LOUS RONDON As Ondas 1
LOUS
RONDONAs Ondas
1
I Onda
Esquecimento
Vivemos o prazer do esquecimento,
Este verso embora velho e pequeno
Traduz um sentimento comum no
Coração humano. Esquecer é lento.
Pense no sentido dele a você,
Há quatro anos eu penso, escrevo, apago,
Nada me satisfaz, não há diálogo,
Coração conhece. Mão desconhece.
São muitos momentos, tantos pesares
Que preferia nem ter me lembrado,
Faço questão de esquecer o passado.
Erramos não uma, duas ou três,
Tudo passou e nos resta o infinito
Interessa o que agora vejo e sinto.
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Cuiabá, de 2009 a julho de 2013.
II Onda
Floresce
Acolhe-se o sol
Silva o vento. Frialdade
Floresce as tulipas
Cuiabá, 14/12/2010
Chuva
Sol insuportável
Cheiro da garoa vem
É a terra fértil
Cuiabá, 5/12/2010
Manga
3
Tarde cuiabana
O quintal cheio de mangas
Cheira à minha infância
Cuiabá, 3/12/2010
Flores
Vida é grande, cheia
As flores da primavera
Fazem-me viver
Cuiabá, 17/7/2010
Mangueira
Cuidado a cabeça!
As mangas estão caindo
Do alto da mangueira
Cuiabá, 15/1/ 2010
4
Goiaba
Goiabas maduras
E logo me vem o cheiro
O doce cozendo
Cuiabá, 6/1/2010
Caju
Na calçada as pombas
Bicam os cajus caídos
Antes das formigas
Cuiabá, 29/12/2009
III Onda
Vazio
Cheio estou imensamente
Vazio. Há tudo no mundo
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Se procurar esperanças,
Mas delas somente é absurdo
Viver precisa de um júbilo
Despertar da fraqueza e
Ver o novo. Não ser cheio,
Pero sempre motivado.
Cuiabá, 23/03/2012
Velhice
A vida começa como
Acaba, nem se vê. Tudo
Acontece em dia calmo
De lembrança, sobretudo,
Infância é memória d'um
Velho, A velhice ninguém
Espera em momento algum,
Via o velho com desdém.
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Cuiabá, 17/11/2011
Lamento
Quantas vezes mais lamentarei pelo
Querer e não poder. Frustração anda
Junto ao desejo, afim de ornar a vida
Com a morte, um fúnebre pesadelo.
Pero alguns quereres são imortais
Ao meu sobrinho deixo amor e nome
Versos, para no futuro ele me
Fazer também, mesmo que casuais.
Cuiabá, 29 de Julho de 2011
Universal
Sou eu sendo todo mundo
Sozinho e universal,
Sentimento desigual,
7
A mesma forma de tudo.
Compartilho um egoísmo
Quero pra todos meu gosto,
Eterno hoje, amanhã finito,
Singularmente modismo.
No final não sou ninguém
Valho uma mistura e só,
Mas pensando nisso passo
A pensar que sou alguém.
Rio de Janeiro, 24/1/2011
IV Onda
Suicídio
Amigo suicida,
No céu a cerveja
É bem mais gelada.
Fico com inveja
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Lá tem moças virgens
Cá eu nunca vi.
Vão te dar massagens
Pele tão suave
Bucetas sem pelo
E sempre quentinhas,
Elas só de vê-lo,
'Starão molhadinhas.
Você tem é sorte
Eu to sempre pobre,
Quando vir a morte
'Spero que não cobre.
Cuiabá, 21/set/2012
Bar
Trocamos de bar
Pois só um enjoa
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Respirar outro ar
E ficar atoa.
Pago à cafetina
O quarto da puta
Foder na matina
Muita força bruta.
Baba no meu pau
Preu foder o rabo
Geme e diz au au
Assim eu me gabo.
Tonto da cerveja
Acordo cheirando
Pó. E antes queu veja
Moco e vou andando.
03/setembro/2012
V Onda
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Vício
Mate seu vício com outro
Vício. Se saudável, fume
Demais. O exagero me
Torna por mim mesmo um erro.
A fúria toma conta
Da passividade. Do
Jejum ao puro libido,
Só contraste. Bem simplista.
Aristóteles, não dá,
Pertence ao homem o pecar.
Nenhuma virtude ou ar
O equilibrará na vida.
Cuiabá, 19 de Junho de 2013.
Esperança
Fecha-se a caixa, a esperança
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Fica. O pior dos pecados,
Resta a ingenuidade dos
Fracos. 'Sperar não compensa.
Sabe que seus dias 'tão
Jogados à sorte. Nada
Lhe cabe a fazer na vida,
Senão, ouvir sempre um não.
Ao anoitecer, solitário,
Depara c'uma questão,
É melhor viver em vão
Ou dormir num cemitério?
Cuiabá, 10 de Junho de 2013.
Dificuldade
A pobreza é a maior
Dificuldade da vida,
Em dívida vê que afunda
Enche-te a alma de pavor.
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'Manhã acaba a comida
No futuro ninguém te
Espera. E socialmente:
Uma depressão profunda.
Acabou a graça. Só
Notícia ruim no jornal,
Mais um país desigual
Merda, achar emprego é osso.
Não tem papel. Guarde para
Limpar a bunda. Dormir
No chão faz bem, vai sentir
Dor mesmo. Depois piora.
Cuiabá, 04 de Junho de 2013.
Efêmero
Entro p'ra poder sair
Todo existir 'stá ligado
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Ao fim. O sol renascendo
Doutra noite a se esvair.
Talvez soubesse que dentro
De cada época se extingue
Uma reflexão e segue
A nova a criar meu centro.
Assim no abismo da vida
Ficar perdido na morte,
Me acharão s'eu tiver sorte,
De dar vida à ida sofrida.
Cuiabá, 25 de abril de 2013.
Desejo
Se quiser sofrer busque o que deseja
Será seu fim. Mas finita é a vida,
Desgraçada antes da sua chegada.
Pare! Não importa o que em vão planeja.
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Conhecimento lhe trará desgosto
No entanto, ignorância é falsa esperança,
Perdeu tudo ao deixar de ser criança,
Corda que pulava até ficar tonto
Pendura-lhe o corpo já morto. Não
Importa se fede, apodrece, Agora
Vê que tudo está ruim, mas vá lá fora,
Faça o melhor, pior outros farão.
Cuiabá, 19 de fevereiro de 2013.
VI Onda
Produto
Não se constrói mais o Ser,
Mas compra como produto,
É um comércio maldito,
Do pensar e do viver.
Tem muita gente, preciso
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Dizer, ganhando dinheiro
Com seu gosto verdadeiro,
Lhe venderam 'ste sorriso.
Hétero ou homo, o namoro
Possui mesmo tantos nomes?
São só quantias enormes
De consumismo imaturo.
Identidades à venda,
Dizem todos os anúncios,
Quanto gastou para sê-los?
A vida não preenchida.
Quer aparência ou conteúdo?
Mesmo o sentir teve preço,
Desejo sempre perverso
Burro, alheio e dominado.
Enfim é um grande acúmulo,
De marcas, nomenclaturas,
Más, acéfalas, -- robóticas
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Massas. Desprezo do belo.
Cuiabá, 26 de Junho de 2013.
Pânico
Caso não hoje, amanhã
Decerto. A taquicardia
Me assusta de noite e dia,
Lá vem a morte tão sã...
Mas é só medo, loucura,
Estresse ou a cafeína,
Pode ser mesmo a chacina
Que minha visão adora.
O sangrar de um degolado
Junto do grunhido rouco,
Ser morto assim como porco,
E lastimar seu estado.
Também gosto do queimado,
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Amarrado a qualquer árvore,
E antes que o fogo o devore
É sem pena, apedreijado.
Por isso vivo num pânico
De esperar morte iminente,
Aqui sou mais um doente,
Do jornalismo patético.
Cuiabá, 24 de Junho de 2013.
Privação
Agora após a vigésima
Segunda translação da
Terra. Está na madrugada
A pensar e não se anima.
Há neste mundo de tudo,
Pode ver e desejar,
Como um enorme jantar,
E não o comer, contudo.
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Conhece bem seu limite,
Aquele chato de sempre,
Que contigo nasce e morre,
Sei que sofre obediente.
É sua cor e pobreza,
Limita-o socialmente,
Uma casta, nem mais tente,
Só navegue, pois precisa.
Cuiabá, 21 de Junho de 2013.
VII Onda
Proletário
Almas desafortunadas
Nascidas em larga escala,
Almejam vida sem tê-la,
Rebanhos sós, sem estradas.
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Quantos tão analfabetos,
Uniformemente burros,
Inanimados, são muros,
Sarcasticamente mortos.
Máquinas que vendem força,
Ordenhados, ordinários
Ao capital, operários,
Negócios vis, dor intensa.
Abolir a escravatura,
Matar os ricos, governo,
Opor-se, ufanismo eterno,
Repor tudo sem demora.
Cuiabá, 02 de julho de 2013.
Prisão
Encontro na rua tanta
Liberdade, apesar disso
Imagino um compromisso
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Sempre só, me desalenta.
Antes em casa ficasse,
Na solidão, mas ao menos
Já bem. Pensamentos nos
Obriga a odiar burrice.
Esses vermes, toda gente
Largada à essa podridão,
Insignificantes são,
Sem futuro, decadente.
Aguardando esperançoso
Nada além do fim do mundo,
Jazer eterno, cansado,
Obscurecer por desuso.
Cuiabá, 01 de julho de 2013.
VIII Onda
Rinite
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Do nariz a derreter
Obstruído, avermelhado,
Respiro livre assoando
Encharcando meu suéter.
Miserável a rinite
Impertinente, chatíssima,
Faz-me perder toda calma
Ataca sempre, incessante.
Solucionar quem dera
Olhos coçam, lacrimejam,
Larguei o livro no chão,
Sinto alergia da poeira.
Também de cachorro, gato,
Barata, remédio, fungo,
Lã, ácaro, calor, chego
A lembrar do septo torto.
Cuiabá, 13 de julho de 2013
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Refluxo
Refluxo enche minha boca
Inflama minha garganta,
Ocasiona dor tanta,
Dói dente, descalcifica.
Emagreço pois não como
Jejuo e não falo mais,
Aftas, aftas infernais,
Nego qualquer conformismo.
Endoscopia já fiz,
Indo do dentista ao gastro,
Resposta sei, nunca encontro,
Ora, sou mesmo infeliz.
Cuiabá, 10 de julho de 2013.
IX Onda
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Verdade
Buscar Infinitamente
A Verdade tão sozinho,
Estar Sempre no caminho,
Equilibrar corpo e mente.
Nunca a Verdade possuirei
Na minha alma corajosa,
Não vou encontrar Certeza
Absoluto como rei.
Jamais parar a Procura,
Livre ao vento, campo verde
Nem ao outro impor a Verdade
Universal, simples, pura.
Cuiabá, 28 de julho de 2013.
Pobreza
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Minha terra tem pobreza,
Onde educação não vem;
O futuro é miserável,
Ser burro e fazer nenem.
Nosso país em ruínas,
Mais chips tem cada pessoa
Do que bons livros na estante,
Povo parvo, vil, atoa.
"Em cismar, sozinho, à noite,"
Mais prazer encontro eu morto,
Gonçalves, minhas desculpas,
Cá não é Coimbra ou Porto.
Cuiabá, 27 de julho de 2013.
Televisão
Se este fosse o último poema,
Amanhã eu sei que morro,
Nada fiz de tão maduro,
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Sou de novo quem reclama.
Ranzinza, reclamão, chato,
Contesto tudo, disseram,
Me desculpa mesmo. Não
Tenho noção do meu ato.
Quero ser rei pela escrita,
Ninguém lê. Talvez o texto
Precise ser vídeo. Tento
Ser bom, ser péssimo irrita.
Ver, ouvir: Involuntário,
Ler: Interpretar ideias,
Tantas batidas cardíacas,
'Spero morrer logo. Tédio.
Na tevê as cores hipnóticas,
Alta definição de
Imagem. Som surpreende.
Livros sós nas bibl'otécas.
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Cuiabá, 22 de Julho de 2013.
X Onda
Beleza
Silhueta de beleza germânica,
O rosto jovem bem equilibrado,
Tem curvas suaves representando
Graciosamente a pequena boca.
Ao lado da face escorre o cabelo
Dourado, que balança-se ao andar,
Postura elegante de um sério ar,
Corpo firme com boa estatura e belo.
Dentes claros, alinhados, simétricos,
Nascidos pra sorrir naturalmente,
O que faz com simpatia ao ver gente.
Defeitos lógico que os tem, mas poucos.
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A alegre voz revela a idade curta,
Contudo tão madura que se assusta.
Para alguém.
Cuiabá, 22 de agosto de 2013.
Corda
A formosíssima corda torcida,
Tecida aos vários fios finíssimos,
Forte, resistente e a ela confiamos
A vida e os barcos com toda a pescada.
Tão industrialmente projetada
Para boiar e durar a corrosão,
A chuva e o sol nada desgastarão
O laço bem feito na madrugada.
Ao percorrermos toda sua história,
Ver as utilidades variadas,
No mar, casa, terra, mato e fazendas,
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Provar qualidade demonstraria.
Sintética ou natural, tem a escolha,
Então pega, sinta, cheira, prova e olha.
Cuiabá, 15 de agosto de 2013.
Facão
O facão em todo seu comprimento,
Quarenta e cinco centímetros de
Lâmina em puro aço carbono grande,
Brilho encantadoramente bonito.
Acinzentado, rígido, polido,
Três milímetros de espessura forte,
Fio assentado de excelente corte,
E afiação convexa em um sentido.
Metal gelado, assustador, mortífero,
Tornou-se flâmula de outra nação,
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Pela utilidade é amado tão.
Têmpora em parafina com esmero,
Por isso a dureza mesmo delgado,
Será eternamente de muito agrado.
Cuiabá, 04 de agosto de 2013.
XI Onda
Sucinto
"Estúpido é julgar os outros pelas nossas próprias faculdades."
GOETHE
Orgulho-me do que logo
Estará no lixo. Venha
A findar de manhãzinha
Meu pensamento vago.
A morte é o conserto da
Vida, do que acaba, tudo!
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Erros sanados, ser mudo,
E antes ter falado em nada.
Preocupa-me a brevidade,
Pero muito mais a longa
Duração. Medo que traga
Algo que nunca se perde.
Cuiabá, 22 de agosto de 2013.
Felicidade
"The rich get richer
and the poor get... children"
F. SCOTT FITZGERALD
A felicidade custa
Um dinheiro que não tenho,
É quem sabe um belo sonho,
Uma realidade oculta.
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Deixa pra lá, a vida passa,
E toda vontade fica
Na juventude tão rica,
Manhã torna-se lembrança.
Lembra, tantas já passaram,
Contentemos com que temos,
Os dias não são os mesmos,
Há saudade e solidão.
'Stamos velhos, ficaremos,
E vem depois outras vidas,
Iguais a nós ou perdidas,
Para as quais daremos mimos.
Cuiabá, 19 de agosto de 2013.
Cacofonia
"Se se morre de amor! Não, não se morre," �
GONÇALVES DIAS
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Se se morre fedido, não se morre,
Tens tempo pra ficares muito sujo,
Após ter sentido teu cheiro eu fujo,
É ficar próximo a ti grande porre.
E para a porra da cacofonia,
Não é agradável tampouco esperta,
Banhe-se todo dia, experimenta,
Tenta e sentirá o que nunca sentia.
Cuiabá, 13 de agosto de 2013.
XII Onda
Sonho e natureza
I
Íris azul do cristal reluzente...
Efêmeras e transbordantes ondas,
Tantas nuvens pelo vento levadas,
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Esmaecidas criam formas de gente.
Espelham-se no mar denso e infinito...
As águas que desde o princípio belas,
Alegra os sinceros olhos ao vê-las,
Toda imensidão da vida no peito.
Brilhante anil, multicores, e formas...
De pássaros voando em harmonia,
Translúcida imagem do som vagueia,
E vês que o sonho foge e em vão o chamas.
Deitado acordas com o sol na face...
O rosto babado de muito sono,
Gatinhos novíssimos acordam-no,
Mostram a verde grama e a flor que nasce!
II
Flores vivas, cheirosas e vermelhas...
Brotando do chão por causa da chuva,
Como mãe atenciosa as cuidava,
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Retirando o pólen grandes abelhas.
Já nascido o fruto doce e maduro...
Entregam-se pras aves companheiras,
'Stas plantam semente das goiabeiras,
Que nos darão comida e bom futuro.
Veja a natureza maravilhosa...
Sábia como nenhum de nós fora,
Auto preserva-se, mesmo que embora,
Não a reconheçamos como casa.
Azuladas esferas radiantes...
A graciosa maçã rosa e clara,
Cintilante o contorno duma pêra,
Garbosamente brilhará mais que antes!
Para Danna.
Cuiabá, 14 de agosto de 2013.
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