276 ISSN on-line: 1982-9949 Doi: 10.17058/r&a.v23i1.5825
Revista Reflexo e Ao, Santa Cruz do Sul, v.23, n.1, p.276-302, jan./jun.2015
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LEITURA LENTA DA OBRA DE ARTE COMO PROPOSTA PARA EDUCAO
ESTTICA: CONTRIBUIES DE MARX E VIGOTSKI
Priscila de Souza Chist1
Resumo
O artigo sinaliza, por meio de pesquisa bibliogrfica, uma proposta de Educao Esttica em
dilogo com estudos de Marx e Vigotski. Atravs das teorias marxianas, apresenta reflexes
sobre Esttica no contexto contemporneo e, com Vigotski, busca compreender pressupostos
da Educao Esttica. Sugere um caminho, a partir das Artes Visuais, para se educar
esteticamente diante do conceito de leitura lenta da obra de arte. Considera que uma das possibilidades para alcanar tal intento proporcionar intensos, diversificados e contnuos
encontros com obras de arte, mediar leituras de imagens que evidenciem tanto os aspectos
poticos e intertextuais quanto os formais dessas obras, ampliados pelo conhecimento do
universo do artista e dos modos de legitimao e divulgao das obras e, por fim, propor
assuntos relacionados com os interesses dos educandos.
Palavras-chave: Educao Esttica; Arte; Vigotski; Marx
1 INTRODUO
A Educao Esttica constitui-se como desafio frente sociedade capitalista. Marx nos
1 Priscila de Souza Chist, licenciada em Educao Artstica e Pedagogia, possui mestrado e doutorado em Educao pela Universidade Federal do Esprito Santo. Atua como professora do Instituto Federal do Esprito Santo na Educao Profissional de Jovens e Adultos (Proeja), Licenciatura em Letras e nos Programas de Ps-Graduao em Ensino de Cincias e Matemtica (Educimat), Letras (Profletras) e Humanidades. Endereo: Avenida Vitria n. 1729, Jucutuquara, Vitria - Esprito Santo. E-mail: [email protected].
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ajuda a pensar sobre essa questo quando pontua que a crescente instrumentalizao da
humanidade afasta, cada vez mais, os indivduos das vivncias sensveis. Com o intuito de
contrapor esse fato, o artigo em tela sinaliza um possvel caminho para a Educao Esttica,
por meio das Artes Visuais, a partir de pesquisa bibliogrfica referente aos estudos de Marx,
como apontado, e tambm de Vigotski.
Na primeira seo, apresenta contribuies dos estudos marxianos para reflexes sobre
Esttica no contexto contemporneo. J na segunda, aponta a contribuio de Vigotski para os
estudos sobre a Educao Esttica, sob a luz das ideias marxianas. A seguir, na terceira seo,
sugere uma proposta de Educao Esttica por meio das Artes Visuais, em especial, a partir
do conceito de leitura lenta de Vigotski. Considera que uma das possibilidades de se educar esteticamente proporcionar intensos, diversificados e contnuos encontros com obras de arte,
mediar leituras de imagens que evidenciem tanto os aspectos poticos e intertextuais quanto
os formais dessas obras, ampliados pelo conhecimento do universo do artista e dos modos de
legitimao e divulgao das obras e, por fim, propor assuntos relacionados com os interesses
dos educandos.
2 CONTRIBUIES DOS ESTUDOS MARXIANOS PARA AS REFLEXES SOBRE A ESTTICA NO CONTEXTO CONTEMPORNEO
No dia a dia, em diferentes contextos, muito comum ouvir falar sobre esttica,
principalmente relacionada com a beleza fsica. Para a filosofia, esttica relaciona-se com o
estudo do belo e do sentimento que esse suscita nos homens. A esttica aparece ligada
noo de beleza e, por isso, a arte tem lugar privilegiado nessa reflexo, pois, durante muito
tempo, ela teve como funo exprimir a beleza de modo sensvel.
Etimologicamente, a palavra esttica origina-se do grego, aisthesis, com o significado de faculdade do sentir, compreenso pelos sentidos, percepo totalizante, reafirmando a ligao da esttica com a arte. Assim, o objeto artstico aquele que se oferece ao sentimento
e percepo. Segundo Santaella (1994), a raiz aisth, do verbo aisthanomai, quer dizer sentir com os sentidos, ou seja, com a rede de percepes fsicas. Para o Dicionrio Bsico de Filosofia de Japiass e Marcondes (2008), esttica um dos ramos tradicionais da filosofia. O
termo foi criado por Alexander Von Baumgarten, no sculo XVIII, para designar o estudo da
sensao, a cincia do belo, e referia-se empiria do gosto subjetivo, quilo que agrada aos
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sentidos, com fins elaborao de uma ontologia do belo.
Terry Eagleton (1993) destaca que a esttica nasceu como um discurso sobre o corpo.
Em sua formulao original, pelo filsofo alemo Alexander Baumgarten, o termo no se
refere primeiramente arte, mas com o grego aisthesis, a toda a regio de percepo e sensao humanas, em contraste com o domnio mais rarefeito do pensamento conceitual
(EAGLETON, 1993, p. 17).
No ano de 1735, Baumgarten publicou Reflexes filosficas sobre algumas questes pertinentes poesia e, nesse artigo, pela primeira vez, empregou a palavra esttica, definindo-a como a cincia da percepo geral. Ele acreditava que o campo da lgica deveria ser ampliado por uma esttica que incluiria a coisa cognoscvel sensitivamente. Em sua obra
posterior, Aisthetica (1750), essa cincia da percepo foi tomada como sinnimo de conhecimento pelos sentidos e partia da ideia de que existe uma esttica natural, como uma capacidade inata que o ser humano possui para o pensamento belo, e tambm uma esttica
adquirida, que pode acontecer por meio do ensino ou da prtica. Nesse sentido, a esttica surge do reconhecimento de que o mundo da percepo e da
experincia no pode ser simplesmente derivado de leis universais abstratas, mas requer do
seu discurso mais inferior uma lgica interna. O surgimento da esttica relaciona-se tambm
com a busca pela ascenso da burguesia em frente aristocracia feudal, por uma ordem
universal de sujeitos livres, iguais e autnomos. Por isso, era preciso pensar em um tipo
inteiramente novo de sujeito, um sujeito que, assim como a obra de arte, [...] descobre a lei
na profundeza de sua prpria identidade livre, e no em algum poder externo opressivo
(EAGLETON, 1993, p. 21).
Nesse contexto, coloca-se um novo desafio ideolgico ordem dominante. Isso
produz novas dimenses do sentimento para alm dos limites propostos pelo Absolutismo.
Para que o poder fosse legitimado e conquistado pela burguesia, ocorreu um processo
profundo de emancipao poltica em que a liberdade e a compaixo, a imaginao e o corpo
foram ouvidos no interior do discurso de um racionalismo repressivo.
Baumgarten concebia a esttica como equivalente sensual da lgica, pois estava para a
sensorialidade, conhecimento tido como inferior, do mesmo modo que a lgica estava para o
pensamento, conhecimento superior. a partir de Baumgarten que essa rea se tornou uma
disciplina autnoma e culminou na Educao Esttica, que teve incio com os estudos de Schiller.
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Friedrich Schiller, assim como Imanuel Kant, 2 insere-se no contexto Iluminista,
marcado pela conscientizao histrica, resultado do esforo de um pequeno grupo de
literatos, escritores, crticos e filsofos. Vrios episdios que ocorreram durante a Revoluo
Francesa, entre eles a execuo do rei Luis XVI, deixaram Schiller decepcionado e o levaram
a concluir que o Iluminismo no bastava para aperfeioar as relaes polticas. Caberia
somente arte, inserida em um sculo indigno e brbaro, o papel de purificar a humanidade.
Para Schiller a arte o impulso mais eficaz do ser humano, o meio mais efetivo de
autorrealizao humana e, por conseguinte, a Educao Esttica deveria fomentar uma
revoluo total da maneira de sentir, tornando-se a base da construo de uma verdadeira
liberdade humana.
Schiller (2002) tentou superar o seu mestre, Kant, no tratado A Educao Esttica do homem numa srie de cartas. Nas cartas, ele diagnostica as questes centrais de sua poca: a alienao, o isolamento, a diviso do trabalho, a consequente fragmentao do indivduo, o
Estado moderno e o desenvolvimento cientfico e cultural. Para ele, somente a formao da
sensibilidade seria capaz de tirar os homens da condio da barbrie. Nesse sentido, considera
o artista como o indivduo capaz de se resguardar de corrupes de sua poca.
A ideia de Schiller era criar cidados que colaborassem com a liberdade poltica e
civil. Para ele, a Educao Esttica era a tarefa suprema do homem e, embora factvel, no
poderia ser inteiramente realizada, pois a humanidade jamais seria plenamente emancipada.
Porm, acreditava que o indivduo que se cultivasse e se enobrecesse moralmente no
renunciaria esperana de um dia vir a ser livre. Nesse sentido, educar e ser educado
esteticamente significaria educar e ser educado pela soberania da imaginao.
Contudo, no final do sculo XIX, a partir das ideias schillerianas, Marx, ao criticar o
capitalismo industrial, as capacidades atrofiadas, os poderes dissociados e a totalidade da
2 Para Kant (1995a, 1995b, 1995c), o homem, em sua busca pelo conhecimento de mundo, precisa procurar tambm a harmonia com o mundo, pois, para haver conhecimento, preciso que as nossas faculdades se ajustem realidade material. a contemplao desta forma pura de cognio, a harmonia com o mundo, que vem a ser esttica. O filsofo acredita que existem duas fontes do conhecimento humano: a sensibilidade e o entendimento. Por meio da primeira, os objetos nos so dados; pela segunda, so pensados. S pela conjugao desses dois elementos possvel a experincia do real. Portanto, para Kant, no somos capazes de conhecer as coisas como elas so em si, s conhecemos realmente o mundo dos fenmenos, da experincia, dos objetos enquanto se relacionam conosco, sujeitos, e no com a realidade em si, tal qual ela , independentemente de qualquer relao com o conhecimento, pois o mundo dos fenmenos s existe na medida em que participamos dele. A obra de Arte para Kant desinteressada, universalmente reconhecida por um sentimento ao mesmo tempo individual e coletivo. Contudo, as exigncias kantianas ficam difceis de serem cumpridas no sculo XXI, pois, neste momento, j no se pode mais conceber os juzos estticos como puros e desinteressados; eles so, na maior parte das vezes, ditados por interesses mercadolgicos.
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natureza humana arruinada, introduz questes que constituram a base da esttica marxiana.
Ele nasceu em 1818 e foi um estudioso que exerceu grande influncia sobre o pensamento
filosfico, social e histrico da humanidade. Para Marx, o objetivo da vida a felicidade ou o
bem-estar. A sua obra uma investigao extensiva sobre as condies materiais necessrias
para realizar esse objetivo.
Nos Manuscritos econmico-filosficos de 1844, esboou uma concepo humanista de um comunismo que tinha como objetivo final a existncia humana. Nessa ocasio, Marx,
influenciado pela filosofia de Feuerbach, baseava-se no contraste entre a natureza alienada do
trabalho no capitalismo e uma nova sociedade comunista na qual os seres humanos
desenvolveriam livremente sua natureza em produo cooperativa. Com os Manuscritos, Marx tenta decifrar a sociedade civil de ordem burguesa. Ele cria uma teoria da ordem
burguesa. Os Manuscritos no foram redigidos para publicao, mas criados como material de estudo. Eles so um texto de transio em que Marx desenvolve um conjunto de
determinaes que sero recorrentes em sua obra, um texto radical, entendendo que ser
radical implica agarrar a coisa pela raiz (MARX, 2010, p.151).
Para Marx, a raiz do homem seria o prprio homem, pois o homem uma constante
tenso entre a sua genericidade humana, entre o seu ser genrico e a sua singularidade. O que
prprio do ser humano existir como ser singular. Essa singularidade imediata que nos
constitui insuprimvel; ela se transcende e se resolve na genericidade humana.
Ele considera que o homem constitudo de toda a sua referencialidade cultural, pois
o horizonte da cultura que o transcende e do qual ele portador. O homem s se expressa
singular e genericamente na medida em que um ser objetivo. aquele que s se mantm
enquanto tal na medida em que se objetiva. A objetivao a condio da existncia humana.
Ela se d por meio de formas pouco perenes como o gesto, o riso, o movimento, a fala
cotidiana, mas tambm por meio de formas mais privilegiadas, como a Cincia, a Arte, a
Literatura etc. Esse conjunto de objetivaes, que o acervo da humanidade, deve ser
apropriado pelos indivduos, precisa ser subjetivado pelos indivduos. Porm, o objeto
produzido s se torna uma objetivao da humanidade quando o homem no se perde mais
nele, ou seja, o objeto s existe para o sujeito na medida em que o sujeito desenvolveu a
faculdade necessria apreenso do objeto.
O homem rico, para Marx, no aquele que tem; aquele que , pois o domnio da humanidade o domnio do ser e no o domnio do ter. Para Marx, s possvel ser rico
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interiormente se se puder interiorizar a riqueza de objetivaes da humanidade. Assim, a
verdadeira riqueza a elaborao das possibilidades criativas humanas, sem qualquer
pressuposto alm do desenvolvimento histrico anterior. S o acesso s objetivaes permite
a subjetivao. Marx pensa no indivduo socialmente constitudo e, portanto, socialmente
rico. Ningum nasce rico ou pobre; a sociedade que nos torna ricos ou no. o sistema de
objetivaes que faz emergir e desenvolver o ser social. A humanidade se desenvolve na
medida em que desenvolve seus sistemas de objetivaes. 3 Sobre isso, Marx e Engels
pontuam:
V-se como, em vez da riqueza e da misria da economia poltica existe o homem rico e a necessidade humana rica. O homem rico ao mesmo tempo aquele que tem necessidade de uma totalidade de manifestaes humanas da vida. O homem para quem a sua prpria realizao existe como uma necessidade interior, como uma carncia (MARX; ENGELS, 1986, p. 26).
Para Marx, a objetivao elementar que constitui o ser social o trabalho. Ao conjunto
dessas objetivaes estaria reservado o conceito de prxis. Ele considera que o ser humano
prtico e social. Esse carter do homem exemplificado paradigmaticamente pelo trabalho,
objetivao privilegiada que garante a condio humana. O trabalho a condio eterna do
homem, integra a sua essncia, ou seja, o conjunto de atributos, qualidades que o ser
humano, ao longo da sua trajetria na terra, conseguiu realizar.
A partir das ideias de Marx, consideramos o trabalho como uma atividade ontolgica,
estruturante do ser social que proporciona a participao legtima nos benefcios da riqueza
social. Esses benefcios se distinguem das formas histricas e alienantes de explorao do
trabalhador, presentes na produo capitalista. A concepo ontocriativa de trabalho no se
reduz atividade laborativa ou ao emprego, mas refere-se produo de todas as dimenses
da vida humana. Por meio dos estudos de Marx (2001), compreendemos o trabalho como
prxis que possibilita criar e recriar, no apenas no plano econmico, mas no mbito da arte e
da cultura.
Contudo, com a crescente instrumentalizao da natureza e da humanidade, o processo
do trabalho afasta cada vez mais os indivduos das vivncias sensveis. Esta mutilao do
homem, ou perda do humano, se d precisamente no trabalho, na produo material, isto , na 3 Contudo, nem sempre as potencialidades criativas humanas so eficazes em termos de bem-estar. Isso se deve ao fato de que algumas capacidades humanas podem ser destrutivas, como, por exemplo, a construo de campos de concentrao (EAGLETON, 1993).
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esfera na qual o homem deveria se afirmar como tal e que tornou possvel a prpria criao
esttica (VZQUEZ, 1968, p. 52). Nesse sentido, a esttica uma esfera essencial para a
busca do humano perdido. Ela pode esclarecer quanto o homem perdeu com a sociedade
capitalista e vislumbrar uma nova sociedade na qual dominem relaes verdadeiramente
humanas.
Diante desses pressupostos, defendemos a ideia de que a Educao Esttica
fundamental no processo educativo. E, nesse contexto, a arte precisa ser compreendida como
mediao na formao omnilateral dos sujeitos. Uma formao voltada para o
desenvolvimento total, completo e pleno. A arte surgiu por intermdio do trabalho, quando a
fabricao dos instrumentos se sofisticou e possibilitou a elevao do domnio do homem
sobre a matria. Foi quando os objetos passaram a ter valor para alm da utilizao, mas pela
materializao da alta possibilidade criadora do homem (VZQUEZ, 1968). Assim, partimos
do pressuposto de que a obra de arte um objeto no qual o sujeito se expressa, se exterioriza e
se reconhece.
Ela possui a funo de humanizar o prprio homem, pois no curso das relaes
sociais que os indivduos produzem, se apropriam e transformam as diferentes atividades
prticas e simblicas em circulao na sociedade em que vivem, e as internalizam como
modos de ao/elaborao prprios, constituindo-se como sujeitos. Desse modo, como
dissemos, para o indivduo se constituir como ser humano, preciso que internalize as
produes humanas que foram sistematizadas na trajetria da humanidade (a arte um
exemplo dessas produes). Nesse contexto, para se conhecer um objeto, como a obra de arte,
preciso revelar sua estrutura social, apresentar o mundo das mediaes, dos processos
sociais (econmicos, polticos, cientficos, culturais etc.) em que o objeto est inserido. Nesse
sentido, a arte constitui-se como mediao entre o homem e o mundo. Portanto, elemento
mediador que permite a explicitao e o reconhecimento coletivo da relao dialtica
estabelecida entre o homem e a realidade.
A Arte (e com ela as imagens) produto do homem inserido em um contexto social dinmico e plural. Produzidas pelo trabalho humano, as imagens esto referidas ao modo de produo e s relaes de classe e interesses sociais dos homens que as criaram. Dessa forma, o desafio de analis-las pressupe o desvelamento de sua materialidade histrico-social, ou seja, sua reconstituio histrica (FOERSTE, 2012, p. 173).
No entanto, o homem, muitas vezes, manipulado pela sociedade capitalista pela via
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da arte. Um dos modos de manipulao se d por meio da arte de massas ou pseudoarte. uma arte que, deixando o homem na superfcie ou na margem das coisas, se distingue por utilizar uma linguagem astutamente fcil, que corresponde sua falta de profundidade
humana (VZQUEZ, 1968). Nesse sentido, na sociedade capitalista contempornea, pode-se
dizer que a verdadeira obra de arte tem uma funo muito importante, tendo em vista que o
mundo regido pelo consumo e pela alienao do homem. A arte, por ser expresso e
objetivao do homem, [...] um dos caminhos mais valiosos para reconquistar, testemunhar
e prolongar a verdadeira riqueza humana (VZQUEZ, 1968, p. 127). Assim, a funo social
da arte tornar possvel uma vivncia esttica cada vez mais profunda e humana, pois ela
um dos meios mais fecundos que o homem possui para elevar-se enquanto tal. Toda obra de
arte, por ser produto do trabalho do homem, estabelece, por essncia, um dilogo com as
particularidades de poca, classe, nao, com os homens de ontem, hoje e amanh. Portanto,
para compreender a gnese da produo da obra de Arte necessrio consider-la como
produto da histria e do cotidiano, imersa nos conflitos sociais e tocada por eles.
Acreditamos, desse modo, que a arte pode contribuir para a educao dos sentidos
humanos. Porm, o ensino da arte no pode ser considerado o nico responsvel pela
Educao Esttica, pois essa deve permear todos os conhecimentos abordados na escola no
que chamamos de uma educao integral/omnilateral. Alm disso, consideramos que imagens
artsticas podem ser mediadoras de um conhecimento sensvel, um conhecimento pouco
explorado na escola tradicional.
Diante desses pressupostos e reflexes, na prxima seo, apresentaremos as ideias de
Vigotski sobre Educao Esttica.
3 CONTRIBUIO DE VIGOTSKI PARA OS ESTUDOS SOBRE EDUCAO ESTTICA
A histria da educao moderna marcada pela presena da racionalidade
instrumentalizadora, pragmtica e burguesa e, tambm, pela ausncia da racionalidade
sensvel.
O pleno sentimento da vida implica em que tentemos captur-la e, assim, compreend-la, de todas as maneiras possveis lgicas e estticas, intelectuais e estsicas, cientficas e artsticas. No h porque privilegiar-se uma nica e exclusiva maneira de contato com a realidade, feito intentado pela lgica da modernidade ao longo desses ltimos sculos. (DUARTE JNIOR, 2000, p. 192).
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Nesse sentido, necessrio ampliar os modos academicamente aceitos de se conhecer
a vida. Isso consiste numa discusso mais ampla da vida e do mundo. De modo contrrio,
uma educao centrada sobre as faculdades humanas isoladas,
[...] como intelecto ou a sensibilidade, s pode mesmo resultar em indivduos dotados de um profundo e bsico desequilbrio: ao sensvel e ao inteligvel devem ser propiciadas condies equnimes de desenvolvimento, sob a pena da produo de seres humanos arraigadamente desequilibrados, como lhe soe acontecer nos dias em que vivemos (DUARTE JNIOR, 2000, p. 174-175).
Tal separao entre as faculdades humanas deveria ser algo impossvel de acontecer,
porque essas dimenses humanas so, em tese, inseparveis.
Diante dessas questes, cabe indagar como seria possvel pensar a Educao Esttica,
uma Educao do Sensvel, no contexto da escola. possvel pensar que, apesar da
consolidao de vrias leis que regulamentaram a educao brasileira, a formao humana
integral no se consolidou. Cada vez mais, fica evidenciada a busca por uma educao voltada
para a tcnica, distanciada do conhecimento sensvel. Estudos realizados pelos pesquisadores
da rea (CIAVATTA, 2005; DUARTE JNIOR, 2000) mostram quo longe estamos da
formao humana integral.
preciso propor modos de negar/desconstruir/resistir os/aos sistemas opressores que
integram a sociedade capitalista e que abafam a sensibilidade humana. Por isso, a importncia
da Educao Esttica como modo de contribuir com o desvelamento dos sistemas opressores,
fragmentadores e insensveis. Vislumbramos possibilidades de discutir sobre essa
problemtica a partir das ideias de Vigotski (2010), pois ele problematiza de modo muito
interessante a Educao Esttica na escola de seu tempo.
Antes de apresentar tal discusso, cabe apontar que Vigotski4 parte das ideias de Marx
para compor uma nova psicologia do desenvolvimento humano. Considera que organismo e
meio exercem influncia recproca, portanto, o biolgico e o social esto sempre associados
aos processos de desenvolvimento dos sujeitos. Parte da premissa de que o homem se
constitui como tal por meio das interaes sociais. Percebe-o como algum que transforma e 4 Cabe colocar que os livros de Vigotski chegaram ao Brasil recentemente, na dcada de 80, traduzidos de verses americanas que censuraram muitas das suas ideias ligadas ao marxismo. Algumas reflexes sobre os problemas de traduo na obra de Vigotski e suas repercusses no campo da Educao foram sistematizadas por Zoia Prestes (2010).
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transformado nas relaes produzidas em uma determinada cultura. Nesse sentido, na
interao dialtica do homem com seu meio que se originam suas funes psicolgicas
superiores.5 Essa relao do homem com o mundo no uma relao direta, mas sim mediada
por meios que se constituem nas ferramentas auxiliares da atividade humana. por
intermdio desses instrumentos e signos que os processos de funcionamento psicolgico so
fornecidos pela cultura.
Dessa forma, s ocorre o processo de desenvolvimento das funes psicolgicas
superiores quando o aprendizado se efetiva. Esse aprendizado se d a partir da interao dos
indivduos e, tambm, no mbito da educao escolar. Para Vigotski (1987), a escola6 oferece
contedos, desenvolve modalidades de pensamento bastante especficas e tem papel
insubstituvel na apropriao das vivncias 7 culturalmente acumuladas. A escola um
elemento imprescindvel para a realizao plena do desenvolvimento dos indivduos, j que
promove um modo mais sofisticado de analisar e generalizar os elementos da realidade. Nela
ocorrem, pelo menos em tese, atividades educativas8 sistematizadas intencionadas em tornar
acessvel o conhecimento formalmente organizado.
Para o psiclogo russo, um dos modos de os sujeitos se apropriarem da vivncia
culturalmente acumulada acontece por intermdio da Educao Esttica. Contudo, muitas
vezes as concepes acerca do papel da esttica na vida do sujeito so vistas na escola de
modo antagnico. Quase sempre essas concepes no tratam a Educao Esttica como um
objetivo em si, mas apenas como um meio para atingir resultados pedaggicos estranhos
esttica. Essa esttica a servio da pedagogia sempre cumpre funes alheias e, segundo os
5As funes psicolgicas superiores consistem no modo de funcionamento psicolgico tipicamente humano, como a capacidade de planejamento, memria voluntria e imaginao. Esses processos mentais so considerados superiores, porque se referem a mecanismos intencionais, aes conscientemente controladas, processos voluntrios que do ao indivduo a possibilidade de independncia em relao s caractersticas do momento e do espao presente. Vigotski (1987) e seus colaboradores buscaram a comprovao dessas ideias por meio de experimentos com crianas e de investigaes das formas de organizao dos processos mentais em indivduos de diferentes culturas. Esse estudo permitiu a definio de diversas linhas de pesquisa. 6 preciso lembrar que a presena na escola no garantia de que o indivduo se aproprie dos conhecimentos. O acesso ao saber depender de fatores sociais, polticos, econmicos, tendo em vista que a escola no uma instituio independente, ela est inserida em uma trama social. 7 Para Prestes (2010), algumas tradues dos textos de Vigotski substituram a palavra vivncia pela palavra experincia. Contudo, a palavra experincia no corresponde ao significado que atribudo pelo psiclogo russo ao conceito de vivncia que se relaciona com viver uma determinada situao, deixando-se afetar profundamente por ela. 8 Na sociedade contempornea, a excluso, o fracasso e a evaso escolar impedem a apropriao do saber sistematizado, da construo de funes psicolgicas mais sofisticadas, de instrumentos de atuao e transformao de seu meio social e de condies para a construo de novos conhecimentos (REGO, 1995).
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pedagogos, deve servir de via e recurso para educar o conhecimento, o sentimento ou a
moral (VIGOTSKI, 2010, p. 324).
Vigotski critica a finalidade moral da arte, mais especificamente da Literatura, dizendo
que Organizam-se bibliotecas infantis com a finalidade de que as crianas tirem dos livros exemplos morais ilustrativos e lies edificantes, a enfadonha moral da rotina e os sermes falsamente edificantes se tornaram uma espcie de estilo obrigatrio de uma falsa literatura infantil. (VIGOTSKI, 2010, p. 324).
O autor ressalta, ainda, que o adulto, supondo que o sentimento srio inacessvel
criana e, por conseguinte, ao jovem, adocica sem habilidade, nem arte, as situaes e os
heris: substitui o sentimento pela sensibilidade e a emoo pelo sentimento. O
sentimentalismo no outra coisa seno uma tolice do sentimento (VIGOTSKI, 2010, p.
325).
Apesar da expectativa em obter resultados que atinjam o efeito moral esperado, muitas
vezes isso no acontece. Como exemplo Vigotski cita a relao da Fbula da Cigarra e a Formiga e a escola.
[...] na fbula A Cigarra e a Formiga a simpatia das crianas foi provocada pela cigarra despreocupada e potica, que passou o vero inteiro cantando enquanto a Formiga sombria e enfadonha lhes pareceu repugnante, assim como a fbula lhes pareceu direcionada contra a avareza estpida e presunosa da Formiga. Mais uma vez o bardo da zombaria foi orientado para o lado errado, e em vez de infundir nas crianas o respeito diligncia e ao trabalho a fbula suscitou nelas a sensao de alegria e beleza da vida leve e despreocupada. (VIGOTSKI, 2010, p. 326-327).
Assim, para Vigotski, a escola procura, muitas vezes, enquadrar qualquer vivncia
esttica em um conhecimento do dogma moral sem assimilar esse dogma, sem suspeitar que o
texto artstico frequentemente no ajuda a apreend-lo, ao contrrio, infunde uma concepo
moral de ordem justamente oposta. Sob essa concepo, a obra de arte perde qualquer valor
autnomo, torna-se uma espcie de ilustrao para uma tese moral de cunho geral; toda a
ateno se concentra precisamente nessa ltima, ficando a obra fora do campo de viso do
educando.
[...] sob essa interpretao no s no se constroem nem se educam hbitos e habilidades estticas, no s no se comunicam flexibilidade, sutileza e diversidade de formas s vivncias estticas como, ao contrrio, transforma-se em regra pedaggica a transferncia da ateno do aluno da prpria obra para o seu sentido moral. O resultado um amortecimento sistemtico do sentimento esttico, sua
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substituio por um momento moral estranho esttica e da a natural repugnncia esttica. (VIGOTSKI, 2010, p. 328).
Um outro equvoco, apontado por Vigotski, pensar que a arte uma espcie de cpia da realidade. Houve um momento no qual os crticos concebiam que a obra de arte reunia e comportava em si os traos tpicos da intelectualidade que podiam servir como material
fidedigno para o estudo de qualquer poca. Entretanto, Vigotski afirma que fcil mostrar
que a verdade da realidade da obra de arte se d a partir de relaes sumamente complexas:
[...] a realidade sempre aparece na arte to transfigurada e modificada que no h como
transferir diretamente o sentido dos fenmenos da arte para os fenmenos da vida
(VIGOTSKI, 2010, p. 330). Para ele, ao aderirmos concepo de que a arte reflexo direto
da realidade, arriscamo-nos [...] no s a ficar com uma concepo falsa da realidade como
tambm a excluir inteiramente os momentos puramente estticos no ensino (VIGOTSKI,
2010, p. 330). Isso se explica pelo fato de que muitas vezes o artista possui outras reaes ao
seu contexto e se vale apenas de um material comum para atender a diferentes necessidades.
Mais um erro cometido pela pedagogia tradicional ocorre quando se reduz a esttica
ao sentimento do agradvel, ao prazer pela obra de arte, com um objetivo em si. Isso [...]
reduz todo o sentido das emoes estticas ao sentimento imediato de prazer e alegria que
elas suscitam na criana (VIGOTSKI, 2010, p. 331). Para Vigotski, nessa concepo, a arte
vista como um meio de despertar reaes hedonsticas (fonte de prazer).
Nesse sentido, Vigotski critica a pedagogia tradicional por ter cado em um impasse
nas questes da Educao Esttica, justamente ao tentar impor objetivos estranhos e no
inerentes a essa educao. Ento, em que isso resultou? A pedagogia tradicional deixou
escapar o prprio significado da Educao Esttica e obteve resultados contrrios aos
esperados.
Sobre as concepes relativas esttica, Vigotski pontua que, durante muito tempo,
manteve-se o ponto de vista de que a percepo esttica uma vivncia passiva, entregue
impresso, a cessao de qualquer atividade do organismo. Os psiclogos acreditavam que a
condio indispensvel para a possibilidade de realizao da reao esttica partia do
desinteresse, da contemplao desinteressada, da ausncia de qualquer posio pessoal em
face do objeto esttico. Essa concepo liga-se s ideias de Kant (1995a, 1995b, 1995c) sobre
a contemplao desinteressada. Para Kant, o homem, em sua busca pelo conhecimento de
mundo, precisa procurar tambm a harmonia com o mundo, pois, para haver conhecimento,
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preciso que as nossas faculdades se ajustem realidade material. a contemplao dessa
forma pura de cognio, a harmonia com o mundo, que vem a ser esttica. O filsofo acredita
que existem duas fontes do conhecimento humano: a sensibilidade e o entendimento. Por
meio da primeira, os objetos nos so dados; pela segunda, so pensados. S pela conjugao
desses dois elementos possvel a experincia do real. Portanto, para Kant, no somos
capazes de conhecer as coisas como elas so em si, s conhecemos realmente o mundo dos
fenmenos, da experincia, dos objetos enquanto se relacionam conosco, sujeitos, e no com
a realidade em si, tal qual ela , independentemente de qualquer relao com o conhecimento,
pois o mundo dos fenmenos s existe na medida em que participamos dele. A obra de Arte
para Kant 9 desinteressada, universalmente reconhecida por um sentimento, ao mesmo
tempo, individual e coletivo.
Vigotski critica essa tendncia ao dizer que essa uma noo que compreende uma
meia-verdade, pois fornece uma ideia falsa da natureza da reao esttica no seu conjunto.
Para o autor, a obra de arte no percebida quando o organismo est em completa passividade
tampouco percebida s pelos ouvidos e os olhos, mas tambm em atividade interior
complexa, na qual o contemplar e o ouvir so apenas o primeiro momento, o primeiro
impulso, o impulso bsico.
Se o destino de um quadro consistisse apenas em afagar o nosso olho e o da msica em provocar emoes agradveis ao nosso ouvido, a percepo dessas artes no apresentaria nenhuma dificuldade e todos, com exceo dos cegos e surdos, estariam igualmente chamados a perceber essas artes. Entretanto, os momentos de percepo sensorial das estimulaes so apenas os impulsos primrios necessrios para despertar uma atividade mais complexa e em si carecem de qualquer sentido esttico. Distrair os nossos sentimentos, diz Christiansen, no o objetivo final da inteno artstica. O principal na msica o que no se ouve, nas artes plsticas o que no se v nem se apalpa. (VIGOTSKI, 2010, p. 333).
Segundo o autor, a emoo esttica pressupe a existncia de trs momentos:
estimulao, elaborao e resposta. O momento da percepo sensorial da forma, aquele
trabalho desempenhado pelo olho e o ouvido, constitui apenas o momento primeiro e inicial
da vivncia esttica. Para o autor, a arte um [...] sistema especialmente organizado de
impresses externas ou interferncias sensoriais sobre o organismo (VIGOTSKI, 2010, p.
9 As exigncias kantianas ficam difceis de serem cumpridas no sculo XXI, pois, na contemporaneidade, a arte cada vez mais servir aos interesses mltiplos, como a busca desenfreada pelo lucro, a espetacularizao e a diverso.
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333). Entretanto, essas interferncias sensoriais esto organizadas e construdas de tal modo
que estimulam no organismo um tipo de reao diferente do que habitualmente ocorre, e essa
atividade especfica, vinculada aos estmulos estticos, o que constitui a natureza da
vivncia esttica. Nessa vivncia esttica, o espectador constri suas reaes a partir das
impresses externas (elementos que compem a obra como suporte, formas, cores, textura
etc.), criando o objeto esttico.
Realmente, talvez o quadro no represente simplesmente um pedao de pano quadrangular com certa quantidade de tinta aplicada sobre ele. Mas quando o espectador interpreta esse pano e essas tintas como a representao de um homem, um objeto ou ao, o complexo trabalho de transformao do pano pintado em quadro pertence inteiramente ao psiquismo do receptor. necessrio correlacionar de tal modo as linhas, fech-las em tais contornos, relacion-las entre si, interpret-las de tal modo em que perspectiva e transferi-las para o espao a fim de que elas lembrem uma figura humana ou paisagem. (VIGOSTKI, 2010, p. 334).
Para perceber a obra de arte, faz-se necessrio um complexo trabalho de memorizao
e associao de pensamento para se entender, por exemplo, que homem ou que paisagem
esto representados no quadro, em que relao esto as suas diferentes partes. Todo esse
trabalho necessrio pode ser chamado de sntese criadora secundria, porque requer de quem percebe reunir em um todo e sintetizar os elementos dispersos da totalidade artstica. Para o
autor,
[...] se uma melodia diz alguma coisa a nossa alma porque ns mesmos sabemos arranjar os sons que nos chegam de fora [...]. Todo o contedo e os sentimentos que relacionamos com o objeto da arte no esto contidos nela mas so por ns incorporados, como que projetados nas imagens da arte, e os psiclogos denominaram de empatia o prprio processo de percepo. (VIGOSTKI, 2010, p. 334, grifo nosso).
Vigotski comenta que essa atividade de empatia consiste num reatamento de uma srie de reaes internas, da sua coordenao vinculada, e em certa elaborao criadora do objeto
que constitui o dinamismo esttico bsico que, por sua natureza, um dinamismo do
organismo que reage a um estmulo externo.
Na tentativa de entender o sentido biolgico da atividade esttica, o autor compreende,
a partir da elucidao da psicologia da criao do artista e na aproximao entre a percepo e
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o processo de criao, que a criao10 uma necessidade do nosso psiquismo. Parte do
conceito da psicologia moderna de que a criao sublimao, ou seja, transformao de modalidades inferiores de energia psquica, que no foram utilizadas nem encontraram vazo
na atividade normal do organismo, em modalidades superiores. Para ele,
[...] nas questes de criao temos diante de ns como que pessoas ricas e pobres, umas gastando toda a reserva de sua energia para manter a sua sobrevivncia diria, outras como que guardando e economizando, ampliando o currculo de necessidades a serem atendidas. Tambm aqui a criao surge do instante como certa energia no acionada, no utilizada e uma destinao imediata, ela permanece irrealizada e se desloca para alm do limiar da conscincia, de onde retorna transformada em novas modalidades de atividade. (VIGOTSKI, 2010, p. 337).
Para Vigotski, realiza-se na vida do homem apenas uma parte de todas as excitaes
que surgem no sistema nervoso, e a criao cobre inteiramente o resduo que fica entre as
possibilidades e a realizao, o potencial e o real na nossa vida. De acordo com autor, ser
Shakespeare e ler Shakespeare so fenmenos diversos pelo grau, mas idnticos pela
natureza: O leitor poder ser congenial ao poeta e, ao percebermos uma obra de arte, ns
sempre a recriamos de forma nova. legtimo definir os processos de percepo como
processos de repetio e recriao do ato criador (VIGOTSKI, 2010, p. 338).
Por conseguinte, Vigotski considera que a arte surge em nossa vida como forma de
excitao do sistema nervoso que permanece de modo irrealizado na atividade, porque o
sistema nervoso recebe um volume de excitaes superior ao que pode reagir. Porm, o
excedente do comportamento no realizado deve encontrar alguma vazo. Se o sistema
nervoso no encontra a devida vazo, surgem formas anormais de comportamento sob o
aspecto de psicoses e neuroses que significam o conflito da aspirao do subconsciente no
realizada com a parte consciente do nosso comportamento. Sobre isso o autor coloca que
Para o que no se realiza na vida existem apenas duas sadas: a sublimao ou a neurose. Assim, do ponto de vista psicolgico a arte constitui um mecanismo biolgico permanente e necessrio de superao de excitaes no realizadas na vida e um acompanhante absolutamente inevitvel da existncia humana nessa ou naquela forma. (VIGOTSKI, 2010, p. 338, grifo nosso).
10 Segundo Prestes (2010), Vigotski refere-se criao como um processo e no como uma qualidade ou caracterstica de quem criativo (criatividade).
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Assim, [...] na criao artstica a sublimao se realiza em formas tempestuosas e grandiosas, realizando-se na percepo artstica nas formas dos estilos que a ns se dirigem,
formas essas atenuadas, simplificadas e antecipadamente preparadas pelo sistema
(VIGOTSKI, 2010, p. 338, grifo nosso). Portanto, a Educao Esttica tem um importante
papel na criao de habilidades permanentes para a sublimao do subconsciente.
Educar esteticamente algum significa criar nessa pessoa um conduto permanente e de funcionamento constante, que canaliza e desvia para necessidades teis a presso interior do subconsciente. A sublimao faz em formas socialmente teis o que o sonho e a doena fazem em formas individuais e patolgicas. (VIGOTSKI, 2010, p. 338).
O que o autor russo diz de suma importncia para a Educao Esttica. Indica que
fundamental promover momentos de criao artstica, pois assim o indivduo canalizar e
desviar suas presses interiores por via da arte.
Vigotski nos ajuda a perceber que o objetivo final da reao esttica no repetir
alguma reao real, mas super-la e venc-la. Portanto, uma obra de arte vivenciada pode
ampliar a nossa concepo de algum campo de fenmenos, levar-nos a ver esse campo com
novos olhos, a generalizar e unificar fatos dispersos. Como qualquer vivncia intensa, a
vivncia esttica cria uma atitude muito sensvel para o nosso comportamento, como se, a
partir dessas vivncias, pudssemos acumular energia para futuras aes, dando a essas aes
um sentido e um mundo novos.
O prazer provocado por obras de arte sempre surge por via indireta e contraditria e
decorre forosamente da superao de impresses imediatas causadas pelo objeto e pela arte.
Para Vigotski,
necessrio ver o feio em toda a sua fora para depois colocar-se acima dele no riso. necessrio vivenciar com o heri da tragdia todo o desespero da morte para com o coro elevar-se sobre ela. A arte implica essa emoo dialtica que reconstri o comportamento e por isso ela sempre significa uma atividade sumamente complexa de luta interna que se conclui na catarse11. (VIGOTSKI, 2010, p. 345).
De acordo com o autor russo, a relao da vivncia esttica com a educao se dilui
em trs questes:
11 Para Vigotski, a catarse relaciona-se com a [...] liberao das paixes despertadas pela tragdia que constitui um objetivo final da Arte. O horror no representado em prol de si mesmo, mas como impulso para a sua superao (VIGOTSKI, 2010, p. 345).
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a) Educar a criao o desenho ensina o sujeito a dominar o sistema das suas
experincias e a venc-las e super-las. Ensina a ascenso ao psiquismo. Por exemplo:
a criana que desenha um co vence, supera e coloca-se acima de experincia
imediata. A correo do desenho significa uma grosseira interferncia na estrutura
psicolgica da vivncia da criana e ameaa servir como obstculo a tal vivncia. Por
isso, o autor defende a plena liberdade da criao infantil, a renncia tendncia a
equipar-la com a conscincia do adulto e o reconhecimento da sua originalidade.
Existe a tendncia da criana liberdade e independncia em relao ao desenho real
dos objetos. Isso no significa que a criana no consegue ver os objetos como eles
so, mas que ela deforma os aspectos secundrios do objeto em proveito dos aspectos
mais importantes dele.
b) Ensinar as habilidades tcnicas da arte para Vigotski, impossvel penetrar na obra
de arte alheio tcnica de sua linguagem. Por isso, defende que seja oportunizado, na
educao, o mnimo conhecimento tcnico da estrutura de qualquer obra. Neste
sentido agem de forma integralmente pedaggica aquelas escolas nas quais o domnio
da tcnica de cada arte se torna condio indispensvel da formao (VIGOTSKI,
2010, p. 350). Complementa ao falar que o ensino da tcnica deve ser combinado com
a prpria criao do sujeito e da cultura das suas percepes artsticas. Assim, s ser
til aquele ensino da tcnica que vai alm da tcnica e que ministra um aprendizado
criador, ou de criar, ou de perceber.
c) Educar o juzo esttico, ou seja, as habilidades para perceber e vivenciar obras de arte
o autor critica alguns pedagogos que pensavam que observar, ouvir e sentir prazer
fosse to simples que no necessitava de nenhuma aprendizagem especial. Contrrio a
essa opinio, Vigotski considera que esse o objetivo principal e o fim da educao
geral.
O sistema geral da educao social visa a ampliar ao mximo os mbitos da experincia pessoal e limitada, estabelecer contato entre o psiquismo da criana e as esferas mais amplas da experincia social j acumulada, como que incluir a criana na rede mais ampla possvel da vida. Essas finalidades gerais determinam inteiramente tambm os caminhos da Educao Esttica. A humanidade acumulou na arte uma experincia to grandiosa e excepcional que qualquer experincia de criao domstica e de conquistas pessoais parece nfima e msera em comparao com ela. Por isso, quando se fala de Educao Esttica no sistema de educao geral sempre deve-se ter em vista essa incorporao da criana experincia Esttica da sociedade humana: incorpor-la inteiramente arte monumental e atravs dela incluir o psiquismo da criana naquele trabalho geral e universal que a sociedade
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humana desenvolveu ao longo dos milnios, sublimando na arte o seu psiquismo. (VIGOTSKI, 2010, p. 351-352).
Assim, a interpretao da obra de arte o procedimento que exige um aprendizado
especial, [...] a elaborao de habilidades especficas de recriao das obras de arte e, neste
sentido, as aulas de observao de quadros e leitura lenta, introduzidas em algumas escolas europeias, so um modelo de Educao Esttica (VIGOSTSKI, 2010, p. 352, grifo nosso).
Ainda sobre a educao do juzo esttico, considera que preciso introduzir a
Educao Esttica na prpria vida, pois a arte transfigura a realidade das construes da
fantasia e, tambm, da elaborao real dos objetos e situaes. A casa e o vesturio, a
conversa e a leitura e a maneira de andar, tudo isso pode servir como material para a
elaborao esttica.
De coisa rara e ftil a beleza deve transformar-se em uma exigncia do cotidiano. O esforo artstico deve impregnar cada movimento, cada palavra, cada sorriso da criana. de Potiebni a bela afirmao de que, assim como a eletricidade no existe s onde existe a tempestade, a poesia tambm no existe s onde h grandes criaes da arte, mas em toda parte onde soa a palavra do homem. E essa poesia de cada instante que constitui quase que a tarefa mais importante da educao esttica. (VIGOTSKI, 2010, p. 352).
Sobre a Educao Esttica e o talento, Vigotski afirma que no se deve perguntar por
que uma pessoa tem mais ou menos talento, uma vez que um alto grau de talento original do
ser humano um fato bsico em todos os campos do psiquismo e, consequentemente, so
passveis os casos de explicao, os casos de diminuio e perda de talento. Portanto, a tarefa
da Educao Esttica
[...] deve partir da existncia de um alto talento da natureza humana e da hiptese da existncia de grandiosas potencialidades criadoras do ser humano e, assim, dispor e orientar as suas interferncias educativas de modo a desenvolver e preservar tais potencialidades. O talento se torna tambm uma tarefa da educao. (VIGOTSKI, 2010, p. 363).
Nesse sentido, encontrar talentos, evidenciar talentos, no funo da educao, pois
todos os indivduos possuem as mesmas potencialidades criadoras. Marx j apontava para
esse caminho.
Para Vigotski, a possibilidade criadora, para que cada um de ns se torne um
coparticipante de Shakespeare em sua tragdia e em Beethoven em suas sinfonias, o
indicador mais ntido de que, em cada um de ns, existem um Shakespeare e um Beethoven.
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Vigotski vai s mximas alturas da potencialidade da criatividade humana. A partir das ideias
marxianas, ele declara o potencial criador existente em todos seres humanos e apresenta de
que modo isso pode ser valorizado pela escola do seu tempo.
Com base nas contribuies de Vigotski para a Educao Esttica, o que podemos
pensar sobre as prticas que temos na escola? Como pode a Educao Esttica contribuir com
a formao dos alunos tendo em vista todo o processo de racionalizao instrumental que a
escola sofre a partir da cincia moderna e da sociedade capitalista?
Para pensar sobre essas questes, faremos o resgate de algumas ideias aqui
apresentadas na perspectiva de t-las como pressupostos indispensveis para essa discusso.
a) preciso ajudar o indivduo a desenvolver a criticidade, conduzindo-o capacidade de
refletir sobre as ideologias dominantes, postas principalmente pela mdia que compe
a grande Indstria Cultural ou, nos modos de dizer de Vzquez, a arte de massa. Faz-se
necessrio, ento, refletir, negar, problematizar os meios de comunicao, os produtos
da mdia e outros meios de alienao para contribuir com uma educao
emancipadora.
b) preciso ajudar o educando a se apropriar das objetivaes humanas, pois, como
Marx apontou, isso s ocorre de homem para homem, ou seja, pela interao.
c) preciso ampliar ao mximo a vivncia do aluno a partir do que a humanidade
acumulou de grandioso na arte. Para uma Educao Esttica, deve-se incorporar a
vivncia do sujeito esttica da sociedade humana.
d) O alto talento da natureza humana comum a todos os homens, cabe educao
desenvolver tais potencialidades.
e) Para uma Educao Esttica, preciso: educar para a criao e reconhecer a originalidade da criao; ensinar habilidades artsticas combinadas com a prpria criao do sujeito e da cultura das suas percepes artsticas; educar o juzo esttico e ensinar a observar e ler lentamente as obras de arte.
Diante desses pressupostos, na seo que segue, apresentaremos uma proposta de
Educao Esttica por meio das Artes Visuais, tendo como foco especfico a ideia de se
propor leituras lentas das obras de arte.
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4 UMA PROPOSTA DE EDUCAO ESTTICA POR MEIO DAS ARTES VISUAIS: A LEITURA
LENTA DA OBRA DE ARTE
Todos os aspectos apresentados desde as ideias de Vigotski sobre a Educao Esttica
so fundamentais. Contudo, no artigo em tela elencaremos um desses aspectos e faremos uma
ampliao/um aprofundamento relacionado ao que o autor intitulou de leitura lenta da obra de arte.
Entendemos, a partir de Vigotski (2010) e das nossas vivncias no campo do ensino da
arte, que, para ocorrer uma leitura lenta, preciso que se tenha um tempo para ver a obra de arte. Porm, no adianta colocar a imagem na frente do aluno e deix-lo perceber isso
sozinho. Isso seria reiterar a crena de que a percepo esttica uma experincia passiva,
como alerta Vigotski (2010). Assim, preciso ajudar o educando a analisar criticamente a
obra de arte para perceber mltiplas relaes intrnsecas a elas, que passam pelos aspectos
contextuais, formais12 e por outros dilogos estabelecidos entre a imagem lida com outras
obras de arte.
Desse modo, necessrio refletir sobre o contexto de produo da obra, o que no
significa somente ir atrs de uma histria pessoal de vida e de um trabalho artstico ou
imaginar as reaes de um leitor ansioso por completar lacunas de uma possvel interpretao
do texto lido. Entendemos que a imagem o ponto de partida para que se possa compreender
o contexto histrico no qual ela est inserida. preciso interligar o contexto aos aspectos
formais, sem dividir a leitura no que contexto e o que forma. Alm disso, importante
colocar a obra analisada em dilogo com outras imagens do mesmo artista e/ou de outros. Por
conseguinte, interligar a temtica do artista com outros textos, como reportagens de revistas,
msicas ou poesias para criar, a partir da leitura, uma rede de significaes. Essa proposio
refora o fato de que todo texto se constri como um mosaico de citaes, todo texto a
absoro e transformao de um outro texto e, nessa ciranda de significaes, o sujeito amplia
o seu repertrio cultural e sensvel e se aproxima cada vez mais do universo do artista.13 Esta relao dialgica entre vozes no interior de uma obra de arte relaciona-se com o
conceito de polifonia adotado por Bakthin (2000). Com base nessa ideia, possvel pensar 12 No caso da obra bidimensional seria, por exemplo, a linha, a cor, a textura, a forma, a composio e a tcnica. 13 Trata-se do contexto de produo do artista, as suas referncias para a criao, seus gostos, histrias etc.
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que o artista, assim como os leitores, est impregnado por diferentes textos visuais e/ou
verbais vistos e lidos que vo compor os seus repertrios criativos. Desse modo,
compreendemos que, para que a leitura de uma obra seja realizada de modo aprofundado,
preciso, alm dos outros fatores citados, observar os indcios da presena de outras vozes e
outros textos (os intertextos) na imagem analisada e, a partir dessas tramas, atribuir sentido a
essas conexes. Como se, ao ler, pudssemos traar um possvel caminho polifnico subjetivo e relativo a cada leitura de imagem realizada e tambm a cada leitor.
Indissociveis anlise dos aspectos contextuais e intertextuais esto os aspectos
formais, ou seja, a visualidade da imagem. A forma uma mediao necessria para o
contedo esttico, [...] pois este s surge a partir da relao totalmente estruturada, elaborada
dos materiais (FREITAS, 2003, p. 43).
como se a forma da obra de arte, operando uma mediao entre ns e o mundo, acabasse nos fornecendo a possibilidade de vnculo imediato com ele, no obscurecido pela abstrao conceitual, lgica. A experincia esttica parece apontar para uma transcendncia, uma ultrapassagem daquilo que nossos sentidos podem perceber e que nossa razo pode pensar. (FREITAS, 2003, p. 44).
No caso de uma pintura, desenho ou gravura, por exemplo, necessrio explorar as
expresses das formas e de sua disposio no espao, das cores, dos materiais empregados e
dos contrastes plsticos como recursos capazes de construir significados. preciso considerar
as possibilidades de combinaes de cores; se elas instalam ou no movimento e ritmo na
composio criada pelo artista. Cabe identificar como foi realizado o emprego dessas cores:
se so puras, complementares, anlogas etc; a utilizao ou no de tonalidades; os graus de
saturao da cor; a variao ou a manuteno cromtica e tonal; a luminosidade em seus graus
variados e nos jogos entre claro/escuro.
Alm de analisar as relaes cromticas estabelecidas, necessrio perceber como as
combinaes de linhas, volumes e cores superpostas proporcionam efeitos diferentes de
simetria ou de perspectiva, por exemplo. Outros pontos a serem observados dizem respeito
materialidade e tcnica utilizada para criar a obra de arte. Quando se trata de uma pintura,
podem-se observar as pinceladas, as marcas do gesto do artista, ou seja, a deciso do artista de
deixar perceptvel o ritmo impresso na obra que produziu, a espessura da pincelada, o modo
como recobriu o suporte camada por camada ou a deciso de deix-lo perceptvel, o ritmo
impresso pela maneira de fazer e, por fim, o relevo ou a textura que o gestual do artista cria na
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superfcie pictrica. Nesse caso, a cor e a forma desencadeiam diferentes efeitos de sentido e
so consideradas como marcas deixadas no ato de pintar. No campo ainda da pintura, podem-
se perceber as pinceladas: se so contidas, soltas, descendentes, ascendentes, diludas,
pastosas, lisas ou rugosas.
Outro ponto a ser observado a posio e a orientao das formas que geram ou no
movimento no suporte escolhido pelo artista, como elas se relacionam e que efeito essa
organizao composicional proporciona. Alm disso, cabe observar o efeito proporcionado
pelos diversos tipos de suporte que podem ser utilizados pelo artista, como madeira, tela,
metal, papel etc. (REBOUAS, 2003).
Mais dois aspectos importantes de serem analisados, no caso da pintura, so o ttulo da
obra e a assinatura do artista. Segundo Oliveira (2004), quando um artista d sua obra um
ttulo verbal, ele a reelabora numa outra linguagem, a verbal. como se o artista nos desse
uma chave para entrar na obra de arte por ele produzida. Em contrapartida, existem artistas
que no do nomes s obras. O no nomear ou a ausncia dum nome num outro sistema j
por si mesmo uma espcie de ttulo que guia o observador na tarefa de reconstruir a
significao da obra (OLIVEIRA, 2004, p. 130). Oliveira pontua que a assinatura do pintor
um dos modos de presena na tela. Ele, que se presentifica no ato mesmo de organizar o seu
discurso, aparece com essa outra marca, a da assinatura (OLIVEIRA, 2004, p. 130). A
assinatura o selo do pintor que, ao terminar a obra, a identifica como sua e a envia do seu
ateli (mundo privado) para o mundo pblico. A assinatura colocada quando no h nada
mais a ser feito. Ela o ponto final, ou a obra acabada.
Alm disso, o modo como essa imagem foi distribuda e legitimada fundamental e
precisa ser analisado. Sobre esse assunto, Foerste (2012, p. 177) coloca que
[...] ler imagens constitui-se num desafio cotidiano de desvelamento de prticas e concepes humanas imbricadas na materialidade da imagem. Os modos particulares de produo, distribuio e recepo das imagens desafiam-nos a estud-las como objeto que no se esgota em si mesmo, mas que est referido ao complexo campo de relaes de que so produto, so preservadas, divulgadas e/ou recebidas. Percebe-se, ento, que j no possvel ler imagens sob bases unicamente formalistas de anlise, mas que essa anlise implica encontro dos sujeitos. Trata-se do encontro do homem com o homem, mediados pelo objeto das intervenes humanas no mundo.
Nesse sentido, cabe perguntar: Onde a imagem analisada est localizada? Como se deu o acesso a essa imagem? Quem legitimou essa produo como obra de arte? Por que
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essa obra est no museu ou no livro, e no outra? Desse modo, seria incentivada uma postura crtica em relao aos Sistemas de Belas-Artes,14 para que os alunos se habituem a essa prtica e se sintam capazes de fazer suas prprias escolhas culturais.
Assim, possvel pensar que estabelecer relaes entre esses aspectos de modo
indissocivel pode colaborar com a leitura lenta proposta por Vigotski e ampliada por ns. Isso no significa que essa uma frmula que, se repetida, lograr xito e proporcionar uma
Educao Esttica. muito mais do que isso, envolve complexidade, reiteraes e
processualidades. Portanto, consideramos que a leitura lenta deve integrar alm de momentos de anlises formais, conceituais, histricas e intertextuais perodos de suspenso,
um tempo entreimagens que possibilite uma reflexo profunda e vagarosa. No em um momento pontual, mas em vrios momentos que constituem um processo de convvios e de
encontros com as obras de arte, um processo catrtico. Esses momentos de encontro e de
convvio com as imagens integram duas possibilidades de trabalho: a partir de reprodues
das imagens (cpias de boa qualidade) ou com visitas aos espaos expositivos (ateli do
artista, museus, galerias de arte, centros culturais, entre outros).
Alm disso, mais um fator que pode colaborar com a Educao Esttica a proposio
de assuntos relacionados com os interesses dos alunos. Pensamos que a escola precisa se constituir como um espao de debate, dilogo e autoria. Muitas vezes, os assuntos discutidos
no so apreciados pelos alunos. Isso resulta, em alguns casos, numa desmotivao e num
desinteresse em aprender. No se trata de reiterar o conhecimento cotidiano do aluno, mas
propor ampliaes a partir de questes que emerjam da prtica social do educando.
No adianta disponibilizar o mais interessante objeto artstico a uma pessoa, se ela no
tiver, alm de estmulo e curiosidade, a capacidade de compreender de todos os modos, sentir
14 Para Reis (2006, p. 3), a tarefa primordial do Sistema de Belas-Artes [...] identificar, classificar e qualificar um objeto quanto ao seu valor artstico segundo um conjunto de parmetros e critrios teleolgicos previamente definidos. O Sistema de Belas-Artes o mantenedor e controlador do capital cultural da classe dominante. Para esse autor, a origem do Sistema de Belas-Artes surgiu e confunde-se com o processo de consolidao da burguesia brasileira, devido necessidade de se estabelecer parmetros teis para os mecenas e compradores de objetos artsticos nos mercados existentes, para que assim fosse elaborado um cdigo contendo noes gerais de Esttica que serviam para [...] balizar o valor artstico de uma obra, a produo geral de um artista e as suas qualidades enquanto tal (REIS, 2006, p. 3). Frente s demandas dos sculos XVIII e XIX, foi preciso estabelecer um estatuto epistemolgico para a arte, desenvolver uma viso crtica da arte, v-la como um dos dispositivos produtivos e ideolgicos sob o controle, muitas vezes, das classes dominantes. Isso nos coloca diante do senso de urgncia quanto a operar o aparato conceitual e sensvel da arte. Dessa forma, preciso desenvolver na escola propostas que problematizem a histria da arte brasileira e mostrem aos alunos as concepes ideolgicas que estavam permeando as buscas por uma identidade artstica brasileira.
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com outras capacidades humanas (inclusive o raciocnio) esse objeto. Caso isso no seja
proposto, a pessoa ser incapaz de se reconhecer no objeto artstico, ficar impossibilitada de
estabelecer uma relao propriamente humana sensvel com a obra de arte. Como diz
Marx, os sentidos so historicamente constitudos. Eles se refinam e se humanizam a partir de
um processo que inerentemente social. No campo da educao, possvel pensar que esse
processo pode acontecer na escola e precisa contar com diversificadas, intensas e sensveis
mediaes.
5 CONSIDERAES FINAIS
Nas sees anteriores, apresentamos reflexes sobre a Esttica e seu aspecto
educativo, por meio das ideias de Marx e Vigotski. A partir de um dos pilares apontados por
Vigotski quanto Educao Esttica, a leitura lenta, propusemos um aprofundamento que pode ser considerado como uma possibilidade de se educar esteticamente. Assim,
consideramos que, ao proporcionar intensos, diversificados e contnuos encontros com obras
de arte, mediar leituras de imagens que evidenciem tanto os aspectos poticos e intertextuais
quanto os formais dessas obras, ampliados pelo conhecimento do universo do artista e dos
modos de legitimao e divulgao das obras e, por fim, propor assuntos relacionados com os
interesses dos educandos, seria possvel pensar em um modo de se contribuir com a Educao
Esttica do sujeito.
Consideramos que quanto mais intensas e sistematizadas forem as leituras de imagens
maior ser o nosso repertrio cultural para sentirmos e significarmos o mundo e fazermos a
leitura do que nos rodeia e nos acontece (LEITE, 1998, 2005). Como diz Vigotski (2009,
2010), a imaginao se alimenta e se realimenta de materiais tomados/apropriados da
experincia vivida por ns. Quanto mais rica for a vivncia humana, maior ser o material
disponvel para a imaginao.
Diante dessas ideias possvel pensar em uma Educao Esttica como um modo especial de
formao dos sentimentos e dos gostos que possibilite o princpio criador em todas as
atividades humanas e contribua com a formao de identidades, subjetividades e alteridades.
Que busque ampliar, por meio da leitura lenta das imagens, o olhar do sujeito sobre o mundo, a natureza e a cultura, que diversifique e enriquea suas vivncias sensveis estticas. Uma
Educao Esttica que possa estimular outras necessidades e interesses, que promova outras
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buscas no sentido de transformao daquilo que oferecido pelas mdias, por exemplo, por
meio do estranhamento e da inverso do olhar que permita e que busque intensamente a ao
criadora.
READING SLOW ART WORK AS A MOTION FOR AESTHETIC
EDUCATION ON THE BASIS OF MARX AND VYGOTSKY CONTRIBUTIONS
ABSTRACT
The article signals a proposal for Aesthetic Education, from literature search, in dialogue with
studies of Marx and Vygotsky. According to the Marxist theory presents reflections on
aesthetics in the contemporary context and seeks to understand Vygotsky assumptions of
Aesthetic Education. Suggests a path through the visual arts, to educate aesthetically from the
concept of slow reading of the artwork. Considers that one of the possibilities to achieve such
intent is to provide intense, diverse and ongoing encounters with works of art; mediate
readings pictures that show both poetic and intertextual aspects as formal of these works,
magnified by the knowledge of the artist's universe and the legitimation modes and
dissemination of works and, finally, to propose matters relating to the interests of students.
Keywords: Aesthetic Education; Art; Vygotsky; Marx
LECTURA LENTA DE TRABAJO DE ARTE COMO PROPUESTA DE EDUCACIN ESTTICA EN LA BASE DE CONTRIBUCIONES DE MARX Y VYGOTSKY
RESUMEN
El artculo seala una propuesta de Educacin Esttica, a travs de la bsqueda bibliogrfica,
en dilogo con los estudios de Marx y Vygotsky. De acuerdo con la teora marxista presenta
reflexiones sobre la esttica en el contexto contemporneo y busca entender supuestos
Vygotsky de Educacin Esttica. Sugiere un camino a travs de las artes visuales, para educar
estticamente desde el concepto de lectura lenta de la obra. Considera que una de las
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posibilidades para lograr tal propsito es proporcionar encuentros intensos, diversos y en
curso con las obras de arte; mediar lecturas imgenes que muestran tanto los aspectos poticos
e intertextuales como formal de estas obras, magnificadas por el conocimiento del universo
del artista y los modos de legitimacin y difusin de las obras y, por ltimo, para proponer los
asuntos relacionados con los intereses de los estudiantes.
Palabras clave: Educacin Esttica; Art; Vygotsky; Marx
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Data de recebimento: 29/03/2015 Data de aceite: 12/05/2015