1 PROF. JOSEVAL MARTINS VIANA APOSTILA DE BIODIREITO 1. Conceito de biodireito (Bio = vida ; Direito = legislação aplicada à vida) 2. Princípios do biodireito 2.1. Proteção à dignidade da pessoa humana 2.2. Proteção à própria pessoa humana 2. Reflexão inicial Os cientistas devem ter como paradigma o respeito à dignidade da pessoa humana, que é o fundamento do Estado Democrático de Direito. Art. 1º, III, da CF: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana. (Direito Fundamental) O biodireito não admitirá conduta científica que reduza a pessoa humana à condição de coisa, retirando dela sua dignidade e o direito a uma vida digna. A ciência é poderoso auxiliar para que a vida do homem seja cada vez mais digna de ser vivida. Logo, nem tudo que é cientificamente possível é moral e juridicamente admissível. Urge a imposição de limites à moderna medicina, reconhecendo-se que o respeito ao ser humano em todas as suas fases evolutivas (antes de nascer, no nascimento, no viver, no sofrer e no morrer) só é alcançado se se estiver atento à dignidade humana. O BIODIREITO E AS PRINCIPAIS QUESTÕES JURÍDICAS 1. Proteção à vida humana: quando começa a vida? Art. 5º da CF Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
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APOSTILA DE BIODIREITO 1. Conceito de biodireito …...infanticídio (CP, art. 123), o aborto (CP, arts. 124 a 128) e o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (CP, art.
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Transcript
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PROF. JOSEVAL MARTINS VIANA
APOSTILA DE BIODIREITO
1. Conceito de biodireito (Bio = vida ; Direito = legislação aplicada à vida)
2. Princípios do biodireito
2.1. Proteção à dignidade da pessoa humana
2.2. Proteção à própria pessoa humana
2. Reflexão inicial
Os cientistas devem ter como paradigma o respeito à dignidade da pessoa
humana, que é o fundamento do Estado Democrático de Direito.
Art. 1º, III, da CF:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático
de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana. (Direito Fundamental)
O biodireito não admitirá conduta científica que reduza a pessoa humana
à condição de coisa, retirando dela sua dignidade e o direito a uma vida digna.
A ciência é poderoso auxiliar para que a vida do homem seja cada vez
mais digna de ser vivida. Logo, nem tudo que é cientificamente possível é moral
e juridicamente admissível.
Urge a imposição de limites à moderna medicina, reconhecendo-se que o
respeito ao ser humano em todas as suas fases evolutivas (antes de nascer, no
nascimento, no viver, no sofrer e no morrer) só é alcançado se se estiver atento
à dignidade humana.
O BIODIREITO E AS PRINCIPAIS QUESTÕES JURÍDICAS
1. Proteção à vida humana: quando começa a vida?
Art. 5º da CF Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
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no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade, nos termos seguintes:
A vida é um bem jurídico tutelado como direito fundamental básico desde
a concepção momento específico, comprovado cientificamente, da formação da
pessoa.
O respeito à vida decorre de um dever absoluto erga omnes, por sua própria
natureza, ao qual a ninguém é lícito desobedecer.
A vida também recebe proteção jurídico-penal, uma vez que são punidos os
homicídios simples (CP, art. 121) e qualificado (CP, art. 121, § 2º), o infanticídio
(CP, art. 123), o aborto (CP, arts. 124 a 128) e o induzimento, instigação ou
auxílio ao suicídio (CP, art. 122).
2. Princípio do primado do direito à vida
Documentos internacionais referentes à proteção à vida
• Código de Nuremberg – 1947
• Declaração Universal dos Direitos Humanos, - 1948
• Declaração de Helsinque - 2000 (Hoje 2013 – Fortaleza)
• Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais -
1966
• Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos - 1966
• Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos -
1997
• Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos - 2003
• Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos – 2004
• Lei de Biossegurança – Lei n. 11.105, de 24 de março de 2005.
Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do artigo 225 da Constituição
Federal.
Essa lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização
de atividades que envolvem os OGMs e seus derivados, cria o Conselho
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Nacional de Biossegurança, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança (CTNBio), dispõe sobre a política nacional de biossegurança.
Questões do Biodireito
Biodireito e o direito à vida
Início da vida
Embrião humano - Direitos
Pesquisas científicas com o embrião humano
Biodireito e o aborto
Questões religiosas e jurídicas
Necessidade de aborto não previsto em lei
Biodireito e a utilização de células-tronco
Biodireito e a clonagem humana
Biodireito e os transplantes de órgãos e tecidos
Biodireito e a sexualidade
Biodireito e a eutanásia, distanásia, ortotanásia e mistanásia
Biodireito e o testamento vital
Biodireito e a negativa de tratamento médico
4. Bioética
Bio – vida
Ética – ética relacionada às questões da vida (Exemplo: pesquisas com
seres humanos)
4.1 Princípios da bioética
(Resol. CNS 466/12)
Esta Resolução incorpora, sob a ótica do indivíduo e das
coletividades os quatro referenciais básicos da bioética: autonomia, não
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maleficência, beneficência e justiça, entre outros, e visa a assegurar os direitos
e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa
e ao Estado.
• Princípio da autonomia
• Princípio da não maleficência
• Princípio da beneficência
• Princípio da justiça
• Princípio da equidade
5. Início da vida
O Direito Civil distingue nascituro de pessoa.
Artigo 2º do Código Civil
6. Conceito de nascituro
Nascituro é aquele que foi concebido, mas ainda não nasceu. Essa
palavra é de origem latina (nascituru) e significa “aquele que ainda irá nascer.”
Pessoa natural é o ser considerado como sujeito de direitos e obrigações.
7. Direitos do nascituro
• Direito à vida (Art. 5º da CF/88)
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes.”
Direito à vida
• Art. 124 do CP
Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho
provoque.
Pena - detenção, de um a três anos.
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8. Conceito de aborto
Aborto é a interrupção da gravidez com a destruição do produto da
concepção. É a morte do ovo (até três semanas de gestação), embrião
(de três semanas a três meses) ou feto (após três meses), não
implicando necessariamente sua expulsão. O produto da concepção
pode ser dissolvido, reabsorvido pelo organismo da mulher ou até
mumificado, ou pode a gestante morrer antes de sua expulsão. Não
deixará de haver, no caso, o aborto. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual
de Direito Penal. 23ª ed. São Paulo: Atlas S.A, 2005, p. 262.)
9. Conceito de aborto na área da saúde
Aborto é a expulsão ou extração de um embrião ou feto pesando menos
de 500g (aproximadamente 20 a 22 semanas de gestação),
independentemente ou não da presença de sinais vitais.
Entende-se por aborto (de ab-ortus, privação do nascimento) a
interrupção voluntária da gravidez, com a morte da concepção. Não
distinguiu a lei entre óvulo fecundado, embrião e feto. Contentou-se a lei
com a interrupção da gravidez. COSTA JR., Paulo José da. Direito Penal
Objetivo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003. p. 203.
Direito ao patrimônio
• Art. 542 do CC. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo
seu representante legal.
• Art. 1.799 do CC. Na sucessão testamentária podem ainda ser
chamados a suceder:
I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo
testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão.
O nascituro tem direitos em estado potencial, sob condição suspensiva
(direito condicional ou eventual), pois aguardam a verificação de evento
futuro e incerto (nascimento com vida) para ter eficácia.
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Hubert Lepargegneur afirma no capítulo VII, sob o título “Bioética e
conceito de pessoa: esclarecimentos”, afirma que: “a pessoa é
considerada como a entidade biológica imediatamente formada pela
fusão dos gametas no instante da fecundação. (PESSINI, Léo; Christian
de Paul de Barchifontaine (Org.) Fundamentos da bioética. São Paulo :
Paulus, 1996.
Christian de Paul Barchifontaine defende a ideia de que “o embrião
humano deve ser considerado como pessoa e pertencer à comunidade
moral, não se reconhecendo assim, nenhuma diferença de estatuto moral
em relação aos diferentes estados de desenvolvimento humano.”
10. Teoria quanto ao direito do nascituro
1ª) Teoria Natalista: parte da interpretação literal e simplificada da lei,
afirmando que a personalidade jurídica começa com o nascimento com
vida, o que traz a conclusão de que o nascituro não é pessoa, portanto,
tem apenas expectativa de direitos. Nega seus direitos fundamentais, tais
como, o direito à vida, à investigação de paternidade, aos alimentos, ao
nome e até à imagem.
2ª) Teoria concepcionista: sustenta que o nascituro é pessoa humana
desde a concepção, tendo direitos resguardados pela lei.
Adeptos: Pontes de Miranda, Rubens Limongi França, Pablo Stolze
Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho, Maria Helena Diniz, Teixeira de
Freitas, Clóvis Beviláqua, entre outros. É a posição adotada pela
doutrina civilista brasileira atual.
3ª) Teoria da personalidade condicional: afirma que a personalidade
jurídica começa com o nascimento com vida, mas os direitos do nascituro
estão sujeitos a uma condição suspensiva, portanto, sujeitos à condição,
termo ou encargo. Ao ser concebido o nascituro poderia titularizar alguns
direitos extrapatrimoniais, como, por exemplo, à vida, mas só adquire
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completa personalidade quando implementada a condição de seu
nascimento com vida.
Tópico para reflexão
No meio científico, alguns médicos e juristas consideram o nascituro
uma coisa.
Qual é a consequência jurídica desse posicionamento radical?
11. Retomada do conceito de biodireito
O biodireito é um novo ramo do estudo jurídico, resultado do encontro entre a
bioética e o biodireito.
É o ramo do Direito Público que se associa à bioética, estudando as
relações jurídicas entre o direito e os avanços tecnológicos conectados à
medicina e à biotecnologia, tais como, peculiaridades relacionadas ao corpo e à
dignidade da pessoa humana.
12. Princípios do biodireito
2.1. Proteção à dignidade da pessoa humana
2.2. Proteção à própria pessoa humana
O biodireito nasce como uma nova ciência jurídica para acompanhar o
desenvolvimento científico para proteger o participante da pesquisa e o doente
no que diz respeito ao seu tratamento médico.
A ciência é poderoso auxiliar para que a vida do homem seja cada vez
mais digna de ser vivida. Logo, nem tudo que é cientificamente possível é moral
e juridicamente admissível.
O BIODIREITO E AS PRINCIPAIS QUESTÕES JURÍDICAS
1. Proteção à vida humana
O direito à vida, por ser essencial ao ser humano, condiciona os
demais direitos da personalidade.
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Art. 5º da CF Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
A vida é um bem jurídico tutelado como direito fundamental básico desde
a concepção momento específico, comprovado cientificamente, da formação da
pessoa.
O respeito à vida decorre de um dever absoluto erga omnes, por sua
própria natureza, ao qual a ninguém é lícito desobedecer.
A vida também recebe proteção jurídico-penal, uma vez que são punidos
os homicídios simples (CP, art. 121) e qualificado (CP, art. 121, § 2º), o
infanticídio (CP, art. 123), o aborto (CP, arts. 124 a 128) e o induzimento,
instigação ou auxílio ao suicídio (CP, art. 122).
2. Princípio do primado do direito à vida
O direito à vida prevalecerá sobre qualquer outro, seja ele o de liberdade
religiosa, de integridade física ou mental etc. Havendo conflito entre dois direitos,
incidirá o princípio do primado mais relevante. Assim, por exemplo, se se precisar
mutilar alguém para salvar sua vida, ofendendo sua integridade física, mesmo
que não haja seu consenso, não haverá ilícito nem responsabilidade penal
médica.
REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA
RESOLUÇÃO CFM nº 2.168/2017
Adota as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida –
sempre em defesa do aperfeiçoamento das práticas e da observância aos
princípios éticos e bioéticos que ajudam a trazer maior segurança e eficácia a
tratamentos e procedimentos médicos –, tornando-se o dispositivo deontológico
a ser seguido pelos médicos brasileiros e revogando a Resolução CFM nº 2.121,
publicada no D.O.U. de 24 de setembro de 2015, Seção I, p. 117.
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A infertilidade humana é um problema de saúde, com implicações médicas e
psicológicas.
Art. 35-C da Lei n. 9.656/98
É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:
III - de planejamento familiar.
LEI Nº 9.263, DE 12 DE JANEIRO DE 1996.
Regula o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do
planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências.
Art. 226 da Constituição Federal: A família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado:
(...)
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao
Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse
direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas.
Art. 1º da Lei n. 9.263/96
O planejamento familiar é direito de todo cidadão, observado o disposto
nesta Lei.
Art. 2º da Lei 9.263/96
Para fins desta Lei, entende-se planejamento familiar como o conjunto de
ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição,
limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal.
Art. 4º da Lei n. 9.263/96
O planejamento familiar orienta-se por ações preventivas e educativas e
pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas