-
FACULDADE DE CINCIAS HUMANAS E DA SADEIBES - Instituto
Brasileiro de Educao e Sade
Curso de Licenciatura Plena em Educao Fsica
Raquel de Alcntara Maragno MolinaPsicloga, Mestre em Educao pela
UNB - DF.Coordenadora do Cursos de Ps-Graduao Latu Sensu do
UNIEUROCurrculo lattes:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.doE-mail:
[email protected]
Braslia DF2012
-
Vygotsky e o desenvolvimento humano
Elaine Rabello Jos Silveira passos
O que Desenvolvimento Humano?
A noo de desenvolvimento est atrelada a um contnuo de evoluo, em
que ns caminharamos ao longo de todo o ciclo vital. Essa evoluo,
nem sempre linear, se d em diversos campos da existncia, tais como
afetivo, cognitivo, social e motor.
Este caminhar contnuo no determinado apenas por processos de
maturao biolgicos ou genticos. O meio (e por meio entenda-se algo
muito amplo, que envolve cultura, sociedade, prticas e interaes)
fator de mxima importncia no desenvolvimento humano.
Os seres humanos nascem mergulhados em cultura, e claro que esta
ser uma das principais influncias no desenvolvimento. Embora ainda
haja discordncias tericas entre as abordagens que sero apresentadas
adiante sobre o grau de influncia da maturao biolgica e da
aprendizagem com o meio no desenvolvimento, o contexto cultural o
palco das principais transformaes e evolues do beb humano ao idoso.
Pela interao social, aprendemos e nos desenvolvemos, criamos novas
formas de agir no mundo, ampliando nossas ferramentas de atuao
neste contexto cultural complexo que nos recebeu, durante todo o
ciclo vital.
Perspectivas de Estudo do Desenvolvimento humano (Ribeiro,
2005):
Na Psicologia do Desenvolvimento, temos algumas perspectivas
diversas.
-
Para os tericos Ambientalistas, entre eles Skinner e Watson (do
movimento behaviorista), as crianas nascem como tbulas rasas, que
vo aprendendo tudo do ambiente por processos de imitao ou
reforo.
Para os tericos Inatistas, como Chomsky, as crianas j nascem com
tudo que precisam na sua estrutura biolgica para se desenvolver.
Nada aprendido no ambiente, e sim apenas disparado por este.
Para os tericos Construcionistas, tendo como cone Piaget, o
desenvolvimento construdo a partir de uma interao entre o
desenvolvimento biolgico e as aquisies da criana com o meio. Temos
ainda uma abordagem Sociointeracionista, de Vygotsky, segundo a
qual o desenvolvimento humano se d em relao nas trocas entre
parceiros sociais, atravs de processos de interao e mediao.
Temos a perspectiva Evolucionista, influenciada pela teoria de
Fodor, segundo a qual o desenvolvimento humano se d no
desenvolvimento das caractersticas humanas e variaes individuais
como produto de uma interao de mecanismos genticos e ecolgicos,
envolvendo experincias nicas de cada indivduo desde antes do
nascimento.
Ainda existe a viso de desenvolvimento Psicanaltica, em que
temos como expoentes Freud, Klein, Winnicott e Erikson. Tal
perspectiva procura entender o desenvolvimento humano a partir de
motivaes conscientes e inconscientes da criana, focando seus
conflitos internos durante a infncia e pelo resto do ciclo
vital.
Vygotsky: uma breve histria
Vygotsky nasceu em 1896 na Bielo-Rssia, que depois (em 1917)
ficou incorporada Unio Sovitica, e mais recentemente voltou a ser
Bielo-Rssia. Nasceu no mesmo ano que Piaget (coincidncia?!), mas
viveu muitssimo menos que este ltimo, pois morreu de tuberculose em
1934, antes de completar 38 anos.
-
Foi o primeiro psiclogo moderno a sugerir os mecanismos pelos
quais a cultura torna-se parte da natureza de cada pessoa ao
insistir que as funes psicolgicas so um produto de atividade
cerebral. Conseguiu explicar a transformao dos processos
psicolgicos elementares em processos complexos dentro da
histria.
Vygotsky enfatizava o processo histrico-social e o papel da
linguagem no desenvolvimento do indivduo. Sua questo central a
aquisio de conhecimentos pela interao do sujeito com o meio. Para o
terico, o sujeito interativo, pois adquire conhecimentos a partir
de relaes intra e interpessoais e de troca com o meio, a partir de
um processo denominado mediao.
As principais obras de Vygotsky traduzidas para o portugus so "A
formao social da mente", "Psicologia e pedagogia" e "Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem", A Construo do Pensamento e
Linguagem (obra completa), Teoria e Mtodo em Psicologia, Psicologia
Pedaggica.
Vygotsky morreu em 1934, e sua obra permaneceu desconhecida no
Ocidente at os anos 60, principalmente por razes polticas. Teve
dois artigos publicados em peridicos americanos nos anos 30, e
apenas em 1962 saiu nos Estados Unidos o livro Pensamento e
Linguagem, edio a partir da qual foram feitas outras inclusive a
brasileira, mas que na verdade uma compilao que corresponde a
apenas um tero da obra.
Vygotsky trouxe uma nova perspectiva de olhar s crianas. Ao lado
de colaboradores como Luria, Leontiev e Sakarov, entre outros,
apresenta-nos conceitos, alguns j abordados por Jean Piaget, um dos
primeiros a considerar a criana como ela prpria, com seus processos
e nuanas, e no um adulto em miniatura.
O terico pretendia uma abordagem que buscasse a sntese do homem
como ser biolgico, histrico e social. Ele sempre considerou o homem
inserido na sociedade e, sendo assim, sua abordagem sempre foi
orientada para os processos de desenvolvimento do ser humano com
nfase da dimenso scio-histrica e na interao do homem com o outro no
espao social. Sua abordagem scio-interacionista buscava
caracterizar os aspectos tipicamente humanos do comportamento e
elaborar hipteses de como as caractersticas humanas se formam ao
longo da histria do indivduo (Vygotsky, 1996).
-
Vygotsky et. al. (1988) acredita que as caractersticas
individuais e at mesmo suas atitudes individuais esto impregnadas
de trocas com o coletivo, ou seja, mesmo o que tomamos por mais
individual de um ser humano foi construdo a partir de sua relao com
o indivduo.
Suas maiores contribuies esto nas reflexes sobre o
desenvolvimento infantil e sua relao com a aprendizagem em meio
social, e tambm o desenvolvimento do pensamento e da linguagem.
Nos aprofundando um pouco mais nas idias de Vygotsky...
Desenvolvimento e Aprendizagem: a Zona de Desenvolvimento
Proximal
Para J. Piaget, dentro da reflexo construtivista sobre
desenvolvimento e aprendizagem, tais conceitos se inter-relacionam,
sendo a aprendizagem a alavanca do desenvolvimento. A perspectiva
piagetiana considerada maturacionista, no sentido de que ela preza
o desenvolvimento das funes biolgicas que o desenvolvimento - como
base para os avanos na aprendizagem. J na chamada perspectiva
scio-interacionista, scio-cultural ou scio-histrica, abordada por
L. Vygotsky, a relao entre o desenvolvimento e a aprendizagem est
atrelada ao fato de o ser humano viver em meio social, sendo este a
alavanca para estes dois processos. Isso quer dizer que os
processos caminham juntos, ainda que no em paralelo. Entenderemos
melhor essa relao ao discutir a Zona de Desenvolvimento
proximal.
Os conceitos scio-interacionistas sobre desenvolvimento e
aprendizagem se fazem sempre presentes, impelindo-nos reflexo sobre
tais processos. Como lidar com o desenvolvimento natural da criana
e estimul-lo atravs da aprendizagem? Como esta pode ser efetuada de
modo a contribuir para o desenvolvimento global da criana?
Em Vygotsky, ao contrrio de Piaget, o desenvolvimento
principalmente o psicolgico/mental (que promovido pela convivncia
social, pelo processo de socializao, alm das maturaes orgnicas)
depende da aprendizagem na medida em que se d por processos de
internalizao de
-
conceitos, que so promovidos pela aprendizagem social,
principalmente aquela planejada no meio escolar1.
Ou seja, para Vygotsky, no suficiente ter todo o aparato
biolgico da espcie para realizar uma tarefa se o indivduo no
participa de ambientes e prticas especficas que propiciem esta
aprendizagem. No podemos pensar que a criana vai se desenvolver com
o tempo, pois esta no tem, por si s, instrumentos para percorrer
sozinha o caminho do desenvolvimento, que depender das suas
aprendizagens mediante as experincias a que foi exposta. Neste
modelo, o sujeito no caso, a criana reconhecida como ser pensante,
capaz de vincular sua ao representao de mundo que constitui sua
cultura, sendo a escola um espao e um tempo onde este processo
vivenciado, onde o processo de ensino-aprendizagem envolve
diretamente a interao entre sujeitos.
Essa interao e sua relao com a imbricao entre os processos de
ensino e aprendizagem podem ser melhor compreendidos quando nos
remetemos ao conceito de ZDP. Para Vygotsky (1996), Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZDP), a distncia entre o nvel de
desenvolvimento real, ou seja, determinado pela capacidade de
resolver problemas independentemente, e o nvel de desenvolvimento
proximal, demarcado pela capacidade de solucionar problemas com
ajuda de um parceiro mais experiente. So as aprendizagens que
ocorrem na ZDP que fazem com que a criana se desenvolva ainda mais,
ou seja, desenvolvimento com aprendizagem na ZDP leva a mais
desenvolvimento,por isso dizemos que, para Vygotsky, tais processos
so indissociveis.
justamente nesta zona de desenvolvimento proximal que a
aprendizagem vai ocorrer. A funo de um educador escolar, por
exemplo, seria, ento, a de favorecer esta aprendizagem, servindo de
mediador entre a criana e o mundo. Como foi destacado
anteriormente, no mago das interaes no interior do coletivo, das
relaes com o outro, que a criana ter condies de construir suas
prprias estruturas psicolgicas (Creche Fiocruz,
1 Vejamos que esta diferena de concepes entre Piaget e Vygotsky
se d, em grande parte, pelo fato de
que , para Piaget, desenvolvimento maturao, e para Vygotsky, o
termo tambm compreende o desenvolvimento psicolgico.
-
2004). assim que as crianas, possuindo habilidades parciais, as
desenvolvem com a ajuda de parceiros mais habilitados (mediadores)
at que tais habilidades passem de parciais a totais. Temos que
trabalhar, portanto, com a estimativa das potencialidades da
criana, potencialidades estas que, para tornarem-se desenvolvimento
efetivo, exigem que o processo de aprendizagem, os mediadores e as
ferramentas estejam distribudas em um ambiente adequado
(Vasconcellos e Valsiner, 1995).
Temos portanto uma interao entre desenvolvimento e aprendizagem,
que se d da seguinte maneira: em um contexto cultural, com aparato
biolgico bsico interagir, o indivduo se desenvolve movido por
mecanismos de aprendizagem provocados por mediadores.
Para Vygotsky, o processo de aprendizagem deve ser olhado por
uma tica prospectiva, ou seja, no se deve focalizar o que a criana
aprendeu, mas sim o que ela est aprendendo. Em nossas prticas
pedaggicas, sempre procuramos prever em que tal ou qual aprendizado
poder ser til quela criana, no somente no momento em que
ministrado, mas para alm dele. um processo de transformao constante
na trajetria das crianas. As implicaes desta relao entre ensino e
aprendizagem para o ensino escolar esto no fato de que este ensino
deve se concentrar no que a criana est aprendendo, e no no que j
aprendeu. Vygotksy firma est hiptese no seu conceito de zona de
desenvolvimento proximal (ZDP). (Creche Fiocruz, 2004)
Pensamento e Linguagem:
Existem duas grandes vertentes na Psicologia que explicam a
aquisio da linguagem: uma delas defende que a linguagem j nasce
conosco; outra, que aprendida no meio. Vejamos os principais
autores de cada uma das partes:
-
Proposta ambientalista: do nada ao tudo atravs da experincia
Skinner: possibilidade de explicar a linguagem e qualquer
comportamento humano complexo pelos mesmos princpios estudados em
laboratrio.
A proposta inatista forte: Chomsky: o beb nasce com todo o
aparato. Nada aprendido no ambiente; apenas disparado por ele. A
criana apenas vai se moldando s especificidades da sua lngua.
A proposta interacionista: Piaget: o mecanismo interacionista --
a linguagem faz parte de uma funo mais ampla, que a capacidade de
representar a realidade atravs de significados que se distinguem de
significantes.
Vygotsky: razes genticas do pensamento e da linguagem linguagem
considerada como instrumento mais complexo para viabilizar a
comunicao, a vida em sociedade. Sem linguagem, o ser humano no
social, nem histrico, nem cultural.
Bruner: Psicologia cultural defende a viso cultural do
desenvolvimento da linguagem e coloca a interao social no centro de
sua ateno sobre o processo de aquisio.
Cole: Sociocultural para que a criana adquira mais do que
rudimentos de linguagem, ela deve no apenas ouvir ou ver linguagem,
mas tambm participar de atividades que a linguagem ajuda a criar e
manter.
Segundo Vygotsky...
-
Para Vygotsky, a relao entre pensamento e linguagem estreita. A
linguagem (verbal, gestual e escrita) nosso instrumento de relao
com os outros e, por isso, importantssima na nossa constituio como
sujeitos. Alm disso, atravs da linguagem que aprendemos a pensar
(Ribeiro, 2005).
As funes da linguagem
A linguagem , antes de tudo, social. Portanto, sua funo inicial
a comunicao, expresso e compreenso. Essa funo comunicativa est
estreitamente combinada com o pensamento. A comunicao uma espcie de
funo
bsica porque permite a interao social e, ao mesmo tempo,
organiza o pensamento. Para Vygotsky, a aquisio da linguagem passa
por trs fases: a linguagem social, que seria esta que tem por funo
denominar e comunicar, e seria a primeira linguagem que surge.
Depois teramos a linguagem egocntrica e a linguagem interior,
intimamente ligada ao pensamento.
A linguagem egocntrica
A progresso da fala social para a fala interna, ou seja, o
processamento de perguntas e respostas dentro de ns mesmos o que
estaria bem prximo ao pensamento, representa a transio da funo
comunicativa para a funo intelectual. Nesta transio, surge a
chamada fala egocntrica. Trata-se da fala que a criana emite para
si mesmo, em voz baixa, enquanto est concentrado em alguma
atividade. Esta fala, alm de acompanhar a atividade infantil, um
instrumento para pensar em sentido estrito, isto , planejar uma
resoluo para a tarefa durante a atividade na qual a criana est
entretida (Ribeiro, 2005).
A fala egocntrica constitui uma linguagem para a pessoa mesma, e
no uma linguagem social, com funes de comunicao e interao. Esse
falar sozinho essencial porque ajuda a organizar melhor as idias e
planejar melhor as aes. como se a criana precisasse falar para
resolver um problema que, ns adultos, resolveramos apenas no plano
do pensamento / raciocnio.
-
Neste momento, a criana faz a maior descoberta de sua vida:
todas as coisas tm um nome. Stern
Uma contribuio importante de Vygotsky e seus colaboradores,
descrita no livro Pensamento e Linguagem (1998), do mesmo autor, o
fato de que, por volta dos dois anos de idade, o desenvolvimento do
pensamento e da linguagem que at ento eram estudados em separado se
fundem, criando uma nova forma de comportamento.
Este momento crucial, quando a linguagem comea a servir o
intelecto e os pensamentos comeam a oralizar-se a fase da fala
egocntrica marcado pela curiosidade da criana pelas palavras, por
perguntas acerca de
todas as coisas novas (o que isso?) e pelo enriquecimento do
vocabulrio. O declnio da vocalizao egocntrica sinal de que a criana
progressivamente abstrai o som, adquirindo capacidade de pensar as
palavras, sem precisar diz-las. A estamos entrando na fase do
discurso interior. Se, durante a fase da fala egocntrica houver
alguma deficincia de elementos e processos de interao social,
qualquer fator que aumente o isolamento da criana, iremos perceber
que seu discurso egocntrico aumentar subitamente. Isso importante
para o cotidiano dos educadores, em que eles podem detectar
possveis deficincias no processo de socializao da criana. (Ribeiro,
2005)
Discurso interior e pensamento
O discurso interior uma fase posterior fala egocntrica. quando
as palavras passam a ser pensadas, sem que necessariamente sejam
faladas. um pensamento em palavras. J o pensamento um plano mais
profundo do discurso interior, que tem por funo criar conexes e
resolver problemas, o que no , necessariamente, feito em palavras.
algo feito de idias, que muitas vezes nem conseguimos verbalizar,
ou demoramos ainda um tempo para achar as palavras certas para
exprimir um pensamento.
O pensamento no coincide de forma exata com os significados das
palavras. O pensamento vai alm, porque capta as relaes entre as
palavras de uma forma mais complexa e completa que a gramtica faz
na linguagem escrita e falada. Para a expresso verbal do
pensamento, s vezes preciso
-
um esforo grande para concentrar todo o contedo de uma reflexo
em uma frase ou em um discurso. Portanto, podemos concluir que o
pensamento no se reflete na palavra; realiza-se nela, a medida em
que a linguagem que permite a transmisso do seu pensamento para
outra pessoa (Vygotsky, 1998)
Finalmente, cabe destacar que o pensamento no o ltimo plano
analisvel da linguagem. Podemos encontrar um ltimo plano interior:
a motivao do pensamento, a esfera motivacional de nossa conscincia,
que abrange nossas inclinaes e necessidades, nossos interesses e
impulsos, nossos afetos e emoes. Tudo isso vai refletir imensamente
na nossa fala e no nosso pensamento. (Vygotsky 1998)
BIBLIOGRAFIA
CRECHE FIOCRUZ. Projeto Poltico Pedaggico. Rio de Janeiro:
Fiocruz, 2004.
RIBEIRO, A. M. Curso de Formao Profissional em Educao Infantil.
Rio de Janeiro: EPSJV / Creche Fiocruz, 2005.
VASCONCELLOS e VALSINER. Perspectivas co-construtivistas na
educao. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1995.
VYGOTSKY, L. S. A formao social da mente. Rio de Janeiro:
Martins Fontes, 1996.
VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. Rio de Janeiro: Martins
Fontes, 1998.
Sobre os autores: Elaine Rabello: Graduanda em Psicologia pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Analista Transacional em
Formao - Curso 202 na rea Clnica Jos Silveira Passos: Psiclogo
(CRP-05/18842), Psicoterapeuta, Analista Transacional (Membro
Didata em Formao da UNAT-BR), Master em Ecologia Humana (Escola de
Ecologia Humana - Argentina), Consultor Organizacional e Engenheiro
Como citar este artigo? RABELLO, E.T. e PASSOS, J. S. Vygotsky e o
desenvolvimento humano. Disponvel em no dia xx de xxxxxx de
xxxx.
Pensar conceber, fragmentar e seqenciar ao mesmo tempo uma dada
situao. As palavras so mediadores entre pensamento e mundo
externo.
-
A PSICANLISE
"Se fosse preciso concentrar numa palavra a descoberta
freudiana,
essa palavra seria incontestavelmente inconsciente".
SIGMUND FREUD
As teorias cientificas surgem influenciadas pelas condicoes da
vida social, nos seus aspectos economicos, politicos, culturais
etc. Sao produtos historicos criados por homens concretos, que
vivem o seu tempo e contribuem ou alteram, radicalmente, o
desenvolvimento do conhecimento.
Sigmund Freud (1856-1939) foi um medico vienense que alterou,
radicalmente, o modo de pensar a vida psiquica. Sua contribuicao e
comparavel a de Karl Marx na compreensao dos processos historicos e
sociais.
Freud ousou colocar os "processos misteriosos" do psiquismo,
suas "regioes obscuras", isto e, as fantasias, os sonhos, os
esquecimentos a interioridade do homem, como problemas, mas
cientificos. A investigacao sistematica desses problemas levou
Freud a criacao da Psicanalise. O termo psicanalise e usado para se
referir a uma teoria, a um metodo de investigacao e a uma pratica
profissional. Enquanto teoria, caracteriza-se por um conjunto de
conhecimentos sistematizados sobre o funcionamento da vida
psiquica. Freud publicou uma extensa obra, durante toda a sua vida,
relatando suas descobertas e formulando leis gerais sobre a
estrutura e o funcionamento da psique humana.
A Psicanalise, enquanto metodo de investigacao, caracteriza-se
pelo metodo interpretativo, que busca o significado oculto daquilo
que e manifesto por meio de acoes e palavras ou pelas producoes
imaginarias, como os sonhos, os delirios, as associacoes livres, os
atos falhos. A pratica profissional refere-se a forma de tratamento
a Analise - que busca o autoconhecimeto ou a cura, que ocorre
atraves desse autoconhecimeto. Atualmente, o exercicio da
Psicanalise ocorre de muitas outras formas. Ou seja, e usada como
base para psicoterapias, aconselhamento, orientacao; e aplicada no
trabalho com grupos, instituicoes. A Psicanalise tambem e um
instrumento importante para a analise e compreensao de fenomenos
sociais relevantes: as novas formas de sofrimento psiquico, o
excesso de individualismo no mundo contempor9neo, a exacerbacao da
viol:ncia etc.
Compreender a Psicanalise significa percorrer novamente o
trajeto pessoal de Freud, desde a origem dessa ci:ncia e durante
grande parte de seu desenvolvimento. A relacao entre autor e obra
torna-se mais significativa quando descobrimos que grande parte de
sua producao foi baseada em experi:ncias pessoais, transcritas com
rigor em varias de suas obras, como A interpretacao dos sonhos e A
psicopatologia da vida cotidiana, dentre outras.
Compreender a Psicanalise significa, tambem, percorrer, no nivel
pessoal, a experi:ncia inaugural de Freud e buscar "descobrir" as
regioes obscuras da vida psiquica, vencendo as resist:ncias
interiores, pois se ela foi realizada por Freud, "nao e uma
aquisicao definitiva da humanidade, mas tem que ser realizada de
novo por cada paciente e por cada psicanalista".
A GESTAO DA PSICANLISE
Freud formou-se em Medicina na Universidade de Viena, em 1881, e
especializou-se em Psiquiatria. Trabalhou algum tempo em um
laboratorio de Fisiologia e deu aulas de Neuropatologia no
instituto onde trabalhava. Por dificuldades financeiras, nao pode
dedicar-se integralmente a vida acad:mica e de pesquisador.
Comecou, entao, a clinicar, atendendo pessoas acometidas de
"problemas nervosos". Obteve, ao final da resid:ncia medica, uma
bolsa de estudo para Paris, onde trabalhou com Jean Charcot,
psiquiatra
-
franc:s que tratava as histerias com hipnose. Em 1886, retornou
a Viena e voltou a clinicar, e seu principal instrumento de
trabalho na eliminacao dos sintomas dos disturbios nervosos passou
a ser a sugestao hipnotica.
Em Viena, o contato de Freud com Josef Breuer, medico e
cientista, tambem foi importante para a continuidade das
investigacoes. Nesse sentido, o caso de uma paciente de Breuer foi
significativo. Ana O. apresentava um conjunto de sintomas que a
fazia sofrer: paralisia com contratura muscular, inibicoes e
dificuldades de pensamento. Esses sintomas tiveram origem na epoca
em que ela cuidara do pai enfermo. No periodo em que cumprira essa
tarefa, ela havia tido pensamentos e afetos que se referiam a um
desejo de que o pai morresse. Estas ideias e sentimentos foram
reprimidos e substituidos pelos sintomas.
Em seu estado de vigilia, Ana O. nao era capaz de indicar a
origem de seus sintomas, mas, sob o efeito da hipnose, relatava a
origem de cada um deles, que estavam ligados a viv:ncias anteriores
da paciente, relacionadas com o episodio da doenca do pai. Com a
rememoracao destas cenas e viv:ncias, os sintomas desapareciam.
Este desaparecimento nao ocorria de forma "magica", mas devido a
liberacao das reacoes emotivas associadas ao evento traumatico - a
doenca do pai, o desejo inconsciente da morte do pai enfermo.
Breuer denominou metodo catartico o tratamento que possibilita a
liberacao de afetos e emocoes ligadas a acontecimentos traumaticos
que nao puderam ser expressos na ocasiao da viv:ncia desagradavel
ou dolorosa. Esta liberacao de afetos leva a eliminacao dos
sintomas.
Freud, em sua Autobiografia, afirma que desde o inicio de sua
pratica medica usara a hipnose, nao so com objetivos de sugestao,
mas tambem, para obter a historia da origem dos sintomas.
Posteriormente, passou a utilizar o metodo catartico e, aos poucos,
foi modificando a tecnica de Breuer: abandonou a hipnose, porque
nem todos os pacientes se prestavam a ser hipnotizados; desenvolveu
a tecnica de 'concentracao', na qual a rememoracao sistematica era
feita por meio da conversacao normal; e por fim, acatando a
sugestao (de uma jovem) anonima, abandonou as perguntas - e com
elas a direcao da sessao para se confiar por completo a fala
desordenada do paciente.
A DESCOBERTA DO INCONSCIENTE
("Qual poderia ser a causa de os pacientes esquecerem tantos
fatos de sua vida interior e exterior..)", perguntava-se Freud. O
esquecido era sempre algo penoso para o individuo, e era exatamente
por isso que havia sido esquecido e o penoso nao significava,
necessariamente, sempre algo ruim, mas podia se referir a algo bom
que se perdera ou que fora intensamente desejado. Quando Freud
abandonou as perguntas no trabalho terap:utico com os pacientes e
os deixou dar livre curso as suas ideias, observou que, muitas
vezes, eles ficavam embaracados, envergonhados com algumas ideias
ou imagens que lhes ocorriam. A esta forca psiquica que se opunha a
tornar consciente, a revelar um pensamento, Freud denominou
resist:ncia. E chamou de repressao o processo psiquico que visa
encobrir, fazer desaparecer da consci:ncia, uma ideia ou
representacao insuportavel e dolorosa que esta na origem do
sintoma. Estes conteudos psiquicos "localizam-se" no
inconsciente.
Tais descobertas"(...) constituiram a base principal da
compreensao das neuroses e impuseram uma modificacao do trabalho
terap:utico. Seu objetivo (...) era descobrir as repressoes e
suprimi-las atraves de um juizo que aceitasse ou condenasse
definitivamente o excluido pela repressao. Considerando este novo
estado de coisas, dei ao metodo de investigacao e cura resultante o
nome de psicanalise em substituicao ao de catartico".
A PRIMEIRA TEORIA SOBRE A ESTRUTURA DO APARELHO PSIQUICO
Em 1900, no livro A interpretacao dos sonhos, Freud apresenta a
primeira concepcao sobre a estrutura e o funcionamento da
personalidade. Essa teoria refere-se a exist:ncia de tr:s sistemas
ou inst9ncias psiquicas: inconsciente, pre-consciente e
consciente.
-
O inconsciente exprime o "conjunto dos conteudos nao presentes
no campo atual da consci:ncia". E constituido por conteudos
reprimidos, que nao t:m acesso aos sistemas pre-
consciente/consciente, pela acao de censuras internas. Estes
conteudos podem ter sido conscientes, em algum momento, e ter sido
reprimidos, isto e, "foram" para o inconsciente, ou podem ser
genuinamente inconscientes. O inconsciente e um sistema do aparelho
psiquico regido por leis proprias de funcionamento. Por exemplo, e
atemporal, nao existem as nocoes de passado e presente.
O pre-consciente refere-se ao sistema onde permanecem aqueles
conteudos acessiveis a consci:ncia. E aquilo que nao esta na
consci:ncia, neste momento, e no momento seguinte pode estar.
O consciente e o sistema do aparelho psiquico que recebe ao
mesmo tempo as informacoes do mundo exterior e as do mundo
interior. Na consci:ncia, destaca-se o fenomeno da percepcao,
principalmente a percepcao do mundo exterior, a atencao, o
raciocinio
A DESCOBERTA DA SEXUALIDADE INFANTIL
Freud, em suas investigacoes na pratica clinica sobre as causas
e o funcionamento das neuroses, descobriu que a maioria de
pensamentos e desejos reprimidos referiam-se a conflitos de ordem
sexual, localizados nos primeiros anos de vida dos individuos, isto
e, que na vida infantil estavam as experi:ncias de carater
traumatico, reprimidas, que se configuravam como origem dos
sintomas atuais, e confirmava-se, desta forma, que as ocorr:ncias
deste periodo da vida deixam marcas profundas na estruturacao da
pessoa. As descobertas colocam a sexualidade no centro da vida
psiquica, e e postulada a exist:ncia da sexualidade infantil. Estas
afirmacoes tiveram profundas repercussoes na sociedade puritana da
epoca, pela concepcao vigente da inf9ncia como "inocente".
Os principais aspectos destas descobertas sao:
A funcao sexual existe desde o principio da vida, logo apos o
nascimento, e nao so a partir da puberdade como afirmavam as ideias
dominantes.
* O periodo de desenvolvimento da sexualidade e longo e complexo
ate chegar a sexualidade adulta, onde as funcoes de reproducao e de
obtencao do prazer podem estar associadas, tanto no homem como na
mulher. Esta afirmacao contrariava as ideias predominantes de que o
sexo estava associado, exclusivamente, a reproducao.
* A libido, nas palavras de Freud, e "a energia dos instintos
sexuais e so deles".
No processo de desenvolvimento psicossexual, o individuo, nos
primeiros tempos de vida, tem a funcao sexual ligada a
sobreviv:ncia, e, portanto, o prazer e encontrado no proprio corpo.
O corpo e erotizado, isto e, as excitacoes sexuais estao
localizadas em partes do corpo, e ha um desenvolvimento progressivo
que levou Freud a postular as fases do desenvolvimento sexual em:
fase oral (a zona de erotizacao e a boca), fase anal (a zona de
erotizacao e o 9nus), fase falica (a zona de erotizacao e o orgao
sexual); em seguida vem um periodo de lat:ncia, que se prolonga ate
a puberdade e se caracteriza por uma diminuicao das atividades
sexuais, isto e, ha um "intervalo" na evolucao da sexualidade. E,
finalmente, na puberdade e atingida a ultima fase, isto e, a fase
genital, quando o objeto de erotizacao ou de desejo nao esta mais
no proprio corpo, mas em um objeto externo ao individuo - o outro.
Alguns autores denominam este periodo exclusivamente como genital,
incluindo o periodo falico nas organizacoes pre-genitais, enquanto
outros autores denominam o periodo falico de organizacao genital
infantil.
No decorrer dessas fases, varios processos e ocorr:ncias
sucedem-se. Desses eventos, destaca- se o complexo de Edipo, pois e
em torno dele que ocorre a estruturacao da personalidade do
individuo. Acontece entre 3 e 5 anos, durante a fase falica. No
complexo de Edipo, a mae e o objeto de desejo do
-
menino, e o pai e o rival impede seu acesso ao objeto desejado.
Ele procura entao ser o acesso ao objeto pai para "ter" a mae,
escolhendo-o como modelo de comportamento passando a internalizar
as regras e as normas sociais representadas e impostas pela
autoridade paterna. Posteriormente, por medo da perda do amor do
pai, "desiste" da mae, isto e, a mae e " trocada" pela riqueza do
mundo social e cultural, e o garoto pode, entao, participar do
mundo social, pois tem suas regras basicas internalizadas atraves
da identificacao com o pai. Este processo tambem ocorre com as
meninas, sendo invertidas as figuras de desejo e de identificacao.
Freud fala em Edipo feminino.
EXPLICANDO ALGUNS CONCEITOS
Antes de prosseguirmos um pouco mais acerca das descobertas
fundamentais de Freud, e necessario esclarecer alguns conceitos que
permitem compreender os dados e informacoes colocados ate aqui, de
um modo din9mico e sem considera-los processos mec9nicos e
compartimentados. Alem disso, estes aspectos tambem sao postulacoes
de Freud, e seu conhecimento e fundamental para se
compreender a continuidade do desenvolvimento de sua teoria.
1. No processo terap:utico e de postulacao teorica, Freud,
inicialmente, entendia que todas as cenas relatadas pelos pacientes
tinham de fato ocorrido. Posteriormente, descobriu que poderiam ter
sido imaginadas, mas com a mesma forca e consequ:ncias de uma
situacao real. Aquilo que, para o individuo, assume valor de
realidade e a realidade psiquica. E e isso que importa mesmo que
nao corresponda a realidade objetiva.
2. 2. O funcionamento psiquico e concebido a partir de tr:s
pontos de vista: o economico (existe uma quantidade de energia que
"alimenta" os processos psiquicos), o topico (o aparelho psiquico e
constituido de um numero de sistemas que sao diferenciados quanto a
sua natureza e modo de funcionamento, o que permite considera-lo
como "lugar" psiquico) e o din9mico (no interior do psiquismo
existem forcas que entram em conflito e estao, permanentemente,
ativas. A origem dessas forcas e a pulsao). Compreender os
processos e fenomenos psiquicos e considerar os tr:s pontos de
vista simultaneamente.
3. A pulsao refere-se a um estado de tensao que busca, atraves
de um objeto, a supressao deste estado. Eros e a pulsao de vida e
abrange as pulsoes sexuais e as de autoconservacao. Tanatos e a
pulsao de morte, pode ser autodestrutiva ou estar dirigida para
fora e se manifestar como pulsao agressiva ou destrutiva.
4. Sintoma, na teoria psicanalitica, e uma producao - quer seja
um comportamento, quer seja um pensamento - resultante de um
conflito psiquico entre o desejo e os mecanismos de defesa. O
sintoma, ao mesmo tempo em que sinaliza, busca encobrir um
conflito, substituir a satisfacao do desejo. Ele e ou pode ser o
ponto de partida da investigacao psicanalitica na tentativa de
descobrir os processos psiquicos encobertos que determinam sua
formacao. Os sintomas de Ana O. eram a paralisia e os disturbios do
pensamento; hoje, o sintoma da colega da sala de aula e recusar-se
a comer.
A SEGUNDA TEORIA DO APARELHO PSQUICO
Entre 1920 e 1923, Freud remodela a teoria do aparelho psiquico
e introduz os conceitos de id, ego e superego para referir-se aos
tr:s sistemas da personalidade.
O id constitui o reservatorio da energia psiquica, e onde se
"localizam" as pulsoes: a de vida e a de morte. As caracteristicas
atribuidas ao sistema inconsciente, na primeira teoria, sao, nesta
teoria, atribuidas ao id. E regido pelo principio do prazer.
O ego e o sistema que estabelece o equilibrio entre as
exig:ncias do id, as exig:ncias da realidade e as "ordens" do
superego. Procura "dar conta" dos interesses da pessoa. E regido
pelo
-
principio da realidade, que, com o principio do prazer, rege o
funcionamento psiquico. E um regulador, na medida em que altera o
principio do prazer para buscar a satisfacao considerando as
condicoes objetivas da realidade. Neste sentido, a busca do prazer
pode ser substituida pelo evitamento do desprazer. As funcoes
basicas do ego sao: percepcao, memoria, sentimentos,
pensamento.
O superego origina-se com o complexo de Edipo, a partir da
internalizacao das proibicoes, dos limites e da autoridade. A
moral, os ideais sao funcoes do superego. O conteudo do superego
refere-se a exig:ncias sociais e culturais.
Para compreender a constituicao desta inst9ncia - o superego - e
necessario introduzir a ideia de sentimento de culpa. Neste estado,
o individuo sente-se culpado por alguma coisa errada que fez - o
que parece obvio - ou que nao fez e desejou ter feito, alguma coisa
considerada ma pelo ego mas nao, necessariamente, perigosa ou
prejudicial; pode, pelo contrario, ter sido muito desejada. Por
que, entao, e considerada ma? Porque alguem importante para ele,
como o pai, por exemplo, pode puni-lo por isso. E a principal
punicao e a perda do amor e do cuidado desta figura de autoridade.
Portanto, por medo dessa perda, deve-se evitar fazer ou desejar
fazer a coisa ma; mas, o desejo continua e, por isso, existe a
culpa. Uma mudanca importante acontece quando esta autoridade
externa e internalizada pelo individuo. Ninguem mais precisa lhe
dizer "nao. E como se ele "ouvisse" esta proibicao dentro de si.
Agora, nao importa mais a acao para sentir-se culpado: o
pensamento, o desejo de fazer algo mau se encarregam disso. E nao
ha como esconder de si mesmo esse desejo pelo proibido. Com isso, o
mal-estar instala-se definitivamente no interior do individuo. A
funcao de autoridade sobre o individuo sera realizada
permanentemente pelo superego. E importante lembrar aqui que, para
a Psicanalise, o sentimento de culpa origina-se na passagem pelo
Complexo de Edipo.
O ego e, posteriormente, o superego sao diferenciacoes do id, o
que demonstra uma interdepend:ncia entre esses tr:s sistemas,
retirando a ideia de sistemas separados. O id refere-se ao
inconsciente, mas o ego e o superego t:m, tambem, aspectos ou
"partes" inconscientes.
E importante considerar que estes sistemas nao existem enquanto
uma estrutura vazia, mas sao sempre habitados pelo conjunto de
experi:ncias pessoais e particulares de cada um, que se constitui
como sujeito em sua relacao com o outro e em determinadas
circunst9ncias sociais. Isto significa que, para compreender
alguem, e necessario resgatar sua historia pessoal, que esta ligada
a historia de seus grupos e da sociedade em que vive.
OS MECANISMOS DE DEFESA, OU A REALIDADE COMO ELA NAO
A percepcao de um acontecimento, do mundo externo ou do mundo
interno, pode ser algo muito constrangedor, doloroso,
desorganizador. Para evitar este desprazer, a pessoa "deforma" ou
suprime a realidade - deixa de registrar percepcoes externas,
afasta determinados conteudos psiquicos, interfere no
pensamento.
Sao varios os mecanismos que o individuo pode usar para realizar
esta deformacao da realidade, chamados de mecanismos de defesa. Sao
processos realizados pelo ego e sao inconscientes, isto e, ocorrem
independentemente da vontade do individuo.
Para Freud, defesa e a operacao pela qual o ego exclui da
consci:ncia os conteudos indesejaveis, protegendo, desta forma, o
aparelho psiquico. O ego - uma inst9ncia a servico da realidade
externa e sede dos processos defensivos - mobiliza estes
mecanismos, que suprimem ou dissimulam a percepcao do perigo
interno, em funcao de perigos reais ou imaginarios localizados no
mundo exterior.
Estes mecanismos sao:
Recalque: o individuo "nao v:", "nao ouve" o que ocorre. Existe
a supressao de uma parte da realidade. Este aspecto que nao e
percebido pelo individuo faz parte de um todo e, ao ficar
invisivel, altera, deforma o sentido do todo. E como se, ao ler
esta pagina, uma palavra ou uma
-
das linhas nao estivesse impressa, e isto impedisse a
compreensao da frase ou desse outro sentido ao que o mais radical
esta escrito. Um exemplo e quando entendemos uma proibicao como
permissao porque nao "ouvimos o nao. O recalque, ao suprimir a
percepcao do que esta acontecendo, e o mais radical dos mecanismos
de defesa. Os demais se referem a deformacoes da realidade.
Formacao reativa: o ego procura afastar o desejo que vai em
determinada direcao, e, para isto, o individuo adota uma atitude
oposta a este desejo. Um bom exemplo sao as atitudes exageradas -
ternura excessiva, superprotecao - que escondem o seu oposto, no
caso, um desejo agressivo intenso. Aquilo que aparece (a atitude)
visa esconder do proprio individuo suas verdadeiras motivacoes (o
desejo), para preserva-lo de uma descoberta acerca de si mesmo que
poderia ser bastante dolorosa. E o caso da mae que superprotege o
filho, do qual tem muita raiva porque atribui a ele muitas de suas
dificuldades pessoais. Para muitas destas maes, pode ser aterrador
admitir essa agressividade em relacao ao filho.
Regressao: o individuo retorna a etapas anteriores de seu
desenvolvimento; e uma passagem para modos de expressao mais
primitivos. Um exemplo e o da pessoa que enfrenta situacoes
dificeis com bastante ponderacao e, ao ver uma barata, sobe na
mesa, aos berros. Com certeza, nao e so a barata que ela v: na
barata.
Projecao: e uma conflu:ncia de distorcoes do mundo externo e
interno. O individuo localiza (projeta) algo de si no mundo externo
e nao percebe aquilo que foi projetado como algo seu que considera
indesejavel. E um mecanismo de uso frequente e observavel na vida
cotidiana. Um exemplo e o jovem que critica os colegas por serem
extremamente competitivos e nao se da conta de que tambem o e, as
vezes ate mais que os colegas.
Racionalizacao: o individuo constroi uma argumentacao
intelectualmente convincente e aceitavel, que justifica os estados
"deformados" da consci:ncia. Isto e, uma defesa que justifica as
outras. Portanto, na racionalizacao, o ego coloca a razao a servico
do irracional e utiliza para isto o material fornecido pela
cultura, ou mesmo pelo saber cientifico. Dois exemplos: o pudor
excessivo (formacao reativa), justificado com argumentos morais; e
as justificativas ideologicas para os impulsos destrutivos que
eclodem na guerra, no preconceito e na defesa da pena de morte.
Alem destes mecanismos de defesa do ego, existem outros:
denegacao, identificacao, isolamento, anulacao retroativa, inversao
e retorno sobre si mesmo. Todos nos os utilizamos em nossa vida
cotidiana, isto e, deformamos a realidade para nos defender de
perigos internos ou externos, reais ou imaginarios. O uso destes
mecanismos nao e, em si, patologico, contudo distorce a realidade,
e so o seu desvendamento pode nos fazer superar essa falsa
consci:ncia, ou melhor, ver a realidade como ela e.
PSICANLISE: APLICAES E CONTRIBUIES SOCIAIS
A caracteristica essencial do trabalho psicanalitico e o
deciframento do inconsciente e a integracao de seus conteudos na
consci:ncia. Isto porque sao estes conteudos desconhecidos e
inconscientes que determinam, em grande parte, a conduta dos homens
e dos grupos - as dificuldades para viver, o mal-estar, o
sofrimento.
A finalidade deste trabalho investigativo e o autoconhecimento,
que possibilita lidar com o sofrimento, criar mecanismos de
superacao das dificuldades, dos conflitos e dos submetimentos em
direcao a uma producao humana mais autonoma, criativa e
gratificante de cada individuo, dos grupos, das instituicoes.
Nesta tarefa, muitas vezes bastante desejada pelo paciente, e
necessario que o psicanalista ajude a desmontar, pacientemente, as
resist:ncias inconscientes que obstaculizam a passagem dos
conteudos inconscientes para a consci:ncia.
-
A representacao social (a ideia) da Psicanalise ainda e bastante
estereotipada em nosso meio. Associamos a Psicanalise com o diva,
com o trabalho de consultorio excessivamente longo e so possivel
para as pessoas de alto poder aquisitivo. Esta ideia correspondeu,
durante muito tempo, a pratica nesta area que se restringia,
exclusivamente, ao consultorio. Contudo, ha varias decadas e
possivel constatar a contribuicao da Psicanalise e dos
psicanalistas em varias areas da saude mental. Historicamente, e
importante lembrar a contribuicao do psiquiatra e psicanalista D.
W. Winnicott, cujos programas radiofonicos transmitidos na Europa,
durante a Segunda Guerra Mundial, orientavam os pais na criacao dos
filhos, ou a contribuicao de Ana Freud para a Educacao e, mais
recentemente, as contribuicoes de Francoise Dolto e Maud Mannoni
para o trabalho de expressoes com criancas e adolescentes em
instituicoes - hospitais, creches, abrigos.
Atualmente, e inclusive no Brasil, os psicanalistas estao
debatendo o alcance social da pratica clinica visando torna-la
acessivel a amplos setores da sociedade. Eles tambem estao voltados
para a pesquisa e producao de conhecimentos que possam ser uteis na
compreensao de fenomenos sociais graves, como o aumento do
envolvimento do adolescente com a criminalidade, o surgimento de
novas (antigas?) formas de sofrimento produzidas pelo modo de
exist:ncia no mundo contempor9neo - as drogadicoes, a anorexia, a
sindrome do p9nico, a excessiva rnedicalizacao do sofrimento, a
sexualizacao da inf9ncia. Enfim, eles procuram compreender os novos
modos de subjetivacao e de existir, as novas expressoes que o
sofrimento psiquico assume. A partir desta compreensao e de suas
observacoes, os psicanalistas tentam criar modalidades de
intervencao no social que visam superar o mal-estar na civilizacao.
Alias, o proprio Freud, em varias de suas obras - O mal-estar
supera o mal-estar na civilizacao, Reflexoes para o tempo de guerra
e morte - coloca questoes sociais, e ainda atuais, como objeto de
reflexao, ou seja, nos faz pensar e ver o que mais incomoda: a
possibilidade constante de dissociacao dos vinculos sociais.
O metodo psicanalitico usado para desvendar o real, compreender
o sintoma individual ou social e suas determinacoes, e o
interpretativo. No caso da analise individual, o material de
trabalho do analista sao os sonhos, as associacoes livres, os atos
falhos (os esquecimentos, as substituicoes de palavras etc.). Em
cada um desses caminhos de acesso ao inconsciente, o que vale e a
historia pessoal. Cada palavra, cada simbolo tem um significado
particular para cada individuo, o qual so pode ser apreendido a
partir de sua historia, que e absolutamente unica e singular. Por
isso e que se diz que, a cada nova situacao, realiza-se novamente a
experi:ncia inaugurada por Freud, no inicio do seculo 20 - a
experi:ncia de tentar descobrir as regioes obscuras da vida
psiquica.
SOBRE O INCONSCIENTE
Que significa haver o inconsciente? Em primeiro lugar (...) uma
certa forma de descobrir sentidos, tipica da interpretacao
psicanalitica. Ou seja, tendo descoberto uma especie de ordem nas
emocoes das pessoas, os psicanalistas afirmam que ha um lugar
hipotetico donde elas prov:m. E como se supusessemos que existe um
lugar na mente das pessoas que funciona a semelhanca da
interpretacao que fazemos; so que ao contrario: la se cifra o que
aqui deciframos, os sonhos, por exemplo. Dormindo, produzimos
estranhas historias, que parecem fazer sentido, sem que saibamos
qual.
Chegamos a pensar que nos anunciam o futuro, simplesmente porque
parecem anunciar algo, querer comunicar algum sentido. Freud,
tratando dos sonhos, partia do principio de que eles diziam algo e
com bastante sentido. Nao, porem, o futuro. Decidiu interpreta-los.
Sua tecnica interpretativa era mais ou menos assim. Tomava as
varias partes de um sonho, seu ou alheio, e fazia com que o
sonhador associasse ideias e lembrancas a cada uma delas. Foi
possivel descobrir assim que os sonhos diziam respeito, em parte,
aos acontecimentos do dia anterior, embora se relacionassem tambem
com modos de ser infantis do sujeito.
Igualmente, ele descobriu algumas regras da logica das emocoes
que produz os sonhos. Vejamos as mais conhecidas. Com frequ:ncia,
uma figura que aparece nos sonhos, uma pessoa, uma situacao,
-
representa varias figuras fundidas, significa isso e aquilo ao
mesmo tempo. Chama-se este processo condensacao, e ele explica o
porqu: de qualquer interpretacao ser sempre muito mais extensa do
que o sonho interpretado. Outro processo, chamado deslocamento, e o
de dar o sonho uma import9ncia emocional maior a certos elementos
que, quando da interpretacao, se revelarao secundarios, negando-se
aqueles que se mostrarao realmente importantes. Um detalhezinho do
sonho aparece, na interpretacao, como o elo fundamental.
Digamos que o sonho, como um estudante desatento, coloca
erradamente o acento tonico (emocional, e claro), criando um drama
diverso do que deveria narrar; como se dissesse Esquilo por
esquilo... Um terceiro processo de formacao do sonho consiste em
que tudo e representado por meio de simbolos e, um quarto, reside
na forma final do sonho que, ao contrario da interpretacao, nao e
uma historia contada com palavras, porem uma cena visual. (...)
Do conjunto de associacoes que partem do sonho, o interprete
retira um sentido que lhe parece razoavel. Para Freud, e para nos,
todo sonho e uma tentativa de realizacao do desejo. (...) Sera tudo
apenas um brinquedo, uma charada que se inventa para resolver? Nao,
por certo (...). Apenas voc: deve compreender que o inconsciente
psicanalitico nao e uma coisa embutida no fundo da cabeca dos
homens, uma fonte de motivos que explicam o que de outra forma
ficaria pouco razoavel - como o medo de baratas ou a necessidade de
autopunicao. Inconsciente e o nome que se da a um sistema logico
que, por necessidade teorica, supomos que opere na mente das
pessoas, sem no entanto afirmar que, em si mesmo, seja assim ou
assado. Dele so sabemos pela interpretacao.
REFERNCIA
Bock, Ana Merc&s Bahia. Furtado, Odair. Teixeira, Maria de
Lourdes T. Psicologias: uma Introduo ao Estudo de Psicologia.
Saraiva. So Paulo: 2001.
-
A TEORIA BSICA DE JEAN PIAGETJos Luiz de Paiva Bello
Vitria, 1995
Desde muito cedo Jean Piaget demonstrou sua capacidade de
observao. Aos onze anos percebeu um melro albino em uma praa de sua
cidade. A observao deste pssaro gerou seu primeiro trabalho
cientfico. Formado em Biologia interessou-se por pesquisar sobre o
desenvolvimento do conhecimento nos seres humanos. As teorias de
Jean Piaget, portanto, tentam nos explicar como se desenvolve a
inteligncia nos seres humanos. Da o nome dado a sua cincia de
Epistemologia Gentica, que entendida como o estudo dos mecanismos
do aumento dos conhecimentos.
Convm esclarecer que as teorias de Piaget tm comprovao em bases
cientficas. Ou seja, ele no somente descreveu o processo de
desenvolvimento da inteligncia mas, experimentalmente, comprovou
suas teses. Resumir a teoria de Jean Piaget no uma tarefa fcil,
pois sua obra tem mais pginas que a Enciclopdia Britnica. Desde que
se interessou por desvendar o desenvolvimento da inteligncia
humana, Piaget trabalhou compulsivamente em seu objetivo, at s
vsperas de sua morte, em 1980, aos oitenta e quatro anos, deixando
escrito aproximadamente setenta livros e mais de quatrocentos
artigos. Repassamos aqui algumas idias centrais de sua teoria.
1 - A inteligncia para Piaget o mecanismo de adaptao do
organismo a uma situao nova e, como tal, implica a construo contnua
de novas estruturas. Esta adaptao refere-se ao mundo exterior, como
toda adaptao biolgica. Desta forma, os indivduos se desenvolvem
intelectualmente a partir de exerccios e estmulos oferecidos pelo
meio que os cercam. O que vale tambm dizer que a inteligncia humana
pode ser exercitada, buscando um aperfeioamento de potencialidades,
que evolui "desde o nvel mais primitivo da existncia, caracterizado
por trocas bioqumicas at o nvel das trocas simblicas"
(RAMOZZI-CHIAROTTINO apud CHIABAI, 1990, p. 3).
2 - Para Piaget o comportamento dos seres vivos no inato, nem
resultado de condicionamentos. Para ele o comportamento construdo
numa interao entre o meio e o indivduo. Esta teoria epistemolgica
(epistemo = conhecimento; e logia = estudo) caracterizada como
interacionista. A inteligncia do indivduo, como adaptao a situaes
novas, portanto, est relacionada com a complexidade desta interao
do indivduo com o meio. Em outras palavras, quanto mais complexa
for esta interao, mais inteligente ser o indivduo. As teorias
piagetianas abrem campo de estudo no somente para a psicologia do
desenvolvimento, mas tambm para a sociologia e para a antropologia,
alm de permitir que os pedagogos tracem uma metodologia baseada em
suas descobertas.
3 - No existe estrutura sem gnese, nem gnese sem estrutura
(Piaget). Ou seja, a estrutura de maturao do indivduo sofre um
processo gentico e a gnese depende de uma estrutura de maturao. Sua
teoria nos mostra que o indivduo s recebe um determinado
conhecimento se estiver preparado para receb-lo. Ou seja, se puder
agir sobre o objeto de conhecimento para inser-lo num sistema de
relaes. No existe um novo conhecimento sem que o organismo tenha j
um conhecimento anterior para poder assimil-lo e transform-lo. O
que implica os dois plos da atividade inteligente: assimilao e
acomodao. assimilao na medida em que incorpora a seus quadros todo
o dado da experincia ou struturao por incorporao da realidade
exterior a formas devidas atividade do sujeito (Piaget, 1982).
acomodao na medida em que a estrutura se modifica em funo do meio,
de suas variaes. A adaptao intelectual constitui-se ento em um
-
"equilbrio progressivo entre um mecanismo assimilador e uma
acomodao complementar" (Piaget, 1982). Piaget situa, segundo Dolle,
o problema epistemolgico, o do conhecimento, ao nvel de uma interao
entre o sujeito e o objeto. E "essa dialtica resolve todos os
conflitos nascidos das teorias, associacionistas, empiristas,
genticas sem estrutura, estruturalistas sem
gnese, etc. ... e permite seguir fases sucessivas da construo
progressiva do conhecimento" (1974, p. 52).
4 - O desenvolvimento do indivduo inicia-se no perodo
intra-uterino e vai at aos 15 ou 16 anos. Piaget diz que a
embriologia humana evolui tambm aps o nascimento, criando
estruturas cada vez mais complexas. A construo da inteligncia d-se
portanto em etapas sucessivas, com complexidades crescentes,
encadeadas umas s outras. A isto Piaget chamou de construtivismo
sequencial. A seguir os perodos em que se d este desenvolvimento
motor, verbal e mental.
A. Perodo Sensrio-Motor - do nascimento aos 2 anos,
aproximadamente. A ausncia da funo semitica a principal
caracterstica deste perodo. A inteligncia trabalha atravs das
percepes (simblico) e das aes (motor) atravs dos deslocamentos do
prprio corpo. uma inteligncia iminentemente prtica. Sua linguagem
vai da ecolalia (repetio de slabas) palavra-frase ("gua" para dizer
que quer beber gua) j que no representa mentalmente o objeto e as
aes. Sua conduta social, neste perodo, de isolamento e
indiferenciao (o mundo ele).
B. Perodo Simblico - dos 2 anos aos 4 anos, aproximadamente.
Neste perodo surge a funo semitica que permite o surgimento da
linguagem, do desenho, da imitao, da dramatizao, etc.. Podendo
criar imagens mentais na ausncia do objeto ou da ao o perodo da
fantasia, do faz de conta, do jogo simblico. Com a capacidade de
formar imagens mentais pode transformar o objeto numa satisfao de
seu prazer (uma caixa de fsforo em carrinho, por exemplo). tambm o
perodo em que o indivduo d alma (animismo) aos objetos ("o carro do
papai foi 'dormir' na garagem"). A linguagem est a nvel de monlogo
coletivo, ou seja, todos falam ao mesmo tempo sem que respondam as
argumentaes dos outros. Duas crianas conversando dizem frases que
no tm relao com a frase que o outro est dizendo. Sua socializao
vivida de forma isolada, mas dentro do coletivo. No h liderana e os
pares so constantemente trocados. Existem outras caractersticas do
pensamento simblico que no esto sendo mencionadas aqui, uma vez que
a proposta de sintetizar as idias de Jean Piaget, como por exemplo
o nominalismo (dar nomes s coisas das quais no sabe o nome ainda),
superdeterminao (teimosia), egocentrismo (tudo meu), etc.
C. Perodo Intuitivo - dos 4 anos aos 7 anos, aproximadamente.
Neste perodo j existe um desejo de explicao dos fenmenos. a idade
dos porqus, pois o indviduo pergunta o tempo todo. Distingue a
fantasia do real, podendo dramatizar a fantasia sem que acredite
nela. Seu pensamento continua centrado no seu prprio ponto de
vista. J capaz de organizar colees e conjuntos sem no entanto
incluir conjuntos menores em conjuntos maiores (rosas no conjunto
de flores, por exemplo). Quanto linguagem no mantm uma conversao
longa mas j capaz de adaptar sua resposta s palavras do
companheiro. Os Perodos Simblico e Intuitivo so tambm comumente
apresentados como Perodo Pr-Operatrio.
D. Perodo Operatrio Concreto - dos 7 anos aos 11 anos,
aproximadamente. o perodo em que o indivduo consolida as conservaes
de nmero, substncia, volume e peso. J capaz de ordenar elementos
por seu tamanho (grandeza), incluindo conjuntos, organizando ento o
mundo de forma lgica ou operatria. Sua organizao social a de bando,
podendo participar de grupos maiores, chefiando e admitindo a
chefia. J podem compreender regras, sendo fiis a ela, e
-
estabelecer compromissos. A conversao torna-se possvel (j uma
linguagem socializada), sem que no entanto possam discutrir
diferentes pontos de vista para que cheguem a uma concluso
comum.
E. Perodo Operatrio Abstrato - dos 11 anos em diante. o pice do
desenvolvimento da inteligncia e corresponde ao nvel de pensamento
hipottico-dedutivo ou lgico-matemtico. quando o indivduo est apto
para calcular uma probabilidade, libertando-se do concreto em
proveito de interesses orientados para o futuro. , finalmente, a
abertura para todos os possveis. A partir desta estrutura de
pensamento possvel a dialtica, que permite que a linguagem se d a
nvel de discusso para se chegar a uma concluso. Sua organizao
grupal pode estabelecer relaes de cooperao e reciprocidade.
5 - A importncia de se definir os perodos de desenvolvimento da
inteligncia reside no fato de que, em cada um, o indivduo adquire
novos conhecimentos ou estratgias de sobrevivncia, de compreenso e
interpretao da realidade. A compreenso deste processo fundamental
para que os professores possam tambm compreender com quem esto
trabalhando. A obra de Jean Piaget no oferece aos educadores uma
didtica especfica sobre como desenvolver a inteligncia do aluno ou
da criana. Piaget nos mostra que cada fase de desenvolvimento
apresenta caractersticas e possibilidades de crescimento da maturao
ou de aquisies. O conhecimento destas possibilidades faz com que os
professores possam oferecer estmulos adequados a um maior
desenvolvimento do indivduo. Aceitar o ponto de vista de Piaget,
portanto, provocar turbulenta revoluo no processo escolar (o
professor transforma-se numa espcia de tcnico do time de futebol,
perdendo seu ar de ator no palco). (...) Quem quiser segui-lo tem
de modificar,
fundamentalmente, comportamentos consagrados, milenarmente
(alis, assim que age a
cincia e a pedagogia comea a tornar-se uma arte apoiada,
estritamente, nas cincias
biolgicas, psicolgicas e sociolgicas). Onde houver um professor
ensinando... a no est havendo uma escola piagetiana! (Lima, 1980,
p. 131).
O lema o professor no ensina, ajuda o aluno a aprender, do Mtodo
Psicogentico, criado por Lauro de Oliveira Lima, tem suas bases
nestas teorias epistemolgicas de Jean Piaget. Existem outras
escolas, espalhadas pelo Brasil, que tambm procuram criar
metodologias especficas embasadas nas teorias de Piaget. Estas
iniciativas passam tanto pelo campo do ensino particular como pelo
pblico. Alguns governos municipais, inclusive, j tentam adot-las
como preceito poltico-legal. Todavia, ainda se desconhece as
teorias de Piaget no Brasil. Pode-se afirmar que ainda limitado o
nmero daqueles que buscam conhecer melhor a Epistemologia Gentica e
tentam aplic-la na sua vida profissional, na sua prtica pedaggica.
Nem mesmo as Faculdades de Educao, de uma forma geral, preocupam-se
em aprofundar estudo nestas teorias. Quando muito oferecem os
perodos de desenvolvimento, sem permitir um maior entendimento por
parte dos alunos.
REFERNCIAS
CHIABAI, Isa Maria. A influncia do meio rural no processo de
cognio de crianas da pr-escola: uma interpretao fundamentada na
teoria do conhecimento de Jean Piaget. So Paulo, 1990. Tese
(Doutorado), Instituto de Psicologia, USP. 165 p. LIMA, Lauro de
Oliveira. Piaget para principiantes. 2. ed. So Paulo: Summus, 1980.
284 p. PIAGET, Jean. O nascimento da inteligncia na criana. 4. ed.
Rio de Janeiro: Zahar, 1982. 389 p.
-
TEORIA CONSTRUTIVISTA
Prof Heloisa Argento
A partir da metade do sculo XX, no Brasil, surgem novas teorias
nas reas da psicologia educacional. Piaget e Vygotsky, pais da
psicologia cognitiva contempornea, propem que conhecimento
construdo em ambientes naturais de interao social, estruturados
culturalmente. Cada aluno constri seu prprio aprendizado num
processo de dentro para fora baseado em experincias de fundo
psicolgico. Os tericos desta abordagem procuram explicar o
comportamento humano em uma perspectiva em que sujeito e objeto
interagem em um processo que resulta na construo e reconstruo de
estruturas cognitivas. Piaget acrescenta mudanas fundamentais posio
de Kant, em relao ao conhecimento, na medida em que em seu sistema
no existe nenhuma categoria de entendimento a priori. As noes de
tempo, espao e a logicidade de raciocnio so construdas pelo
indivduo atravs da ao em trocas dialticas com o meio. Vygotsky e os
outros tericos russos enfatizam o papel dos determinantes
scio-culturais na formao das estruturas comportamentais. (COUTINHO
E MOREIRA, 1991 p.23)
Segundo Mario Carretero (CARRETERO, 1997), construtivismo " a
idia que sustenta que o indivduo - tanto nos aspectos cognitivos
quanto sociais do comportamento como nos afetivos - no um mero
produto do ambiente nem um simples resultado de suas disposies
internas, mas, sim, uma construo prpria que vai se produzindo, dia
a dia, como resultado da interao entre esses dois fatores. Em
consequncia, segundo a posio construtivista, o conhecimento no uma
cpia da realidade, mas, sim, uma construo do ser humano".
Vygotsky v o sujeito como um ser eminentemente social, na linha
do pensamento marxista, e ao prprio conhecimento como um produto
social. Ele sustenta que todos os processos psicolgicos superiores
(comunicao, linguagem, raciocnio, etc.), so adquiridos no contexto
social e depois se internalizam. Piaget desenvolveu uma teoria
chamada de Epistemologia Gentica ou Teoria Psicogentica, onde
explica como o indivduo, desde o seu nascimento, constri o
conhecimento. Esta teoria a mais conhecida concepo construtivista
da formao da inteligncia.
Piaget v o professor mais como um espectador do desenvolvimento
e favorecedor dos processos de descobrimento autnomo de conceitos
do que como um agente que pode intervir ativamente na assimilao do
conhecimento. Mario Carretero (CARRETERO, 1997) coloca: "a teoria
de Piaget continua oferecendo, na atualidade, a viso mais completa
de desenvolvimento cognitivo, tanto pela grande quantidade de
aspectos que aborda (desenvolvimento cognitivo desde o nascimento
at a idade adulta, desenvolvimento moral, noes sociais, lgicas,
matemticas, etc.) como por sua coerncia interna e utilizao de uma
metodologia que deu origem a resultados muito produtivos durante
cinquenta anos de pesquisa."
PRESSUPOSTOS ESSENCIAIS DO MODELO GENTICO-COGNITIVO DE
PIAGET
Piaget trabalhou compulsivamente em seu objetivo, de estudar a
gnese da inteligncia at as vsperas de sua morte, em 1980, aos
oitenta e quatro anos, deixando escritos aproximadamente setenta
livros e mais de quatrocentos artigos. Desde muito cedo Jean Piaget
demonstrou sua capacidade de observao. Aos onze anos percebeu um
melro albino em uma praa de sua cidade. A observao deste pssaro
gerou seu primeiro trabalho cientfico. Formado em Biologia
interessou-se por pesquisar sobre o desenvolvimento do conhecimento
nos seres humanos. Da o nome dado a sua cincia de Epistemologia
Gentica, que entendida como estudo dos mecanismos de formao do
conhecimento lgico tais como as noes de tempo, espao, objeto,
causalidade etc. e da gnese
-
(nascimento) e a evoluo do conhecimento humano. Para Piaget o
comportamento dos seres vivos no inato, nem resultado de
condicionamentos. Para ele o comportamento construdo numa
interao entre o meio e o indivduo. Esta teoria epistemolgica
(epistemo = conhecimento; e logia = estudo) caracterizada como uma
viso interacionista do desenvolvimento. A inteligncia do indivduo,
como adaptao a situaes novas, portanto, est relacionada com a
complexidade desta interao do indivduo com o meio. Em outras
palavras, quanto mais complexa for esta interao, mais inteligente
ser o indivduo.
Epistemologia gentica: estudo de como se passa de um
conhecimento para outro conhecimento superior. Interacionismo:
teoria psicolgica que sustenta que o desenvolvimento do
comportamento humano uma construo resultante da relao do organismo
com o meio em que est inserido. Esta teoria valoriza igualmente o
organismo e o meio. Em relao ao conhecimento, indica que a
representao da realidade em sistemas organizados de elementos que
se relacionam entre si. O indivduo ao longo de sua vida, constri
diferentes modelos desta realidade, cada vez mais complexos, pois o
que tem que entender que estes modelos apresentam uma certa
estabilidade temporal, mas, ao mesmo tempo, esto submetidos a
processos de mudana que modificam os sistemas construdos a cada
momento. (MERCHN, 2000 p.49)
No existe estrutura sem gnese, nem gnese sem estrutura (Piaget,
1982). Ou seja, a estrutura de maturao do indivduo sofre um
processo gentico e a gnese depende de uma estrutura de maturao. Sua
teoria nos mostra que o indivduo s recebe um determinado
conhecimento se estiver preparado para receb-lo. Ou seja, se puder
agir sobre o objeto de conhecimento para inseri-lo num sistema de
relaes. No existe um novo conhecimento sem que o organismo tenha j
um conhecimento anterior para poder assimil-lo e transform-lo. A
interao com o meio, proporciona modelos ou representaes bsicas a
partir de uma estrutura hereditria j constituda, mas o
desenvolvimento do indivduo lhe vai dotando de conhecimentos sobre
a realidade que, ao relacionar-se de outra forma entre si,
amplia-se e d entrada a outros novos conhecimentos, configurando
sistemas progressivamente diferenciados e caractersticos de etapas
que se repetem em todos os indivduos. Portanto a construo da
inteligncia d-se, em etapas ou estgios sucessivos, com
complexidades crescentes, encadeadas umas s outras. A isto Piaget
chamou de construtivismo seqencial.
Construtivismo seqencial: o desenvolvimento da inteligncia
faz-se por complexidade crescente, onde um estgio (nvel) resultante
de outro anterior. Estgios: patamares de desenvolvimento que se d
por sucesso (organizaes de aes e pensamento caractersticas de cada
fase do desenvolvimento do indivduo).
ESTGIOS DO DESENVOLVIMENTO GENTICO-COGNITIVO
Piaget, quando descreve a aprendizagem, tem um enfoque diferente
do que normalmente se atribui esta palavra. Piaget separa o
processo cognitivo inteligente em duas palavras: aprendizagem e
desenvolvimento. Para Piaget, segundo MACEDO (1994), a aprendizagem
refere-se aquisio de uma resposta particular, aprendida em funo da
experincia, obtida de forma sistemtica ou no. Enquanto que o
desenvolvimento seria uma aprendizagem de fato, sendo este o
responsvel pela formao dos conhecimentos. Piaget, quando postula
sua teoria sobre o desenvolvimento da criana, descreve-a,
basicamente, em 4 estgios, que ele prprio chama de fases de transio
(Piaget, 1975): Sensrio-motor (0 2 anos); Pr-operatrio ( 2 7 anos);
Operatrio-concreto ( 7 12 anos); Operatrio Lgico-Formal (12 16
anos);
-
A. Perodo Sensrio-Motor: Do nascimento aos 2 anos,
aproximadamente, etapa bsica manipulativa. A ausncia da funo
semitica a principal caracterstica deste perodo. A inteligncia
trabalha atravs das percepes (simblico) e das aes (motor) atravs
dos deslocamentos do prprio corpo. Sua linguagem vai da ecolalia
(repetio de slabas) palavra-frase ("gua" para dizer que quer beber
gua) j que no representa mentalmente o objeto e as aes. Sua conduta
social, neste perodo, de isolamento e indiferenciao. (o mundo
ele).
Funo semitica: capacidade que o indivduo tem de gerar imagens
mentais de objetos ou aes, e atravs dela chegar a representao ( da
ao ou do objeto). A funo semitica comea pela manipulao imitativa do
objeto e prossegue na imitao interior ou diferida (imagem mental),
na ausncia do objeto. a funo semitica que permite o pensamento".
(Lima, 1980: 102).
Neste estgio, a partir de reflexos neurolgicos bsicos, o beb
comea a construir esquemas de ao para assimilar mentalmente o meio
(LOPES, 1996). Tambm marcado pela construo prtica das noes de
objeto, espao, causalidade e tempo (MACEDO, 1991). Segundo Lopes,
as noes de espao e tempo so construdas pela ao, configurando assim,
uma inteligncia essencialmente prtica.
Conforme MACEDO (1991, p. 124) assim que os esquemas vo "pouco a
pouco, diferenciando-se e integrando-se, no mesmo tempo em que o
sujeito vai se separando dos objetos podendo, por isso mesmo,
interagir com eles de forma mais complexa." NITZKE et alli (1997b)
diz-se que o contato com o meio direto e imediato, sem representao
ou pensamento. Exemplo: O beb pega o que est em sua mo; "mama" o
que posto em sua boca; "v" o que est diante de si. Aprimorando
esses esquemas, capaz de ver um objeto, peg-lo e lev-lo a boca.
B. Perodo pr-operatrio ou Simblico ou Intuitivo: Dos 2 anos aos
7 anos, aproximadamente. Etapa intuitiva e de aprendizagem
instrumental bsica. Neste perodo surge a funo semitica que permite
o surgimento da linguagem, do desenho, da imitao, da dramatizao,
etc. Podendo criar imagens mentais na ausncia do objeto ou da ao o
perodo da fantasia, do faz de conta, do jogo simblico. Com a
capacidade de formar imagens mentais pode transformar o objeto numa
satisfao de seu prazer (uma caixa de fsforos em carrinho, por
exemplo). tambm o perodo em que o indivduo d alma (animismo) aos
objetos ("o carro do papai foi 'dormir' na garagem"). A linguagem
est em nvel de monlogo coletivo, ou seja, todos falam ao mesmo
tempo sem que respondam as argumentaes dos outros. Duas crianas
conversando dizem frases que no tm relao com a frase que o outro
est dizendo. Sua socializao vivida de forma isolada, mas dentro do
coletivo. No h liderana e os pares so constantemente trocados.
Existem outras caractersticas do pensamento simblico que no esto
sendo mencionadas aqui, uma vez que a proposta de sintetizar as
idias de Jean Piaget, como por exemplo: Antropomorfismo ou
Nominalismo: dar nomes s coisas das quais no sabe o nome ainda.
Superdeterminao: teimosia. Egocentrismo: tudo meu. Neste perodo
j existe um desejo de explicao dos fenmenos. a idade dos porqus,
pois o indivduo pergunta o tempo todo. Distingue a fantasia do
real, podendo dramatizar a fantasia sem que acredite nela. Seu
pensamento continua centrado no seu prprio ponto de vista. J capaz
de organizar colees e conjuntos sem, no entanto incluir conjuntos
menores em conjuntos maiores (rosas no conjunto de flores, por
exemplo). Quanto linguagem, no mantm uma conversao longa, mas j
capaz de adaptar sua resposta s palavras do companheiro.
Intuio: uma representao construda por meio de percepes
interiorizadas e fixas e no chega ainda ao nvel da operao. Ou, um
pensamento imaginado. Incide sobre as configuraes de conjunto e no
mais sobre simples colees sincrticas simbolizadas por exemplares
tipos.
-
Imagem mental: um produto da interiorizao dos atos de
inteligncia. Constituinum decalque, no do prprio objeto, mas das
acomodaes prprias da ao que incidem sobre o objeto. Cpia do objeto
realizada atravs do sensrio-motor. a imagem criada na mente de um
objeto ou ao distante.
Animismo: concepo de objetos inanimados com vida, sentimento ou
intencionalidade, sendo uma das manifestaes do egocentrismo
infantil.
Egocentrismo: pensamento centrado no ego, no sujeito, conjunto
de atitudes prcrticas, pr-objetivas, pr-lgicas e pr-conceituais,
seja em relao natureza, aos outros ou a si mesma.
nesta fase que surge, na criana, a capacidade de substituir um
objeto ou acontecimento por uma representao (PIAGET e INHELDER,
1982), e esta substituio possvel, conforme PIAGET, graas funo
simblica. Assim este estgio tambm muito conhecido como o estgio da
Inteligncia Simblica. Contudo, MACEDO (1991) lembra que a atividade
sensrio-motor no est esquecida ou abandonada, mas refinada e mais
sofisticada, pois verifica-se que ocorre uma crescente melhoria na
sua aprendizagem, permitindo que a mesma explore melhor o ambiente,
fazendo uso de mais e mais sofisticados movimentos e percepes
intuitivas.
Em suma, a criana deste estgio: egocntrica, centrada em si
mesma, e no consegue se colocar, abstratamente, no lugar do outro.
No aceita a idia do acaso e tudo deve ter uma explicao ( fase dos
"por qus"). J pode agir por simulao, "como se". Possui percepo
global sem discriminar detalhes. Deixa se levar pela aparncia sem
relacionar fatos. Exemplos: Mostram-se para a criana, duas bolinhas
de massa iguais e d-se a uma delas a forma de salsicha. A criana
nega que a quantidade de massa continue igual, pois as formas so
diferentes. No relaciona as situaes.
C. Perodo Operatrio Concreto: Dos 7 anos aos 11 /12anos,
aproximadamente. o perodo em que o indivduo consolida a construo
das operaes subjacentes s quais se encontram as possibilidades
intelectuais do perodo. Tais operaes so o resultado de aes mentais
interiorizadas e reversveis. No inicio desta fase do pensamento
lgicoconcreto a lgica infantil est, ainda muito dependente da
manipulao concreta de objetos, e de relaes entre objetos. Entende
que as conservaes de nmero, substncia, volume e peso no acarretam,
necessariamente, a mudana de quantidade. J capaz de ordenar
elementos por seu tamanho (grandeza), incluindo conjuntos,
organizando ento o mundo de forma lgica ou operatria. Sua organizao
social a de bando, podendo participar de grupos maiores, chefiando
e admitindo a chefia. J podem compreender regras, sendo fiis a ela,
e estabelecer compromissos. A conversao torna-se possvel (j uma
linguagem socializada), sem que, no entanto possam discutir
diferentes pontos de vista para que cheguem a uma concluso
comum.
Reversibilidade: quando a operao deixa de ter um sentido
unidirecional. A reversibilidade seria a capacidade de voltar, de
retorno ao ponto de partida. Aparece, portanto como uma propriedade
das aes do sujeito, possvel de se exercerem em pensamento ou
interiormente. Lembramos que as operaes nunca tm um sentido
unidirecional; so reversveis. Conservao: uma invariante que permite
a formao de novas estruturas. A invarincia a conservao. A estrutura
apenas um patamar: O funcionamento levar formao de novas
estruturas" (Lima, 1980: 56). Pode ser observada na rea:
Lgico-matemtica: conservao dos nmeros, etc. Fsicas: Substncia,
peso, volume, etc. Espaciais: Medida, rea, etc. Conforme NITZKE et
alli (1997b), neste estgio a criana
-
desenvolve noes de tempo, espao, velocidade, ordem,
casualidade..., sendo ento capaz de relacionar diferentes aspectos
e abstrair dados da realidade. Apesar de no se limitar mais a uma
representao imediata, depende do mundo concreto para abstrair. Um
importante conceito desta fase o desenvolvimento da
reversibilidade, ou seja, a capacidade da representao de uma ao no
sentido inverso de uma anterior, anulando a transformao observada.
Exemplos: Despeja-se a gua de dois copos em outros, de formatos
diferentes, para que a criana diga se as quantidades continuam
iguais. A resposta afirmativa uma vez que a criana j diferencia
aspectos e capaz de "refazer" a ao.
D. Perodo Operatrio Lgico Formal ou Abstrato Dos 12 aos 16 anos
em diante, em que acaba a construo de estruturas intelectuais
prprias do raciocnio hipottico-dedutivo, que caracterstico nos
adultos. o pice do desenvolvimento da inteligncia e corresponde ao
nvel de pensamento hipottico-dedutivo ou lgico-matemtico. quando o
indivduo est apto para calcular uma probabilidade, libertando-se do
concreto em proveito de interesses orientados para o futuro. ,
finalmente, a abertura para todos os possveis. A partir desta
estrutura de pensamento possvel a dialtica, que permite que a
linguagem se d em nvel de discusso para se chegar a uma concluso.
Sua organizao grupal pode estabelecer relaes de cooperao e
reciprocidade. Logicizao: processo de transformar o pensamento
simblico e intuitivo em pensamento operatrio. Segundo WADSWORTH
(1996) neste momento que as estruturas cognitivas da criana alcanam
seu nvel mais elevado de desenvolvimento. A representao agora
permite criana uma abstrao total, no se limitando mais representao
imediata e nem s relaes previamente existentes. Agora a criana
capaz de pensar logicamente, formular hipteses e buscar solues, sem
depender mais s da observao da realidade. Em outras palavras, as
estruturas cognitivas da criana alcanam seu nvel mais elevado de
desenvolvimento e tornam-se aptas a aplicar o raciocnio lgico a
todas as classes de problemas. Exemplos: Se lhe pedem para analisar
um provrbio como "de gro em gro, a galinha enche o papo", a criana
trabalha com a lgica da idia (metfora) e no com a imagem de uma
galinha comendo gros. A seqncia das etapas sempre invarivel, embora
a poca em que so alcanadas possa no ser sempre a mesma para todas
as crianas. So quatro os fatores bsicos responsveis pela passagem
de uma etapa de desenvolvimento para a seguinte a maturidade do
sistema nervoso, a interao social (que se d atravs da linguagem e
da educao), a experincia fsica com os objetos e, principalmente, a
equilibrao.
CONCEITOS BSICOS DA TEORIA PIAGETIANA
Para se compreender o processo de construo do conhecimento,
necessrio evidenciar a configurao dos sistemas que integram os
processos de como o individuo se desenvolve, adquire novos
conhecimentos e a importncia da interao entre o sujeito e o objeto.
Para tanto, necessrio conhecer com clareza o que significa os
seguintes conceitos: 1 - Organizao: No pode haver adaptao
(assimilao e acomodao) proveniente de uma fonte desorganizada, pois
a adaptao tem como base uma organizao inicial expressa no esquema
(ponto de partida para a ao do indivduo sobre os objetos do
conhecimento). O pensamento (interiorizao da ao) se organiza
mediante a constituio de esquemas que formam atravs do processo de
adaptao. A adaptao e organizao so os processos indissolveis do
pensamento. 2 - Adaptao: um processo dinmico e contnuo no qual a
estrutura hereditria do organismo interage com o meio externo de
modo a reconstituir-se. Ela a essncia do funcionamento intelectual
e biolgico. um movimento de equilbrio contnuo entre a assimilao e a
acomodao, que so processos distintos, porm indissociveis que compem
a adaptao, processo este que se refere ao restabelecimento de
equilbrio. O indivduo modifica o meio e
-
tambm modificado por ele. A adaptao intelectual constitui-se
ento em um "equilbrio progressivo entre um mecanismo assimilador e
uma acomodao complementar" (Piaget, 1982). 3. Assimilao e Acomodao:
A assimilao o processo cognitivo pelo qual uma pessoa integra
(classifica) um novo dado perceptual, motor ou conceitual s
estruturas cognitivas prvias (WADSWORTH, 1996). Ou seja, quando a
criana tem novas experincias (vendo coisas novas, ou ouvindo coisas
novas) ela tenta adaptar esses novos estmulos s estruturas
cognitivas que j possui. O prprio Piaget define a assimilao como
(PIAGET, 1996, p. 13) : ... uma integrao estruturas prvias, que
podem permanecer invariveis ou so mais ou menos modificadas por
esta prpria integrao, mas sem descontinuidade com o estado
precedente, isto , sem serem destrudas, mas simplesmente
acomodando-se nova situao. Isto significa que a criana tenta
continuamente adaptar os novos estmulos aos esquemas que ela possui
at aquele momento. Por exemplo, imaginemos que uma criana est
aprendendo a reconhecer animais, e at o momento, o nico animal que
ela conhece e tem organizado esquematicamente o cachorro. Assim,
podemos dizer que a criana possui, em sua estrutura cognitiva, um
esquema de cachorro. Pois bem, quando apresentada, esta criana, um
outro animal que possua alguma semelhana, como um cavalo, ela a ter
tambm como cachorro (marrom, quadrpede, um rabo, pescoo, nariz
molhado, etc.). Figura Ligeira semelhana morfolgica entre um cavalo
e um cachorro Notadamente, ocorre, neste caso, um processo de
assimilao, ou seja a similaridade entre o cavalo e o cachorro
(apesar da diferena de tamanho) faz com que um cavalo passe por um
cachorro em funo da proximidades dos estmulos e da pouca variedade
e qualidade dos esquemas acumulados pela criana at o momento. A
diferenciao do cavalo para o cachorro dever ocorrer por um processo
chamado de acomodao. Ou seja, a criana, apontar para o cavalo e dir
"cachorro". Neste momento, uma adulto intervm e corrige, "no,
aquilo no um cachorro, um cavalo". Quando corrigida, definindo que
se trata de um cavalo, e no mais de um cachorro, a criana, ento,
acomodar aquele estmulo a uma nova estrutura cognitiva, criando
assim um novo esquema. Esta criana tem agora, um esquema para o
conceito de cachorro e outro para o conceito de cavalo. Entrando
agora na operao cognitiva da acomodao, iniciamos com definio dada
por PIAGET (p. 18, 1996): Chamaremos acomodao (por analogia com os
"acomodatos" biolgicos) toda modificao dos esquemas de assimilao
sob a influncia de situaes exteriores (meio) ao quais se aplicam.
Assim, a acomodao acontece quando a criana no consegue assimilar um
novo estmulo, ou seja, no existe uma estrutura cognitiva que
assimile a nova informao em funo das particularidades desse novo
estmulo (NITZKE et alli, 1997a). Diante deste impasse, restam
apenas duas sadas: criar um novo esquema ou modificar um esquema
existente. Ambas as aes resultam em uma mudana na estrutura
cognitiva. Ocorrida a acomodao, a criana pode tentar assimilar o
estmulo novamente, e uma vez modificada a estrutura cognitiva, o
estmulo prontamente assimilado. WADSWORTH diz que (1996, p. 7) "A
acomodao explica o desenvolvimento (uma mudana qualitativa), e a
assimilao explica o crescimento (uma mudana quantitativa); juntos
eles explicam a adaptao intelectual e o desenvolvimento das
estruturas cognitivas."Essa mesma opinio compartilhada por NITZKE
et alli (1997a), que escreve que os processos responsveis por
mudanas nas estruturas cognitivas so a assimilao e a acomodao.
PIAGET (1996), quando expe as idias da assimilao e da acomodao, no
entanto, deixa claro que da mesma forma como no h assimilao sem
acomodaes (anteriores ou atuais), tambm no existem acomodaes sem
assimilao. Esta declarao de Piaget, significa que o meio no provoca
simplesmente o registro de impresses ou a formao de cpias, mas
desencadeia ajustamentos ativos. Procurando elucidar essas
declaraes, quando se fala que no existe assimilao sem acomodao,
significa que a assimilao de um novo dado perceptual, motor ou
conceitual se dar primeiramente em esquemas j existentes, ou seja,
acomodados em fases anteriores. E quando se fala que no existem
acomodaes sem assimilao, significa que um dado
-
perceptual, motor ou conceitual acomodado perante a sua
assimilao no sistema cognitivo existente. neste contexto que Piaget
(1996, p. 18) fala de "acomodao de esquemas de assimilao". Partindo
da idia de que no existe acomodao sem assimilao, podemos dizer que
esses esquemas cognitivos no admitem o comeo absoluto (PIAGET,
1996), pois derivam sempre, por diferenciaes sucessivas, de
esquemas anteriores. E dessa maneira que os esquemas se desenvolvem
por crescentes equilibraes e auto-regulaes. Segundo WAZLAVICK
(1993), pode-se dizer que a adaptao um equilbrio constante entre a
assimilao e a acomodao. De uma forma bastante simples, WADSWORTH
(1996) escreve que durante a assimilao, uma pessoa impe sua
estrutura disponvel aos estmulos que esto sendo processados. Isto ,
os estmulos so "forados" a se ajustarem estrutura da pessoa. Na
acomodao o inverso verdadeiro. A pessoa "forada" a mudar sua
estrutura para acomodar os novos estmulos. Assim, de acordo com a
teoria construtivista, a maior parte dos esquemas, em lugar de
corresponder a uma montagem hereditria acabada, constroem-se pouco
a pouco, e do lugar a diferenciaes, por acomodao s situaes
modificadas, ou por combinaes (assimilaes recprocas com ou sem
acomodaes novas) mltiplas ou variadas. 4 - Esquema: Modelo de
atividade que o organismo utiliza para incorporar o meio. No ser
humano os esquemas iniciais, ponto de partida da interao sujeito e
objeto, so os reflexos. Todo novo esquema construdo a partir dos
esquemas iniciais, ponto de partida para novas interaes do indivduo
com o meio. A adaptao, resultante dos processos de assimilao e
acomodao, se refere construo dos esquemas. WADSWORTH (1996) define
os esquemas como estruturas mentais, ou cognitivas, pelas quais os
indivduos intelectualmente se adaptam e organizam o meio. Assim
sendo, os esquemas so tratados, no como objetos reais, mas como
conjuntos de processos dentro do sistema nervoso. Os esquemas no so
observveis, so inferidos e, portanto, so constructos hipotticos.
Conforme PULASKI (1986), esquema uma estrutura cognitiva, ou padro
de comportamento ou pensamento, que emerge da integrao de unidades
mais simples e primitivas em um todo mais amplo, mais organizado e
mais complexo. Dessa forma, temos a definio que os esquemas no so
fixos, mas mudam continuamente ou tornam-se mais refinados. Uma
criana, quando nasce, apresenta poucos esquemas (sendo de natureza
reflexa), e medida que se desenvolve, seus esquemas tornam-se
generalizados, mais diferenciados e mais numerosos. NITZKE et alli
(1997a) escreve que os esquemas cognitivos do adulto so derivados
dos esquemas sensrio-motores da criana. De fato, um adulto, por
exemplo, possui um vasto arranjo de esquemas comparativamente
complexos que permitem um grande nmero de diferenciaes. Estes
esquemas so utilizados para processar e identificar a entrada de
estmulos, e graas a isto o organismo est apto a diferenciar
estmulos, como tambm est apto a generaliz-los. O funcionamento mais
ou menos o seguinte: uma criana apresenta um certo nmero de
esquemas, que grosseiramente poderamos compar-los como fichas de um
arquivo. Diante de um estmulo, essa criana tenta "encaixar" o
estmulo em um esquema disponvel. Vemos ento, que os esquemas so
estruturas intelectuais que organizam os eventos como eles so
percebidos pelo organismo e classificados em grupos, de acordo com
caractersticas comuns. 5 - Experincia Fsica e Lgico-matematica: O
fator essencial na constituio do esquema a ao do sujeito sobre o
objeto do conhecimento. Esta ao representada por dois tipos de
experincia, indissociveis, mas passveis de serem abordadas
didaticamente. Trata-se da experincia fsica e da experincia
lgico-matemtica.
A INTELIGNCIA SEU DESENVOLVIMENTO NA TEORIA PIAGETIANA
A inteligncia para Piaget o mecanismo de adaptao do organismo a
uma situao nova e, como tal, implica na construo contnua de novas
estruturas dotando o indivduo de uma srie de instrumentos para
conhecer a realidade e relacionar-se com ela, partindo de uma
aproximao
-
espontnea que permite os modelos e representaes intuitivas.
Desta forma, os indivduos se desenvolvem intelectualmente a partir
de exerccios e estmulos oferecidos pelo meio que os cercam. O que
vale tambm dizer que a inteligncia humana pode ser exercitada,
buscando um aperfeioamento de potencialidades, que evolui desde o
nvel mais elementar da vida do indivduo, at o nvel das trocas
simblicas. O conhecimento se mostra como resultado de uma construo
onde importante a maturao e a experincia do indivduo, reguladas por
um mecanismo interno, que Piaget d o nome de equilibrao, que atua
como processo autoregulador, para compensar as perturbaes
exteriores que rompem o equilbrio interno. O resultado de cada
reequilibrao no a volta ao equilbrio anterior, e sim a um novo
estado qualitativo diferente. (MERCHN, 2000 p.53) O desenvolvimento
intelectual o processo que busca atingir formas de equilbrio cada
vez melhores ou, em outras palavras, um processo de equilibrao
sucessiva que tende a uma forma final, ou seja, a aquisio do
pensamento operatrio formal. Pode-se dizer ainda que a construo de
estruturas ou estratgias de comportamento. Gira em torno da
atividade do organismo que pode ser motora, verbal e mental. a
evoluo (processo de organizao em nveis progressivamente
superiores.) do indivduo. O processo de desenvolvimento
influenciado por quatro fatores, a saber: 1 - Maturao: Base
biolgica do comportamento, o amadurecimento de estruturas biolgicas
na intera