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A teoria do ciclo de vida de Franco Modigliani fre-qentemente
invocada para explicar as motivaes para comportamentos financeiros
das pessoas fsicas, medida que envelhecem. De acordo com a teoria,
a expectativa de queda da renda do trabalho na terceira idade induz
as pessoas acumulao prvia de ativos, a fim de financiar um padro
estvel de consumo e de bem-estar durante os anos finais da vida. No
Brasil, temos o hbito de questionar a validade de teorias globais,
em prol de conjecturas locais, e perguntamos: ser que a motivao de
poupana de prazo to longo, como proposta por Modigliani,
sobreviveria ao conhecido hbito brasileiro de pensar e trabalhar
somente no curto prazo?
Mesmo que a hiptese central de suavizao privada do bem-estar ao
longo do tempo seja rejeitada no nosso contex-to, a teoria oferece
um arcabouo interessante para analisar como a insuficincia de aes
privadas compensada pela ao pblica, por meio de transferncias de
renda e aposen-tadorias, ou, alternativamente, para aferir os
impactos da falta de proteo social que caracterizaria a populao da
terceira idade no Brasil.
O nosso objetivo aqui descrever alguns determinantes econmicos
do nvel de bem-estar da populao que se en-
contra na terceira idade, a partir dos resultados da pesquisa
Idosos no Brasil feita pelo Servio Social do Comrcio (SESC) e pela
Fundao Perseu Abramo (FPA), reunidas em livro publicado pelas
mesmas instituies, que inclui tanto aspec-tos objetivos como
subjetivos. Estes ltimos constituem um diferencial relevante desse
trabalho que complementam os analisados freqentemente em economia.
Outra inovao analisar o comportamento financeiro dos idosos em
relao a crdito consignado vinculado a penses e
aposentadorias.Fontes A perspectiva de queda da renda do trabalho
nas fases finais do ciclo da vida torna necessria a poupana, se o
objetivo for sustentar um mesmo patamar de consumo na terceira
idade. O paulatino aumento dos fluxos de rendimen-tos alternativos
aos do trabalho gera uma perfeita suavizao da renda de todas as
fontes, e do consumo, nas idades mais avanadas, tal como sustenta
Modigliani. Na anlise da renda familiar per capita, a famlia
funcionaria como uma unidade de tomada de decises de consumo e
poupana, e isso implica um processo de socializao da renda dentro
dos domiclios.
O grfico elaborado a partir dos microdados do Censo Demogrfico
2000/IBGE, apresenta as trajetrias de renda
Marcelo NeriCentro de Polticas Sociais do IBRE e da EPGE
([email protected])
Aposentadoria: atitudes e percepes
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A
T E M A S S O C I A I S
per capita provenientes do trabalho, de outras fontes e da soma
de todas as fontes, ao longo da vida. Observe-se que a renda do
trabalho nas idades representada por uma curva em formato de sino
que atinge o pico absoluto de R$ 327 entre os 45 e os 49 anos de
idade e que cai da para frente, at atingir um valor absoluto de R$
168, entre aqueles acima de 60 anos. O aumento das rendas
alternativas ao trabalho ao longo da vida pode ser interpretado
como evidncia da tendncia de acumular recursos financeiros, com o
objetivo de manter o nvel de bem-estar nas etapas finais do ciclo
da vida, ocasio em que a renda do trabalho reduzida. Consi-derando
os fluxos de renda per capita dos idosos com mais de 60 anos,
observamos as seguintes participaes relativas: trabalho (39%),
previdncia (49%), aluguis (7%) e outras rendas (6%) que incluiriam
a renda financeira.
J de acordo com a pesquisa Idosos no Brasil, a aposenta-doria
por idade (28%), a aposentadoria por tempo de servio (26%), a penso
por morte (16%), o trabalho (15%) e a aposentadoria por invalidez
(10%) so as principais fontes de renda na velhice. Os idosos foram
questionados sobre o conhecimento do Benefcio de Prestao Continuada
(BPC), associado Lei Orgnica de Assistncia Social (LOAS), programas
que transferem um salrio mnimo mensal para aqueles com deficincia
e/ou com idade acima de 65 anos, extremamente pobres, ou seja, com
renda familiar inferior a de salrio mnimo mensal. Trinta e sete por
cento dos idosos afirmaram conhec-lo. Destes, apenas 1% de forma
espontnea, ou seja, sem a necessidade de estimulao do
entrevistador. Esse conhecimento foi menor nos grupos mais velhos,
uma vez que, entre os de 80 anos ou mais, apenas 19% disseram
conhecer o programa.
O recebimento de aposentadoria atinge 64% dos idosos. bastante
diferenciada por gnero: 80% dos homens contra 52% das mulheres so
aposentados. As mulheres se aposen-tam mais por idade enquanto os
homens se aposentam mais por tempo de servio. Entre aqueles que se
aposentaram (64%), 83% obteve a aposentadoria por idade ou tempo de
servio (53% dos idosos) e 67% dos que se aposentaram disseram ter
desejado a aposentadoria (43% dos idosos), enquanto 11% no queriam
se aposentar (7% dos idosos), dado importante a ser considerado
pelos planejadores de polticas previdencirias.Adaptao Os dados da
pesquisa revelam que, de modo geral, as pessoas no recebem preparao
especfica para a aposentadoria 95% dos idosos aposentados
declararam no ter tido essa oportunidade. Dentre os idosos que a
tive-ram, 2% foram em empresas privadas em que trabalhavam e 3% do
governo. Nenhuma mulher que trabalhava em em-presas privadas
participou de programas de preparao para a aposentadoria e apenas
2% receberam alguma preparao para a aposentadoria por parte do
governo. Possivelmente, esse dado afetado pela baixa participao das
mulheres hoje idosas no mercado de trabalho. As prximas geraes
devero apresentar uma configurao diferente, pois o traba-
lho feminino fora de casa cresceu muito nas ltimas dcadas. Por
faixa etria, no notamos grandes va-riaes quanto oferta de programas
de preparao para a aposentadoria, a no ser para os homens e
mulheres entre 75 e 79 anos, grupo no qual 9% afirmaram ter
recebido algum tipo de preparao por parte do governo.
As dificuldades de adaptao rotina de aposentado geralmente
afetam mais o homem do que a mulher (25% contra 21%) 15% deles e
11% delas indicaram a falta de rotina ou da movimentao do dia-a-dia
como as principais barreiras adaptao. Talvez a menor freqncia dessa
queixa entre as mulheres se deva ao fato de a aposentadoria
significar o retorno s rotinas domsticas, agora sem o peso
adicional daquela associada ao trabalho fora de casa.
Estrutura de consumo (%) Populao total e da terceira idade
Popu-lao total
Famlias com pelo menos 50% de idosos
Fam-lias com
idosos
Fam-lias s com
idososTotal
idosos
At 8 sal-rios
mni-mos
Acima de 8 sal-rios
mni-mos
Alimentao 27,49 30,23 35,34 24,90 30,43 30,05 Gneros alimentcios
24,75 27,96 33,33 22,45 28,20 27,61Habitao 31,84 33,00 35,25 30,84
32,97 35,79Vesturio 5,40 3,68 2,70 4,52 3,65 3,01 Roupas 3,46 2,39
1,68 3,01 2,41 1,94 Roupas masculinas 1,27 0,86 0,67 1,05 0,91 0,67
Roupas femininas 1,59 1,35 0,85 1,64 1,32 1,20Sade e cuidados
pessoais 10,36 15,03 14,47 15,09 14,90 16,79 Servios de sade 3,70
6,81 5,09 8,46 6,74 8,27 Hospitais e laboratrios 0,15 0,59 0,92
0,30 0,59 0,79 Mdico, dentista e outros 3,55 6,22 4,17 8,16 6,15
7,48 Produtos mdico-odontolgicos 2,60 4,91 5,79 3,48 4,89 5,50
Medicamentos em geral 2,20 4,48 5,47 2,99 4,41 5,22 Cuidados
pessoais 4,06 3,31 3,59 3,15 3,28 3,02Educao, leitura e recreao
8,74 4,43 1,81 7,63 4,47 2,84 Educao 5,76 1,86 0,52 3,91 1,99 0,44
Leitura 0,43 0,57 0,42 0,76 0,55 0,59 Recreao 2,56 1,99 0,88 2,96
1,93 1,80Transportes 11,72 7,85 6,24 9,06 7,87 6,33 Transporte
pblico 5,01 3,03 3,36 2,41 3,04 2,16 Transporte pblico urbano 4,76
2,91 3,25 2,28 2,94 2,06 Transporte pblico interurbano 0,25 0,12
0,10 0,13 0,11 0,10Despesas diversas 4,44 5,79 4,19 7,97 5,71
5,19
Fonte: DGD/IBRE/FGV.Obs: grupo, subgrupo e item.
Aposentados, os
idosos acham
importante
continuar
exercendo
atividades,
como forma de
adaptao mais
fcil nova rotina
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Dificuldades financei-ras foram relatadas por 5% dos homens e
por 2% das mulheres. As baixas freqncias desse tipo de resposta
talvez se devam presena de reservas acu-muladas durante os anos
produtivos, exatamente para suavizar o impacto da queda de renda na
velhice. As queixas mais freqentes entre os ho-mens talvez derivem
do fato de que, na maioria das famlias, cabe a eles
o papel provedor. Com a queda de renda depois da apo-sentadoria,
parte dos homens experimenta problemas em manter o mesmo padro de
vida.
De modo geral, uma vez aposentados, os idosos acham importante
continuar exercendo atividades, como forma de adaptao mais fcil
nova rotina. Apontam vrias alternativas para dar vazo a essa
necessidade: 16% res-saltam o trabalho como opo, e no como obrigao;
13% falam da importncia de ter qualquer atividade para ocupar o
tempo e a mente; 10% afirmam que bom ter um trabalho mais leve e
adequado idade; 8% afirmam que desejvel manter o salrio para
garantir o mesmo padro de vida; e 8% dizem que gostariam de
dedicar-se a cursos, projetos e afazeres voluntrios, trabalhando
menos horas. Lazer (7%), atividade fsica (6%) e descanso (5%) gozam
de menor importncia entre as sugestes dos aposentados. Ou seja, os
valores associados ao trabalho permanecem mais presentes entre os
idosos do que a idia de recolhimento a atividades mais ldicas. No
entanto, importante mencionar que 7% dos idosos disseram que no
fazem nada e 30% responderam que no sabiam o que fazer para manter
a atividade depois da aposentado-ria, o que sugere a oportunidade
de ofertar programas de preparao para a aposentadoria que ofeream
orientao quanto a esse aspecto.Emprstimo O governo federal tem
possibilitado aos aposentados tomar emprstimos com desconto direto
na folha de pagamentos do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), at o limite de 30% dos benefcios. Questionados de forma
estimulada sobre o conhecimento e a utilizao do em-prstimo
consignado, 23% dos idosos da pesquisa SESC/FPA disseram nunca ter
ouvido falar. A proporo daqueles que jamais fizeram o emprstimo
decai com a idade, passando de 60% daqueles entre 60 e 64 anos para
42% entre os com 80 anos de idade ou mais. O uso deste canal de
crdito muito mais por necessidade prpria do que para repassar aos
parentes. Para aqueles entre 65 e 69 anos, por exemplo,
25% utilizaram o emprstimo por necessidade prpria contra 4% que
o repassaram aos parentes.Gastos Perguntados pela pesquisa SESC/FPA
sobre os trs itens em que mais gastam individualmente, a alimentao
ficou em primeiro lugar, sendo mencionada por 93% dos idosos (95%
homens e 91% mulheres). Contas (luz, gua e telefone) ocupam a
segunda posio com 79% das mltiplas respostas entre os homens (83%)
e as mulheres (76%). E na terceira colocao, os gastos com remdios
(59%) esto menos presentes entre os homens (54%, contra 62% das
mulheres).
Elas so as que mais gastam com prestao de lojas (9%, contra 6%
entre os homens), e nos itens moradia (8% entre as mulheres contra
6% entre os homens), lazer (4%, contra 3% entre os homens) e auxlio
domstico, como empregada, enfermeira, faxineira (4%, contra 1%
deles). As despesas com alimentao diminuem com o passar da idade
(94% dos que tm 60 a 64 anos contra 90% dos que tm mais de 80
anos). O mesmo ocorre com contas de luz, gua, gs e telefone (82%
contra 72%). E a pesquisa revela ainda que 85% dos idosos tm o
controle sobre as suas prprias despesas. Ao contrrio do que se
poderia esperar, os mais velhos entre os idosos no perdem mais
controle das despesas.
De maneira geral os dados sugerem que os indivduos buscam formas
de suavizao do bem-estar ao longo do tempo, preparando-se para a
queda da renda do trabalho nos anos finais do ciclo de vida. De
forma consistente com a teoria, os idosos revelaram notvel
capacidade de suavi-zao de renda. A reduo da renda do trabalho
observada nesta fase da vida consistente com a teoria de
Modigliani. Entretanto, isto se deve mais atuao do Estado como
provedor de benefcios previdencirios contributivos e
no-contributivos, do que de comportamentos privados propriamente
ditos. Ou seja, um pseudoagente hbrido formado por indivduos e pelo
Estado atua como agente suavizador de variveis econmicas associadas
ao bem-estar individual. Embora na sua forma pura a teoria seja
rejeitada, ela oferece um arcabouo interessante para analisar como
a insuficincia de aes privadas compensada pela ao pblica e,
igualmente, para aferir os impactos sociais da insuficincia de
renda e da desproteo social da populao na terceira idade no
pas.
A pesquisa Idosos no Brasil complementa a anlise quanti-tativa
revelando uma srie de comportamentos, percepes e atitudes da
populao da terceira idade que podem ser bastante teis ao
delineamento de polticas pblicas. A grande maioria dos idosos tem
controle de sua prpria despesa, o que denota autonomia, dado
interessante que contrasta com o senso comum, segundo o qual os
idosos so dependentes.
Referncias: NERI, M. C. Renda, Consumo e Aposentadoria:
Evidncias, Ati-
tudes e Percepes In: Idosos no Brasil. Vivncias, Desafios e
Expectativas
na terceira idade.1 ed. So Paulo: Editora Fundao Perseu Abramo,
2007.
Segundo a
pesquisa SESC/
FPA, os trs itens
em que os idosos
mais gastam
individualmente
so alimentao,
contas e
remdios
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4 3 J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C
A
O Barmetro de Confiana nas instituies brasileiras per-guntou aos
brasileiros em quem eles, hoje, confiam mais. Foram listadas 17
instituies: de governos estaduais, municipais e federal , mdia,
Polcia Federal e igrejas, a partidos polticos, Cmara, Senado e
outros. Atualmente, o brasileiro confia, sobre-tudo, nas Foras
Armadas, que detm expressivo apoio de 79% da populao. A vinculao
das Foras Armadas com o regime autoritrio se diluiu, desapareceu da
percepo dos brasileiros. E isso, talvez, em razo do prprio passar
do tempo, das novas geraes que tm outra experincia com as Foras
Armadas. Parodiando: a vinculao saiu da vida e ficou na
histria.
O Poder Judicirio, foco principal da pesquisa, vem em sexto
lugar, com 56% de confiana. Antes dele vm a Igreja Catlica (72%), a
Polcia Federal (70%), o Ministrio Pblico (60%) e a Imprensa (58%).
Tal estudo iniciativa de Mozart Valladares, presidente da Associao
dos Magistrados Brasileiros.
So muitos os dados a exigir ateno. Mas um dos mais rele-vantes
est na resposta seguinte pergunta: o senhor ou algum parente prximo
utilizou ou no os servios da Justia nestes ltimos 12 meses? Cerca
de 10% dos entrevistados responderam que sim. Trata-se de cerca de
13 milhes de brasileiros que, apenas no perodo de 12 meses, se
relacionaram, de alguma forma, com a Justia. Este nmero , com
certeza, maior se considerarmos os processos em curso que no
exigiram um relacionamento direto do entrevistado.
Mesmo na ausncia de srie histrica que nos indique a ten-dncia,
parece evidente que estamos diante de uma sociedade razoavelmente
judicializada. Justia tender a ser, mais e mais, gnero de primeira
necessidade. Sobretudo para as classes da populao de menor renda.
No por menos que o brasileiro conhece a Justia do Trabalho e os
Juizados Especiais mais e melhor do que conhece o prprio Supremo
Tribunal Federal. A contrapartida poltica lquida deste fato a
crescente impor-tncia do Judicirio no quotidiano do brasileiro.
E como tem sido este relacionamento? A imensa maioria afirma que
foi tratada de forma respeitosa (82%) pelo Poder
Judicirio. Da mesma maneira positiva, com respostas um pouco
acima da mdia (5.0), o brasileiro diz que a atuao do Poder
Judicirio foi independente (5.7) e com honestidade (5.9). O nico
item que fica abaixo da mdia , justamente, a agilidade da prestao,
o que evidencia a lentido da Justia (4.9). Problema crnico.
Na verdade, estes dados positivos no surpreendem. Afinal, temos
mais de 12 mil juzes na ativa. O quotidiano da Justia feito pela
primeira instncia. E, como opina o brasileiro, feito de
independncia e honestidade, ou seja, de atitudes no corporativas,
sem nepotismo, ou corrupo como regra. O que est tambm comprovado em
outras pesquisas com os prprios juzes.
Mas fato que o quotidiano dificilmente merece a ateno da mdia,
que prefere focar sua ateno e natural que as-sim seja na exceo. O
quotidiano quase midiaticamente invisvel. Torn-lo visvel, em toda a
sua extenso, seria uma das tarefas das associaes de classe.
Quando a independncia do juiz mais de perto focalizada e se
pergunta por quem os juzes se deixam influenciar, a resposta tambm
no surpreende. Em primeiro lugar, o Legislativo quem, segundo os
brasileiros, mais influencia o Judicirio. natural que assim seja,
pois de l que partem as leis que os juzes aplicam. influncia
originria, gentica. Mas, em se-guida, apontam-se os empresrios e o
Poder Executivo como influncias na deciso dos juzes.
Embora a pesquisa no detalhe, razovel acreditar que a percepo
sobre influncia do Executivo diga respeito, so-bretudo, a questes
fiscais e previdencirias. Neste sentido, haveria pelo menos um
desconforto, uma ateno cautelosa, ou mesmo um receio de que o
interesse econmico maior seja dos empresrios, seja do Executivo
possa influenciar na independncia do prprio Judicirio.
De todo modo, o importante que pesquisas dessa natureza tenham
continuidade histrica para melhor podermos definir as polticas
judiciais. Com os ps no cho.
Joaquim FalcoDiretor da Escola de Direito Rio/FGV emembro do
Conselho Nacional de Justia([email protected])
O Barmetroda Confiana
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O saldo da balana comercial deste ano dever cair na comparao com
2007. At junho ltimo, o supervit acumulado no ano era de US$ 11,370
bilhes, um pouco mais da metade do valor registrado no primeiro
semes-tre de 2007 US$ 20,579 bilhes. A participao das exportaes de
produtos manufaturados caiu de 53,5% para 48,5% na comparao do
primeiro semestre dos anos de 2007 e 2008.
A valorizao da moeda brasileira muitas vezes apontada como a vil
dos resultados da balana. Em adio, contribuiria para a reprimarizao
da pauta de exportaes. Responder a essa questo exige uma anlise
mais detalhada do contedo das exportaes em termos de seus fatores
(intensivas em capital, trabalho ou recursos naturais). Exporta-se
soja em gro, mas espe-cialistas em agricultura explicam que esse um
cultivo intensivo em capital e tecnologia. O mesmo pode ser dito
sobre o petrleo, que no caso brasileiro exige tecnologia avanada
para extrao em guas profundas.
Aqui o objetivo apenas destacar alguns dados bsicos. Cai a
participao das manufaturas, mas os dez principais produtos de
exportao do pas no mudaram muito, desde 1998, e tendem a ser
intensivos em capital. Crescimento Desde 2003, as exportaes
brasileiras crescem a uma taxa superior s mundiais (tabela 1). No
entanto, a diferena entre as duas taxas, que chegou a ser de 10,6%
a favor do Brasil, em 2004, diminui nos ltimos anos. As importaes
nacionais seguem uma trajetria inversa, pois aumenta a diferena
entre a taxa brasileira e a mundial. Em 2007, as importaes
brasi-leiras aumentaram 32% e as mundiais 15,5%.
O crescimento dos uxos brasileiros acima das taxas mundiais
mostra o dinamismo recente do comrcio ex-terior. O aumento das
importaes estaria associado ao crescimento econmico e, parte, ao
aumento de preos do petrleo. No primeiro semestre de 2008, por
exem-plo, as importaes brasileiras aumentaram em 32%,
Queda na participao dos manufaturados
Lia Valls PereiraCoordenadora de Projetos do IBRE/FGV
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sendo que a de combustveis e lubricantes registrou uma taxa de
124%.
O aumento das exportaes totais tem sido acompa-nhado de um
incremento em todos os grandes agregados exportados. No obstante,
registrada uma queda da participao de 59% para 52,3% das
manufaturas nas exportaes totais entre 2000 e 2007. No seria motivo
para preocupao se essa queda apenas reetisse o gran-de aumento em
valor dos produtos bsicos associados aos incrementos de preos das
commodities. Dados ela-borados pela Fundao Centro de Estudos de
Comrcio Exterior (www.funcex.com.br) mostram, entretanto, que no
primeiro trimestre de 2008 registrada para quase todos os setores
industriais uma queda na quantidade exportada. Logo, a diminuio
mais acentuada na par-ticipao das manufaturas nas exportaes totais
no apenas uma questo de preo.
Os saldos comerciais por fator agregado apresentados no grco
mostram que as manufaturas passam a contri-buir para a reduo do
supervit comercial j em 2007. Novamente esperado que esse resultado
se repita, em 2008. Observa-se que o dcit das manufaturas do ano
passado (US$ 9,233 bilhes) ainda est longe dos valores registrados
entre 1999/2001. Em 1998, esse dcit foi de US$ 19,253 bilhes, ano
em que a moeda brasileira estava valorizada, mas no tanto quanto
agora, e o cres-cimento econmico foi menor do que o de 2007. Logo,
algum ganho nas exportaes, mesmo com o cmbio desfavorvel, est
ocorrendo.
Importncia Comparamos os principais produtos exportados pelo
Brasil que so publicados pela Secretaria de Comrcio Exterior,
referente ao acumulado do ano. Duzentos e quatorze so comuns aos
anos que compre-endem o perodo de 1998 a 2007.
Tab. 1 Crescimento anual dos fluxos de comrcio (%)Exportaes
Importaes
Brasil Mundo Brasil Mundo1996 2,7 5,3 5,6 5,11997 11,0 4,0 11,4
1,11998 -3,5 -2,4 -3,6 -1,21999 -6,1 3,7 -15,1 5,32000 14,7 13,7
14,1 13,72001 5,7 -4,3 -0,6 -2,62002 3,7 4,6 -14,9 4,62003 21,1
16,9 2,2 16,92004 32,0 21,4 30,0 21,42005 22,6 14,1 17,2 14,12006
16,2 15,5 24,2 15,52007 16,9 15,5 32,0 15,5Fonte:
www.desenvolvimento.gov.br
A diminuio mais acentuada na
participao das manufaturas nas
exportaes totais brasileiras no
apenas uma questo de preo
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Em 1998, quando a participao de manufaturados nas exportaes era
de 57,5%, os 214 produtos expli-cavam 90,2% do total vendido desse
grupo. Em 2007, cai a participao das manufaturas (52,3%) e do valor
percentual dos 214 produtos para 85,7%. A tabela 3 mostra como a
queda da participao de manufaturas acompanhada pelo declnio dos
produtos selecionados.
Que concluso pode-se chegar? Aqui, por enquanto, somente uma
hiptese. A queda da participao dos 214 produtos, que seriam o ncleo
das exportaes brasileiras de manufaturas, leva tambm a queda das
exportaes de manufaturas.
Nas importaes no ocorre o mesmo. Primeiro, o nmero de produtos
comum menor (106) e a participa-o no total das importaes de
manufaturas se mantm relativamente constante ao redor de 50%.
Listamos, ento, os dez principais produtos expor-tados para
perodos selecionados (tabela 3). A primeira comparao entre 1998 e
2007 mostra uma pequena queda no grau de concentrao da pauta. Em
1998, os dez produtos representavam 39,4% do total das expor-taes
de manufaturas e, em 2007, 33,8%. Apenas dois produtos no constam
da lista nos dois anos. Suco de laranja e bombas e compressores so
substitudos por aparelhos receptores (celulares) e leos combustveis
entre os principais produtos.
A segunda comparao, entre janeiro e maio de 2007 e igual perodo
para 2008, registra percentuais quase
idnticos em relao aos dez principais produtos. Acar renado e
suco de laranja so substitudos por motores eltricos e mquinas de
terraplanagem.
Exceto o acar renado, o suco de laranja, calados, laminados de
ferro e leo combustvel, todos os outros produtos no so pautados em
recursos naturais. Re-gistra-se ainda que as exportaes de janeiro a
maio de 2008, comparadas igual perodo de 2007, seriam mais
intensivas em bens no pautados em recursos naturais.
Essa uma amostra das exportaes de manufatu-ras, embora 30% no
sejam um percentual pequeno. O que se destaca aqui a necessidade de
anlises mais detalhadas da composio da pauta de exportaes
brasileiras, para se afirmar que a de manufaturas est se
reprimarizando.
Tab. 3 Participao dos produtos no total das exportaes de
manufaturas (%)
Ano de 1998 Ano de 2007Automveis 5,5 Avies 5,6
Partes e peas para veculos 4,9 Automveis 5,6Calados, partes e
componentes 4,7 Partes e peas para veculos 3,8
Suco de laranja congelado 4,3 Motores para veculos 3,0Avies 4,0
Laminados planos de ferro
e ao3,0
Motores para veculos 3,8 Aparelhos receptores e
transmissores
2,8
Veculos de carga 3,5 leos combustveis 2,7Laminados planos de
ferro e ao 3,4 Veculos de carga 2,4
Acar renado 2,9 Calados, partes e componentes
2,4
Bombas, compressores, ventiladores
2,5 Acar renado 2,4
Total dos 10 39,4 Total dos 10 33,8
Janeiro a maio de 2007 Janeiro a maio de 2008Automveis 5,3 Avies
5,3Laminados planos de ferro e ao 4,0 Automveis 5,2Avies 3,9 Partes
e peas para veculos 4,0Partes e peas para veculos 3,9 leos
combustveis 3,9Aparelhos receptores e transmissores
3,2 Aparelhos receptores e transmissores
2,8
Acar renado 2,5 Laminados planos de ferro e ao
2,5
Veculos de carga 2,5 Veculos de carga 2,4Calados, partes e
componentes 2,4 Motores, geradores eltricos 2,2
leos combustveis 2,4 Calados, partes e componentes
2,2
Suco de laranja congelado 2,2 Mquinas para terraplanagem
2,1
Total dos 10 32,3 Total dos 10 32,5
Fonte: www.desenvolvimento.gov.br
Tab. 2
AnoExportaes
Part.das manufaturas no total das exportaes
Part. dos 214 produtos no total das export. de manufaturas
1998 57,5 90,21999 56,9 88,22000 59,1 91,52001 56,5 87,12002
54,7 84,92003 54,3 81,42004 54,9 82,42005 55,1 84,32006 54,3
82,82007 52,3 77,9
AnoImportaes
Part.das manufaturas no total das importaes
Part dos 106 produtos no total das import. de manufaturas
1998 84,3 53,11999 84,5 55,72000 83,2 57,12001 84,4 54,12002
81,8 52,22003 79,2 51,82004 76,9 51,12005 78,9 47,82006 76,5
49,92007 77,3 50,0Fonte: www.desenvolvimento.gov. Elaborao:
IBRE/FGV.
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47 J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C A
C O M R C I O E X T E R I O R
No estou aqui a fazer propaganda do chefe da Diretoria Geral
(DG)-Comrcio, da Comisso Europia, em Bruxelas. No s ele e o seu
cargo disso no necessitam, como tal gesto no se enquadra nos
propsitos dessa coluna. Uso o nome, em expandida sindo-que, para,
mais do que o cargo, designar uma linha de pensamento e atitudes
dentre as em con ito atualmente na Europa, no que toca a sua
poltica externa.
Preocupa-me o futuro do belo projeto europeu. No passado ms de
maio con-sagrado como de aniversrio da fundao do projeto ,
expressei em diversas palestras, de So Paulo China, as minhas vises
quanto ao seu desenvolvimento (Which Future for the European
Union?, disponvel no site da EPGE). Dentre as contradies que uma
Europa a 27 membros porta, est a questo crucial de uma poltica e
representao externa uni cadas. Ora, a poltica comercial um dos
aspectos da externa e, poder-se-ia pensar, talvez o mais
simples.
Entretanto, h quase dois anos vimos presenciando re-sistncias a
uma viso mais esclarecida, que procura criar uma Europa no s mais
moderna, como mais simptica e aberta ao inevitvel dilogo com seus
parceiros comerciais, da sia Amrica Latina. Viso que, em geral, vem
sendo perseguida pela DG-Comrcio, enquanto um ressurgimento de
velhas posies protecionistas e de um desejo (ultrapas-sado?) por
campees nacionais vem a ela se opondo, principalmente, embora de
forma no exclusiva, da parte da Frana e, pasmem, a Alemanha.
Dois exemplos so significativos. No ano passado, preocupada com
a escalada do contencioso comercial da Unio Europia (UE) com a
China, a DG de Mandelson encomendou uma anlise sobre a questo a um
grupo isento de especialistas. No s havia a idia de simpli car e
focalizar, inteligente e positivamente, os contenciosos, como de
redesenhar a abordagem comercial entre as duas economias, sob uma
perspectiva que, claro, defendendo os interesses europeus,
aceitasse tanto a inelutvel presena internacional do Imprio do
Meio, como a parte ben ca por ela trazida. Tal aceitao implicaria,
forosamente, na reduo ou desaparecimento de determinados setores
pro-dutivos. Cuidadoso e bem elaborado trabalho foi submetido ao
Conselho Europeu, onde, apesar de bem acolhido pela
maioria, foi rechaado, basicamente, pelos dois pases acima
mencionados, preocu-pados que estavam com os seus campees
nacionais!
Recentemente, no mbito da difcil Ro-dada Doha, a mesma
DG-Comrcio fez um gesto mais do que necessrio na rea agrco-la,
visando auxiliar o destravamento das ne-gociaes. Medida novamente
mal recebida por frao signi cativa dos membros, tendo o presidente
francs indiretamente responsa-bilizado essa e outras polticas de
Mandelson
pela recente recusa irlandesa ao Tratado de Lisboa. a Frana do
miditico Nicolas Sarkozy que, note-se, assumir a presidncia da UE
em julho agora. As recentes resolues sobre imigrao, onde o mesmo
desempenhou papel relevan-te, j do uma triste idia do que se pode
esperar.
No endosso a totalidade da poltica da DG-Comrcio, especialmente
a em curso de transformar os acordos Co-tonou com as antigas
colnias europias em acordos bila-terais de reas de livre-comrcio.
Tanto o sabor colonialista disfarado em paternalismo, como as
distores por eles provocadas no comrcio internacional permanecem.
Nem cabe aqui julgar se o recente gesto em Doha ou no ade-quado s
nossas aspiraes e pleitos, por exemplo. O ponto que desejo
ressaltar, tendo sempre sido um entusiasta das relaes comerciais
mais estreitas com a UE, e particular-mente do Acordo de Livre
Comrcio Unio EuropiaMer-cosul que continuaremos a esperar cada vez
mais como o Godot da pea de Beckett que a UE se encontra mais
diferenada e dividida, e as nossas relaes bilaterais com ela devero
se tornar ainda mais complexas.
Um bom exemplo a questo dos biocombustveis. Apesar das boas
intenes do prprio Comissrio Barroso cujo pensamento, acredito,
prximo ao de Mandelson , e de atitudes muito favorveis por parte
dos membros escandinavos, pouco, ou nada, tem andado a nosso favor.
Nosso etanol continua a pagar uma tarifa que torna com-petitivo o
produzido localmente, de modo nada e ciente, a partir do acar de
beterraba...
Em um tal contexto, devemos redobrar nossa ateno e escolher com
inteligncia os melhores e mais e cazes aliados internos. nesse
momento que Peter Mandelson surge como representativo de uma
corrente com a qual o dilogo pode ser travado de modo inteligente e
construtivo.
Renato G. Flres Jr.Professor da Escola de Ps-Graduao
em Economia da FGV
Apoiemos Peter Mandelson
-
J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C A 4
8
L I V R O S
Imagine um mundo no qual a desigualdade de renda entre naes no
apresente precedentes histri-cos; no qual as desigualdades entre
pases sejam bem mais relevantes, na explicao da desigualdade total
entre indivduos vivendo no planeta, do que as desigualdades que se
en-contram dentro de cada pas tomado em separado.
Mas, da mesma forma, um mundo no qual, num intervalo de 40 anos,
al-gumas economias possam apresentar mobilidade vertical de renda
per ca-pita tambm sem paralelos histricos; desta forma deixando de
figurar entre as mais pobres para alcanar padres de renda
substancialmente mais elevados (a exemplo do que fizeram Coria do
Sul, Cingapura, Hong Kong e Taiwan no perodo que vai do incio dos
anos de 1970 at os dias atuais).
Este o retrato do mundo atual. Neste contexto, Er-nesto Lozardo
toma para si, no seu livro Globalizao: a certeza imprevisvel das
naes (Editora do Autor), uma tarefa herclea: explicar de que forma
as naes emergentes determinam e tm suas trajetrias determinadas
pelo pro-cesso de globalizao. E como as naes prsperas, ricas e
globais, chegaram a este ponto.
Uma explicao muito comum para a atual desigual-dade de renda
entre naes d-se em termos da forma diferenciada e assimtrica como a
Revoluo Industrial afetou cada economia a partir do incio do sculo
XIX. preciso observar que isto se deu no apenas em termos de
crescimento do produto, mas tambm em termos demogr-ficos. Dados
histricos mostram que os Estados Unidos e a Inglaterra descolaram
substancialmente suas rendas per capita do resto do mundo a partir
da segunda metade do sculo XIX, deixando para trs, com nfases
decrescentes, o Japo, o noroeste da Europa, os demais pases da
Europa, Amrica Latina e sia.
Lozardo no se detm diretamen-te na defesa ou negao desta tese.
Mas, com riqueza de detalhes, d ao leitor uma certeza: para
entender em pormenores os motivos de possveis assimetrias na coleta
dos frutos das revolues tecnolgicas necessrio mergulhar com
determinao e von-tade nos processos histricos e cultu-rais que
determinam a evoluo das instituies e do processo decisrio em cada
nao. a partir da que se forma o quadro geral no qual se deter-minam
a produtividade, a formao de capital fsico e de capital humano.
Para atender a este fim, o livro propicia uma prazerosa lei-tura
dos casos da China, ndia, Japo, do Sudeste Asitico, da Europa e dos
Estados Unidos.
Economistas, treinados a desenhar linhas de chegada, mas no o
roteiro de cada corrida (que o que realmente interessa), costumam
desprezar esta etapa anterior de anlise, tomando, perigosa e
pobremente, o ambiente ins-titucional como dado. O livro no segue
este caminho de menor esforo. Neste ponto reside uma das suas
maiores qualidades.Escolhas O segundo fato que caracteriza o mundo
atual, exemplificado pelo crescimento acelerado de algumas
eco-nomias asiticas aps a segunda Guerra Mundial, costuma ser
explicado pelas diferentes polticas econmicas seguidas por cada
nao. Tm sido particularmente bem-sucedidas aquelas voltadas para a
educao e abertura comercial.
O alto crescimento de algumas economias pode tambm ser entendido
no contexto da revoluo das tcnicas de pro-duo que se deu a partir
do final do sculo XIX, ainda que numa verso mais tardia
(latecomers). As difuses tecnol-gicas teriam sido particularmente
melhor absorvidas nestes pases pela escolha de polticas internas
adequadas (acom-panhada, diga-se de passagem, tambm por um processo
de transio demogrfica). Isto leva Lozardo a deter-se sobre
Certeza imprevisvelRubens Penha Cysne
Professor da Escola de Ps-Graduao em Economia da FGV
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49 J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C A
L I V R O S
outro aspecto do crescimento: o das reformas de origem macro e
microeconmica que uma nao deve trilhar se deseja colher com xito os
frutos da globalizao.
Trata-se de ponto particularmente importante para o Brasil, no
momento, a observao do autor sobre a im-portncia da composio de
demanda na determinao dos aportes de produtividade. Em um pas com
cmbio flexvel operando com elevada mobilidade de capitais, a
exemplo do que tem ocorrido em nosso pas, elevaes dos gastos
pblicos (ainda quando cobertos com receitas equivalentes de
impostos), tendem a afetar tal composio na direo de bens
no-transacionveis, perdendo espao os bens transacionveis com o
exterior. Como costuma ser nas exportaes e nas substituies de
importao que se materializam pesquisas e novos produtos, perde o
pas em potencial de crescimento de longo prazo.
Outro ponto que fica claro na exposio que estrat-gias de
desenvolvimento baseadas unicamente em polticas de substituio de
importaes no tm boas chances de contribuir positivamente para o
crescimento sustentado. O mesmo se poderia dizer das polticas
industriais nas quais se concede ao Estado o poder de decidir, de
forma centralizada, os setores ou ramos de atividades a serem
privilegiados com os favores pblicos.
O livro nota tambm com argcia que, se democracia ple-na no
necessria para o crescimento, pode ser importante para dividir de
forma mais eqitativa os frutos deste. China e Rssia, por exemplo
(com diferentes graus de democracia), esto em processo crescente de
concentrao de renda, desta forma caracterizando a ocupao de um
ponto no ciclo do crescimento distinto daquele atualmente ocupado
pelo Brasil (onde a nfase distributiva tem sido forte).
Lozardo argumenta que a elevao da desigualdade que hoje se
verifica entre as naes do mundo no tem expli-cao, como costumam
sugerir alguns, na globalizao. O livro apresenta dados que sugerem
que os pases menos desenvolvidos tm-se beneficiado mais da integrao
dos mercados do que os mais desenvolvidos. Evidentemente, o divisor
de guas aqui se materializa em funo das polticas internas seguidas
por cada pas.
Para compreender todos estes processos de forma mais ampla,
preciso lembrar a evoluo histrica das teorias de crescimento. Ao
contrrio da teoria clssica baseada em Ricardo e Malthus, feita para
explicar um crescimento com renda per capita praticamente estagnada
(ainda que com crescimento do produto), a teoria que surge a partir
de Solow toma como dada a fertilidade. Tal hiptese, aliada ao
princpio da produtividade decrescente do capital, torna o
crescimento sustentado impossvel, a menos da introduo de postulados
ad hoc sobre crescimento de produtividade. Na ausncia de tal
expediente, no h crescimento sustent-vel por habitante. Evolues da
renda per capita nada mais fazem do que refletir transitoriedades
na convergncia para o estado estacionrio, onde isto no mais
ocorre.
Difuso Uma soluo transitria para o problema veio com Lucas e
Romer, atravs da introduo de progressos tcnicos ou tecnologias
endogenamente determinadas nos modelos de crescimento. Uma nova
fronteira da teoria do crescimento, entretanto, considera com muito
mais nfase os processos de difuso tecnolgica entre naes. No mais se
toma, como nos modelos descritos acima, a for-mao de capital como
independente do que fazem outras naes. Esta hiptese, sabe-se hoje,
no compatvel com a evidncia emprica disponvel nos ltimos 200 anos
(em particular, aquela que divide os pases em earlycomers e
latecomers).
Na questo especfica da globalizao, Lozardo prov uma taxonomia
interessante, baseada na eterna noo econmica da oferta e da
demanda: no mundo atual, os investimentos diretos estrangeiros, o
comrcio e as multina-cionais proveriam a oferta de globalizao. Por
outro lado, a demanda pela mesma se daria em funo da necessidade de
crescimento e desenvolvimento que caracterizaria as economias
emergentes. Em particular, tal necessidade de-correria do desejo de
acesso de consumidores de economias emergentes ao padro de consumo
dos mais ricos (fruto da queda do custo de informao).
Um ponto importante do livro o alerta quanto ao papel de
co-responsabilidade que devem assumir as naes mais prsperas, se
desejam prover maiores chances de sucesso de longo prazo opo pelo
capitalismo. Assim como dentro de cada pas a desigualdade de renda
acaba por dificultar o cres-cimento, o mesmo pode se dar para o
mundo capitalista como um todo. Como coloca Lozardo com
propriedade, o maior perigo para a riqueza de poucos a pobreza de
muitos.
Polticas inteligentes para as economias mais ricas e
glo-balizadas deveriam desta forma incluir em seus propsitos apoio
a economias emergentes na consecuo de justia, da reduo de pobreza,
da proteo ambiental, do respeito a valores individuais e sociais e
da segurana global. Obter dos pases prsperos esta viso pragmtica da
necessidade de co-responsabilidade mundial ser o grande desafio do
capitalismo neste sculo, conclui Lozardo. Longe de qualquer rano
assistencialista, trata-se este de um desa-fio capacidade de
percepo e execuo dos lderes das economias mais prsperas.
Enfim, como comum a qualquer livro que se detenha sobre um tema
to amplo e controverso, haver partes do livro com as quais o leitor
tender a concordar com maior ou menor veemncia. O importante,
entretanto, que o convite reflexo que o livro proporciona estar
muito bem alicerado. De fato, Lozardo oferece gentilmente, ao longo
de todo o texto, os trs ingredientes que requerem o rigor acadmico
e que costumam caracterizar os clssicos em qualquer assun-to:
dados, fatos e teorias. Como dizia o saudoso piauiense Petrnio
Portela, com os fatos no se briga. Caber ao leitor pinar suas
prprias concluses. A acuidade na escrita e o prazer na leitura so
assegurados.
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Conglomerados financeiros
Julho de 2008 CONJUNTURA ECONMICA 50
No ltimo dia 18 de junho, foram conhecidos os Me-lhores e
Maiores Conglomerados Financeiros do pas, em cerimnia realizada em
So Paulo, com a presena de cerca de 130 executivos do setor
nanceiro. Os principais premiados, por segmento de atividades,
foram: Atacado e Negcios UBS Pactual, eleito pela segunda vez
consecu-tiva pela revista Conjuntura Econmica como o melhor nesse
segmento. O BMG, pela oitava vez consecutiva, foi o melhor no
Financiamento ao Consumo; o Daycoval foi o melhor em Middle Market.
J o Banrisul venceu como o melhor banco pblico do pas. E no
segmento Varejo, o grande vencedor foi o grupo Ita.
Entre os conglomerados que mais se destacaram em 2007 e nos trs
ltimos anos, foram premiados o Banco do Brasil, como o maior do pas
em ativo total, por operaes de crdito e por depsitos totais. O
Bradesco recebeu o prmio por ter sido o maior em receitas de
intermediao nanceira no ano passado, enquanto o Unibanco foi o que
mais cresceu por ativo total entre os grandes conglome-rados em
2007.
O Votorantim se destacou como o que mais cresceu em operaes de
crdito no ano passado e o que teve o menor custo operacional, entre
os grandes grupos nanceiros,
tanto em 2007 como na comparao dos trs ltimos anos. J o Citibank
foi o que mais cresceu em rentabilidade sobre o patrimnio em 2007 e
o que teve o maior crescimento em receitas nos trs ltimos
exerccios.
Entre os pequenos e mdios conglomerados, o BM&F foi o que
mais cresceu em ativo total no ano passado, enquanto o Dresdner
recebeu o prmio como o que mais cresceu em operaes de crdito em
2007. O Barclays ven-ceu por ter apresentado o maior crescimento em
depsitos totais e o BBM por ter tido o maior crescimento no item
rentabilidade operacional no ano passado. O Clssico foi quem
apresentou o menor custo operacional em 2007 e nos trs ltimos anos.
J o VR foi o que mais cresceu em receitas nos trs ltimos anos. E o
Cruzeiro do Sul recebeu o prmio por ter o maior crescimento do
patrimnio lquido nos ltimos trs anos.
A cerimnia de premiao foi conduzida pelo Embai-xador Sebastio
Rego Barros, presidente do Conselho do Instituto Brasileiro de
Economia (IBRE), pelo diretor do IBRE, professor Luiz Guilherme
Schymura, pelo vice-di-retor do Instituto, Vagner Ardeo e pelo
professor Yoshiaki Nakano, diretor da Escola de Economia de So
Paulo da FGV.
Melhores do pas
A solenidade foi conduzida pelo professor Yoshiaki Nakano; pelo
professor Luiz Guilherme Schymura; pelo Embaixador Sebastio Rego
Barros; e pelo vice-diretor do IBRE, Vagner Ardeo.
-
5 1 J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C
A
Conglomerados financeiros
1 Luiz Felippe Indio da Costa, presidente (Banco Cruzeiro do
Sul)
9 Geraldo Travaglia, vice-presidente corporativo (Unibanco)
2 Marcio Del Nero, diretor-executivo (VR)
10 Moacyr Nachbar Junior, diretor de contabilidade
(Bradesco)
3 Joo Carlos Pinho, diretor de captao e relacionamento
institucional (BBM)
11 Marco Geovanne Tobias da Silva, gerente geral de relaes com
os investidores (Banco do Brasil)
4 Edson Sarti, diretor-executivo (Barclays)
12 Juerg Haller, COO (Chief Operations Officer) para a Amrica
Latina (UBS Pactual)
5 Gleen Peebles, diretor-executivo e Sandro Amorim, gerente de
vendas (Dresdner Bank Brasil)
13 Ricardo Gelbaum, diretor-executivo nanceiro (BMG)
6 Gilberto Mifano, presidente do conselho de administrao
(BM&F Bovespa)
14 Sasson Dayan, presidente (Daycoval)
7 Henrique Jos Szapiro, superintendente-executivo de RH e
assuntos corporativos (Citibank)
15 Fernando Guerreiro, presidente (Banrisul)
8 Milton Roberto Pereira, vice-presidente (Votorantim)
16 Ronald Anton de Jongh, vice-presidente executivo (Ita)
1 2 3 4
5 6 7 8
9 10 11 12
13 14 15 16
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J u l h o d e 2 0 0 8 C O N J U N T U R A E C O N M I C A 82
P O N T O D E V I S T A
Este artigo analisa se as metas fiscais na forma de supervits
primrios so mesmo o ajuste fiscal que precisamos. O Brasil vem
experimentando uma poltica fiscal associada gerao de supervits
primrios, que , na verdade, uma meta fiscal de, atualmente, 3,8% do
PIB. Ou seja, entre arrecadao e despesas, o setor pblico
consolidado, que envolve estados, municpios, empresas estatais e
governo central, deve econo-mizar pelo menos 3,8% em relao ao PIB
gerado no ano. No primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso
(FHC 1), entre 1995 e 1998, esta economia do setor pblico era
pra-ticamente nula, chegando despoupana de quase 1% do PIB, em
1997. J a partir do FHC 2, reverte-se radicalmente a postura fiscal
e passa-se a realizar importantes economias que, na mdia do perodo
1999 a 2002, era de 3,3% do PIB. Afinal, inaugurava-se ali a
poltica de gerao de supervits primrios. O governo de Luiz Incio
Lula da Silva deu continuidade a tal poltica. De 2003 a 2007, vem
gerando uma economia mdia anual da ordem de 4,1% do PIB.
Ressalta-se que todas estas contas j esto em relao ao novo PIB.
Mas, que tipo de ajuste fiscal compreende tal poltica de gerao
de supervits primrios? Note que a necessidade de financiamento do
setor pblico na era FHC (1995-2002) beirava a 7% do PIB, quando a
economia do setor pblico no passava de 1,7% do PIB, e que, na era
Lula (2003-2007), tal necessidade se reduziu substancialmente para
a casa dos 2,7% do PIB. Note, tambm, que a razo dvida/PIB subia
consistentemente na era FHC, atingindo 51% do PIB (2002), e, na era
Lula, caiu para 42,5% do PIB (2008). Isso significa que o governo
Lula tem mais responsabilidade fiscal do que o governo FHC, ou que
no governo Lula tem-se um ajuste fiscal adequado? A resposta para
ambas as perguntas um sonoro no.
O fato que h dois tipos bsicos de ajuste fiscal. O tipo I,
baseado no corte de despesas relacionadas com benefcios de
seguridade social e despesas com pessoal; e o tipo II, baseado na
elevao da arrecadao e corte de gastos com investimento. Pois bem, o
ajuste fiscal da era Lula, assim como o do FHC 2, a do tipo II.
Essa a concluso de uma pesquisa realizada por Ulysses de Moraes em
sua dissertao de mestrado O perfil e a composio do ajuste fiscal
brasileiro (1997/2007), defendida na Escola de Economia de So Paulo
da FGV-SP, em julho deste ano. Ou seja, quando se precisa gerar
supervits primrios rapidamente corta-se a despesa mais
discricionria de todas, as chamadas OCCs (Outras Despesas de
Custeio e Capital), com expanso das despesas de benefcios de
seguri-dade social e despesas de pessoal, somada a um aumento
nas
arrecadaes. Esse ajuste fiscal bem-sucedido na medida em que
gera economias para reduzir a relao dvida/PIB, mas no
necessariamente o ajuste que a economia brasileira precisa.
O grande benefcio gerado por essa poltica fiscal se deve a dois
de quatro atributos indispensveis de um ajuste fiscal de fato:
persistncia, dado que se iniciou no FHC 2 e foi mantido pelo
governo atual; e sua contribuio para a trajetria da dvida no tempo.
Contudo, seu grande desafio ainda estar por vir: o seu tamanho
associado sua composio. O ajuste do tipo II no o desejvel para o
Brasil. Temos que migrar logo para um ajuste fiscal do tipo I. Mas,
porque, se a relao dvida/PIB vem caindo?
A resposta a esta pergunta se divide em duas partes. Na
primeira, quando se faz economias com aumento de despesas,
espera-se mais tributao na frente e isso inibe hoje o investi-mento
privado. Com corte de investimentos pblicos, dada a sua
discricionariedade, tem-se um ajuste fiscal inadequado. De outro
modo, o ajuste fiscal do tipo I parece gerar resultados mais
satisfatrios para o mdio prazo e deixa a economia menos vulnervel
aos ciclos de liquidez, de carter curto pra-zistas. Da a segunda
parte da resposta, que est diretamente associada com o que estar
por vir. Com a retomada de altas de juros pelo Copom, e menor
crescimento econmico, muito provavelmente a economia gerada com os
supervits primrios ser consumida por maiores encargos financeiros
da dvida.
Visto de outra forma, temos o chamado supervit prim-rio
requerido para manter a relao dvida/PIB constante no tempo. Pois
bem, esse supervit deve ser maior de agora em diante, dadas as
recentes e futuras elevaes na taxa bsica de juros. A previso de
mercado, logo no final de junho de 2008, para o final do ano, j
atinge os 14,54% ao ano para a taxa Selic, com crescimento do PIB
em 4,8%. Em outras palavras, economias para alm dos atuais 3,8% do
PIB no resultaro em reduo da relao dvida/PIB.
Ao cenrio de taxa de juros e de menor crescimento econmico,
adiciona-se a frentica expanso das despesas com pessoal para este e
os prximos anos, alm daquelas j conhecidas altas contnuas das
despesas previdencirias. O que se espera so duas decises: reduo
novamente das OCCs e/ou aumento na arrecadao, com novas contribuies
(ICS), congelamento de alquotas de imposto de renda, e elevao nas
alquotas de outras tantas contribuies vigentes (CSLL, Confins),
entre outros. Ou seja, geram-se despesas e corre-se atrs de mais
receitas para cumprir a meta fiscal. Metas fiscais assim obtidas no
contituem o ajuste fiscal desejado para o pas para os prximos
anos.
Mrcio HollandProfessor da EESP/FGV e pesquisador CNPq
Metas fiscais e o ajuste fiscal