UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ Centro de Ciências Agrárias - Departamento de Ciências do Solo APOSTILA DE DISCIPLINA (AK0015) MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA Profa. Dra. Mirian Cristina Gomes Costa Fortaleza, CE Maio - 2013
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
Centro de Ciências Agrárias - Departamento de Ciências do Solo
APOSTILA DE DISCIPLINA (AK0015)
MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA
Profa. Dra. Mirian Cristina Gomes Costa
Fortaleza, CE
Maio - 2013
11
PARTE I – ENTENDENDO A IMPORTÂNCIA DO MANEJO E CONSERVAÇÃO DO
SOLO E DA ÁGUA
1 Introdução
1.1 O crescimento da população mundial e a necessidade de aumentar a
produção de alimentos
Estudo conduzido pela ONU (Organização das Nações Unidas) aponta para
alguns aspectos que devem ser levados em consideração ao pensar na importância
do uso do solo para a agropecuária. Dentre esses aspectos se destacam:
a) Crescimento da população mundial (Figuras 1A e 1B);
No que se refere ao aumento da população mundial, em 2008, a ONU divulgou
relatório que apresenta estimativa em relação ao número de habitantes em escala
planetária para o ano de 2050, que poderá atingir 9,2 bilhões de pessoas. De acordo
com a pesquisa, o crescimento da população deve ocorrer de forma significativa
somente nos países em desenvolvimento, no caso dos países desenvolvidos as
mudanças serão modestas.
Figura 1A. Crescimento populacional (Fonte : United Nations: words Population
Prospects: The 2006 Revision (2007)
12
Figura 1B. Crescimento populacional mundial em diferentes cenários no futuro
(Fonte: Millenium Ecosystem Assessment)
b) Aumento da produção total e per capita de alimentos, porém em
gradientes muito menores para o segundo caso (Figura 2);
Para alimentar a produção mundial crescente, a agricultura desempenha
papel fundamental. O sucesso atual da agricultura, em escala global, deve ser
reconhecido, uma vez que este satisfez a demanda crescente de alimentos durante
a última metade do século XX.
Nas últimas quatro décadas, a produção global de alimentos cresceu cerca de
170%. Em 2005, em uma área de 47 milhões de hectares, foram colhidos 2,5 vezes
mais grãos (120 milhões de toneladas) (BORTOLOZZO, 2009). Assim, em 2050, o
Brasil terá a capacidade de produzir um bilhão de toneladas de grãos. Este sucesso
na produção de alimentos se deve aos avanços científicos e às inovações
tecnológicas, como por exemplo, o desenvolvimento de novas variedades de
plantas, o uso de fertilizantes e defensivos e aperfeiçoamento de sistemas de
irrigação (Quadro 1).
No entanto, apesar do sucesso da agricultura, a base de produção está sendo
comprometida. Isso acontece porque os recursos naturais (solo, água e a própria
13
diversidade natural genética) estão sendo excessivamente degradados e porque há
uma grande dependência de combustíveis fósseis não renováveis.
c) Redução dos preços de produtos agrícolas (Figura 2);
A agricultura brasileira vem se desenvolvendo e modernizando, destacando-
se como atividade de alto valor econômico e social, com tendência de crescimento
acentuado em curto prazo. A amplitude dos mercados interno e exteno e a tendência
de aumento da produção de alimentos contribuem para a dinâmica de redução dos
preços dos produtos agrícolas.
Figura 2. Produção de alimentos mundial e per capita, preços e número de pessoas
subnutridas Millenium (Ecosystem Assessment).
14
Quadro 1 - Produtividade, área plantada, custo atual e renda diferencial proporcionada pela geração de pesquisa aplicada às
culturas do algodão e cajueiro em diferentes sistemas de produção no Nordeste brasileiro
Sistema de Produção
Região
Produtividade
(kg/ha)
Área plantada
atual no NE (ha)
Custo atual
(R$/Kg)
R$/arroba)
Renda potencial
diferencial gerada
pela pesquisa9/ (R$)
Algodão herbáceo NE 4951/ 283.8581/ 9,187/ 1.289.879.138,00
Algodão arbóreo1 NE 2631/ 26.2241/ 9,187/ 63.313.652,20
Algodão mocó (1º ano) Seridó, PB, RN 5002/ 26.2241/ 9,187/ 57.054.507,80
Algodão mocó (2º ano) Seridó, PB, RN 8002/ 26.2241/ 9,187/ 129.275.404,00
Algodão 7MH Seridó, PB, RN 1.3502/ 26.2241/ 9,187/ 261.680.380,00
Algodão herbáceo de sequeiro Sudoeste da Bahia 1.1002/ 283.8581/ 9,187/ 1.576.518.946,00
Algodão herbáceo de sequeiro Sertão, PB 1.7002/ 283.8581/ 9,187/ 3.140.008.810,00
Algodão herbáceo irrigado Sertão, PB, CE 2.9502/ 283.8581/ 9,187/ 6.397.279.360,00
Cajueiro gigante (castanha de
caju)3
CE, RN, PB 2093/ 647.4996/ 0,908/ 121.794.562,00
Cajueiro anão precoce de
sequeiro (castanha de caju)4
CE, RN, PB 7234/ 647.4996/ 0,908/ 299.533.037,00
Cajueiro anão precoce de
irrigado (castanha de caju)4
CE, RN, PB 1.2865/ 647.4996/ 0,908/ 627.620.781,00
1 - Média para a safra 1996/1997 de acordo com Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (1977), citado por Beltrão
(1999); 2 - Produtividades médias conforme Beltrão (1999); 3 - Produtividade média dos anos de 1989 a 1998, conforme banco de
dados do Centro Nacional de Agroindústria Tropical (CNPAT) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA); 4 -
Produtividade média de cajueiro anão precoce em condições de sequeiro de oito anos de produção; 5 - Produtividade média de
cajueiro anão precoce em condições irrigadas de cinco anos de produção; 6 - Área plantada para a safra 1995/1996 conforme
IBGE, citado por Silva (1998); 7 - Fonte: Folha de São Paulo (1999); 8 - Preço médio das áreas produtoras de Acarape (R$1,00) e
Acaraú (R$0,80), Ceará. Fonte: Diário do Nordeste (1999); e 9 - Renda diferencial = {Área plantada (ha) X produtividade do
15
sistema de produção considerado (com aplicação de pesquisa) (kg/ha) X custo atual (R$/kg)} - {Área plantada (ha) X produtividade
do sistema de produção médio nas áreas produtoras (kg/ha), indicada pelos itens 1,2 e 3 X custo atual (R$/kg)}.
12 1.310.0001.320.000
1.330.0001.340.000
1.350.0001.360.000
1.370.0001.380.000
1.390.0001.400.000
1.410.0001.420.000
1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005
Ano
Te
rra
s a
rá
ve
is (
10
00
ha
)
d) Redução da área agrícola e de pastagens nos países desenvolvidos e
aumento da área agrícola e de pastagens nos países em desenvolvimento
(Figura 3);
Países desenvolvidos, em virtude à maior ênfase em atividades industriais,
apresentam redução na área utilizada na agropecuária, concentrando as áreas de
produção e buscando a máxima eficiência produtiva. Já nos países em
desenvolvimento, vastas áreas são ocupadas com atividades ligadas à
agropecuária, mas muitas vezes os sistemas de produção são de baixa eficiência.
f) Redirecionamento do uso atual da terra nos países desenvolvidos
(Figura 4);
Em função das condições edafoclimáticas desfavoráveis e até mesmo da
necessidade de manter áreas de preservação de espécies nativas, áreas antes
destinadas ao uso para a agricultura estão sendo convertidas em áreas de
manutenção de florestas, tornando necessário estabelecer formas de repor os
alimentos que antes eram produzidos nessas áreas.
g) Redução da disponibilidade de novas áreas cultiváveis (Figura 5).
Aspectos desfavoráveis do ponto de vista do clima e do solo, a perda de
que se tornaram improdutivas em virtude da degradação dos solos, bem como a
necessidade de manter as áreas de preservação têm levado à redução na
disponibilidade de novas áreas cultiváveis. Neste sentido são levantados
importantes questionamentos: Como produzir alimentos para uma população cada
vez mais crescente? Como produzir alimentos em condições potencialmente
limitadas de área disponível?
Para poder responder estas perguntas é necessário o entendimento das
conseqüências das práticas atuais que estão comprometendo a produtividade
ecológica, atual e futura, dos campos agrícolas.
1.2 Condições técnicas que comprometem a produtividade ecológica (atual e
futura) e que são conseqüentes das atividades agrícolas predominantes nos
campos agrícolas atuais
a) Degradação do solo: pode envolver a salinização, alagamento,
compactação, contaminação por defensivos, perda da qualidade da estrutura,
perda de fertilidade e erosão;
13
Figura 5. Área de terras aráveis mundiais (FAOSTAT, 2006)
b) Desperdício e uso exagerado de água: a agricultura é responsável por
2/3 do uso global da água e é uma das principais causas de sua falta em muitas
regiões. Mais da metade da água aplicada nas culturas não é absorvida pelas
plantas;
c) Poluição do ambiente: Incluem-se como poluentes os defensivos, os
fertilizantes e sais, além de sedimentos. Vários são os exemplos de poluição e um
deles é o caso do Pantanal Mato-Grossense. Lá, nas áreas de cultivo de soja,
cana-de-açúcar, algodão e milho na região do planalto que circunda a planície
pantaneira, bem como nas áreas de arroz irrigado na própria planície (como no
Pantanal do rio Miranda), o uso excessivo de defensivos está contaminando uma
das mais importantes e ainda conservadas áreas úmidas do mundo. Além da
agricultura intensiva praticada nas terras altas que, nos últimos 40 anos, não tem
respeitado a legislação que obriga a manter conservadas as áreas de proteção
permanente, como as matas ciliares (matas ao longo dos rios e córregos) e as
áreas de nascentes, bem como as áreas de reserva legal.
d) Dependência de insumos externos: os altos rendimentos da
agricultura atual estão relacionados ao aumento do uso de insumos agrícolas:
água para irrigação, fertilizantes, corretivos, defensivos, energia para máquinas e
bombas e na tecnologia necessária ao desenvolvimento de novos insumos;
e) Perda da diversidade genética: a diversidade genética geral das
plantas domesticadas diminuiu, muitas variedades foram extintas e outras têm
caminhado nesta direção. Apenas seis variedades de milho, por exemplo, são
responsáveis por mais de 70% da produção mundial deste grão. Esta perda ocorre
por conta da ênfase da agricultura convencional em ganhos de produtividade em
curto prazo. Contudo, a vulnerabilidade de uma cultura com uma base genética
restrita é muito maior com relação ao ataque de pragas, patógenos (que adquirem
resistência a agrotóxicos e aos compostos de defesa da planta), clima e outros
fatores ambientais;
f) Redução da participação da população rural sobre a produção
agrícola: há uma diminuição da população rural diretamente envolvida com a
produção agrícola, tanto nos países desenvolvidos como nos em
desenvolvimento. Pequenos produtores não podem bancar o custo de atualização
de equipamentos e tecnologia agrícola para competir de maneira bem-sucedida,
com as operações da produção em grande escala;
g) Desigualdade global: apesar dos aumentos na produtividade e
produção, a fome persiste no mundo. Enormes disparidades quanto a ingestão de
calorias e a segurança alimentar entre pessoas de nações desenvolvidas e
aquelas de nações em desenvolvimento. As relações de desigualdade tendem a
14
promover políticas e práticas agrícolas que são dirigidas mais por considerações
econômicas do que pela sabedoria ecológica e pensamento em longo prazo. Por
exemplo, agricultores deslocados pela produção para exportação dos grandes
proprietários de terras, são freqüentemente forçados a cultivar terras marginais,
não aptas à agricltura. Os resultados são os desmatamentos, a erosão severa e o
dano social e ecológico sério.
2 O uso do solo no nordeste brasileiro/Ceará
Grande parte da economia agrícola nordestina está fortemente sustentada
na exploração dos recursos naturais, principalmente no que se refere ao
extrativismo da cobertura vegetal, ao superpastejo em pastagens nativas e a
exploração agrícola sem qualquer tipo de preocupação conservacionista (Sampaio
& Salcedo, 1997) (Quadro 2). Araújo Filho & Carvalho (1996) comentam que 73%
do consumo de energia primária para a indústria de alguns estados nordestinos
têm como fonte o carvão e a lenha e, em termos globais, o uso destas fontes
atende 33% do consumo de energia.
Quadro 2. - População total e rural no semi-árido em 1991, bovinos + caprinos no
NE em 1995, produção de lenha e carvão em 1989, área irrigada no
semi-árido em 1985 e áreas degradadas no NE*
EF População bovino
s
ovinos lenha Carvão área
irrigad
a
Áreas degradadas
tota
l
Rural caprino
s
MF F-MF F M
---------106-------- 106 m3 103 Mg 103 ha 103 km2
PI 2,6 1,2 1,98 3,21 1,73 6,3 13,6 5,9 0,5 7,9 0,6
CE 6,3 2,2 2,10 2,31 12,16 49,9 67,3 42,5 8,8 5,1 20,
6
RN 2,4 0,7 0,57 0,45 5,36 23,4 17,5 9,0 1,4 2,6 6,0
PB 3,1 1,1 0,86 0,68 1,90 22,5 16,2 21,1 6,9 3,0 4,3
PE 3,4 1,6 1,27 1,49 2,81 70,1 50,4 16,3 7,2 1,5 -
AL 0,9 0,5 0,80 0,18 1,30 6,4 4,9 0,9 - - -
SE 0,5 0,3 0,91 0,20 0,87 6,4 6,6 2,7 - - -
BA 5,8 3,2 10,02 6,76 20,36 135,3 71,9 20,3 6,7 1,6 -
Tota
l
25,
0
10,8 18,51 15,26 46,49 320,3 248,3 118,7 31,6 21,8 31,
5
MF = muito forte; F = forte; M = moderada.
(Adaptado de SAMPAIO, E.V.S.B. & SALCEDO, 1997)
Sampaio & Salcedo (1997) comentam que, considerando a produção média
de lenha das caatingas que é de 24 m3 ha-1 (ou 70 estéreo ha-1) utilizando o fator
15
de conversão de lenha para carvão de 12,5 estéreo Mg-1 (PNUD-FAO-IBAMA,
1992), estes números corresponderiam ao corte raso de 5,0x103 km2 no Ceará,
2,2x103 km2 no Rio Grande do Norte, 0,8x103 km2 na Paraíba e 1,2x103 km2 em
Pernambuco.
São proporções anuais pequenas (1,2 a 4,3%) mas, como a vegetação leva
de 10-15 anos para recuperar mais de 90% da biomassa original, afeta áreas
totais 10 a 15 vezes maiores. Os autores comentam que tais retiradas, associadas
às áreas agrícolas, são responsáveis pela maior parte das áreas desmatadas
nestes estados, o que corresponde a 53% (CE), 66% (RN), 49% (PB) e 55% (PE),
em 1992, tendo crescido 5%, 21%, 9% e 10% em 19 anos (PNUD-FAO-IBAMA-
SUDENE, 1993).
Estes dados tornam bastante evidente que as reservas florestais naturais
estão sendo utilizadas para o suprimento desta demanda, com graves
conseqüências, perfeitamente perceptíveis, a começar pela redução da
biodiversidade (flora e fauna), inclusive com espécies ameaçadas de extinção
(Figueiredo et al., 1994), a redução do potencial de produção agrícola de solos,
bem como suas conseqüências sócio-políticas que se tornam evidentes pela
migração sempre crescente do meio rural.
A lista de espécies ameaçadas de extinção no Ceará relaciona 38 espécies
de plantas, a grande maioria arbóreas, incluindo o angico-preto, o angico branco,
a aroeira, o bálsamo, a braúna, o caroá, o cedro, a craibeira, o cumaru, o gonçalo
alves etc.
Todos estes fatores em conjunto culminam com a degradação do ambiente.
Tal realidade é comprovada por Sá et al. (1994) que realizaram levantamento de
áreas degradadas no nordeste brasileiro. Os autores indicaram que os estados da
Paraíba, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco apresentam proporções
equivalentes a 64, 53, 36 e 25%, respectivamente, da superfície destes estados,
entre os níveis de degradação moderado, forte a muito forte. Predominantemente
os níveis identificados estão associados a Luvissolos, Planossolos e os Neossolos
Litólicos, solos nos quais o binômio algodão-pecuária, juntamente com a
exploração da vegetação para produção de lenha, madeira e carvão, foram os
principais agentes de degradação.
No Ceará, os 53% equivalem a 77.000 km2, de um total de 148.016 km2
0
50
100
150
200
250
1968 1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996
Anos
Pro
du
tivi
dad
e m
éd
ia (
kg/h
a)
16
com grande parte ocupada por Luvissolos, Planossolos e os Neossolos Litólicos.
As conseqüências da perda da qualidade destes solos se refletiram na queda da
produtividade do algodão mocó no estado do Ceará, no passado o maior produtor
do país (Figura 6).
Figura 6. Produtividade media do algodão-mocó, de 1973 a 1996, no estado do
Ceará, Brasil (EMBRAPA, 1996)
3 A necessidade de sistemas sustentáveis de produção de alimentos
A produção agrícola pode ser aumentada principalmente de três maneiras:
a) incorporação de novas áreas de produção; b) aumento nos ciclos de cultivo (ex:
culturas de “safrinha”) ou c) aumento da produtividade.
Como já visto, a abertura de novas frentes agrícolas nem sempre é
possível, pois muitas áreas devem ser destinadas à preservação, principalmente
se não forem aptas ao uso agrícola. Já o aumento nos ciclos de cultivo dependerá
do desenvolvimento de técnicas relacionadas ao melhoramento genético das
culturas, viabilizando ciclos mais curtos, bem como do desenvolvimento de
técnicas relacionadas à irrigação para garantir a produção agrícola fora da estação
chuvosa. Já o aumento da produtividade é uma opção bastante viável a ser
trabalhada, pois o manejo adequado dos sistemas de produção pode fazer com
que a produtividade das culturas seja aumentada de forma bastante satisfatória.
O aumento na produção de alimentos a partir de aumentos de produtividade
deve ser fundamentado na sustentabilidade, ou ainda, deve ser uma produção
sustentável. A sustentabilidade ou produção sustentável pode ser definida como a
condição capaz de perpetuar a colheita de biomassa de um sistema, porque sua
capacidade de se renovar ou ser renovado não é comprometida. Como a
perpetuidade nunca pode ser demonstrada no presente, a prova de
sustentabilidade permanece no futuro, fora do alcance.
Assim, é impossível se saber, com certeza, se uma determinada prática
agrícola é, de fato, sustentável ou se um determinado conjunto de práticas
constitui sustentabilidade. Contudo, é possível demonstrar que uma prática está
se afastando da sustentabilidade, principalmente se aprendermos a identificar os
efeitos desejáveis de uma agricultura sustentável, como:
a) Efeitos negativos mínimos no ambiente e não liberação de substâncias
tóxicas ou nocivas na atmosfera, água superficial ou subterrânea;
17
b) Preservação e recomposição da fertilidade, prevenção da erosão e
manutenção da saúde ecológica do solo;
c) Uso da água de maneira que permita a recarga dos depósitos aqüíferos e
satisfaça as necessidades hídricas do ambiente e das pessoas;
d) Depender, principalmente, de recursos de dentro do agroecossistema,
incluindo comunidades próximas, ao substituir insumos externos por ciclagem de
nutrientes, melhor conservação e uma base ampliada de conhecimento ecológico;
e) Trabalhar para valorizar e conservar a diversidade biológica, tanto de
paisagens silvestres quanto de paisagens domesticadas;
f) Garantir igualdade e acesso às práticas, conhecimento e tecnologias
agrícolas adequados e possibilitar o controle local dos recursos agrícolas.
4 A agricultura irrigada no nordeste brasileiro e a sua sustentabilidade
As ações voltadas para a expansão das áreas irrigadas merecem destaque,
pois esta discussão pode estar inserida numa abordagem mais ampla e de
complemento aplicado do conceito de sustentabilidade. No nordeste as áreas
irrigadas são consideradas privilegiadíssimas, já que nesta região a água é um
recurso escasso, sendo considerada potencial e importante fonte de geração de
renda e emprego.
Embora seja apontada como solução salvadora do Nordeste brasileiro, esta
atividade só é rentável e sustentável se realizada de forma adequada, por meio de
técnicas que maximizem a eficiência do uso da terra e da água, promovendo
assim, a redução de custos operacionais e impactos ambientais.
No estado do Ceará são poucos os perímetros que mantém essa
sustentabilidade econômica. Alguns perímetros irrigados implantados no passado
apontam vários erros, inclusive de engenharia, que devem ser considerados no
presente e futuro, evidenciando principalmente a falta de tecnologia e assistência
técnica, como razão para o comprometimento destas áreas. O uso atual de
algumas áreas irrigadas indica que a degradação do solo pela compactação e
salinização já é uma realidade, como, por exemplo, os casos da Chapada do
Apodi e Morada Nova.
O potencial comprometedor do uso inadequado dos recursos na
sustentabilidade destas áreas é elevado, pois quaisquer outras práticas a serem
adotadas para minimizar as conseqüências deste uso, comprometem a sua
viabilidade econômica. Contudo, não resta dúvida que a irrigação é uma técnica
que pode conduzir a sustentabilidade de algumas áreas do semi-árido, mas não
deve ser considerada a única.
18
Assim, tecnologia para o aumento da eficiência dos recursos naturais (solo
e água), do trabalho e do capital deve ser uma busca incessante, principalmente
se for considerado que o potencial de área a ser explorado com o uso da irrigação
não ultrapassa 5% (Sampaio & Salcedo,1997), considerando a baixa
disponibilidade hídrica no semi-árido brasileiro. Somente por esse valor é evidente
que a irrigação não se tornará a única opção para viabilizar a exploração agrícola
fundamentada na sustentabilidade no semi-árido.
A área passível de irrigação no Ceará é de 2%. O custo de 1 ha irrigado
está em torno de US$ 12.000,00 e de 1.000 m3 de água por volta de US$ 20,00. A
proporção de área não irrigável é elevada. A busca da sustentabilidade no semi-
árido passa, necessariamente, pela complementaridade do uso agrícola das áreas
irrigadas e das não irrigadas, devendo haver opções de uso agrícola racional e
sustentável, tanto em nível local, regional e nacional. Na realidade, o fato que se
nota é o esforço concentrado no desenvolvimento de tecnologia e expansão da
área irrigada, e muito pouco para a convivência com a deficiência hídrica.
5 O conceito de agroecossistema (um pouco de agroecologia)
Um agroecossistema é um local de produção agrícola, uma propriedade
agrícola, por exemplo, compreendido como um ecossistema. Este conceito
proporciona uma estrutura onde se pode analisar os sistemas de produção de
alimentos como um todo, incluindo seus conjuntos complexos de insumos e
produção e as interconexões entre as partes que o compõem.
É um conceito que se baseia em princípios ecológicos, tendo como
referência os ecossistemas naturais. Examinam-se os aspectos estruturais e os
funcionais. Então, os agroecossistemas são descritos em termos de como eles se
comparam estrutural e funcionalmente com os ecossistemas naturais.
Um ecossistema pode ser definido como um sistema funcional de relações
complementares entre organismos vivos e seu ambiente, delimitado por fronteiras
escolhidas arbitrariamente, as quais, no espaço e no tempo, parecem manter um
equilíbrio dinâmico, porém estável. Um ecossistema tem partes físicas com
relações particulares (a estrutura do sistema), que juntos participam de processos
dinâmicos (a função do sistema).
Os componentes estruturais básicos do ecossistema são: fatores bióticos
(organismos vivos que interagem no ambiente) e fatores abióticos (componentes
químicos e físicos não vivos do ambiente, como solo, luz, umidade e temperatura).
6 A organização nos ecossistemas
Os ecossistemas podem ser examinados em termos de uma hierarquia de
organização das partes que o compõem, sendo dividido em quatro níveis (Figura
7):
19
a) No primeiro nível que é o mais simples está o organismo individual. Nele o
indivíduo é analisado quanto ao seu comportamento em resposta aos fatores do
ambiente e como o grau de tolerância particular do organismo a estresses no
ambiente determinará onde o mesmo viverá. Exemplo: a adaptação da bananeira
que a restringe nas regiões tropicais.
b) No segundo nível de organização ficam os grupos de indivíduos da mesma
espécie, sendo chamado de população. É importante entender a ecologia das
populações para determinar os fatores que controlam seu tamanho e crescimento,
especialmente com relação à capacidade do ambiente de sustentar uma
determinada população ao longo do tempo.
c) No terceiro nível de organização fica a comunidade, uma comunidade é
definida como um conjunto de várias espécies vivendo juntas em um determinado
lugar e interagindo. O importante neste nível é saber como as interações de
organismos afetam a distribuição e abundância das diferentes espécies que
constituem uma comunidade particular. A competição entre plantas em um
sistema de cultivo ou a predação de pulgões por joaninhas são exemplos de
interações neste nível em um agroecossistema.
d) E o quarto e mais abrangente nível de organização de um ecossistema é o
próprio ecossistema, incluindo todos os fatores abióticos do ambiente, além das
comunidades de organismos que ocorrem em uma área específica.
Uma característica importante dos ecossistemas é que em cada nível de
organização emergem propriedades que não estavam presentes no anterior,
resultantes da interação das partes componentes daquele nível de organização do
ecossistema. Uma população é muito mais que uma coleção de indivíduos da
mesma espécie e tem características que não podem ser compreendidas em
termos de organismos individuais. No contexto do agroecossistema, este princípio
significa, em essência, que a unidade agrícola é maior que a soma de seus
cultivos individuais. A sustentabilidade pode ser considerada a qualidade
emergente maior de uma abordagem de ecossistema à agricultura.
20
Figura 7. Níveis de organização do ecossistema aplicados a um agroecossistema
(Fonte: Gliessman, 2001).
7 A propriedades estruturais das comunidades
Uma comunidade existe como resultado das adaptações das espécies que
compõem os gradientes de fatores abióticos que ocorrem no ambiente e como
resultado das interações entre populações dessas espécies. É importante
examinar detalhadamente as propriedades das comunidades, resultantes das
interações neste nível.
As propriedades estruturais de comunidades são:
a) Diversidade das espécies: é o número de espécies existentes em uma
comunidade;
b) Dominância e abundância relativa: em uma comunidade algumas
espécies podem ser relativamente abundantes e outras menos. A espécie com
maior impacto, tanto dos componentes bióticos quanto nos abióticos da
comunidade, é referida como a espécie dominante. A dominância pode ser
21
resultado da relativa abundância do organismo, seu tamanho, seu papel ecológico
ou de quaisquer desses fatores combinados;
c) Estrutura vegetativa: comunidades terrestres apresentam um
componente vertical (um perfil com diferentes camadas) e outro horizontal
(agrupamentos ou padrões de associação). Aprende-se a reconhecer como
espécies diferentes ocupam lugares distintos nesta estrutura. Quando espécies
assumem formas semelhantes de crescimento, nomes mais gerais são dados a
esses conjuntos: pradaria, capoeira, floresta etc;
d) Estrutura trófica: cada espécie em uma comunidade tem necessidades
nutriticionais. Como essas necessidades são satisfeitas ante outras espécies, o
que determina a estrutura de relações alimentares é chamado de estrutura trófica.
A estrutura trópica é constituída por organismos produtores (autotróficas:
satisfazem suas necessidades de energia sem serem predadoras de outros
organismos) e consumidores (incluindo os herbívoros, predadores, parasitas e
parasitóides). Todos os consumidores são chamados heterotróficos (suas
necessidades nutritivas são satisfeitas consumindo outros organismos). Cada
nível de consumo é considerado nível trófico diferente. As relações tróficas podem
ser descritas como uma cadeia alimentar, dependendo de sua complexidade; e
e) Estabilidade: normalmente, a diversidade das espécies, a estrutura de
dominância (vegetativa e trófica) de uma comunidade permanecem razoavelmente
estáveis ao longo do tempo, embora indivíduos morram e deixem a área e o
tamanho relativo das populações mude. A estabilidade relativa de uma
comunidade depende enormemente do seu tipo e da natureza das perturbações
às quais ela está sujeita.
8 Os processos dinâmicos nos ecossistemas
O funcionamento dos ecossistemas envolve os processos dinâmicos de
movimento de matéria e energia e as interações e relações dos organismos e
materiais no sistema. É importante entender estes processos, tratando os
conceitos de dinâmica, eficiência, produtividade e desenvolvimento de
ecossistemas, especialmente de agroecossistemas, onde a função pode fazer a
diferença entre o fracasso e o sucesso de um cultivo ou de determinada prática de
manejo.
Os dois processos fundamentais em qualquer ecossistema são o fluxo de
energia entre suas partes e a ciclagem de nutrientes.
8.1. Fluxo de energia
O fluxo de energia em um ecossistema está diretamente relacionado a sua
estrutura trófica. A energia flui para dentro do ecossistema como resultado da
captação de energia solar pelas plantas (as produtoras do sistema), sendo a
22
biomassa convertida nos diferentes níveis tróficos pelos demais componentes do
ecossistema (consumidores do sistema), liberando muito da energia que entrou na
produção da biomassa, sendo a remanescente devolvida ao solo como matéria
orgânica.
8.2. A ciclagem de nutrientes
A ciclagem de nutrientes nos ecossistemas está obviamente relacionada ao
fluxo de energia. Enquanto a energia flui apenas numa direção, os nutrientes, por
outro lado, movem-se em ciclos, dos componentes bióticos para os abióticos e
novamente para os bióticos. Como tanto os componentes bióticos como os
abióticos do ecossistema estão envolvidos nesses ciclos, estes recebem o nome
de ciclo biogeoquímicos.
Os ciclos biogeoquímicos são complexos e interconectados, além de que
muitos ocorrem em nível global que transcende ecossistemas individuais. Os
ciclos mais importantes são do carbono (C), nitrogênio (N), oxigênio (O), fósforo
(P), enxofre (S) e água. Cada nutriente tem uma rota específica através do
ecossistema, mas dois tipos principais são identificados.
Para os ciclos do C, O e N, a atmosfera funciona como o reservatório
abiótico principal, assumindo caráter global. Elementos menos móveis (P, S, K, Ca
e muitos micronutrientes) são ciclados localmente, pois o solo é o reservatório
principal.
Se uma quantidade grande de um nutriente for perdida ou removida de um
determinado sistema, ele pode se tornar limitante para o crescimento e
desenvolvimento posteriores. Os componentes biológicos de cada sistema são
muito importantes para determinar a eficiência com que os nutrientes se movem,
assegurando que o mínimo seja perdido e o máximo seja reciclado. A
produtividade pode tornar-se intimamente relacionada às taxas de reciclagem de
nutrientes.
9 A dinâmica dos ecossistemas naturais e agroecossistemas
As populações no ecossistema são dinâmicas, seu tamanho e os
organismos individuais que as compõem mudam com o tempo, sendo
determinadas também pelas interações com as outras e com o ambiente. As
interações possíveis de ocorrerem entre espécies numa população podem ser de
competição (adaptações similares e recursos insuficientes) ou de mutualismo
(espécies que desenvolvem formas de interação entre si, com benefícios para
ambas).
Os ecossistemas estão num constante estado de mudança dinâmica.
Apesar deste dinamismo interno, são notavelmente estáveis em sua estrutura e
funcionamento geral. Esta estabilidade se deve em parte à complexidade dos
23
ecossistemas e à diversidade das espécies, tornando-os hábeis em resistir à
modificação que é introduzida por perturbação ou de se recuperar da perturbação,
depois que acontece.
Esta estabilidade geral combinada com a transformação dinâmica é
captada no conceito de equilíbrio dinâmico. Este equilíbrio é de considerável
importância em um ambiente agrícola, permitindo um equilíbrio ecológico e
funcionando com base no uso sustentável de recursos, que pode ser mantido
indefinidamente, a despeito da mudança continuada e regular na forma de
colheita, cultivo do solo e replantio.
A manipulação e as alterações humanas dos ecossistemas, com o
propósito de estabelecer uma produção agrícola, tornam os agroecossistemas
muito diferentes dos ecossistemas naturais. Contudo os processos, estruturas e
características dos ecossistemas naturais podem ser observados nos
agroecossistemas.
Os fluxos de energia e o movimento de nutrientes de um ecossistema
natural e um agroecossistema são mostrados nas Figuras 8 e 9 e no Quadro 4.
24
Figura 8. Componentes funcionais de um ecossistema natural (Fonte: Gliessman,
2001).
Figura 9. Componentes funcionais de um agroecossistema natural (Fonte:
Gliessman, 2001).
Quadro 4. Diferenças ecológicas-chave entre ecossistemas naturais e
agroecossistemas.
Ecossistemas naturais Agroecossistemas
Produtividade líquida Média Alta
Interações tróficas Complexas Simples, lineares
Diversidade de espécies Alta Baixa
Diversidade genética Alta Baixa
Ciclos de nutrientes Fechados Abertos
Estabilidade (resiliência) Alta Baixa
Controle humano Independente Dependente
25
Permanência temporal Longa Curta
Heterogeneidade do
habitat
Complexa Simples
Fonte: Gliessman (2001).
Uma comparação entre as figuras revela diferenças em vários aspectos
chaves:
a) Fluxo de energia: é bastante alterado em um agroecossistema pela
interferência humana. São sistemas abertos, onde parte considerável da energia é
dirigida para fora do sistema na época da colheita, em vez de ser armazenada na
biomassa que poderia, então, se acumular dentro do sistema;
b) Ciclagem de nutrientes: a reciclagem é mínima na maioria dos
agroecossistemas, perdendo quantidades consideráveis com a colheita ou como
resultado da lixiviação ou erosão, devido a grande redução nos níveis de
biomassa permanente mantido dentro do sistema. A reposição das perdas tem
ocorrido com nutrientes de insumos externos;
c) Mecanismos reguladores de produção: devido a simplificação do
ambiente e redução das interações tróficas em agroecossistemas, raramente
populações de plantas cultivadas ou de animais são auto-reprodutoras ou auto-
reguladoras. Os insumos humanos, na forma de sementes ou agentes de controle,
freqüentemente dependem de grandes subsídios de energia, determinando o
tamanho das populações. A diversidade biológica é reduzida, as estruturas tróficas
tendem a se tornar simplificadas e muitos nichos não são ocupados;
d) Estabilidade: os agroecossistemas, comparados aos ecossistemas
naturais, têm muito menos resistência, devido à sua reduzida diversidade
funcional e estrutural.
10 Ecossistemas naturais e agroecossistemas sustentáveis
Apesar dos contrastes agudos apontados, sistemas reais de ambos os tipos
existem num contínuo. Poucos ecossistemas naturais são verdadeiramente
naturais no sentido de serem completamente independentes da influência
humana. Por outro lado, os agroecossistemas podem variar bastante em sua
necessidade de interferência humana e insumos. Eles podem ser desenhados
para se aproximarem de ecossistemas naturais, em termos de características
como diversidade, ciclagem de nutrientes e heterogeneidade de habitats.
Fisicamente, os limites espaciais de um agroecossistema, como aqueles de
um ecossistema, são arbitrários, sendo na prática equivalente a uma unidade
produtiva rural individual, embora pudesse facilmente ser uma lavoura ou conjunto
de unidades vizinhas.
26
É preciso distinguir entre o que é externo e interno em um agroecossistema,
principalmente quando se consideram os insumos, uma vez que algo não pode ser
um insumo a menos que venha de fora do sistema. A convenção seguida é usar a
fronteira espacial de um agroecossistema (explícita ou implícita) como a linha
divisória entre o interno e o externo. Insumos fornecidos pelo homem, ou seja,
qualquer substância ou fonte de energia de fora das fronteiras espaciais do
sistema constitui insumo humano externo (agrotóxicos, fertilizantes, sementes
híbridas, combustíveis fósseis, tratores, irrigação, trabalho humano não residente
na unidade produtivo). Há também insumos naturais: radiação solar, precipitação,
vento, sedimentos depositados por enchentes e os propágulos de plantas.
O desafio de criar agroecossistemas sustentáveis é o de alcançar
características semelhantes às de ecossistemas naturais, mantendo a produção
para ser colhida. No trabalho em direção à sustentabilidade, o responsável se
esforça, tanto quanto possível, para usar o conceito de ecossistema no desenho e
manejo do agroecossistema.
O fluxo de energia pode ser desenhado para depender menos de recursos
não renováveis, alcançando-se um equilíbrio melhor entre o uso de energia para
manter os processos internos do sistema e aquele disponível para a exportação,
na forma de produtos que podem ser colhidos. O produtor pode esforçar-se para
desenvolver e manter ciclos de nutrientes que sejam mais fechados possível, a fim
de reduzir as perdas de nutrientes do sistema e buscar maneiras sustentáveis de
fazer retornar, para a unidade produtiva, os nutrientes exportados.
Um agroecossistema deve incorporar a qualidade de ecossistema natural
de resiliência, estabilidade, produtividade e equilíbrio dinâmico necessário para
estabelecer uma base ecológica de sustentabilidade. À medida que se reduz o uso
de insumos humanos externos no controle dos processos do agroecossistema,
pode-se esperar uma mudança de sistemas dependentes de insumos artificiais
para sistemas desenhados para usar processos e interações de ecossistemas
naturais, além de materiais derivativos de dentro do sistema.
11. Bibliografia
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caatinga. In: ALVAREZ V., V.H.; FONTES, L.E.F. & FONTES, M.P.F., eds. O
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árido. Fortaleza, DCS/UFC, 2000, p.47-56.
27
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caatinga. Sobral, EMBRAPA, CNPC, 1996. 23p.
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Desenvolvimento do Setor Florestal do Nordeste. Recife, 1993.
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SEMINÁRIO LATINO-AMERICANO DA DESERTIFICAÇÃO. Fortaleza,
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SAMPAIO, E.V.S.B. & SALCEDO, I. Diretrizes para o manejo sustentável dos
solos brasileiros: região semi-árida. In: XXVI CONGRESSO BRASILEIRO DE
CIÊNCIAS DO SOLO. Anais. Rio de Janeiro, 1997. (CD ROOM).
28
PARTE II – SISTEMAS DE CLASSIFICAÇÃO DAS TERRAS (CAPACIDADE DE
USO E APTIDÃO AGRÍCOLA – FAO/BRASILEIRO)
1 Introdução
A classificação de objetos naturais pressupõe o arranjo de indivíduos de
uma população em classes, organizando conhecimentos de forma que as
propriedades dos objetos possam ser relembradas e as relações entre eles
possam ser entendidas.
1.2 Tipos de classificação de solos
Em se tratando de solos, existe a classificação taxonômica (ou natural) e a
interpretativa (ou técnica). A classificação taxonômica permite agrupar solos em
função de grande quantidade de atributos comuns, sendo representada pelo
Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (Embrapa, 2006). Já a classificação
interpretativa é aquela que permite agrupar solos em função de características de
interesse prático e específico, como ocorre nos sistemas de classificação da
Capacidade de Uso e Aptidão Agrícola das Terras – FAO/Brasileiro.
a) Classificação taxonômica (natural)
Considera-se um conjunto considerado simultâneo de atributos ou
propriedades relacionadas a origem do objeto a ser classificado.
Exemplos: Soil taxonomy; Sistema Brasileiro de Classificação de Solos
(Embrapa, 2006).
b) Classificação Interpretativa (técnica)
Alguns atributos ou propriedades são considerados, procura-se atender um
objetivo específico e de aplicação prática.
Exemplos: Capacidade de Uso, Aptidão agrícola (FAO/Brasileiro), Terras
para Irrigação.
Os levantamentos de informações que estão associados aos sistemas de
classificação taxonômica de solos constituem a fonte mais completa de dados que
podem ser utilizados na definição da aptidão agrícola das terras.
Estes levantamentos são, contudo, de custo elevado e requerem pessoal
técnico especializado, o que limita a sua utilização, pois a aplicação para a
definição da aptidão agrícola das terras requer detalhes em escala pequena.
Recomenda-se que sejam feitos ou utilizados levantamentos pedológicos
detalhados (escala 1:10.000 a 1:25.000) ou semi-detalhados (escala 1:25.000 a
1:100.000). O uso dos levantamentos de classes de solo disponíveis, como o do
Ceará (1:600.000), em escalas muito grandes, não fornecem os detalhes
necessários para a aplicação de sistemas de definição da aptidão agrícola em
nível de propriedade agrícola.
29
A aptidão diz respeito à adaptabilidade das terras para um tipo específico
de utilização agrícola, pressupondo-se um ou mais distintos níveis de manejo.
Neste conceito, pressupõe-se a necessidade de informações, as quais deverão
ser utilizadas adotando-se um sistema de estratificação que permita a transmissão
de conhecimento de forma sistematizada e técnica, ou seja, com o uso de um
sistema de classificação. A determinação da aptidão agrícola pressupõe
planejamento de uso das terras.
2 Sistema de Classificação da Capacidade de Uso
2.1 Introdução
Este sistema foi estruturado pelo Serviço de Conservação do Solo dos
EUA. Sua grande contribuição foi a de ter influenciado todos os sistemas
subseqüentes que incluem a produção sustentada, ou seja, apresenta enfoque
conservacionista. É utilizado em várias partes do mundo e sofreu várias
adaptações.
Objetiva agrupar solos já mapeados nos EUA em classes de capacidade de
uso para programas de planejamento agrícola. Torna a informação já existente
nos levantamentos de solos (nível detalhado) mais acessível, de forma prática, ao
usuário. É uma interpretação dos mapas de solos dos levantamentos existentes
nos EUA. Nos países em que esta informação não está disponível, procurou-se
supri-la, mapeando-se atributos como declive, textura, permeabilidade etc. Porém,
isso limita bastante uma interpretação mais consistente.
2.2 Estrutura do Sistema de Capacidade de Uso
Grupos de Uso (3 grupos): Estabelecidos com base nos tipos de
intensidade de uso.
Classes de Uso (8 classes): Baseadas no grau de limitação de uso.
Subclasses de Uso (Índices): Baseadas na natureza da limitação de uso.
Unidades de Uso (Índices): Baseadas em condições específicas que afetam
o uso ou manejo da terra.
Classes de Capacidade de Uso:
Grupo A:
I até IV - com aptidão para culturas.
Grupo B:
30
V - refere-se a classes de solos com problemas de drenagem,
pedregosidade ou de adversidade climática problemática para cultivos; e
VI e VII - necessitam de manejo especial.
Grupo C:
VIII - não apresentam retornos para insumos referentes a
manejo para culturas, pastagens ou florestas.
As classes de capacidade de uso (I a VIII) são as seguintes:
A - Terras cultiváveis:
Classe I - sem problemas especiais de conservação;
Classe II - problemas simples de conservação;
Classe III - problemas complexos de conservação; e
Classe IV - ocasionalmente ou em extensão limitada com
sérios problemas de conservação.
B - Terras cultiváveis apenas em casos especiais de algumas
culturas permanentes e adaptadas, em geral, para pastagem ou reflorestamento:
Classe V - Sem necessidade de práticas especiais de
conservação;
Classe VI - com problemas especiais de conservação; e
Classe VII - com problemas complexos de conservação.
C - Terras impróprias para vegetação produtiva, próprias para
proteção da flora e da fauna silvestres, para recreação ou para armazenamento de
água.
Índices:
São adicionados às classes de aptidão definindo subclasses e
unidades de uso. São indicativos dos principais problemas em nível detalhado.
Subclasses:
Consideram-se quatro naturezas:
e: limitações pela erosão presente e/ou risco de erosão;
s: limitações relativas ao solo;
a: limitações por excesso de água; e
c: limitações climáticas.
Unidades de uso:
Especificam mais a natureza da limitação:
31
Exemplos:
s-hi: limitação de natureza relativa ao solo e associada a
problemas de hidromorfismo;
s-pd: limitação de natureza relativa ao solo e associada a
problemas de pedregosidade;
s-di: limitação de natureza relativa a solo e associada a
distrofismo;
s-ti: limitação de natureza relativa a erosão e associada a
tiomorfismo;
etc.
Exemplos do Sistema de Classificação da Capacidade de Uso:
IIIpd-di Classe III, com problemas de pedregosidade e distrofismo.
IIi Classe II, com problemas de inundação.
2.3 Levantamento Utilitário das Terras
As informações necessárias para a aplicação do Sistema de Capacidade de
Uso são as características e/ou propriedades do perfil do solo (independente de
serem fatores limitantes ou não), a declividade do terreno, a erosão já sofrida pela
terra, uso atual, o estádio de desbravamento e outras características gerais da
propriedade.
2.3.1 Perfil do solo
Não necessariamente limitantes:
Profundidade efetiva: É a espessura máxima do solo em que as raízes não
encontram impedimento físico para penetrar livremente, facilitando a fixação da
planta e servindo como meio para a absorção de água e nutrientes.
Exemplos de impedimento físico considerado: presença de rocha
consolidada, fragipans, lençol freático sem possibilidade de rebaixamento por
drenagem, etc.
32
Índices utilizados: 0: não identificada;
1: muito profundos (> 2 m);
2: profundos (1 a 2 m);
3: moderadamente profundos (0,5 a 1 m);
4: rasos (0,25 a 0,5 m);
5: muitos rasos (< 0,25 m).
Textura do perfil do solo: obtida a partir da análise granulométrica e do uso
do triângulo textural. Pode ser estimada em condições de campo pela sensação
ao tato da massa de solo úmida.
Principais grupamentos texturais utilizados:
0: não identificado;
1: textura muito argilosa;
2: textura argilosa;
3: textura média;
4: textura siltosa;
5: textura arenosa.
Permeabilidade do perfil do solo: capacidade que o solo apresenta de
transmitir água e ar. É a velocidade do fluxo através de uma secção transversal
unitária de solo saturado, sob determinado gradiente hidráulico.
Estimada pela análise conjunta de sua textura, friabilidade, estrutura e
quantidade de poros visíveis a olho nu.
0: não identificada;
1: rápida (> 150 mm/h);
2: moderada (5 a 150 mm/h); e
3: lenta (< 5 mm/h).
2.3.2 Fatores limitantes específicos
Fatores limitantes: critério diagnóstico que afeta adversamente o uso da
terra
São vários, cada um com os seus índices próprios:
Pedregosidade (pd);
Risco de inundação (i);
Caráter abrupto (ab);
Caráter vértico (vê);
Hidromorfismo (h);
Seca prolongada (se);
Geada ou vento frio (gd);
33
Baixa saturação de bases ou caráter distrófico (di);
Capacidade de retenção de cátions muito baixa (ct);
Tiomorfismo (ti);
Sodicidade (so);
Salinidade (sl);
Presença de carbonatos (ca);
2.3.3 Características e/ou propriedades do solo de notação facultativa
São informações adicionais.
Classificação pedológica: devem ser notadas com razoável conhecimento
do levantador. Devem ser usadas notações do sistema de classificação vigente.
Cor do solo: notação adotada com referência a caderneta de Munsell.
Produtividade aparente: estimada pelo tipo de vegetação espontânea e
colheitas auferidas pelos agricultores.
Outras características: substrato geológico; vegetação primitiva; forma de
declive; e outras de interesse local.
2.3.4 Declividade do terreno
A: declives < 2%;
B: declives entre 2 e 5%;
C: declives entre 5 e 10%;
D: declives entre 10 e 15%;
E: declives entre 15 e 45%;
F: declives entre 45 e 70%;
G: declives > 70%.
2.3.5 Erosão
Expressa por meio de indicadores de tipo e grau de erosão:
Indicadores gerais:
A: Geral
0: presente, mas em grau não identificado;
: erosão não aparente, tal como ocorre em solos virgens recobertos
de vegetação.
B: Erosão laminar
34
1: ligeira - já aparente, mas com < 25% do solo superficial removido
(horizonte A), ou quando não for possível identificar a profundidade normal do
horizonte A de um solo virgem, com mais de 15 cm do solo superficial (horizonte
A) remanescente;
2: moderada - com 25% a 75% do solo superficial removido
(horizonte A), ou quando não for possível identificar a profundidade normal do
horizonte A de um solo virgem, com 5 a 15 cm do solo superficial (horizonte A)
remanescente;
3: severa - com mais de 75% do solo superficial removido (horizonte
A) e, possivelmente com o horizonte B aflorando, ou quando não for possível
identificar a profundidade normal do horizonte A de um solo virgem, com menos
de 5 cm do solo superficial (horizonte A) remanescente;
4: muito severa - com todo solo já superficial removido (horizonte A)
e com o horizonte B bastante afetado (erodido), já havendo, em alguns casos, sido
removido em proporções entre 25 e 75% da profundidade original;
5: extremamente severa - com o horizonte B, em sua maior parte, já
removido, e com o C atingido, encontrando-se o solo praticamente destruído para
fins agrícolas;
6: símbolo reservado para áreas desbarrancadas ou translocações
de blocos de terra.
C: Erosão em sulcos
a: Freqüência dos sulcos
7: ocasionais - sulcos distanciados mais de 30 m;
8: freqüentes - sulcos distanciados a menos de 30 m, ocupando área
inferior a 75%;
9: muito freqüentes - sulcos distanciados a menos de 30 m,
ocupando área superior a 70 %.
b: Profundidade dos sulcos:
7, 8 e 9 (somente números) - sulcos superficiais, cruzados por
máquinas e que se desfazem com o preparo;
7, 8 e 9 (circundados por ) - sulcos rasos cruzados por máquinas e
que não se desfazem com o preparo;
7, 8 e 9 (circundados por ) - sulcos profundos, que não podem ser
cruzados por máquinas agrícolas e que ainda não atingiram o horizonte C;
7V, 8V e 9V - sulcos muito profundos que não podem ser cruzados
por máquinas agrícolas e que atingiram o horizonte C.
35
Erosão eólica:
Tipos
L: litorânea
C: comtinental
Graus:
1: pequena ou ligeira;
2: regular ou moderada;
3: severa ou intensa.
2.3.6 Uso atual, nível tecnológico e estádio de desbravamento
Devem ser levantadas informações relativas ao uso atual nas diferentes
áreas da propriedade em que o levantamento será feito, bem como o nível
tecnológico adotado nestas áreas ou, então, o estádio de desbravamento das
áreas.
2.3.7 Características gerais da propriedade
Informações como benfeitorias (casas, currais, depósitos etc), cercas
divisórias, estradas internas e externas da propriedade, presença de barragens etc
devem ser levantadas e alocadas.
2.3.8 Notação das informações
Essas informações são representadas por símbolos e notações
convencionais, dispostos numa fórmula que sintetiza as condições encontradas
em cada área considerada homogênea.
Fórmula mínima:
atualusoerosãoedeclividad
dadepermeabilitexturaefetivadeprofundida
Fórmula obrigatória:
36
atualusotestanilimfatoreserosãoedeclividad
dadepermeabilitexturaefetivadeprofundida
Fórmula máxima:
É a fórmula obrigatória acrescida de outros elementos passíveis de identificação.
A classificação pedológica, cor do solo e a produtividade aparente, quando
conhecidos ou identificáveis, poderão ser adicionados, optativamente, antes da
fração da fórmula.
Exemplo de uma fórmula máxima hipotética:
2122LpcMtalpd
72B
2/12/33p6/5YR5LV
2.4 Identificação da classe de capacidade de uso
A identificação da capacidade de campo é feita pela verificação das
diferentes propriedades levantadas e a identificação do grau de limitação, sendo a
definição da classe de capacidade de uso associada ao grau de limitação mais
severo das propriedades avaliadas. Essa definição passa pela associação de
graus de limitação a classes de uso do Sistema de Capacidade de Uso. No quadro
1 pode-se observar um exemplo de conversão de propriedades e graus de
limitações em classes de capacidade de uso. No entanto, este quadro deve ser
definido para as diferentes situações de ambiente, ou seja, um quadro utilizado
para a região da caatinga, certamente não é o mesmo da região dos cerrados,
assim como o quadro utilizado para a região dos Inhamus não é o mesmo para o
Maciço de Baturité.
37
Quadro 1. Limitações, graus de limitações e parâmetros na avaliação de
propriedades do solo para o enquadramento em classes de
capacidade de uso das terras
Limitaçã
o
Grau
de
limitaç
ão
Parâmetros de avaliação Classes de capacidade de uso
M
O
N P K C
a
Mg Al
I II II
I
I
V V
V
I
VI
I
VI
II % mg.dm-3
Mmol.kg-1
Fertilidad
e
Alta 5 0,
2
5
>2
0
>2
,3
>4
2
>8 <3 * * * * * * * *
Média 3 0,
1
5
10 1,
2
31 4 7 * * * * * *
Baixa 1 0,
0
5
5 <1
,2
8 2 10 * * * * *
Muito
baixa
<1 <
0,
0
5
<5 <0
,6
<8 <2 >1
0
* * *
Profundid
ade
efetiva
Muito
profund
o
> 2 m
*
*
*
*
*
*
*
*
Produn
do
2 a 1 m * * * * * * * *
Modera
do
1 a 0,5 m * * * * * * *
Raso 0,5 a 0,25 m * * * * *
Muito
raso
<0,25 * * *
Permeabil
idade
Rápida > 15 cm/hora * * * * * * * *
Modera
da
15 a 5 cm/hora * * * * * *
Lenta < 5 cm/hora * * * *
Pedregosi
dade
Sem pedras * * * * * * * *
<1 % * * * * * * *
1 a 10 % * * * * * *
10 a 30 % * * * * *
30 a 50 % * * *
38
>50 % * *
Risco de
inundação
Ocasio
nal
Recorrência de 5 ou mais anos * * *
Freqüe
nte
Recorrência entre 1 e 5 anos * *
Muito
freqüen
te
Todos os anos *
Classes de
declive
Plano 0 a 2% (Classe A) * * * * * * * *
Suave
ondulad
o
2 a 6 % (Classe B) * * * * * *
Ondula
do
6 a 13 % (Classe C) * * * * *
Forte
ondulad
o
13 a 25% (Classe D) * * * *
Montan
hoso
25 a 55% (Classe E) * * *
Escarpa
do
>55 % * *
Grau de
erosão
laminar
Não
aparent
e
Sem sinais perceptíveis de erosão * * * * * * * *
Ligeira Até 25 % do horizonte A
removido
* * * * * *
Modera
da
25 a 75% do horizonte A
removido
* * * * *
Forte Mais de 75 % do A removido e B
exposto
* * *
Muito
forte
A removido e B severamente
erodido
* *
Extrem
amente
forte
A e B removidos e horizontes C
exposto
*
Sulcos Superfi
ciais
Ocasionais: a menos de 30 m
entre si
* * * * * *
Freqüentes: a menos de 30 m
entre si
* * * * *
Muito freqüentes: ocupam mais * * * *
39
de 75 % da área
Rasos Ocasionais * * * * *
Frequentes * * * *
Muito frequentes * * *
Profund
os
Ocasionais * * * *
Freqüentes * * *
Muito frequentes * *
Voçoroca
s
*
40
2.5 Recomendações práticas para a execução do levantamento utilitário
Para a execução dos trabalhos de campo e escritório deverão ser adotadas
medidas que permitam não só o planejamento das atividades a serem
desenvolvidas, mas também a sua efetiva execução. Para tanto, deverão ser
avaliadas as condições de execução dos serviços (distâncias, área a ser
levantada, acomodações etc). Deverão ser previstas a utilização de equipamentos
e utensílios (trados, sacos plásticos, pranchetas, reservatório de água, GPS etc),
bem como todas as atividades e materiais de escritório para a edição do relatório
descritivo, como também dos mapas que comporão o produto final a ser entregue
ao solicitante dos serviços.
Mapas deverão ser utilizados, destacando-se aquele de campo que vai ser
utilizado para todas as anotações necessárias para a execução dos serviços. O
mapa base ou mapa de campo pode ser: fotografias aéreas; mapa planialtimétrico,
mapa de restituição e mapa planimétrico. Deverão ser compostos os seguintes
mapas ao final dos trabalhos: uso atual, capacidade de uso, levantamento do meio
físico, pedológico etc.
2.6 Exemplo de aplicação do Sistema de Capacidade de Uso
O caso do Assentamento Lages em Caridade – CE (Chaves, 2005).
41
Figura 1. Classes de relevo do Assentamento Lages no município de Caridade-CE (Fonte: Chaves, 2005).
42
Figura 2. Caracterísiticas e/ou propriedades do meio físico do Assentamento Lages no município de Caridade-CE (Fonte
Chaves, 2005).
43
Figura 3. Classes de capacidade de uso do Assentamento Lages no município de Caridade-CE (Fonte: Chaves, 2005).
44
Figura 4. Classes de solo do Assentamento Lages no município de Caridade-CE(Fonte: Chaves, 2005).
45
3 Sistema de Aptidão Agrícola das terras (FAO/Brasileiro)
3.1 Introdução
Desenvolvido na década de 60, apresnetando características bastante
inovadoras:
a) Considera na sua estrutura os níveis de manejo: Os problemas dos
diferentes tipos de agricultores são diferenciados (Quadro 2).
b) Considera a estimativa de viabilidade de redução dos problemas (Quadro
3).
c) Estrutura permite ajustamento a novos conhecimentos permitindo
adaptações regionais;
Ajuste em função metodologia que sintetiza as qualidades do ecossistema
em cinco parâmetros:
Nutrientes (N);
Água (A);
Oxigênio (O);
Mecanização (M); e
Erosão (E).
Quadro 2. Níveis de manejo considerados no sistema FAO/Brasileiro
Nível de
manejo
Práticas agrícolas Capital aplicado no
melhoramento e conservação
do solo e lavouras
Trabalho
A Refletem baixo
nível tecnológico
Praticamente não é aplicado Principalmente braçal.
Alguma tração animal
com implementos
simples
B Refletem nível
tecnológico médio
Modesta aplicação Tração animal
C Refletem alto nível
tecnológico
Aplicação intensiva Mecanização em quase
todas as fases
Quadro 3. Classes de viabilidade de melhoramento no sistema FAO/Brasileiro
Classe Viabilidade de melhoramento
Classe a1 Melhoramento viável com práticas
simples e pequeno emprego de capital.
Classe b Melhoramento viável com práticas
intensivas e mais sofisticadas e
considerável aplicação de capital. Esta
classe ainda é considerada
economicamente compensadora.
46
Classe c Melhoramento viável somente com
práticas de grande vulto; aplicadas a
projetos de larga escala que estão,
normalmente, além das possibilidades
individuais dos agricultores.
Classe d Sem viabilidade técnica ou econômica
de melhoramento.
1 – As letras minúsculas a, b e c são usadas, além da indicação da classe de
viabilidade de melhoramento, também para indicar aptidão para lavouras. Embora
seu uso fique bem claro no contexto, quando indica variabilidade de melhoramento
a letra é grifada.
3.2 Aplicação do sistema FAO/Brasileiro
a) Estimativa dos problemas:
É uma síntese da influência das propriedades do ecossistema;
Estimativa dos desvios N; A; O; E e M;
Estimar em relação a que?
Solo ideal X Solo real (Quadro 4)
Graus de desvios considerados:
Nulo = 0
Ligeiro = 1
Moderado = 2
Forte = 3
Muito forte = 4
Quadro 4. Relação entre solo ideal (i = 0, onde i = N,A,O,E e M) e solo real (i
0)
Parámetro Solo ideal
Solo real
Nutrientes N = 0 N 0
Água A = 0 A 0
Oxigênio O = 0 O 0
Suscetibilidade à erosão E = 0 E 0
Impedimentos a
mecanização
M = 0 M 0
47
Estimativa de desvios subjetiva convergência de critérios.
É possível usar critérios de referência como auxílio nesta estimativa, não
ficando tão subjetiva assim (Quadro 5).
b) Estimativa da redução destes problemas, conforme nível de manejo
considerado:
É um balanço entre intensidade dos desvios e possibilidades, dificuldades e
conveniência de sua redução.
Deve-se considerar as opções dos vários níveis de manejo, refletindo
diferenças em insumos e técnica.
É uma estimativa da viabilidade de melhoramento.
Considera-se, no sistema, as classes de viabilidade de melhoramento.
Exemplos:
N = 4 para as Areias Quartzosas da Serra da Ibiapaba, antes do
melhoramento.
N = 1b, após melhoramento, mesmo aplicando fertilizantes e
corretivos (o melhoramento pode não eliminar toda a deficiência).
A viabilidade de melhoramento está intimamente ligada às condições sócio
econômicas, sintetizadas grosseiramente na forma de níveis de manejo.
Quadro 5. Grau de desvio (limitações) das condições agrícolas dos solos em
relação ao solo ideal, quanto a nutrientes ou fertilidade (N), disponibilidade de
água (A), oxigênio (O), suscetibilidade à erosão (E) e impedimentos à
mecanização
0 (nulo)
N Elevada reserva de nutrientes. Nem mesmo plantas exigentes respondem a
adubação. Ótimos rendimentos por mais de 20 anos. Ao longo do perfil:
V%>80%, S>6 cmolkg-1
, TAL=0, na camada arável, e condutividade elétrica
(CE) < 4 dSm-1
a 25 oC.
A Floresta perenifólia ou presença de lençol freático ou sub irrigação. Não há
deficiência de água em nenhuma parte do ano. Incluem-se áreas de campos
hidrófilos e subtropicais sempre úmidos. Quanto a A ,são possíveis dois cultivos
por ano.
O Aeração boa em qualquer época do ano – bem (D4) a expressividade drenados
(D1)
48
E Após 10-20 anos: horizonte A permanece intacto. Erosão ligeira, que possa
ocorrer, é controlada facilmente. Plano, ou Quase (p), declive < 3%, e bem
permeável.
M Podem ser usados na maior parte da área, sem dificuldades, todo ano, todos os
tipos de maquinaria agrícola; rendimento do trator (% de horas efetivamente
usadas ), RT > 90% . Solos planos (p) ou suave ondulados (s) com < 8% de
declive, sem outros impedimentos à mecanização ( pedregosidade, rochosidade,
texturas extremas e tipos de argilas )
1 (Ligeiro)
N Boa reserva de nutrientes, boa produção por mais de 10 anos, com pequenas
exigências para manter produção depois. V > 50%, S >3, TAL < 30% ,
condutividade elétrica < 4dSm-1
e Tna < 6%. (Latossolos eutróficos, por
exemplo).
A Água disponível (Ad): pequena deficiência durante o período curto na estação de
crescimento. Só plantas bem sensíveis é que são prejudicadas no seu crescimento.
Floresta subperenífera (estação seca de 1 a 3 meses ). Em climas mais secos: solos
com lençol freático, condicionando boa disponibilidade de água às plantas, ou
irrigados. Aptidão para dois cultivos é marginal.
O Plantas de raízes mais sensíveis têm dificuldade na estação chuvosa;
moderadamente drenados (D5).
E Após 10-20 anos: <25% do horizonte A original da maior parte da área; Ap
formado de material A (exceto se A muito espesso), na maior parte da área.
Erosão bem controlada por culturas selecionadas (cana-deaçucar) ou cultivos
arbóreos ou parcelas pequenas. Suave ondulação (s), declives 3-8% (SSM: classe
1 da erosão).
M Maioria dos tipos de maquinaria sem ou com ligeira dificuldade, RT: 75-90%; (a)
suave ondulação (s),com 3-8% de declive sem outros impedimentos; (b) planos
com pedregosidade (0,05 a 1,0), rochosidade (2-10%) ou profundidade limitante;
(c) planos, com textura muito grosseira (arenosa, cascalhenta etc.), argilosa com
argila 2:1, ou problemas de drenagem.
2 (Moderado)
N Um ou mais nutrientes com reserva limitada. Bons rendimentos só nos poucos
anos iniciais. Reserva no solo ou no ciclo orgânico ou condutividade elétrica: 4-8
dSm-1
ou TNa 6-15%.(Latossolos não eutróficos sob florestas, por exemplo).
A Ad: deficiente durante período um tanto longo; plantas muito sensíveis podem ser
cultivas. Floresta subcaducifólia (estação seca de 3-6 meses ou 3, se arenoso).
Também floresta caducifólia com solos com alta capacidade de retençãodeAd.
Praticamente não há possibilidade de dois cultivos.
O Imperfeitamente drenados (D6) ou com risco permanente de inundação ocasional
49
(recorrência:>5 anos).
E Após 10-20 anos; 25 a 75% do horizonte A é removido da maior parte da área; Ap
é constituído localmente do material de B. pequenas voçorocas podem ocorrer.
Controle à erosão deve ser intensivo. Cultivo de árvores sem a completa remoção
da vegetação ainda funciona bem, relevo ondulado, declive 8-20% (SSM: classe 2
da erosão).
M Só tipos mais leves de equipamento, algumas vezes só durante parte do ano,
tracionados por animais. Se usado trator, RT:50-75%; (a) ondulados,8-20% de
declive, sem outros impedimentos, se usado para agricultura formam-se sulcos
freqüentes e profundos; (b) declive <20%, com pedregosidade, rochosidade ou
profundidade limitante;; (c) planos, com textura muito grosseira (arenosa,
cascalhenta etc.), argilosa com argila 2:1, ou problemas de drenagem.
3 (Forte)
N Um ou mais nutrientes em pequenas quantidades permitem bons resultados só de
culturas adaptadas. O rendimento de outras culturas e pastagem é baixo. Cerrado
fechado ou terras exauridas ou condutividade elétrica:8-15 dSm-1
e TNa>15%
(por exemplo, Latossolos sob cerrado propriamente dito).
A Ad: grande deficiência. Só possível plantas mais adaptadas. Caatinga
hipoxerófila; floresta caducifólia; transições de cerrado e floresta para caatinga
(estação seca de 6 a 8 meses, 3 a 7 se arenoso); precipitação, P-600 a800 mm/ano
e irregulares, e temperatura alta, (T) é predominante).
O Culturas mais sensíveis, drenagem artificial, ainda viáveis ao nível do agricultor;
mal (D7) e muito mal drenado (D8) ou sujeitos a inundações freqüentes
(recorrência:1 a 5 anos).
E( Após 10-20 anos: >75% do horizonte A removido na maior parte da área. Ap
apenas localmente guarda vestígios do antigo A. Ocorre voçorocas rasas, com
algumas profundas. Controle é difícil, dispendioso ou inviável. Fortes ondulados
(f), declive 20-45% (SSM: classe 3 de erosão).
M Só implementos manuais na maior parte da área: (a) declive de 20-45%, forte
ondulado: se usado para agricultura, formam sulcos, constituindo forte
impedimento à mecanização ; (b) declive <20% com pedregosidade, rochosidade
ou solos rasos.RT<50%
4 (Muito Forte)
N Conteúdo de nutrientes muito restrito com possibilidade remota de agricultura,
50
pastagem e reflorestamento. Somente plantas com muita tolerância conseguem
adaptar-se. Campo cerrado ou solos salinos com condutividade elétrica: >15dSm-1
ou tiomórficos. Exemplo: solos rasos álicos sob vegetação campestre (Solos
Litólicos e Cambissolos), originários de rochas pelíticas do grupo Bambuí.
A Deficiência é severa. Estação de crescimento curta ou mesmo ausente. A
vegetação natural é escassa ou só presente durante parte do ano. Caatinga
hiperxerófila (estação seca 8 a10 meses, P= 400-600 mm, irregulares, e alta T).
O Idem do grau forte, mas melhoramento não é viável ao nível do agricultor.
E Os solos para fins agrícolas são destruídos em poucos anos; voçorocas médias e
profundas praticamente inutilizam a área agrícola. Risco de danos para a
pastagem é muito grande. Montanhoso e escarpado, declive >45%.
M Não é possível nem o uso de implementos manuais (a) declive > 45%,
montanhoso ou escarpado; (b) declive < 45% com pedregosidade, rochosidade ou
solos rasos: se usados para agricultura, formam-se voçorocas.
c) Identificação da classe de aptidão
Confronto das informações de a e b.
Uso de tabelas de conversão (quadros-guia) (Quadro 9).
O quadro de conversão ou quadro-guia é o máximo de limitação permitido,
para cada delta e para cada nível de manejo, referente a classe de aptidão.
A definição da classe de aptidão agrícola deve seguir o princípio de que o
uso não pode ser mais intensivo do que permite o delta que está no mínimo.
É uma síntese e, portanto, difícil de ser lida com aproveitamento de toda a
informação que ela encerra.
A mensagem final que chega geralmente na forma de mapa colorido com
símbolos.
Exemplo:
1Ab(c):
Letras A, B e C, maiúsculas ou minúsculas; e entre parênteses ou não,
significam aptidão para culturas:
A: Aptidão boa no sistema de manejo A;
51
b: Aptidão regular no sistema de manejo B; e
(c): Aptidão restrita no sistema de manejo C.
____ Áreas de pior aptidão agrícola na unidade de
mapeamento.
Ausência de qualquer letra indica inaptidão.
Exemplo: 2ab.
Existem também as letras P, S e N:
P: pastagem plantada;
S: silvicultura;e
N: pastagem natural.
Letras maiúsculas: classes de aptidão boa;
Letras minúsculas: classes de aptidão regular; e
Letras minúsculas entre parênteses: classes de aptidão restrita.
O conceito de aptidão agrícola utilizado tem um sentido amplo para (Quadro
6 e 7):
Lavouras;
Pastagens plantadas;
Pastagens naturais;
Silvicultura;
Reserva biológica; e
Recreação
Expressa uma adequação ao uso ao aumento do (s) grau (s) de limitação
(ões).
Quadro 6. Grupos e classes de aptidão agrícola e alternativas gerais de utilização
Grupos Classe Nível de manejo
A B C
Lavouras
A L 1 Boa 1A 1B 1C
L I 2 Regular 2a 2b 2c
T M 3 Restrita 3(a) 3(b) 3(c)
E I Pastagem plantada
R T 4 Boa 4P
52
N A 4 Regular 4p
A Ç 4 Restrita 4(p)
T Õ Silvicultura e/ou pastagem natural
I E 5 Boa 5N 5S
V S 5 Regular 5n 5s
A 5 Restrita 5(n) 5(s)
S Sem aptidão para uso agrícola
6 Preservação da flora e da fauna
Quadro 7. Alternativas de utilização das terras de acordo com o grupo de aptidão
agrícola
Aumento da intensidade de uso
Limitações
e
Alternativas
Grupos
de
aptidão
Lavoura
Preserva
ção da
flora e
da fauna
Silvicult
ura
e/ou
pastag
em
natural
Pasta
gem
Aptidão
restrita
Aptidão
regular
Aptidão
boa
A D 1
L E 2
T S 3
E V 4
R I 5
N O 6
Quadro 8. Classes de aptidão agrícola
Classes de
aptidão
Limitações
gerais
Produções no manejo A Remoção de restrições
BOA
ligeiras boa no período de 20 anos
REGULAR moderadas boa no período de 10 anos parcialmente no manejo
53
A
RESTRITA fortes Médias e baixas no período
de 10 anos
opção de culturas
INAPTA excluem a produção sustentada do tipo de utilização em questão
Porém, como se obtém a classe de aptidão agrícola?
Exemplo (Quadros 9 e 10)
Passos:
A estimativa dos deltas do ecossistema em relação ao solo ideal
(qualidades do ecossistema).
Avaliação da viabilidade de redução dos deltas conforme nível de manejo
(refletindo diferenças em insumos e técnica).
Confronto de informações obtidas utilizando.
Uso de quadros de síntese de informações (Quadro 10)
Observações gerais:
a) Os Quadros-guia (Quadro 9) são muito gerais;
b) Precisam ser mais específicos;
c) O Sistema FAO/Brasileiro não foi suficientemente trabalhado ao nível do
usuário/propriedade;
d) Pelas suas características está mais condicionado para aplicação para
escalas muito pequenas (grandes regiões);
e) Na estimativa das qualidades da terra entra uma grande quantidade de
informações não quantificáveis e expressáveis;
f) É o conhecimento empírico (um sentimento de percepção), fundamental
nas decisões do agricultor.
54
Quadro 9. Quadro-guia de classificação de aptidão agrícola da região semi-árida
Aptidão Agrícola Graus de limitação das condições agrícolas das terras para os níveis de manejo A, B e C
Grupo Sub-
grupo
Classe Uso agrícola N A O E M
A B C A B C A B C A B C A B C
1 1ABC Boa 0/1 0a 0a 1/2 ½ 1/2 1 1a 0/1a 1 0/1a 0a 2 1/2 0
2 2abc Regular Lavouras 1 1a 1b 2 2 2 2 1/2a 1b ½ 1a 0/1b 2/3 2 1
3 3(abc) Restrita 2 1/2a 1/2b 2/3 2/3 2/3 3 2a 2b 2/3 2a 1/2a 3 2/3 2
4 4P Boa Pastagem 2a 2 3 2/3a 2
4p Regular 2/3a 2/3 4 3a 2/3
4(p) Restrita Plantada 3a 3 4 3/4 3
5 5S Boa 2/3a 2 1a 3a 2/3
5s Regular Silvicultura 3a 2/3 1a 3a 3
5(s) Restrita 4 3 1/2a 4 3
5 5N Boa 2/3 3 3 3 3
5n Regular Pastagem
natural
3 3/4 3/4 3 4
5(n) Restrita 4 4 4 3 4
6 6 Preservação
da flora e da
fauna
55
Quadro 10. Resultado do confronto entre desvios da unidade PLs após redução dos desvios (quando viáveis) e os requisitos de máxima
limitação permissível para determinada classe de uso na Tabela-Guia
Situação N A O E M
A B C A B C A B C A B C A B C
PLs 1 1a 1b 2/3 2/3 2/3 1 1a 0/1a 1 0 0 2 2/3 2
Quadro –
Guia
1 1a 1b 2/3 2/3 2/3 1 1a 0/1a 1 0/1a 0a 2 2/3 2
a B c (a) (b) (c) A B C A B C A (b) (c)
Uso mais
intensivo
(a) (b) (c)
Uso
possível
3 (a) (b) (c)
Conclusão 3(abc) é o máximo uso possível para a área em questão, ou seja, no sistema de manejo A, B e C, o máximo uso é o de
culturas em caráter restrito
56
3.3 Exemplo de aplicação do Sistema FAO/Brasileiro
O exemplo de Parambu-CE
Quadro 11. Aptidão agrícola das terras das folhas SB.24-Y-A-III-2 – Parambú, de
acordo com o uso intensivo mais indicado (Fonte Leite & Oliveira, 1996)
Figura 5. Mapa da aptidão agrícola da área estudada (Fonte Leite & Oliveira, 1996)
Quadro 12. Símbolo, classes de solos, principal limitação, aptidão agrícola, área em hectare e
porcentual das terras das folhas SB.24-Y-A-III-2 – Parambú (Fonte Leite &
Oliveira, 1996)
57
58
4 Bibliografia
CHAVES, N.M.A. Levantamento pedológico semidetalhado com fins de
determinação das classes de capacidade de uso na área do projeto de
Assentamento Lages. Fortaleza: UFC, 2005. 118p.
LEITE, F.R.B. & OLIVEIRA, S.B.P. Aptidão agrícola das terras das folhas SB.24-Y-
A-III-2 Parambu utilizando sistema de informações geográficas. In: VIII Simpósio
Brasileiro de Sensoriamento Remoto. Anais. 1996. INPE, p.27-32.
LEPSCH, I. F. (coord.). Manual para levantamento utilitário do meio físico e
classificação de terras no sistema de capacidade de uso. Campinas: SBCS,
1991. 175p.
RESENDE, M., CURI, N. REZENDE, S.B., CORRÊA, G.F. Pedologia: a base para a
distinção de ambientes. Viçosa: NEPUT, 1995. 304p.
59
PARTE IV – PROPRIEDADES FÍSICAS, QUÍMICAS E MINERALÓGICAS
DE INTERESSE AO MANEJO E CONSERVAÇÃO DO SOLO
1. Introdução
A conservação do solo consiste em dar o uso e o manejo adequado às suas
características químicas, físicas e biológicas, visando manter o equilíbrio ou
recuperar áreas alteradas. Por meio de práticas de conservação, é possível manter
a fertilidade do solo e evitar problemas sérios, como a erosão e a compactação.
Para minimizar os efeitos negativos de agentes ambientais (chuva, vento,
temperatura, etc) e do próprio uso pelo homem, devem ser utilizadas algumas
técnicas de manejo que garantam a conservação dos solos. Porém, para utilizar as
técnicas de manejo adequadas, inicialmente é importante conhecer bem as
propriedades químicas, físicas e mineralógicas do solo que, de uma maneira ou de
outra, influenciam o manejo.
2. Propriedades Mineralógicas
2.1 Fases do solo
Um solo mineral próximo à superfície, com condições físicas ótimas para o
crescimento de plantas, apresenta aproximadamente, a seguinte composição
volumétrica: 50% de espaço poroso, ocupados por partes iguais de ar e água, 45 a
48% de sólidos minerais e 2 a 3, por vezes 5% de matéria orgânica (MO). Têm-se
em média, então, 50% constituídos pela fase sólida, 25% pela fase líquida e 25%
pela fase gasosa (Figura 1).
FIGURA 1. Composição volumétrica média de um solo com boa estrutura.
A fase sólida é constituída de agregados que se apresentam, até certo
ponto, individualizados. Os agregados são formados de partículas unitárias,
cimentadas entre si por matéria orgânica, óxidos e hidróxidos de Fe e Al, sílica, etc.
As partículas individuais são obtidas após a dispersão dos agregados. Limites de
tamanho definem as partículas como pertencentes a diferentes frações. Esses
limites são estabelecidos pela classificação de Atterberg ou classificação
internacional (Figura 2).
Ar
25%
Água 25%
Minerais
45 - 48%
50% de
partículas
sólidas
50% de
poros
MO 2 a 5%
60
FIGURA 2. Limites dos tamanhos das partículas dos solos.
2.2 Sistema Coloidal
O solo pode ser considerado como um sistema disperso, uma vez que é
construído de mais de uma fase, estando a fase sólida em estado de acentuada
subdivisão. Há, portanto, um sistema coloidal no solo, constituído de partículas
diminutas, de tamanho coloidal, minerais ou orgânicas, ou organominerais, como
fase dispersa na solução (ou no ar) do solo, como meio de dispersão. Nesse sistema
ocorrem reações químicas, físico-químicas e microbianas da maior importância no
estudo dos solos. Nessa fase dispersa é que se encontram as argilas.
As partículas do sistema coloidal do solo apresentam as seguintes
propriedades:
2.2.1 Grande superfície específica
A superfície específica refere-se à área pela unidade de peso do material
considerado (solo como um todo, fração argila apenas, matéria orgânica, etc) e é
usualmente expressa é m²/g.
Deve-se, portanto, esperar grandes variações entre solos quanto às suas
superfícies específicas. Dentre os fatores por essas variações, encontram-se:
Textura; Tipos de minerais de argila e Teor de matéria orgânica.
Em virtude do menor tamanho da fração argila do solo, em relação às outras
frações, pode-se deduzir que esta fração, de natureza coloidal, contribui em maior
proporção com o valor da superfície específica do solo.
A matéria orgânica, embora presente, na maioria dos solos, teores
relativamente baixos, contribui, significativamente, para o valor da superfície
específica do solo, graças ao seu alto grau de subdivisão. Assim um solo com maior
teor de matéria orgânica deverá ter maior superfície específica que outro com menor
teor, se outras características, como tipo e quantidade de argila, forem mantidas
constantes.
2.2.2 Cargas elétricas
Propriedade muito importante de uma dispersão coloidal é a presença de
cargas elétricas. As partículas colidais do solo, as argilas de modo geral, são
eletronegativas. Embora possam, também, conter cargas positivas, estão são
61
normalmente, em menor número que as negativas. Essas cargas elétricas
proporcionam a adsorção de íons de carga opostas, retendo-os no solo, íons estes
que, em boa parte, desempenham papel importante para o crescimento e
desenvolvimento das plantas.
2.2.3 Cinética
As partículas dispersas em meios líquidos apresentam movimentos. O
movimento browniano é caracterizado pelo movimento brusco, irregular e em zigue-
zague de partículas individuais no meio de dispersão. Esse movimento deve-se à
energia cinética das partículas.
O movimento de difusão é consequência da migração de partículas de uma
região de maior concentração para outra de menor concentração. Há também, o
movimento ocasionado pela força gravitacional, responsável pela sedimentação de
partículas.
2.3 Mineralogia da fração argila
A fração argila não deve ser confundida com minerais de argila. A fração
argila é aquela representada pelas partículas menores que 0,002 mm. Já os
minerais de argila são representados pelas ARGILAS SILICATADAS e ARGILAS
NÃO SILICATADAS.
2.3.1 Argilas Silicatadas
Dentro da fração argila (partículas menores que 2 μm), as argilas são os
constituintes mais comuns em solos de regiões temperadas, ainda não sujeitos aum
estádio avançado de intemperismo. As argilas silicatadas são constituídas de duas
unidades estruturais básicas. Uma é o tetraedro de sílica, formado por ligações de
um átomo de sílica, formado por ligações de um átomo de Si a quatro átomos de
oxigênio (Figura 3).
A outra unidade é constituída pelo octaedro de alumina, formado por um átomo de Al
e seis de oxigênio (Figura 4).
FIGURA 3. Tetraedro de sílica FIGURA 4. Octaedro de
alumina
62
O número de camadas de tetraedros para camadas de octaedros, por
unidade componente de um cristal de argila silicatada, é uma característica básica
de identificação dos principais grupos de argila silicatadas. Dentre as argilas
silicatadas, destacam-se os principais grupos:
a) Caulinita
Caracteriza-se por um arranjo com uma camada de tetraedros e uma de
octaedros, unidas entre si, rigidamente, pelos átomos de oxigênio comuns às duas
camadas, constituindo uma unidade cristalográfica. Unidades assim formadas se
unem entre si por ligações de H, constituindo o grupo das caulinitas ou o grupo das
argilas 1:1.
São hexagonais e de tamanho grande, o que condiciona pequena superfície
específica, se comparada às partículas de argilas silicatadas do tipo 2:1mais ativa,
como a montmorilonita.
b) Montmorilonita
Caracteriza-se por unidades constituídas por um arranjo com duas camadas
de tetraedros para uma de octaedros, ligadas rigidamente pelos átomos de oxigênio
comuns às lâminas. São também denominadas argilas 2: 1 (Figura 5). As unidades
são frouxamente ligadas entre si por moléculas d’água e cátions na solução, o que
permite que a distância entre elas seja variável. Como consequência, cátions e
moléculas podem-se mover entre essas unidades, o que proporciona tanto uma
superfície total (a interna mais a externa) como uma superfície específica bem
maiores do que para a caulinita. Com a hidratação desse material, há aumento da
distância entre as unidades, o que justifica a classificação desta argila como
expansiva.
FIGURA 5. Representação esquemática das argilas do grupo da montmorilonita
(tipo 2:1)
c) Ilita
O grupo da ilita, ou mica hidratada, apresenta a mesma organização
estrutural que a montmorilonita (tipo 2:1), exceto no que diz respeito às ligações
entre as unidades cristalográficas. A existência de déficit de carga positiva na
camada de tetraedro leva a um excesso de cargas negativas que são neutralizadas,
geralmente por íons de K, fortemente retidos entre duas unidades. Essas ligações
diminuem intensamente a expansão do material quando sujeito á hidratação. A
63
superfície de adsorção catiônica é, consequentemente, menor que a da
montmorilonita.
d) Outros grupos de argilas silicatadas
A presença mais frequente de vermiculita (tipo 2: 1), argila silicatada
semelhante à montmorilonita, embora não tão expansiva como esta, em solos de
regiões temperadas, diz sobre a sua menor resistência ao intemperismo, do que a
caulinita, por exemplo, tão frequente em solos de regiões tropicais. Não obstante a
vermiculita é, de modo geral, mais resistente ao intemperismo em relação à
montmorilonita. A vermiculita apresenta substituição de Si por Al na camada de
tetraedros, ao passo que a montmorilonita apresenta substituição de Al por Mg na
camada de octaedros. Portanto, a presença de Al, em solos ácidos, é fator de
estabilização da vermiculita. Por outro lado a lixiviação de Mg dos solos tende a
desestabilizar a montmorilonita.
A clorita diferente das demais estudadas por apresentar, além do grupo 2;1
de talco (com unidade cristalográfica similar á da montmorilonita, mas com Mg
dominando a camada de octaedros), uma camada adicional de brucita (Mg(OH)2).
Por essa razão, essa argila é conhecida pelo tipo 2:2 ou 2:1:1 ( duas lâminas de
tetraedros, uma de octaedro e uma de brucita). A superfície específica e a
capacidade de troca catiônica são semelhantes às da ilita.
3. Propriedades Químicas
As propriedades de natureza química podem influenciar, positiva ou
negativamente, o crescimento das plantas.
3.1. Origem das cargas elétricas do solo
Há no solo, em geral, predominância de cargas negativas sobre positivas.
Essa predominância é expressiva em solos de regiões temperadas, graças à
presença de argilas silicatadas mais ativas, por conseguinte mais eletronegativas.
As cargas eletronegativas do solo podem ter diferentes origens:
3.1.1 Cargas negativas
a) Dissociação de Grupos OH nas arestas das Argilas Silicatadas
O grupo OH nas terminações tetraedrais ou octaedrais, em faces quebradas
das unidades cristalográficas das argilas silicatadas, pode-se dissociar, gerando
uma carga negativa.
Verifica-se que com a elevação do pH do meio (solo) o equilíbrio é deslocado
para a direita em razão da neutralização dos íons H+ liberados na dissociação do
grupo OH. Este tipo de cargas dependentes do pH é o tipo predominante em argilas
1:1, como a caulinita.
64
Figura 2. Grupos OH em arestas quebradas das UC’s podem se dissociar,
gerando carga negativa
b) Substituição Isomórfica
Durante a gênese de argilas do tipo 2:1, alguns átomos de Si dos tetraedros
podem ser substituídos por Al, bem como o Al dos octaedros pode ser substituído
por Mg ou por outros cátions de valência menor que a do Al3+. A substituição do Si4+,
que se encontrava, inicialmente, neutralizando quatro cargas negativas por Al3+, irá
condicionar sobra de uma carga negativa. De maneira semelhante, uma carga
negativa será gerada pela substituição de um Al3+ de um octaedro por um cátion
divalente, como o Mg2+. Deve-se ressaltar que o número de cargas geradas por este
processo não é variável com alterações do pH do meio.
c) Matéria orgânica
Na matéria orgânica do solo, as cargas negativas originam-se, principalmente,
da dissociação de grupos carboxílicos e fenólicos, de acordo com as equações
químicas: em que R representa um radical de modo geral, de longas cadeias
alifáticas ou eventualmente aromáticas. Verifica-se pelas equações que o equilíbrio
é deslocado para a direita, forma dissociada, com a elevação do pH do meio, ou
seja, com a neutralização da acidez (Figura 3).
Figura 3. Cargas negativas originadas a partir da dissociação de grupos carboxílicos
e fenólicos;
3.1.2. Cargas positivas
As cargas eletropositivas do solo têm a sua origem nos óxidos e hidróxidos
(óxidos hidratados) de Fe e Al, preferencialmente (Figura 4). Tal situação se dá de
maneira mais significativa em condições mais ácidas de solo. Os Solos de região
tropical apresentam-se como ácidos, onde sesquióxidos de Fe e Al formam cargas
positivas. Dependendo do pH do solo, os Óxidos hidratados de Fe e Al podem
originar cargas positivas, negativas ou permanecer com carga neutra.
OH-
Argila
+ OH- O
-
Argila
+ H2O
R – COOH R – COO- + H
+
65
Figura 4. Cargas positivas originadas por óxidos e hidróxidos de Fe e Al
3.2. Adsorção e troca iônica
As propriedades de adsorção iônica do solo são devidas, quase que
totalmente, aos minerais de argila e à matéria orgânica do solo, materiais de
elevada superfície específica. Essas partículas coloidais do solo apresentam
cargas elétricas negativas e positivas, podendo absorver ou “reter”, por diferença
de carga, tanto cátions como ânions.
Cargas negativas ou positivas são neutralizadas por íons de cargas
contrárias que podem ser trocados por outros da solução do solo. A troca ocorre
entre íons de mesma carga. Cargas negativas são neutralizadas por cargas
positivas, definindo a ADSORÇÃO CATIÔNICA (Figura 5). Cargas positivas são
neutralizadas por cargas negativas, definindo a ADSORÇÃO ANIÔNICA (Figura
6).
Na adsorção, íons ligam-se por eletrovalência ou covalência às partículas
coloidais do solo. Os cátions mais envolvidos no processo são: Ca2+, Mg2+, Al3+,
H+, K+, Na+ e NH4+. Os íons adsorvidos às partículas coloidais podem ser
deslocados e substituídos estequiometricamente por outros de mesma carga,
caracterizando a TROCA IÔNICA.
Figura 5. Troca Catiônica
Al3+
Ca2+
Colóide
-
K+
+ 6NH4+
3NH 4+
2NH4+
Colóide
NH4+
+ K+ + Ca
2++ Al
3+
OH-
OH-
Colóide
+
SO42-
+ 4H2PO4-
2H2PO4-
Colóide
2H2PO4-
+ SO4 2-
+ 2OH-
Al O
H+
H+
Carga Positiva
+ H+
Al-OH
+ OH-
Al-O- + H2O
Carga Nula
(PCZ = pH)
Carga Negativa
66
Figura 6. Troca Aniônica
3.3. Capacidade de Troca Catiônica – CTC
Se uma solução salina é colocada em contato com certa quantidade de solo,
verificar-se-á a troca entre cátions contidos na solução e os da fase sólida do solo.
Esta reação de troca se dá com rapidez, em proporções estequiométricas e é
reversível. Por métodos analíticos, a quantidade de cátion que passou a neutralizar
as cargas negativas do solo pode ser determinada. O resultado indica a quantidade
de cargas negativas expressadas pela capacidade de troca catiônica do solo (CTC).
Dentre os cátions que neutralizam as cargas negativas da CTC efetiva do
solo, incluem-se, principalmente, as bases (Ca2+, Mg2+, K+, Na+, NH4+). , o Al3+ e,
também, cátions H+ ligados a cargas negativas da CTC de caráter mais eletrovalente
(tipo ácido forte).
Alguns princípios básicos caracterizam a CTC. Alguns princípios básicos
caracterizam a CTC.
a) O fenômeno de troca é reversível. Os cátions adsorvidos podem
ser deslocados por outros, e assim sucessivamente.
b) O fenômeno de troca é uma reação estequiométrica, isto é
obedece à lei dos equivalentes químicos: um molc de um cátion é trocado
(substituído) por um molc de outro cátion.
c) É um processo rápido. Na determinação da CTC, o tempo de
agitação do solo e solução varia de 5 a 15 min.
Muitas condições do solo têm influência sobre a CTC, dentre as quais: pH,
características dos cátions trocáveis, como valência e raio hidratado, concentração
da solução e da natureza da fase sólida.
O efeito do pH se verifica, principalmente, sobre as cargas dependentes do
pH.
A natureza dos cátions trocáveis afeta a preferencialidade de troca no solo, de
acordo com a densidade de carga dos cátions, isto é, Z/r, em que Z é a carga do íon
e r é o raio do íon hidratado. Os cátions que têm maior densidade de carga são mais
retidos nas cargas negativas do solo. Por isso os cátions polivalentes são
geralmente mais fortemente retidos no solo.
A diferença na preferencialidade de troca entre cátions da mesma carga se
deve à diferença entre raios iônicos hidratados (espessura da camada de hidratação
do íon), que faz com que Cs+ seja mais fortemente retido, em forma eletrostática,
que o Li+. O Cs+ apresenta maior massa atômica e menor espessura da sua camada
de hidratação em relação ao Li+.
A concentração dos cátions na solução do solo afeta a preferencialiadade de
troca, interagindo com a carga dos cátions envolvidos. Assim, à medida que dilui a
67
solução, mantendo constantes as concentrações dos cátions presentes, verifica-se
um aumento na preferência de troca dos cátions de menor valência, como o Na+,
pelos de maior valência.
Dada a importância da CTC no solo, as características relacionadas com esta
propriedade são constantemente determinadas e utilizadas em interpretações e em
cálculos de necessidades de corretivos e fertilizantes.
3.3.1 CTC efetiva (t) e Potencial a pH 7,0 (T)
A capacidade de troca catiônica trata da determinação em certo pH
tamponado, geralmente a pH 7,0 ou a pH 8,2 (para solos alcalinos e salinos). No
Brasil, tem sido mais usado o valor T a pH 7,0 que é calculado somando-se as
bases e a acidez potencial [SB + (H + Al)]. Além dessas duas expressões, pode-se
ainda citar o valor t ao pH do solo (CTC efetiva), que é calculado somando-se as
bases com a acidez trocável (SB + Al3+).
3.3.2 Soma de bases (SB)
A soma de bases (SB) é calculada somando-se os teores de Ca2+, Mg2+, K+ e,
quando disponíveis, Na+ e NH4+ trocáveis. Nos solos ácidos de regiões tropicais os
cátions trocáveis Na+ e NH4+ geralmente têm magnitude desprezível.
3.3.3 Saturação por bases (V)
A participação das bases no complexo sortivo do solo, expressa em
percentagem, é conhecida como saturação por bases (V).
Para este cálculo, V= SB/T * 100, usa-se CTC a pH 7,0 (valor T).
3.3.4 Acidez trocável
A acidez trocável é representada pelo Al3+ e, com menor participação, por
outros cátions de hidrólise ácida, como Mn2+, Fe2+ e Fe3+ mais o H+ que faz parte da
CTC efetiva. Como, em geral, a participação do H+ é pequena em relação à acidez
trocável (Al3+ predominantemente), este valor é também chamado de Al trocável.
3.3.5 Acidez potencial
A determinação da acidez potencial (a pH 7,0) é feita, usando-se, como
extrator, uma solução tamponada de acetato de cálcio 0,5 mol L-1, pH 7,0. Esta
acidez inclui H + Al ( H+ trocável, H de ligações covalentes que é dissociado com a
elevação do pH, predominante, de modo geral, da matéria orgânica, Al3+ trocável e
outras formas de Al – aquelas parcialmente hidrolisadas como AlOH2+ e Al(OH)2+). A
maior parte do H provém das cargas negativas dependentes do pH. Esta fração é
chamada acidez dependente do pH.
3.4. Capacidade de troca Aniônica
A capacidade de troca aniônica é definida como o poder do solo de reter
ânions na fase sólida, numa forma trocável com outros ânions da solução.
68
Entretanto, a manifestação desta propriedade não é tão característica quanto a troca
catiônica, isto é, não são atendidas perfeitamente as condições de rapidez,
reversibilidade e estequiometria. Por esta razão a troca aniônica é mais frequente e
convenientemente denominada adsorção aniônica, sugerindo um processo mais
complexo do que a simples troca.
Um aspecto particular do comportamento de certos ânions no solo é a
adsorção específica, Por este processo os ânions são retidos pela fase sólida, por
meio de ligações fortes (covalentes), passando a fazer parte da estrutura da micela,
em sua superfície. Este tipo de adsorção é de baixa reversibilidade e é bem
conhecida para o P, sendo o principal responsável pela fixação de P no solo,
principalmente nos solos ricos em óxidos e hidróxidos de Fe e Al.
3.4.1 Adsorção específica
É o processo pelo qual ânions são adsorvidos na fase sólida por ligações
fortes (covalentes). Trata-se de uma adsorção de baixa reversibilidade, bastante
comum para o P. O ânion que desloca P da fase sólida é o silicato (H3SiO4-) e o
sulfato (SO42-). A adsorção varia com o teor e o tipo de argila. Cargas positivas
que causam adsorção são dependentes do pH (menor pH, aumenta cargas
positivas e aumenta a adsorção).
O
3.5. Acidez do solo
Grande limitante ao desenvolvimento das plantas em muitos solos
brasileiros. Pode estar associada à presença de Al e Mn em concentrações
tóxicas às plantas e aos baixos teores de Ca e Mg que são importantes
nutrientes.
No manejo é preciso utilizar meios que minimizem os efeitos negativos da
acidez do solo. O uso do termo “reação do solo” é comum para se referir à influência
do fator pH sobre as propriedades do solo.
3.5.1 Conceito ácido-base
Fe
O
Fe
OH
OH
+ P
O OH
OH O
P
O O
OH O Fe
O
Fe
+ OH-
+ H2O
69
- Arrhenius (1884):
Um Ácido é uma substância com H que, em solução aquosa, produz H+ ; base é
uma substância que produz OH-. A teoria não se aplica à substâncias que não
possuem H ou OH.
- Brönsted-Lowry (1923):
Um Ácido é uma substância química que doa prótons; base é uma substância que
recebe prótons.
Ácido:
Base:
A reação de
transferência de prótons envolve a competição de duas bases por prótons, como
por exemplo, a dissolução de HCl em água (Figura 7). A acidez de uma solução
(como a do solo) será definida pelo balanço entre doadores e receptores de
prótons.
HCl (ÁCIDO) doa H+ para H2O (BASE) que recebe H+
Figura 7. Reação ácido-base
3.5.2 Origem da Acidez do Solo
Os solos, em suas condições naturais, podem ser ácidos, em decorrência do
material de origem e da intensidade da ação de agentes de intemperismo, como
clima e organismos. Regiões com altas precipitações pluviais apresentam tendência
à maior acidificação do solo pela remoção de cátions de caráter básico do complexo
de troca, como o Ca, Mg, K e Na, e o consequente acúmulo de cátions de natureza
ácida, como o Al e H.
Nos solos cultivados, a acidez pode ser acentuada pela absorção dos cátions
básicos pelas culturas e exportados com as colheitas. O manejo inadequado do solo
pode, também, favorecer a erosão, expondo os horizontes subsuperficiais que são,
em geral, mais ácidos. O uso de fertilizantes amoniacais contribui, para a
acidificação devido a nitrificação do amônio. A oxidação da matéria orgânica e do S
também desempenha papel importante na acidificação.
3.5.2.1 Remoção de bases
HA + H2O A- + H
+ (H3O)
B + H2O BH + OH-
HCl + H2O H3O+ + Cl
-
70
A remoção de cátions de caráter básico do solo pela lixiviação, erosão, e
pelas culturas, resulta no aumento de formas trocáveis de H+ e de Al3+ no
complexo sortivo (CTCefetiva), favorecendo maiores concentrações destes íons na
solução do solo. O Al é hidrolisado e gera acidez
3.5.2.2 Grupos ácidos da matéria orgânica
A ionização do H de ácidos carboxílicos, fenólicos e, principalmente, de
álcoois terciários da matéria orgânica, contribui para a acidez no solo. Entretanto,
em condições de acúmulo de matéria orgânica e no estádio final de sua
mineralização, a oxidação libera elétrons, podendo ocasionar um aumento no pH.
-
A mineralização da M.O. também libera bases que aumentam o pH, pois
libera N e S que, ao oxidar, liberam prótons e diminuem o pH.
A oxidação biológica da M.O. produz CO2 que leva à acidificação do solo
3.5.2.3 Minerais de argila silicatados e não silicatados
Os grupos estruturais Si-OH e Al-OH exposto na superfície dos minerais de
argila silicatada, assim como os grupos Al-OH e Fe-OH nos oxihidróxidos de Fe
(magnetita, hemetita, goethita) e Al (gibbsita) contribuem para a geração de acidez.
3.5.2.4 Fertilizantes minerais
Al3+
+ 6H2O Al(OH)3 + 3H3O-
O2 + 4H+
+ 4 e-
2H2O + 1,229 volts
NH4+
+ 2O2
+ H2O
NO3 -
+ 2H3O+
S
+ 3/2 O2 + 3H2O
SO4
2- + 2H3O
+
CO2 + H2O H2CO3
H+
+ HCO3-
666
CO32-
+ 2H+
666
71
A oxidação do amônio também é responsável pela acidez gerada quando da
aplicação de fertilizantes, como (NH4)2SO4 e NH4NO3, que aumenta com as doses
aplicadas (Figura 8).
Com o aumento do pH, o Al não permanece na forma de oxihidróxidos de
Al, restando os cátions básicos na solução do solo na forma trocável. Deve-se
salientar que o H+ está sendo continuamente produzido no solo como resultado,
por exemplo, da mineralização de compostos orgânicos com produção de CO2 e
do intemperismo dos silicatos, que libera Al3+ em solução.
Figura 8. NH4+ desloca Al3+ do mineral de argila
3.5.3 Determinação da acidez do solo
A acidez do solo é avaliada, geralmente, por meio do seu pH, determinando-se a
atividade de H+ na solução do solo com água ou com soluções salinas. O pH está
relacionado com a concentração dos H+ na solução do solo, que determina a acidez
ativa do solo. Deve-se ter em mente que a acidez ativa é apenas uma parte muito
pequena em relação à acidez trocável ou à acidez potencial do solo.
3.5.3.1 Acidez ativa (Não trocável)
Refere-se à atividade dos íons H+ (H3O+) em solução, medida pelo pH.
Fornece indicativos sobre a disponibilidade de nutrientes, presença de Al,
atividade biológica, reação de fertilizantes, etc.
3.5.3.2 Acidez trocável
Como em muitos solos o teor de H+ trocável é muito pequeno (o mesmo
acontece com a acidez da hidrólise de outros cátions de reação ácida), considera-
se o resultado de acidez trocável como sendo o teor de Al trocável (Al3+).
3.5.3.3 Acidez potencial
Esta acidez é composta pela acidez trocável e não-trocável. Refere-se à
quantidade de formas trocáveis e não-trocáveis desses íons do solo. Essa acidez
potencial inclui H+ e Al3+ adsorvidos em forma eletrovalente, bem como os íons H
Al3+
+ 3NH4 (NH4+)3 + Al
3+ Al
3+ + 6H2O Al(OH)3 + 3 H3O
+
Si-O- +
H3O-
72
ligados covalentemente que se dissociam de compostos orgânicos, de grupos OH
na superfície das argilas, e de alguns polímeros de Al, como já apresentado.
3.5.4 Efeitos da acidez do solo no manejo
A concentração de H+ na solução do solo, mesmo com valor de 0,1 mmol
L-1 que corresponde a pH 4,0, não é fator limitante ao crescimento e
desenvolvimento das plantas, desde que haja suprimento adequado do nutrientes
e ausência de elementos em concentrações tóxicas. Entretanto, essa situação
não acontece naturalmente nos solos, pois, em condições ácidas, podem ocorrer
íons, como o Al3+ e Mn2+, em teores tóxicos para as plantas. A acidez do solo
pode interferir, também, na disponibilidade de alguns nutrientes e na atividade
dos microrganismos. Assim, para o estudo dos prejuízos causados pela acidez
dos solos devem-se considerar os efeitos diretos e indiretos da acidez,
principalmente dos decorrentes da acidez ativa (pH).
3.5.4.1 pH x Disponibilidade de nutrientes
A redução da acidez do solo promove a insolubilização de Al e Mn,
aumenta a disponibilidade de P e Mo e diminui a disponibilidade de
micronutrientes, como o Zn, Mn, Cu e Fe.
A intensidade dessas mudanças na disponibilidade/absorção de elementos
químicos do solo pode ser sentida na forma diferenciada entre espécies,
cultivares ou variedades de plantas. A variabilidade de comportamento de
plantas, em relação aos efeitos da acidez do solo, não permite generalizações e
dificulta bastante o estabelecimento de faixas de pH adequadas para as diversas
culturas.
Concentração de elementos, tais como alumínio, ferro e manganês, pode
atingir níveis tóxicos, porque sua solubilidade aumenta nos solos ácidos;- a
toxidez de alumínio é, provavelmente, o fator limitante mais importante para as
plantas em solo muito ácidos;- os organismos responsáveis pela decomposição
da matéria orgânica e pela liberação de nitrogênio, fósforo e enxofre podem estar
em pequeno número e com pouca atividade;- o cálcio pode ser deficiente quando
a CTC do solo é extremamente baixa. O mesmo acontece com o magnésio;- a
performance dos herbicidas aplicados ao solo pode ser afetada, de modo
adverso, quando o pH do solo é muito baixo;- a fixação simbiótica de nitrogênio
pelas leguminosas é severamente reduzida.
A relação simbiótica requer uma amplitude de pH mais estreita para o
crescimento ótimo das plantas do que no caso de plantas não fixadoras de
nitrogênio;- os solos argilosos, com alta acidez, são menos agregados. Isto causa
baixa permeabilidade e aeração, um efeito indireto, motivo pelo qual os solos que
receberam calagem produzem mais resíduos das culturas; pois melhora
crescimento radicular, aumenta mineralização da M.O. e diminui retenção de P na
73
fase sólida; a disponibilidade de nutrientes como o fósforo e o molibdênio é
reduzida;- há aumento na tendência de lixiviação de potássio.Os principais
sintomas de toxidez podem ser observados no sistema radicular:- raízes
caracteristicamente curtas ou grossas;- inibição do crescimento das raízes, que
se tornam castanhas;- raízes laterais engrossadas e pequena formação de pêlos
radiculares;- se observa também predisposição da planta injuriada à infecção por
fungos.
A maneira mais fácil, correta e economicamente viável de corrigir a acidez
do solo, notadamente na camada arável, diz respeito ao uso de calcário por meio
da calagem. Essa prática tem dois objetivos fundamentais: correção da acidez do
solo para diminuir ou até anular os efeitos tóxicos das altas concentrações ou
saturações de alumínio e manganês, e correção das deficiências de cálcio e
magnésio.
↑ disponibilidade de Mo e Cl
O molibidênio é fortemente adsorvido pelos oxihidróxidos de Fe e Al, à
semelhança do que ocorre com o P, e é deslocado pelo OH- com a elevação do
pH do solo. A mesma tendência é observada para Cl-, embora este seja
fracamente adsorvido no solo.
↑ disponibilidade de S
O SO4-2 adsorvido pelos oxihidróxidos de Fe e Al, à semelhança do que
ocorre com P, é liberado pela elevação do pH. A decomposição da Matéria
orgânica liberando S é favorecida pela elevação do pH.
↓ disponibilidade de micros metálicos (Cu, Fe, Mn e Zn)
A disponibilidade destes micronutrientes catiônicos diminui com a
elevação do pH (mais OH-) do solo.
↑ disponibilidade
de N
A
disponibilidade
aumenta graças ao
efeito favorável na
mineralização da matéria orgânica.
↑ não afeta muito a disponibilidade de B
Abaixo de pH 7,0 há pouco efeito na disponibilidade de boro; em
condições do pH do solo, o ácido bórico é pouco dissociado. A influência é maior
quando aumenta mineralização da M.O. que libera boro.
3.6 Alumínio em solos ácidos
Fe3+
+ 3OH- Fe(OH)3↓
Mn2+
+ 4OH- MnO2↓ + 2H2O + 2 e
-
Cu2+
+ 2OH- Cu(OH)2↓
Zn2+
+ 2OH- Zn(OH)2↓
74
O alumínio constitui importante componente da acidez dos solos. A reação
de hidrólise do Al3+ em solução contribui para o poder tampão dos solos. Além
disso, o Al e o Mn, quando em altas concentrações no solo, podem ser tóxicos às
plantas, constituindo uma das principais limitações agrícolas em solos ácidos.
De acordo com os equilíbrios químicos, a atividade do Al3+ e das demais
espécies de sua hidrólise depende basicamente do tipo de mineral da fase sólida
e do pH do solo. Em solos ácidos, com predomínio de argilas de 1:1 (caulinita) e
oxihidróxidos (gibbsita) na fração argila, a atividade do Al3+ em solução pode ser
bastante elevada.
Verifica-se que a valores de pH acima de 5,5 – 6,0 (até 7,0), a solubilidade
do Al é mínima. Esta é umas das razões pelas quais a correção de solos ácidos é
feita pra se atingir um pH, de pelo menos, 5,5.
3.6.1 Saturação por alumínio e crescimento das plantas
Dada a necessidade de se adaptarem as condições locais do solo com
elevada acidez, as plantas desenvolveram mecanismos de tolerância ao Al. Como
exemplo de diferenças entre plantas, podem-se mencionar a alfafa, que
apresenta muito baixa tolerância ao al, e a samambaia ou o chá, que sobrevivem
em solos com alto teor de Al. Essa variabilidade de reação e concentrações
tóxicas de Al e, ou de Mn existe entre espécies de plantas e entre variedades
dentro da mesma espécie.
Os efeitos do Al em concentrações tóxicas manifestam-se tanto na parte
aérea como no sistema radicular, por meio de sintomas anatômicos e
morfológicos e da redução de crescimento. O sistema radicular é mais afetado
que a parte aérea, ocorrendo prejuízo no alongamento das raízes do que no
volume e na produção de matéria seca, reduzindo sua superfície.
Consequentemente, as raízes ocupam menor volume de solo diminuindo, assim,
a possibilidade de absorção de nutrientes e água.
Os mecanismos de tolerância ao al são vários e não existe um único que
explique por completo sua diferenciação entre espécies e variedades de plantas.
A tolerância ao Al pode ocorrer em plantas eficientes em absorver e translocar P
da parte aérea. Parte do P absorvido é utilizado para precipitar o Al nas raízes
das plantas.
A percentagem de saturação por Al é, também, um bom indicador da acidez
do solo e seu efeito sobre as plantas.
Em termos de efeitos negativos ao crescimento das plantas, o efeito primário
da toxidez por Al faz-se sentir ao sistema radicular. Os principais sintomas que
podem ser observados no sistema radicular são:
Raízes curtas ou grossas
Inibição do crescimento das raízes, que se tornam castanhas;
Raízes laterais engrossadas e pequena formação de pêlos
radiculares;
75
Predisposição da planta injuriada a infecções por fungos; entretanto,
também há casos em que o Al3+ controla algumas doenças fúngicas
das raízes.
3.6.2 Mecanismos de tolerância à Al
Não absorvem Al, pois apresentam capacidade de manter o Al fora do
metabolismo da planta (mecanismo de exclusão), por processos de
complexação do Al com ácidos orgânicos e por precipitação de Al (OH)3
pela maior basificação da rizosfera;
Não translocam alumínio para a parte aérea, mantendo sua capacidade de
absorver P e Ca, mesmo na condição de elevada absorção de Al;
Há espécies com elevada capacidade de manter adequada partição de C
para formar novas raízes absorventes.
3.7 Alterações de pH na rizosfera
O pH na rizosfera pode ser diferente daquele do solo, chegando a ser acima
de duas unidades diferente em relação ao observado para o solo. As plantas
promovem a extrusão de H+ ou de HCO3- e liberação de exsudatos radiculares,
como ácidos orgânicos, aminoácidos, açúcares, fenóis, etc.
Para a manutenção do equilíbrio eletroquímico, quando as plantas absorvem
nutrientes com cargas positivas (cátions), liberam H+. Quando absorvem cargas
negativas (ânions), liberam OH-.
Em geral, para Solos com boa porosidade, a liberação de CO2 vis respiração
radicular ou microbiana não provoca importantes alterações no pH da rizosfera. A
difusão de CO2 pelos poros do solo dá-se de maneira rápida. Da mesma forma,
grandes mudanças de pH da rizosfera induzidas por exsudatos de baixo peso
molecular podem ser consideradas mais como exceção do que regra.
Dentre as práticas de manejo cultural, a adubação nitrogenada talvez possa
produzir as maiores alterações do pH da rizosfera. Com N absorvido,
preferencialmente, como nitrato, a planta passa a absorver mais ânions que
cátions, resultando em valores de pH mais altos na rizosfera. Assim, a absorção
de N-NO3- promove formação de HCO3
- e consequente aumento do pH.
Alterações no pH da rizosfera podem resultar em efeitos benéficos ou
maléficos no crescimento das plantas. Em solos alcalinos e neutros, o aumento
no pH leva á menor disponibilidade de nutrientes, como o Fe, Mn, Cu e Zn. Em
solos ácidos, o aumento do pH da rizosfera pode resultar em decréscimo da
atividade do Al, sendo este fato considerado como um dos mecanismos de
adaptação do vegetal a estas condições.
Al
m% = CTCef
X 100
76
4. Propriedades físicas
A cor, textura e outras propriedades físicas do solo são utilizadas na
classificação de perfis e em levantamentos sobre a aptidão do solo para projetos
agrícolas e ambientais. O conhecimento básico sobre as propriedades físicas do
solo servirá como base para a compreensão de muitos aspectos que serão
abordados posteriormente.
4.1 Funções do solo:
O conceito de um solo fisicamente ideal é complexo e carece de melhor
definição quantitativa. No entanto, já há indicação clara de uma série de valores
quantitativos de indicadores da qualidade física de um solo, seja valores ideais,
críticos ou restritivos ao crescimento de plantas ou na qualidade ambiental
4.2 Funções do solo que são influenciadas por atributos físicos
A definição de um solo fisicamente ideal é difícil devido ao tipo e natureza
das variações físicas dos solos que ocorrem ao longo da profundidade do solo, na
superfície da paisagem e ao longo do tempo. Um exemplo clássico refere-se ao
suprimento de água e ar, que variam continuamente junto com os ciclos de
umedecimento e secagem, que ocorrem com a alternância de chuva e estiagem.
Um solo é considerado fisicamente ideal para o crescimento de plantas quando
apresenta boa retenção de água, bom arejamento, bom suprimento de calor e
pouca resistência ao crescimento radicular. Paralelamente, boa estabilidade dos
agregados e boa infiltração de água no solo são condições físicas importantes
para qualidade ambiental dos ecossistemas. O solo fisicamente ideal, também,
projete as plantas de elementos tóxicos (adsorção, complexação, oxido redução,
etc) e fornece nutrientes.
4.3. Fases do solo
Um solo mineral, próximo à superfície, com condições físicas ótimas para o
crescimento vegetal, apresenta, aproximadamente, a seguinte composição
volumétrica: 50% de espaço poroso, ocupados por partes iguais de ar e de água,
45 - 48% de sólidos minerais e 2 até 5% de matéria orgânica. Têm-se,
normalmente, então, 50 % constituídos pela fase sólida, 25% pela fase líquida e
25% pela fase gasosa.
25%
Ar
25%
Água
45-48%
Mineral
2-5%M.O
77
4.4. Interface ar, minerais, água e vida
4.4.1 Constituintes minerais
A fase sólida é constituída de agregados que se apresentam, até certo
ponto, individualizados. Os agregados são formados de partículas unitárias,
cimentadas entre si por matéria orgânica, óxidos de Fe e Al, sílica etc. As
partículas individuais são obtidas após a dispersão dos agregados. Limites de
tamanho definem as partículas como pertencentes a diferentes frações:
Areia: 0,2 a 0,05 mm
Silte: 0,002 a 0,05 mm
Argila: < 0,002 mm
Colóides: < 0,001 mm
Areia Silte Argila
0,2 a 0,05 mm
0,05 a 0,002 mm < 0,002 mm
Visível a olho nu Visível ao microscópio Visível ao microscópio
eletrônico
Predomínio de minerais
primários
Predomínio de minerais
primários e secundários
Predomínio de minerais
secundários
Baixa atração entre
partículas
Média atração entre
partículas
Alta atração entre
partículas
Baixa atração por água Média atração por água Alta atração por água
Baixa CTC
Baixa CTC Alta CTC
Quando molhado: solto,
arenoso
Quando molhado: liso Quando úmido:
pegajoso, maleável
Quando seco: muito
solto, arenoso
Quando seco: pó Quando seco: torrões
duros
- Minerais primários: não sofreram alteração desde que foram extraídos da rocha
(ex.: quartzo, micas, feldspatos) presentes nas frações areia e silte
- Minerais secundários: formados do intemperismo dos primários menos
resistentes (ex.: argilas silicatadas, óxidos de Fe e Al) presentes na argila e no
silte
- Minerais interferem na estrutura que, por sua vez, influencia o movimento de
água no solo
78
b) Matéria orgânica
- Une partículas influenciando a estrutura do solo
c) Água do solo
A água na forma líquida apresenta uma série de propriedades de
fundamental importância em seu comportamento no solo. A polaridade, pontes de
hidrogênio e tensão superficial da água fazem com que a água em sistemas
porosos atinja estado de menor energia livre e seja retida contra a gravidade,
especialmente por capilaridade e também por adsorção.
c) Ar do solo
É variável
Possui maior umidade que o ar atmosférico
Possui mais CO2 que O2
Ocupa poros não preenchidos por água
4.5 Arquitetura do solo e propriedades físicas
a) Cor do solo
Pouco influencia o uso e manejo do solo
Indica natureza de outras propriedades
É avaliada pela carta de Munsell
Há três componentes da cor do solo: valor, croma, matiz
Causas da cor do solo: oxidação de Fe e Mn, umidade
b) Textura do solo
Definida pela proporção entre areia, silte e argila
A classificação mais usada é a o Depto de Agricultura dos EUA
o AREIA MUITO FINA: 0,05 – 0,10 mm
o AREIA FINA: 0,10 – 0,25 mm
o AREIA MÉDIA: 0,25 – 2,0 mm
o AREIA GROSSA: 0,5 – 1,0 mm
o AREIA MUITO GROSSA: 1,0 – 2,0 mm
o SILTE: 0,05 – 0,002 mm
o ARGILA: < 0,002 mm
c) Influência da área superficial em outras propriedades
> área superficial > retenção de água
> área superficial > CTC
> área superficial > agregação
> área superficial > biomassa microbiana
4.6 Textura e propriedades do solo
79
- Mudança de classe textural só ocorre por processos pedológicos (erosão,
deposição, iluviação e intemperismo) que alteram a textura dos horizontes
- Práticas de manejo não alteram a textura, a não ser que favoreçam a erosão
que elimine um dos horizontes do solo.
4.6.1 Solo arenoso
Baixa capacidade de retenção de água
Boa aeração
Alta drenagem
Baixa matéria orgânica
Rápida decomposição da M.O.
Rápido aquecimento
Baixa compactabilidade
Susceptibilidade moderada à erosão eólica
Susceptibilidade baixa à erosão por água
Potencial de compressão e expansão baixo
Boas condições para preparo do solo após chuva
Alto potencial de lixiviação de elementos
Baixo potencial de estocar nutrientes às plantas
Baixa resistência à mudança de pH
4.6.2 Franco
Proporções próximas entre areia, argila e silte
4.6.3 Determinação da classe textural
a) Tato
Método crítico
Há necessidade de uniformizar a umidade da amostra
a) Análise laboratorial que determina o tamanho das partículas
Método da pipeta ou método do densímetro
Baseados na sedimentação da areia e do silte
A velocidade de precipitação é proporcional ao tamanho das
partículas
A equação que descreve o fenômeno fundamenta-se na Lei de
Stokes
Onde:
g= força gravitacional
ƞ= viscosidade da água a 20 oC
Ds= densidade de partículas
V=
h
t
=
d2 g (Ds – Df)
18ƞ
80
Df= densidade do fluído
b) Estrutura
- Refere-se ao arranjo das partículas do solo em grupos chamados agregados
ou peds
- Solos com determinada quantidade de argila tendem a formar unidades
estruturais chamadas agregados que podem ser macro ou micro
- Para formar agregados é preciso ter floculação de argila e cimentação em
uma complexa relação de reações químicas, físicas e bilógicas
- Influencia:
Movimento da água
Transferência de calor
Aeração
Porosidade
- É afetada por:
Mecanização
Cultivo
Drenagem
Calagem e adubação
- É caracterizada por:
Tipo
Tamanho
Grau
- Tipos de estrutura
Esferoidal Blocos Laminar Prismática
Estrutura
granular
Blocos
irregulares
Lâminas
delgadas
Colunar ou
prismática
Peds
esferoidais ou
grânulos
Bordas
arredondadas:
subangular
Horizonte
superficial ou
subsuperficial
Prismas
orientados
Arranjamento
Solto
Bordas com
pontas:
angular
Resultado de
processos de
formação do
solo ou de
compactação
Subsolos com
alta qtidade
de Na
Caracteriza
horizonte
superficial
com muita
M.O.
Encontrado
em horizonte
B
81
É a principal
estrutura
afetada pelo
manejo
Promove boa
drenagem,
aeração e
enraizamento
- Distribuição do tamanho de agregados
- Importante para determinação a distribuição de tamanho de poros
- Importante papel na erodibilidade superficial
- Selamento superficial e formação de crosta
- Agregados rompidos em condições de umidade formam camada de argila
dispesa e espessa que inibe a infiltração de água e a troca gasosa entre solo
e atmosfera, caracterizando o selamento superficial
- Quando seca, o selamento forma uma crosta dura que impede a emergência
de plântulas
- A crosta se torna mais dura com o grau de dispersão coloidal
- A evaporação da água torna a superfície do solo com maior concentração de
sais (Na), levando a uma alta concentração de Na na CTC
- Com a infiltração da água da chuva ou da irrigação, os sais são lixiviados,
mas a concentração de Na na CTC continua alta, levando à dispersão que
contribui com a formação de crostas.
4.7 Densidade do solo
4.7.1 Densidade de partículas (real)
- massa de sólidos/volume de sólidos
- Mg/m3 ou g/cm3
- Determinada pela composição química e estrutura cristalina do mineral
- Não afetada pela porosidade
- Não relacionada com textura estrutura
- Varia de 2,60 a 2,75 Mg/m3
- Para cálculos gerais: 2,65 Mg/m3
- Aumenta para 3 Mg/m3 quando há grande qtidade de magnetita no solo
- Diminui para 0,9 a 1,3 Mg/m3 qdo há grande qtidade de M.O.
4.7.2 Densidade total (global ou aparente)
- Massa de solo + poros/volume solo+poros
- Se aumenta o volume de poros, diminui a densidade total
- É afetada pela textura
Solos argilosos tem poros entre e dentro dos grânulos e maior
porosidade total que solos arenosos e com menor densidade total
Solos arenosos com predomínio de 1 classe de tamanho de areia tem
menor densidade em relação aos solos que tem diferentes tamanhos
de areia pq patículas pequenas preenchem os espaços porosos
- Influencia a força do solo e o crescimento de raízes
82
Raízes penetram o solo, empurrando para os poros
Se os poros são muito pequenos para acomodar a extremidade da raiz,
ela empurra partículas de solo para o lado e aumenta o poro
Força do solo: é uma propriedade que causa resistência à deformação
Compactação aumenta a densidade e aumenta a força do solo
- Umidade influencia a densidade
- Textura do solo influencia a densidade
Alta qtidade de argla e baixa qtidade de poros aumenta a resistência à
penetração
Na mesma umidade, raízes penetram mais fácil solo arenoso que solo
argiloso
4.8 Porosidade
O espaço do solo não ocupado por sólidos e ocupado pela água e ar compõem o
espaço poroso, definido como sendo a proporção entre o volume de poros e o
volume total de um solo. É inversamente proporcional à Ds e de grande
importância direta para o crescimento de raízes e movimento de ar, água e
solutos no solo. A textura e a estrutura dos solos explicam em grande parte o tipo,
tamanho, quantidade e continuidade dos poros.
Os tipos de poros estão associados à sua forma, que por sua vez tem relação
direta com sua origem. O tipo de poros mais característico são os de origem
biológica, que são arredondados e formados por morte e decomposição de raízes
ou como resultado da atividade de animais ou insetos do solo, como minhocas,
térmitas, etc... Outro tipo de poros apresenta forma irregular e de fenda formados
por vários processos, tipo umedecimento e secagem, pressão, etc... Poros
arredondados tendem a ser mais contínuos e de direção predominante normal a
superfície, ao contrário das fendas no solo.
4.9 Água no solo
- Movimentação é muito influenciada pela capilaridade que é causada pela
adesão e tensão
- Adesão: atração da água pelos sólidos
- Tensão: atração entre as moléculas de água (coesão)
4.9.1 Mecanismo de capilaridade
Fino capilar de vidro dentro de
recipiente com água
Patm
Patm
83
Capilar tem parede hidrofílica, havendo adesão entre água e parede do
capilar
Adesão faz com que a água tenda a subir pelo capilar
Forças de coesão fazem com que as moléculas de água permaneçam
juntas, formando o menisco
Pressão atmosférica sobre a água fora do tubo é maior que a pressão que
ocorre no menisco, fazendo com que a água suba até o equilíbrio dessas
pressões
Altura de ascensão de
água em solos é menor
que a esperada pq os
poros são tortuosos
Solos arenosos
Solos argilosos
Poros grandes e médios Ascensão inicial da água é lenta
Permitem rápida ascensão da água
Limita a altura
4.9.2 Energia da água no solo
- Energia potencial e cinética influenciam o movimento da água no solo
- Como o movimento é lento, Ecinética é menos relevante
- Água movimenta-se de local de > potencial para < potencial
- As forças que afetam o estado de energia são:
Adesão: potencial mátrico
Atração: potencial osmótico
Gravidade]
- Diferença de potencial (Ψ)
Ψt = Ψm + Ψo + Ψg
4.9.3 Métodos para medir o conteúdo de água no solo
a) Gravimétrico
Método direto
Calibra demais métodos
Destrutivo
h=
2 T cosɑ
r d g
Onde:
T= tensão superficial
ɑ = ângulo de contato
d = densidade da água
r = raio
g = gravidade
84
d) Sonda de nêutrons
a. Equipamento com fonte de nêutrons e detector
b. Detector é introduzido no solo liberando neutrons
c. Nêutrons colidem com o H da água e se espalham, perdendo
velocidade
d. O número de nêutrons lentos é contado no detector
e. Adequado para solos minerais
f. Inadequado para solos orgânicos
e) Método eletromagnético
TDR (Time Domain Reflectrometry)
Sinais eletromagnéticos
O tempo que os sinais demoram para percorrer é relacionado com a
cte. dielétrica do solo que é proporcional à qtidade de água no solo.
f) Método da capacitância
Capacitância elétrica de 2 eletrodos introduzidos no solo
Depende da cte. Dielétrica que é determinada pelo nível de água no solo
Baixo custo
Material radioativo
e) Métodos para medir o potencial de água
Tensiômetro
- A força com que a água é retida no solo é uma expressão do potencial de água
- Tensiômetros de campo medem a atração ou a tensão
- Trata-se de tubo preenchido com água, fechado e com cápsula porosa na ponta
que fica em contato com o solo
Qdo em solo seco, a água vai do > Ψ (tubo) para o < Ψ (solo) até que o
potencial do tensiômetro se iguale ao potencial do solo
Forma-se vácuo no interior do tubo que é medido por contador
Se o solo fica úmido, água entra no tensiômetro, reduzindo o vácuo
- Útil no potencial entre 0 e -85 kPa
- Se o potencial é mais negativo, o tensiômetro falha pq entra ar na cápsula
porosa
Outros
Psicrômetro: Mede potencial osmótico e potencial mátrico
Aparato de pressão de membrana: usado para potencial < que 10.000 KPa
Blocos de resistência elétrica: acurácia limitada
4.9.4 Fluxo de água no solo
a) Saturado
85
- Poros cheios
- Equação de Darcy: Qtidade de água/tempo
- Solo arenoso: > movimento vertical
- Solo argiloso: > movimento horizontal
b) Insaturado
- Macroporos preenchidos com ar
- Alta umidade: condutividade hidráulica é maior em solo arenoso pq tem mais
macroporos
c) Infiltração
- Processo no qual a água entra nos espaços porosos e torna-se água do solo
- Taxa de infiltração é denominada infiltrabilidade (i)
- Medida com cilindros de
infiltração (gde e pequeno)
d) Percolação
- Ocorre após a infiltração que é um processo mais superficial
- É a descida de água no perfil
- Taxa de percolação relaciona-se com a condutividade hidráulica
e) Movimento de água em solos estratificados
- percolação diminui quando a água encontra camada com poros menores e baixa
condutividade hidráulica
- camada de material grosseiro também diminui percolação pq macroporos tem <
atração pela água que microporos
f) Movimento de vapor d’água no solo
- Interno: dentro do solo
- Externo: na superfície
- Vapor d’água é perdido por evaporação
- Vai do ponto de > pressão de vapor (UR = 100%) para < pressão de vapor
- Vapor move-se de local com menor concentração de sal para local com maior
concentração de sal, porque o sal diminui a pressão de vapor
- Vapor vai do local com maior temperatura para local com menor temperatura
4.9.5 Definições da água no solo para o manejo
a) Capacidade máxima de retenção de água
- Ocorre qdo todos os poros do solo estão preenchidos com água
i = Q
A t
Onde:
Q= m3 de água infiltrada
A= área da superfície do solo (cm3)
t= tempo (segundos)
86
- V água = P total
b) Capacidade de campo
- Após saturação máxima, excesso de água drena dos macroporos rapidamente
- A água que sobra influenciada pelo potencial matricial caracteriza a CC
c) Ponto de murcha permanente
- Solo em secamento e plantas em crescimento
- A absorção de água aumenta o secamento
- Plantas absorvem água proveniente de poros maiores e depois não conseguem
mais absorver água
- Plantas murcham de dia para economizar água e voltam a absorver água e
ficam túrgidas à noite
- A umidade do solo nesse ponto caracteriza o PMP
d) Água disponível para as plantas
4.9.6 Fatores que afetam a
disponibilidade de água para as plantas
a) Relação entre conteúdo de água e potencial
> argila > água disponível > PMP
> M.O. > água retida
b) Compactação e potencial matricial, oxigênio e crescimento radicular
Aumenta compactação, diminui água no solo pois:
Diminui macroporos
Aumenta microporos
Diminui espaço poroso total
Diminui o número e o tamanho de macroporos
Aumenta microporos finos e aumenta o PMP
4.10 Ar do solo e temperatura
- Disponibilidade de oxigênio é regulada por:
Macroporosidade
Conteúdo de água
Consumo de oxigênio por plantas e organismos
- Movimento de gases ocorre por
Fluxo de massa (menos importante)
CC
H2O disponível PMP
- 10 a -30 KPa - 1500 KPa
87
Difusão (mais importante)
- Meios para caracterizar a aeração do solo
Conteúdo de água e outros gases
Preenchimento de ar na porosidade
Potencial redox
- Composição do ar do solo
78% N2
21% O2
0,035% CO2
Outros gases: vapor d’água, metano, ácido sulfídrico, etileno
- Potencial redox
Estado de redução ou oxidação de elementos
Solo aerado: formas oxidadas (Fe3+, Mn4+, NO3-)
Solo encharcado: formas reduzidas (Fe2+, Mn2+, NH4+)
Potencial redox (Eh) mede a tendência de um elemento doar ou receber
elétrons
Eh de referência é o do H (Eh=0)
Eh do solo depende da presença de agentes oxidantes e pH
Quanto menos oxigênio, menor o Eh do solo
- Fatores que afetam a aeração do solo
Falta de drenagem do excesso de água (baixa quantidade de macroporos)
Taxa de respiração de microrganismos (alta respiração reduz oxigênio)
Heterogeneidade do solo
Diferenças sazonais
Vegetação
- Efeitos ecológicos da aeração do solo
Degrada resíduos (decomposição da M.O.)
Oxida elementos podendo causar toxidez
Produção de metano
4.11 Temperatura do solo
- Processos afetados pela temperatura do solo
Germinação de sementes
Funções radiculares (absorção)
Processos microbianos
Oxidação de NH4 para NO3
Agregação do solo (congelamento, derretimento)
88
- Aumento da temperatura pelo uso do fogo
Aumento breve e superficial
Pode quebrar gibbisita e caulinita
Quebra e muda o movimento de compostos orgânicos que vão para as
camadas mais profundas pelos poros e, ao atingir camadas mais frias,
condensam e precipitam
Compostos podem formar camada hidrofóbica, quando chove a água não
infiltra e favorece a erosão
Afeta a germinação de sementes
5 Bibliografia
NOVAIS, R. F.; ALVAREZ, V. H.; BARROS, N. F.; FONTES, R. L. F.;
CANTARUTTI, R. B.; NEVES, J. C. L. Fertilidade do solo. Viçosa: Sociedade
Brasileira de Ciência do Solo, 2007. 1017 p.
BRADY, N. C. Natureza e propriedades dos solos. 7 ed. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1989. 898 p.
RAIJ, B. van Fertilidade do solo e adubação. São Paulo/Piracicaba: Agronômica
Ceres/Associação Brasileira para Pesquisa da Potassa e do Fosfato, 1991.
343 p.
89
4. MATÉRIA ORGÂNICA DO SOLO
4.1. Introdução
A matéria orgânica do solo (MOS) resulta do acúmulo de resíduos de plantas
e animais. Ela apresenta estado ativo de decomposição que é viabilizada pelos
microrganismos, fazendo com que a MOS apresente caráter transitório e dinâmico.
A MOS apresenta em sua constituição elementos químicos como carbono,
hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo, enxofre (CHONPS), além de outros
elementos considerados nutrientes para as plantas. O carbono e o nitrogênio são os
elementos de maior destaque devido às ligações de compostos de carbono e
síntese proteica. A estrutura da MO morta do solo é composta de C (52 a 58 %) e O
(34 a 35 %), seguido de N e H (3,3 a 7 %). Os elementos S e P ocorrem geralmente
em proporções inferiores a 2 %. A maior parte do C é introduzida ao solo por meio
da fotossíntese (Figura 1) que é a fonte primária de matéria orgânica representada
pela seguinte equação: 6CO2 + 6 H2 energia→6C(H2O) + 6O2.
Figura 1. Representação da entrada do CO2 atmosférico na fitomassa que fará parte
da MOS.
Estima-se que a produção primária total global de C pelo processo de
fotossíntese seja de, aproximadamente, 120 Gt ano-1de C (SILVA E MENDONÇA,
2007). Práticas de manejo que adicionam resíduos vegetais ao solo também
proporcionam aumento nas entradas de C ou redução nas perdas (sistema de
preparo reduzido e remoção reduzida de resíduos), ajudando a manter ou elevar os
níveis de COS (SMITH, 2008).
Os compostos orgânicos podem retornar diretamente ao solo na forma de
resíduos vegetais (restos de culturas, serrapilheira, etc) ou por animais mortos e/ou
seus excrementos. Esse material depositado no solo sofre decomposição a partir da
ação de microrganismos, contribuindo com a disponibilidade de nutrientes.
90
A MOS é representada pelo carbono, mas o solo não apresenta somente
carbono orgânico. O carbono total existente no solo é constituído pela soma entre C
orgânico e C inorgânico, sendo que o C orgânico está associado com a matéria
orgânica e, em grande parte, é proveniente de restos vegetais.
Como o tecido vegetal apresenta aproximadamente 58% de carbono (massa
seca), para fins práticos a porcentagem de MOS é calculada da seguinte forma:
%MOS = %Corgânico x 1,72 (fator de van Bemmelen). Já o carbono inorgânico do
solo é aquele associado à fração mineral, sendo exemplificado pelos carbonatos de
cálcio (CaCO3) e de magnésio (MgCO3).
Apesar de a MOS ocupar no máximo 5% da fase sólida da maior parte dos
solos (Figura 2A), ela é de grande importância, tanto do ponto de vista ambiental
como para garantir a qualidade dos solos de áreas agricultáveis. No aspecto
ambiental, vale ressaltar que as formas de C orgânico do solo apresentam interação
com a biosfera. Isso acontece porque o carbono da atmosfera passa para os
vegetais por meio da fotossíntese e, mediante deposição da fitomassa no solo, esse
carbono passa a constituir a MOS.
Figura 2. Porcentagem de matéria orgânica na fase sólida do solo (A) e quantidade
de carbono na atmosfera, vegetação e no solo (B).
Além da importância de caráter ambiental (sequestro de C), a MOS também é
fundamental para a qualidade dos solos agricultáveis, contribuindo com
propriedades físicas, químicas e biológicas. Caso a MOS tenha sido perdida em
virtude de práticas de manejo inadequadas, sua reposição é de grande importância.
Porém, essa reposição pode ser tecnicamente difícil, além de representar maior
custo para o agricultor.
Para compreender o custo que a reposição da MOS pode representar para o
agricultor, considere o exemplo do manejo afetando a MOS e a sustentabilidade no
semi-árido cearense (Dados provenientes da área visitada na viagem de campo -
Centro de Convivência com o Semiárido – Embrapa Caprinos):
91
Fonte: Maia et al., 2006.
4.2. Compartimentos da Matéria Orgânica
Num sentido bem amplo, a MOS pode ser entendida como a fração que
compreende todos os organismos vivos e seus restos que se encontram no solo,
nos mais variados graus de decomposição. Em algumas situações, até mesmo os
resíduos vegetais na superfície do solo são tidos como componentes da MOS. No
entanto, frequentemente e, em especial no manejo da fertilidade do solo, a MOS é
considerada como sendo a fração não-vivente, representada especialmente pelas
frações orgânicas estabilizadas na forma de substâncias húmicas.
4.2.1. Matéria Orgânica Viva
Corresponde ao material orgânico associado às células de organismos vivos
que se encontra temporariamente imobilizado (dreno), mas que representa potencial
de mineralização (fonte). A matéria orgânica viva raramente ultrapassa 4% do COT
do solo e pode ser subdividida em três compartimentos: raízes (5 a 10%),
macrorganismos ou fauna do solo (15 a 30%) e microrganismos (60 a 80%). Apesar
de representar baixo percentual da matéria orgânica, essa fração é muito importante
no processo de transformação dos componentes orgânicos do solo.
As raízes atuam diretamente como fonte de C orgânico, uma vez que
diferentes espécies vegetais imobilizam temporariamente C em sua biomassa
radicular, retornando-o ao solo por ocasião de sua senescência. Dependendo da
espécie, quantidades grandes de C podem ser adicionadas em profundidade. Em
algumas espécies, as raízes finas (< 2mm de diâmetro) apresentam teores elevados
de compostos orgânicos mais resistentes à degradação. Indiretamente, as raízes
contribuem com a exsudação de uma série de compostos orgânicos, os quais
imediatamente vão constituir, em parte, o compartimento da MOS morta
(substâncias não-húmicas).
92
E, geral, os organismos de menor tamanho encontram-se em maior
quantidade no solo. Os microrganismos são representados, principalmente, pelas
bactérias, fungos, actinomicetos e algas, sendo os vírus componentes
submicroscópicos e os protozoários os componentes da microfauna do solo. A
mesofauna pode ser representada pelas colêmbolas e ácaros; e a macrofauna pelos
anelídeos, térmitas, isópteros e coleópteros.
As funções de destaque da fauna do solo na transformação dos componentes
do material orgânico; mistura dos componentes orgânicos e inorgânicos; formação e
manutenção dos poros do solo; regulação e dispersão da microflora no solo.
Dependendo da forma de alimentação – fitófagos, saprófagos e carnívoros-, os
organismos têm funções diferenciadas. A ação de misturar e deslocar o material
orgânico e mineral do solo da superfície e do subsolo pela fauna é fundamental na
dispersão de nutrientes ao longo do perfil de solo.
A biomassa microbiana (BM) é a principal constituinte da MOS viva. Cerca de
1-3% do COT em solos tropicais está associado a BM. Atua como agente
decompositor e como reserva lábil de C e nutrientes e no fluxo de energia no solo. A
contribuição da microbiota do solo na ciclagem de nutrientes, imobilizados em sua
biomassa, pode ser predita por meio de suas proporções em relação às formas
totais desses nutrientes. O C associado à biomassa microbiana (C-BM) representa
um dos compartimentos da MOS com menor tempo de ciclagem. A BM responde
rapidamente às práticas que levam ao decréscimo ou acréscimo da MOS.
4.2.2. Matéria Orgânica Morta
A matéria orgânica não vivente contribui, em média, com 98% do C em
formas orgânicas (C orgânico) total (COT) do solo, podendo ser subdividida em
matéria leve ou macrorgânica (3- 20%) e húmus. O húmus é um compartimento que
consiste de substâncias húmicas (70%) e não-húmicas (30%). Outro compartimento
que tem recebido atenção mais recentemente é aquele composto por carvão,
originado da queima (natural ou antrópica) de resíduos vegetais.
4.2.2.1. Matéria Orgânica Leve
A matéria macrorgânica, ou matéria orgânica leve (MOL) ou particulada,
dependendo do método de fracionamento, é a fração da matéria orgânica não-
vivente que se encontra em menor proporção, contribuindo com cerca de 3-20% do
COT, composta principalmente por restos vegetais em vários estádios de alteração.
Seu conteúdo está principalmente ligado ao aporte orgânico, pelo aumento e
manutenção dos resíduos orgânicos. Há tendência de aumento dos teores dessa
fração, seja em sistemas que preconizem a diminuição do revolvimento do solo,
como em SPD, seja em espécies em rotação, em condições climáticas menos
favoráveis à decomposição e em sistemas mais produtivos e, ainda, pela adição ao
solo de resíduos que não são produzidos in situ, como compostos orgânicos. Logo,
93
o tipo de solo, a vegetação, o clima e as práticas de manejo adotadas irão afetar a
magnitude desse compartimento.
A MOL é caracterizada, em razão da sua composição química, pela sua alta
disponibilidade aos microrganismos do solo e pela sensibilidade às alterações do
meio. As frações da MOS podem ser determinadas por meio de fracionamento físico
por diferença de densidade. O uso desse fracionamento permite separar frações
orgânicas cuja composição e localização física no solo são diferenciadas. Com o uso
do método densimétrico, são separados os restos vegetais parcialmente
decompostos e de baixa densidade dos compostos orgânicos mais resistentes à
decomposição, sendo utilizadas, para isso, soluções de sais orgânicos e inorgânicos
com densidades compreendidas na faixa de 1,6 a 2,0 kg L-3.
4.2.2.2. Matéria Orgânica Pesada
O húmus é o compartimento que inclui substâncias húmicas e não-húmicas.
Esses dois grupos de compostos encontram-se fortemente associados no ambiente
edáfico e não são totalmente separados pelos processos tradicionais de
fracionamento, sendo difícil definir seus limites.
4.2.2.2.1. Substâncias Não-húmicas
As substâncias não-húmicas podem chegar a contribuir com 10 a 15 % do
COT dos solos minerais. São grupos de compostos orgânicos bem definidos, como
carboidratos, lignina, lipídeos, ácidos orgânicos, polifenóis, ácidos nucléicos,
pigmentos e proteínas. Esses compostos são provenientes da ação e transformação
da matéria orgânica viva sobre o material orgânico que é aportado ao solo, ou,
ainda, adicionado via exsudação das raízes. Os mono e dissacarídeos, dificilmente
encontrados no solo, são rapidamente oxidados e transformados em outros
compostos (principalmente substâncias húmicas) pela microbiota do solo. As
proteínas, os polifenóis solúveis e os núcleos polifenólicos da lignina são grandes
fontes de N e C na forma aromática, respectivamente, para a síntese de substâncias
húmicas. A lignina, por exemplo, é considerada uma das principais precursoras das
substâncias húmicas nas rotas de humificação e sua degradação é realizada, em
sua maior parte, por um grupo específico de organismos: os fungos de podridão
branca.
4.2.2.2.2. Substâncias Húmicas
As substância húmicas contribuem com cerca de 85 a 90 % do COT dos solos
minerais. São constituídas de macromoléculas humidificadas amorfas, variando do
amarelo a castanho. Esse compartimento é o principal componente da MOS,
constituindo a grande reserva orgânica do solo. Essas frações são formadas por
reações secundárias de síntese e têm propriedades distintas dos biopolímeros de
organismos vivos, incluindo a lignina das plantas superiores (Figura 3).
94
Figura 3. Esquema ilustrativo das substâncias húmicas de acordo com
Stevenson, (1994).
Atualmente, não existe um método de extração ideal para as substâncias
húmicas. O método ideal deveria: possibilitar o isolamento do material orgânico na
forma não alterada; permitir a extração dos componentes orgânicos sem
contaminação com outras substâncias inorgânicas, tais como argilas e cátions;
favorecer a extração completa, garantindo, assim, a representatividade do material
extraído em relação a todas as demais frações de diferentes tamanhos, e,
finalmente, ser universalmente aplicável a todos os solos.
Percebe-se, assim, que não existe um esquema ideal de extração, purificação
e fracionamento das substâncias húmicas. A escolha de um ou outro método deve,
preferencialmente, estar calcada nos objetivos de estudo. Deve-se ressaltar em
razão da complexidade da gama de estruturas apresentadas pelas substâncias
húmicas, que o seu fracionamento é puramente operacional e baseia-se na sua
solubilidade em diferentes soluções (Figura 4).
Figura 4. Esquema operacional de fracionamento químico com base na solubilidade
diferencial das frações húmicas em ambiente alcalino ou ácido. Fonte: Silva e
Mendonça (2007).
95
Dentre os vários extratores empregados na extração e fracionamento das
substâncias húmicas, o mais comum tem sido empregado de solução diluída de
NaOH, embora normalmente tenha menor poder de extração, é preferida pela menor
probabilidade de alterar a composição/estrutura das substâncias húmicas (Figura 4).
Assim, as substâncias húmicas podem ser operacionalmente subdivididas
em: frações ácidos fúlvicos (FAF) (solúvel em ácido e base); frações ácidos húmicos
(FAH) (solúvel apenas em base) e fração humina (FH) (não é solúvel em meio ácido
e básico).
Os ácidos fúlvicos são menores que os ácidos húmicos e por isso apresentam
maior mobilidade. Os ácidos fúlvicos também apresentam maior relação O/C que os
ácidos húmicos, o que quer dizer que são mais oxidados que ácidos húmicos. Além
disso, os ácidos fúlvicos apresentam maior CTC, sendo a fração mais importante
para que a MO melhore a fertilidade do solo de regiões tropicais.
4.3. Estabilidade dos Compartimentos da Matéria Orgânica do Solo
A dinâmica e o tamanho dos compartimentos da MOS são influenciados por:
clima (umidade e T º C); composição vegetal (ligninas, polifenóis, relação C/N/P/S)
características do solo (textura, mineralogia, fertilidade, topografia, biota) e manejo.
Quanto aos compartimentos não protegidos (parte viva e lábil), sua
estabilidade é influenciada pela composição dos resíduos. Resíduos com diferente
composição apresentarão taxas de ciclagem diferenciada: numa fase inicial, os
compostos mais lábeis, solúveis em água (aminoácidos livres, ácidos orgânicos,
açucares), são facilmente decompostos pela maioria dos microrganismos (Wolf e
Wagner, 2005). Já a celulose e a hemicelulose, que são de maior complexidade
estrutural, são insolúveis e precisam ser convertidos em unidades de tamanho
menor por meio de sistemas enzimáticos extracelulares especializados para serem
utilizados pela microbiota. Já os compartimentos protegidos (substâncias húmicas)
apresentam mecanismos de estabilização (Figura 5). Tais mecanismos podem ser
de ordem física, química (ou coloidal) e/ou bioquímica.
96
Figura 5. Esquema de compartimentos da matéria orgânica (Adaptado de Duxbury et
al., 1989).
4.3.1. Mecanismos Físicos
As partículas primárias do solo são arranjadas em agregados de modo que a
MOS fica no interior dos agregados. Os agregados atuam promovendo proteção
física da MOS, reduzindo o acesso aos microrganismos e a difusão de O2.
Esse mecanismo de proteção pela agregação do solo permite a proteção não-
seletiva de compostos orgânicos, acarretando estabilização de formas mais lábeis
de C orgânico. O cultivo do solo tem sido um fator limitante à atuação da proteção
física exercida pelos agregados, especialmente aquela relacionada com os
microagregados.
Do mesmo modo, os cátions são importantes na estabilização da MOS, pois
eles servem de ponte entre os compostos orgânicos e as argilas. Sob condições de
solos tropicais ácidos, o cátion que domina o complexo de troca é o Al3+. No entanto,
na maioria dos solos cultivados, as práticas de manejo da fertilidade, especialmente
a calagem, fazem com que o Ca2+ seja o cátion predominante no complexo sortivo.
4.3.2. Mecanismos Químicos
Estabilidade é dada pela associação da MOS com as frações argila e silte,
formando complexos argilo-orgânicos. Vários são os mecanismos de interação da
MOS com as argilas. Stevenson (1994) destaca os seguintes mecanismos de
ligação:
4.3.2.1. Ligação eletrostática
A atração se dá entre cargas opostas; pode ocorrer entre a superfície de
argilas silicatadas carregadas negativamente e grupamentos que apresentam carga
líquida positiva, como os grupamentos amina.
4.3.2.2. Força de van der Waals
Força resultante de flutuação da densidade de carga elétrica dos átomos. É
considerada importante na adsorção de moléculas polares neutras e não-polares.
4.3.2.3. Ponte de hidrogênio e outros cátions
Assim como os outros cátions, o H+ atua como ponte, ligando o grupamento
orgânico à superfície da argila, ambos negativamente carregados. Esse processo é
o muito importante nos solos ácidos onde se verifica grande protonação de
grupamentos reativos, tanto nas argilas como na MOS. A ponte de H2O é de grande
97
importância nos solos, se se considerar que ambos os coloides, orgânicos e
inorgânicos, encontram-se hidratados pela solução do solo na maior parte do tempo.
4.3.2.4. Coordenação
Ocorre uma troca de ligantes. Ânions orgânicos ligados a oxihidróxidos
podem ser trocados por outros ânions, mas grande parte é ligada de forma
específica por meio de troca de ligantes.
4.3.3. Mecanismos Bioquímicos
Estabilidade é atribuída à complexidade química dos compostos orgânicos.
Essa complexidade pode ser inerente ao próprio resíduo vegetal adicionado ao solo
(como por exemplo, alto teor de compostos fenólicos, lignina, taninos, etc.) ou aos
processos de condensação e polimerização que ocorrem durante a decomposição
dos resíduos vegetais (humificação), tornando-o mais resistentes à decomposição.
4.4. Propriedades do Solo Influenciadas pela Matéria Orgânica
Apesar de sua pequena proporção em relação à massa total de solos
minerais tropicais, a MOS desempenha grande influência sobre várias propriedades
físicas, químicas e biológicas do solo e exerce várias funções nos ecossistemas
terrestres. No entanto, é bastante difícil separar qual característica do solo é mais
influenciada pela MOS, visto que há grande interação entre elas. Dessa forma,
muitas das variações das propriedades de determinado solo são mais influenciadas,
não somente pelo efeito direto da quantidade e qualidade da MOS, mas também
pelo produto das interações entre os diversos componentes do sistema.
4.4.1. Propriedades Físicas
4.4.1.1. Agregação
O fenômeno de agregação é resultante da reorganização, floculação e ação
das partículas cimentadas sobre as partículas primárias do solo. Os agregados
protegem fisicamente a MOS por formar uma barreira física aos microrganismos e
suas enzimas aos substratos, por controlar interações entre cadeias alimentares e
por influenciar o “turnover” microbiano.
Com base no esquema proposto por Tisdall & Oades (1982), pressupõe-se
que os agregados maiores sejam formados pela união dos agregados da classe
inferior, seguindo uma ordem hierárquica. Conforme seu tamanho, cada classe será
unida por diferentes agentes cimentantes, de modo que a MOS influencia direta e
indiretamente as diferentes fases de formação de agregados. Os agentes
cimentantes são classificados em três grupos: transientes – principalmente
polissacarídeos; temporários – raízes e hifas fúngicas, e; persistentes – compostos
98
aromáticos recalcitrantes associados com cátions polivalentes e polímeros
fortemente adsorvidos.
Nesse modelo, a matéria orgânica particulada (MOP), hifas fungos e raízes de
plantas podem formar um emaranhado de microagragados. A morte das raízes e as
hifas crescendo dentro e através dos macroagregados produzem agentes ligantes
bioquímicos capazes de estabilizar os macroagregados do solo. Entretanto, essas
frações estão sujeitas à decomposição microbiana; assim, a agregação é um
processso dinâmico no solo, uma vez que a atividade microbiana pode atuar na
produção dos agentes ligantes às partículas, mas também desestabilizar por meio
da decomposição dos mesmos. O aporte continuado de material vegetal é essencial
para que esse balanço seja positivo. Por isso, sistemas que visam a manutenção e
aumento da MOS geralmente estão ligados a uma melhoria da agregação do solo.
A MOS é um agente cimentante que contribui com a formação dos
agregados. Assim, existe relação entre a dinâmica da MO e a agregação do solo.
4.4.1.2. Retenção de água
A MOS pode reter até 20 vezes sua massa em água (Stevenson, 1994) e os
efeitos da MO na retenção de água é mais evidente em solos arenosos. Porém,
parte da água fica retida na estrutura interna da MOS, ou seja, indisponível às
plantas. Por essa razão, a água retida na estrutura ativa e na matéria macrorgânica
é a mais importante para o equilíbrio biológico em regiões secas.
Outro aspecto importante relacionado com a retenção de água pela MOS é
que as substâncias húmicas podem apresentar caráter hidrofóbico ou hidrofílico,
dependendo de sua constituição. Em regiões de clima quente (semiárido) onde se
pratica irrigação e onde há baixo aporte de MO, há favorecimento de decomposição
da matéria orgânica mais ativa. Isso faz com que compostos orgânicos hidrofóbicos
predominem no solo, afetando negativamente a capacidade de retenção de água.
4.4.2. Propriedades Químicas
4.4.2.1. Poder tampão
A MOS tem grande diversidade química devido sua relação com diversos
grupos funcionais, fazendo com que tenha a ação tamponante em ampla faixa de pH
do solo. A redução ou aumento do pH em função dos processos de transformação
da MOS será decorrente da liberação ou consumo de H+.
O aumento do pH pode ocorrer quando: a atividade do H+ é diminuída pela
liberação de cátions; formas orgânicas de N são liberadas pela mineralização e
quando há desnitrificação ou descarboxilação dos ácidos orgânicos. A redução do
pH pode ocorrer quando há liberação de CO2 na decomposição/mineralização da
MO. O CO2 liberado durante o processo forma ácido carbônico e resulta na liberação
de H+.
99
4.4.2.2. Capacidade de Troca de Cátions
Há muito tempo se reconhece a importância da MOS para a CTC dos solos,
contribuindo com 20-90 % da CTC das camadas superficiais de solos minerais e,
praticamente, toda a CTC de solos orgânicos. Em solos tropicais, com cargas
predominantemente variáveis, dependentes do pH, em estádio avançado de
intemperismo, com a fração argila dominada por caulinita e oxidróxidos de Fe e Al, a
contribuição da MOS é maior, principalmente quando em baixos teores de argila. Se
for considerado que grande parte dos sítios de reação da MOS está ocupada por
metais e ligação com os coloides inorgânicos do solo, a contribuição da MOS para a
CTC efetiva é, frequentemente, menor do que a teoricamente possível, quando
comparada com as cargas totais dos grupamentos carboxílicos e fenólicos.
4.4.2.3. Complexação de metais
A presença de vários grupamentos funcionais na MOS possibilita sua reação
com os metais. Os principais sítios de complexação são os grupamentos
carboxílicos e fenólicos. As interações possíveis entre o complexante (esfera
externa, mantendo a camada de hidratação), como as entre os grupamentos
carboxílicos carregados negativamente (dissociados) e um cátion monovalente, ou
interações mais complexas em que ligações de coordenação (esfera interna,
perdendo a camada de hidratação e estabelecendo ligação covalente diretamente
com a superfície do ligante) com os ligantes orgânicos são formadas. Características
do metal, tais como valência e tamanho do raio hidratado, eletronegatividade e
polarizabilidade; características da molécula orgânica, tais como densidade e tipo de
grupamentos reativos, localização dos grupamentos reativos da molécula e tamanho
da molécula, e características da solução, tais como pH, força iônica e temperatura,
terão grande influência sobre influência sobre a ocorrência e predominância de
determinado mecanismo e sua estabilidade.
A complexação ocorre devido aos grupamentos funcionais da MO
(carboxílicos e fenólicos) que interagem com metais, formando ligação eletrostática
ou de coordenação. A complexação é dependente das características dos metais e
da MOS.
As características da MOS que influem na complexação são: densidade; tipos
de grupamentos funcionais predominantes; localização do grupamento reativo e
tamanho da molécula. Já as características dos metais que influem na complexação
são: valência; tamanho do raio de hidratação e eletronegatividade. A ordem
decrescente de habilidade de íons metálicos formarem quelatos é a seguinte: Fe3+>
Al3+ > Cu2+> Ni2+ > Co2+> Zn2+ > Fe2+> Mn2+.
A indisponibilidade de metais pela MOS tem grande importância para o
manejo sob três aspectos:
1) Alguns metais são micronutrientes essenciais ao desenvolvimento das
plantas (Ex.: Cu, Fe, Mn, Zn). Se esses metais forem complexados pela MOS pode
haver indisponibilidade, prejudicando o crescimento das plantas.
100
2) Por outro lado, os metais podem adquirir potencial tóxico se presentes no
solo em quantidades excessivas. Nesse caso, a complexação de metais pela MOS é
favorável, reduzindo a disponibilidade de elementos considerados “poluentes”.
3) A complexação de alumínio pela MOS reduz a toxidez desse elemento às
plantas. No sistema de plantio direto (SPD) essa complexação é muito importante,
tendo em vista o elevado aporte de matéria orgânica que acontece em função do
acúmulo de palha e ausência de revolvimento do solo.
4.4.3. Propriedades Biológicas
4.4.3.1. Reserva Metabólica de Energia
A matéria orgânica mantém o metabolismo energético dos organismos do
solo, atuando como substrato. Essa MO possui diferentes elementos químicos
(CHONPS...), dentre os quais está o carbono que atua como fonte de energia aos
microrganismos.
4.4.3.2. Compartimentos e Decomposição de Nutrientes em Forma
Orgânica
Os nutrientes podem ser estocados (imobilizados) ou liberados
(mineralizados) por processos mediados pelos microrganismos (Figura 6A). A
imobilização é a conversão de elementos na forma inorgânica para a forma orgânica
por meio de microrganismos e plantas, seguida por incorporação na biomassa. Já a
mineralização é a conversão de elementos da forma orgânica para a inorgânica.
A decomposição da MOS é importante para liberação de nutrientes que
constituem as estruturas dos compostos orgânicos. Dependendo das relações entre
quantidade de energia e quantidade de nutrientes (C/N; C/P; C/S), os nutrientes que
resultam da decomposição podem ser imobilizados pelos microrganismos ou
mineralizados e liberados para a solução do solo (Figuras 6B e 7).
Figura 6. Representação esquemática da imobilização e mineralização (A) e
relações C/N que resultam em imobilização ou mineralização (B).
101
4.4.3.3.1. Nitrogênio
Cerca de 95% do N do solo está associado à matéria orgânica. O ciclo do N
envolve a transferência do N2 atmosférico para compostos orgânicos, os quais são
convertidos em N amoniacal, que por sua vez, é transformado em N nítrico e,
finalmente, o N retorna à atmosfera na forma gasosa. As principais reações no solo,
nas quais as formas orgânicas de N estão envolvidas são: (a) fixação biológica do
N2; (b) mineralização ou amonificação do N orgânico a amônio; (c) imobilização ou
assimilação de amônio a N orgânico e, (d) assimilação ou imobilização de nitrato a N
orgânico.
4.4.3.3.2. Fósforo
O ciclo do P é bastante similar ao ciclo de ao ciclo de outros nutrientes, visto
que ele se encontra em minerais e no solo, organismos vivos e água. Pelo fato de
ser muito reativo, o P combina com O2 e, portanto não é encontrado na forma
elementar na natureza. Assim, o P do solo, água e seres vivos encontra-se
associado a quatro O, formando o PO43-. Em solos ácidos, grande parte do
ortofosfato (PO43-) encontra-se fortemente associado aos oxidróxidos de Fe e Al,
enquanto, nos solos alcalinos, os fosfatos de Ca são as formas predominantes.
Dessa forma, as concentrações de íons de ortofosfato na solução do solo são
bastante baixas. Na solução solo, o ortofosfato é encontrado na forma de H2PO4-,
em solos ácidos, e de HPO42-, em solos alcalinos. Essas formas iônicas de P são
absorvidas por plantas e microrganismos. A maior parte desse P é incorporado à
estrutura de compostos orgânicos (Po). As plantas podem ser consumidas por
animais, que retornarão o P ao solo na forma de dejetos orgânicos. No solo, o
ortofosfato será liberado para a solução pelo processo de mineralização do Po
mediada por microrganismos. O Po também poderá ser incorporado em compostos
orgânicos mais estáveis que farão parte da matéria orgânica humificada do solo.
4.4.3.3.3. Enxofre
Em regiões de clima mais seco (árido, semi-árido), as formas inorgânicas
(como o gesso) são o principal compartimento de S no solo, mas nos solos das
regiões úmidas e subúmidas, o S na matéria orgânica geralmente contribui com
mais de 90% do S total. Apesar da importância do S do ponto de vista nutricional e
sua predominância em formas orgânicas em nossos solos, informações relativas à
sua composição e biodisponibilidade são ainda bastante escassas.
A dinâmica do S no solo é ditado por processos de imobilização e
mineralização, ambos mediatos pela atividade microbiana. Embora parte do S
orgânico do solo possa ser derivado diretamente de compostos de plantas e animais
(aminoácidos sulforados, sulfolipídeos, etc), evidências recentes indicam que grande
parte do S orgânico é sintetizado in situ.
102
Na maior parte dos solos, a principal fonte de S para as plantas advém da
mineralização da MOS.
4.4.3.3.4. Relações C/N, C/P e C/S
A mineralização do N, P e S da MOS ocorre simultaneamente com a do C. De
modo geral, haverá mineralização líquida desses nutrientes quando as relações C/N,
C/P e C/S forem, respectivamente, menores que 30, 200 e 300. Isso indica que o
requerimento relativo de N pelos microrganismos é maior que o do P, que, por sua
vez, é maior que o de S, bastando apenas que o resíduo orgânico adicionado ao
solo tenha uma relação C/N>30 para que o processo de imobilização de N
predomine em relação à mineralização deste nutriente. No decorrer de um ano, 55 a
70% do C de todo resíduo vegetal e animal retornado ao solo é liberado na
atmosfera como CO2, porém há diferentes taxas pelas frações que compõem a
MOS. Considerando as formas orgânicas de N, P e S, conclui-se, que durante o
processo de mineralização da matéria orgânica, a taxa de liberação desses
elementos será distinta, fazendo com que os processos de acúmulo e mineralização
de C e N sejam distintos do P e S (Figura 7).
Pode ocorrer competição entre o material orgânico adicionado e a planta
pelos nutrientes da solução do solo. Quando os processos de mineralização
predominam em relação aos de imobilização, a matéria orgânica funcionará como
fonte de nutriente e, consequentemente, aumentará a disponibilidade deste para as
plantas. Do contrário, quando a imobilização prevalece sobre a mineralização, a
matéria orgânica passa a reter o nutriente, diminuindo sua disponibilidade para as
plantas. Esse processo depende de outros fatores, tais como tempo de conversão
da área de vegetação natural para área agrícola, estádio de degradação do solo e
tempo de adoção de sistemas agrícolas com aporte constante de matéria orgânica.
Com a adoção de práticas agrícolas que priorizem o aporte orgânico, tal como
o plantio direto e agroflorestal, espera-se que, nos primeiros anos, quando as taxas
de acúmulo de MOS são altas, a matéria orgânica funcione imobilizando e
competindo pelos nutrientes. Nos anos seguintes, quando os incrementos nos teores
de MOS são muito pequenos ou inexistentes, espera-se que o sistema orgânico
acarrete equilíbrio entre os processos de imobilização e mineralização. Com o
tempo, o aporte dos nutrientes ao solo via deposição de resíduos vegetais da parte
aérea e das raízes será maior que a quantidade de nutrientes imobilizados pela
biomassa microbiana e pelos compartimentos física e quimicamente protegidos da
MOS. Só a partir desse ponto, a MOS expressará, ao máximo, seu potencial de
mineralização de nutrientes. Essa dinâmica das diferentes frações da MOS é
especialmente importante para entender as mudanças na disponibilidade de
nutrientes.
103
Figura 7. Relações C/N; C/P e C/S que resultam em imobilização e mineralização.
4.5. Bibliografia
NOVAIS, R. F.; ALVAREZ, V. H.; BARROS, N. F.; FONTES, R. L. F.;
CANTARUTTI, R. B.; NEVES, J. C. L. Fertilidade do solo. Viçosa: Sociedade
Brasileira de Ciência do Solo, 2007. 1017 p.
104
PARTE V – DINÂMICA DA ESTRUTURA DO SOLO
1 Introdução
A estrutura é um fator chave para as funções que o solo exerce, pois
representa a capacidade de dar suporte à vida das plantas e dos animais e de
moderar a qualidade ambiental com ênfase particular no seqüestro de carbono do
solo (C) e na qualidade da água.
A estabilidade de agregados é usada como indicador da estrutura do solo. A
agregação resulta do rearranjo, da floculação e da cimentação das partículas. O
declínio na estrutura é considerado como forma de degradação do solo e é
freqüentemente relacionado com o uso da terra e com práticas de manejo do solo e
das culturas agrícolas.
A estrutura influencia o movimento e a retenção da água no solo, erosão,
encrostamento superficial, ciclagem de nutrientes, penetração das raízes e
produtividade das culturas. Fenômenos externos tais como o escorrimento
superficial, a poluição das águas superficiais e subterrâneas e as emissões do CO2
são influenciadas pela estrutura do solo.
A redução nas operações de preparo e na fertilização pode diminuir as
emissões do CO2 devido ao menor revolvimento do solo e menor aplicação de
insumos, os quais são dependentes de combustíveis fósseis. A biodiversidade das
espécies é afetada pelas práticas de manejo, de modo que, geralmente, práticas
agrícolas fundamentadas em monocultivos com elevado aporte de insumos
diminuem a biodiversidade, enquanto que práticas alternativas com baixo aporte de
insumos melhoram a biodiversidade.
Com o aumento da população e da urbanização, é importante identificar
métodos para aumentar a produção de alimentos e ao mesmo tempo manter a
qualidade ambiental. Para isso é importante conhecer aspectos referentes à
agregação e a estrutura do solo para que seja possível identificar as formas de
manejo mais adequado.
2 Estrutura do solo
A estrutura do solo se refere ao tamanho, à forma e ao arranjamento entre
sólidos e os espaços vazios, a continuidade dos poros e espaços vazios, sua
capacidade de reter e transmitir fluídos e substâncias orgânicas e inorgânicas e sua
habilidade de suportar o crescimento e o desenvolvimento vigoroso das raízes.
Estrutura do solo favorável e elevada estabilidade de agregados são
importantes para melhorar a fertilidade do solo, a produtividade agrícola, a
porosidade e reduzir a erodibilidade.
105
3 Agregação
Os agregados são partículas secundárias formadas por meio da combinação
de partículas minerais com substâncias orgânicas e inorgânicas. A dinâmica
complexa da agregação é resultado da interação de muitos fatores, incluindo os
ambientais e os ligados ao manejo do solo, além da influência das plantas e das
propriedades do solo, tais como: composição mineral, textura, concentração do
carbono orgânico do solo (COS), processos pedogênicos, atividades microbianas,
íons trocáveis, reservas de nutrientes e disponibilidade de água.
Os agregados ocorrem em uma variedade de tipos e tamanhos. Estes são
freqüentemente agrupados pelo tamanho em macroagregados (>250 μm) e
microagregados (<250 μm). Estes grupos podem ser subdivididos pelo tamanho, e
os grupos de tamanhos diferentes variam nas suas propriedades, tais como agentes
ligantes e distribuição de carbono e nitrogênio.
3.1 Mecanismos da agregação
Existem vários mecanismos de agregação. Os agregados são formados em
estágios nos quais predominam diferentes mecanismos de ligação. Há diferentes
explicações para a formação de agregados no solo:
a) Teoria hierárquica da agregação:
Propõe que os microagregados unem-se para formar macroagregados e as
ligações dentro dos microagregados são mais fortes que as ligações entre
microagregados. Microagregados (<250 μm) são formados por moléculas orgânicas
(MO) unidas à argila (A) e cátions polivalentes (C), formando partículas compostas
(A- C - MO), que se unem entre si para formar os macroagregados [(A-MO-C)x]y.
b) Matéria orgânica particulada
Alternativamente, os macroagregados também podem ser formados em torno
da matéria orgânica particulada (MOP). Com a decomposição da MOP e liberação
de exudados microbianos, os macroagregados tornam-se mais estáveis, diminui a
relação C/N e ocorre a formação interna de microagregados. Os microagregados
formados internamente contêm maiores quantidades do compartimento recalcitrante
do COS. Com a utilização do compartimento mais lábil do COS e redução da
atividade microbiana, a fonte de exudados diminui e os macroagregados perdem sua
estabilidade, eventualmente há quebra e liberação de microagregados mais
estáveis.
c) Teoria concêntrica da agregação
As raízes e hifas liberam compostos orgânicos que agem como susbtâncias
aderentes mantendo as partículas de solo unidas. As partículas podem ser
rearranjadas durante o emaranhamento, enquanto os ciclos de umedecimento e
secagem ajudam a estabilizar os agregados. Microagregados bacterianos formam-
106
se a partir de colônias de bactérias, seus exudados formam cápsulas de
polissacarídeos ao redor da colônia e as partículas de argila são alinhadas e
atraídas pela secagem e contração. A estrutura de argila forma uma camada
protetora na colônia bacteriana inibindo a decomposição do COS interno. A teoria
concêntrica da agregação sugere que as camadas externas são construídas
concentricamente sobre as camadas externas dos agregados, com isso o C das
camadas mais externas é mais novo que o C no interior dos agregados.
A precipitação de óxidos, hidróxidos, fosfatos e de carbonatos melhoram a
agregação. Cátions tais como Si4+, Fe3+, Al3+ e Ca2+ estimulam a precipitação dos
compostos que agem como agentes ligantes de partículas primárias. Cátions
também formam pontes entre a argila e partículas de MOS resultando em
agregação. Os compostos orgânicos dissolvidos (COD) podem complexar com Fe3+
e Al3+ em pH baixo, formando compostos organo-metálicos móveis que podem
precipitar em outra parte no solo. A complexação reduz o acesso microbiano ao
COS e sua mineralização.
É possível que os agregados se formem diretamente de uma combinação de
processos (Figura 1). Macroagregados podem inicialmente formar-se por meio da
acumulação de microagregados ou em torno da MOP ou dos centros bacterianos.
Posteriormente à decomposição ou quebra dos macroagregados formam-se
microagregados. Os microagregados podem ser formados inicialmente pela união
progressiva de argila, MOS e cátions, ou como produtos da reciclagem dos
macroagregados. As partículas primárias podem se acumular nas camadas externas
dos agregados.
Figura 1. Alguns possíveis cenários da agregação ( MO – matéria orgânica, MOP –
matéria orgânica particulada) (Fonte: Bronick & Lal, 2005).
3.2 Dinâmica e reciclagem dos agregados
Partículas Primárias Argila – Cátions -MO
Macroagregados Microagregados
Argila – Partícula -MO Acumulação Concêntrica
Hierárquica
Bactérias ou Centro MOP
107
Os contínuos efeitos interativos dos processos de formação do solo, as
propriedades do solo e os fatores exógenos tais como paisagem e clima
estabelecem o equilíbrio dinâmico na estrutura do solo (Figura 2).
Os agregados podem ser rompidos por uma variedade de mecanismos,
dependendo da natureza dos agentes ligantes. As atividades dos organismos
influenciam o tempo de retenção e a reciclagem do C no solo e estes, por sua vez,
afetam a estabilização, a agregação e a reciclagem do C.
A decomposição da matéria orgânica do solo (MOS) é influenciada pela
atividade dos organismos, pelas propriedades do solo e por fatores ambientais como
temperatura, concentração gasosa, disponibilidade de nutrientes e gradiente de
umidade. A relação C/N é comumente usada como indicador da reciclagem do COS,
embora para as frações de carbono recalcitrante (CR) e inerte (CI), a relação de
lignina/N ou outros compostos mais resistentes de ser mais apropriada.
Organismos
Acessibilidade à decomposição
Cátions
Fatores Exógenos
Perturbações Antropogênicas
Argila
Propriedades do Solo
Processos Pedogenéticos
Matriz do Solo
Estabilização do C
Reciclagem de macroagregado Formação de microagregado
Fonte de C
108
Figura 2. Fatores que afetam a agregação do solo (Fonte: Bronick & Lal, 2005).
O retorno dentro do sistema sugere que a decomposição da MOS é afetada
pela estrutura do solo, por meio da porosidade, das trocas gasosas e da umidade do
solo, bem como pela localização física do C como sua profundidade e a oclusão. A
dinâmica da reciclagem varia espacialmente dentro do solo e dentro dos agregados
individuais, bem como no tempo. A dinâmica do COS pode ser mais lenta no final da
estação de crescimento das plantas, resultando em menores taxas de reciclagem
nos macroagregados. Agentes ligantes como os compostos inorgânicos, argilas de
baixa atividade e agentes ligantes de CR são geralmente resistentes à quebra. A
mobilização e precipitação das substâncias podem promover a dissolução e quebra
dos agregados, bem como a formação de novos agregados.
A ingestão pela fauna do solo pode romper os agregados, embora isto, em
geral, aumente a estabilidade dos agregados. Os agregados também são
suscetíveis ao rompimento por distúrbios físicos tais como, a expansão da argila, o
cultivo e o impacto da chuva.
4 Processos Pedogenéticos e a estrutura do solo
O desenvolvimento estrutural e a agregação do solo ocorrem dentro do
contexto dos processos pedogenéticos naturais e das atividades antropogênicas. O
intemperismo altera os materiais, os quais são translocados no perfil dos solos por
meio da lixiviação, bioperturbação, eluviação e iluviação, resultando em
horizontalização. A matéria orgânica dissolvida dos horizontes eluviais é imobilizada
em horizontes iluviais como o horizonte B. Os materiais precipitados aumentam a
ligação entre agregados no horizonte B.
5 Estrutura do Solo e Crescimento das Plantas
A estrutura do solo afeta o crescimento das plantas influenciando a
distribuição das raízes e a sua habilidade para absorver água e nutrientes. A
estrutura do solo facilita a oxigenação e a infiltração de água e pode melhorar o
armazenamento da água. O aumento na transferência de água pode reduzir a
retenção do fertilizante na matriz do solo e aumentar a eficiência do uso do
fertilizante pelas plantas. Distúrbios na estrutura do solo ocasionados pela
compactação ou cultivo podem resultar em rápida reciclagem de nutrientes,
encrostamento superficial, redução na disponibilidade de água e ar para as raízes.
109
6 Estrutura do Solo Influenciada pelo Clima e Fatores Exógenos
O clima e a posição da paisagem influenciam a estrutura do solo a partir de
fatores como temperatura, precipitação, altitude, gradiente e aspecto do declive. As
propriedades do solo tais como textura, mineralogia, COS e organismos moderam a
influência do clima.
6.1 Clima
O clima afeta a agregação do solo por meio de alterações na temperatura
(congelamento e descongelamento) e no regime hídrico que afetam os ciclos de
umedecimento e secagem que podem reorientar as partículas, possivelmente
resultando em melhoria da agregação e aumento no isolamento do COS dentro dos
agregados.
Mudanças na temperatura e na umidade afetam a atividade biológica e
alteram as taxas de decomposição. Altas temperaturas resultam no aumento da
respiração e da atividade biológica no solo, enquanto que baixas temperaturas
resultam em maior estoque de COS.
A umidade do solo e os ciclos de secagem e umedecimento têm efeitos
variáveis na agregação. Os ciclos de secagem e umedecimento podem romper a
agregação em argilas expansivas. Partículas de argila por ocasião do umedecimento
se expandem e separam-se uma das outras, reduzindo a estabilidade dos
agregados.
Por outro lado, os ciclos de secagem e umedecimento têm influências
positivas nos estágios iniciais de agregação em solos com argilas não expansivas e
nos macroagregados (Figura 3). Durante o umedecimento, as partículas da argila
tendem a dispersar-se formando pontes e camadas quando secam. Isto favorece o
contato entre as partículas e aumenta as ligações das argilas. Os ciclos também
afetam a quantidade de matéria orgânica particulada incorporada dentro dos
agregados e a porosidade, sendo importantes para a agregação nos solos de
regiões áridas, semi-áridas e subúmidas.
A temperatura e o regime hídrico podem ser modificados por práticas de
manejo como irrigação, uso de culturas de cobertura e cobertura morta. O cultivo
convencional aumenta a exposição ao ar, sol e vento. Práticas de manejo moderam
o impacto dos ciclos de secagem e umedecimento. Em experimentos com plantio
direto, os ciclos de secagem e umedecimento são menos intensos devido à proteção
do solo com palha na superfície. A dispersão ou quebra causada pelos ciclos de
secagem e umedecimento pode ser reduzida pelo aumento de substâncias húmicas
no solo.
Ciclos de umedecimento e secagem (quat.)
80
70
60
50
40
30
10
0 0 5 10 15 20 25 30
20
Caulinita, 25% Esmectita, 25% EA
(%)
110
Figura 3. Ciclos de secagem e umedecimento na estabilidade de agregados (EA)
com 0,5 – 1,0 mm de diâmetro com 25% de argila caulinita ou esmectita (Fonte:
Bronick & Lal, 2005).
6.2 Paisagem/topografia
A região geográfica, a altitude, o aspecto e o gradiente do declive influenciam
a vegetação e a erosão. A altitude influencia a taxa de intemperismo nos solos,
tendo efeito indireto na estrutura. O aumento na estabilidade de agregados e na
vegetação permite aumentar a infiltração e, consequentemente a redução da erosão.
Solos declivosos são mais suscetíveis à erosão, particularmente em regiões com
chuvas intensas. A erosão remove preferencialmente as partículas menos densas ou
partículas leves, incluindo a argila e o COS que são os dois agentes primários
ligantes na agregação. A erosão do COS pode também aumentar a taxa de
mineralização.
6.3 Propriedades do Solo
a) Tipos de Solo
A agregação é controlada por diferentes mecanismos nos diferentes tipos de
solos (Quadro 1). A taxa e a estabilidade da agregação geralmente aumentam com
o COS, área superficial da argila e CTC. Em solos com baixa concentração de COS
ou de argila, a agregação pode ser dominada por cátions, enquanto o papel dos
cátions na agregação pode ser mínimo em solos com elevada concentração de COS
ou argila.
Quadro 1. Tipos de solo e fatores de agregação
Ordens de Solo Fatores de agregação Autores
Alfisols (Luvissolos) Matéria orgânica do solo Dalal e Bridges, 1996;
Oades e Waters, 1991
Andisols (Solos
originados de
cinzas vulcânicas
Argila alofana,
argila não cristalina
Torne t al., 1997
Aridisols (Solos de
regiões áridas)
Carbono orgânico solúvel,
carbonatos e minerais de argila
intemperizada
Biox-Fayos et al., 1998;
Boettinger e Southard,
1995
Entisols
(Neossolos)
Matéria orgânica do solo Dalal e Bridges, 1996
Inceptisols
(Cambissolos)
Argila amorfas Dalal e Bridges, 1996
Oxisols
(Latossolos)
Óxidos de Al3+ e Fe3+ Oades e Waters, 1991;
Dalal e Bridge, 1996
Spodosols
(Espodossolos)
hidróxidos de Al não cristalino,
raízes das plantas e rizosfera,
MOS hidrofóbica, complexos
De coninck, 1980
111
organo-metálicos, hidróxidos
metálicos.
Ultisols (Argissolos
distróficos)
MOS Dalal e Bridge, 1996;
Zhang e Horn, 2001
Vertisols
(Vertissolos)
Sesquióxidos não cristalinos,
frações do tamanho de argila
Leinweber et al., 1999
Ligações de cátions
polivalentes, ciclos de
umedecimento e secagem
Dalal e Bridge, 1996
(Fonte: Bronick & Lal, 2005)
b) Textura
A textura do solo tem uma influência significativa na agregação. Em solos
arenosos o COS tem maior influência na estrutura; enquanto que com o aumento do
conteúdo de argila, o tipo da argila é mais importante que a quantidade na
determinação da agregação. A concentração de argila afeta fisicamente a agregação
por meio da expansão e dispersão. O potencial da desagregação pela expansão
induzida é reduzido em níveis baixos de argila. O aumento na concentração de
argila está associado com o aumento na estabilização do COS.
c) Capacidade de Troca de Cátions (CTC)
A CTC é freqüentemente relacionada a agregados estáveis. A agregação é
estimulada pela interação entre cátions polivalentes na qual as forças repulsivas
entre as cargas negativas da argila e/ou o COS são reduzidas. Os agregados
contendo cátions polivalentes (Ca2+, Al3+ e Fe3+) são resistentes à desagregação.
d) pH do solo
Em adição aos efeitos no crescimento das plantas, o pH do solo também
influencia a solubilidade dos íons metálicos, a atividade microbiana e a dispersão da
argila. As cargas negativas das superfícies das partículas de argila aumentam com o
pH, aumentando a repulsão das partículas. Portanto, o controle do pH é importante
em solos com argilas dispersivas. As partículas de argila freqüentemente floculam
em valores altos de pH. Os solos com alto pH e elevada concentração de
carbonatos formam agregados grandes.
O calcário é comumente adicionado ao solo para aumentar o pH e
freqüentemente resulta no aumento da atividade microbiana e na produção das
culturas e contribui para aumentar MOS e indiretamente aumenta a agregação.
e) Porosidade
112
Existe ampla escala de tamanhos de poros entre e dentro dos agregados em
solos bem estruturados. Poros grandes (>30 μm) incluem bioporos, rachaduras e
poros entre agregados. O espaço, o tamanho e a quantidade de poros podem
influenciar o COS e a sua reciclagem. A textura do solo e o COS podem influenciar a
porosidade. Bioporos são importantes para aumentar a difusão de água e gases
influenciando a decomposição. Os poros pequenos podem proteger o COS da
decomposição, limitando o acesso microbiológico pelo controle da difusão de gases
e da disponibilidade de água. A dispersão da argila, o cultivo, a compactação e o
encrostamento podem resultar no descréscimo da porosidade. Em solos expansivos,
a porosidade está relacionada com o conteúdo de água no solo e às características
de expansão e contração. O cultivo causa aumento da porosidade em curto prazo,
mas em longo prazo diminui a agregação.
6.4 Água do Solo
A textura e estrutura do solo influenciam o fluxo, a disponibilidade e o estoque
de água no solo. A agregação e a interconexão de poros aumentam a passagem do
fluxo no solo, podendo resultar no aumento da infiltração e redução do escorrimento
superficial, no movimento mais profundo da água no perfil do solo e no aumento da
lixiviação.
7 Agentes de agregação
7.1 Carbono
A fonte de C, se orgânico ou inorgânico, influencia sua composição e
concentração no solo e, por sua vez, na eficácia da agregação por meio da
associação com cátions e partículas do solo.
a) Carbono inorgânico do solo (CIS)
O CIS existe como minerais primários e secundários. Os carbonatos primários
ou litogênicos originam-se do material da rocha, sendo a fonte para a formação de
carbonatos secundários que são dissolvidos e translocados pela água com ácidos
orgânicos e/ou CO2 do solo e da atmosfera (Figura 4).
Intemperismo de carbonatos Liberação de CO2
Fixação união com CO2
Carbonatos no solo
CO2 no solo e na atmosfera
113
Figura 4. Relação ente carbonatos e CO2 do solo via intemperismo e fixação.
Carbonatos secundários ou pedogenéticos formam-se quando o CO2
dissolvido precipita em carbonatos e bicarbonatos com Ca2+ e Mg2+ de fora do
sistema. Sob condições de baixa umidade ou aumento do pH, os cátions,
bicarbonatos (HCO3−), carbonatos dissolvidos e o CO2 podem reagir com os cátions
disponíveis para formar camadas de carbonatos secundários nas partículas
primárias do solo.
O efeito dos carbonatos na estrutura é moderado pelo COS. O aumento no
COS resulta no aumento da dissolução e reprecipitação de carbonatos no solo. O
COS aumenta a respiração microbiana e o CO2 e é uma fonte de Ca2+ e Mg2+. Em
baixas concentrações de COS, a estabilidade dos macroagregados é melhorada
pelos carbonatos.
Elevadas concentrações de carbonatos melhoram a proteção do COS,
provavelmente devido à redução da mineralização do COS e aumento no Ca2+. Os
organismos influenciam a agregação mediada por carbonatos: a atividade de
minhocas pode alterar a concentração de carbonato, embora os efeitos sejam
inconsistentes e possam depender da espécie da minhoca.
A irrigação e o manejo da fertilidade aumentam o COS e, desse modo
aceleram a formação de carbonatos secundários em solos áridos e semi-áridos por
meio da adição de ácidos carbônicos e orgânicos que podem reagir com os silicatos
do solo para seqüestrar o C.
b) Carbono orgânico do solo (COS)
O COS resulta em regiões de heterogeneidade, conduzindo à formação de
pontos de agregação de modo que o aumento do COS está relacionado com o
aumento da agregação (Figura 5). As propriedades químicas do COS determinam
sua carga e capacidade de complexação, influenciando as taxas de decomposição
que têm efeitos diretos na agregação. O efeito agregador do COS lábil nos
agregados é rápido, mas transiente enquanto que a decomposição lenta do COS
tem efeito mais sutil e duradouro na agregação. O isolamento da fração do C lábil
dentro dos agregados aumenta a estabilidade e durabilidade deste carbono pela
redução de sua decomposição (Figura 5). O aumento na biomassa microbiana está
associado com o aumento da estabilidade dos agregados.
Matéria orgânica particulada (MOP): A MOP compreende partículas
grandes de matéria orgânica (250-2000 μm) que existem como uma MOP livre,
também denominada Fração Leve Livre (FLL) ou como matéria orgânica encrustada
nas partículas do solo, também denominada Fração Leve Oclusa (FLO), que oferece
proteção física à decomposição. A FL no solo é geralmente associada com a argila e
os cátions polivalentes para formar agregados.
114
O aumento do COS e da agregação no sistema de plantio direto podem ser
devido ao aumento na FL/MOP (Six et al., 1999). A MOP/FL pode agir como núcleo
para formação de macroagregados com o material que acumula em seu entorno.
Macroagregados têm grande concentração de MOP/FL de baixa densidade. Dentro
dos macroagregados, a decomposição do carbono leve (CL) da matéria orgânica
oclusa (MOO) pode conduzir ao enriquecimento relativo de carbono recalcitrante
(CR). O rompimento da MOP dentro dos agregados resulta na exposição do CL,
tornando-o disponível para a decomposição microbiana (Figura 6). A MOP pode ser
importante agente na ligação de microagregados para formar macroagregados, pois
a sua decomposição pelos microrganismos produz polissacarídeos extracelulares
que atuam como agentes ligantes.
Figura 5. Carbono orgânico do solo (COS) e diâmetro médio ponderado (DMP)
(Fonte: Bronick & Lal, 2005).
Carboidratos: O papel dos carboidratos na melhoria da estrutura do solo é
variável. Os carboidratos originados a partir das plantas são freqüentemente de
tamanho mais grosseiro e ocorrem na fração da areia, enquanto que os carboidratos
produzidos por atividades microbianas são mais finos e estão nas frações argila e
silte. Os carboidratos formados microbiologicamente tendem a ser mais resistentes à
decomposição. O cultivo reduzido (cultivo conservacionista ou plantio direto), a
adição de esterco e o uso de culturas de cobertura estão associados com o aumento
nas concentrações de carboidratos e melhoria da estrutura do solo.
DMP = 0,0514x + 0.0697 R
2 = 0,6654
DMP (mm)
Concentração de COS (g kg-1
)
3.0
2.5
2.0
1.5
1.0
0.5
0 10 20 30 50 40
0.0
115
Figura 6. Fluxograma da compartimentalização do COS (CI - carbono inerte, CL
fração lábil, CR – carbono recalcitrante) (Fonte: Bronick & Lal, 2005).
Polissacarídeos: São mineralizados rapidamente e atuam como agentes
ligantes transitórios que iniciam uma agregação que pode não ter estabilidade em
longo prazo. Os polissacarídeos adsorvidos fortemente nas superfícies minerais
agem como pontes para unir as partículas do solo. Os polissacarídeos podem
também formar uma substância gelatinosa que age como cola para unir as
partículas em agregados.
Fenóis: As moléculas fenólicas podem complexar com cátions para formar
pontes catiônicas. Os fenóis e os polifénois são precursores de substâncias húmicas
e aumentam a agregação. A baixa agregação nos solos cultivados com soja é
atribuída aos baixos conteúdos fenólicos nos resíduos da cultura. Já a elevada
agregação é freqüentemente associada com plantas ricas em fenóis.
Lignina: A baixa taxa de decomposição da lignina é considerada como um
fator chave nas taxas de retorno do C, melhorando a agregação. A mucilagem e
outros compostos resultantes da decomposição da lignina por fungos contribuem
para agregação do solo.
Lipídios: Os lipídios são freqüentemente abundantes na fração da argila. Em
alguns solos, os lipídios podem melhorar a estabilidade de agregados contra a
dispersão e fragmentação causadas pela entrada repentina de água. Provavelmente
Aporte de C
a
b
CR
CL
CO2 atmosférico
CI
c
Tempo de residência
Decomposição
a – Proteção física b – Proteção química c – Perturbações
a
b
116
isto está relacionado à natureza hidrofóbica dos lipídios e à mineralogia da argila. Os
lipídios exercem papel mais importante na agregação em solos que apresentam
misturas de argila e ilita do que nos solos dominados por caulinita ou esmectitas. Os
cultivos convencionais apresentam maiores quantidades de lipídios extraídos totais
quando comparados com o plantio direto, os quais exibem geralmente maiores
níveis de biodegradabilidade da MOS.
Substâncias húmicas (SH): A recalcitrância das substâncias húmicas é
resultado de sua resistência química e de sua associação com a matriz do solo, a
qual oferece proteção física. Os ácidos húmicos (AHs) podem ser adsorvidos às
partículas de argila pelos cátions polivalentes, formando cobertura eficaz que evita a
dispersão da argila. As SHs podem aumentar a estabilidade dos agregados e reduzir
a dispersão devido aos ciclos de umedecimento e secagem.
Hidrofobicidade: A hidrofobocidade do COS, junto com suas propriedades
de carga e a interação com as partículas do solo, afeta as propriedades físico-
químicas do solo incluindo a estabilidade estrutural. As moléculas hidrofóbicas
causam repelência à água nos agregados do solo e diminuem a sua molhabilidade,
que pode resultar numa maior coesividade, reduzindo a dispersão e as taxas de
decomposição do COS. A estabilidade de agregados a longo prazo pode ser
melhorada pela adição de materiais orgânicos hidrofóbicos tais como os resíduos
orgânicos contendo materiais hidrofóbicos e COS de tipos da planta como Cistus e
Pinus. O plantio direto e as queimadas afetam a hidrofobicidade do solo. Queimadas
com elevadas temperaturas podem resultar na repulsão da água, aumentando a
estabilidade estrutural. Também é preciso lembrar que a hidrofobicidade também
pode prejudicar a infiltração de água, o que aumenta a suscetibilidade à erosão.
7.2 Argila e mineralogia da argila
Os minerais da argila influenciam as propriedades que afetam a agregação:
área superficial, CTC, densidade de cargas, dispersão e expansão, que, por sua
vez, também afetam as taxas de decomposição do COS. A interação da argila, do
COS e dos agregados é afetada pelo pH, CTC, íons (Na+, Ca2+, Mg2+) e todos esses
parâmetros estão relacionados com a quantidade e tipo de argila presente no solo. A
composição mineralógica da argila é modificada com o desenvolvimento
pedogenético do solo. As argilas de baixa atividade, tais como a caulinita e a
haloisita estão freqüentemente presentes em Alfisols, Ultisols e Oxisols, enquanto as
argilas com alta atividade como esmectitas estão presentes nos Vertisols.
As argilas ocorrem como estruturas cristalinas em camadas ou como minerais
não cristalinos com estrutura amorfa. Em alguns solos, a argila não cristalina é um
fator importante para a agregação, como ocorre nos solos vulcânicos onde o COS e
a agregação estão associados com as argilas alofânicas. Os minerais de argila não
cristalinos, tais como a alofana e a imogolita têm elevada área superficial e cargas
variáveis dependente de pH que geralmente aumentam a agregação. As argilas
cristalinas e não expansivas, tais como a caulinita (1:1), tem baixa CTC e área
superficial, o que tende a diminuir a estabilidade de agregados. A caulinita tem uma
boa capacidade de floculação devido às cargas eletrostáticas entre os planos
117
superficiais e COS. Em comparação, a agregação é geralmente maior nas argilas
com alta atividade tais como esmectitas e outras argilas do tipo 2:1, que estão
associadas com a elevada CTC, grande área superficial e elevado conteúdo de
COS.
A dispersividade dos agregados do solo é afetada pela natureza do COS e do
tipo da argila. Os cátions, particularmente Ca2+ e Na+, eletrólitos e pH podem
influenciar a dispersão da argila. Concentrações elevadas de fertilizantes amoniacais
podem conduzir à dispersão da argila. A adição de gesso ao solo reduz a dispersão
da argila devido às mudanças na concentração e composição dos eletrólitos. A CTC,
a área superficial dos minerais de argila e o COS e outras propriedades do solo
interagem para formar ligações intra-partículas que influenciam a dispersão. As
argilas menos reativas, como a caulinita, são menos dispersivas. O COS e algumas
raízes podem aumentar a dispersão de partículas da argila enquanto outras têm
efeito contrário. O COS carregado negativamente pode ser rompido na estrutura dos
agregados possivelmente pela repulsão das cargas negativas dos minerais do solo.
Existem diferenças nas concentrações do COS entre as argilas dispersas e não
dispersas, sugerindo que a decomposição dos resíduos orgânicos pode promover a
dispersão. As argilas menos dispersivas contêm mais materiais alifáticos na
superfície do solo e carboidratos no subsolo. Estes compostos podem agir como
substâncias aderentes para manter as partículas unidas. As argilas facilmente
dispersas contêm maiores concentrações de aminoácidos que podem agir como
dispersantes.
Os solos dominados por minerais de argila com cargas variáveis, tais como
argila 1:1 e óxidos, têm elevada agregação em níveis baixos de COS. Já os solos
que apresentam mineralogia variada da fração argila têm maior agregação em altos
níveis de COS. O tipo de argila também afeta a taxa de decomposição de MOS. A
montmorilonita resulta em rápida decomposição do COS com maior produção de
ácidos fúlvicos de baixo peso molecular. Por outro lado, a caulinita resulta em
decomposição mais lenta e maiores quantidades de C residual e ácidos húmicos.
Baixos valores de pH associados com a clorita podem resultar em baixas taxas de
decomposição, e isto está relacionado ao elevado conteúdo de C associado com
essas argilas.
7.3 Cátions
a) Cálcio e magnésio
Os cátions bivalentes Ca2+ e Mg2+ melhoram a estrutura do solo por meio de
pontes catiônicas com as partículas de argila e COS. Como mencionado
anteriormente, em condições áridas e semi-áridas, Ca2+ e Mg2+ precipitam
carbonatos para forma carbonatos secundários que servem como revestimento e
atuam unindo as partículas primárias do solo. Geralmente, o Ca2+ é mais eficaz do
que Mg2+ em melhorar a estrutura do solo. Entre os cátions bivalentes, o Ca2+ pode
inibir a dispersão da argila e o rompimento dos agregados pela substituição do Na+ e
Mg2+ na argila e nos agregados, aumentando a estabilidade.
118
Em comparação ao Ca2+, o Mg2+ pode ter efeito deletério na estabilidade de
agregados do solo pelo aumento na dispersão da argila. A extensão do efeito
negativo do Mg2+ comparado ao Ca2+ pode depender do tipo da argila e
concentração de eletrólitos no solo. Além disso, o Mg2+ pode proporcionar maior
quebra pela expansão das argilas, resultando na desestruturação dos agregados.
O uso de corretivos do solo contendo Ca2+ e Mg2+, tais como o calcário e o
gesso, pode ter grandes efeitos na agregação, como por exemplo, no caso da
calagem de solos ácidos e a gessagem em solos afetados por sais. A crescente
estabilidade de agregados em solos calcários sugere a formação de uniões fortes
envolvendo pontes de Ca2+.
b) Ferro e alumínio
Os cátions polivalentes de Al3+ e Fe3+ melhoram a estrutura do solo por meio
de pontes catiônicas, formação de compostos organo-metálicos e géis. A
solubilidade e mobilidade desses cátions são dependentes do pH, com alta
solubilidade em pH baixo. Os agregados contendo Al3+, Fe3+ e argilas com elevada
CTC tendem a aumentar a incorporação do COS. A interação do Al3+ e do Fe3+ com
caulinita pode, sinergisticamentem, promover a agregação com impacto limitado no
COS enquanto os óxidos e os hidróxidos de Al3+ interagem sinergisticamente com o
COS e com a argila dispersiva aumentando a estabilidade do agregado. Ambos, o
Al3+ e o Fe3+ controlam a agregação em solos ácidos com baixos conteúdos de
argila e COS, tais como Oxisols. Os íons Fe3+ amorfos e MOS formam finas
partículas estáveis nos solos com elevado conteúdo de COS. Partículas de fração
grosseira são formadas por óxidos de Fe3+ que aumentam a força tensil dos
agregados em Oxisols e aumentam a estabilidade de agregados em outros.
c) Fósforo
Os efeitos do P na agregação do solo são indiretos. Como a disponibilidade
do nutriente afeta o crescimento das raízes e das plântulas, aumenta a produção
das plantas e a cobertura da superfície do solo. A disponibilidade de P também
influencia na colonização de fungos micorrízicos arbusculares (FMA), que afeta a
morfologia das raízes e a agregação. A aplicação de P como fertilizante e ácido
fosfórico pode conduzir à formação de fosfatos de Al3+ ou de Ca2+, que atuam como
agentes agregantes.
d) Sódio
O Na+ é um agente altamente dispersivo que resulta diretamente no
rompimento dos agregados e, indiretamente, afeta a agregação por meio do declínio
da produtividade das plantas. O Na+ trocável na solução do solo e em sítios de troca
contribui para a repulsão das cargas que dispersam as partículas de argila. O
aumento na dispersão pelo Na+ pode quebrar os agregados, promovendo maior
disponibilidade da MOS à decomposição. Práticas de manejo que substituem o Na+
nos sítios de troca de cátion por Ca2+ ajudam a amenizar os elevados conteúdos de
Na+ e seus efeitos adversos. O gesso é usado como corretivo do solo para superar a
119
sodicidade para redução a dispersão, a porcentagem de sódio trocável, (PST) e para
aumento do C microbiano (Cmic).
8 Influência bióticas na agregação
8.1 Plantas
a) Espécies de plantas
Os efeitos combinados da composição bioquímica e da quantidade dos
resíduos das plantas retornados aos solos e os produtos químicos liberados pelas
plantas afetam a taxa e a estabilidade da agregação e a taxa de reciclagem dos
agregados. Os agregados estáveis em água (AEA), o tamanho médio dos
agregados e o diâmetro médio ponderado (DMP) estão correlacionados com a
composição bioquímica dos resíduos das plantas: os fenóis, a lignina, as proteínas,
os açúcares monossacarídeos, os sacarídeos, fenóis e AHS trocáveis alcalinas e os
ácidos fenólicos tais como o ácido vanílico-vanalina dos resíduos.
Os resíduos de milho (Zea mays) têm elevados conteúdos de fenóis e
aumentam a agregação quando comparado com outras culturas. O cultivo contínuo
de milho reduz os microagregados quando comparado com o milho cultivado em
rotação. A estabilidade dos agregados do solo é elevada sob cultivos contínuos de
alfafa (Medicago sativa). A baixa agregação do solo cultivado com soja é atribuída
às baixas concentrações de fenóis e aos baixos retornos dos resíduos ao solo.
b) Raízes
As raízes das plantas e sua rizosfera têm vários efeitos na agregação do solo.
As raízes emaranham e realinham as partículas do solo e liberam exudados, que
resultam nas alterações físicas, químicas e biológicas que influenciam a agregação.
A agregação tende a aumentar com o aumento do comprimento e da
densidade das raízes, associações microbianas e glomalina. A estabilidade dos
agregados é maior na rizosfera do solo que na área não rizosférica devido à
rhizodepocomposição, massa, densidade de raízes e à distribuição de tamanho das
raízes. Essa maior estabilidade de agregados na rizosfera também se deve à
reciclagem, comprimento radicular e crescimento de hifas.
Quimicamente, as raízes melhoram a agregação pela liberação de compostos
que têm efeito cimentante nas partículas do solo. As mucilagens das raízes, como o
ácido poligalacturônico, podem estabilizar os agregados pelo aumento das ligações
e redução da taxa de molhabilidade. As raízes aumentam o ciclo de umedecimento e
secagem do solo adjacente, que pode aumentar a estabilidade de agregados em
alguns casos e reduzir em outros, o que possivelmente está relacionado ao tipo de
argila.
As raízes podem também alterar o balanço iônico e osmótico na rizosfera por
meio da absorção e a rhizodecomposição de nutrientes que podem afetar a
agregação. Diferentes sistemas de raízes afetam diferentemente a agregação
devido às variações quanto às propriedades, exudados e funções diferentes das
raízes. Geralmente, extensivas raízes fibrosas produzem níveis elevados de
macroagregação. As raízes das plantas leguminosas estão associadas com elevada
biomassa microbiana, aumento da agregação e do número de agregados estáveis
120
em água quando comparadas com plantas não leguminosas. A estabilidade de
agregados das plantas não leguminosas está relacionada com a massa das raízes.
8.2 Microrganismos
As raízes, os fungos e as bactérias melhoram a agregação pelo
emaranhamento das partículas do solo, fornecendo compostos extracelulares que
mantém as partículas unidas. É freqüentemente difícil separar os efeitos múltiplos
dos organismos na agregação.
a. Atividade Microbiana
O efeito do tamanho do agregado na atividade microbiana depende de
inúmeros fatores. Em alguns casos, a atividade microbiana pode depender do
tamanho do agregado e em outros não. As bactérias estão freqüentemente
associadas com as argilas e os polissacarídeos nos microagregados, resultando em
menor biomassa microbiana nos microagregados do que nos macroagregados. A
menor relação bactérias/fungos nos macroagregados do que nos microagregados
sugere que a atividade bacteriana pode dominar na microagregação, enquanto que
a atividade fúngica domina na formação do macroagregados. O aumento de
macroagregados está associado com o aumento nas atividades fúngicas e resíduos
frescos.
A atividade microbiana varia com o tamanho do agregado, as estações do
ano, as atividades de cultivo, o manejo, a qualidade e a quantidade de resíduos e
tipo de solo. A influência microbiana é mais pronunciada em solos arenosos onde os
microrganismos do solo produzem fonte de C prontamente disponível para a rápida
estabilização dos agregados. Os tratamentos fungicidas podem reduzir o carboo
microbiano no solo.
a.1) Fungos, fungos micorrízicos arbusculares (FMA) e glomalina
As hifas fungícas melhoram a estabilidade de agregados pela reorientação e
união das partículas com polissacarídeos extracelulares e o emaranhamento das
partículas. As hifas também emaranham microagregados para formar
macroagregados, sugerindo aumento da agregação com a densidade de hifas.
Os FMAs constituem uma das influências bióticas mais importantes na
agregação do solo. Glomalina é uma glicoproteína liberada dos FMA. Está presente
nos solos em elevada concentração e é um fator importante na estabilização dos
agregados, possivelmente devido à sua natureza recalcitrante e à elevada
concentração em alguns solos. Os solos com elevados conteúdos de argilas
expansivas têm maiores conteúdos de glomalina do que os solos que contêm argilas
de baixa atividade. É possível que a natureza hidrofóbica e recalcitrante da molécula
de glomalina pode proteger outros agentes agregantes. Os ciclos de umedecimento
e secagem podem aumentar a polimerização e a hidrofobicidade na glomalina.
8.3 Fauna do solo
121
Vários insetos (completamente desenvolvidos ou não), artrópodes, minhocas,
nematóides e os grandes macrorganismos vivem no solo e exercem influência
importante na sua estrutura. Eles ingerem e eliminam material, realocando-o no solo
e formando orifícios. Estruturas biogênicas formadas pelos organismos do solo tais
como montículos e/ou aglomerações de térmitas (cupins) são freqüentemente
protegidas da mineralização.
Os efeitos destas atividades são variáveis. Os macrorganismos melhoram a
aeração, a porosidade, a infiltração, a estabilidade de agregados, a incorporação da
serrapilheira, aumentam a estabilização de N e C, a reciclagem de C e a redução de
carbonatos e mineralização do N, a disponibilidade de nutrientes e a mobilidade dos
metais. Estes efeitos podem degradar as propriedades do solo pela remoção do
carbono orgânico dissolvido e quebra das ligações entre as partículas durante a
ingestão. A dispersão é freqüentemente compensada durante a nova formação dos
agregados e a ingestão de compostos do carbono recalcitrante (CR).
O solo ingerido sofre muitas alterações, incluindo o realinhamento físico das
partículas de argila e quebra das ligações dentro dos agregados, alterando o acesso
microbiano ao COS. Excrementos, produtos eliminados misturados com o solo, a
reorganização e a biosíntese do COS geralmente resultam no aumento do CR. A
atividade da fauna do solo é importante na formação de complexos organo-minerais
e na agregação.
a) Minhocas
As minhocas aumentam a agregação do solo por meio de mudanças
biológicas e fisico-químicas. Elas exercem consideráveis influências diretas e
indiretas na estrutura e no COS. O impacto das minhocas na agregação varia de
acordo com a espécie, a qualidade da serrapilheira e com material de origem do
solo. Por sua vez, as espécies e a população da minhoca são influenciadas pela
qualidade e pela quantidade do material vegetal.
Algumas minhocas digerem o solo e quebram as ligações, desestabilizando
os agregados. Entretanto, os processos bioquímicos estabilizam os agregados. A
reorganização de partículas do solo e a liberação de enzimas pelas minhocas
influenciam a mineralização, o fluxo de água e as atividades microbianas. As
minhocas aumentam o COS nos coprólitos, e, em menor extensão, nos materiais
depositados nas paredes dos orificios. A atividade das minhocas aumenta os
macroagregados estáveis em água.
b) Térmitas (Cupins)
O efeito dos térmitas no COS e na estrutura do solo varia com as espécies e
solo. Impactos positivos e negativos ou nenhum dos dois têm sido relatados sobre
COS. Em muitos casos, a ingestão do COS e sua transformação durante a digestão
resultam em formas de COS mais estáveis na terminhosfera. A microagregação
induzida pelos térmitas está relacionada com a composição do solo, promovida
pelas concentrações dos gibsita e óxido de Fe nos trópicos. Entretanto, essa
microagregação não ocorre em solos cauliníticos.
122
9 Impactos Ambientais na Estrutura do Solo
9.1 Elevadas concentrações de dióxido de carbono atmosférico e a estrutura
do solo
O efeito total da elevação do CO2 atmosférico na estrutura do solo não é
muito bem compreendido, mas tendo em vista a importância do aumento na emissão
de gases de efeito estufa para a atmosfera, torna-se importante refletir sobre o papel
da estrutura do solo nesse aspecto.
O aumento no CO2 atmosférico pode resultar em aumento da fotossíntese,
seguido de aumento de fotoassimilados nas raízes e nas comunidades microbianas.
Aumentando as taxas fotossintéticas, as plantas tendem a crescer mais,
demandando maiores quantidades de nutrientes.
Em locais onde os solos são pobres em nutrientes (solos de regiões
tropicais), para que as plantas possam sobreviver, a tendência é que sejam
favorecidas as espécies vegetais que apresentem associações simbióticas e que,
por essa razão, conseguem suprir a falta de determinados nutrientes (ex.:
leguminosas que fixam nitrogênio da atmosfera). O prodomínio de espécies que
apresentam alguma associação simbiótica como as leguminosas, pode levar a uma
alteração na composição química dos compostos das plantas. Se tal condição
resultar em MOS com relação C/N baixa, o material orgânico apresentará rápida
decomposição, podendo afetar negativamente a agregação.
Em ambientes com disponibilidade adequada de nutrientes (solos de regiões
temperadas), o aumento no CO2 atmosférico pode resultar em maior taxa
fotossintética e, conseqüentemente, em maior crescimento vegetal. Entretanto, se
não há limitações na disponibilidade de nutrientes, haverá grande desenvolvimento
de diversas espécies vegetais, não só daquelas que apresentem alguma relação de
simbiose. Isso levará ao aumento da MOS com composição química variada e taxa
de decomposição equilibrada, favorecendo a agregação.
Mudanças nas espécies dominantes e alocação de carbono (C) são
mecanismos primários de mudanças no aporte e decomposição do C. As mudanças
nas espécies de planta influenciam a distribuição da população microbiana e os
compostos microbianos envolvidos no desenvolvimento estrutural do solo. A
alocação de fotoassimilados para as raízes e os exudados das raízes tende a
aumentar a MOS e os microrganismos na rizosfera.
Aumentos no carbono microbiano podem ocorrer sob elevada concentração
de CO2 como resposta indireta às mudanças no crescimento da planta. Pode ocorrer
aumento nos fungos micorrízicos arbusculares (FMA) e no comprimento e
longevidade das raízes. Aumento nos níveis do CO2 resulta no aumento de
agregados estáveis em água, glomalina e no comprimento das hifas de FMA em
cultivos de sorgo. O aumento do CO2 atmosférico pode resultar em baixa densidade
de hifas, possivelmente devido à redução da difusão do oxigênio nos solos. Taxas
de decomposição elevadas devido ao aumento da temperatura, umidade e atividade
microbiológica podem ter grande influência na rápida reciclagem da
compartimentalização do COS. Estas influências, compreendendo os resíduos
superficiais e das plantas, mais que as frações mais lentas como raízes e C macro e
123
microbiano, podem resultar na acumulação de MOS e aumento na proporção de
microagregados.
10 Aumentando o compartimento do COS
O tipo de solo, o agente ligante, o manejo e as condições ambientais
interagem na determinação da agregação. Práticas de manejo do solo que
minimizam a pertubação e maximizam o retorno do carbono orgânico otimizam a
produtividade e aumentam o compartimento do COS.
O uso apropriado de corretivos como fertilizantes, calcários, estercos e
compostos, pode aumentar o compartimento do COS e a agregação. Práticas
agrícolas sustentáveis como consórcios, culturas de cobertura e rotações de colheita
também podem aumentar o compartimento do COS. Práticas de manejo que
reduzem as taxas de decomposição e as emissões de CO2 também ajudam o
aumento no armazenamento do COS.
11 Manejo e melhoria na estrutura do solo
11.1 Manejo do solo
Para aumentar a agregação, o manejo do solo deve visar o aumento na
produção primária das plantas e, consequentemente, o aporte de C, a redução das
perturbações e das taxas de perdas de C por processos como a decomposição e a
erosão. Melhorias nas práticas de manejo incluem métodos de cultivo, manejo dos
resíduos, práticas corretivas, manejo da fertilidade do solo e reciclagem de
nutrientes.
a) Cultivo
As operações de cultivo levam à destruição de agregados do solo, além de
causar compactação e perturbar as comunidades de plantas e de animais que
contribuem para a agregação. O cultivo também reduz a MOS, CTC, nutrientes, as
atividades microbianas e da fauna que contribuem para a agregação.
Em comparação com sistemas convencionais de manejo, o plantio direto têm
mais agregados estáveis e COS. O cultivo reduzido pode resultar no aumento de
macroporos e os biocanais que influenciam no movimento e na disponibilidade da
água, aumentando a preocupação sobre a qualidade da água. Por sua vez, há
impacto pela lixiviação e perdas de nutrientes e compostos químicos na drenagem
da água no solo. A intensidade e o tempo de cultivo determinam a extensão do
efeito do cultivo no COS.
b) Cobertura morta e manejo de resíduos
A cobertura morta melhora a estrutura do solo de diferentes formas. A adição
da cobertura morta na superfície do solo reduz a erosão, a evaporação, protege o
solo do impacto das gotas da chuva e aumenta a estabilidade de agregados. A
cobertura morta aumenta a quantidade dos compartimentos do COS, modifica a
temperatura, o regime de umidade e o impacto da fauna no solo. O retorno de
resíduos das plantas ao solo melhora a estrutura e isto está relacionado com a
quantidade e qualidade dos resíduos.
124
c) Esterco
A adição de esterco ao solo melhora a estrutura e o diâmetro médio
ponderado dos agregados, aumentando a macroagregação e a resistência à quebra.
Entretanto, pode reduzir a estabilidade dos agregados do solo contra a dissolução e
às ações dispersivas. O aumento no COS resulta no aumento da atividade biológica
que, por sua vez, resulta no aumento da porosidade e na redução da densidade do
solo.
O aumento na atividade microbiana devido ao aumento no C do solo por
aplicações de esterco resulta no aumento da estabilidade dos agregados. Os solos
com adição de esterco também têm elevada população de minhocas. Os solos sem
esterco geralmente contêm menos COS e biomassa microbiana e são mais densos
do que os solos com esterco. Além disso, seus agregados são mais fortes quando
secos, e fracos quando úmidos. Por outro lado, solos com esterco têm agregados
fortes quando úmidos e fracos quando secos. A diferença entre os solos quando
seco parece estar relacionada à diferença na concentração de argilas dispersivas,
enquanto que a diferença quando úmido está relacionada com a diferença na
quantidade de material ligante orgânico. Micro e macroagregados têm maiores
níveis de carboidratos em solos com esterco do que naqueles que recebem
fertilizantes minerais. O aumento da concentração iônica pode ser uma preocupação
nos solos com adição de esterco, devido ao aumento na susceptibilidade à
dispersão e redução na estabilidade dos agregados. O esterco aumenta as
concentrações de Na+, K+ e Mg2+ . As aplicações de esterco aumentam a dispersão
de macroagregados grandes e afetam também o pH do solo e a disponibilidade de
P.
d) Compostos orgânicos
A adição de compostos orgânicos ao solo melhora a estrutura e reduz a
densidade. A compostagem pode aumentar a macroagregação e a estabilidade de
agregados na rizosfera. As propriedades do solo e as condições ambientais
determinam o impacto dos compostos na agregação, O déficit hídrico pode limitar a
eficácia dos compostos na agregação. Os efeitos da adição dos compostos na
estrutura do solo podem ser de curto prazo, embora esses efeitos sejam geralmente
positivos.
d) Fertilizantes e nutrientes
A complexidade das influências químicas e físicas dos fertilizantes resulta em
efeitos variáveis da fertilização na agregação. Aplicações de fertilizantes geralmente
melhoram a agregação do solo, pois favorecem o crescimento das plantas e a
formação de MOS. Entretanto, sob algumas condições, os fertilizantes podem
também diminuir a concentração do COS, reduzir a agregação e as comunidades
microbianas comparadas a solos com adição de esterco. Ainda assim, o uso de
125
fertilizantes minerais frequentemente melhora a estrutura do solo em comparação a
solos não fertilizados.
O efeito primário do aumento de nutrientes tem melhorado a produtividade
das plantas, o COS e a atividade biológica. O aumento no COS pelo uso de
fertilizantes aumenta a agregação e o diâmetro médio ponderado. O uso de
fertilizantes também aumenta a qualidade e a quantidade de resíduos, mas isto não
necessariamente aumenta o compartimento do COS. As aplicações de fertilizantes
alteram o pH e a concentração eletrolítica no solo, os quais podem ter efeitos
adversos na estrutura. Os efeitos benéficos das aplicações de fertilizantes
geralmente compensam alguns efeitos adversos da fertilização. O aumento nos
resíduos das plantas e o crescimento das raízes aumentam o CL, a atividade
microbiana e o Cmic, que melhoram a estabilidade dos agregados. Aumentos na
disponibilidade de N por aplicação de fertilizantes aumentam a taxa de
decomposição da FL-CL, enquanto estabiliza mais o CI.
Os efeitos físicos e químicos dos fertilizantes estão relacionados ao tipo de
fertilizante e tipo de solo. O uso de fertilizantes fosfatados melhora as ligações de
Al3+ e de Ca2+. O ácido fosfórico promove a agregação do solo através da redução
do pH, da mobilização de Al3+ e da precipitação subseqüente do fosfato de Al e atua
como agente cimentante para formar agregados estáveis. Fertilizantes amoniacais
podem dispersar as argilas, tendo efeito adverso na agregação do solo. O efeito
dispersivo do amônio (NH4+) é temporário e diminui já que a NH4
+ é nitrificada à
NO3−.
e) Manejo das culturas
O cultivo diminui o compartimento do COS microbiano e total e a fauna do
solo, mas aumenta o CO2 metabólico. O manejo para aumentar o COS e a
agregação inclui a fertilização, manejo das pastagens, a conversão do cultivo para
vegetação nativa, incluindo culturas de cobertura, leguminosas e gramíneas, a
inoculação com minhocas e a irrigação.
e1) Rotação das culturas e culturas de cobertura
A dinâmica dos agregados varia entre as diferentes culturas, rotações e
culturas de cobertura. O efeito das diferentes culturas tende a refletir a composição
química dos resíduos vegetais, estrutura e a habilidade radicular para alterar as
propriedades químicas e biológicas do solo. Estes efeitos tendem a ser de curto
prazo sob regimes de cultivos convencionais. Em alguns solos, as rotações podem
não afetar a estabilidade dos agregados. As culturas de cobertura aumentam o
aporte de C no solo, reduzem a erosão, aumentam a CTC, a estabilidade dos
agregados, a infiltração da água e a reciclagem de nutrientes. Os resíduos das
culturas de cobertura podem melhorar a biomassa microbiana, a respiração, a
mineralização de N e alterar a comunidade microbiana.
126
e2) Sistemas agrosilvipastoris
A inclusão de árvores leguminosas em sistemas agrícolas reduz a erosão,
melhora a fertilidade do solo e aumenta a produtividade de outras culturas. Sistemas
agrosilvipastoris influenciam na MOS, que por sua vez influencia a agregação em
comparação aos sistemas convencionais.
12 Conclusões
A estrutura do solo tem papel vital, mas freqüentemente negligenciado na
produção sustentável de alimentos e no bem-estar da sociedade. Uma visão mais
holística do uso e manejo da terra é necessária para lidar com o aumento na
pressão de uso do solo visando produção sustentável de alimento e fibras, enquanto
reduz os impactos ambientais externos adversos das práticas agrícolas.
O impacto na estrutura do solo varia de uma escala global para uma elevada
escala local. Aumentos no seqüestro de C pelos agregados do solo podem reduzir a
concentração de CO2 na atmosfera e estar associado com o aquecimento global.
Melhorias na estrutura do solo aumentam a reciclagem de nutrientes, a
disponibilidade de água e a biodiversidade enquanto reduz a erosão pela água e
vento, melhora a qualidade das águas superficiais e subterrâneas.
Processos e mecanismos envolvidos na agregação do solo são complexos e
possuem mecanismos de reciclagem complicados. A agregação do solo pode ser
melhorada por práticas de manejo que, ao mesmo tempo em que reduzam a taxa de
decomposição do COS, também diminuam as perturbações no agroecossistema,
aumentem a fertilidade do solo, os aportes orgânicos e a cobertura proporcionada
pelas plantas.
A decomposição do COS pode ser reduzida pelo isolamento dos produtos do
C lábil dentro dos agregados e aumento da proteção química pela entrada de
compostos de CR ou a transformação do CL em compostos de CR e CI. A estrutura
do solo pode ser melhorada por meio do uso de culturas e práticas de manejo
culturais que promovam a agregação. Dentre estas práticas, são citados o uso de
culturas com elevado CR e elevada produção de biomassa, retorno dos resíduos
culturais e incorporação de culturas de cobertura.
A agregação também tende a aumentar com o aumento do comprimento e
densidade das raízes; as raízes fibrosas extensivas produzem maiores níveis de
macroagregação. A melhoria da diversidade e da quantidade da flora e da fauna do
solo é importante para melhorar a estrutura do solo. A atividade da fauna do solo é
importante na formação de complexos organo minerais na agregação.
13 Bibliografia
127
BRONICK, C.J. & LAL, R. Soil structure and management: a review. Geoderma,
124:3-22, 2005.
128
PARTE VI – EROSÃO DO SOLO
1 Conceito
Erosão é um processo de desgaste da superfície e/ou arrastamento das
partículas do solo por agentes, tais como: água das chuvas (hídricas), ventos
(eólica), gelo (mudanças de temperatura) ou outro agente geológico, incluindo
processos como o arraste gravitacional.
2 Importância no contexto global
A importância do estudo da erosão do solo advém dos efeitos que os processos
erosivos podem ter no ambiente, principalmente associados à degradação de solos
agrícolas, ao assoreamento de cursos e reservatórios de água e a perda de
produtividade dos solos agrícolas.
Geralmente, a elaboração de políticas públicas visando adoção de práticas
conservacionistas contra a erosão dos solos somente torna-se prioridade quando
aspectos relacionados às perdas financeiras são evidenciados. Algumas literaturas
mostram que os gastos econômicos em função da perda do solo por erosão podem
ser muito elevados. Uri & Lewis (1998) e Pimenta et al. (1993) indicam que, para a
economia americana, os custos decorrentes das perdas de solo por erosão já
ultrapassaram a casa dos 30 bilhões de dólares por ano. Para as condições da
Inglaterra já foram relatados custos na ordem de 90 milhões de libras por ano
(Environment Agency, 2002). Já para a Indonésia, mais precisamente na ilha de
Java, os gastos resultantes das perdas de solo giram em torno de 400 milhões de
dólares ao ano (Magrath & Arens, 1989).
Mas como medir os custos da erosão do solo? Telles et al. (2010) ressaltam que
os custos da erosão do solo podem ser divididos em on-site (direto ou interno –
produtor), consistem nas perdas que ocorrem na propriedade agrícola; e off-site
(indireto ou externo – sociedade), perdas que ocorrem fora da propriedade agrícola
e que atingem toda a sociedade (PIMENTEL et al., 1995; CROSSON, 1995;
MARQUES, 1998).
Telles et al. (2010) citam diferentes autores que destacam os principais danos
representativos dos custos on-site da erosão do solo, tais como: reposição de
nutrientes, produção sacrificada e desvalorização do preço das terras. Com relação
aos custos off-site, são citados: assoreamento, enchentes, tratamento de água,
geração de energia elétrica, reparação do patrimônio público, perdas biológicas,
aquecimento global, calamidade pública, aumento no preço dos alimentos.
Por meio de práticas conservacionistas, que controlem a erosão, estes custos
podem ser minimizados, garantindo a sustentabilidade dos sistemas de produção
(LAL, 2006; MONTGOMERY, 2007). As práticas conservacionistas devem ser
conduzidas visando reduzir a taxa de perda de solo para valores semelhantes aos
que ocorrem em condições naturais. Enquanto as perdas de solos cultivados podem
variar de 45 a 450 t ha-1, as perdas de solo em condições naturais ficam bem abaixo
dos valores anteriormente mencionados (Relevo suave – 0,0045 t ha-1; Relevo
moderado – 0,45 t ha-1). Para que se consiga reduzir as taxas de perda em solos
129
cultivados, é preciso adotar estratégias adequadas de conservação e, para que isso
seja possível, é fundamental entender como funcionam os processos erosivos.
Os fatores que influenciam a erosão são regidos por: energia, resistência e
proteção. A energia geralmente está relacionada aos agentes causadores da
erosão, já a resistência e a proteção dizem respeito às características do solo em
resposta aos agentes erosivos. A erosão apresenta variações no espaço e no
tempo.
2.1 Variação espacial dos processos erosivos
Como o nome já diz, trata-se das variações da erosão no espaço, indicando
em quais locais os processos erosivos ocorrem com maior intensidade. Na busca
por essa percepção, vale destacar a relação entre precipitação (chuvas), cobertura
vegetal e erosão (Figura 1):
Locais com precipitação total abaixo de 450 mm: erosão aumenta com a
precipitação (cobertura vegetal fraca);
Locais com precipitação entre 450 e 650 mm: erosão diminui com a
precipitação (cobertura vegetal suficiente);
Locais com precipitação acima de 1700 mm: erosão aumenta com a
precipitação (vegetação não consegue proteger o solo).
Mas ainda assim, variações podem ocorrer devido a: tipo de solo, relevo e
cobertura.
Figura 1. Relações entre produção de sedimentos e a precipitação média anual
(Walling & Kleo, 1979).
130
Se taxas erosivas são agrupadas em categorias de vegetação natural, terra
cultivada e solo nú, as maiores perdas ocorrem nas condições semiáridas,
semiúmidas e tropical.
Ex.1: Perdas de solo me áreas não cultivadas na África (Roose, 1971).
Savana: 0,15 t ha-1 ano-1;
Savana densa: 0,20 t ha-1 ano-1;
Floresta tropical: 0,03 ha-1 ano-1.
Ex.2: Perdas de solo em áreas preparadas para agricultura
Savana: 8 t ha-1 ano-1;
Savana densa: 26 t ha-1 ano-1;
Floresta tropical: 90 ha-1 ano-1.
Ex.3: Perdas de solo em áreas com solo descoberto
Savana: 20 t ha-1 ano-1;
Savana densa: 30 t ha-1 ano-1;
Floresta tropical: 170 t ha-1 ano-1.
Os exemplos são indicativos de que a remoção da floresta tropical aumenta mais
os riscos de erosão em relação à remoção da savanna (devido ao alto potencial
erosivo das chuvas tropicais).
Estudos recentes têm enfocado mais a vulnerabilidade do semiárido à erosão. Na
região semiárida há um grande problema, pois há necessidade de preservar água e
a ecologia local é vulnerável. Assim, a remoção da vegetação para estabelecer
agricultura no semiárido leva à rápida diminuição na matéria orgânica e à exaustão
dos nutrientes do solo, resultando numa série de outros impactos que aumentam os
riscos de desertificação.
2.2 Variação temporal dos processos erosivos
Como o nome também já diz, trata das variações na erosão ao longo do
tempo, servindo de indicativo a respeito das épocas em que há maior ocorrência de
erosão.
Ao longo de um ano ocorrem muitos eventos chuvosos de pequena
magnitude e poucos eventos de grande magnitude. Por outro lado, considerando um
longo período de tempo, é esperado que a erosão ocorra durante eventos de
moderada freqüência e magnitude.
O fato é que taxas erosivas normalmente seguem um padrão sazonal e isso é
bem ilustrado em locais com estação seca e chuvosa bem definidas (Figura 2).
131
Figura 2. Ciclos sazonais de precipitação, vegetação e erosão (Kirkby, 1980)
Por meio da Figura 2, é possível constatar que o pico de vegetação para proteger
o solo ocorre já no final do período chuvoso. Assim, há maior susceptibilidade à
erosão na fase inicial das chuvas (alta chuva, mas ainda sem vegetação suficiente
para proteger o solo). Há variações sazonais mais complexas, como as que ocorrem
em locais com regime hídrico também mais complexo e em locais em que a terra é
preparada para agricultura. As variações sazonais em longo prazo estão
relacionadas com mudanças na cobertura do solo (floresta/área cultivada).
Com o amento da população mundial, a necessidade de produzir mais alimentos é
uma realidade do mundo atual. Para cumprir a demanda de maior produção de
alimentos, o uso mais intensivo das terras parece inevitável. Nesse sentido, a
expansão da agricultura para terras menos aptas certamente levará ao aumento nas
perdas de solo por erosão, ocasionando risco à segurança alimentar, bem como
tantos outros problemas ligados à erosão.
Nesse contexto, o conhecimento de práticas conservacionistas deve ser voltado
para a resolução de problemas como:
Altas taxas de erosão em terras agrícolas;
Redução anual de 15 a 30% do potencial produtivo dos solos;
132
Dificuldade de recuperar solos degradados pela perda da fertilidade;
Perda anual estimada de 6 milhões de hectares de terras por ano (erosão e
outras formas de degradação).
3 A degradação do solo no nordeste brasileiro
A produção agropecuária da região Nordeste do Brasil experimenta grandes
obstáculos associados a uma complexa sinergia de fatores que concorrem para a
degradação da base de recursos naturais da região e que dificultam, ou até
inviabilizam, produzir bens agrícolas em boa parte dos municípios dos nove estados
que a compõem. Podem-se listar estes fatores da seguinte forma:
a) Elevado nível de concentração fundiária, que é uma das mais desiguais do
mundo. Isto induz uma grande concentração de famílias, quase sempre numerosas,
em pequenos estabelecimentos ou minifúndios, o que conduz a uma super
exploração, representando sobrecarga sobre a base de recursos naturais.
b) Instabilidade climática cuja melhor tradução é a ocorrência sistemática das
secas, o maior problema do Nordeste. Neste item precipitação de chuvas, refere-se
à forma irregular com que as chuvas se distribuem na região, tanto temporal como
espacialmente.
c) Modo de condução das atividades agrícolas na Região. De um lado,
observam-se as práticas dos pequenos produtores explorando a terra
intensivamente até a exaustão da sua fertilidade natural e sem qualquer prática de
reposição dessa fertilidade. A principal preocupação desses produtores é com a
sobrevivência não tendo acesso às técnicas conservacionistas de uso do solo. Por
outro lado, observa-se o uso intensivo de máquinas e implementos e agroquímicos
em geral. O uso intensivo conduz à compactação do solo, à eliminação da cobertura
vegetal natural, à perda da camada superficial do solo, juntamente com a matéria
orgânica. Assim, a superfície fica exposta, tanto à ação dos raios solares, como
também à ação das chuvas. Estes dois fatores, associados aos ventos, provocam a
erosão dos solos.
d) Eliminação da cobertura vegetal natural, tanto nos pequenos
estabelecimentos quanto nos grandes. Ademais, esta vegetação ainda é utilizada
como uma das principais fontes de energia na região, tanto na forma de lenha
quanto na forma de carvão vegetal. Vale ressaltar que esta fonte de energia
(derivada da cobertura vegetal) ainda é largamente utilizada nos domicílios,
sobretudo das zonas rurais, para o cozimento de alimentos, e também por indústrias
de diferentes portes instaladas no interior do Nordeste.
4 Tipos de erosão
Erosão geológica: é um processo construtivo, não influenciado pelo homem,
onde as taxas de formação superam as de remoção do solo. É reconhecível
somente com o decorrer de longos períodos de atividade. Este processo possibilita a
formação dos contornos naturais do relevo na crosta terrestre, formando os vales,
montanhas, planícies, planaltos, deltas, etc. Exemplos: Chapada da Ibiapaba, o
Maciço Residual de Baturité e os Tabuleiros Costeiros.
133
Erosão acelerada: processo rápido e destrutivo e iniciado pelo próprio
homem, no qual as taxas de remoção superam as taxas de formação ou gênese dos
solos. Quase todas as operações agrícolas são intensificadoras do processo
erosivo. Exemplos: A retirada da cobertura vegetal expõe a superfície do solo e
propicia condições para que os ventos e água atuem de forma mais direta pela não
absorção dos impactos das gotas de chuva, eliminação de obstáculos à
movimentação dos ventos e favorecimento do escoamento superficial formando
enxurradas, acentuando ainda mais o processo erosivo. O cultivo do solo contribui
ainda mais por desagregá-lo, favorecendo a individualização das partículas ou a
diminuição do tamanho dos agregados, facilitando, a movimentação destes pelos
ventos e água (Figuras 3 e 4).
5 Agentes de erosão
Os agentes erosivos atuam geralmente de forma conjunta, podendo, ou não
serem intensificados pelo homem. Os principais são:
Água: provavelmente é o principal agente erosivo, atuando por meio das
chuvas, enxurradas, ondas e os próprios cursos d´água.
Ventos: a ação dos ventos ocorre pela abrasão de partículas de rochas e
solo em suspensão. Mais comum no litoral e em regiões de desertificação.
Mudanças de temperatura: quando considerado como agente de erosão
geológica é perceptível somente quando se considera longo período de tempo,
como por exemplo, as fraturas geradas nas rochas. Estas fraturas tendem a ser
superficiais nas variações de temperatura entre o dia e a noite, enquanto são mais
profundas quando originadas das alternâncias entre o verão e o inverno.
Biológico: ação de organismos vivos tais como liquens e musgos sobre as
rochas, os quais podem proporcionar condições para que outros agentes erosivos
como a água e os ventos atuem.
6 Fases do processo erosivo
São definidas três fases para o processo erosivo:
Desagregação: O umedecimento dos agregados durante as chuvas ameniza
as forças de coesão entre as partículas do solo, tornando os agregados mais
susceptíveis a fragmentação com o impacto continuado das gotas de chuva.
Contribuem também nesta fase as enxurradas formadas pelo escorrimento
superficial.
Transporte: as partículas de solo desagregadas pelas gotas poderão ser
transportadas pelo salpique, ou seja, junto com as gotículas de chuvas subdivididas
134
e que se deslocam com o impacto das primeiras gotas. As enxurradas formadas
pelo escorrimento superficial são outro meio de transporte.
Deposição: Após diminuir ou cessar a velocidade e turbulência da enxurrada
e encerradas as chuvas, as partículas de solo são então depositadas nas porções
mais rebaixadas do relevo. Este processo pode ocasionar o assoreamento de cursos
d’água ou reservatórios.
7 Tipos de erosão em função dos agentes causadores
Erosão hídrica: A erosão hídrica é causada por forças ativas, tais como as
chuvas, a declividade e comprimento do declive do terreno e a capacidade que o
solo tem de absorver água, e por forças passivas, como a resistência do solo à ação
erosiva e a densidade da cobertura vegetal.
A água da chuva exerce sua ação erosiva sobre o solo pelo impacto das
gotas, que caem com velocidade e energia variáveis, dependendo do seu diâmetro,
e pelo escorrimento da enxurrada.
O volume e a velocidade da enxurrada variam com a chuva, com a
declividade e o comprimento do declive do terreno e com a capacidade do solo em
absorver mais ou menos água,
A resistência que o solo oferece à ação erosiva da água está determinada por
diversas de suas características e/ou propriedades físicas e químicas, e pela
natureza e quantidade do seu revestimento vegetal.
Erosão eólica: Normalmente mais associada a regiões planas, de poucas
chuvas, onde a vegetação natural não proporciona cobertura efetiva da superfície e
sujeita a ventos constantes.
Os principais fatores que afetam a erosão eólica são:
Clima: precipitação, vento, temperatura, umidade, viscosidade e densidade
do ar;
Solo: textura, estrutura, densidade das partículas, matéria orgânica, umidade
e a rugosidade da superfície; e
Vegetação: altura e densidade da cobertura vegetal.
Os problemas mais sérios ocasionados pela erosão eólica são as mudanças
na textura, nas condições físicas e na fertilidade. As partículas mais finas são
carreadas, permanecendo as mais grosseiras e normalmente menos produtivas,
uma vez que esta separação remove os materiais mais importantes do ponto de
vista de produtividade e retenção de água, como também deixa o material mais
arenoso, ficando, assim, o solo mais erodível que o original. Com a continuação do
processo, o crescimento de plantas fica mais restrito, e a erodibilidade do solo
aumenta.
8 Formas de erosão hídrica
135
As formas de erosão mais comuns relatadas na literatura são a laminar, em
sulcos e voçorocas, todas definidas a partir da progressiva concentração de
enxurrada na superfície.
Outras formas devem ser comentadas, tidas como especializadas, uma vez
que ocorrem associadas a estas, como por exemplo, a erosão por salpicamento ou o
efeito do impacto da gota de chuva, na verdade o primeiro e mais importante estádio
do processo de erosão.
Erosão pelo impacto das gotas de chuva: É o primeiro passo no processo
de erosão, pois as gotas destroem agregados, reduzindo-os a tamanhos menores,
bem como contribuem para o processo de redução da velocidade de infiltração de
água no perfil, favorecendo desta forma a formação de enxurradas.
Erosão laminar: É o tipo de erosão em que finas camadas de solo são
removidas em toda uma área, sendo a menos notada visualmente. Pode ser
percebida a partir da exposição de raízes de plantas perenes.
Erosão em sulcos: É uma forma de erosão resultante da concentração da
enxurrada em alguns pontos do terreno, atingindo volume e velocidades suficientes
para formar sulcos mais ou menos profundos.
Na sua fase inicial, os sulcos podem ser desfeitos com as operações normais
de preparo do solo, porém em estádio mais avançado, podem atingir profundidades
que interrompem o trabalho de máquinas.
Figura 3. Erosão em sulco em vários graus de severidade.
Erosão em voçorocas: É uma forma espetacular de erosão, ocasionada por
grandes concentrações de enxurrada que passam, ano após ano, no mesmo sulco,
o qual vai se ampliando pelo deslocamento de grandes massas de solo, formando
grandes cavidades em extensão e profundidade.
136
Figura 4. Voçorocas em Morro de Ferro - MG
Deslocamentos e escorregamentos de massas de solo: Ocasionados, às
vezes, por cortes feitos nas bases dos morros bastante inclinados. Exemplos podem
ser dados pelas quedas de barreiras, muito comuns no domínio pedobioclimático
dos Mares de Morros.
Erosão em pedestal: Ocorre quando um solo de grande susceptibilidade à
erosão encontra-se protegido da ação de salpicamento por uma pedra ou raízes de
árvores, ou seja, material mais resistente a erosão. A erosão na vizinhança é
principalmente por salpicamento, não havendo ação da enxurrada, evidente pelo
não desgaste da base dos pedestais.
Erosão em pináculo: Caracterizada por deixar altos pináculos no fundo e
nos lados das voçorocas, está geralmente associada a condições altamente
erosionáveis de alguns solos. É um tipo de erosão sempre associado a sulcos
verticais profundos nas voçorocas (Figura 4).
Erosão em túnel: Ocorre em solos sujeitos a erosão em pináculos, formando
túneis contínuos ou canais subterrâneos. Ocorrem quando a água de superfície se
movimenta dentro do solo até encontrar uma camada menos permeável, arrastando
partículas mais finas da camada mais porosa.
9 Limites aceitáveis de erosão
A erosão geológica é um processo natural sendo qualitativa e
quantitativamente aceitável. Porém, o que pode ser normal quando se considera o
homem intervindo nos agroecossistemas, visando a produção sustentável de
alimentos?
O limite a ser considerado deve ser a não existência de processos erosivos,
pois se entende que os sistemas agrícolas sejam tecnicamente conduzidos,
137
permitindo a estabilidade física, química e biológica do solo, viabilizando a produção
agrícola perpétua de alimentos.
Alguns autores estabelecem a possibilidade de aceitar a erosão em níveis
que não ultrapassem a taxa de formação de solos. Entretanto, isso pode ser
questionável, pois a taxa pode não ser precisamente medida para as diferentes
classes de solo.
Estimativas gerais consideram a necessidade de 300 a 1.000 anos para a
formação de 25 mm de solo, sendo esta estimativa reduzida para 100 anos quando
se considera o revolvimento do solo pelo cultivo. Nos Estados Unidos adota-se como
limite superior de perda de solo tolerável o valor de 11,2 t ha ano-1, equivalente a
uma taxa de formação de 25 mm em 30 anos (0,83 mm ano-1).
Contudo, estes limites podem ser mais restritivos quando se consideram os
resultados obtidos por Galindo & Margolis (1989) para solos no estado de
Pernambuco. Utilizando duas metodologias diferentes, estes autores encontraram
valores variáveis entre 0,98 a 0,09 mm. ano-1, respectivamente para um Latossolo
Vermelho-Amarelo textura argilosa e Luvissolo Vértico textura média/argilosa (Bruno
não Cálcico).
Estes números evidenciam que os limites podem ser bastante restritivos, o
que leva a necessidade de desenvolvimento real de sistemas que sejam
eficientemente conservadores, sobretudo para solos da condição semi-árida.
10 Estimativas da quantidade de erosão
As primeiras estimativas numéricas da quantidade de erosão nas décadas de
20 e 30 não consideravam a definição e avaliação das causas e efeitos de um
fenômeno natural. Este também é o caso da Equação Universal de Perda de Solo
(EUPS), desenvolvida pelo Departamento de Agricultura dos EUA nos anos 60.
Nesta época iniciaram-se os trabalhos que procuravam entender o processo erosivo,
tentando entendê-lo e reproduzi-lo física e matematicamente. Uma grande
quantidade de dados foi produzida com a aplicação e desenvolvimento dos modelos
empíricos, dando condições para o desenvolvimento destes modelos.
Contudo, os princípios qualitativos fundamentais para a estimativa da perda
de solo consideram que a causa fundamental da erosão do solo é a atuação da
chuva sobre a superfície do solo. Este fenômeno pode ser dividido em como a
erosão do solo irá ser afetada pelos diferentes tipos de chuva e como variará com as
diferentes condições de solo.
A quantidade de erosão depende da combinação do poder da chuva em
causar erosão e da habilidade do solo em resistir aos efeitos da chuva. Em termos
matemáticos, a erosão é função da erosividade das chuvas e da erodibilidade do
solo.
Erosividade pode ser definida como a habilidade potencial da chuva em
provocar erosão. Para uma dada condição de solo, uma chuva pode ser comparada
com outra quantitativamente, permitindo o estabelecimento de uma escala numérica
de erosividade.
138
A susceptibilidade do solo ao processo erosivo define a erodibilidade do solo,
podendo ser atribuída a três fatores básicos. O primeiro diz respeito às
características mecânicas, químicas e físicas do solo as quais podem ser medidas
em laboratório. O segundo está relacionado com a topografia, especialmente a
declividade do terreno. Por último, a erodibilidade vai ser dependente do tratamento
que está sendo dado ao solo e ao manejo das plantas sobre o mesmo, compondo,
desta forma, dois outros componentes deste fator: a cultura (tipo, fertilização,
produtividade esperada etc) e o tratamento dado ao solo (o uso ou não de práticas
conservacionistas, tipo de preparo do solo, intensidade de cultivo etc.).
Sendo assim, pode-se estabelecer que a erosão do solo é função da
erosividade das chuvas, envolvendo a energia de todos componentes da chuva
(gotas e enxurradas) e da erodibilidade do solo. A erodibilidade do solo, por sua vez,
pode ser decomposta em componentes associados às características e/ou
propriedades do solo que o tornam mais ou menos susceptível a erosão, bem como
componentes relacionados ao manejo da superfície do solo, minimizando os efeitos
dos grandes comprimentos de rampa e elevadas declividades, e também, das
condições em que a cultura está sendo conduzida, estabelecendo maiores ou
menores perdas de solo pela cobertura proporcionada à superfície do solo.
11 Tamanho e distribuição das gotas de chuva
Os primeiros experimentos de determinação do tamanho das gotas de chuva
foram feitos em 1892. Gotas de chuva foram coletadas utilizando-se placas de
ardósia divididas em quadrados, sendo o tamanho das gotas obtido através do
tamanho do salpico (impacto) das gotas de chuva.
Outra técnica para este tipo de determinação é o uso de papel absorvente
juntamente com algum tipo de pó sobre a sua superfície, de tal forma que, após o
impacto, ter-se-ia a marca circular característica daquele tamanho de gota, medida
pelo seu diâmetro. O tamanho das gotas de chuva seria obtido pela relação com o
diâmetro da mancha no papel associado a contrastes de calibração para o papel
absorvente obtidas em laboratório. Esta metodologia atualmente é facilitada pelo uso
de scanners e programas computadorizados de determinação de área ou forma.
Uma técnica muito popular é o método de pelets de flocos. Gotas de chuva
são coletadas em bandejas contendo farinha de trigo. Cada gota de chuva forma um
pequeno glóbulo de farinha umedecido que, após secagem, pode ser separado do
restante. Experimentos prévios de laboratório podem estabelecer uma relação entre
o tamanho do glóbulo e da gota de chuva. Outras formas de avaliação do tamanho
de gotas de chuva podem ser utilizadas e estão associados também ao momento e
a energia cinética das chuvas: sensores acústicos, sensores de medida de pressão,
etc.
A variação dos tamanhos de gotas tem sido medida em vários países
utilizando os métodos comentados, sendo identificado 5 mm como o limite superior.
Experimentos em túnel de ventos indicam diâmetro de gotas estáveis em torno de
4,6 mm, sendo instáveis acima de 5,4 mm de diâmetro, podendo desintegrar ou não
neste intervalo, dependendo da turbulência. Fotografias em alta velocidade mostram
139
que a forma das gotas tende a uma esfera achatada em função da resistência do ar.
Experimentos de campo confirmam os diâmetros máximos referidos anteriormente.
Normalmente não se encontram gotas maiores que 5 ou 6 mm, a não ser que em
condições de colisão, quando podem ser formadas gotas de maior diâmetro.
As proporções de tamanhos de gotas e como se distribuem variam com as
diferentes chuvas. A observação direta evidencia que chuvas de baixa intensidade e
que podem durar dias são formadas por gotas de pequeno diâmetro, enquanto que
em chuvas de alta intensidade, as gotas são de diâmetros muito maiores.
Estudos têm mostrado que há uma relação entre o diâmetro de gotas de
chuva (pelo menos 50% delas) e intensidade. Com esta relação não há dúvidas de
que aumentando a intensidade das chuvas há um correspondente aumento do
tamanho das gotas, diminuindo também o tamanho quando a intensidade das
chuvas reduz (Figura 5). No entanto, sabe-se que existe um limite físico para o
tamanho máximo de gotas, havendo uma reversão nesta relação em chuvas de
muito altas intensidades. Curvas de distribuição de tamanhos de gotas para
intensidades crescentes mostram claramente que o valor máximo do diâmetro de
gota chega ao máximo até 80 a 100 mm de chuva por hora, decrescendo a
intensidades maiores (Figuras 6 e 7).
Figura 5. Distribuição do tamanho de gotas em baixas e médias intensidades de
chuvas (Fonte: Hudson, 1995).
Figura 6. Distribuição do tamanho de gotas em altas intensidades de chuva
140
(Fonte: Hudson, 1995).
12 Velocidade terminal
Um corpo em queda livre irá acelerar até que a resistência do ar seja igual à
força da gravidade, continuando em queda a uma dada velocidade constante. Esta
velocidade é conhecida como velocidade terminal e vai depender do tamanho e da
forma deste corpo. A velocidade terminal das gotas de chuva aumenta com o
aumento do tamanho. Gotas em torno de 5 mm de diâmetro apresentam uma
velocidade terminal de 9 metros por segundo (Figura 7).
Figura 7. Velocidade terminal de gotas de chuva (Fonte: Hudson, 1995).
Muitas medidas da velocidade terminal foram feitas em laboratório no início
do século, obtendo-se valores semelhantes, considerando o aparato utilizado.
Medidas posteriores, utilizando equipamentos mais modernos, obtiveram valores de
velocidade terminal 15% superiores quando comparadas às medidas do início do
século. A metodologia de determinação da velocidade terminal envolve a detecção
dos pulsos elétricos gerados quando as gotas d´água passam por anéis de indução
em função da carga elétrica presente nesta. Quando a chuva é acompanhada por
ventos, o componente resultante pode ser maior que a velocidade terminal. O efeito
irá ser maior sobre gotas de pequeno diâmetro caindo vagarosamente do que em
grandes gotas com alta velocidade.
141
13 Momentum e energia cinética
Há evidências experimentais de que o poder erosivo das chuvas está
relacionado à parâmetros compostos derivados de combinações de mais de uma
propriedade física. A energia cinética das chuvas e o seu momentum são exemplos.
Se o tamanho das gotas e sua velocidade terminal são conhecidos, então é possível
calcular o momentum da chuva caindo ou sua energia cinética pela soma dos
valores individuais para cada gota d´água.
Alguns estudos indicam que a taxa de destacamento de partículas de solo
está muito mais associada ao momentum que à energia. Entretanto, tem sido visto
que para chuvas naturais, as relações entre intensidade e momentum ou energia
são similares.
O cálculo indireto da energia das chuvas proporcionou melhores resultados
do que tentativas de medida direta do momentum das chuvas, pois as forças
envolvidas são tão pequenas que alguns instrumentos não são suficientemente
sensíveis para se fazer o registro da energia das chuvas diretamente.
Sensores acústicos (ruído das chuvas obtido por em microfone e
transformado em um sinal que pode ser medido) e piezoelétricos (mudanças de
pressão sobre um cristal de quartzo gerando um sinal elétrico) e transdutores de
pressão (registro da pressão do impacto das gotas d´água sobre um meio elástico)
são algumas das metodologias mais recentes para aplicação nestes casos, todos
com vantagens e desvantagens.
Alguns dos primeiros resultados obtidos e conduzidos em vários países são
mostrados na Figura 8. Entretanto, estes resultados apresentam poucas medidas
em altas intensidades e que também foram feitas por diferentes pesquisadores, não
podendo ser identificado se as variações observadas são devidos às diferentes
técnicas e qual a real diferença entre as chuvas nos vários países. Resultados de
alguns destes estudos são apresentados na forma de equações matemáticas
relacionadas basicamente à intensidade de chuva e energia cinética. Pesquisas
sobre esta matéria estão sendo estimuladas pelo conhecimento que se tem da forte
relação entre energia ou momentum e o poder de provocar erosão.
Equações relacionando energia cinética e intensidade de chuvas:
E = 916 + 331 log I, sendo E= energia das chuvas em pé.ton. acre-
1.polegadas e I = intensidade de chuva em pol.h-1;
E= 210 + 89 log I, sendo E= energia das chuvas em ton.m. ha-1.cm-1 e I =
intensidade de chuva em cm. h-1;
E= 11,9 + 8,7 log I, sendo E = energia das chuvas em J.m-2.mm-1 e I =
intensidade de chuva em mm.h-1 ;
E = 29,22 (1-0,894e-0,004771), sendo E = energia das chuvas em J.m-2 .mm-1 e I
= intensidade de chuva em mm.h-1 ;
142
E = 30-125/I, sendo E = energia das chuvas em J.m-2.mm e I = intensidade de
chuva em mm.h-1 ;
E = 9,81 + 11,25 log I, sendo E = energia das chuvas em J.m-2 .mm-1 e I =
intensidade de chuva em mm.h-1 ;
Figura 8. Relação entre energia cinética e intensidade em diferentes países.
14 Impacto da gota d’água e o escoamento superficial
A erosão do solo é um processo de trabalho e envolve o gasto de energia em
todas as fases da erosão pelas chuvas, tais como a quebra e o salpicamento de
agregados no ar, o aumento da turbulência das enxurradas e no transporte e
carreamento de partículas de solo.
O impacto das gotas de água é vital para o processo erosivo e sua
importância pode ser confirmada por meio da comparação da energia cinética
disponível em uma chuva caindo e a existente nas enxurradas (Quadro 1). Observa-
se que as quantidades de energia envolvidas em um e outro são muito grandes,
sendo que a energia das chuvas é cerca de 256 vezes maior que a energia
envolvida no escoamento superficial.
Na prática, os efeitos do impacto das gotas d’água foram facilmente
demonstrados no passado. Foram utilizadas parcelas (1,5 m x 27,5 m), sendo uma
com a superfície do solo recoberta a certa altura por tela plástica com pequeno
diâmetro de abertura, o suficiente para subdividir as gotas d’água em outras
menores, atenuando a velocidade de queda, enquanto a outra parcela não foi
coberta. Observou-se que a perda de solo na parcela coberta não foi eliminada, mas
reduzida a 1/100 da perda de solo observada na parcela desprotegida.
Quadro 1. Energia cinética (EC = (½ x m x (V)2)) das chuvas e o escoamento
superficial
Variáveis Chuvas Escoamento superficial
Massa Massa da chuva caindo = R Massa do escoamento
superficial = R/4
Velocidade Velocidade terminal = 8m/s Velocidade do
143
escoamento na superfície
= 1 m.s-1
Energia cinética ½ x R x (8)2 = 32R ½ x R/8 x (1)2 = R/8
O selamento da superfície do solo é outra conseqüência do impacto da gota
d’água, reduzindo a velocidade de infiltração no solo, o que favorece o aumento do
escoamento superficial. O aumento da turbulência nas enxurradas formadas pelo
escoamento superficial, aumenta bastante capacidade de destacamento e
carreamento de partículas do solo.
15 Estimativa da erosividade das chuvas
Vários estudos foram desenvolvidos no mundo buscando identificar a melhor
associação entre as características das chuvas naturais e a quantidade de perda de
solo, ou seja, a erosividade das chuvas.
O melhor método para estimar a perda de solo é composto pelo produto da
energia cinética de uma chuva nos 30 minutos consecutivos de sua duração total e
que correspondam à maior intensidade de chuva. A intensidade de chuva é obtida a
partir de registros de pluviográfos, considerando-se o período de 30 minutos de
maior intensidade e a quantidade de chuva ocorrida. A medida da erosividade
descrita é denominada de Índice IE30.
Métodos alternativos têm sido estudados. Um deles considera que as chuvas
acima de 25 mm h-1 são consideradas erosivas, sendo o índice associado
denominado de K. Este índice apresenta boas correlações com as perdas de solo e
é definido por toda energia cinética da chuva que cai a mais de 25 mm h-1. Para as
condições de clima temperado um índice semelhante considera chuvas com
intensidade superiores a 10 mm h-1.
Os dados de IE são apresentados no exemplo abaixo utilizando dados de um
pluviográfo (Quadro 2).
Quadro 2. A intensidade máxima de chuva em 30 minutos (IE30) é dada pela
fórmula EC = 11,9+8,7 log I máxima.
Tempo de
duração da
chuva
(minutos)
Quantidade de
chuva (mm)
Intensidade
de chuva1
(mm h-1)
Energia de chuva2
(J m-2 mm-1)
Total 3
(J m-2)
0-5 0 - - -
5-10 1 12 21,29 21,29
10-15 1 12 21,29 21,29
15-20 2 24 23,90 47,80
20-25 2 24 23,90 47,80
25-30 3 36 25,44 76,32
30-35 3 36 25,44 76,32
34-40 3 36 25,44 76,32
40-45 3 36 25,44 76,32
144
45-50 2 24 23,90 47,80
50-55 2 24 23,90 47,80
55-60 1 12 21,29 21,29
400,88
16 Aplicações de um índice de erosividade
A habilidade de avaliar numericamente o poder erosivo das chuvas tem duas
aplicações principais: a definição de práticas conservacionistas e a pesquisa para
ajudar a melhorar o conhecimento e o entendimento a respeito da erosão.
No primeiro caso, o conhecimento da erosividade das chuvas em determinada
área pode auxiliar na definição de quais práticas de conservação do solo a serem
adotadas, permitindo também um dimensionamento mais adequado destas.
Diferentes características de chuva nos vários ambientes de um país irão
condicionar valores de erosividade também distintos, pois as chuvas predominantes
nesta região são típicas e diferenciadas de outra região.
Mapas de erosividade de chuvas podem ser confeccionados, permitindo
prever melhor a ocorrência da erosão do solo e a definição da aplicação ou não de
uma ou outra prática. A eficiência da aplicação destes índices torna-se maior à
medida que são mais detalhados, ou seja, se há índices para as várias épocas do
ano, ou mesmo mensais, é possível estabelecer critérios muito mais discriminatórios
para a aplicação das práticas conservacionistas.
A implantação de determinada prática conservacionista que requer o
estabelecimento prévio de uma cobertura vegetal protetora, a qual necessita de
certa umidade de solo, como os canais escoadouros nos sistemas de
terraceamento, pode ser mais bem definida quando se conhec a erosividade das
primeiras chuvas. O estabelecimento da cobertura vegetal deve ocorrer nas
condições de menor erosividade, pois estas chuvas vão propiciar a umidade
necessária para o desenvolvimento de plantas e não necessariamente deverão
provocar erosão.
A pesquisa da erosão do solo utiliza tanto chuvas naturais quanto simuladas.
Índices de erosividade são essenciais, pois permitem a distinção criteriosa do teste
de diferentes práticas ou táticas de manejo ao longo dos anos, uma vez que
certamente se têm variações quanto às chuvas de um ano para o outro. Quando se
utilizam estes índices, pode-se avaliar se a erosão de uma determinada prática em
relação a outras é devida à mesma ou às diferenças entre chuvas nos anos de
estudo. O mesmo pode ser aplicado a uma estação de cultivo. O início ou fim desta
estação pode levar às perdas de solo diferenciadas dependendo das características
das chuvas predominantes no início ou fim da mesma.
17 Erodibilidade do solo
145
Como já definido, a erodibilidade do solo é a sua vulnerabilidade ou
susceptibilidade a erosão, sendo a sua recíproca resistência. Enquanto a
erosividade pode ser avaliada diretamente por meio de propriedades físicas das
chuvas, a erodibilidade é mais complicada, pois depende de uma série de variáveis.
De forma mais ampla, a erodibilidade do solo pode ser aplicada a todas as demais
variáveis envolvidas na perda de solo, exceto a erosividade das chuvas. É também
utilizada mais especificamente como uma medida única do efeito das
características/propriedades do solo, sendo os fatores associados ao manejo do solo
e da cultura avaliados separadamente.
Três grandes grupos de fatores afetam a erodibilidade do solo: as
características/propriedades fisicas e químicas, as características associadas à
topografia e o manejo da terra.
As características/propriedades do solo que influenciam a erodibilidade são as
que afetam a velocidade de infiltração, a permeabilidade e a capacidade de
absorção da água, além daquelas que levam a resistência à dispersão, ao
salpicamento, à abrasão e às forças de transporte de chuva e enxurrada. A
infiltração é o movimento da água da superfície do solo para a subsuperfície e
quanto maior sua velocidade, menor a intensidade de enxurrada na superfície,
reduzindo, conseqüentemente, a erosão.
Durante uma chuva, a velocidade máxima de infiltração ocorre no começo, e
usualmente decresce muito rapidamente, de acordo com alterações na estrutura da
superfície do solo. Se a chuva continua, a velocidade de infiltração gradualmente
aproxima de um valor mínimo, determinado pela velocidade com que a água pode
entrar na camada superficial e pela velocidade com que ela pode penetrar através
do perfil do solo.
Por muitos anos os cientistas de solo têm tentado relacionar vulnerabilidade
do solo às suas características/propriedades e que possam ser medidas em
laboratório ou no campo. As primeiras tentativas relacionam as perdas de solo com
a textura, suas variações de composição e as mudanças no perfil, sendo que alguns
autores propuseram índices de erodibilidade a partir das classes granulométricas
principais. O grau de agregação, quantificado por diferentes metodologias, é
considerado um bom indicador da erodibilidade. A avaliação da estabilidade de
agregados (solos bem agregados, poros maiores, maior infiltração) pode ser feita
por meio do peneiramento úmido e agitação (com certa tendência a subestimar),
utilizando-se como referência a porcentagem de agregados estáveis ou instáveis em
água ou determinada classe de diâmetro de agregados.
Outra forma considerada na literatura é a resistência ao impacto das gotas
d’água, sendo considerado, por alguns autores, como o melhor indicador, permitindo
também a avaliação do efeito do selamento do solo por partículas finas. A literatura
relata que alguns autores, avaliando diversas metodologias, verificaram que a
estimativa da erodibilidade do solo não é afetada pelo uso de parâmetros fáceis e
simples de serem medidos, sendo considerados como os mais importantes à
146
porcentagem de agregados instáveis e a porção das partículas em suspensão
(basicamente a quantidade de argila dispersa em água). É relatado também que, em
alguma extensão, a erodibilidade é dependente do material de origem.
Como rotineiramente a estabilidade de agregados não é facilmente medida,
alternativas de estimativa da erodibilidade a partir de parâmetros que tenham um
efeito similar já foram propostas. Entre as medidas a serem utilizadas, a percolação
e a infiltração, incluindo ou não os teores de matéria orgânica, a estrutura, a
permeabilidade. Estas propostas foram transcodificadas em nomógrafos como os
apresentados na Figura 9.
Figura 9. Nomógrafo de erodibilidade do solo (Fonte: Hudson, 1995).
18 Topografia
As terras de relevo irregular são mais vulneráveis a erosão hídrica, uma vez
que o salpico, o escoamento superficial e o transporte, têm seus efeitos acentuados
em maiores declividades. A influência da topografia na erosão do solo depende do
efeito integrado da declividade e do comprimento do declive, sendo diretamente
proporcionais a estes fatores.
Fisicamente o movimento da enxurrada pode ser explicado pela associação
com um corpo em plano inclinado (Figura 10):
147
Figura 10. Decomposição de forças num movimento de um corpo num plano
inclinado
Em um corpo (enxurrada) inclinado atuam duas forças: o seu peso P e a
reação normal do plano N. Como essas duas forças não atuam na mesma direção,
elas não se equilibram, admitindo uma resultante que, na ausência de atrito, faz com
que o bloco desça o plano com aceleração constante (a).
Para determinar esta aceleração é necessário conhecer a força resultante que
atua neste corpo. Decompõe-se, para isso o peso P em dois componentes, um
perpendicular ao plano (Py) e outro paralelo (Px).
Substituindo o peso P por seus componentes, pode-se verificar que Py e N se
equilibram, pois N é a reação normal ao plano a esse componente do peso. Logo a
força resultante que atua sobre o corpo é Px.
Analisando a Figura 9, têm-se:
Py = N
Sen = Px/P Px = P. Sen ; e
Cos = Py/P Py = P. Cos .
Aplicando-se a segunda lei de Newton em módulo e considerando que Px é a
força resultante responsável pelo movimento que atua sobre o corpo, tem-se que:
FR = m.a, sendo FR = Px
Px = P. sen ; e
m.a = P. sen
P = m.g
m.a = m.g. sen
a = g. sen .
N
Py
P
Px
148
Essa é a expressão da aceleração adquirida por um corpo (enxurrada) que
desliza, sem atrito, sobre um plano inclinado com ângulo em relação ao horizontal.
Assim, quanto maior o angulo , ou seja, a declividade do terreno, maior a
aceleração deste corpo.
Sendo assim, quanto maior a declividade, maior a aceleração no movimento
do corpo e, conseqüentemente, maior a velocidade deste corpo, uma vez que:
V2f = V2
i 2 a.S
Considerando:
Ec = MV2/2
Quanto maior a velocidade maior a energia cinética deste corpo,
conseqüentemente quanto maior o poder erosivo da enxurrada (o corpo em
movimento num plano inclinado)
Além disso, considerando as equações anteriores, quanto maior o espaço a
ser percorrido pelo corpo maior a velocidade deste corpo, considerando os demais
fatores constantes. Sendo assim, quanto maior o comprimento dos declives, maior
tende a ser a distância a ser percorrida pela enxurrada e o seu poder erosivo. Há
condições para o aumento do volume da enxurrada, sua massa e sua velocidade.
19 Manejo do Solo e a erosão
As variações na perda de solo provocada pelos diferentes tipos de manejo são
muito maiores do que a erosão em diferentes solos com o mesmo tipo de manejo. É
comprovada que a erosão é muito mais influenciada pelo manejo do que por outro
fator, incluindo uma detalhada discussão relativa ao manejo do solo e da cultura.
O melhor manejo pode ser definido como o mais intensivo e produtivo uso pelo
qual a terra é capaz de produzir sem causar erosão, ou seja, o uso em acordo com a
sua aptidão. Para a identificação desta aptidão existem ferramentas já vistas nesta
disciplina e incluem os sistemas de Capacidade de Uso das Terras e o
FAO/Brasileiro.
20 Manejo da cultura ou cobertura vegetal
Semelhante ao item anterior, a erosão é grandemente afetada pelos diferentes
tipos de uso do solo. No entanto, um uso particular pode ter também grandes
variações na quantidade de perda de solo dependendo do conhecimento detalhado
dos cultivos. Para uma mesma cultura, quando não manejada racionalmente, pode
haver erosão de forma acentuada sendo função da efetividade da cobertura vegetal
proporcionada ao solo.
A cobertura vegetal atua na redução do processo erosivo por meio dos seguintes
mecanismos: proteção direta contra o impacto das gotas de chuva; dispersão da
água interceptando-a e evaporando-a antes que atinja o solo; decomposição das
raízes das plantas, formando canalículos e aumentando a infiltração da água;
149
melhoramento da estrutura do solo pela adição de matéria orgânica e aumentando a
capacidade de retenção de água; e diminuição da velocidade de escoamento da
enxurrada pelo aumento do atrito na superfície. Mesmo culturas com tendência de
exposição da superfície do solo, como por exemplo, a mamona e o algodão, se
manejadas adequadamente poderão proporcionar uma efetiva minimização das
perdas do solo.
A vegetação é importante também na erosão eólica pela redução da
velocidade do vento na superfície do solo e absorção da maior parte da força
exercida sobre o solo. O efeito da cobertura vegetal vai depender do tipo, estádio de
desenvolvimento e produtividade.
21 Necessidade de medidas de controle da erosão
Diante do exposto pode-se estabelecer que a erosão é função da erosividade
das chuvas (R), envolvendo a energia de todos os componentes da chuva (gotas e
enxurradas), e da erodibilidade do solo.
A erodibilidade do solo, por sua vez, pode ser decomposta em componentes
associados às características e/ou propriedades do solo que o tornam mais ou
menos susceptível a erosão, bem como componentes relacionados ao manejo da
superfície do solo, minimizando os efeitos dos grandes comprimentos de rampa e
elevadas declividades (LS). Além disso, a erodibilidade também depende das
condições em que a cultura está sendo conduzida (C), estabelecendo maiores ou
menores perdas de solo pela cobertura proporcionada na superfície do solo.
A análise dos fatores que influenciam no processo erosivo considerando o
uso agrícola, analisando pelos aspectos relativos à erosividade das chuvas e
erodibilidade do solo, leva à discussão de como a erosão pode ser controlada.
No primeiro caso, o poder erosivo das chuvas está fora de controle, restando
atuar em fatores que podem ser modificados por uma intervenção técnica. As
propriedades intrínsecas do solo que o caracterizam ser mais ou menos susceptível
à ação do processo erosivo também apresentam caráter limitado de ação, restando,
em maior extensão o uso do solo e o manejo a ser dado às culturas existentes em
sua superfície, as quais estão mais efetivamente sobre o controle humano. Tal
quadro leva à discussão a respeito de quais seriam as práticas ou alterações no
manejo do solo e da cultura que levam às menores perdas de solo e água. Este será
o assunto de aula prática.
22 Bibiografia
BERTONI, J. & LOMBARDI NETO, F. Conservação do solo. São Paulo, Ícone, 1999.
355p.
GALINDO, I.C. & MARGOLIS, E. Tolerância de perdas por erosão para solos do
estado de Pernambuco. R. Bras.Ci. Solo, 13:95-100.1989.
HUDSON, N. Soil conservation. Ames, Iowa State University Press, 1995. 391p.
SILVA, J.R.C. Erosão e produtividade do solo no semi-árido. In: OLIVEIRA, T.S.;
ASSIS Jr., R.N.; ROMERO, R.E. & SILVA, J.RC., eds. Agricultura,
sustentabilidade e o semi-árido. Fortaleza, DCS-UFC, 2000. P.169-213.
150
7. PRÁTICAS CONSERVACIONISTAS E SISTEMAS DE MANEJO
Algumas das causas do esgotamento de nossos solos pela erosão podem ser
controladas, e todas as técnicas utilizadas para aumentar a resistência do solo ou
diminuir as forças do processo erosivo denominam-se práticas conservacionistas.
Estas podem ser divididas em vegetativas, edáficas e mecânicas, segundo se utilize
a própria vegetação, se tratem de modificações nos sistemas de cultivo, ou se
recorra a estruturas artificiais construídas mediante a remoção ou disposição
adequada de porções de terra. Cada uma delas resolve apenas parcialmente o
problema; assim, para a melhor solução, deverão ser aplicadas simultaneamente, a
fim de abranger com a maior amplitude possível os diversos aspectos do problema.
As práticas vegetativas e edáficas são mais simples de executar e de manter;
sempre se deve recorrer a elas, utilizando as mecânicas como complementares,
naqueles casos em que a combinação das outras não consiga a suficiente proteção
dos terrenos.
Neste capítulo, além das práticas, são apresentados os sistemas de manejo
do solo, tais como a rotação de culturas, o preparo do solo e o plantio direto.
A conservação do solo não se reduz à simples aplicação de um número
determinado de práticas: é todo sistema de manejo do solo de assegura a obtenção
dos maiores lucros possíveis sem diminuir a produtividade do terreno.
7.1. Práticas de caráter vegetativo
As práticas de caráter vegetativo são aqueles em que se utiliza a vegetação
para defender o solo contra a erosão.
A densidade da cobertura vegetal é o princípio fundamental de toda proteção
que se oferece ao solo, perseverando-lhe a integridade contra os efeitos danosos da
erosão. Realmente, a erosão do solo é tanto menor quanto mais densa é a
vegetação que o recobre e protege. A importância para a conservação do solo da
densidade de cobertura vegetal – compreendendo esta não somente as plantas
como os resíduos vegetais.
A utilização racional de vegetação para recobrir e travar o solo é um dos
princípios básicos da sua conservação. É evidente, porém, que no seu emprego
para fins agrícolas, nem sempre é econômico mantê-lo inteiramente recoberto com
vegetações protetoras, o que não impede, entretanto, que dentro dos planos de
produção sejam incluídos sistemas de proteção do solo baseados nas vegetações
de revestimento e de travamento.
7.1.1. Florestamento e reflorestamento
As terras de baixa capacidade de produção e, ao mesmo tempo, muita
suscetíveis à erosão, deverão ser recobertas de vegetações permanentes bastante
151
densas, como as florestas, permitindo, assim, uma utilização econômica das terras
inadequadas para cultura, e proporcionando-lhes, ao mesmo tempo, a preservação.
Para certos solos muito inclinados, muitos pobres ou muito erodidos, a
cobertura com florestas é a maneira mais econômica e segura de utilização. Nas
regiões de topografia acidentada, as florestas devem ser formadas no topo dos
morros a fim de reduzir as enxurradas que se formam nas cabeceiras, atenuando os
problemas de controle de erosão nos terrenos situados mais baixo, e
proporcionando, pela maior infiltração, uma regularização das fontes de água.
O reflorestamento ciliar é usado para a proteção das margens dos rios,
empregando espécies arbóreas que fornecem frutos comestíveis, como ingazeiros
ou amoreiras, para alimentação dos peixes.
Para certos tipos de erosão, como voçoroca o reflorestamento das cabeceiras
e dos barrancos é bastante vantajoso.
As florestas exercem papel importante no equilíbrio ecológico da região e na
economia das propriedades agrícolas. Toda propriedade agrícola necessita de uma
área com mata para fornecimento de lenha, madeiras, etc., indispensáveis à
organização e manutenção da propriedade. As matas fornecem ambiente para a
fauna silvestre, abrigando e alimentando aves e animais úteis como controladores
de pragas ou como fornecedores de caça.
Sem dúvida, entre os trabalhos mais urgentes de defesa dos solos, está o
restabelecimento da floresta em zonas extensas desmatadas, incorporando-as à
economia da nação como produtoras de redá. Da forma como essa tarefa seja
conduzida depende o futuro de muitas regiões. Em muitos países, já se começa a
criar uma consciência dos imensos benefícios da árvore, e surgem campanhas de
reflorestamento que permitem augurar o restabelecimento do equilíbrio ecológico em
zonas extensas que se podem transformar em prósperos produtores de riqueza.
7.1.2. Pastagem.
Os terrenos onde as culturas não proporcionam produções compensadoras
ou onde é grande o perigo pela erosão devem ser reservados às pastagens, que
fornecem também boa proteção ao solo. A combinação agricultura-pecuária bem
administrada constitui ideal para a manutenção da fertilidade do solo; de um lado,
assegura a produção de uma densa vegetação durante períodos longos às áreas
que dela necessita, e, de outro, fornecem adubo orgânico.
As pastagens, embora em intensidade em pouco menor que as florestas,
fornecem grande proteção ao solo contra os estragos pela erosão. Seu trato pode
afetar grandemente seu valor como revestimento do solo contra a erosão.
Um peso de gado muito grande, por exemplo, pode resultar em uma
vegetação excessivamente raleada e reduzida, redundando em uma diminuição
considerável da proteção contra a erosão. Assim, para que as pastagens possam
constituir uma eficiente maneira de proteger o solo contra a erosão, um cuidado
essencial será mantê-las com um peso de gado compatível com a sua capacidade.
152
Um bom sistema de evitar que os pastos sejam muito raleados pelo gado, será fazer
o rodízio de pastagens; para tal fim, sua área total será dividida em determinado
número de pastos, sendo o gado passado de um para o outro, dentro de uma
sequência determinada. Assim, os pastos terão tempo suficiente para se refazerem,
sem o perigo do pastoreio excessivo.
Deve-se evitar, sempre que possível atear-lhes fogo: este pode ser uma
causa da diminuição da densidade da cobertura vegetal das pastagens, com
sensível prejuízo para a proteção do solo oferecida contra a erosão.
A fim de manter as pastagens com uma densidade de cobertura capaz de
proporcionar uma capacidade de suporte de gado razoável e, ao mesmo tempo,
suficiente para garantir a proteção do solo contra a erosão, uma das práticas mais
recomendadas é o ressemeio periódico. Dessa maneira, reformando-se a pastagem
e semeando ou plantando mudas de espécies de capim ou leguminosas mais
indicadas, conseguir-se-á uma cobertura de maior capacidade de suporte e
consequentemente, de maior capacidade de proteção do solo contra a erosão.
É muito difícil dar indicações precisas sobre manejo de pastos, pois, mas os
seguintes pontos gerais podem servir de guia para tanto: (a) o pasto deve ser
mantido livre de ervas daninhas, devendo, porém, ter misturas de leguminosas e
gramíneas; (b) quando a fertilidade do solo diminuir, é conveniente a aplicação de
um fertilizante químico completo; (c) quando a acidez do terreno é muito alta, deve-
se corrigi-la, mediante a aplicação de calcário, a fim de proporcionar o crescimento
de leguminosas; (d) os pastos recém-estabelecidos não devem ser pastoreados até
que as plantas tenham desenvolvido um sistema radicular que permita suportar o
pisoteio; (e) as árvores de sombra para abrigo do gado devem ser localizadas na
parte alta do terreno, e longe dos riachos ou córregos e grotas; (f) os pastos não
devem ser sobre-pastoreados; (g) o pastoreio misto, de várias espécies de animais,
assegurada sempre melhor utilização da pastagem; e (h) os sulcos e camalhões em
pastagens, em contorno, são uma prática recomendada para solo argiloso, para
regiões de pouca chuva e para pastagens em formação.
7.1.3. Plantas de cobertura.
Essas plantas se destinam a manter o solo coberto durante o período
chuvoso a fim de reduzir os efeitos da erosão e melhorar as condições físicas e
químicas do terreno.
As plantas de cobertura além de controlarem os efeitos da erosão e evitarem
que os elementos nutritivos postos em estado solúvel no solo sejam lixiviados nas
águas de percolação, também proporcionam uma eficiente proteção da matéria
orgânica do solo contra o efeito da ação direta dos raios solares.
Um grande benefício dessas plantas é a produção de matéria orgânica para
incorporação ao solo. O aumento do conteúdo de matéria orgânica no solo melhora
as suas condições físicas e estimula os diversos processos químicos e biológicos.
De todos os resíduos das plantas, as raízes são, sem duvida, o mais importante,
pois o seu crescimento subterrâneo possibilita a acumulação de matéria orgânica a
153
profundidades variáveis. A matéria orgânica melhora a estrutura e a capacidade de
retenção da umidade dos solos: aos argilosos, plásticos, confere melhor resistência,
refletindo não só na maior facilidade de aeração e crescimento das plantas, como
também na melhoria das condições de aeração; aos solos arenosos, melhora sua
capacidade de retenção de umidade, refletindo decisivamente no crescimento das
plantas de cultivo durante as épocas muito secas.
No caso de culturas anuais, as plantas de cobertura são intercaladas nos
ciclos da cultura, visando substituí-la assim que ela seja retirada do terreno.
No caso de culturas perenes, como cafezal, cacaual, seringal, pomares, as
plantas de cobertura são utilizadas principalmente para suplementar o efeito de
cobertura já proporcionado pelas plantas cultivadas, cobrindo os claros deixados no
terreno por suas copas.
As plantas utilizadas como cobertura, nas culturas anuais, são principalmente
as mesmas leguminosas empregadas para adubação verde, ou seja, a mucuna, as
crotalárias, o feijão-guandu. Nas plantas perenes, as plantas de cobertura são,
também, as mesmas usadas para adubação verde, a saber: o calopogônio
(Calopogonium mucunoides Desv.), a jetirana (Centrosema pubescens Benth.), o
feijão-de-porco (Canavalia ensiformes (L.) D. C.), algumas crotalárias (Crotalaria
ssp.), o cudzu-comum (Pueraria thunbergiana Benth.).
Pode-se verificar o efeito das plantas de cobertura, mesmo que não sejam
leguminosas, quando enterradas, na melhoria das condições físicas do solo. As
partículas minerais menores, ou seja, as argilas, tendem a unirem-se, de maneira a
impedir a penetração do ar, a absorção e retenção de umidade; os solos argilosos
endurecem quando secos e, quando úmidos, tornam-se pegajosos e pouco
permeáveis, condições essas que afetam gravemente a produção de culturas. Ao
enterrar-se a planta de cobertura, o volumoso material que se mistura ao solo
melhora as condições de aeração e, à medida que avançam os processos de
decomposição, o enriquecimento em húmus, resultante da incorporação do material
vegetal ao solo, modifica ainda mais as condições físicas desfavoráveis, pois os
abundantes coloides que o húmus contém, de grande poder absorvente, rodeiam as
partículas minerais, em forma de película fina que retém a umidade e é capaz de
absorver e reter os nutrientes.
Outro efeito das plantas de cobertura, quando enterradas, é a melhoria da
solubilidade de muitas substâncias minerais do solo. Os elementos nutritivos para as
plantas provêm da decomposição das rochas e do material originário do solo,
através da meteorização, que torna esses materiais lentamente aproveitáveis; o
aumento da atividade dos microrganismos proporcionado pela incorporação de
material orgânico acelera enormemente esse processo, de maneira que as culturas
podem logo dispor das quantidades de nutrientes requeridas.
O sombreamento do solo, proporcionado pelas plantas de cobertura, é outro
efeito importante. Nas regiões tropicais, o solo descoberto, submetido à ação direta
do sol e da água da chuva, sofre prejuízos graves e rápidos na sua produtividade;
com as plantas de cobertura, consegue-se o estabelecimento de uma boa proteção
sobre o terreno, amenizando esse efeito prejudicial dos fatores meteorológicos.
154
A prática das plantas em cobertura pode ser contra-indicada se o custo das
sementes for alto, tornando-a muito cara. Ela requer, também, precauções contra a
disseminação de pragas ou enfermidades ocasionadas por plantas que podem ser
hospedeiras de fungos e insetos que atacariam as culturas principais: é o caso de
algumas leguminosas susceptíveis a nematoides radiculares, que atacam muitas
plantas cultivadas. Em regiões secas, os adubos verdes têm pouca utilização em
virtude da competição em água, que refletirá na produção da cultura principal.
7.1.4. Cultura em faixas
Consiste na disposição das culturas em faixas de largura variável, de tal
forma que a cada ano se alternem plantas que oferecem pouca proteção ao solo
com outras de crescimento denso. Pode-se considerá-la como uma prática
complexa, pois combina o plantio em contorno, a rotação, as plantas de cobertura e,
em muitos casos, os terraços.
Dentre os diversos sistemas de controle de erosão, tanto hídrica como eólica,
a cultura em faixas é um dos mais eficientes e práticos para culturas anuais; para
controle da erosão hídrica, deve ser orientada no sentido das curvas de nível do
terreno, e para controle da erosão eólica, deve ser executado pelos lavradores sem
despesas extras, uma vez que só altera a disposição das culturas e sua orientação
com relação ao declive ou aos ventos dominantes.
O efeito da cultura em faixas para controle da erosão é baseado em três
princípios: as diferenças em densidades das culturas empregadas, o parcelamento
dos lançantes e a disposição em contorno. A disposição alternada de culturas
diferentes faz com que as perdas por erosão sofridas por determinada cultura sejam,
em parte, controladas pela que vem logo abaixo; culturas como o feijão, mamona e a
mandioca perdem mais solo e água por erosão do que amendoim, algodão e arroz,
e estas, por sua vez, perdem mais que soja, batatinha, milho e cana-de-açúcar.
Algumas vezes, uma mesma cultura, plantada em diferentes épocas, pode
proporcionar diferenças de densidade de vegetação aproveitáveis para o sistema de
culturas em faixas, como por exemplo, a cana-de açúcar. O parcelamento dos
lançantes, pela cultura em faixas, é uma das causas de redução das perdas por
erosão, pois estas aumentam progressivamente com o comprimento dos lançantes;
as larguras das faixas deverão ser determinadas em função do declive do terreno,
do tipo de solo e da cultura. A disposição em contorno é um dos fundamentos
básicos do sistema de cultura em faixas, e as culturas diferentes, dispostas em
contorno, contribuirão para reduzir os prejuízos da erosão.
No caso da erosão eólica, varia a orientação dada às faixas, pois as correntes
a que será necessário antepor obstáculos, são as correntes dos ventos dominantes;
as faixas terão que ser orientadas de modo a serem perpendiculares à direção dos
ventos dominantes. O lançante, nesse caso, deve-se entender o comprimento ao
longo da direção dos ventos dominantes.
Podem-se distinguir dois sistemas principais de culturas em faixas: (a) faixas
de exploração contínua, em que as culturas existentes permanecem de um ano para
155
outro na mesma posição; e, (b) faixas em rotação, em que anualmente todas as
culturas mudam de posição, segundo um plano preestabelecido de rotação. O
sistema de faixas em rotação adapta-se, em geral, a qualquer tipo de cultura anual
ou semiperene (cana-de-açúcar, mandioca, sisal); é sempre interessante incluir no
plano de rotação uma leguminosa, de preferência para o enterrio como adubo verde,
de forma a garantir a manutenção e o melhoramento da fertilidade do solo.
A locação das faixas pode ser feita de três maneiras: (a) faixas niveladas:
todos os limites entre faixas são locados na linha de contorno do terreno; (b) faixas
paralelas: apenas uma linha mediana da gleba é marcada em contorno, sendo as
demais linhas divisórias entre faixas tiradas paralelamente à mesma; (c) faixas
associadas: combinando os dois sistemas anteriores, de tal modo que uma faixa
paralela se alterne com uma nivelada, esta com largura irregular e aquela com
largura regular. O sistema de faixas niveladas é o mais adequado para terrenos de
topografia irregular; o controle de erosão será mais eficiente em virtude de as fileiras
de plantas seguirem, com maior aproximação as curvas de nível do terreno,
podendo ter nas linhas de transição das faixas a construção de reforços de proteção
mecânica (terraços); as faixas se apresentam com largura irregular de acordo com
as mudanças de declividade do terreno, e com bastantes ruas mortas que dificultam
os trabalhos de cultivo e trato. O sistema de faixas paralelas é recomendado apenas
para terrenos de topografia suave e declives muito uniformes; sendo as faixas de
largura uniforme, não há ruas mortas, oque facilita as operações de cultivo e trato. O
sistema de faixas associadas, que é a associação de faixas paralelas, é executado
marcando uma linha nivelada de cada duas faixas e, por elas, marcam-se as
paralelas; a cultura exigente de tratos mecânicos ficará com a faixa de largura
regular e, a outra, com a de largura irregular.
O espaçamento entre as linhas divisórias das faixas, correspondente à largura
das faixas, dependerá do tipo de solo, do grau de declive, das culturas e dos
sistemas culturais empregados. A largura das faixas será tanto menor quanto mais
erodível for o solo, quanto maior for a declividade do terreno e quanto menor for a
densidade de cobertura proporcionada pela cultura. De modo geral, adota-se entre
as linhas divisórias de faixas o mesmo espaçamento usado para os terraços de base
larga, ficando, assim, feita a marcação destes para o caso de sua futura instalação.
O sistema de culturas em faixas oferece todas as vantagens de plantio em
contorno e da rotação de culturas, e também a proteção adicional ao terreno, pela
ação das faixas de culturas mais densas que diminuem a velocidade e o volume da
enxurrada provocada pelas culturas mais abertas.
Se o sistema é planejado com cuidado e se marcam adequadamente as
faixas estabelecendo uma rotação de culturas, com os anos consecutivos de uso a
gleba terá uma proteção balanceada em todo o terreno.
7.1.5. Cordões de vegetação permanente
Os cordões de vegetação permanente são fileiras de plantas perenes e de
crescimento denso, dispostas com determinado espaçamento horizontal e sempre
156
em contorno. Em culturas anuais cultivadas continuamente na mesma faixa, ou em
rotação, são intercaladas faixas estreitas de vegetação cerrada, formando os
cordões de vegetação permanente; em culturas perenes com o café e pomar, os
cordões são colocados entre as arvores, com determinado espaçamento horizontal,
formando barreiras vivas para controle da erosão.
Quebrando a velocidade de escorrimento da enxurrada, o cordão de
vegetação permanente provocará a deposição de sedimentos transportados e
facilitará a infiltração da água que escorre no terreno, concorrendo, pois, para
diminuir a erosão do solo. Esses cordões possibilitam a formação gradual de
terraços com o correr dos anos; com o preparo do solo e com os cultivos que se
fazem entre as faixas, e também como resultado da própria erosão, a terra vai sendo
deslocada do seu lado de cima, formando gradativamente, terraços, e com um
pequeno trabalho de acabamento estes serão terminados; assim, os cordões de
vegetação permanente poderão não apenas substituir os terraços como, também,
representar a fase inicial de sua construção.
O cordão de vegetação permanente é uma prática bastante eficiente de
controle de erosão, chegando quase a equivaler aos terraços. Os dados revelam
que essa prática controla cerca de 80% das perdas de solo e 60% das perdas de
água.
Para as condições de nossa agricultura, tais cordões apresentam, de modo
geral, sobre os terraços, a grande vantagem de sua simplicidade e facilidade de
execução. Mesmo locados sem grande precisão, apresentarão eficiência satisfatória,
o que facilita o seu emprego pelos agricultores que disponham de pequenos
recursos técnicos.
Quando os cordões de vegetação permanente são usados como meio de
formação natural dos terraços, convêm que já sejam marcados com o espaçamento
e gradiente recomendados apara os terraços, sendo necessários, então, um pouco
mais de cuidado e precisão no seu nivelamento.
Seu principal inconveniente, relativamente aos terraços, é a diminuição da
área destinada às culturas anuais. Nos terraços de base larga, toda a área do
terreno, inclusive aquela ocupada pelo camalhão e pelo canal do terraço, poderá ser
coberta com a cultura, sem qualquer diminuição da área útil. Por exemplo, em uma
faixa de 30 m de cultura de algodão protegida com cordões de vegetação
permanente de 3 m de largura, 10% da área da cultura principal seria ocupada com
a vegetação protetora; porém, quando se utiliza como planta protetora de formação
dos cordões a cana-de-açúcar, por exemplo, dela se pode retirar um rendimento ou
uso econômico, sendo empregada como forrageira para alimentação dos animais da
propriedade agrícola ou mesmo para moagem e industrialização.
A distância entre cordões de vegetação permanente varia com a declividade
do terreno e com as condições do solo; de preferência, deve ser usada a mesma
tabela dos terraços.
Os cordões de vegetação permanente deverão ter de 2 a 3 m de largura. A
vegetação a empregar na sua formação, além de apresentar, de preferência, valor
econômico subsidiário para a fazenda, deverá possuir as características seguintes:
157
crescimento rápido e cerrado; formação de uma barreira densa junto ao solo;
durabilidade; não possuir caráter invasor para as terras de culturas adjacentes, e
não fornecer abrigo para moléstias e pragas das culturas em que tiver que ser
intercalada.
As espécies mais usadas para a formação dos cordões de vegetação
permanente são: a cana-de-açúcar, que oferece valor econômico pela utilização em
forragem de alimentação do gado ou na industrialização; o vetiver, que pode ser
utilizado para extração, por destilação das raízes, da essência de sândalo,
proporcionando uma barreira mais densa e cerrada que a cana-de-açúcar; a erva-
cidreira, que também fornece um óleo essencial, com boa barreira e a vantagem do
porte menor; o capim-gordura, que pode ser usado como feno, produzindo uma
barreira bastante densa e bem ligada ao solo.
Para a proteção das culturas perenes, os cordões de vegetação permanente
deverão ser formados com plantas vivazes, de pequeno porte e de crescimento
bastante denso e cerrado junto à superfície do solo, de modo a formarem barreiras
contra o escoamento da enxurrada. Além do controle da erosão, as plantas
utilizadas deverão oferecer possibilidade de uso econômico, não apresentar perigo
de praguejamento e não competir com as culturas entre as quais serão plantadas.
As espécies mais recomendadas são: o isote, o capim-chorão, a erva-cidreira, a
leucina: o essencial é que a planta escolhida forme um bom obstáculo ao arraste do
solo. A aplicação de cordões de vegetação permanente, em culturas perenes, tem
sido muito discutida pela competição que possam fazer á cultura principal; deve-se
ter em mente, contudo, a quantidade de material orgânico que proporcionam ao solo
e também que sua área de ocupação é muito pequena em relação à área total da
cultura. Os cordões de vegetação permanentes serão mais eficientes se formados
em contorno; porém, quando as ruas de culturas estiverem em linhas retas, serão
interrompidos quando encontrarem árvores em seu alinhamento. O espaçamento
entre os cordões de vegetação permanente deverá ser aproximadamente o mesmo
dos terraços tipo de base estreita, também chamados cordões em contorno, que
tivessem que ser empregados nas mesmas condições. Em terrenos de inclinação
muito forte, os cordões de vegetação permanente deverão ter o mesmo
espaçamento dos terraços tipo patamar, que, nesse caso, seriam necessários;
esses cordões poderão ser usados, também, para formação natural dos terraços
patamar, graças à retenção gradual da terra que vai sendo deslocada das faixas que
lhes fica acima, tornando uma prática cuja construção é bastante cara a um custo
praticamente nulo.
7.1.6. Alternância de capinas
A alternância das épocas de capinas em ruas adjacentes, durante o período
chuvoso, é uma maneira, praticamente sem despesa, de reduzir as perdas por
erosão tanto em culturas anuais como perenes.
Esse sistema consiste em fazer as capinas sempre pulando uma ou duas
ruas, e, depois, passado algum tempo, voltar para capiná-las, deixando, assim,
158
sempre uma ou duas com mato imediatamente abaixo de outra ou de outras recém-
capinadas. A terra perdida pelas ruas limpas de mato será retida pelas ruas com
mato que ficam imediatamente abaixo.
Em cada rua de cultura haverá sempre o mesmo número de capinas que no
sistema usual. O sistema de alternância de capinas requer apenas um pouco mais
de atenção na distribuição das épocas de capinas: consiste apenas em fazer com
que entre cada duas ruas adjacentes, seja dado um intervalo entre capinas de,
aproximadamente, metade do intervalo normalmente adotado; procurar-se-á fazer
com que a primeira capina seja antecipada sobre a época que, no sistema
convencional, seria considerada como mais própria, de cerca de uma quarta parte
do intervalo normal entre as capinas de uma mesma área.
O efeito das alternâncias de capinas na diminuição das perdas por erosão é
muito interessante, principalmente ao considerar sua aplicação muito simples e seu
custo praticamente nulo.
A eficiência desse sistema no controle de erosão será tanto maior quanto
mais próxima das curvas de nível do terreno estiverem as ruas das plantas. Sendo
bem conduzido, ele não afeta a produção.
7.1.8. Ceifa do mato
A ceifa do mato nas culturas perenes, do tipo de pomar, café, cacau, cortando
as ervas daninhas a uma pequena altura da superfície do solo, deixando intactos os
sistemas radiculares do mato e das plantas perenes e uma pequena vegetação
protetora de cobertura, constituída de tocos, é uma maneira eficiente maneira de
controlar a erosão. A ceifa deve ser convenientemente repetida a fim de não
prejudicar a cultura pela concorrência do resto do mato, e executada com o auxílio
de ceifadeiras mecânicas apropriadas.
O controle das ervas daninhas nas culturas perenes pode ser realizado
quimicamente, por intermédio de herbicidas, porém o efeito contra a ação do
impacto da gota de chuva deve ser menor.
O efeito da ceifa do mato no controle das perdas por erosão pode ser
explicado, quando em comparação com o controle das ervas daninhas por meio das
capinas, pelo seguinte; (a) não há desagregação da camada superficial do solo que
facilita a erosão; (b) não há mutilação das raízes superficiais das plantas perenes
cultivadas, com sacrifício para a produção; (c) sem a eliminação total da vegetação
de cobertura do solo, não haverá o efeito da energia de impacto da gota de chuva no
terreno; (d) o sombreamento do solo que proporciona é de grande auxílio contra a
oxidação acelerada da matéria orgânica.
Essa operação, cortando as ervas daninhas a uma pequena altura da
superfície do solo, deixa intactos os sistemas radiculares do mato e das plantas
cultivadas e também ainda uma pequena vegetação protetora de cobertura,
constituída pelos pequenos tocos deixados. A ceifa controla o desenvolvimento
exagerado e prejudicial das ervas daninhas, eliminando-as logo que sua competição
em umidade e elementos nutritivos comece a ser sentida pelas culturas.
159
Como a ceifa não destrói completamente o mato, o seu número ou a sua
frequência precisa ser bem maior do que no caso das capinas, pois os pequenos
tocos de ervas daninhas deixados brotam logo em seguida, formando novas plantas
em tempo mais curto do que por meio de sementes, como é o caso das plantas
eliminadas pelas capinas.
A frequência das ceifas necessárias para controlar as ervas daninhas numa
cultura perene, como cafezal, pomar, cacaual, dependerá das condições locais de
fertilidade do solo, grau de infestação e espécies predominantes de ervas daninhas
e da distribuição de chuvas; o melhor índice é observar a reação das plantas
cultivadas, não deixando que estas amareleçam por efeito da concorrência do mato.
7.1.9. Cobertura morta
A cobertura do solo com restos de culturas é uma das mais eficientes práticas
de controle da erosão, especialmente no da eólica.
A cobertura morta protege o solo contra o impacto das gotas de chuva, faz
diminuir o escoamento da enxurrada, e incorpora ao solo a matéria orgânica que
aumenta a sua resistência ao processo erosivo; no caso da erosão eólica, protege o
solo contra a ação direta dos ventos e impede o transporte das partículas.
A cobertura morta com palha ou resíduos vegetais contribui para a
conservação da água, devendo ser preconizada nas zonas de precipitações pouco
abundantes, e diminui a temperatura do solo, reduzindo, assim, as perdas por
evaporação.
Em culturas anuais, esse sistema é praticado em geral, com equipamentos
que, soltando o solo durante o seu preparo, deixa os restos de cultura na superfície,
podendo também ser compensador em culturas perenes, como pomares e em
alguns cafezais.
A cobertura morta tende a melhorar a estrutura do solo na camada superficial.
Seu efeito mais importante, do ponto de vista de controle de erosão, pela proteção
que oferece contra o impacto das gotas de chuva e contra o escoamento acelerado
da enxurrada.
A cobertura morta, que tem mostrado, em algumas regiões, ser de valor,
também, no controle da erosão eólica, é, pois, de grande eficiência. Entretanto, nem
sempre tem dado bons resultados em face do problema de fertilidade do solo,
principalmente com relação ao nitrogênio. A cobertura com palha ou nas suas
atividades, estimulando a decomposição e, em consequência, determinando a
rápida redução da disponibilidade de nitrogênio, especialmente nas primeiras
semanas de decomposição. Para que tal prática tenha sucesso na produção, é
necessário que haja adequado suprimento de nitrogênio para a atividade microbiana
do solo e para o uso da planta.
Em culturas perenes, a cobertura com palha apresenta o problema de exigir
uma área próxima, destinada á produção de capim, considerável gasto de mão-de-
obra, transporte, corte e distribuição da palha de capim sobre o terreno. As
vantagens da palha como cobertura são grandes, mas sua aplicação generalizada
160
fica limitada pelo seu elevado custo. O cuidado especial de impedir que a cobertura
seja atingida pelo fogo, destruindo também a cultura, é conseguindo, fazendo-se a
aplicação alternadamente em uma ou duas ruas, deixando outras tantas sem a
cobertura; no ano seguinte, a palha de capim será aplicada nas ruas que antes
ficaram desprotegidas.
As espécies de capim mais usadas para a produção de palha a ser distribuída
dentro das ruas que antes ficaram desprotegidas.
7.1.10. Faixas de bordadura e quebra-ventos
As faixas marginais das terras cultivadas apresentam, muitas vezes,
problemas de controle de erosão e de preparo do solo, que são resolvidos com o
estabelecimento de faixas de bordadura. E, nas regiões sujeitas á erosão eólica, nas
faixas marginais dos campos, torna-se necessário o estabelecimento de quebra
ventos para o controle dos ventos que sopram junto á superfície do solo.
7.1.10.1. Baixas de bordadura
Consistem em faixas estreitas formadas com plantas de porte baixo e
vegetação cerrada para conter os excessos de enxurrada que possam escorrer sem
provocar danos.
Com uma largura de 3 a 5 m, são formadas na margem dos campos
cultivados, ao lado dos caminhos e dos canais escoadouros. Sua principal finalidade
é controlar a erosão nas bordas dos terrenos de cultura; realmente, elas formam um
anteparo para as enxurradas que correm das terres cultivadas e evitem que se
formem solapamentos nas saídas de enxurrada.
As faixas de bordadura também podem proporcionar um espaço para o
manejo de máquinas de preparo do solo, de cultivo, de pulverização e de colheita.
No caso, principalmente, dos terrenos com certo declive e que sejam arados e
cultivados em contorno, elas vêm a facilitar a virada dessas máquinas quando no
seu uso. Outro benefício é facilitar a ligação entre as faixas de cultura ou entre
terraços, pelas máquinas de cultivo, de pulverização e de colheita.
Estabelecendo as faixas de bordadura com vegetações úteis, fornecedoras de
produtos de valor econômico, evita-se o aparecimento de ervas daninhas que os
cultivadores poderiam espalhar pelo resto do terreno. Para sua formação, são
recomendadas as leguminosas de pequeno porte, como centrosema, cudzu, e
gramíneas, como erva-cidreira e capim-gordura.
7.1.10.2. Quebra-ventos
Consistem em uma barreira densa de árvores, colocadas a intervalos
regulares do terreno, nas regiões sujeitas a ventos fortes, nos lugares susceptíveis
de erosão eólica, de modo a formares anteparos contra os ventos dominantes.
161
Sua função é fundamentalmente reprimir a ação do vento na superfície do
solo, protegendo as plantas, fornecendo cada uma, uma barreira mais densa em
determinada altura; as plantas de menor porte são colocadas na frente, aumentando
gradualmente de porte até as mais altas. O vento será, assim, desviado para cima
por uma superfície inclinada de copa de árvores. Quanto mais altos os quebra-
ventos, mais longe farão sentir a sua influência.
Para a formação de renque de árvores destinadas a funcionar como quebra-
ventos, podem ser utilizadas as seguintes: o eucalipto, o bambu, a tefrósia, o
cipreste.
7.2. Práticas de caráter edáfico
São as práticas conservacionistas que, com modificações no sistema de
cultivo, além do controle de erosão, mantêm ou melhoram a fertilidade do solo.
Não basta controlar a erosão para manter a fertilidade do solo, pois também
contribuem para seu depauperamento, o consumo de elementos nutritivos pelas
culturas, a combustão da matéria orgânica e a lixiviação pelas águas de percolação.
Além das práticas de controle da erosão, são necessárias outras que
reponham os elementos nutritivos, controlem a combustão de matéria orgânica,
diminuam a lixiviação, controlando, parte, as causas de depauperamento do solo.
7.2.1. Controle do fogo
O fogo é, realmente, umas das maneiras mais fáceis e econômicas de limpar
um terreno recém-derrubado, de eliminar o trabalho e as dificuldades do enterro de
restos culturais, de combater certas moléstias ou pragas das culturas, de limpar e
renovar as pastagens. Entretanto, os prejuízos ocasionados pelo fogo, na destruição
da matéria orgânica e na volatilização do nitrogênio, são de grande importância para
a fertilidade do solo.
As queimadas utilizadas no desbravamento de terras destroem grande parte
da matéria orgânica que a natureza levou anos a formar; essa matéria orgânica e o
nitrogênio que desaparecem são imprescindíveis à integridade produtiva do solo.
Com um pouco de esforço, consegue-se desbravar e limpar o terreno para o plantio
sem lançar mão do fogo; é importante preservar ao máximo a valiosa reserva de
húmus e nitrogênio acumulada na mata.
A queima das pastagens deve ser evitada ou, pelo menos, controlada. Essas
queimas de limpeza e renovação tornam o solo mineralizado e pobre em nitrogênio
e matéria orgânica; depois de alguns anos dessa prática, pode-se observar
mudanças de vegetação espontânea e diminuição da capacidade de suporte das
pastagens.
As queimas que se praticam, anualmente, nas palhaças e restos de cultura,
para facilitar o preparo do solo, são muito mais nocivas. Além dos prejuízos em
matéria orgânica e nitrogênio, o solo perde sua capacidade de absorção e retenção
de umidade e, principalmente, sua resistência à erosão. Os restos culturais podem
162
ser enterrados, deixados na superfície, ou encordoados ao longo de curvas de nível
do terreno, e deixados até se decomporem com o tempo.
Desde remotas eras, o fogo tem sido utilizado, em todos os países, como
instrumento para limpar os terrenos, e sempre houve controvérsia sobre seus
efeitos. Em geral os lavradores partidários de tal prática, por vários motivos,
assumindo maior importância os seguintes: (a) é o único meio, dentro das suas
possibilidades, de conseguir, após a derrubada, a limpeza do terreno, e prepará-lo
para o cultivo; (b) é um sistema econômico de eliminar os restos culturais de um ou
vários anos; (c) diminui as pragas e moléstias. Os técnicos, em geram, são inimigos
da queima, sendo seus argumentos mais frequentes: (a) consome a matéria
orgânica do solo; (b) elimina os microrganismos do solo; (c) volatiliza as substâncias
necessárias à nutrição das plantas; (d) deixa o solo desnudo, aumentando a erosão;
(e) diminui a produção.
É difícil explicar com precisão os fatores que influem na maior produtividade
dos terrenos queimados, nos primeiros cultivos após a queima. Pode-se aceitar
certa influência das cinzes. A elevação do pH e o conteúdo de bases trocáveis
devem ter grande influência no aumento da produtividade. As alterações em
algumas propriedades físicas do solo também merecem ser consideradas: a
estrutura, por exemplo, tem importante papel na fertilidade do solo. A
pedregosidade, a aeração e a permeabilidade aumentam com o tamanho dos
agregados, essas três propriedades têm grande influência no crescimento e na
frutificação das plantas.
Todavia, é um fato indubitável, sabendo-se do efeito que tal prática tem no
considerável aumento das perdas de solo e água pela erosão.
7.2.2. Adubação verde
É a incorporação, ao solo de plantas especialmente cultivadas para esse fim
ou de outras vegetações cortadas quando ainda verdes para serem enterradas.
Essas plantas protegem o solo contra a ação direta da chuva quando estão vivas e,
depois de enterradas, melhoram as condições físicas do solo pelo aumento de
conteúdo de matéria orgânica.
Como sistema de adubação orgânica, a adubação verde tem a vantagem de
ser estabelecida em qualquer cultura e produzida no próprio solo em que vai ser
incorporada. Constitui umas das formas mais baratas e acessíveis de incorporar ao
solo a matéria orgânica; sendo notórios seus efeitos na estabilização e mesmo no
aumento das produções.
As plantas utilizadas como adubo verde podem ser de diferentes tipos;
necessitam, porém, produzir, em pouco tempo, grande quantidade de massa; essa
quantidade, quando incorporada, é que irá determinar a quantidade de húmus
resultante no solo.
Deve-se preferir na adubação verde, as plantas da família das leguminosas,
que, além de matéria orgânica, incorporam também nitrogênio ao solo. As
leguminosas têm a propriedade de possuir bactérias fixadoras de nitrogênio do ar,
163
vivendo em simbiose em suas raízes, tirando destas energia para suas atividades e
fornecendo, em troca, o nitrogênio retirado do ar, que passa, assim, a fazer parte da
constituição da planta: são, por isso, em geral, muito mais ricas em nitrogênio do
que as demais plantas. É conveniente inocular a bactéria apropriada para que se
verifique a fixação do nitrogênio atmosférico; a inoculação faz formar nódulos nas
raízes, produzidos por bactérias da espécie Bacillus radiciola, onde existem várias
raças fisiológicas, além de grupos de inoculação cruzada, nos quais se reúnem
todas as espécies de leguminosas que podem ser inoculadas com a mesma raça de
Bacillus.
A incorporação como adubo verde de plantas não leguminosas ocasiona, em
geral, diminuição da produção da cultura imediata, como consequência do consumo
de nitrogênio do solo pelos microrganismos que produzem a decomposição da
matéria orgânica; torna-se necessário, nesse caso, uma aplicação suplementar de
um fertilizante nitrogenado.
São muitas as espécies de leguminosas que podem ser utilizadas como
adubo verde, e sua escolha dependem, em cada lugar, das condições climáticas,
organização da propriedade agrícola, preço da semente, facilidades de cultivo. Nas
condições brasileiras, destacam-se como principais as seguintes: a mucuna, feijão-
de-porco, o feijão-guandu, as crotalérias, as tefrósias, o lablabe. Em algumas
regiões, podem ser empregadas a alfafa, o trevo, a vigna, alguns tipos de feijão, o
cudzu-tropical, algumas indigóferas.
O plantio de adubos verdes é feito, em geral, na mesma época que o das
demais culturas anuais; por essa razão, o adubo verde requer um ano sem cultura
econômica no terreno. Depois de enterrá-lo, especialmente se se trata de uma
cultura de crescimento denso, deve-se deixar transcorrer duas ou três semanas
antes de começar a sementeira do cultivo principal.
Ao incorporar ao solo grandes quantidades de material orgânico (30 a 40
toneladas por hectare), apresenta-se uma curta deficiência transitória de nitrogênio,
devido à proliferação de bactérias que atacam os tecidos vegetais, as quais utilizam
o nitrogênio em sua alimentação; além disso, durante os primeiros dias de
decomposição, a água da chuva solubiliza alguns constituintes das folhas, que
absorvem oxigênio do solo em proporção tão alta que privam as sementes das
plantas da quantidade necessária para a sua germinação.
7.2.3. Adubação química
A manutenção e restauração sistemática da fertilidade do solo, por meio de
um plano racional de adubos deverá fazer parte de qualquer programa de
conservação do solo. A manutenção da fertilidade é muito importante, uma vez que
proporciona melhor cobertura vegetal do terreno, e, com ela, melhor proteção do
solo.
Com o plantio racional de adubações, consegue-se contrabalancear o declínio
de fertilidade do solo, resultante da retirada normal de elementos nutritivos pelas
colheitas.
164
É, sem dúvida, mais econômico repor regularmente as pequenas diminuições
de fertilidade sofridas pelo solo, forma a manter sempre um nível mínimo necessário
de elementos nutritivos essenciais, do que, após vários anos, tentar restaurar, de
uma só vez, depois que o solo já está empobrecido. Em geral as adubações são
praticadas visando ao aumento de produção da cultura, mas, na realidade,
asseguram a manutenção da fertilidade do solo.
Os elementos nutritivos essenciais que usualmente necessitam ser fornecidos
ao solo, sob a forma de fertilizantes, são o nitrogênio, o fósforo e o potássio. Outros
elementos secundários, como o cálcio, o magnésio, o enxofre, o boro, o manganês,
o zinco e o ferro, em geral, fornecidos com os próprios fertilizantes empregados para
fornecer os três elementos principais.
7.2.4. Adubação orgânica
Na época atual, de preços cada vez mais elevados dos fertilizantes químicos,
é de prever maior consumo, no futuro, da adubação orgânica. Esse assunto é hoje
tão importante que mereceu, recentemente, da FAO, uma conferência especial de
todo o mundo.
A adubação com esterco de curral ou com composto exerce importante papel
de melhoramento das condições para o desenvolvimento das culturas, e, sem
dúvida, dos mais destacados, é a influência da matéria orgânica na redução das
perdas de solo e água por erosão.
O esterco de curral, além de fornecer ao solo a matéria orgânica já em estado
de decomposição e elementos nutritivos, tem a vantagem de fornecer certos
compostos orgânicos que tem uma função estimulante do crescimento das plantas.
O composto é, em geral, formado por detritos orgânicos diversos, tais como
palhas, varredura de terreiros, etc., depois de misturados e curtidos.
Na organização de uma propriedade agrícola, o aproveitamento do esterco
produzido pelos animais e dos demais resíduos orgânicos, na forma de composto, é
um programa fundamental para a manutenção e melhoramento da produtividade do
solo.
A aplicação do esterco ou composto é mais fácil nas culturas perenes, café ou
pomar, de pequenas áreas.
7.2.5. Calagem
A acidez do solo além de certos limites prejudica o desenvolvimento das
plantas cultivadas, diminuindo a sua produção. Nos solos ácidos, o desenvolvimento
de microrganismos é bastante reduzido, principalmente de bactérias fixadoras do
nitrogênio atmosférico; a acidez torna o fósforo do solo dificilmente aproveitável
pelas plantas.
A correção da acidez se faz com a aplicação de cálcio ao solo, na operação
conhecida como calagem. O papel do cálcio aplicado na calagem é neutralizar a
acidez do solo, proporcionando melhores condições para o desenvolvimento das
165
plantas. Em geral, quase todas as culturas se beneficiam pela calagem do solo, e
algumas, como as leguminosas, exigem um solo menos ácido para desenvolver
bem.
A calagem proporciona melhor cobertura vegetal ao solo, o que reflete em
maior proteção contra o impacto das gotas de chuva, diminuindo, portanto, as
perdas de solo e água pela erosão.
7.3. Práticas Mecânicas
As práticas mecânicas de controle da erosão são projetadas e construídas
para conter água da enxurrada, propiciando sua infiltração ou escoamento seguro.
Elas devem proteger o terreno quando ocorrem chuvas muito intensas, canalizando
a água de forma segura. Antes da adoção de qualquer prática conservacionista, é
preciso ter em mente que o solo deve ser utilizado dentro de sua capacidade de uso
(aptidão agrícola) e que todas as operações devem ser realizadas em contorno, ou
seja, seguindo uma curva de nível. A curva de nível é uma linha imaginária, em que
todos os pontos desta linha estão em uma mesma altura ou cota.
7.3.1. Distribuição racional dos caminhos
Esta é uma prática básica na conservação do solo e da água, pois muitas
medidas a serem adotadas se fundamentam na correta disposição das estradas,
porém, geralmente, é negligenciada por agricultores e técnicos. Sabe-se que a
existência de estradas em uma propriedade é fundamental para a realização dos
trabalhos. Quando são bem planejadas, construídas e conservadas, elas facilitam o
desenvolvimento da atividade agrícola e ainda ajudam no controle da erosão.
Infelizmente, na maioria das vezes as estradas e os carreadores são
construídos em linha reta (e não em nível), desconsiderando a topografia do terreno.
São também dispostas erradamente, sem sistemas de drenagem para coleta e
desvio de enxurrada deles proveniente. Recebem também água de glebas vizinhas,
que correm sobre elas, provocando erosão, o que dificulta o trânsito e encarece o
trabalho de manutenção. Além disso, quando as estradas são dispostas em linha
reta, as culturas ficam, quase sempre com ruas “a favor das águas” (morro abaixo),
o que contribui ainda mais para as perdas de solo por erosão.
Para resolver ou minimizar esses problemas, deve-se fazer a distribuição
racional dos caminhos, o que significa colocá-los, ao máximo, próximo ao contorno
(em nível). Desse modo, as estradas ou carreadores principais devem ser locados e
construídos em nível (carreadores em nível ou nivelados), com largura de 5 a 6 m e
uma ligeira inclinação (0,05%) no sentido do barranco.
A água que escorre dos carreadores em pendente deve ser desviada para
bacias de captação ou caixas de retenção devidamente dimensionadas. Pode ainda
ser retirados para os terraços, para um lado, ou os dois lados do canal, por meio de
pequenos canais de desvio. Essa é também uma medida de grande importância
para a conservação das estradas e o controle da erosão. Além disso, as rampas
166
mais lisas devem ser ensaibradas (pedregulhadas), drenados os lugares de
formação de poças, e os barrancos, sempre que possível, devem ser gramados.
Devem-se evitar ao máximo as baixadas sujeitas a alagamento, rampas compridas,
grandes declives e locais onde não se possam controlar as águas.
Outra medida que ajuda a conservar os carreadores é revesti-los com
vegetação rasteira, normalmente gramíneas, controlando seu desenvolvimento
através da roçada, realizada de tempos em tempos, podendo ainda deixar crescer a
vegetação espontânea (mato). A vegetação ajuda a conservar as estradas.
7.3.2. Preparo e plantio em contorno
Realizar cultivos em nível significa fazer as operações de preparo do solo,
plantio e todas as operações de cultivo no sentido transversal à pendente (cortando
o declive), seguindo curvas de nível (linha em nível, linhas em contorno).
Uma linha em nível, ou curva em nível, é aquela que possui todos os pontos
em uma mesma altura no terreno (mesma altitude ou cota).
Os cultivos em nível são feitos com o objetivo de reduzir a erosão, bem como
facilitar os tratos na lavoura. Numa área cultivada em nível ou em contorno, como as
operações são feitas praticamente em nível, cada fileira de plantas, assim como
pequenos sulcos e leiras, e também restos culturais deixados na superfície são
dispostos de maneira que formam barreiras que dificultam o percurso livre da
enxurrada, diminuindo sua velocidade e sua energia, aumentando,
consequentemente, a infiltração da água no solo.
Tanto as culturas anuais como as perenes, inclusive pastagens e
reflorestamento, devem ser implantadas e conduzidas em nível ou contorno.
Contudo, o cultivo em nível é apenas uma das muitas práticas conservacionistas,
devendo, portanto ser associada a outras práticas conservacionistas, principalmente
quando a área apresenta declive maior que 4%.
A efetividade do cultivo em nível diminui: dos solos argilosos para os
arenosos; à medida que a declividade do terreno aumenta; e das culturas mais
densas (fecham mais) para as menos densas. A eficiência dos cultivos em contornos
deve-se, principalmente, à conservação da água, aumentando a umidade do solo.
Além de aumentar a produção das culturas, o plantio em contorno reduz as perdas
de solo e da água.
7.3.3. Sulcos e Camalhões em pastagem
A pastagem é tida como uma prática vegetativa de controle da erosão, devido
à proteção que as gramíneas oferecem ao solo. No entanto, em determinadas
situações, outras práticas são requeridas para se evitar que o processo erosivo
cause danos à pastagem.
Apesar de pouco difundido no Brasil, a prática normalmente recomendada
para pastagens é a construção de sulcos e camalhões em contorno, especialmente
em regiões com pouca chuva. Pastagens em formação, onde a vegetação ainda não
167
esteja proporcionando cobertura eficiente, em terrenos muito inclinados e/ ou pastos
fracos e excessivamente pastoreados são situações em que os sulcos e camalhões
são indicados e eficazes.
Os sulcos e camalhões são equivalentes a um terraço de dimensões
reduzidas, construídos em contorno (a partir de linhas de nível), com arados
reversíveis, de aiveca ou de disco, tombando a terra sempre para o lado de baixo.
Uma ou duas passadas no mesmo sulco são suficientes para sua construção. Outra
opção seria a construção de sulcos em contorno ou de camalhões em contorno,
isoladamente, e não formando um conjunto.
O espaçamento entre os sulcos e camalhões depende das características do
solo (textura e estrutura), que afetam diretamente a capacidade de infiltração de
água no solo, da maior ou menor quantidade de vegetação que possa ser destruída
na operação de construção. Para a determinação do espaçamento devem ser
considerados o tipo de solo e a declividade do terreno, podendo-se adotar os
critérios e quadros empregados para terraços. Em terrenos inclinados é
recomendada a ressemeadura nos sulcos, visando estabelecer a vegetação mais
rapidamente.
De modo geral, não se recomenda a construção de sulcos e camalhões em
muitos solos arenosos, pois estes promovem rápida infiltração da água,
dispensando, normalmente, estruturas que promovem maior retenção de umidade.
7.3.4. Mulching vertical
A cobertura permanente do solo e a consolidação e a estabilização da
estrutura do solo, embora otimizadas pelo sistema plantio direto, mesmo assim não
propiciam condição suficiente para disciplinar a enxurrada e, consequentemente,
não constituem meio seguro de controle adequado da erosão hídrica. Esse processo
assume relevância, fundamentalmente, em topossequência em que o comprimento
do declive induz à enxurrada energia cisalhante superior à resistência imposta pela
cobertura vegetal e pelo próprio solo. Assim, no sistema plantio direto, a enxurrada,
além, de representar potencial erosivo, decorrente da energia de cisalhamento,
indubitavelmente constitui veículo de transporte de solutos aos mananciais de
superfície, representando riscos ao equilíbrio do ambiente.
O mulching vertical, em razão das características de construção, que não
interferem na praticidade operacional da lavoura, representa técnica
conservacionista potencial para manejo de enxurrada, e, consequentemente, para
controle de erosão hídrica, em áreas sob sistema plantio direto.
A prática conservacionista mulching vertical é constituída por sulcos, locados
e construídos em nível, com 0,075 a 0,095 m de largura e 0,4 m de profundidade,
preenchidos com resíduos vegetais. É em razão da reduzida largura do sulco que o
mulching vertical não interfere nas operações motomecanizadas requeridas para a
condução da lavoura.
O espaçamento horizontal entre os sulcos, à semelhança da estimativa dos
afastamentos horizontal e vertical entre terraços, pode ser estimado pelo método da
168
máxima chuva esperada para determinado período de retorno. Entretanto,
espaçamentos da ordem de 10 m entre sulcos têm demonstrado resultados
satisfatórios.
Além do efeito direto da redução do escoamento superficial, há efeitos
indiretos de correntes do uso da prática mulching vertical. Dentre esses se
destacam: adição de material orgânico em profundidade no solo; redução de perdas
de resíduos culturais provocada pela enxurrada, principalmente em lavouras de
milho; rompimento da camada compactada (pé-de-arado), que proporciona elevação
da taxa de infiltração da enxurrada; retardamento do pico de enxurrada, que
ameniza os riscos de enchente; e redução da perda de nutrientes e do transporte de
defensivos agrícolas, com potencial de contaminação ambiental.
Apesar da prática mulching vertical requerer ainda estudos de validação em
diferentes condições de solo e de clima e de aprimoramento do equipamento para a
deposição de palha no sulco, apresenta-se como uma interessante alternativa para o
controle do escoamento superficial, principalmente em talvegues de elevada
propensão à concentração de enxurrada. Há possibilidades de o mulching vertical
ser implementado em áreas cultivadas com culturas perenes e, inclusive, no canal
de terraços, objetivando elevar a capacidade de infiltração de água no solo. Em
áreas de pastagens, todavia, requer criteriosa observação, principalmente
envolvendo o risco de acidentes como os animais ao transporem os sulcos.
7.3.5. Bacias de captação e Retenção de Águas Pluviais Provenientes de
Estradas
Para construção das estradas faz-se necessária a retirada da cobertura
vegetal do solo e sua compactação e/ou impermeabilização. Isso faz com que a
infiltração da água no leito da estrada seja nula. A água que não se infiltra é
normalmente direcionada para as laterais, aonde vão se acumulando e aumentando
de velocidade ao longo da pendente.
Sabe-se que a água promove erosão no solo se atingir velocidade erosiva,
que será tanto maior quanto maior for o volume de enxurrada. Dessa maneira, a
captação estratégica da água, impedindo a formação de grandes massas e de
velocidade erosiva, é a solução para a conservação das estradas e traz, como
benefícios indiretos, a alimentação dos aquíferos subterrâneos.
O comprimento e o declive de rampa são os principais fatores para o aumento
da velocidade da enxurrada. Na prática, pode-se assumir que a quadruplicação do
comprimento de rampa triplica a perda de solo por unidade de área. Alterar o declive
de uma rampa às vezes é difícil; entretanto, parcelar o seu comprimento é fácil e os
resultados excelentes. Este é o princípio básico de um sistema de terraceamento e
que também pode ser utilizado para o controle de erosão nas estradas se, associado
a isso, a água for direcionada e captada em bacias – as bacias de retenção.
Analisando o ciclo hidrológico, verifica-se que a água da chuva tem vários
caminhos: evaporação, infiltração e escoamento. Este último provoca problemas de
erosão. A infiltração é o caminho ideal a ser dado à água da chuva, visto não
169
provocar erosão e abastecer o lençol freático. A água da chuva, visto não provocar
erosão e abastecer o lençol freático. A água da enxurrada é um desperdício enorme,
principalmente se for considerada a grande preocupação atual com o bem água.
Nas estradas, onde a infiltração é nula, torna-se cada vez mais importante conseguir
seu aproveitamento racional.
A tecnologia proposta para obter a melhor conservação das estradas e
preservação das condições ambientais é simples e baseia-se no cálculo do volume
de água a ser captado, considerando-se a área da estrada e a precipitação
pluviométrica média anual.
7.3.6. Terraceamento
Terraço é um conjunto formado pela combinação de um canal (valeta) com
um camalhão (monte de terra ou dique), construído a intervalos dimensionados, no
sentido transversal ao declive, ou seja, feitos em nível ou em gradiente, cortando o
declive. É uma estrutura mecânica, cuja construção envolve a movimentação de
terra, através de cortes e aterros. Permite a contenção de enxurradas, forçando a
absorção da água da chuva pelo solo, ou a drenagem lenta e segura do excesso de
água. Desse modo, o terraceamento é a prática de terracear, e terracear é construir
terraços.
Figura 1. Partes Componentes de um Terraço
Sabe-se que quanto maior o comprimento da rampa (da encosta), maiores
são a velocidade e o volume da enxurrada, e maior a sua energia capaz de arrastar
o solo, promovendo a erosão. Com base nesse raciocínio, o princípio de
funcionamento do terraço baseia-se no parcelamento do declive, isto é, dividir uma
rampa comprida (mais sujeita à erosão) em várias rampas menores, mais curtas
(menos sujeitas à erosão). Cada terraço protege a faixa que está logo abaixo dele
ao receber as águas da faixa que está acima.
A função do terraço, portanto, é reduzir a concentração e velocidade da
enxurrada, dando à água maior tempo para infiltração e limitando a sua capacidade
de causar erosão.
Quando um terraço é mal construído, poderá ocasionar muito mais danos do
que benefícios. Isso se dá pelo fato de que, quando um terraço se rompe, a água
armazenada em grande volume terá maior capacidade de provocar sulcos de erosão
e até voçorocas, podendo levar à inutilização da área.
170
Figura 2. Vista parcial da água da enxurrada retida em um terraço.
O terraço deve ser construído onde outras práticas mais simples não sejam
suficientes para o controle adequado da erosão, tendo em vista o seu alto custo. Por
outro lado, é mais eficiente quando utilizado em combinação com outras práticas,
como o ajustamento das glebas à sua capacidade de uso, o plantio em contorno, a
cobertura morta e cultura em faixas entre outras.
O terraceamento está diretamente ligado aos seguintes fatores: tipo de solo,
declividade do terreno e quantidade de chuvas.
7.3.6.1. Classificação dos Terraços
Os terraços podem ser classificados quanto: à função que exercem; à largura
da base; ao processo de construção; à forma do perfil do terreno; e ao alinhamento.
7.3.6.1.1. Quanto à função
7.3.6.1.1.1. Terraços em nível (de retenção, absorção ou de infiltração):
Este terraço é construído em nível (sobre uma curva em nível marcada no
terreno) e tem suas extremidades fechadas. Sua função é armazenar o excedente
de enxurrada por ele interceptado, para que infiltre lentamente no perfil do solo. É
recomendado para terrenos com boa permeabilidade no perfil do solo.
7.3.6.1.1.2. Terraços com gradiente, em desnível, com declive ou de
escoamento
É um terraço que apresenta declive suave, constante (uniforme) ou variável
(progressivo), com uma ou as duas extremidades abertas. Sua função é acumular o
excedente de água e conduzí-la para fora da área protegida, até um canal
escoadouro, sem que haja erosão no leito do canal.
O terraço com gradiente é recomendado para terrenos de permeabilidade
baixa (lenta) ou moderada, como solos que apresentam B textural (pouco
171
permeáveis no horizonte B) e solos rasos como os Neossolos Litólicos e
Cambissolos. Além disso, são recomendados para regiões de precipitações
elevadas e de até 20% de declividade.
Quadro 1. Vantagens e desvantagens dos terraços em nível e com gradiente
A decisão de quando se utilizar terraço em nível e quando utilizar terraço com
gradiente, além das vantagens e desvantagens que apresentam, dependerá: da
permeabilidade do solo e do subsolo; da intensidade das chuvas; e da necessidade
de se conservar/aumentar a umidade do solo. Este último fator deverá ser
considerado para regiões onde a disponibilidade de água é baixa. O terraço de
infiltração é indicado para retenção de água na área de interesse. Além do controle
da erosão, consegue-se abastecer e manter os lençóis subterrâneos.
7.3.6.1.2. Quanto à largura da base
A largura, ou base, de um terraço corresponde à área de movimentação da
superfície do solo, incluindo canal e camalhão.
Quanto à largura, os terraços podem ser classificados em:
7.3.6.1.2.1. Terraço de base estreita
Este terraço apresenta uma largura de base entre 2 a 3 m (Figura 1).
Normalmente é indicado para área de 12 a 18% de declividade. Neste tipo de
terraço não se pode cultivar no canal nem sobre o camalhão. Pode ser construído
utilizando equipamentos manuais e de tração mecânica ou animal. Algumas
situações peculiares podem alterar essa recomendação.
172
Figura 1. Terraço de base estreita
7.3.6.1.2.2. Terraço de base média
A faixa da superfície movimentada no terraço de base média varia de 3 a 6 m
(Figura 2). Ele é indicado para áreas com declives de 8 a 12% e pode ser
construído tanto com arado de arraste quanto com levante hidráulico. O
camalhão deste tipo de terraço pode ser cultivado e o canal não deve ser cultivado.
Figura 2. Terraço de base média.
7.3.6.1.2.3. Terraço de base larga
Este terraço possui uma base de 6 a 12 m (Figura 3), sendo recomendado
para áreas com relevo suave ondulado a ondulado e declividade de até 12%,
preferencialmente de 6 a 8 %.Em solos de boa permeabilidade podem ser utilizados
em terrenos com declividade de até 20%. Possibilita a utilização de máquinas no
plantio, mesmo dentro do canal e sobre o camalhão, o que permite fazer, na própria
operação de preparo do solo, a sua manutenção. Essas características compensam
seu alto custo de construção e normalmente é construído em nível.
173
Figura 3. Terraço de base larga.
7.3.6.1.3. Quanto ao processo de construção
Quanto ao processo de construção, os terraços podem ser classificados como
tipo Nichol’s e tipo Mangum.
7.3.6.1.3.1. Tipo Nichol’s ou canal
Neste tipo de terraço, a superfície do solo é cortada e tombada sempre de
cima para baixo, formando um canal relativamente profundo e de forma triangular
(Figura 4 e 5). O arado reversível possibilita um bom rendimento na construção
deste tipo de terraço (aula prática de construção de terraço). A principal
desvantagem deste tipo de terraço é que a faixa em que é construído o canal não
pode ser aproveitada para o cultivo. É indicado para declives inferiores a 18%.
Figura 4. Terraço tipo Nichol’s.
Figura 5. Terraço tipo Nichol’s ou canal
174
7.3.6.1.3.2. Tipo Mangum ou camalhão
Na construção deste terraço, corta-se a superfície do solo nos dois lados,
tombando-a para o centro, de modo a formar um camalhão entre dois canais (Figura
6). Apresenta canal mais largo e raso e uma maior capacidade de armazenamento
que o terraço tipo Nichols. A capacidade de armazenamento é determinada
predominantemente pelo camalhão, pois a profundidade do corte do terreno
corresponde à profundidade normal de aração. É construído normalmente com
arado fixo, mas o arado reversível também pode ser utilizado. Normalmente, é
recomendado para áreas com declives até 8 ou 12%.
Figura 6. Terraço tipo Mangum.
Figura 7. Terraço tipo mangum ou camalhão
7.3.6.1.4. Quanto à forma do perfil do terreno
7.3.6.1.4.1. Terraço comum
É o tipo de terraço mais usado e é a combinação de um canal com um
camalhão construído em nível ou com gradiente, cuja função é interceptar a
enxurrada, forçando sua absorção pelo solo ou a retirada do excesso de água de
maneira mais lenta, sem provocar erosão (Figura 8). Pode ser construído com
arados terraceadores, arados de discos, arados de aivecas, lâmina frontal ou
175
mesmo com motoniveladora. Em pequenas propriedades, pode ser construído com
implementos puxados a tração animal ou mesmo com ferramentas manuais.
Figura 8. Terraço comum
A declividade máxima recomendada para sua construção é de 20%. Deve ser
combinado com práticas vegetativas e sistemas de manejo que proporcionem
proteção superficial, amenizando o impacto das gotas da chuva.
7.3.6.1.4.2. Terraços tipo Patamar
É construído através da movimentação de terra com cortes e aterros, que
resultam em patamares em forma de escada (Figura 9 e 10). A plataforma do
patamar deve apresentar pequena inclinação em direção ao seu interior e um
pequeno dique, a fim de evitar o escoamento da água de um terraço para outro, o
que poderia provocar erosão no talude.Pode ser contínuo (semelhante a terraços)
ou descontínuo (banquetas individuais). É indicado para terrenos acima de 20% de
declividade.
Figura 9. Seção transversal típica do terraço tipo patamar.
176
Figura 10. Terraço tipo patamar em vinhedo com taludes protegidos com
vegetação
No patamar deve ser plantada a cultura, e o talude deve ser recoberto com
vegetação rasteira (como grama por exemplo), desde que não seja invasora, para
manter a sua estabilidade. Em solos pouco permeáveis, este tipo de prática não é
indicado.
Tendo em vista a sistematização que é feita na área, este tipo de terraço,
além de controlar a erosão, facilita as operações agrícolas. É construído
manualmente ou com trator de esteira equipado com lâmina frontal. Em virtude de
seu alto custo de construção, é normalmente recomendado, em razão da viabilidade
econômica, para exploração de culturas de alta rentabilidade econômica.
7.3.6.1.4.3. Terraços tipo Banquetas Individuais
Quando o terreno apresenta obstáculos como pedras ou afloramento de
rochas ou existe deficiência de máquinas ou implementos para construção do
terraço tipo patamar, pode ser utilizada uma variação deste tipo de terraço, chamada
de banquetas individuais ou patamar descontínuo (Figura 11).
São bancos construídos individualmente para cada planta, onde a
movimentação de terra se dá apenas no local onde se vai cultivar. São indicados
para culturas perenes, como café, árvores frutíferas, etc. As ferramentas
empregadas são manuais, como enxada e enxadão, porque são construídas em
áreas com declividade bastante acentuada, sendo impraticável o uso de máquinas.
177
Figura 11. Terraço tipo banquetas individuais.
Inicialmente, retira-se toda a camada superior mais fértil que é amontoada ao
lado da área onde vai ser construída a banqueta. Em seguida faz-se o corte no
barranco e aproveita-se a terra retirada no corte para fazer o aterro. Da mesma
forma que o patamar, acerta-se a superfície da plataforma com ligeira declividade no
sentido inverso ao da declividade original do terreno. Vegeta-se com gramas a parte
de aterro para melhor estabilidade e, finalmente, espalha-se a terra raspada da
superfície, a fim de a fertilidade da banqueta.
7.3.6.1.4.4. Terraços tipo Murundum
É o termo utilizado para terraço construído raspando-se o horizonte superficial
do solo (horizonte A), por tratores que possuem lâmina frontal, e amontoando-a para
formar um camalhão de avantajadas proporções (pode chegar a mais de 2 m)
(Figura 12). Normalmente este tipo de terraço, praticado em áreas de cultivo de
cana-de-açúcar, não segue um dimensionamento adequado. Visando facilitar o
trânsito de máquinas e caminhões na área agrícola, a distância entre eles é maior do
que a recomendada para os terraços comuns. Erradamente tenta-se compensar
esta medida aumentando a dimensão do camalhão para segurar maior volume de
água.
Figura 12. Terraço tipo Murundum.
Uma limitação apresentada por este tipo de terraço é que a remoção da
camada mais fértil do solo prejudica o desenvolvimento das plantas na área que foi
178
raspada. Além disso, por requerer grande movimentação de terra, seu custo de
construção é elevado. Pelo fato de ser locado com distâncias maiores, apresenta
erosão acentuada e está sujeito a rompimento. Da forma como é construído não é
economicamente recomendável.
7.3.6.1.4.5. Terraço tipo embutido
É mais difundido em área de cana-de-açúcar e sua forma assemelha-se à dos
murunduns. É construído de forma que o canal tenha forma triangular, ficando os
talude que separa o canal do camalhão praticamente na vertical (Figura 13). Visto de
cima, assemelha-se a uma veneziana deitada. Apresenta pequena área inutilizada
para o plantio, sendo construído normalmente com motoniveladora ou trator de
lâmina frontal.
7.3.6.1.4.6. Terraços não-paralelos
Os terraços não-paralelos são os mais comuns, pois são aqueles locados
sobre as linhas niveladas básicas. Devido às irregularidades na declividade do
terreno, os terraços construídos sobre as linhas niveladas básicas não são paralelos.
A distância ou espaçamento entre os terraços é variável ao longo da área
terraceada. O paralelismo só ocorre no caso de a área não apresentar
irregularidades em sua declividade.
7.3.6.1.4.7. Terraços paralelos
São construídos com espaçamento constante ao longo de toda sua extensão.
Para implantação deste tipo de terraço é necessário um planejamento minucioso,
baseado fundamentalmente no levantamento planialtimétrico da área. A área na qual
os terraços serão locados deverá ser sistematizada, realizando-se cortes e aterros
no local, tornando-os paralelos.
179
A grande vantagem deste tipo de terraço é que ele reduz o número de
linhas mortas e as curvas muito estreitas, economiza tempo no preparo, cultivo e
colheita e, ainda, diminui os prejuízos relativos à destruição de plantas devido à
manobra de máquinas. Entretanto, o custo de implantação é bastante elevado.
7.3.6.2. Levantamentos preliminares para construção
de terraços
Devem-se realizar amostragens de solos para determinação da textura, da
permeabilidade e da presença de camadas compactadas no solo, de acordo com os
seguintes passos: Coletar amostras de solos para análises de solo, principalmente
física; observar profundidade efetiva por meio de cortes em beira de estradas;
observar a existência de camadas mais duras utilizando a dificuldade à penetração
da faca; abrir trincheiras dentro da área para se fazer a observação descrita
anteriormente; medir a declividade do terreno; obter informações a respeito da
quantidade de chuva que normalmente ocorre na região. Determinar a cultura,
sequência ou rotação que será explorada na área a ser terraceada.
7.3.6.2.1. Espaçamento entre terraços
Por espaçamento entende-se a distância entre um terraço e outro. Pode ser
referido de duas maneiras: espaçamento vertical ou espaçamento horizontal. O
Espaçamento Vertical (EV) entre dois terraços corresponde à diferença de nível
entre eles - significa quantos metros se desce no terreno de um terraço até o outro.
Se se considerar que o terraço pode ser construído ao longo de uma linha de nível
(curva de nível) e que esta corresponde à linha de interseção de um plano inclinado
cortado por um plano horizontal. Pode-se também definir o espaçamento vertical
entre dois terraços como sendo a distância entre os dois planos horizontais que
180
passam por eles (Figura 14A). Este conceito é muito útil na locação de terraço com
nível topográfico. A Figura 14B representa a vista do ponto Y.
Figura 14. As linhas L1e L2correspondem às interseções dos planos
horizontais B e C com o plano inclinado (A). Projeção vista do ponto Y, mostrando as
linhas L1e L2(B).
O Espaçamento Horizontal (EH) representa, em linha reta (medido na
horizontal), quantos metros separam os terraços. Pode ser também definido como a
distância entre dois planos verticais que passam por dois terraços (Figura 15A).
Figura 15. Vista frontal da Figura 1A, do ponto X (A). Seções transversais dos
terraços P1 e P2, construídos ao longo das linhas L1e L2, respectivamente (B).
Se observássemos a Figura 14A do ponto X, sua representação seria como
apresentada na Figura 15A, onde as linhas a, b e c representam os planos A, B e C
e os pontos P1e P2 representam as linhas de interseção L1e L2, do plano A cortado
pelos planos B e C (Figura 14A), ao longo das quais os terraços podem ser
construídos. Fazendo dois planos verticais representados pelas linhas r e s
passarem pelos terraços P1 e P2 respectivamente, a distância entre eles
corresponde ao espaçamento horizontal (EH) entre os terraços P1 e P2. A Figura
15B representa as seções transversais dos terraços P1 e P2, construídos ao longo
das linhas L1 e L2, respectivamente. O espaçamento real, ao longo da superfície do
terreno, é diferente do espaçamento horizontal como anteriormente definido. Ele
pode ser calculado, mas na prática, estica-se horizontalmente uma trena e marca-se
a posição do ponto por onde o terraço deverá passar. Porém, quando a marcação é
181
feita com nível topográfico usando-se o espaçamento vertical, o espaçamento
horizontal fica automaticamente marcado.
7.3.6.2.1.1. Espaçamento entre terraços em declividades
variáveis
A Figura 16 mostra os planos inclinados, representados pelas linhas a (45º) e
b (20º), cortados pelos planos horizontais, representados pela linha d que passa
pelos terraços P2 e P3, e os planos verticais representados pelas linhas n, s e t que
passam pelos terraços P1, P2 e P3, respectivamente. Na Figura 16A pode-se
observar que as distâncias verticais entre P1-P2 e P1-P3 são iguais e que a
distância horizontal entre P1-P2 é menor que a distância horizontal entre P1-P3.
Com os valores das distâncias horizontais entre P1-P2 e P1-P3, tem-se a Figura
16B.
Figura 16. Planos inclinados a (45º) e b (20º) cortados pelos planos
horizontais d e c e pelos planos verticais r, s e t (A). Comportamento esquemático
dos terraços quando em locais de declividade variável (B).
Esta figura mostra que, em terrenos de declividades variáveis, para uma certa
distância vertical, a distância horizontal entre terraços varia com a declividade do
terreno, ou seja, os terraços se aproximam quando a declividade aumenta e se
afastam quando a declividade diminui. Quando a declividade do terreno é uniforme,
os terraços se mantêm paralelos.
7.3.6.2.1.2. Fatores que afetam o espaçamento entre
terraços
Basicamente, o espaçamento entre dois terraços deve ser tal que a enxurrada
que escorre entre eles não alcance velocidade erosiva. Quanto maior a distância
entre os terraços, menor o custo de construção por unidade de área, porém esse
espaçamento máximo tem o limite da eficiência prática. Cada um deles deve ter
capacidade suficiente para receber a enxurrada que escorreu na faixa limitada pelo
182
que foi construído na parte superior e conduzi-la ou absorvê-la, conforme o caso,
isto é, se o terraço é de escoamento ou de infiltração. Os principais fatores que
afetam a distância entre terraços são: clima, solo, declividade, tipo de cultura e tipo
de terraço.
7.3.6.2.1.3. Clima
Deve ser considerados, principalmente, a intensidade, a energia e a
freqüência das chuvas.
7.3.6.2.1.3.1. Intensidade
Pode-se considerar que enxurrada é igual à quantidade de chuva caída
subtraída da quantidade desta chuva que infiltrou. Para uma certa capacidade de
infiltração, quanto mais intensa for a chuva, maiores serão o volume e a velocidade
da enxurrada e, consequentemente, maior a sua energia cinética (força capaz de
desprender as partículas do solo e arrastá-las). Em regiões sujeitas a chuvas de alta
intensidade deve-se diminuir a distância entre terraços para reduzir a velocidade e
consequentemente a energia cinética da enxurrada. Se a chuva for de baixa
intensidade, grande parte dela se infiltra no solo, reduzindo o volume da enxurrada.
Se a capacidade de infiltração do solo for igual ou maior que a intensidade da chuva,
não haverá enxurrada.
7.3.6.2.1.3.2. Energia
A gota de chuva, ao cair, adquire energia, que está relacionada com o seu
tamanho e à velocidade de queda. Quando maior a energia da chuva, maior a sua
capacidade de desagregar o solo, arrastar suas partículas e causar erosão.
7.3.6.2.1.3.3. Freqüência
A infiltração de água no solo é mais rápida e maior quando ele está seco, mas
tende a se reduzir com o decorrer da chuva. Chuvas freqüentes caindo em solo
úmido, próximo à saturação e com sua capacidade de infiltração já reduzida,
acarretarão maiores volumes de enxurradas e, conseqüentemente, maiores riscos
de erosão.
Em regiões onde ocorrem chuvas freqüentes e de alta intensidade na época
de plantio, quando o solo está desagregado e desprotegido contra o choque das
gotas de chuvas e do movimento de enxurrada, a erosão torna-se extremamente
severa. Nestas condições, torna-se imprescindível reduzir a distância entre os
terraços, para diminuir o volume, a velocidade e a energia da enxurrada e,
conseqüentemente, a sua capacidade de transportar o solo.
7.3.6.2.1.3.4. Declividade
183
A declividade representa a inclinação do terreno e pode ser expressa em
graus ou percentagem. Como regra geral, quanto maior a declividade, mais
próximos são os terraços e vive-versa. Este efeito é explicado pelo movimento do
corpo num plano inclinado.
7.3.6.2.1.4. Tipo de cultura
Desconsiderando aspectos das culturas, como manejo, tratos culturais,
consorciação e cobertura vegetal do solo, pode-se afirmar que: nas culturas anuais,
o preparo do terreno desagrega o solo, que fica solto, e favorece a ação da
enxurrada, que facilmente transporta o solo. Por esta razão, nas culturas anuais, a
distância entre dois terraços deve ser reduzida. Culturas perenes como café,
pomares, seringueira etc., em que o espaçamento entre as plantas é grande e o
plantio é feito em covas, a distância entre os terraços pode ser maior, pois, nestas
condições, a enxurrada terá que utilizar parte de sua energia para desagregar o solo
antes de transportá-lo. No entanto, em sistemas de cultivo conservacionista como o
cultivo mínimo e, principalmente, o plantio direto, a proteção dada ao solo,
permitindo que o sistema se comporte de maneira semelhante a um cultivo de
culturas perenes.
7.3.6.2.1.5. Tipo de solo
Os parâmetros a serem considerados são aqueles que afetam a infiltração de
água, como textura, estrutura, presença de camadas adensadas no perfil do solo e
coerência entre partículas e/ou agregados. Essas características variam com a
classe de solo e devem ser observadas de acordo com o solo predominante na
região onde se vai trabalhar. Os solos argilosos englobam vários solos com perfis e
características bem distintos.
Levantamentos devem ser feitos anteriormente à implantação do sistema de
terraceamento, para averiguação da permeabilidade apresentada por esses solos.
De maneira geral, aqueles que apresentam B textural (horizonte B com teor de argila
mais elevado que o horizonte superficial - horizonte A) mostram problemas
relacionados à infiltração da água, requerendo terraços mais próximos. A condição
de baixa permeabilidade quase sempre conduz o técnico a trabalhos com terraços
com gradiente para escoamento da água.
Solos de textura média tendem a apresentar baixa infiltração e grande volume
de enxurrada, requerendo terraços mais próximos. Novamente, nesta situação o
técnico opta pelo terraço com gradiente em substituição aos nivelados.
Solos arenosos com predominância de areia grossa na sua constituição
apresentam alta capacidade de infiltração e baixo potencial erosivo. Neles, o
espaçamento entre os terraços pode ser maior, e os técnicos normalmente
recomendam a construção de terraços em nível.
De maneira geral, considerando-as classes de solos, os Cambissolos e os
Neossolos Litólicos são mais suscetíveis à erosão, e os Latossolos, menos. Desse
184
modo, quando permitido, os primeiros deverão ter terraços maispróximos e os
segundos mais distantes. Os Argissolos encontram-se em uma posição
intermediária.
7.3.6.2.1.6. Tipo de terraço
Para uma mesma situação de clima, cultura a ser implantada e declive, a
decisão sobre a construção de um sistema de terraceamento em nível ou gradiente
será tomada em função da permeabilidade do solo. De maneira que os terraços em
nível deverão estar mais próximos comparativamente aos terraços com gradiente.
7.3.6.3. Cálculos para a dimensão de terraços
7.3.6.3.1. Exemplo de cálculo de espaçamento entre
terraços
Cálculo das distâncias vertical e horizontal entre
terraços
O espaçamento vertical pode ser calculado por várias fórmulas, porém a mais
usada é a de Bentley:
em que:
EV = espaçamento vertical em metros;
D% = declividade em percentagem; e
X = fator resultante da interação: solo, declividade, cobertura
vegetal e tipo de terraço, encontrado em quadros especiais
(Quadro 2).
Calcule o espaçamento vertical (EV) e o horizontal (EH) entre terraços em
nível para a bacia de 60 ha a ser utilizada com culturas anuais, apresentando declive
médio de 15%, respectivamente. A classe de solo predominante é o Luvissolo Tipico
Órtico (textura média).
185
Quadro 2. Valores x para aplicação da fórmula de Bentley conforme os tipos
de práticas conservacionistas, culturas e solo
Exemplo:
Dados:Cultura: milho; Área: 60 hectares; Classe de solo: Luvissolo Tipico
Órtico (textura média); Terraço nivelado;Declividade: 15%;
X = Tabelado (Quadro 2); e Determinar EV e EH.
a) Determinação do valor de X:
No Quadro 2 abaixo do termo “terraços”, encontra-se o termo “culturas
anuais”. Abaixo de “culturas anuais”, na coluna 2, encontra-se “nivelado”. Abaixo de
“terraço nivelado” encontram-se os tipos de solos: “argiloso”, “médio” e “arenoso”.
Seguindo a linha correspondente ao “solo médio” até a última coluna, encontra-se o
valor de X igual a 5,0 para as condições propostas.
b) Determinação a declividade do terreno (D) = 15%.
c) Calcular o Espaçamento Vertical (EV). Substituindo, na fórmula de Bentley,
X e D pelos seus respectivos valores, tem-se:
d) Calcular o Espaçamento Horizontal (EH)
O espaçamento horizontal (EH) pode ser calculado em função da declividade
do terreno, expressa em porcentagem (D%), e do espaçamento vertical entre os
terraços (EV), pela semelhança entre triângulos. Por exemplo a declividade de 10%
186
significa que para 100 m horizontais têm-se 10 m verticais. Assim, pode-se
estabelecer a seguinte regra de três:
100 m horizontais __________ 15,00 m verticais
EH __________ 1,53 m verticais
Considerando a possibilidade de transformar o cálculo anterior em formula,
tem-se:
7.3.6.3.2. Comprimento dos Terraços
Deve-se considerar se os terraços são em nível ou com gradientes.
Nivelados
Teoricamente, o comprimento do terraço em nível não tem limite. Por medida
de segurança, recomenda-se construir “travesseiros” (Figura 17), que são pequenos
diques ou barreiras de terra batida dentro do canal, distanciados de 100 a 200 m.
Evita-se que, em caso de arrombamento do terraço, toda a água nele acumulada vá
atingir o terraço de baixo. Essas barreiras, porém, dificultam os trabalhos de
manutenção dos terraços.
187
Figura 17. Terraços com “travesseiros” em cafezal.
Com gradiente
Os terraços em desnível devem apresentar uma pequena inclinação para um
lado ou para os dois lados. A inclinação do canal deve ser criteriosamente
dimensionada, afim de que a água não cause erosão dentro do terraço. O
comprimento normalmente recomendado para terraços com gradiente é de 500 a
600 m. Quando a área a ser terraceada apresenta dimensões maiores,
principalmente quando o terreno for de baixa permeabilidade e/ou o solo for bastante
degradado pela erosão, e as condições topográficas permitirem, deve-se procurar
reduzir o comprimento dos terraços.
Para isso, dois artifícios podem ser usados:
Locar canais escoadouros, nas duas
extremidades laterais, e orientar o gradiente dos terraços para eles, a partir
de uma linha de crista localizada na parte central da área (Figura 18).
Figura 18. Esquema de locação dos canais escoadouros nas extremidades
laterais dos terraços.
188
Construir o canal escoadouro na parte central do
terraço e orientar o gradiente dos terraços para ele (Figura 19).
Figura 19. Esquema de locação do canal escoadouro na parte
central do terraço.
Declividade dos terraços com gradiente
Os terraços podem ter gradiente constante, ou o gradiente pode aumentar
progressivamente. Quando o gradiente for fixo, pode-se usar 0,3% e, quando ele for
progressivo, começa-se em 0,1% e vai aumentando até chegar em 0,5%.No quadro
seguinte sugere-se o aumento do gradiente com a distância do terraço.
Quadro 3. Gradiente dos terraços em desnível em função do comprimento
Para solos arenosos, a declividade não deve não passar de 0,3% e em solos
argilosos, até 0,5% (600 m). O gradiente de 0,3% significa que a cada 100 m
descem 30 cm; a cada 50 m descem 15; e a cada 10 m descem 3 cm.
Na locação do terraço, para facilitar o trabalho, bater estacas de 10 em 10 m;
a cada 10 m desce em direção ao caimento. Se o gradiente for de 0,2%, a cada 10
m, descem 2 cm.O caimento do terraço pode ser para um dos lados ou para os dois
lados, para dentro ou para fora da área.A Figura 20 mostra o sentido que o caimento
dos terraços com gradiente pode apresentar.
189
Figura 20. Sentidos do caimento dos terraços com gradiente .
A quantidade de enxurrada que cai na parte inicial do terraço com gradiente é
pequena, mas aumenta ao longo do terraço, exigindo maior capacidade de vazão à
medida que a quantidade de enxurrada aumenta. A capacidade de escoamento de
um terraço é afetada pela seção do canal, profundidade e declividade do terraço.
Estes fatores podem ser ajustados de modo a dar ao terraço uma capacidade de
escoamento compatível com o volume de enxurrada a ser transportado sem,
contudo, permitir que ela adquira velocidade erosiva. Esta velocidade crítica varia
com a natureza do solo em que o terraço é construído e com a natureza do
revestimento do canal. Os terraços com gradiente necessitam de um local onde se
possa jogar com segurança a água escoada por eles. As estruturas que
desempenham essa função são chamadas de canal escoadouro (o qual será
abordado mais adiante).
7.3.6.4. Dimensionamento dos terraços
O dimensionamento de um sistema de terraceamento considera, inicialmente,
o objetivo a que se propõe o sistema: se para infiltração da água ou para seu
escoamento. Esta decisão, tomada em função de características relacionadas,
principalmente, às condições de declividade e de permeabilidade do solo, leva à
construção de um sistema de terraços em nível, para infiltração, ou em gradiente,
para escoamento do excedente da água da chuva. No entanto, para ambas as
situações, o dimensionamento do sistema é feito em função de seu potencial em
gerar enxurradas quando da ocorrência de chuvas intensas. Deve-se calcular,
portanto, a quantidade de enxurrada que a microbacia é capaz de produzir, ou seja,
a vazão máxima do escoamento superficial. A premissa para o dimensionamento do
sistema de terraceamento é a de que deve ser locado em um local protegido da
introdução de água que não aquela efetivamente caída sobre o local considerado.
Assim, o sistema de terraceamento dever ser implementado em uma área delimitada
por divisores de água naturais (microbacia) ou protegidos por um terraço de
190
derivação (diversão). A Figura 21 e 22 mostram um esquema e uma bacia natural a
ser terraceada.
Figura 21. Esquema ilustrativo de uma microbacia para efeito de
terraceamento.
Figura 22. Exemplo de microbacia a ser terraceada
Escoamento superficial máximo (enxurrada
máxima)
A previsão do escoamento máximo pode ser estimada pela fórmula de
Mulvaney (1851) conhecida na literatura como “fórmula racional”.
Sendo:
Qmáx: Vazão máxima da enxurrada em m3/s ;
C : coeficiente de escoamento superficial (adimensional) ;
i: intensidade (mm/h) da precipitação esperada com certo período de retorno
e de duração igual ao tempo de concentração da bacia; e
A : área em hectares.
a. Coeficiente de escoamento superficial – C
191
Este coeficiente refere-se à quantidade de água que é perdida por
escoamento superficial e é função da declividade, da cobertura vegetal e do tipo de
solo presente. Estes parâmetros foram tabulados estão apresentados no Quadro 4.
Quadro 4. Coeficientes de escoamento (C) em função da topografia, da
cobertura e do tipo de solo
b. Intensidade máxima de chuva (Imax)
A intensidade das chuvas evidentemente é fator crucial para a produção de
enxurrada. O ideal seria utilizar para o cálculo da chuva a mais intensa possível,
porém, adotam-se chuvas que apresentam uma esperança matemática
(probabilidade) de cair em intervalos de 5, 10, 15, 20 anos ou mais. Assim, para se
identificar a intensidade de chuva que produz a maior enxurrada na área, dois
critérios fundamentais devem ser observados: chuvas de longa duração são de
baixa intensidade e chuvas de curta duração são de alta intensidade; e para ocorrer
a máxima enxurrada toda bacia deverá produzir água simultaneamente.
Na aplicação desse método é preciso conhecer o tempo de concentração da
bacia e a intensidade da chuva esperada nessa região para um período de retorno
(T) adequado.
O tempo de concentração da bacia é o tempo que a água demora para sair de
um extremo ao outro mais distante da bacia. Quando uma chuva particular tem o
tempo de duração igual ao tempo de concentração da bacia, esta chuva terá
enxurrada máxima, pois toda ela estará contribuindo com água para a enxurrada
simultaneamente e na máxima intensidade possível. O conceito de tempo de
concentração de uma área de contribuição para o escoamento superficial, deve ser
necessariamente ligado ao percurso possível da água sobre uma superfície
irregular, tanto no declive quanto na rugosidade. O tempo de concentração em uma
área ou bacia hidrográfica é a soma de tempos de percurso que a água leva para
percorrer trechos sucessivos ao longo da superfície. A combinação de tempos de
percurso que resultar no maior tempo total para toda bacia ou área de contribuição
dará o chamado tempo de concentração.
192
Para o seu cálculo é necessário conhecer, em função do tipo de cobertura do
solo e do declive, a velocidade média com que a água escoa sobre a superfície.
O problema prático é pois determinar qual o percurso total da água
(distância), em vários trechos sucessivos, que resulta no tempo maior, a partir do
mapa planialtimétrico ou até mesmo esquemático da área ou microbacia a ser
terraceada.
Quadro 5. Velocidade do escoamento superficial (V = m/s) em função do tipo
de superfície e do declive do terreno (D = %), para calcular o tempo de concentração
(Tc)
Assim, depois de calculado o tempo de concentração, procura-se a chuva
intensa cuja duração seja igual a Tc e com o tempo de retorno da ordem de 10 a 25
anos. Estas seriam as alternativas para serem consideradas para o cálculo da chuva
mais intensa, pois tempos de retorno superiores (50 ou 100 anos, por exemplo) ou
mesmo inferiores (2 ou 5 anos, por exemplo), tendem a super ou subestimar as
dimensões do terraço a ser calculado. No primeiro caso, o custo de construção do
terraço seria muito alto, para uma período muito longo, durante o qual o uso do solo
poderia ser bastante alterado. No outro caso, ou seja, períodos de retorno
pequenos, o risco de transbordamento dos terraços seria muito alto, colocando todo
o sistema de terraceamento comprometido.
Assim, adotam-se chuvas que apresentam uma esperança matemática
(probabilidade) de cair em intervalos de 10 a 25 anos, conforme a disponibilidade de
dados da área ou região. A intensidade pode ser calculada através das equações de
intensidade-duração-freqüência, como as determinadas para as estações
meteorológicas de Pentecoste e Fortaleza, instaladas na Fazenda Experimental Vale
do Curu e Campus do PICI (Rodrigues, 2007).
Quadro 6. Equações intensidade-duração- freqüência para as estações
meteorológicas de Fortaleza (Campus do PICI) e Pentecoste (Fazenda Experimental
Vale do Curu)
193
d. Área da bacia (A)
Quanto maior a área de coleta, maior será o volume de água para um mesmo
coeficiente de escoamento e uma mesma intensidade de chuva.
Exemplo de cálculo da vazão máxima do
escoamento superficial máximo
O escoamento superficial máximo produzido sobre uma bacia de 60 ha com
declividade média de 15%, trecho a ser percorrido pelas gotas de chuva para a
formação da enxurrada máxima de 1.600 m (Figura 21) e cultivado com culturas
anuais.
Assim sendo o tempo de percurso no trecho (no caso se haver mais de um
tipo de uso na bacia, caso contrário deve-se calcular o tempo de percurso de cada
uso) é:
Figura 21. Esquema ilustrativo de uma microbacia para efeito de
terraceamento.
Assim sendo o tempo de percurso para o trecho é:
194
Considerando o tempo de concentração de 25,4 minutos (1.524/60), pode se
calcular a intensidade máxima através da fórmula (Quadro 6):
Nesse caso, é esperado para a região de Pentecoste-CE e um período de
retorno de 25 anos, de acordo com o Quadro 6, uma chuva de 117,06 mm/h com
duração de 25,4 minutos (1.524 segundos).
Quadro 5. Equações intensidade-duração- freqüência para as estações
meteorológicas de Fortaleza (Campus do PICI) e Pentecoste (Fazenda Experimental
Vale do Curu).
O coeficiente de escorrimento superficial para uma cobertura de culturas
anuais e declividade de 15% , de acordo com Quadro 6, é igual a 0,70.
Assim, o escoamento superficial máximo pode ser, então, calculado:
Quadro 6. Coeficientes de escoamento (C) em função da topografia, da
cobertura e do tipo de solo
195
Cálculo de terraço em nível e em gradiente
Calculada a vazão máxima do escoamento superficial (enxurrada máxima),
dois caminhos podem ser percorridos conforme o tipo de terraço a ser construído:
A vazão, multiplicada pelo tempo de duração da chuva, resultará no volume
de água a ser infiltrado, caso o terraceamento seja em NÍVEL (ou absorção, ou
retenção ou de infiltração). A vazão calculada será aquela a ser retirada da área pelo
sistema de terraceamento, no caso de escoamento, ou seja, em GRADIENTE (em
desnível, com declive ou de escoamento).
Normalmente, adota-se um coeficiente de segurança, adotando-se 20% a
mais do volume que deve ser armazenado:
Volume de terraço = 1,2 x volume de escoamento superficial máximo
(enxurrada máxima).
a. Cálculo de terraço em nível
Na primeira opção, terraceamento em nível ou infiltração, verifica-se que o
sistema de terraceamento deverá ter volume suficiente para receber a enxurrada,
isto é:
volume de terraços = volume de enxurrada.
O volume da enxurrada é dado pela multiplicação da vazão (m3/s) pela
duração da chuva (s).
O volume de terraços nada mais é do que a multiplicação do comprimento
total dos terraços (L) pela área da seção transversal (S):
em que:
L = Comprimento do terraço (m) para 1 ha (10.000 m2); e
EH = espaçamento horizontal (m).
A área da secção transversal S, em m2, é função do formato do terraço:
No caso de terraço de secção transversal trapezoidal (Figura 22), tem-se:
196
Figura 22. Representação esquemática de seção triangular empregada para
dimensionamento e construção de terraços.
Definida a área da seção transversal, o técnico deve ter em mente que um
terraço de infiltração deve ser raso e largo. Dessa forma, é usual utilizar-se a
profundidade de corte do arado como a profundidade do terraço. O talude a ser
formado deve ser definido (2:1; 1:1; 1:2, etc.) de maneira a chegar aos valores
necessários à construção.
Exemplo de cálculo de terraço em nível
a. Cálculo de volume da enxurrada
A bacia hidrográfica ou área a ser terraceada é de 60 hectares a ser utilizada
com culturas anuais. Considere o exemplo para o qual já foi calculada a vazão do
escoamento superficial (enxurrada) máxima, acrescentando 20% como fator de
segurança, tem-se que
Para o terraço em nível, as dimensões do terraço são calculadas pelo volume
(V) que a vazão máxima de escoamento (enxurrada) máximo (Q) produzirá no tempo
de duração da chuva, no caso semelhante ao tempo de concentração (TC = 1.524s).
Este vai ter que ser o volume de todo o sistema de terraceamento a ser implantado
na área, ou seja, o volume de escoamento produzido na área vai ser igual ao volume
o terraço a ser calculado. Esta é a condição para calcular as dimensões do terraço.
Sendo assim, tem-se:
Sendo assim, tem-se:
b. Cálculo do comprimento do terraço em metros por hectare
O comprimento do terraço pode ser calculado pela fórmula :
em que: L = Comprimento do terraço (m) para 1 ha (10.000 m2); e
EH = espaçamento horizontal (m).
197
De acordo com o exemplo dado no item 4.3., o espaço horizontal (EH) é de
10,20 m, tem-se:
O comprimento total de terraços (LT), considerando a área da bacia de 60 ha
é:
LT = 980,40 m/ha x 60 hectares = 58.824 m de terraço em 60 hectares.
c. Cálculo da seção do canal
Para calcular a seção do canal, basta dividir o volume da enxurrada pelo
comprimento do terraço:
Esta área da seção do terraço deve conter o volume de enxurrada formado
em condições normais. Para encontrar as dimensões deve ser considerado a
forma/tipo de implemento para a construção.
No caso, será usado um arado regulado para cortar 0,40 m de profundidade,
um talude do terraço de 1:1 e formato trapezoidal (Figura 23).
Figura 23. Representação esquemática de um terraço trapezoidal.
Com estas definições, chega-se a:
h = 0,40 m
B = b + 2h
X = h
B = b + X + X = b + 2X
h = 0,40 m
Para o talude 1:1, X = h, de maneira que:
B = b + 2 x 0,40
B = b + 0,80
198
Sendo assim, tem-se para um terraço de forma trapezoidal:
Área da secção transversal (S) = 0,43 m2
Base maior (B) = 1,48 m
Base menor (b) = 0,68 m
Talude = 1:1 = 0,40 = 0,40
Comprimento total (L) = 58.824 m
Profundidade do terraço = 0,40 m
Cálculo de terraço em gradiente
As dimensões do terraço com gradiente devem ser aquelas que proporcionam
uma vazão semelhante a do escoamento superficial máximo produzido na área
(enxurrada máxima), quando da ocorrência da chuva no tempo de concentração e
de retorno considerados.
em que
Q = vazão do canal do terraço, em m3/s;
V = velocidade máxima do escoamento dentro do terraço, em m/s;
S = área da seção transversal em m2.
Conhecendo-se a vazão do canal do terraço, determina-se as dimensões do
canal do terraço, conforme a forma considerada do mesmo. Porém, as dimensões
do terraço devem ser tais que não proporcionem uma velocidade de escoamento
que não promova a erosão do próprio terraço, ou seja, a velocidade de escoamento
no terraço do canal deve ter um limite considerado seguro (uma velocidade
permitida máxima).
Tendo-se como referência estas considerações, o cálculo das dimensões de
um terraço devem seguir os seguintes passos:
199
a. Determinação da declividade do canal do terraço
A declividade do canal do terraço pode ser estabelecida conforme as
recomendações feitas anteriormente no item 3.3.
b. Determinação da velocidade máxima de escoamento permitida no canal do
terraço
Determinada conforme o tipo de solo, a declividade do canal e o tipo de
cobertura.
c. Cálculo da área da secção transversal do terraço
Para calcular a área da seção do canal é necessário considerar a equação
anteriormente (Qcanal do terraço com gradiente= V x S)apresentada e a velocidade máxima
permitida do escoamento no canal do terraço em gradiente (Quadro 7).
d. Cálculo das dimensões da área da secção transversal do terraço
Para calcular as dimensões do canal do terraço em gradiente é preciso
considerar a forma geométrica do mesmo.
Quadro 7. Velocidade máxima permitida em canais abertos
As mais comumente usadas são a trapezoidal, a triangular e a parabólica,
sendo apresentadas a seguir as fórmulas associadas às dimensões destas:
d.1. Forma trapezoidal
Na Figura 23 tem-se:
B = base superior
b = base inferior
200
h = altura
L = lado do canal
Y/h = talude
Figura 23. Seção transversal de um canal de forma trapezoidal
Área da secção do canal :
Cálculo do perímetro molhado:
O perímetro molhado é calculado pela soma da base menor (b) mais os dois
lados do terraço (L1 + L2).
PM = b + L + L
PM = b + 2L
O lado L do trapézio pode ser calculado pelo teorema de Pitágoras, ou seja,
L2= Y2+ h2
Então:
PM = b + 2(Y2+ h2)1/2
Raio hidráulico (RH):
O raio hidráulico (RH) corresponde à divisão da área da secção transversal
(S) do canal pelo perímetro molhado (PM).
Talude:
A inclinação da borda do canal é denominada talude, sendo
expressa pela relação da distância horizontal para distância
vertical e, numericamente pelas relações 1:1; 2:1; 3:1; etc.
Quanto maior for a distância horizontal em relação à distância vertical, menos
inclinado é o talude. No caso é dada pela expressão:
Talude = Y/h
d.2. Forma triangular
Na Figura 25 tem-se:
B = base superior
h = altura
201
L = lado do canal
Y/h = talude
Figura 25. Seção transversal de um canal de forma triangular.
Área da seção do canal:
Perímetro molhado (PM):
O perímetro molhado (PM) é calculado pela soma dos dois lados do terraço
(L1 + L2).
PM = L1+ L2
Como o triangulo é eqüilátero e os dois lados são iguais, então:
PM = 2L
O lado L do trapézio pode ser calculado pelo teorema de Pitágoras, ou seja:
L2= Y2+ h2
Então:
PM = 2(Y2 + H2)1/2
Cálculo do raio hidráulico (RH):
O raio hidráulico (RH) corresponde à divisão da área da seção transversal (S)
do canal pelo perímetro molhado (PM).
Talude
A inclinação da borda do canal é denominada talude, sendo expressa pela
relação da distância horizontal para distância vertical e, numericamente pelas
relações 1:1; 2:1; 3:1; etc. Quanto maior for a distância horizontal em relação à
distância vertical, menos inclinado é o talude.
No caso é dada pela expressão:
Talude = Y/h
d.3. Forma parabolóide
Na Figura 26 tem-se:
B = base superior
202
h = altura
L = lado do canal
Y/h = talude
Área da seção do canal
Figura 26. Seção transversal de um canal de forma parabolóide.
Cálculo do perímetro molhado (PM):
Raio hidráulico (RH):
O raio hidráulico (RH) corresponde à divisão da área da seção transversal (S)
do canal pelo perímetro molhado (PM).
e. Reavaliação do cálculo da velocidade real de escoamento no canal
A velocidade média e real do escoamento no canal do terraço (m/s) nas
dimensões determinadas para a forma da secção considerada pode ser calculada
pela seguinte equação:
em que:
R = raio hidráulico em m;
I = Gradiente hidráulico, ou inclinação do canal em m/m (1% = 0,01), ou a
razão da diferença de nível para o comprimento do canal; e
n = coeficiente de atrito que varia com a natureza do solo ou revestimento do
canal (Quadro 8).
203
Quadro 8. Valores de coeficiente de rugosidade
A velocidade de escoamento real calculada neste passo é, então, confrontada
com a velocidade permitida considerada anteriormente e que está entre as opções
do quadro 6. Caso a velocidade real calculada não esteja próximo do recomendado,
os cálculos devem ser refeitos, alterando-se as dimensões do canal do terraço na
forma considerada.
Nestes casos existem duas situações possíveis:
a. Se a velocidade real estiver muito acima da permitida, isto leva a
necessidade de redução da velocidade de escoamento pelo aumento do atrito, o que
pode ser obtido com um maior espalhamento do escoamento. Assim, para uma
mesma área de secção transversal, pode-se, por exemplo, diminuir a profundidade
do terraço, o que leva ao aumento da largura do mesmo, consequentemente com
um diminuição da velocidade de escoamento.
b. Se a velocidade real estiver abaixo da permitida, torna-se necessário o
aumento da mesma, o que pode ser conseguido com o aumento da profundidade e
a diminuição da largura do terraço, o que leva a uma maior concentração do
escoamento e a redução do atrito com a superfície do solo.
c. Pode-se também aumentar ou diminuir a declividade do canal do terraço,
isto se for possível e dentro das recomendações consideradas em item específico.
Aumentando ou diminuindo a declividade têm-se a respectiva diminuição ou
aumento da velocidade, considerando-se que as demais dimensões permanecem
constantes.
Exemplo de cálculo de terraço em gradiente
O exemplo vai ser apresentado em passos para facilitar a compreensão do
mesmo:
Neste exemplo deve-se lembrar que o mesmo deve ser recalculado quanto a
alguns aspectos, tais como espaçamento vertical (EV = 1,75 m) e horizontal (EH =
11,70 m), considerando-se os valores tabelados adequados a esta condição.
a. Cálculo da vazão de escoamento superficial máxima
204
Outra questão importante é que a área de formação de enxurradas é a que
está imediatamente acima do terraço e não mais toda a área da bacia.
Neste caso e com auxílio de mapas e/ou fotos aéreas se faz a locação dos
terraços e posterior determinação individual da área acima de cada terraço, bem
como sua vazão máxima da enxurrada.
Considerando hipoteticamente uma área de 4 ha acima do primeiro terraço,
tem-se que
b. Determinação da declividade do canal do terraço
A declividade do canal do terraço pode ser estabelecida conforme as
recomendações feitas anteriormente no item 3.3.
Neste exemplo deve-se considerar uma declividade única de
0,3%.
c. Determinação da velocidade máxima de escoamento permitida no canal do
terraço
Será determinada conforme o tipo de solo, a declividade do canal e o tipo de
cobertura. No quadro 7 tem-se que a velocidade máxima permitida para solos mais
erodíveis, declividade de canal de 0,3%, solo cultivado e canal sem cobertura igual a
0,45 m/s (Quadro 7).
d. Cálculo da área da secção transversal do terraço
Para calcular a área da seção do canal é necessário considerar a equação
apresentada e a velocidade máxima permitida do escoamento no canal do terraço
em gradiente (Quadro 7).
Sendo assim:
Qescoamento máximo superficial= Qcanal do terraço em gradiente =V x S
0,91 m3/s = 0,45 m/s x S
S= 2,02 m2
e. Cálculo das dimensões da área da secção transversal do
terraço
Para calcular as dimensões do canal do terraço em gradiente é preciso
considerar a forma geométrica do mesmo. Para este exemplo vai ser considerada a
forma trapezoidal, o uso de um arado regulado para cortar 0,40 m de profundidade e
o talude do terraço será de 1:1.
B = base superior
b = base inferior
h = altura
L = lado do canal
Y/h = talude
205
Então:
e.1. Cálculo do perímetro molhado (PM)
O perímetro molhado (PM) é calculado pela soma da base
menor (b) mais os dois lados do terraço (L1 + L2).
PM = b + 2(Y2 + h2)1/2
PM = 4,65 + 2(0,402+ 0,402)1/2
PM = 5,78 m
e.2. Raio hidráulico (RH)
O raio hidráulico (RH) corresponde à divisão da área da secção transversal
(S) do canal pelo perímetro molhado (PM).
RH = S / PM
RH = 2,02 / 5,78
RH = 0,35 m
Sendo assim, tem-se para um terraço de forma trapezoidal:
Área da secção transversal (S) = 2,02 m
Base maior (B) = 5,45 m
Base menor (b) = 4,65 m
Talude = 1:1 = 0,40 = 0,40
Comprimento total (L) = 51.282 m
Altura ou profundidade do terraço = 0,40 m
d. Talude
A inclinação da borda do canal é denominada talude, sendo expressa pela
relação da distância horizontal para distância vertical e, numericamente pelas
relações 1:1; 2:1; 3:1; etc. Quanto maior for a distância horizontal em relação à
distância vertical, menos inclinado é o talude.
No caso é dada pela expressão:
Talude = Y/h
206
f. Reavaliação da cálculo da velocidade real de escoamento no canal
A velocidade média e real do escoamento no canal do terraço (m/s) nas
dimensões determinadas para a forma da secção considerada é calculada pela
seguinte equação:
O valor de 0,003 é a declividade do canal do terraço em gradiente (0,3%) em
m por m, ou seja: se em 100 m se tem 0,3 m de diferença de nível, em 1 m ter-se-á
0,003 m. A velocidade calculada é menor que a velocidade máxima permitida dentro
do canal, ou seja, a velocidade calculada de 0,27 m/s é menor que a permitida no
canal, nas condições calculadas, que é de 0,45 m/s. Neste caso, a velocidade pode
ainda ser aumentada para ficar próximo da velocidade recomendada. Sendo assim,
pode-se redimensionar a área da secção transversal, por exemplo aumentando a
profundidade do canal, reduzindo a base menor e maior, e consequentemente o
atrito do fluxo do escoamento superficial. Outra alternativa para o exemplo em
questão é a possibilidade de aumento da declividade do canal do terraço.
Procedimentos similares podem ser feitos no caso da velocidade de escoamento no
canal ser maior que a permitida, porém, no intuito de aumentar o espalhamento do
escoamento, aumentado o atrito. Caracteriza-se, assim, o método das tentativas.
7.3.6.5. Softwares de terraceamento
Atualmente pode-se dispor de softwares que auxiliam no dimensionamento
dos terraços, tornando-o mais simples. Um programa computacional chamado
Terraço for Windows permite o dimensionamento de terraços para condições
específicas de manejo de solo, abandonando os processos genéricos de
dimensionamento. Esse software pode ser obtido gratuitamente no site do GPRH -
http://www.ufv.br/dea/gprh/.
7.4. Bibliografia
COSTA, R.N.T. Drenagem agrícola. Fortaleza, SEAGRI, DENA-UFC, 2000. 54p.
(Curso de Aperfeiçoamento de em Irrigação e Drenagem para Engenheiros
Agrônomos e Engenheiros Agrícolas.
207
PIRES, F.R. & SOUZA, C.M. Práticas mecânicas de conservação do solo e da água.
Viçosa, UFC, 176p.
RODRIGUES, J.O. Equações intensidade-duração-freqüência de chuvas para as
localidades de Fortaleza e Pentecoste, Ceará. Fortaleza, UFC, 2007. 62p.
208
PARTE VIII – RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS
1 Introdução
Áreas degradadas são aquelas que, além de possuírem solos empobrecidos
e erodidos, também apresentam instabilidade hidrológica, produtividade primária e
diversidade biológica reduzidas (Parrota, 1992). O ambiente degradado é desprovido
de equilíbrio quanto a três tipos de energia: gravitacional, conservada e solar. A
energia gravitacional é aquela que influi nos processos de arraste de solo por
erosão. Já a energia conservada, diz respeito aos fatores que influenciam a
formação dos solos, como o material de origem. Já a energia solar está relacionada
ao aproveitamento da luminosidade pelas plantas para realização de fotossíntese.
Como a base das funções e usos do solo é a energia armazenada, a degradação
leva à perda das funções e usos do solo.
1.1 Severidade da degradação do solo no Brasil e no mundo
Segundo informações da FAO (2009), a degradação dos solos ocorre em
diferentes graus de severidade, de modo que mais da metade das terras do glogo
terreste estão sob algum nível de degradação (Figura 1).
Fonte: FAO (2009)
Observa-se que a fatia que representa terras degradadas de forma muito
severa é menor em relação às formas de degradação leve, moderada e severa. Isso
reflete a realidade da degradação dos solos em diferentes países do mundo e
também no Brasil (Figura 2). A degradação muito severa geralmente está vinculada
a atividades poluidoras urbano-industriais, atingindo áreas mais restritas. Já as
formas de degradação leve, moderada e severa, atingem maiores extensões de
terra e geralmente estão associdadas a atividades agrosilvipastoris, tendo como
principais causas o desmatamento e a agropecuária. Os principais tipos de erosão
leve, moderada e severa são a erosão hídrica e o empobrecimento do solo.
Severidade da degradação de terras no mundo induzida
pelo homem
35%
18%
21%
20%
6%
Não degradada
Degradação leve
Degradação moderada
Degradação severa
Degradação muito severa
Severidade da degradação de terras induzida pelo homem
no Brasil
19%
30%23%
24%
4%
Sem degradação
Degradação leve
Degradação moderada
Degradação severa
Degradação muito severa
209
Fonte: FAO (2009)
1.2 Causas da degradação do solo
Como já mencionado anteriormente, a poluição muito severa tem como
principal responsável a poluição ligada a atividades urbano-industriais, ocorrendo de
forma mais pontual. A poluição é representada pela deposição de resíduos tóxicos e
também pela chuva ácida. Sua ocorrência causa degradação de maior intensidade,
sendo bastante relevante em países europeus como a Bélgica, Lituânia,
Luxemburgo e Holanda. Entretanto, a atividade mineradora também pode causar
degradação muito severa e essa é uma realidade que afeta diferentes regiões
brasileiras. No caso do Ceará, já foram identificados impactos de degradação severa
de solos em áreas de mineração (Figura 3).
Figura 3. Solo transformado em estéreo em função da mineração de ferro (Sobral,
CE). Foto: Costa, 2009
Já as formas de degradação leve, moderada e severa têm como principais
causas o desmatamento e a agropecuária conduzida sem adoção de práticas
conservacionistas. O desmatamento leva à eliminação da camada vegetal que
protege o solo contra o impacto das gotas de chuva, tornando o solo mais
susceptível à erosão que favorece as perdas de nutrientes e matéria orgânica. É
comum que o desmatamento ocorra associado às queimadas, objetivando o
estabelecimento de pastagens ou áreas de cultivo. O uso do fogo contribui com a
210
perda de nutrientes e também contribui para deixar o solo mais vulnerável aos
agentes erosivos.
O estabelecimento de monocultivos após o desmatamento de uma
determinada área também contribui com a degradação do solo. Com os
monocultivos o empobrecimento do solo é estimulado, pois há uma única cultura
removendo nutrientes do solo, sem diversidade de espécies que possam aportar
determinados nutrientes. A redução da matéria orgânica do solo acaba sendo uma
conseqüência dessa forma de uso da terra, comprometendo a agregação e,
conseqüentemente a estrutura do solo que fica mais vulnerável à erosão.
Quando a área desmatada é convertida para pastagem, o superpastejo
constitui a principal causa de degradação do solo. Nesse caso, o excesso de
animais pastoreando numa determinada área leva à compactação do solo. Com
isso, já redução na biomassa e na proteção proporcionada pela vegetação, expondo
o solo aos agentes erosivos. A degradação dos solos em função do superpastejo
também está ligada à erosão, perda de nutrientes e de matéria orgânica.
Os principais pontos comuns de áreas degradadas, seja pelo desmatamento,
pelo monocultivo ou pelo superpastejo, são: perda da matéria orgânica d solo,
redução na atividade biológica, perda da estrutura do solo, alterações em atributos
químicos e físicos do solo e intensificação dos processos erosivos.
1.3 Quando adotar estratégias de recuperação
Dependendo da intensidade e duração do impacto, pode haver resiliência do
ambiente. Esse aspecto nos auxilia a decidir se medidas de recuperação deverão
ser utilizadas ou se é possível haver reabilitação natural. Quando há degradação
causada por agentes naturais como vento, fogo, terremoto, queda de árvores e
enchentes, é perfeitamente possível que a área seja recuperada a partir da
resiliência natural. Por outro lado, se a degradação está associada à perda da
camada superficial do solo, contendo matéria orgânica e nutrientes, além da perda
da qualidade física e/ou ocorrência de atributos químicos que inviabilizem o
crescimento da vegetação, faz-se necessária uma intervenção antrópica para a
recuperação.
1.4 Definições sobre recuperação de áreas degradadas
A recuperação de áreas degradadas constitui um conjunto de ações visando
restabelecer o equilíbrio e sustentabilidade que existiam no local antes da
degradação (Dias & Griffith, 1998). Tais ações possuem caráter inter e
multidisciplinar e seu ponto de partida é o restabelecimento da vegetação para
corrigir o substrato degradado e transformá-lo novamente em solo.
O material remanescente de processo de degradação, que apresenta baixo
teor de matéria orgânica, baixa disponibilidade de nutrientes, pouca ou nenhuma
estruturação e atividade biológica recebe a denominação de substrato. Um dos
objetivos da recuperação de áreas degradadas é transformar substrato em solo.
O termo recuperação é uma terminologia padrão para se referir às ações em
áreas degradadas. Entretanto, ele representa o resultado da utilização de processos
211
que permitam que a área degradada volte a ser utilizada de forma sustentável,
conforme objetivo previamente determinado. O termo reabilitação se refere à
intenção de fazer com que a área degradada volte a exercer a mesma função
ecológica, mas com diversidade biológica, entropia e biomassa diferentes em
relação ao que existia antes da degradação. Já o termo restauração também se
refere à intenção de fazer com que a área volte a exercer a mesma função
ecológica, mas com os mesmos níveis de diversidade biológica, entropia e biomassa
que existiam antes da degradação. Assim, constata-se que a restauração de uma
área degradada é de maior complexidade.
As definições sobre recuperação, reabilitação e restauração apontam para a
importância de ações a favor da diversidade biológica, das trocas de energia e
produção biomassa nas áreas degradadas. Do ponto de vista da ciência do solo, é
importante enfatizar que todas ações que favoreçam os aspectos acima citados têm
o potencial de devolver ao substrato as condições que permitem que este volte a
desempenhar os serviços relacionados às funções do solo. Dentre esses serviços,
são citados aqueles vinculados aos atributos físicos do solo, como a sustentação de
plantas, enraizamento, infiltração, retenção e disponibilização de água, retenção de
sedimentos, etc. Já os serviçoes vinculados aos atributos químicos do solo são
citados: disponibilização de nutrientes às plantas e organismos, ciclagem de
nutrientes e de carbono, seqüestro de carbono, dentre outros. As transformações de
minerais, de formas iônicas de elementos químicos e de moléculas são serviços
associados a atributos físico-químicos do solo, enquanto que o equilíbrio entre
macro, meso e microfaina, bem como a imobilização, mineralização e ciclagem de
nutrientes, estão associados aos serviços biológicos que o solo exerce.
1.5 Remoção ou inversão da camada superficial em solos degradados
A remoção ou inversão da camada superficial é uma ocorrência bastante comum
em solos degradados. Ao analisar as fases do solo (Figura 4), constata-se que a
fase sólida é composta por grande parte de minerais e uma pequena parcela de
matéria orgânica. Mesmo sendo pequena a proporção de matéria orgânica, ela é
fundamental para garantir a qualidade do solo.
Figura 4. Fases do solo.
212
A matéria orgânica estabilizada concentra-se principalmente no horizonte A
dos solos, que costuma ser a principal camada removida em função da erosão ou
até mesmo invertida em virtude de estratégias questionáveis de mecanização.
Atividades mineradoras ocasionam a remoção não só do horizonte A, mas também
que camadas mais profundas, compromentendo seriamente o substrato resultante
do processo de mineração em termos de quantidades de matéria orgânica. Devido a
esses aspectos, o aporte de matéria orgânica constitui uma importante estratégia em
muitos processos de recuperação de áreas degradadas.
Em áreas em que a degradação leve à moderada está vinculada à agricultura,
o uso de práticas conservacionistas edáficas, vegetativas e mecânicas, favorece o
aporte de matéria orgânica ao solo. Já em casos de degradação severa e muito
severa, a adição de resíduos orgânicos pode ser a opção mais viável na busca pela
recuperação. O uso de resíduos orgânicos provenientes de diversas atividades
antrópicas pode ser duplamente vantajoso, principalmente se proporcionar
destinação segura para o resíduo orgânico e a melhoria do substrato degradado de
modo a viabilizar o crescimento de plantas.
O aproveitamento de resíduos industriais e agroindustriais como
melhoradores de substratos degradados (Tabelas 1 e 3) pode garantir a obtenção de
um material alternativo, de baixo custo, de fácil disponibilidade, além de reduzir o
acúmulo destes resíduos no ambiente. Como exemplos de resíduos orgânicos que
podem ser utilizados na melhoria de substratos degradados, são citados o resíduo
do processamento de goiabas (CORRÊA et al., 2005), a fibra de coco verde
(NUNES, 2007), o resíduo orgânico da indústria processadora de caju (BRAGA et al,
2008), o resíduo de curtume, o lodo de esgoto, além de diversos outros materiais.
Os resíduos orgânicos geralmente apresentam como aspectos vantajosos, a
elevada capacidade de retenção de água, além da presença de alguns elementos
químicos que são nutrientes importantes ao desenvolvimento vegetal (Tabela 2). Por
outro lado, dentre os elementos químicos presentes no resíduo, pode haver
potencial de contaminação, o que torna necessário conhecer bem as características
do resíduo orgânico a ser utilizado.
Tabela 1. Atributos de substrato degradado pela exploração mineral.
Prof. C N P K Na Ca Mg
------cm------ ---g kg-1---- -------------------------mg kg-1------------------------
0-20 1,7 0,4 0,3 46,9 25,2 701,4 130,3
20-40 2,2 0,2 0,5 60,6 19,5 721,4 100,2
Fonte: Bezerra et al. (2006)
Tabela 2. Composição química do lodo de esgoto com potencial de uso como
resíduo orgânico na recuperação de substrato degradado pela exploração mineral.
Atributo Quantidade no resíduo
Corgânico (g kg-1) 224,1
Ntotal (g kg-1) 26,7
213
P (g kg-1) 4,8
K (g kg-1) 10
Ca (g kg-1) 15,4
Mg (g kg-1) 3,4
Na (mg kg-1) 400
Mn (mg kg-1) 200
Cu (mg kg-1) 362,7
Pb (mg kg-1) 185,3
Fonte: Bezerra et al. (2006)
Tabela 3. Alterações químicas em substrato degradado que recebeu diferentes
doses de lodo de esgoto como resíduo orgânco.
Doses C N P K Na Ca Mg
----t ha-1--- ---g kg-1---- -------------------------mg kg-1------------------------
0 4,7 0,4 5,4 88,3 18,8 790 61,4
2,8 7,6 0,6 18,2 123,9 32,8 878 70,7
5,7 7,9 0,8 18,1 141,7 34,3 744 71,7
11,4 16,8 1,7 29,0 177,3 29,7 961 108,8
22,8 19,9 2,1 20,9 111,0 30,3 1059 82,2
Fonte: Bezerra et al. (2006).
2. Alternativas para sistemas de produção agrícola em áreas susceptíveis à
desertificação.
2.1 A degradação e a desertificação
De acordo com a convenção para combate à desertificação (CDD) da
organização das Nações Unidas, a desertificação é definida como a degradação das
terras em regiões secas, ou seja, das áreas áridas, semiáridas e subúmidas secas.
Há mais de 30 anos a desertificação tem sido reconhecida no mundo o como um
importante problema ambiental. Após a seca prolongada que afetou gravemente o
Sahel africano no final da década de 60, foi criado pelas Nações Unidas um plano de
ação de combate à desertificação. Atualmente, as ações que permeiam o combate à
desertificação estão relacionadas não só a aspectos ambientais, mas também a
aspectos sócio-econômicos.
A desertificação é definida como a degradação que ocorre em regiões áridas,
semi-áridas e sub-úmidas, como resultado de vários fatores que incluem as
mudanças climáticas e as atividades humanas (UN, 1994). As perdas da
produtividade biológica e econômica que ocorrem nas regiões áridas estão
relacionadas a processos que podem ser potencializados por ações humanas.
Dentre esses processos destacam-se a erosão (hídrica ou eólica); a deterioração
214
das propriedades físicas, químicas e biológicas do solo; além da perda da vegetação
que ocorre ao longo dos anos (UN, 1994).
Para o sistema de classificação do Programa Ambiental das Nações Unidas
(UNEP, 1992), as consideradas terras secas (drylands) do globo terrestre podem ser
classificadas como hiper-áridas, áridas, semi-áridas ou sub-úmidas secas. As
regiões áridas, semi-áridas e sub-úmidas secas são aquelas que, com exceção das
regiões polar e sub-polar, possuem relação entre precipitação anual e
evapotranspiração potencial entre 0,05 e 0,65 (UN, 1994). Já no início dos anos 90,
69% das terras secas do mundo (exceto os desertos hiper-áridos) estavam
degradadas de forma moderada a severa (Dregne et al., 1991). Como principais
causas dessa degradação estão os sistemas tradicionais de uso da terra que, no
caso da África, foram definidos como insustentáveis de modo a contribuir com a
fome na região desertificada (Lean, 1995).
O superpastejo foi definido como a causa antrópica mais séria da
desertificação (UNEP, 1992). Entretanto, a agricultura nas terras secas também
contribui, principalmente por meio de três processos: salinização, elevação do lençol
freático e erosão (Kassas, 1995). A salinização e elevação do lençol freático afetam
áreas agrícolas com manejo incorreto da irrigação, enquanto que a erosão afeta
principalmente as áreas agrícolas em que a oferta de água para os cultivos depende
do período chuvoso.
Dentre os passos estabelecidos para os 99 países que faziam parte do plano
de ação contra a desertificação das Nações Unidas, estava a melhoria dos sistemas
de uso e manejo da terra, levando em consideração a ecologia dos ambientes
áridos. Além disso, ações corretivas para recuperação de áreas já degradadas
também foram consideradas necessárias. Contudo, somente 20 países
desenvolveram planos nacionais de combate à desertificação (Glenn et al, 1998) e
ainda há muito para ser feito em diferentes locais do mundo para prevenir e
remediar essa forma de degradação.
2.2 Desertificação no nordeste brasileiro
A desertificação no semiárido brasileiro começou a ser identificada nos anos
70 e os estudos pioneiros foram feitos pelo ecologista pernambucano João
Vasconcelos Sobrinho. Ele observou que um deserto estava se formando na região
e era atípico em relação ao observado no Saara, em virtude da ocorrência de chuva
e da natureza do solo da região. Porém, o ecologista enfatizou que o deserto que
estava sendo formado no semiárido brasileiro era similar ao Saara por tornar o local
inóspito (PAN-Brazil, 2004).
Os resultados das atividades humanas que contribuem com a desertificação
são principalmente a erosão, cujo principal tipo é a laminar (com ocorrência
ocasional de voçorocas) e a salinização, tanto em áreas de agricultura irrigada como
nas não irrigadas. Essas formas de degradação são similares àquelas observadas
em outras partes do mundo, iniciando-se com a destruição da cobertura
proporcionada pela vegetação natural e com a interação das atividades humanas
215
com as variações climáticas, criando condições ideais para a desertificação (PAN-
Brazil, 2004).
As áreas sujeitas à desertificação no semiárido brasileiro apresentam
vegetação de tamanho reduzido e caatinga hiperxerófila. Neste tipo de caatinga a
desertificação pode acontecer espontaneamente e sua ocorrência no nordeste
brasileiro pode ser preexistente à colonização. A vegetação da caatinga hiperxerófila
é enfraquecida com a desertificação e isso se acentua a cada ciclo anual,
principalmente após um período de seca. Quando a estação chuvosa se inicia, a
vegetação da área começa a se recuperar, mas não de forma completa. O balanço
incerto entre degradação e recuperação torna difícil predizer qual condição
prevalecerá, mas se houver intervenção humana de forma negativa, certamente a
desertificação irá prevalecer (Vasconcelos Sobrinho, 1983).
Alguns locais no meio da caatinga aparecem com características que
evidenciam o processo de desertificação. Esses locais apresentam solos rasos, de
superfície rochosa e sem capacidade de reter água, secando rapidamente ao
término do período chuvoso. Os solos dessas áreas também apresentam poucos
nutrientes, o que os torna ainda mais susceptíveis à desertificação. O clima é o
mesmo nas áreas adjacentes, mas algumas diferenças ocorrem quanto ao tipo de
solo. Apesar dos fatores que comandam os processos de desertificação, há fatores
locais que determinam as condições do solo e, por essa razão, é possível encontrar
áreas férteis ao lado de áreas já transformadas em deserto (Vasconcelos Sobrinho,
1983).
É justamente a ocorrência das áreas com degradação mais evidente, isoladas
ou agregadas, que determina o que foi definido como “núcleo de desertificação”.
Esses núcleos são de tamanho variado e são caracterizados por possuírem solos
bastante erodidos e uma vegetação que proporciona pouca ou nenhuma cobertura,
inclusive nos períodos chuvosos. Os núcleos de desertificação tendem a expandir
para áreas vizinhas (Vasconcelos Sobrinho, 1983). Em áreas cultivadas é possível
encontrar os chamados núcleos isolados de desertificação que constituem áreas de
difícil recuperação em virtude da necessidade de restaurar o solo que foi totalmente
perdido (PAN-Brasil, 2004).
Em 1993, ações contra desertificação foram desenvolvidas visando preparar o
Plano Nacional de Combate à Desertificação (PNCD). Por meio dessas ações
verificou-se que as principais causas da degradação intensa em Gilbués (PI),
Irauçuba (CE), Seridó (RN) e Cabrobó (PE) foram a substituição da caatinga pela
agricultura e pecuária, além da mineração na região de Gilbués, a extração de argila
em solos aluviais no Seridó e a remoção da madeira para carvão. Essas áreas foram
caracterizadas por apresentar alto risco de desertificação e ficaram conhecidas
como Núcleos de Desertificação (PAN- Brasil, 2004).
2.3 Alternativas para sistemas de produção agrícola em áreas sujeitas à
desertificação
As áreas sujeitas à desertificação sofrem os efeitos ambientais, mas também
são muito influenciadas por ações humanas de populações que, na maioria das
216
vezes, são muito carentes. A busca por alternativas em sistemas de produção com
uso e manejo do solo visando combater a desertificação não pode deixar de lado o
viés sócio-econômico. Nesse sentido, Sayer & Campbell (2003) afirmam que
técnicas precisam ser desenvolvidas para aumentar a capacidade adaptativa dos
agricultores, como sua habilidade para sustentar o fluxo de produtos e serviços dos
quais eles são dependentes.
Nos locais semiáridos onde a chuva não é só a responsável pela degradação,
mas também é o principal determinante da produção agrícola, é preciso desenvolver
sistemas sustentáveis de agricultura que possam ser aceitos pela população local.
Esses sistemas devem permitir a redução dos riscos climáticos e estabilizar a
produção de culturas e forragem, direcionando agricultores familiares por meio do
manejo eficiente e racional do solo, da água e da fitomassa (Roose, 1987; Roose,
1996). Em todo mundo a população rural de áreas secas precisará de estratégias de
cultivo para se adaptar às mudanças climáticas. Essas estratégias incluem
mudanças nos sistemas de produção, de tal forma que o cultivo exclusivo de cereais
deverá ser substituído por sistemas em que cereais são cultivados em associação
com leguminosas (Thomas, 2008).
Além da interação com leguminosas para aproveitar a fixação biológica de
nitrogênio, os sistemas de produção mais adequados às regiões secas também
devem priorizar a produção de biomassa. Em revisão a respeito das oportunidades
para reduzir a vulnerabilidade de terras secas em virtude das mudanças climáticas,
Thomas (2008) aponta que uma das maiores limitações da agricultura
conservacionista em regiões secas é justamente a baixa produção de biomassa.
Porém, evidências atuais mostram que mesmo pequenas quantidades de resíduo já
são suficientes para reduzir perdas de solo por erosão (Stewart & Konhafkan, 2004).
Smolikowski et al. (2001) confirmaram que o resíduo vegetal recobrindo o solo,
sozinho ou associado com cerca viva de leguminosas, diminui o escorrimento
superficial e a erosão em áreas declivosas no semiárido de Cabo Verde. Porém, o
material vegetal para formar cobertura morta somente foi disponível e eficiente nos
anos mais chuvosos. Cercas vivas de leucena e guandu serviram para bloquear o
escorrimento superficial e a erosão.
Dentre as diversas intervenções tecnológicas que podem auxiliar na redução
da vulnerabilidade de regiões secas, permitindo prevenir ou até mesmo reverter a
degradação, possibilitando também o seqüestro de carbono nas terras áridas, são
citadas: a manutenção da cobertura vegetal; o manejo de pastagens; o manejo da
irrigação e controle da salinização; o manejo da fertilidade do solo e a rotação de
culturas; a melhoria de capoeiras; os plantios florestais (Lal, 2001; Lal, 2002; Lal,
2003).
Mudanças nos padrões de cultivo podem auxiliar os agricultores a obter
melhores produções em regiões áridas. Tais mudanças podem ser caracterizadas
por antecipação na semeadura, uso de culturas de ciclo reduzido, uso de culturas
tolerantes à salinidade ou até mesmo à seca (Thomas, 2008). Sistemas de cultivo
baseados no uso de leguminosas nessas regiões secas têm reduzido perdas de
217
carbono e nitrogênio quando comparados com sistemas convencionais com adição
de fertilizantes nitrogenados (Drinkwater et al., 1998; Jenkinson et al., 1999).
Mortimore & Harris (2005) mencionam que, em áreas sujeitas à desertificação
na África, não é apenas a depleção de nutrientes do solo que prejudica a produção
de agricultores familiares. Os autores ressaltam que nitrogênio, fósforo e potássio
não são os únicos nutrientes limitantes, sendo também fundamentais para garantir a
produção o cálcio, magnésio, enxofre e o boro. Os autores reforçam que as
propriedades físicas e biológicas também devem ser consideradas essenciais na
avaliação de solos cultivados nas regiões áridas.
2.4 Leguminosas arbóreas para prevenir e remediar a degradação
Garantir a presença da vegetação pode ser uma forma de melhorar as
propriedades físicas, químicas e biológicas de solos em áreas degradadas, incluindo
aquelas que ocorrem nas regiões sujeitas à desertificação. Essa melhoria pode ser
justificada pelo simples fato de que a cobertura vegetal protege o solo contra a
erosão, mas alguns autores vão ainda mais longe. Eles afirmam que, em regiões
áridas e semi-áridas, o acúmulo preferencial de água, nutrientes e microrganismos
ocorre na região exatamente abaixo da vegetação que aparece distribuída
desuniforme na área (Bochet et al., 1999; Thompson et al., 2006). Goberna et al.
(2007), estudando o solo do semiárido Mediterrâneo observaram que alguns
processos como a mineralização de carbono ou a hidrólise de compostos fosfatados
foi maior no solo sob influência de grupos de plantas e menor na região periférica.
Porém, os autores também observaram que, em outros locais, a atividade
microbiológica no solo foi bastante homogênea, ou seja, independente da presença
da vegetação.
A utilização de espécies nativas, principalmente leguminosas arbóreas ou
arbustivas, como forma de melhorar a fertilidade natural dos solos, tem sido prática
recomendada em regiões tropicais destinadas à produção de alimentos básicos
(Magalhães, 2000). As leguminosas perenes podem ter maior capacidade para
recuperar a fertilidade do solo, em relação às leguminosas anuais produtoras de
grãos. Isso acontece, pois as leguminosas arbóreas têm maior capacidade de
absorver água e nutrientes do solo, resistindo melhor à seca e, conseqüentemente,
produzindo mais biomassa. Além disso, seu ciclo de vida mais longo favorece uma
maior fixação de nitrogênio atmosférico (Dommergues, 1995).
Nas áreas sujeitas à desertificação no nordeste brasileiro, grupos de
agricultores locais continuam a exercer as atividades agrícolas de modo tradicional,
favorecendo ainda mais a ocorrência da desertificação. A introdução de leguminosas
arbóreas nos sistemas de produção utilizados por esses agricultores pode ser uma
alternativa bastante promissora para garantir cobertura vegetal, melhorar a
qualidade do solo e protegê-lo contra a erosão.
O consórcio entre leguminosas arbóreas e culturas anuais já foi avaliado em
diferentes circunstâncias. A contribuição de N pelas leguminosas para culturas em
consórcio depende da espécie de leguminosa, de seu potencial de nodulação e da
eficiência na produção de fitomassa. Todos esses aspectos são determinados por
218
condições genotípicas e fenotípicas (Rao & Mathuva, 2000). No que se refere à
nodulação, para o crescimento adequado das leguminosas arbóreas é necessário o
estabelecimento de uma simbiose eficiente e ativa. A inoculação de estirpe
adequada de rizóbio auxilia a planta a se desenvolver em solos deficientes em N
(Blair et al., 1988).
Uma maneira por meio da qual as leguminosas arbóreas podem ser utilizadas
em conjunto com cultivos anuais é o sistema agroflorestal. Neste sistema, as
espécies de leguminosas arbóreas ou arbustivas são cultivadas em fileiras
intercaladas com cultivos agrícolas (Barreto & Fernandes, 2001). Quando atingem
um determinado tamanho, as leguminosas sofrem uma poda e o resíduo dessa poda
é depositado no solo, onde poderá ser incorporado caracterizando uma forma de
adubação verde para a cultura anual que será utilizada no consórcio.
Ao estudar o desenvolvimento do milho consorciado com leguminosas
arbustivas perenes no sistema de aléias com suprimento de P, Queiroz et al. (2008)
verificaram que a produtividade do milho foi menor nos tratamentos em que ele foi
associado com as leguminosas e maior para o cultivo de milho solteiro adubado com
NPK. Porém, a partir do segundo ciclo de cultivo, a produtividade do milho
consorciado com guandu e gliricídia foi semelhante àquela encontrada no tratamento
com adubação mineral. Para as regiões ameaçadas pela desertificação, a
produtividade da cultura anual é de grande interesse aos agricultores locais, contudo
também é fundamental pensar em um sistema de produção que garanta a
produtividade satisfatória dos cultivos anuais e que também promova melhorias na
qualidade do solo.
2.5 Espécies de leguminosas para regiões secas
O maior desafio em utilizar leguminosas arbóreas em sistemas de produção
para melhorar a qualidade do solo de áreas ameaçadas pela desertificação está
ligado às condições edafo-climáticas. Áreas que já foram bastante afetadas pela
erosão perderam a camada superficial do solo que é a mais fértil, restando apenas a
camada de solo compactada e pobre em nutrientes e organismos. Aliado às
condições de solo, o outro grande desafio é o período seco acentuado que
caracteriza as regiões áridas e semiáridas.
Alguns trabalhos têm sido feitos mundo afora com a introdução de
leguminosas arbóreas (nativas ou exóticas) para recuperação de solos em regiões
secas. Jurado et al. (2006) avaliaram o estabelecimento de mudas de leguminosas
na região semiárida mexicana em função de diferentes intensidades luminosas
obtidas a partir da existência de maior ou menor quantidade de vegetação nativa. Os
autores verificaram que as espécies nativas apresentaram maior sobrevivência,
maior crescimento e maior número de folhas quando plantadas em área com
vegetação natural mais densa. Já a sobrevivência da espécie exótica (Leucaena
leucocephala) foi semelhante, tanto no ambiente com vegetação nativa mais densa
quanto no ambiente com vegetação menos densa. Os autores também relataram
que as mudas de todas as espécies morreram ao final da primavera, atribuindo isso
principalmente à falta de água.
219
Forti et al. (2006) realizaram estudo de longa duração para avaliar
sobrevivência e desenvolvimento de várias espécies arbóreas (leguminosas e não
leguminosas), mediante condições de seca no semiárido de Israel. Mesmo após
secas acentuadas os autores observaram espécies com taxas de sobrevivência
entre 50 e 100%. Dentre as espécies que apresentaram baixa sobrevivência, alguns
indivíduos com características superiores foram encontrados. Os autores avaliaram
não só espécies nativas, mas também espécies exóticas com histórico de tolerância
à seca.
A leucena (Leucaena leucocephala) é uma leguminosa originada na América
Central com algumas variedades usadas na produção de forragem e na adubação
verde. As variedades formam simbiose eficiente com bactérias do gênero
Rhizobium, permitindo bom aproveitamento do nitrogênio atmosférico. Há relatos de
que a leucena apresenta produtividade máxima em regiões tropicais, em solos com
pH próximo à neutralidade e com precipitação entre 600 e 1700 mm. Porém, ela
pode ser dominante também em áreas com apenas 250 mm de chuva e apresentar
boa produtividade em solo com pH próximo à 5.0 (Lima & Evangelista, 2001).
Com relação ao sucesso esperado em usar a leucena nas condições áridas e
semi-áridas nordestinas, Souza (1991) ressalta que, graças ao seu sistema radicular
profundo, a leucena é mais resistente à seca do que leguminosas herbáceas. Souza
& Espíndola (2000) verificaram que uma pastagem em que o capim-buffel foi
associado a leucena teve maior capacidade de suporte em relação ao mesmo pasto
associado ao guandu em região de clima tropical sub-úmido em Pentecoste (CE).
É possível que leguminosas nativas sejam mais adequadas para plantios
consorciados em sistemas de produção que visem melhorar as condições de solo de
áreas afetadas pela desertificação. Nesse sentido, algumas espécies já têm sido
avaliadas, como é o caso do sabiá (Mimosa caesalpiniaefolia) e da catingueira
(Caesalpinia pyramidalis Tul.). O sabiá é uma leguminosa arbórea com grande
potencial graças à sua resistência à seca prolongada, seu rápido crescimento
(Almeida et al., 1986) e seu alto valor protéico (Stamford et al. 1997) que viabiliza
seu uso para alimentação animal. Em solos de mata úmida e do semi-árido
pernambucano, Stamford & da Silva (2000) verificaram que o sabiá não necessita de
calagem em solos ácidos caso seja inoculado com estirpes efetivas de rizóbio,
favorecendo a fixação biológica de nitrogênio e o desenvolvimento da espécie.
A catingueira é uma espécie com alto potencial econômico devido à sua
rusticidade e à seu aproveitamento madeireiro, também pode ser utilizada para
reflorestamento e de forma medicinal, a partir da obtenção de seus extratos
(Oliveira, 1976). É uma das plantas sertanejas cujas gemas brotam nas primeiras
manifestações de umidade. Dantas et al. (2009) verificaram que a formação de
mudas de catingueira não é influenciada pela luminosidade, e que o solo coletado na
própria caatinga, combinado ou não com areia e esterco, é adequado como
substrato para a produção de mudas.
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