7/21/2019 Arte brasileiros http://slidepdf.com/reader/full/arte-brasileiros 1/68 ESPECIAL PRIMITIVO ERUDITO POPULAR Agenda Exposições Keith Haring Marcelo Solá Rebecca Horn Max Ernst Pavilhão das Culturas Brasileiras arteBA Raul Córdula Poteiro Brennand Museu Afro Brasil Emanuel Araújo Galeria Brasiliana Mercado Buenos Aires Berlim Miami julho agosto 2010 número 5 www.brasileiros.com.br
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intuitivo e espontâneo. Reconquistou o espaço daexpressão artística direta, sem os freios acadêmicos.
Esse guerreiro libertou novamente o talento do fazer
artístico. Desenhava com todo o seu ser, como se ele
por inteiro fosse um instrumento e a tinta brotasse
pelos seus dedos.
Teve uma obra meteórica, pintava sobre qualquer
coisa e sem parar, como se soubesse o pouco tempo
que teria de vida. Faleceu em 1990, aos 31 anos,
deixando uma obra contundente.
Pioneiro do grafite, com a sua força vital e sua gene-
rosidade, ampliou as fronteiras do universo das artes
tomando as ruas com a sua arte limpa e precisa.
Na paternidade do grafite há duas genéticas quase
concomitantes: uma é a do grafite que nasce como
consequência da tradição iniciada pela aventura
modernista. A outra, periférica e militante, mani-
festa e traz para o mundo a cultura e identidade do
movimento Hip Hop. Hoje, no Brasil, assistimos à
evolução e mescla das duas.
Vale a pena destacar rapidamente a ressonância
das obras de Fernand Léger e Jean Dubuffet nouniverso de Haring.
Dois elementos são fundamentais para entender as
conexões entre Haring e Léger: a força gráfica com
predominância do desenho, e uma atitude artística
com uma clara motivação de incluir e abraçar o outro.
Em 1972, Dubuffet realiza a escultura Groupe de
quatre arbres para o Chase Manhattan Bank de
Nova York. Imagino o impacto dessa obra na alma
do jovem Haring, na época com 14 anos.
Dubuffet, com seus desenhos infinitos, cria obras
públicas monumentais, totalmente esculpidas e
cobertas com as suas tramas gráficas.
Haring surfou nas ondas do seu fluxo de consciência,preenchendo harmonicamente todos os espaços.
Dessa forma, ele atravessa a ponte erguida por
Dubuffet por onde transitam o erudito e o popular,
o público e o privado desbravando e consolidando
o novo território da arte urbana.
Vinte anos após a sua morte, seus tags mais conhe-
cidos continuam sendo estampados sobre os mais
variados produtos, atualizando a sua obra sempre
viva e jovem.
Porém, um olhar mais atento é necessário para conhe-
cer a densidade da sua obra mais madura e visceral.
Michael Stewart – USA for Africa de 1985, Safe Sex de
88 e The Last Rainforest de 1989 são alguns exemplos
que nos revelam um artista a procura do entendimento
das forças da existência e seu engajamento contra
os preconceitos raciais e sexuais. Viva Keith Haring!
OBRA VIVA!
POR JAIME PRADES
DAS RUAS PARA AS GALERIAS, KEITH HARINGINFLUENCIOU E SE DEIXOU INFLUENCIAR
SERIGRAFIA DE 1983, DE KEITH HARING
Caixa Cultural São PauloGaleria Vitrine da Paulista - Conjunto NacionalAv. Paulista, 2083 - Cerqueira César, São Paulo, SP Metro ConsolaçãoTelefone: (11) 3321-4400De 31 de julho a 5 de setembro de 2010De terça a sábado, das 9 às 21 horasDomingos e feriados, das 10 às 21 horas
Caixa Cultural Rio de Janeiro - Galeria 3Av. Almirante Barroso, 25, Centro, Rio de Janeiro, RJMetrô Estação CariocaTelefone: (21) 2544-4080De 28 de setembro a 14 de novembro de 2010.De terça a sábado, das 10 às 22 horasDomingos e feriados, das 10 às 21 horas
diz o artista, que já teve sua fase de grafiteiro, na
adolescência, e também já fez oficinas com artistas
SEXUALIDADE, POLÍTICA E RELIGIÃO
SE NOS PRIMÓRDIOS OS SÍMBOLOS GRÁFICOS ERAM A ESCRITA, HOJE ELES FAZEM PARTE DO DIÁLOGO VISUALDA PRODUÇÃO CONTEMPORÂNEA, COMO MOSTRAM AS SERIGRAFIAS, PINTURAS E DESENHOS DE MARCELO SOLÁ
radas, havia uma espécie de avião formado porcarrinhos em que se conduzem caixões nos cemi-
térios. Além disso, já expôs em museus e galerias
de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Goiânia, Belo
Horizonte, Recife, Salvador, Nova York, Quebec,
Madri, entre outras.
A pop art, o cinema, os quadrinhos, o rock e a música
eletrônica estão presentes em seus trabalhos e são
suas maiores influências, assim como as cidades
por onde transita. Cita a poeta Ana Cristina Cesar
(1952-1983), que também desenhava, e o artista
Andy Warhol (1928-1987) como referências, mas
não está atrelado a esta ou aquela escola. Segue
seu próprio caminho.
NA PÁGINA AO LADO,LÁPIS E AQUARELA SOBRE
PAPEL, SEM TÍTULO30 X 42 CM. AO LADO,
LÁPIS E AQUARELA SOBREPAPEL, SEM TÍTULO
200 X 170 CM
Casa de Cultura Laura AlvimAv. Vieira Souto, 176 — Ipanema — RJTelefone: (21) 2332-2040Até 1 de agostoTerça a domingo, das 13 às 21 horas
Galeria Arte em DobroRua Dias Ferreira, 417/205 e 206 – Leblon – RJTelefone: (21) 2259-1952Até 7 de agostoSegunda à sexta, das 10 às 18 horasSábados, sob consulta
Paloma Varón é jornalista de Brasília com atuação na área cultural. Foiassessora de curadoria na 10a Bienal Internacional de Curitiba de 2009
DESDE QUE COMEÇOU a vida artística nos anos1970, suas obras já apresentavam diferenciais,
mesmo para os padrões daqueles tempos de trans-
gressões. São daquela época inusitadas esculturas
que ela elaborou para envolver o próprio corpo,
como se obra e artista não se dissociassem. Pois
a alemã Rebecca Horn, que em 1986 ganhava um
prêmio na Documenta de Kassel, uma das mostras
mais importantes do gênero, está pela primeira
vez apresentando sua obra no Brasil. Trata-se de
uma retrospectiva de 35 anos de carreira em car-
taz no Centro Cultural Banco do Brasil-RJ, em que
figuram alguns dos mais relevantes exemplares de
sua produção.
A mostra chamada Rebelião em Silêncio tem tudo
para surpreender quem nunca entrou em contato
com as criações da artista. Por exemplo: instalada
na rotunda do prédio, a uma altura de mais de
30 m, está O Universo em uma Pérola, uma peça de
dimensões enormes, erigida a partir de diferentes
estruturas. A obra envolve espelhos, funis de ouro
e projetores que lançam para o alto a cor azul emforma de pérola: “É uma obra sobre a energia. Sobre
como algo tão pequeno pode se transformar em um
universo”, ela disse.
Ao todo, são 18 peças que mesclam diversas lin-
guagens, como instalação, escultura, videoarte e
pintura. Além de seis filmes, parte importante de
sua produção artística, basta assistir a O Quarto de
Buster, com Donald Sutherland e Geraldine Chaplin.
O filme evidencia sua ligação com o cinema, já que
ela é fã de Buster Keaton (1985-1966), grande nome
do cinema mudo. Enfim, a exposição em cartaz, além
de mostrar as várias vertentes da arte de Rebecca,
revela sua especial capacidade de inserir objetos
comuns do cotidiano em sua investigação criativa,
ao empregar de penas a facas para criar uma obra.
Nome de prestígio na cena artística contemporânea,ela tem obras em acervos de importantes institui-
ções, como o Museu de Arte Moderna de Nova York.
REBELIÃO EM SILÊNCIO
REBECCA HORN GANHA RETROSPECTIVA COM UM CONJUNTO DE TRABALHOS EM QUE NAVEGA PELA PINTURA,INSTALAÇÃO, VIDEOARTE, ESCULTURA E, EVIDENTEMENTE, PELO CINEMA
POR ANA CÂNDIDA VESPUCCI
Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de JaneiroRua 1o de Março, 66, CentroTelefone: (21) 3808-2020Até 18 de julho de 2010De terça a domingo, das 10 às 21 horas
tela L’Ange du Foyer (1937), um dragão cuja riqueza
de traços lembra uma meticulosa trama de tecido,é um dos ícones do movimento que ele ajudou a
fundar na Europa. Mas ele também foi um artista
que se interessou por envolver objetos do coti-
diano em suas criações. Seus romances-colagens
enquadram-se nessa categoria. São três, dos quais
um, com cinco volumes e reunindo 184 obras, está
em cartaz no Brasil. A Mostra chegou ao Museu de
Arte de São Paulo, depois de passar por algumas
das mais importantes instituições europeias, como
o Museu d’Orsay, de Paris, com muito sucesso.
Trata-se do romance-colagem chamado Uma
Semana de Bondade, que se divide em cinco dias
da semana, cada qual com um volume. No passado,os especialistas classificavam esse tipo de trabalho
de Ernst como uma série de estudos artísticos do
autor alemão (1891-1976), que também era escul-
tor e poeta. Portanto, sem grande importância no
conjunto de sua obra. O fato, contudo, é que esses
trabalhos, exibidos uma única vez, em Madri, em
1934, chocaram o mundo, incomodaram a Igreja e,
assim, passaram 70 anos guardados pelo coleciona-
dor francês Daniel Filipacchi. Qual a razão de tanta
polêmica? Simples: em linhas gerais, ironizavam a
vida cotidiana da classe burguesa, com homens e
mulheres mesclados a animais, ainda porque alguns
deles se referem ao livro bíblico Gênesis.
Hoje, entende-se que tais obras são importantes,
sobretudo para se compreender a técnica de Max
Ernst, além, evidentemente, do movimento dadaísta
que ele defendia e que pregava o nonsense. O que
impressiona o público por onde a mostra tem passado
são as habilidades do artista nas colagens em que ele
usava desenhos de revistas, jornais e livros dos séculos
XVIII e XIX, para criar a ilusão de outra realidade. Elepróprio chegou a dizer que “foi um esforço obsessivo
criar o surreal mais realista jamais visto”.
O SURREAL MAIS REALISTA JÁ VISTO
NA MOSTRA UMA SEMANA DE BONDADE , O ARTISTA MAX ERNST IRONIZA A BURGUESIA AO MESCLAR HOMENSE ANIMAIS EM AMBIENTES ELEGANTES E NOBRES
POR ANA CÂNDIDA VESPUCCI
MASP – Museu de Arte de São PauloAvenida Paulista, 1578Telefone: (11) 3251-5644Até 18 de julhoTerças, quartas, sextas, sábados, domingos e feriados,das 11 às 18 horas; quintas, das 11 às 20 horas
Localizada no centro histórico, em frente ao cais,a CASA TURQUESA é um refúgio de paz que oferece conforto, requinte e
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las pontuam conversas entre criações de diferentes
tempos e lugares. Tupi or not tupi, por exemplo,
evidencia como Victor Brecheret bebeu nas tradi-
ções indígenas para compor a escultura moderna
brasileira. Tu me Ensina a Fazer Renda traz louças
projetadas por Marcelo Rosenbaum e cerâmica de
Caroline Harari a partir da rica tradição das ren-
das tecidas por artesãs nordestinas. Avatares do
Alvorada mostra como o traço de Oscar Niemeyer,
nas colunas do Palácio da Alvorada, foi reinter-
pretado por pessoas comuns em portões, muros e
objetos criados em todo o País; o que por sua vez é
reinterpretado por artistas contemporâneos, como
Emmanuel Nassar e Delson Uchôa.
Além dos já citados, participam desse módulo com
obras originais artistas como Alex Flemming, Arthur
Bispo do Rosário, Artur Pereira, Di Cavalcanti, Far-
nese de Andrade, Mestre Guarany, Fulvio Pennacchi,
NA PÁGINA AO LADO BONECAS DA
TRIBO INDÍGENA KARAJÁ E À ESQUERDACONJUNTO DE EX-VOTOS, AMBOS DACOLEÇÃO DO MUSEU DO FOLCLOREROSSINI TAVARES DE LIMA, QUE AGORAPERTENCE AO PAVILHÃO DAS CULTURASBRASILEIRAS. ABAIXO: AVIÕES DO MESTRECUNHA, PERNAMBUCO; BARCO DO ACERVOROSSINI TAVARES DE LIMA; ESCULTURADE PAULO LAENDER, MINAS GERAIS EESCULTURA DE VÉIO, SERGIPE, AO FUNDO
Tarsila do Amaral, Ulisses Pereira Chaves, Vicente
Rego Monteiro e Zé do Chalé. Além dos designers
Irmãos Campana, Lino Villaventura e Ronaldo Fraga.
Obras que não puderam estar ao vivo – como pin-
tura rupestre e manifestações de arte urbana – são
apresentadas em projeção multimídia, recurso nem
sempre utilizado quando se fala de criações do povo.
Homenagear quem veio antes
Não seria possível, a nosso ver, anunciar uma nova
instituição sem fazer uma homenagem a quem
veio antes de nós, abrindo o nosso caminho. Assim,
concebeu-se o módulo Da Missão à Missão, consti-
tuído por uma extensa linha do tempo. O painel tem
início com a Missão de Pesquisas Folclóricas reali-
zada, em 1938, por iniciativa de Mário de Andrade.
À frente do então Departamento de Cultura do
município de São Paulo, Mário determinou que
quatro pesquisadores percorressem o Nordeste e o
Norte do País para registrar as músicas e bailados
populares do Brasil. O acervo coletado pela equipe
naquela ocasião será transferido para o Pavilhão
das Culturas Brasileiras.
Depois dessa ação seminal, destaca-se a atuação
dos intelectuais reunidos em torno do Museu doFolclore Rossini Tavares de Lima, que ocupava o
prédio da Oca até o ano de 2000, e cujo alentado
acervo com cerca de 3.500 peças também ficará
com o Pavilhão. A partir daí, pontuam-se ações
empreendidas por nomes como Gilberto Freyre,
Aloisio Magalhães e Lina Bo Bardi, até chegar à apre-
sentação sintética do projeto do Pavilhão e de sua
missão, que será “pesquisar, registrar, salvaguardar
e difundir a diversidade cultural brasileira, contri-
buindo para o diálogo entre as diferentes culturas
e para o reconhecimento do valor do patrimônio
material e imaterial das culturas do povo”.
O painel abre espaço também para o projeto de
restauração do prédio, que o secretário Carlos
Augusto Calil pretende, se tudo der certo, iniciar
ainda este ano. O projeto do arquiteto Pedro Men-
des da Rocha mantém as virtudes da arquitetura
original, preservando as qualidades do desenho de
Oscar Niemeyer, sobretudo a amplitude de espaço
e a leveza do edifício. Longe de um perfil nostál-
gico ou regressivo, este se pretende um museu dacontemporaneidade, capaz de responder com uma
ação afirmativa a questões do presente e capaz de
contribuir com a transformação social. Queremos
contribuir para que possamos, todos, nos ver como
produtores de cultura, e não apenas consumidores
e espectadores.
FOTO MARIANA CHAMA
*Adélia Borges coordenou a elaboração do projeto do Pavilhão das CulturasBrasileiras e é curadora-geral de Puras Misturas . A equipe curatorial daexposição é integrada também por Cristiana Barreto, José Alberto Nemer eVera Cardim. O projeto museológico foi feito com a colaboração de CristianaBarreto, Marcelo Manzatti e Maria Lúcia Montes, entre outros.
Art Circuits Press Releases is a news distribution service orientedto art professionals, media and collectors interested in Latin American Art and/or to art galleries, museums and institutionsworldwide who wish to contact Latin American collectors. Ourdatabase contains art-centric subscribers throughout Latin America, United States and Spain, including 2,000 writers and art
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Since 2003 Art Circuits has been distributed quarterly as a printed
guide in prestigious art spaces and art fairs, and sent monthly asdigital newsletters to subscribers interested in the South Florida artscene. Art Circuits is a Miami based independent provider of art
pimenta nesta edição. Afinal, ele é filho de Marta
Minujin, a performática argentina mais conhecida
fora dos limites de seu país. Convidada especial
para a Bienal de São Paulo deste ano, na arteBA ela
deu uma prévia do que vai “aprontar” em setem-
bro, no Ibirapuera. Autora de happenings memorá-
veis, um deles em parceria com Andy Warhol. No
sábado, Marta causou congestionamento com uma
performance na qual era replicada por duas modelos
com biotipos idênticos ao dela. “Em São Paulo vou
mostrar uma série de ‘pinturas’ e ‘esculturas’, com
efeitos especiais de luzes”, explica Marta enquanto
atende aos fãs e aos flashes dos fotógrafos.
O público nos quatro dias de Feira superou os 125
mil do ano passado. Se no dia da inauguração,
o ambiente era altamente elitizado com a forte
presença de endinheirados, já no dia seguinte se
NA ARTEBA, MARTA MINUJIN FAZUMA PRÉVIA DA PERFORMANCE QUEAPRESENTARÁ NA PRÓXIMA BIENALDE SÃO PAULO EM SETEMBRO DESTEANO. ELA É, SEM DÚVIDA, A ARTISTAARGENTINA MAIS CONHECIDA FORA DASFRONTEIRAS DE SEU PAÍS. NA DÉCADA DE1960 ATUOU COM ANDY WARHOL
Chile, que há cinco anos luta para projetar a pro-
dução local. “Não temos bienal. A Trienal do Chile,
que teve sua edição inaugural no ano passado, foi
mais um problema para as artes visuais do país que
solução. Foi mal conceituada pelos curadores e mal
formalizada. No Chile, não temos lei de incentivo
para a cultura como há no Brasil. Fernanda Feitosa,
diretora da SP-Arte, disse que criou a feira depois
de constatar que os brasileiros saíam do País para
comprar arte.
A proprietária da galeria Animat, também do Chile,
vê nas feiras oportunidades, tanto no Brasil como na
ACIMA: A INSTALAÇÃO DE CAROLINA ANTONIADIS. UMA CRÍTICAPOP À SOCIEDADE DE CONSUMO. AO LADO: OS JARDINS DE MONETINSPIRARAM A CHILENA MALU STEWART PARA BORDAR SOBREMADEIRA SUA BLUE POND, 2009
Argentina. De opinião diferente, Estela Totah, dona
da Del Infinito, de Buenos Aires, garante que hoje
não há grandes colecionadores como nas décadas de
1940-50. “Hoje, há compradores, especialmente na
faixa dos 25-35 anos que estão estudando arte para
saber o que estão adquirindo. Esse dado é novo no
mercado. Se antes nós nos considerávamos cultos,hoje tentamos conhecer arte.” Para a controvertida
historiadora argentina de arte, Victoria Verlichak,
pesquisadora e historiadora de arte, autora do livro
Marta Traba, o que falta na Argentina é apoio e
envolvimento institucional. “Aqui falta uma política
cultural, como existe no Brasil. Não há como ter
projetos sem o envolvimento financeiro do governo
nacional. Dentro desse panorama a arteBA ganha
importância”, garante ela. Para Tereza Gazitúa, pes-
quisadora e historiadora chilena de arte, o mesmo
sucede em seu país. Há dinheiro para a cultura,
o que não há é um projeto consistente. Matilde
Marin, artista e também pesquisadora de arte, vai
mais longe. “O Brasil, mesmo quando não tinha o
dinheiro que tem hoje, já incentivava a cultura, basta
lembrar a Bienal de São Paulo de 1951. A Argentina,
nessa época, era um país muito mais rico, mas nãofez nada desse porte para as artes plásticas.” Para
Rosa Maria, uma das importantes críticas argenti-
nas de arte, a existência da arteBA é fundamental
para a escoar a produção nacional. “Aqui estão os
galeristas, artistas, críticos e colecionadores, o que
transforma a Feira em num local essencial.”
O brasileiro Thomas Cohn, dono da galeria de
mesmo nome, se diz satisfeito com a arteBA. “Estive
aqui em 2000 e hoje a feira está bem melhor, mais
organizada e com mais expositores.”
A EDIÇÃO DESTE ANO COLOCOU LADO A LADO ARTISTAS CONSAGRADOS COMO O ARGENTINO JULIO LEPARC, OBRA ACIMA, E JOVENS PROMISSORES COMO A CHILENA MALU STEWART NA PÁGINA AO LADO
NA MODERNIDADEO DIVISOR DAS ÁGUAS NO EMBATE ENTRE PRIMITIVOS E ERUDITOS É A EXPOSIÇÃO ORGANIZADA PELO MoMAPRIMITIVISMO NA ARTE DO SÉCULO XX : AFINIDADE DO TRIBAL E DO MODERNO, DE 1984, OBJETO DE REFLEXÃO ATÉ HOJE
POR LEONOR AMARANTE
QUASE NENHUM MOVIMENTO de arte do século
XX escapou da influência da arte primitiva. Grande
parte do estrelado elenco da Escola de Paris bebeu
diretamente na fonte, sem nunca ter colocado os pés
na África, Ásia, Oceania ou Américas. O Surrealismo,
e o Expressionismo mergulharam na chamada arte
“primeira”, para renovar seu discurso visual com
valores e formas diferenciadas.
Muitos dos grandes mestres da pintura e da escul-
tura reinterpretaram traços de artistas anôni-
mos, tribais, de etnias perdidas, especialmente da
África iletrada e atrasada social e intelectualmente,
segundo os padrões culturais do eurocentrismo
vigente. O que se pode dizer do conceito de arte
"primitiva", utilizado desde o início do século XX,
como abrigo semântico, que engloba desde pinturas
pré-históricas a peças criadas pelo homem comum
sem instrução artística?
O termo naïf é mais recorrente nos discursos dos
galeristas que comercializam pinturas coloridas,
realistas, marcadas pela espontaneidade de umfigurativismo livre dos dogmas da composição e da
perspectiva. No Brasil, Heitor dos Prazeres e José
Antônio da Silva, já na década de 1950, abriram o
caminho para uma comunidade muito ativa que se
firmou nas duas décadas seguintes.
O divisor das águas no embate entre primitivos
e eruditos é o MoMA, que, em 1984, idealizou a
exposição Primitivism in 20th Century Art: Affinity
of the Tribal and the Modern. Inteligente e essencial,
a intensa pesquisa teve como curador William Rubin
uma montagem instigante, colocou lado a lado obras
de mestres ocidentais modernos, como Picasso,
Giacometti, Brancusi e Henry Moore, com peças
museológicas da Guiné, Oceania e América. Um
dos objetivos era mostrar a semelhança das formas
entre as obras de períodos tão distantes entre si. O
resultado foi muito além e colocou em xeque, mesmo
fora dos domínios do MoMA, o caráter político e
moral das obras celebradas pelo mercado interna-
cional desses intocáveis mestres contemporâneos.
Uma das críticas foi a excessiva ênfase dada às
afinidades formais, que evidenciavam as desigual-
dades culturais e sociais. E também o fato de que
os artistas ocidentais eram mostrados geniais, por
terem descoberto e recriado primitivos anônimos
e atemporais.
NA PÁGINA AO LADO: ESCULTURA DA ETNIA ZULU, ORIGINÁRIA DA ÁFRICA DO SUL. COLEÇÃO DO BRITISH MUSEUM. ACIMA: ESCULTURAEM BRONZE DO ARTISTA ITALIANO ALBERTO GIACOMETTI, DE 1929. ACERVO DE RUTH E FRANK STANTON
Quai Branly, que reúne peças importantes de vários
períodos e de alto valor antropológico e etnográfico.Ao entrar no museu ou em qualquer uma des-
sas exposições, pode-se imaginar a avidez desses
artistas sobre a produção da África, Ásia, Oceania
e da América que eram autênticos reservatórios
de formas e valores inovadores. Há pontos em
comum que chamam a atenção dessa produção
“pirata” europeia. Em primeiro lugar, eles tomaram
o elemento primitivo como escudo da moderni-
dade e da filiação às formas autênticas e radicais.
Depois se apropriaram do que eles consideravam
“exótico” para recriar uma arte com as práticas
ocidentais da época — e, como ressaltou Gill Perry,construindo uma arte, “sob a égide da política
colonial europeia”.
Na verdade, a ausência de uma iconografia acessível
desses objetos permitiu que eles fossem facilmente
absorvidos por uma cultura artística moderna.
Essa descontextualização fez com que os artis-
tas modernos fossem acusados de responder de
modo etnocentrista à arte africana e da Oceania,
atribuindo a suas aparências sentidos ocidentais
do século XX.
À ESQUERDA: CABEÇA TROFÉU DA TRIBOBRASILEIRA MUNDURUCU. ACERVO DOMUSEU VOLKERKUNDE, BERLIM. À DIREITA:CABEÇA TROFÉU DE EMIL NOLDE. COLEÇÃODO MUSEU SEEBÜL, DA ALEMANHA
uma linha divisória entre arte de gente rica e arte
de gente pobre, enunciada em dicotomias, como
“arte erudita e arte popular”, “arte culta e arte
primitiva”, “arte civilizada e arte ingênua, ínsita
ou naïf”. Nesse contexto, um artista do Nordeste
cuja obra foi incorporada à obra de um artista
metropolitano não tem como se defender, pois
seu “produto” não tem repercussão fora de seus
escassos limites, e o artista que se apropriou
da criação periférica é louvado como autêntico
descobridor da cultura brasileira. Na verdade, ao
artista de sucesso é dado o direito de lançar mão
da obra dos humildes.
Exemplos emblemáticos estão em todo o Brasil.
Quem, por exemplo, não encontra Bispo do Rosário
ou dos bordados do Ceará na obra de Leonilson;
Vitalino nas esculturas de Brecheret e nos dese-
nhos de Tarsila do Amaral, Mestre Noza do Jua-zeiro; e detalhes dos entalhes de igrejas barrocas
em Efrain Almeida ou Tota da Paraíba, em Miguel
dos Santos? Há inclusive forte aparato teórico em
defesa dessa forma de apropriação no Movimento
Armorial criado e defendido por Ariano Suassuna,
no qual ele toma posse da cultura do povo nordes-
tino em função de sua valorização e divulgação.
Seus sucessos teatrais têm base na literatura de
cordel. Isso se tornou um hábito nacional, uma
“atitude” moderna e contemporânea.
Parece muito cômodo usar a obra alheia como
ponte para a realização da própria obra. A grande
maioria dos artistas primitivos e toda a gama
de manifestações artísticas do povo não têm
nenhuma projeção, com raríssimas exceções apoia-
das por poucos críticos de arte ou teóricos. O caso
de José Bezerra, escultor do Vale do Catimbau,
sertão pernambucano, é uma dessas exceções a
partir de sua exposição em São Paulo no ano pas-
sado. O conjunto de suas esculturas na exposição
poderia ser atribuído a um artista contemporâneo.Mesmo assim, artistas como ele são vistos como
excepcionais, carentes, dependentes, inferiores.
A consciência artística de Zé Bezerra, em sua
simplicidade, confunde-se com a compreensão de
todo artista maduro e culto. Exemplo disto foi seu
comentário ao ver outro escultor dar esmerado
acabamento em uma peça: “Não adianta dar muito
acabamento, lixar, polir, porque arte é emoção,
enquanto eu tenho emoção, sei que estou fazendo
arte, quando a emoção acaba a arte está pronta”.
O TRAÇO DA XILOGRAVURA DO MESTRE NOZA CRUZA COM OEXPRESSIONISMO ALEMÃO DA DÉCADA DE 1910. ELE É CONSIDERADOO MAIS EXPRESSIVO ARTISTA BRASILEIRO DE CORDEL, COM OBRASEM ACERVOS DE VÁRIOS PAÍSES
OÁSIS CRIATIVOFRANCISCO BRENNAND CONSTRÓI UM IMPÉRIO ARTÍSTICO HÁ MAIS DE 5ANOS, EM UMA ANTIGA FÁBRICA DE PORCELANA, NO BAIRRO DA VÁRZELONGE DO CENTRO DA CAPITAL PERNAMBUCANA
POTEIRO DEIXA UM LEGADO LIVRE DAS AMARRAS DO CIRCUITO DE ARTE, COM PINCELADAS DE CORESDENSAS E VIBRANTES QUE MESCLAM HUMOR, OUSADIA E INQUIETAÇÃO PERMANENTE
POR PX SILVEIRA
ABAIXO: COMO TODO BRASILEIRO, POTEIRO TAMBÉM AMAVA O FUTEBOLETERNIZADO NA OBRA O JOGO E A PELADA , 90 X 100 CM, 2004.
AO LADO: CINCO ILHAS BRASILEIRAS, 120 X 120 CM, 1996
Afro Brasil abre espaço para um bem-vindo senso de
oportunidade e inclusão estética: exibe a exposiçãoDe Arthur Friedenreich a Edson Arantes do Nasci-
mento. O negro no futebol brasileiro. “Friedenreich,
filho de alemão com negra, representa o começo
da inserção do negro no futebol brasileiro. Essa
exposição é uma homenagem a essa memória, a
esses atletas que fizeram a diferença, que deram
alegria, que inventaram a bicicleta, a folha seca. É
o drible do Garrincha, a genialidade do Pelé, a força
do Djalma Santos, a elegância do Didi.”
Emanoel Araújo é fascinado pela questão da
memória e por personagens que não podemos
deixar morrer, porque podem significar inclusive
autoestima. “Em um País como o nosso, em que a
gente sempre está precisando ser incentivado por
alguma razão, porque o Brasil às vezes é muito
difícil, muito duro, de qualquer lado que a autoes-
tima venha, será importante. Poder entusiasmar
jovens negros, a população mestiça, quem morana periferia, ver seus rostos iluminados de alegria,
isso é o que a gente quer.”
À ESQUERDA: ESTATUETAFEMININA, ATTIE , COSTA DOMARFIM, MADEIRA, ACERVOMUSEU AFRO BRASIL.À DIREITA: EMANOEL
ARAUJO, XANGÔ, 2006,MADEIRA, MIÇANGA ECRISTAL, 220 X 60 X 20 CM
Museu Afro BrasilAvenida Pedro Álvares Cabral, s/ nºParque Ibirapuera - Portão 10São Paulo - SP - BrasilTel. 55 11 5579 0593www.museuafrobrasil.com.brTer. a dom., das 10 às 17 horas (permanência até às 18h)Estacionamento: Portão 3 - Zona Azul
desenvolvido uma consequente reflexão sobre aarte e a cidade e a inter-relação entre coletivos de
artistas), além de Sara Ramo, Cinthia Marcelle e
Marilá Dardot, que já expuseram juntas na Galeria
Vermelho, em São Paulo.
Mas, certamente, a aposta mais ousada é a que
envolve a participação do coletivo Pixação, talvez
como um acerto de contas com os problemas da
Bienal passada. Não só por isso, é a mais “política”
(ou seja, a mais tensa) das apostas dos curadores,
uma vez que trazer o “pixo” para a Bienal pode ter
significações incontroláveis. A ira reacionária, porexemplo. Recentemente, a revista Veja anunciou
que a “Bienal abre as portas para o vandalismo
que pretende ser arte”. É de política bruta que
eles estão falando.
Francisco Alambert
Professor de História Social da Arte do Departamento de História daUSP. Escreveu, com Polyana Canhête, Bienais de São Paulo: daEra do Museu à Era dos Curadores (Editora Boitempo).