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ANATOMIA DOS OVÁRIOS E CORPOS ADIPOSOS DE SCINAX FUSCOVARIA (ANURA, HYLlDAE) Classius de Oliveira Umberto Jorge Alves de Andrade KEV WORDS: Scinax fusco varia, Anura, Hylidae, ovary, anatomy, morfology. Scinax fuscovaria, Anura, Hylidae, ovário, anatomia, morfologia. ABSTRACT ANATOMY OF THE OVARIES ANO FAT BOOIES OF SCINAX FUSCOVARIA (ANURA, HYUOAE). The propitious environmental conditions are responsible for a wide diversity of amphibians in many Brazilian regions. However, the inner morphological characteristics of the majority of these animaIs are not completely known. This paper aims at describing some anatomical characteristicsof the Scinax fusco varia fat bodies and ovaries. The ovaries are lobulated organs bounded by a tenuous and transparent ovarian capsule, which a/lows the identification of different types of germ ce/ls. Itis also brief/y described the histological characteristics of that ce/lular strain (oogonia, oocytes I,11,111, IV). The fat bodies, which are structures juxtaposed to the reproductive system, are attached digitiform prolongations near the cranial edges of kidneys and gonads. 80th structures, ovaries and fat bodies, present great morphological changes during their reproductive cycle. Endereço dos Autores: Departamento de Biologia - Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas - UNESP. 15054-000 São José do Rio Preto, SP. Acta Biologica Leopoldensia Julho/Dezembro
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ANATOMIA DOS OVÁRIOS E CORPOS ADIPOSOS … digitiform prolongations near the cranial edges of kidneys and gonads. 80th ... duas tonalidades distintas: cor creme no hemisfério vegetal

Mar 28, 2018

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ANATOMIA DOS OVÁRIOS E CORPOS ADIPOSOSDE SCINAX FUSCOVARIA (ANURA, HYLlDAE)

Classius de OliveiraUmberto Jorge Alves de Andrade

KEV WORDS: Scinaxfusco varia, Anura, Hylidae, ovary, anatomy, morfology.Scinax fuscovaria, Anura, Hylidae, ovário, anatomia, morfologia.

ABSTRACT

ANATOMY OF THE OVARIES ANO FAT BOOIES OF SCINAX FUSCOVARIA

(ANURA, HYUOAE). The propitiousenvironmental conditions are responsible for a wide

diversity of amphibians in many Brazilian regions. However, the inner morphological

characteristics of the majority of these animaIs are not completely known. This paper aims

at describing some anatomical characteristicsof the Scinax fusco varia fat bodies and

ovaries. The ovaries are lobulated organs bounded by a tenuous and transparent ovarian

capsule, which a/lows the identification of different types of germ ce/ls. Itis also brief/y

described the histological characteristics of that ce/lular strain (oogonia, oocytes I,11,111,

IV). The fat bodies, which are structures juxtaposed to the reproductive system, are

attached digitiform prolongations near the cranial edges of kidneys and gonads. 80th

structures, ovaries and fat bodies, present great morphological changes during their

reproductive cycle.

Endereço dos Autores: Departamento de Biologia - Instituto de Biociências, Letras e CiênciasExatas - UNESP. 15054-000 São José do Rio Preto, SP.

Acta Biologica Leopoldensia Julho/Dezembro

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RESUMO

Uma somatória de condições ambientais privilegiadas em muitas regiões doterritóriobrasileirofavorecem a existência de uma grande diversidade de anfíbios, porémas características morfológicas internas da maioria destes animais ainda são poucoconhecidas. Assim, este trabalho descreve algumas características anatômicas dosovários e corpos adiposos dohilídeoScinax fusco varia.Os ováriossão órgãos lobuladosdelimitados por uma delgada e transparente cápsula ovariana, através da qual é possívelidentificar diferentes tipos celulares germinativos. As características histológicas geraisdesta linhagem celular (ovogônias,ovócitos I, 11, 111e IV)são descritas sucintamente. Oscorpos adiposos, estruturas anexas ao aparelho reprodutor, são prolongamentos digiti-formes aderidos próximo das extremidades craniais dos rins e gônadas. Ambas estrutu-ras, ovários e corpos adiposos, manifestam grandes alterações morfológicas no decorrerdo ciclo reprodutivo.

INTRODUÇÃO

A subclasse Lissamphibia é a mais recente e a única existente dentre astrês que compõem a classe Amphibia, atualmente com mais de 4.520 espéciesdescritas. Das três ordens a mais representativa é denominada de Anura (85%),da qual a maioria das espécies encontra-se nas regiões tropicais e subtropicais,como na América do Sul, onde ocorrem 11 famílias (DUELLMAN & TRUEB,1986). Dentre estas, a família Hylidae está representada por uma grandevariedade de espécies com ampla distribuição geográfica, alcançando nasregiões neotropicais um maior grau de diferenciação, o que ocorre no Brasil(ALMEIDA,1984).

As gônadas dos anfíbios e os corpos adiposos associados a estas têmuma origem embriológica comum (HUMPHREY, 1927). Este corpo adiposo éuma característica comum a todos os anfíbios (DUELLMAN & TRUEB, 1986) eservem como uma reserva nutricional para as gônadas, como inicialmenteproposto por DUBOIS (1927)e constatado por FITZPATRICK (1976) analisandovários outros trabalhos em diferentes espécies. Segundo KÜKENTHAL et ai.(1986) na margem anterior dos ovários estão presentes corpos adiposos abdo-minais com função e forma peculiares.

Os ovários são estruturas saculares e lobuladas com um epitélio germi-nativo que confere à gônada umacapacidade cíclica para proliferação e diferen-ciação de grandes quantidades de gametas (FRANCHI, 1962; LOFTS, 1974).As fêmeas próximas da oviposiçãoapresentamováriosaumentadose com intensaatividade vitelogênica, com proporcionalaumento do complexo folículo-ovocitário(HERMOSILLAet ai., 1986),comodescritoparaRana esculentacujopesodoovárioe tamanho da desova têm correlaçãodiretacom o pesocorporal, coincidindo comas fases de atividade ovariana ao longo do ano (RASTOGI et ai., 1983).

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Com base nas informações apresentadas acima e na escassez de traba-lhos que descrevem a anatomia dos órgãos reprodutores de anuros tropicais,propomos uma descrição das características morlológicas do aparelho reprodu-tor feminino de Scinax fuscovaria, abordando as gônadas e os corpos adipososindependentemente da fase reprodutiva em que se encontre o animal.

MATERIAL E MÉTODOS

Pela dificuldade de coleta de indivíduos do sexo feminino em seu ambientenatural, foram utilizados apenas cinco exemplares adultos de S. fuscovaria (A.Lutz, 1925), que foram anestesiados por saturação em éter e sacrificados paraas análises morlológicas. Os animais foram capturados em Botucatu (SP),durante o período de junho a dezembro de 1992, que corresponde à época deatividade reprodutiva.

As análises macroscópicas foram realizadas em dois espécimes queforam sacrificados e fixados em formalina neutra 10%. A dissecação foi realizadapor meio de uma incisão ventral-mediana da cloaca à altura dos membrosanteriores. A análise da sintopia das estruturas e suas descrições, bem como adocumentação fotográfica, foi realizada sob estereomicroscópio.

Para os estudos histológicos, três fêmeas foram submetidas a dissecaçãoapós a anestesia e tiveram os órgãos reprodutores gotejados" in situ" com asolução de Bouin. Após a retirada dos fragmentos gonadais, os mesmos foramfixados em Bouin durante 20 horas, lavados em álcool etílico 70% e encaminha-dos à rotina histológica de desidratação, diafanização, inclusão em parafina emicrotomia. A técnica de hematoxilinaleosina foi utilizada para coloração.

RESULTADOS

As fêmeas de S. fuscovaria apresentam dois ovários lobulados, localiza-dos ventralmente aos rins e mantidos na posição por uma delgada membranaconjuntiva, o mesovário (FIGURAS 1 e 2). Emassociação com a porçãosuperiorde cada ovário estão aderidas estruturas anexas ao aparelho reprodutorque sãodenominadas corpos adiposos abdominais e apresentam "in vivo" uma colora-ção que varia do esbranquiçado ao amarelo vivo, com várias tonalidadesintermediárias. Numadescrição geral, são corpos formados por prolongamentosdigitiformes dispostos em feixes jungidos pela base e divergentes nos ápices.Encontram-se fixos ao mesentério pela sua base ou "raiz", na altura dasextremidades craniais dos rins e gônadas (FIGURA 2). Os prolongamentospodem espalhar-seportoda a cavidade, dependendodasuaformae volume,o quetambém é variável de acordocom a fase reprodutivaem quese encontrao animal.

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FIGURA1 - Representação esquemática dos órgãos da cavidade corporal em vistaventral: corpos adiposos (CA);estômago (E); fígado (F); intestino (I);ovário direito(OD) e esquerdo (OE); pulmão (P) e canal retal (R). Aproximadamente duas vezeso tamanho natural.

gE

MMd

ÇSL- '-..8.

FIGURA2 - Esquema dos órgãos em vista dorsal: porçôes cranial (Cr), medial (Md)e caudal (Cd) do oviduto; corpos adiposos (CA); estômago (E); ovário esquerdo(OE); pulmão (P); mesovário (M)e rim (R). Aumento aproximado de 4x.

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Em uma observação superficial foram identificadas granulações ovaria-nas, que correspondemaos ovócitosem diferentesestádios de maturação, o quesó é possível ser visualizado pela transparência da cápsula ovariana ou túnicaalbugínea, uma camadade tecido conjuntivoque envolve o órgão conferindo-lheforma e consistência(FIGURA3A). Macroscopicamente,os ovócitos imaturos sãomenores e têm coloraçãoesbranquiçada.Já num estádio intermediário de desen-volvimento assumem uma cor creme devido ao acúmulo de vitelo. Finalmente,quando estão próximosda maturação, encontram-se parcialmente pigmentados,com um hemisférioque mantéma cor creme e o outro parda (FIGURA 38).

FIGURA 3 - Ovócitos de diferentes tamanhos e colorações observados pela trans-parência da delgada cápsula ovariana sob estereomicroscópio. A - Vista geral deum lóbulo (22x). B - Identificação dos ovócitos I (1), 11(2), 111(3) em estádio inicial eIV (4), com aumento de 40x.

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Os ovários, quando analisados histologicamente, apresentam diferentestipos celulares germinativos e, de maneira simplificada, esta linhagem celular foidividida segundo suas características morfológicas em ovogônias, ovócitos I, 11,111e IV (FIGURA 4).

A

FIGURA 4 - A - Ovário com ovogênese avançada: ovócitos I (1), 11(2), 111(3) e IV(4);cápsula ovariana (c) e interstício (i) com escasso material entre os ovócitos.Coloração H-E (22x). B - Secção do ovário imaturo: ninho de ovogônias (Og),ovócitos I (1) e 11(2). Coloração H-E (160x).

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As ovogônias encontram-se geralmente agrupadas em ninhos na periferiada gônada. São as menores células da linhagem germinativa e se caracterizampor apresentarem pouca afinidade aos corantes. Os ovócitos I apresentam umvolume celular maior do que as anteriores e seu citoplasma assume intensabasofilia e o núcleo uma discreta acidofilia. Caracterizando o estádio de ovócitos11,há um progressivo aumento no número de nucléolos, que apresentamdimensões variáveis e preferencialmente localizam-se na periferia nuclear (FI-GURA 48).

Nos ovócitos 111uma característica fundamental refere-se à deposição deinclusões vitelínicas, que ocorre inicialmente na região cortical e posteriormente,de maneira centrípeta, preenche praticamente todo o citoplasma; o núcleo estácentralizado e é proporcionalmente grande (FIGURA 48). Neste estádio inicia-seo processo de polarização celular, originando dois hemisférios (animale vegetal)morfologicamente distintos.

Nos ovócitos IV a polarização celular é nítida. Nestes, uma distinta camadade citoplasma periférico repleta de pigmentos e com a vesícula germinal (núcleo)deslocada para esta porção representa o hemisfério animal e a metade comple-mentar, cujo citoplasma está preenchido pelo vitelo é denominada hemisfériovegetal (FIGURA 4A). Neste estádio final, o ovócito atinge seu maior volume emacroscopicamente, na gônada ou na massadesovada, os ovócitos apresentamduas tonalidades distintas: cor creme no hemisfério vegetal e marrom nohemisfério animal (FIGURA 3).

Quando o ovário prossegue em direção da maturação, ocorre um aumentoextraordinário do ovócito e da própria gônada, bem como uma diferenciação deestruturas periovocitárias que constituirão o envoltório folicular. Com o desen-volvimento gonadal as células germinativas pré-vitelogênicas (ovogônias, ovó-citos I e 11)se localizam na periferia, mantendo contato direto com a cápsulaovariana, já os ovócitos em vitelogênese final e maduros são deslocados paraa região central do lóbulo. Simultaneamente, o interstício ovariano torna-se cadavez mais escasso (FIGURA 4A). É importante salientar que não foram descritasoutras estruturas ovarianas de considerável significado como os envoltóriosfoliculares, folículos atrésicos e pós-ovulatórios.

DISCUSSÃO

A estrutura morfológica geral e relaçãosintópica dos órgãos e tecidos queintegram o aparelho reprodutor de S. fuscovaria, apresentam o mesmo padrãode organização geral da maioria dos anfíbios da ordem Anura.

Os ovários dos anfíbios são órgãos pares retroperitoneais, cuja estruturaé a de uma víscera sacular e lobulada, com um epitélio germinativo que propiciauma ciclicidade na proliferação e diferenciação de gametas (FRANCHI, 1962;

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LOFTS, 1974; HILDEBRAND, 1995). Esta ciclicidade gonadal segue a sazona-lidade reprodutiva de cada espécie e geralmente acarreta mudanças morfológi-cas muito acentuadas.

Em S. fuscovaria, os ovários são órgãos lobulados e geralmente assimé-tricos em forma e volume, sua consistência é frouxa e a forma é conferida peloarranjo dos ovócitos em diferentes estádios de desenvolvimento. Estes ovócitossão envolvidos conjuntamente pela cápsula ovariana, sendo a gônada susten-tada pelo mesovário ventralmente aos rins. Os ovários moldam-se, com muitasvariações, aos segmentos do tubo digestivo em suas diferentes porções eestados funcionais. Obviamente esta plasticidade visceral ocorre de forma maisnotável nas espécies que têm grandes alterações morfológicas cíclicas, o quetambém depende do número e tamanho dos ovócitos produzidos.

A descrição acima é concordante com aquelas propostas para Caudiver-bera caudiverbera (HERMOSILLAet ai., 1986)e Rheobatrachus silus (HORTON& TYLER, 1982), ambos da família Leptodactylidae. Assim, para C. caudiverbe-ra, os ovários são delimitados por uma membrana transparente que possibilitavisualizar os folículos em diferentes estádios de desenvolvimento. Esta mem-brana se reflete constituindo o mesovário, o qual segura as gônadas, por suaporção dorsal, à parede anterior dos mesonefros.

HORTON & TYLER (1982) constataram assimetria no número de lobosovarianos na maioria dos indivíduos analisados, sendo que na maior parte, haviamais lobos no ovário direito. KYRIAKOPOULOU-SKLAVOUNOU & LOUM-BOURDIS (1990) observaram, em Rana ridibunda, que o ovário esquerdo éusualmente maior. Em C. caudiverbera,a diferença de lobulação não representadiferença significativa de peso entre os ovários. É possível que a lobulaçãopermita melhor acondicionamento do material ovariano (HERMOSILLA et aI.,1986). Em nossas observações, tornou-se muito evidente a necessidade mor-fofuncional destas assimetrias, uma vez que os órgãos associados ao aparelhoreprodutor sofrem drásticasvariações, principalmente de forma e volume. Estes,em conseqüência, acomodam-se de maneiras distintas na cavidade corporal.

Em uma observaçãopreliminar e pouco detalhada da granulação ovarianaem S. fuscovaria, foram identificados ovócitos em distintos estádios de diferen-ciação e quando estes associam-se com células somáticas ao seu redor formamos complexos folículo-ovocitários. HERMOSILLA et ai. (1986) relataram que osmaiores folículos possuem clara polarização de pigmento melânico no hemisfé-rio animal e que, na teca externa, há abundância de vasos sanguíneos, fibrascolágenas e fibroblastos. Essa amplificação na vascularização, supõem osautores, contribui para os processos vitelogênicos e, possivelmente, seja neces-sária para dar expressão funcional às células foliculares, cujas interações como ovócito do mesmo complexo foi ículo-ovocitário são evidentes nos processosde maturação folicular. Acreditamos que estas estruturas e suas possíveisfunções sejam semelhantes em S. fuscovaria.

Apesar de não existir consenso e padronização na divisão dos estádiosde desenvolvimento dos tipos celulares germinativos, a maioria dos autores

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costuma dividí-Ios em cinco ou seis estádios, embora nem sempre se equiva-lham. A nomenclatura utilizada também não apresenta um padrão comum paraas descrições em diferentes espécies. Desta forma alguns autores referem-sea estádios foliculares (REDSHAW, 1972; HERMOSILLA et a!., 1986; BEROIS& DE sÁ, 1988), enquanto que outros denominam de fases ovocitárias (PAN-CHARATNA & SAIDAPUR, 1985; DUMONT, 1972; AGOSTINHO, 1988). Inde-pendentemente destas classificações, entendemos que as células pré-vitelogê-nicas e em vitelogênese inicial se localizam na periferia ovariana em função doextraordinário crescimento pelo qual passarão, o que torna-se facilitado pelacapacidade de distensão da cápsula ovariana. Por outro lado, caso as célulasem desenvolvimento estivessem intercaladas aos enormes ovócitos maduros,ao crescerem seriam simplesmente comprimidas por estes.

A análise dos corpos adiposos de S. fuscovaria revelou que são constituí-dos por prolongamentos digitiformes amarelados, presos ao mesentério naaltura das extremidades craniais dos ovários e rins, podendo espalhar-se portoda a cavidade corporal em função da forma, volume e fase reprodutiva.Descrições semelhantes são encontradas para outras espécies (RASTOGI etai., 1983; KÜKENTHAL et a!., 1986; AGOSTINHO, 1988). De maneira similaràquelas observações em S. fuscovaria, foram documentadasvariações morfo-lógicas sazonais em Rana ridibunda (KYRIAKOPOULOU-SKLAVOUNOU &LOUMBOURDIS, 1990), Rana cyanoph/yctis (PANCHARATNA & SAIDAPUR,1985) e várias outras espécies (FITZPATRICK, 1976).

Em Chthonerpeton indistinctum (BEROIS & DE sÁ, 1988), os corposadiposos são órgãos lobados presentes em ambos os sexos, sendo o númerode lobos variável, e que se estendem do fígado à cloaca aderidos à parededorso-medial pelo mesentério. São compostos de tecido adiposo bem desenvol-vido e a irrigação sanguínea ocorre nos ângulos intercelulares.Em S. fuscovaria,após observações nos animais recém-sacrificados, foi constatada a presençade vasos sanguíneos percorrendo longitudinalmente toda a extensão dos pro-longamentos e a ocorrência de variação na coloração (do esbranquiçado aoamarelo vivo), provavelmente associada com a fase de maturação gonadal.

As estruturas denominadas corpos gordurosos ou adiposos, associadosàs gônadas, são típicas da classe Amphibia (DUELLMAN & TRUEB, 1986).Constituem a principal fonte de energia lipídica nos anfíbios (FITZPATRICK,1976), embora suas funções ainda não estejam esclarecidas, podendo estarrelacionadas com hibernação, servindo de reserva energética neste período(BUSH, 1963). Os corpos adiposos são órgãos de reserva nutricional cujaprincipal função é suprir as gônadas. Os maiores corpos adiposos observadosocorrem em fêmeas na época da desova e podem bem ser um reservatório denutrientes. São proporcionalmente muito menores em fêmeas com ovos imatu-ros (NOBLE, 1931).

AGOSTINHO (1988) sugeriu que os corpos adiposos, aderidos à porçãosuperior dos ovários, supostamente armazenam energia para ser utilizadadurante o acasalamento e como reservadurante o inverno.Suavariação sazonal

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foi correlacionada com períodos de dormência durante tempo desfavorável ecom reprodução (produção de gametas e vitelo, atividade de procriação ecuidados com a ninhada) em muitos anfíbios, como nos gêneros Bufo, Rana,Scaphiopus (FITZPATRICK, 1976). Embora ainda persistam algumas dúvidassobre os aspectos funcionais destas estruturas, seu arranjo estrutural é muitosemelhante entre as espécies integrantes do mesmo grupo, como constatadopara os anuros.

AGRADECIMENTOS

À FUNDUNESP pelo auxílio financeiro (proc. 109/94 DFP/F/CBS) e aoCNPq (PIBIC 95/96) pela concessão da bolsa de iniciação científica paraUmberto J. A. Andrade. Aos Professores Gisele Manganelli Fernandes, JoãoCarlos Gonçalves e Dra. Nívea Conforti Froes pela colaboração na versão doresumo para língua inglesa.

REFERÊNCIAS

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Recebido em 06/05/97Aceito em 16/06/97