gastar dos grandes rendimentos que ia buscar das acções que tinha, de rendimentos através do banco... do Brasil. ele sabendo esses pormenores, viu que a mulher que passou a parte, a maior parte do tempo... adoentada, entrevada, no leito de sofrimento, começou então a desenvolver isso e escreveu a célebre "Brasileira de Prazins”... (PT97: Amores Camilo, grifo nosso)
Neste artigo, foram investigadas as orações reduzidas de gerúndio. Utilizando a
noção de subordinação fornecida por Cristofaro e critérios estabelecidos de acordo com
os Níveis e Camadas da Gramática Discursivo-Funcional, pudemos perceber que fatores
como ausência de marcadores discursivos e de função retórica, a correferência entre os
participantes das orações envolvidas, a factualidade e a ausência do sujeito do evento
dependente auxiliam em sua caracterização como formas rebaixadas e, portanto, em
processo de dessentencialização.
Outro fator a se considerar é a variedade de relações semânticas estabelecidas
pelas orações reduzidas de gerúndio, permitindo, muitas vezes, dupla interpretação
quando ocorre superposição dessas relações.
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