Letras - Língua Portuguesa - 3º semestre Análise de livro didático Prática de Ensino I Professora Danielle Maximo Plens Pinelli Elcio Queiroz Couto - R.A. - 10.1699-7 2012
Letras - Língua Portuguesa - 3º semestre
Análise de livro didático
Prática de Ensino I
Professora Danielle Maximo Plens Pinelli
Elcio Queiroz Couto - R.A. - 10.1699-7
2012
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Sumário
Sumário .............................................................................................................. 2
Introdução .......................................................................................................... 3
Pressupostos teóricos ........................................................................................ 4
Análise dos livros didáticos ................................................................................ 7
Proposta de atividade ....................................................................................... 12
Considerações finais ........................................................................................ 14
Bibliografia........................................................................................................ 15
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Introdução
Este trabalho, em cumprimento às solicitações da disciplina Prática de
Ensino I, tem por objetivo analisar comparativamente livros didáticos de Língua
Portuguesa do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, quanto às concepções
de língua, linguagem e variação linguística. Para tanto, foi selecionada a
coleção Português: Linguagens, dos autores William Roberto Cereja e Thereza
Cochar Magalhães, em suas versões para o Ensino Fundamental - dividido em
quatro volumes, correspondentes ao sexto, sétimo, oitavo e nono anos - e para
o Ensino Médio - dividido em três volumes.
Buscar-se-á nesta análise apreender a adequação dos livros didáticos às
orientações e diretrizes oficiais dos PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais -
e PNLD - Plano Nacional do Livro Didático, com especial atenção ao que se
refere à abordagem que o material faz sobre variação linguística.
O livro didático, sendo importante agente na relação ensino-
aprendizagem, como uma das referências que o aluno tem do que lhe é
ensinado, requer especial trato, principalmente no se que refere a sua
adequação aos ditames oficiais quanto ao abandono de noções
preconceituosas no ensino da língua, em toda sua variedade.
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Pressupostos teóricos
Por linguagem entende-se como atividade de interação entre sujeitos
histórica e ideologicamente constituídos, que ocupam lugares sociais
(FARACO, 2005). É pela linguagem que se pode expressar ideias,
pensamentos, vontades e é por meio dela que se apreende o mundo. Por sua
natureza interacional, é através da linguagem que se pode alcançar e
influenciar o outro. Por fim, é por meio da linguagem que se estabelece a
comunicação como prática de interação.
Bakhtin (in: FARACO, 2008) aponta que para apreender a linguagem é
preciso situar sujeitos e situação comunicacional no contexto social:
“(...) para observar o fenômeno da linguagem, é preciso situar os sujeitos -
emissor e receptor do som -, bem como o próprio som, no meio social. Com
efeito, é indispensável que o locutor e o ouvinte pertençam à mesma
comunidade linguística, a uma sociedade claramente organizada”.
Dessa forma, a linguagem é estruturada por um conjunto de regras, cujo
conhecimento é compartilhado pela comunidade linguística que dela faz uso.
Nesse sentido, TERRA (2008) conceitua a linguagem como “todo sistema de
sinais convencionais pelos quais os sujeitos interagem com os outros”.
A linguagem pode ser classificada como verbal e não verbal: a
linguagem verbal se dá pelo uso da palavra, como as línguas naturais; como
linguagem não verbal, entende-se aquela constituída por outros tipos de sinais
ou códigos, tais como cores, gestos, imagens, etc. Essa distinção não exclui a
possibilidade de coexistência, podendo haver um misto entre linguagens
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verbais e não verbais, como acontece nos quadrinhos, na propaganda
publicitária, etc.
A língua, sistema convencional, estruturado e entendido como realização
da linguagem, longe de ser apenas um instrumento de comunicação, é um fato
social de interação, marcado inerentemente pela heterogeneidade, mudança e
variação. Considerando que língua e sociedade estão interligadas de modo
indissociável, não se pode conceber a ideia de uma língua homogênea e única,
diante de uma realidade de pluralidade cultural, social e econômica. Por outro
lado, é também inconcebível que uma língua natural se mantenha imutável ao
longo do tempo. Assim, afirma ALKMIM (2001) que toda língua é um legado
que os indivíduos herdam de seus ascendentes, sendo as mudanças temporais
parte da história de cada língua.
Desse modo, pode-se afirmar que qualquer língua varia e muda -
condição que jamais será refreada. Nesse sentido, FARACO (2005) afirma que
“(...) toda e qualquer língua é um conjunto heterogêneo de variedades. (...)
Cada variedade é resultado das peculiaridades das experiências históricas e
socioculturais do grupo que a fala: como ele se constituiu, como é sua
posição na estrutura socioeconômica, como ele se organiza socialmente,
quais seus valores e visão do mundo, quais suas possibilidades de acesso à
escola, aos meios de informação, e assim por diante.”
As mudanças e variações da língua se dão por diversos fatores, cujas
razões estão associadas a questões históricas (transformações ao longo do
tempo, quando muitas palavras e construções sofrem mudanças de som, de
forma e de significado. Uma vez que os contexto sociais mudam
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constantemente, o falantes também mudam, e nesse processo a língua muda
naturalmente), geográficas (diz respeito às diferenças que uma língua
apresenta nas divesas regiões em que é falada) e sociais (que refletem o sexo,
a faixa etária, condição socioeconômica e agrupamento social.)
Quanto à mudança ao longo do tempo, FARACO (2005) explica que
podem ocorrer mudanças nos níveis fonético-fonológico, morfológico, sintático,
semântico, pragmático e lexical.
FARACO (2008) conceitua as diferenças entre norma culta, norma padrão
e norma gramatical. Por norma padrão entende-se um ideal de língua, não real,
diferente da norma culta, entendida aqui como a variedade utilizada mais
comumente pela sociedade letrada nas práticas mais monitoradas de fala e
escrita. Norma gramatical é a tentativa de diminuir as distâncias entre o ideal
caracterizado pela norma padrão e a realidade da norma culta. A norma
gramatical, no entanto, não concorre para uma descrição da norma culta real,
mas para uma normatização.
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Análise dos livros didáticos
Os PCNs - Parâmetros Curriculares Nacionais - assumem a natureza
heterogênea da língua, onde a variação é sua parte constitutiva. Orientam para
o abandono da concepção de certo ou errado na língua. Outrossim, apontam
para a adoção da concepção de adequação e inadequação de uso de
variedades às diversas situações de interação comunicativa, de acordo com o
contexto em que se produzem. Desse modo, apregoa-se o ensino da variedade
padrão da língua sob a justificativa de que não faz sentido oferecer ao aluno
apenas a reflexão sobre sua própria variedade, senão a possibilidade de
apropriação e desenvolvimento de sua capacidade intelectual e linguística, o
que oferecerá uma maior e mais eficaz participação numa sociedade letrada.
Quanto às concepções de língua, linguagem e variação linguística, a
coleção Português: linguagens do ensino fundamental concentra suas
discussões no primeiro volume, correspondente ao sexto ano do ensino
fundamental ou a antiga quinta série. O primeiro capítulo desse volume é
reservado à explanação dos conceitos de língua e linguagem, com o título de
“Linguagem, ação e interação”. Pelo título que se dá a esse capítulo, podemos
perceber que os autores assumem a natureza interacional da língua, fato que
se mostrará mais adiante, à página 15, com a afirmação:
“A linguagem é um meio de comunicação e interação entre as pessoas”.
Na sequencia, os autores trabalham com as naturezas verbais e não
verbais da linguagem. À página 18, os autores afirmam que a finalidade da
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linguagem é a interação entre as pessoas que concorrem nesse processo
como interlocutores num dado contexto ou situação.
Como língua, os autores entendem tratar-se de
“um conjunto de sinais (palavras) e de leis combinatórias por meio do qual as
pessoas de uma comunidade se comunicam e interagem”.
A variação linguística é tratada do capítulo seguinte, de título “Da língua
aos textos e aos gêneros”, com início na página 34. Nesse capítulo, os autores
trabalham com a importância da situação e do contexto para a produção de
sentido dos textos orais e escritos, aparecendo aqui a noção do continum
tipológico de que nos fala Marcuschi (2004). Desse modo, ao situar a
discussão da variação linguística nesse capítulo, os autores apontam para a
noção de adequação e inadequação do uso da língua. À página 47, os autores
afirmam:
“Variedades linguísticas são as variações que uma língua apresenta, em
razão das condições sociais, culturais e regionais nas quais é utilizada.”
A seguir, os autores destacam que todas as variedades tem ser seu valor
dentro da comunidade que dela faz uso, ressaltando sua completa eficácia
comunicacional. É dito então que não existe uma variedade mais correta que
outra, sendo responsável pela posição que a variedade padrão ocupa o
prestígio social que ela tem. Em consonância com o PCN de Língua
Portuguesa, os autores reafirmam a importância do abandono da noção de
certo ou errado no uso da língua e sua substituição pela noção da adequação
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linguística nas diversas situações. Dá-se também importância ao ensino da
variedade padrão para conferir ao aluno condições de maior e mais efetiva
participação na sociedade letrada.
Foi selecionada para análise a atividade da página 49, que trata de uma
reflexão sobre contexto, adequação linguística e preconceito linguístico. Nessa
atividade, os autores apresentam a seguinte tira de Angeli:
Na atividade em questão, notamos uma certa discrepância entre o texto
escolhido e a proposta dos exercícios. Tal fato se mostra mais claramente na
sugestão de respostas que autores fazem nos exercícios 2 e 4 (em seu item b).
No citado item “b” do exercício 4, os autores sugerem ao professor a discussão
sobre preconceito linguístico – embora esse tema tenha sido abordado apenas
implicitamente no texto da aula que subsidia o exercício, quando trata de valor
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e importância das variedades para as comunidades que as praticam. A
contradição reside no fato de o autores sugerirem na resposta do exercício 2
que o autor da tira está tratando de forma irônica a variedade em questão.
Entende-se que uma atividade que pretende ou sugere trabalhar com a
questão de adequação e preconceito linguísticos não pode trazer um texto em
que se assume um trato irônico de uma variedade linguística, a menos que se
mostre uma posição crítica e contrária a essa ironia. Não é possível perceber
essa posição por parte dos autores na sugestão de resposta que fazem para
esse exercício.
Na versão da coleção Português: linguagens para o ensino médio, os
autores reservam a discussão sobre língua, linguagem e variação linguística a
um capítulo do primeiro volume - correspondente ao primeiro ano – , cujo título
é “Linguagem, comunicação e interação”. Os autores iniciam na página 36
conceituando linguagem como “um processo comunicativo pelo qual as
pessoas interagem entre si”, e seguem apresentando os conceitos de
linguagem verbal, não verbal e mista, e interlocutores, tal como na versão da
coleção para o ensino fundamental. Repete-se aqui também o conceito de
língua como “um conjunto de sinais (palavras) e de leis combinatórias por meio
da qual as pessoas de uma comunidade se comunicam e interagem”. Os
autores introduzem noções de língua como convenção. Ressaltam, no entanto,
que as línguas “resultam de um processo social e histórico complexo e
dinâmico, com transformações permanentes”, no que encontram ecos os
conceitos sociolinguísticos. Ao tratar de variação linguística retomam os
conceitos apresentados na versão do ensino fundamental e reafirmam a
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importância de abandono sobre noções de variedades corretas e erradas. De
igual forma, reafirma-se o papel da escola de ensino da variedade padrão
tendo em conto que isso não visa “eliminar a língua que o aluno traz de casa,
mas prepará-lo para se comunicar com segurança e competência,
independentemente de sua origem social.”
Foi selecionada para análise a seguinte atividade constante na página 44:
Tal como a que foi analisada anteriormente, essa atividade traz um texto
que no nosso entender traz uma certa incoerência com o que foi conceituado
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por todo o texto que subsidia os exercícios. Embora trate-se de um texto
humorístico e os autores ressalvem nas sugestões de respostas que o texto da
atividade “trabalha com estereótipos que não correspondem necessariamente à
realidade” e que “revela comportamentos ou hábitos que supostamente
caracterizam o povo de diferentes Estados ou regiões”, entende-se ser de
maneira pouco eficaz tratar de variedades regionais a partir de um texto de teor
preconceituoso: esse recorte dá ao aluno um conhecimento de falsa realidade.
Tal expediente pode ser observado por exemplo na telenovelas em que, ao ser
retratada um variedade regional, ela é sempre feita por meio de esteriótipos.
Entende-se que uma melhor adequação à realidade seria alcançada com
o trabalho de textos extraídos do cotidiano, como entrevistas ou registros de
situações reais de uso das variedades.
Proposta de atividade
Considerando a relevância de se trabalhar com textos que correspondam
à situações reais de uso da língua, a atividade proposta abaixo tem por objetivo
a avaliar a compreenção do aluno sobre variação línguística e adequação no
uso de variantes.
Considere as situações abaixo:
Situação 1 - O consumidor solicita produtos ao comerciante:
“Me vê deiz pão e trezentas gramas de mortandela, por favô!”
“Por favor, dez pães e trezentos gramas de mortadela”
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Situação 2 - Dois amigos conversam em uma festa:
“Mano, tô mó na fissura de chegar naquela mina ali. ”
“Está vendo aquela doçura ali? Você acha que eu poderia conquistá-la?”
Situação 3 - O juiz declara a sentença:
“Pelas provas que vi, declaro que é você culpado e você vai ter que ficar preso
por três anos.”
“Pelo conjunto de provas apresentadas, declaro o réu culpado, sendo
condenado a cumprir a pena de reclusão de três anos”
Nos textos propostos acima, as duas orações que seguem cada situação
correspondem a formas alternativas de se produzir o enunciado. Considerando
isso, responda as perguntas:
1- Na situação 1, aponte a forma que ocorre com mais frequência em seu
cotidiano. É possível afirmar que ambas as formas são adequadas à
situação proposta? Justifique sua resposta.
2- Na situação 2, é possível apontar a faixa etária ou grupo social a que
pertencem as pessoas que produziram os enunciados? Justifique sua
resposta apontando elementos do texto.
3- Na situação 3, ambas as formas são adaquadas à situação proposta?
Justifique sua resposta.
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Considerações finais
Procurou-se demonstrar através da análise comparativa entre as duas
versões da coleção de livros didáticos dos mesmos autores que, embora o
texto teórico do material esteja adequado à orientações e diretrizes oficiais dos
PCNs quanto aos conceitos de língua, linguagem e variação linguística, ainda é
possível encontrar exercícios propostos que não condizem completamente com
os conceitos trabalhados. Demonstrou-se, a partir desse fato, a existência de
uma certa incoerência entre os exercícios e o textos teóricos que subsidiam as
atividades. Na atividade selecionada a partir da versão da coleção para o
ensino fundamental, observamos a ocorrência de um texto - uma tira de Angeli
- que faz um trato ao nosso ver preconceituoso da variente em questão - no
caso, a variante dos adolescentes. Na atividade analisada da versão da
coleção para o ensino médio, observamos a ocorrência de um texto
humorístico que traz esteriótipos de variações regionais em certos momentos
hiperbolizados.
Conclui-se, dessa maneira, que uma das formas adequadas de se
trabalhar a questão da variação linguístca é através de textos que podem ser
produzidos em situações reais de uso, como demonstrado na Proposta de
atividade.
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Bibliografia
ALKIMIM, T. Sociolinguística. In MUSSALIM, F e BENTES, A. C. Introdução à
linguística vol.1. São Paulo, Cortez, 2ª ed., 2001.
FARACO, C. A. Norma culta brasileira: desatando alguns nós. São Paulo,
Parábola, 2008.
FARACO, C. A. Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das
lónguas. São Paulo, Parábola, 2005.
CEREJA, W. R. e MAGALHÃES, T. C. Português: linguagens - 5ª série. São
Paulo, Atual, 2002
CEREJA, W. R. e MAGALHÃES, T. C. Português: linguagens 1. São Paulo,
Saraiva, 7ª ed., 2010.
MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São
Paulo, Cortez, 2004
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros curriculares
nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa.
Brasília, MEC/SEF, 1998.