A produo da habitao social de mercado nas cidades mdias de
Londrina/pr e Maring/prWagner Vinicius Amorim[footnoteRef:1] [1:
Este artigo compreende parte dos resultados obtidos com a pesquisa
desenvolvida em nvel de doutorado em Geografia pela FCT/UNESP de
Presidente Prudente/SP, sob orientao da Profa. Dra. Maria Encarnao
Beltro Sposito, e co-orientao do Prof. Dr. Everaldo Santos Melazzo.
A pesquisa contou com apoio financeiro da Fundao de Amparo Pesquisa
do Estado de So Paulo (FAPESP). E-mail:
[email protected].]
ResumoO artigo aborda a produo habitacional nas cidades mdias de
Londrina e Maring no contexto atual do Programa Minha Casa Minha
Vida (PMCMV). Desenvolve uma sntese histrica da produo habitacional
nessas cidades, culminando na discusso e problematizao dos impactos
territoriais desse programa, destacando seus principais desafios,
limitaes e enfrentamentos para o caso particular das cidades mdias
e da Habitao de Interesse Social.Palavras-chave: Poltica
habitacional. Produo imobiliria. Habitao de Interesse Social.
Cidades mdias. Londrina/PR e Maring/PR.
1. Os agentes e suas escalas de atuao: poltica habitacional,
poder pblico local e o PMCMV em Londrina e em MaringNeste trabalho
abordaremos as relaes existentes entre os agentes da produo do
espao urbano, poder pblico local e produtores imobilirios, a partir
da questo da promoo da habitao e da poltica habitacional local nas
cidades de Londrina e Maring (Mapa 1). O atual momento do setor
imobilirio no Brasil, fortemente resignificado a partir da atuao do
Estado, por meio do PMCMV, enseja um quadro de mudanas nas prticas
histricas dos produtores e promotores imobilirios, dos maiores aos
menores, daqueles cuja atuao mais local queles mais presentes no
territrio nacional. Estas mudanas no suplantam determinadas
rotinas, esquemas, aes ou estratgias locais evidenciadas em espaos
no metropolitanos, mas as rearticulam ao contexto geral, e
reatualizam os expedientes de reproduo local que, em alguns casos,
mutuamente influenciam outros expedientes pertinentes a outras
escalas espaciais.No contexto atual e na esfera local reproduz-se o
clientelismo, a influncia do empresariado sobre as decises pblicas
e a subservincia das normas urbansticas aos ritmos e sentidos da
valorizao imobiliria que, mesmo em face das importantes mudanas
carreadas ps Estatuto da Cidade, em 2001 inclinadas ao cumprimento
da funo social da cidade e da propriedade, participao da sociedade
civil nos ambientes de tomadas de decises correlatas a
coletividade, dentre outras , resultam em pouca resistncia aos
interesses imobilirios, que permanecem quase intocados e fortemente
organizados nas cidades.
Mapa 1 - Situao geogrfica das cidades mdias de Londrina e
Maring.
Em Maring, onde se construiu fortemente um discurso em torno da
cultura do planejamento tcnico e dos parmetros urbansticos,
constata-se sua constante reordenao de acordo com as convenincias,
ritmos e sentidos apontados pelo mercado (BELOTO, 2004). Tws (2010,
p. 224), em pesquisa concernente verticalizao em Londrina e Maring,
confirma que h:[...] uma relao intrnseca dos agentes do capital
imobilirio com o Estado. Existem muitos agentes que esto
diretamente vinculados ao poder pblico por meio de cargos polticos
ou por parentesco. Esse fator decisivo na formulao e na reproduo
das leis que visam atender a interesses especficos nas cidades,
gerando a segregao e os problemas urbanos. Essa parcela responsvel
pela expanso da verticalizao na Gleba Palhano em Londrina [...]. Em
Maring a maior expressividade ocorreu na localizao dos condomnios
fechados. Agentes polticos que so ao mesmo tempo proprietrios
utilizam diversas estratgias a fim de valorizar suas
propriedades.Semelhantemente, Schmidt (2002, p. 18), em pesquisa
sobre a produo imobiliria luz das aes do poder pblico local em
Maring, afirma que o relacionamento da incorporao imobiliria com a
estrutura poltico-administrativa no se apresenta sistematicamente
sempre conflitante, pois se rege pelos contatos sociais e decises
sobre o que e onde. Aqui, entra a questo da elite local, que
garante certa vantagem aos agentes privados, j que, em defronte s
lutas na esfera pblica, as disputas so acirradas, especialmente no
caso das disputas pelo acesso aos benefcios polticos locais e s
polticas de investimento etc., levando a relao entre determinados
grupos deteriorao, sendo comuns as disputas travadas nos mbitos
legislativo, tcnico e em outras instncias interpessoais, a fim de
atenuar e dirimir as tenses entre o mercado e o poder pblico local,
e conciliar foras consentneas entre si na produo do espao urbano.
Porm, esta conciliao de interesses intermediada pela fora dos
agentes que condicionam as disputas e a concorrncia ao poder
econmico, atenuando-a em funo destes arranjos economicamente
estabelecidos e politicamente favorecidos.A composio do poder
pblico local por agentes que atuam tambm na produo imobiliria,
afirma Tws (2010, p. 201 e 202), possibilita a influncia dos grupos
locais, associados e organizados, na definio das normas do
planejamento urbano. Tws (2010, p. 201-202) observa que a influncia
desses grupos mais se destacou na cidade de Londrina, pressionando
ocasionalmente o poder pblico local no tocante legislao e s normas
urbansticas, j que em Maring, haja vista a articulao histrica dos
governos locais com os grupos econmicos locais, salvo poucas
administraes, o conflito de foras era menos aparente, pois elas
sempre estiveram conciliadas e contempladas na gesto da cidade para
o mercado imobilirio, parecendo, assim, o conflito, menos
agressivo, seja pela competncia do poder pblico local em no
deix-los transparecer ou, o que mais provvel, pela conciliao de
interesses favorecidos e reforados na produo do espao urbano pelo
agente pblico local em sua histrica consonncia com os interesses do
mercado imobilirio local.O objetivo aqui no reescrever a trajetria
da poltica habitacional a partir do exemplo das duas cidades,
porque outras pesquisas j se empenharam nesta tarefa. Dentre elas,
para o caso londrinense, vale mencionar as contribuies de Razente
(1984), Alves (1991), Martins (2007), Postali (2008), Beidack
(2009), Oliveira (2012) e, inclusive, em nossa dissertao de
mestrado (AMORIM, 2011), dedicamos um captulo ao assunto; e, para o
caso maringaense, as investigaes de Silva (2002), Rodrigues (2004)
e Silva e Silva (2013), dentre outras, dedicaram-se ou contriburam
indiretamente com a temtica, cujos recortes analticos
corresponderam a perodos e enfoques distintos da poltica
habitacional e da moradia nas cidades brasileiras nos ltimos
quarenta anos.O que pretendemos compreender o arranjo de foras
locais constitudo em funo da promoo pblica da habitao, sobretudo no
que concerne ao perodo atual, em que a atuao do PMCMV influencia o
rearranjo territorial do setor imobilirio no pas. Assim,
indagamo-nos a respeito das influncias desse programa junto s
construtoras, incorporadoras e imobilirias das cidades por ns
estudadas, e de como esto articulados poder pblico local, agentes
privados e poltica habitacional, e como resignificam a produo
imobiliria.O primeiro perodo desta trajetria teve sua gnese na
dcada de 1960, com a estruturao da poltica habitacional brasileira,
com a criao do atualmente extinto Banco Nacional da Habitao (BNH) e
do Sistema Financeiro de Habitao (SFH), que, sintetizado na escala
local, a partir da pesquisa de Razente (1984, p. 275), compreendeu
um processo de edificao de um novo padro de reproduo do capital
investido no setor imobilirio a partir de novas bases de acumulao e
de mudanas significativas nas estruturas produtivas regionais, alm
de mudanas estruturais e institucionais correlatas ao setor
imobilirio. Estas foram as caractersticas intrnsecas da dcada de
1970, comuns tanto Londrina como Maring, quando se imprimiu uma
nova configurao econmica e socioespacial s cidades. Marcadas pelo
aprofundamento da interveno estatal nas questes fundamentais
reproduo da fora de trabalho e s exigncias do padro de acumulao
capitalista, as dcadas de 1970 e 1980 resultaram, segundo Razente
(1984, p. 277): 1) na produo do espao pela promoo estatal da
habitao, voltado reproduo da fora de trabalho; 2) na produo do
espao urbano pela frao dos promotores imobilirios nas reas
perifricas da cidade; 3) na organizao do espao produtivo para a
reproduo do capital industrial; e 4) na articulao de todas estas
instncias, permeadas pela gesto do espao urbano como um todo,
atravs de sua normatizao/utilizao/ocupao.Desta maneira, o padro de
acumulao orientou a ao do poder pblico local a promover mudanas
estruturais na cidade, dentre elas, uma para o capital industrial
emergente na cidade. Estas mudanas resultaram em programas de
realocao espacial das zonas industriais, que deixaram as antigas
reas prximas ao centro, seja pelo fato da reestruturao espacial que
acometeu este setor, por polticas setoriais, ou pelo preo da terra
que, ento, tornou desinteressante a presena de reas industriais
prximas das residenciais, seja pela prpria proximidade em relao ao
centro comercial da cidade. No entanto, sob os auspcios da poltica
hegemnica e centralizadora do perodo, tal projeto viu-se limitado,
sobretudo na cidade de Londrina, quando a poltica habitacional do
perodo em questo centralizou e definiu os rumos da expanso da
cidade.Inversamente s prioridades locais de acumulao de capital, os
mecanismos operacionais do BNH relegaram ao segundo plano o projeto
industrializante para Londrina (RAZENTE, 1984, p. 299), enquanto em
Maring esses efeitos foram menos ressentidos, haja vista a forma de
insero das industriais e agroindstrias na cidade e a destinao de
espaos apropriados e planejados para estas instalaes. Contudo, a ao
governamental foi dirigida organizao do espao urbano, gerando um
aprofundamento das questes urbanas, havendo investimentos pblicos,
financiados pela fora de trabalho, que, no entanto, valorizaram
seletivamente as cidades e engendraram as possibilidades de
crescimento das empresas associadas construo civil e ao mercado
imobilirio, atribuindo-lhes um forte papel na economia local.Em
Londrina, a efetiva implementao da poltica habitacional se deu por
meio da homologao da Companhia de Habitao de Londrina
(COHAB-LD)[footnoteRef:2] junto ao BNH, em 1965, embora sua real
atuao teve incio somente a partir de 1970. Neste intervalo de seis
anos, a Companhia de Habitao do Paran (COHAPAR) atuou na construo
de moradias populares na cidade, juntamente aos Institutos de
Orientao s Cooperativas (INOCOOPs[footnoteRef:3]), em suma,
voltados populao de baixo poder aquisitivo (BEIDACK, 2009, p. 51 e
52). Isto se deve ao fato de que, de acordo com Martins (2007, p.
88), uma das exigncias para homologao das COHABs junto ao BNH, era
a de, todas elas, no caso do estado do Paran, estarem ligadas atuao
da COHAPAR (AMORIM, 2011, p. 101). [2: A COHAB-LD constitui-se numa
sociedade composta por aes de economia mista, cujo scio majoritrio
a Prefeitura Municipal de Londrina (PML), estando a ela vinculada
como entidade de administrao indireta.] [3: [...] Os INOCOOPs foram
criados em 1966 com objetivo de orientar as cooperativas operrias
em todas as operaes necessrias para a construo de conjuntos
habitacionais. Foram criados tambm para poupar despesas, acumular e
reproduzir o capital e legitimar o sistema. Poderia se candidatar a
uma casa prpria financiada pelo INOCOOP o trabalhador sindicalizado
e que pertencente a alguma associao (BEIDACK, 2009, p. 79, n.r.
32). Em, Londrina, o INOCOOP foi responsvel pela implantao de 14
conjuntos habitacionais, totalizando 3168 unidades, sendo o BNH seu
agente financiador. Sua atuao teve efetivo incio em 1972 e durou at
1996. Alm dos INOCOOPs, tambm o Instituto de Previdncia do Estado
do Paran (IPE - PR) financiou e construiu mais quatro conjuntos
habitacionais, totalizando 702 unidades entre 1978 e 1989 (FRESCA e
OLIVEIRA, 2005, p. 103).]
Durante a dcada de 1970 foram implantados em Londrina 32
conjuntos habitacionais, isto , 34,7% do total implantado nas trs
ltimas dcadas do sculo XX, totalizando 11.600 unidades, o que
correspondeu a 443.811,77 m2 de rea edificada. A maior parte destes
conjuntos foi construda na Zona Norte da cidade, em razo do menor
preo dos terrenos, embora noutras zonas tambm houve nmero
expressivo de unidades habitacionais. Na dcada de 1980, foram
implantados 40 conjuntos, representando 43,7% do total do perodo,
compreendendo 11.326 unidades. Embora o nmero de conjuntos
habitacionais tenha sido maior que na dcada anterior, a rea total
construda foi menor, correspondendo 417.210 m2. Na dcada de 1990,
foram construdos apenas 20 conjuntos, 21,7% do total, com 4.122
unidades, somando uma rea edificada de 173.809 m2 (FRESCA e
OLIVEIRA, 2005, p. 107).Com efeito, foi somente na dcada de 1970
que se efetivou a construo de conjuntos habitacionais em Londrina,
concentrando-se a entrega do maior nmero de unidades no fim da
dcada de 1970 e na primeira metade da de 1980 (Tabela 1).
Posteriormente caminhou-se rumo a uma fase de declnio,
endividamento da COHAB-LD, aumento das ocupaes irregulares, assim,
demandando diferentes formas de proviso habitacional pelo municpio
que, todavia, no fizeram frente problemtica habitacional (AMORIM,
2011, p. 105-106).
Tabela 1 - Londrina. Conjuntos habitacionais construdos at
2013.ANORGOS
COHAB-LDCOHABAN[footnoteRef:4]/INOCOOP [4: Cooperativa
Habitacional Bandeirantes (COHABAN).]
COHAPARIPE-PRTOTAL
CHs[footnoteRef:5] [5: Conjuntos Habitacionais.]
UnidadesCHsUnidadesCHsUnidadesCHsUnidadesCHsUnidades
At 1969----1228--1228
1969-19726576--267--8643
1973-197687732291----101.064
1977-19801810.3012928----2011.229
1981-1984147.3642349----167.713
1985-1988212.0962367--4702273.165
1989-19923616.4884666----407.154
1993-1996520214863573--91.261
1997110------110
1998----194--194
19991185--1441--2656
20001360--6160--7520
20012548--299--4647
2002----180--180
2003----------
20044711------4711
20053392------3392
20063212------5215
20073167------3167
20082308------2308
2009----------
2010[footnoteRef:6] [6: Convm observar que a partir de 2009 o
PMCMV comeou a atuar nessa cidade.]
21852185
201192.21792.217
201269386938
201359405940
Total15034.973133.087191.745470218640.507
Fonte: Londrina (2014, p. 52).
De acordo com anlise da Tabela 1, observa-se a concentrao da
construo de um maior volume de conjuntos habitacionais e de
unidades residenciais durante as dcadas de 1970 e 1980, sendo que,
durante a dcada de 1990 reduziu-se o nmero de conjuntos
habitacionais e, principalmente, o de unidades residenciais. Tambm
possvel constatar que a partir de 2003 a administrao da contratao e
construo dos conjuntos habitacionais permaneceu a cargo apenas da
COHAB-LD.J no caso maringaense, a construo habitacional passou a
ter impacto mais significativo a partir da dcada de 1980, pois,
durante as dcadas de 1960 e 1970 foram implantados 24 conjuntos
residenciais populares na cidade (MARING, 2010; SILVA, 2002, p.
105), enquanto que nas dcadas de 1980 e 1990 foram implantados
quarenta e trinta empreendimentos (Tabela 2), respectivamente,
concentrando-se entre os anos de 1985 e 1995. Silva (2002, p. 108)
destaca que houve uma intensa produo de conjuntos habitacionais
multifamiliares, isto , conjuntos de apartamentos constitudos por
no mnimo quatro blocos com no mnimo quatro andares por bloco,
compreendendo a maior parte dos empreendimentos residenciais
entregues na cidade, por todos os quadrantes do permetro
urbano.
Tabela 2 Maring. Conjuntos residenciais construdos at 2006.ORGO:
COHAPAR/COHESMA/COHAMAR
AnoConjuntos ResidenciaisUnidadesAnoConjuntos
ResidenciaisUnidades
196214119854918
1963--198681.148
1964--19874461
1965--19887915
1966--19891160
196715019905808
1968155199181.966
1969837019922219
1970--199351.367
1971--19941584
1972--199521.181
1973231619965215
197414801997--
1975250819981150
1976112819991150
1977261220001133
197821.5242001--
197931.5662002--
19802391200319
198134582004110
198222322005--
198333482006171
19845436Total9717.980
Fonte: Maring (2010, p. 147-149).
Segundo Silva (2002, p. 3), os conjuntos habitacionais
multifamiliares, como estratgia de soluo ao problema da habitao,
passam a adquirir maior importncia que a prpria expanso
habitacional unifamiliar (casas trreas), inclusive marcando de
forma substancial a paisagem urbana da cidade. Este autor (SILVA,
2002), atenta para o fato de que os conjuntos habitacionais
multifamiliares, por representarem um custo menor de produo,
puderam tambm usufruir de melhor localizao na cidade, diferente dos
conjuntos habitacionais unifamiliares que, geralmente,
localizavam-se nas reas perifricas da cidade, aproximadamente oito
ou dez quilmetros da rea central, nem sempre servidos de
equipamentos e infraestrutura. A produo sob essa forma veio ao
encontro dos interesses das construtoras e dos promotores
imobilirios em geral, que atuavam nesse mercado e que, de algum
modo, se beneficiavam do processo.No caso da produo dos conjuntos
habitacionais multifamiliares, os quais se destacaram na proviso
pblica da habitao em Maring, Silva (2002, p. 114) chama ateno ao
papel da Cooperativa Habitacional dos Empregados Sindicalizados de
Maring (COHESMA), fundada na dcada de 1960, que foi destinada a
atender segmentos econmicos de renda mdia, os quais nos primeiros
anos da atuao do BNH no foram privilegiados. As cooperativas
habitacionais formaram-se[...] basicamente por categorias de
profissionais liberais, funcionrios pblicos, trabalhadores
sindicalizados, entre outros, caracterizando-se por no possurem
fins lucrativos, formando-se uma espcie de condomnio,
dissolvendo-se logo aps a concretizao das obras (SILVA, 2002, p.
115).Elas atenderam a um pblico especfico, situado fora da faixa
atendida pelas COHABs, e foram as interlocutoras deste pblico junto
ao SFH e BNH, articulando construtoras e muturios ao financiamento
habitacional disponvel na esfera federal.O que queremos destacar o
papel das cooperativas nesse perodo no tocante a elaborao dos
projetos, reunio de muturios, localizao de terrenos aptos construo,
contratao das empresas construtoras locais e, por fim, montagem de
todo o aparato tcnico, legal e burocrtico para pleitear os recursos
federais junto ao agente financeiro, neste caso o BNH, que, quando
aprovados, iniciava-se a obra e, a partir do momento da entrega das
unidades, finalizava-se o processo com o repasse dos financiamentos
aos muturios finais (SILVA, 2002, p. 116). O papel das construtoras
locais foi central nesta forma de incorporao residencial, pois,
como afirma Silva (2002, p. 118), em entrevista obtida junto a um
ex-diretor da COHESMA:[...] todo o processo de construo era
repassado para as construtoras da regio, com a finalidade de alm de
construir mais facilmente, prestigiar as empresas do ramo de
construo civil da cidade, ao que era tambm prevista pelo prprio
BNH, na gerao de emprego e renda, como meta social. Nota-se que a
COHESMA pautou suas aes sempre priorizando as empresas construtoras
da regio; por isso, trabalhou-se muitas vezes com construtoras
menores, mas que cresceram junto com a cooperativa [...].A
influncia das construtoras fazia-se presente at mesmo na definio da
localizao e do tamanho dos empreendimentos, conforme Silva (2002,
p. 119), pois a cooperativa empregava expedientes do mercado
imobilirio local para estudar os aspectos da demanda, a localizao
apropriada e o padro construtivo, desempenhando, assim, importante
papel no desenvolvimento da produo imobiliria, da composio de
muitas empresas locais e na estruturao do espao residencial
maringaense.Em pesquisa de doutorado, concernente verticalizao na
cidade de Maring, Mendes (1992, p. 157-158) constata esta
proximidade e influncia entre a poltica habitacional e as empresas
locais construtoras, incorporadoras, imobilirias etc. ,
demonstrando como muitas empresas se constituram em funo da
construo de obras pblicas e conjuntos habitacionais populares, e de
como muitos coordenadores, consultores, diretores e presidentes da
municipalidade tornaram-se empresrios e influentes incorporadores
na cidade de Maring, sendo, ao mesmo tempo, agentes pblicos e
privados, alm de ocuparem cargos importantes nas associaes de
classe e nos sindicatos patronais.Em suma, estes apontamentos
genricos objetivam situar o fortalecimento dos agentes locais na
produo imobiliria, perpassando a poltica habitacional e a atuao dos
agentes privados favorecidos pelo poder pblico local em casos
especficos, alm de demonstrar como esse processo favoreceu o
crescimento de importantes empresas nas duas cidades. Descrever a
influncia histrica da poltica habitacional na estruturao da produo
imobiliria, e da poltica local, trazendo a anlise para o centro da
questo na atualidade, em que o PMCMV cria novas estruturas, ao
mesmo tempo em que mantm e refora outras, sem eliminar a escala
local, aqui nosso objetivo central, no para ficar somente nele, mas
para compreender como se estruturaram importantes empresas locais
em funo das polticas habitacionais mais importantes, que vo do BNH
ao PMCMV. Somente assim poder-se- constatar como e porque atua o
PMCMV em Londrina e Maring, observando suas distines, seu impacto
no estoque habitacional das cidades, e como participam e se
posicionam as empresas locais frente s grandes do setor imobilirio,
hoje bastante privilegiadas pelo programa.2. A produo habitacional
no contexto do PMCMV em Londrina e em MaringAntes de adentrarmos na
anlise dos dados referente atuao do PMCMV em Londrina e Maring,
apresentaremos um breve quadro explicativo desse programa. Trata-se
de um programa habitacional do Governo Federal, criado no ano de
2009, que visa incentivar a produo e a aquisio de novas unidades
habitacionais urbanas e rurais, para famlias com renda mensal de at
R$ 4.650,00. Estimula a produo de Habitao de Interesse Social (HIS)
pelo mercado privado formal, e por isso vai ao encontro dos
interesses privados do setor imobilirio no pas. De acordo com
Maricato e Leito (2010, p. 118):O Programa Minha Casa Minha Vida
(MCMV) parece ter sido uma aposta do governo no mercado, depois da
dificuldade do PAC (Programa de Acelerao do Crescimento) em decolar
nos municpios, por conta de toda a burocracia lenta de aprovao. O
MCMV foi desenhado com 11 grandes empresas e o governo federal,
ento o programa se traduziu no plano de sonhos do mercado.A
implementao efetiva do PMCMV, malgrado a estrutura da Poltica
Nacional de Habitao (PNH) (Figura 1), da aprovao do Estatuto da
Cidade em 2001, da criao do Ministrio das Cidades em 2003,
conjuntamente a alterao da Lei 11.124 referente ao Sistema Nacional
de Habitao (SNH) em 2005 por recomendao do Conselho das Cidades,
subdividido em Sistema Nacional de Habitao de Interesse Social
(SNHIS), voltado faixa de renda entre zero e cinco salrios mnimos,
e em Sistema Nacional de Habitao de Mercado (SHM)[footnoteRef:7],
direcionado s classes de renda de cinco a dez salrios , vem
demonstrando na prtica o descolamento da poltica habitacional em
relao aos avanos institucionais e legais de longa data relativos
funo social da cidade e da propriedade urbana, presente em
instrumentos tais como as Zonas Especiais de Interesse Social
(ZEIS) dentre outros, prprios da gesto social da valorizao da
terra. [7: Para uma leitura a respeito da estruturao do PNH, SNH e
SNHIS, em suas perspectivas, avanos, limitaes, impasses e estudos
de caso, sugerimos Denaldi (2012), Denaldi, Leito, Akaishi (2011) e
Denaldi (2013).]
A seguir, a Figura 1 demonstra a organizao institucional da
Poltica Nacional de Habitao e do Sistema Nacional de Habitao. Este
ltimo est subdividido em Sistema Nacional de Habitao de Interesse
Social e Sistema Nacional de Habitao de Mercado, os quais operam
com fundos e recursos diferentes no tocante s fontes de captao e
repasses oramentrios.
Figura 1: Organizao da Poltica Nacional de Habitao, de 2004.
Fonte: Ministrio das Cidades (2013, p. 15).
O PMCMV est subdividido em subprogramas e modalidades de acordo
com as faixas de renda dos beneficirios, dos grupos prioritrios, do
agente operador, e do porte do municpio. Opera com importantes
fundos e recursos pblicos nacionais, tais como o Fundo de Garantia
do Tempo de Servio (FGTS), Fundo de Arrendamento Residencial (FAR),
recursos do Oramento Geral da Unio (OGU), recursos do Fundo de
Desenvolvimento Social (FDS), apesar de concentrar-se na utilizao
do FGTS e do FAR, j que as principais modalidades implementadas so
carreadas por estas fontes (BRASIL, 2009)[footnoteRef:8]. [8:
Institudo pela Lei Federal N 11.977, de julho de 2009 (BRASIL,
2009).]
Dentre as modalidades, as subdivises inerentes provenincia dos
fundos e recursos, agentes operantes, os tetos mximos dos
financiamentos diferenciados pelo porte dos municpios e outras
especificidades, o PMCV tambm est, inicialmente, subdivido por
faixas de renda, sendo trs as faixas salariais, que vo de zero a
trs salrios mnimos, na faixa um; de mais de trs a cinco salrios, na
faixa dois; e de seis at dez salrios mnimos, na faixa trs. Na faixa
um concentra-se a maior porcentagem do dficit habitacional no
pas.Analisando-se os dados referentes aos empreendimentos
construdos e em fase de construo do PMCMV na cidade de Londrina e
de Maring em 2012, observamos que, para Londrina, de um nmero total
de 7.348 unidades habitacionais, 3.773 (51,34%) encontram-se na
faixa um, 2.842 (38,67%) na faixa dois, e 733 (9,97%) na faixa trs.
J em Maring, de um nmero total de 2.963 unidades habitacionais, 847
(28,58%) encontram-se na faixa um[footnoteRef:9], 1.619 (54,64%) na
faixa dois, e 497 (16,77%) na faixa trs. Percebe-se uma diferena
entre Londrina e Maring, enquanto na primeira concentra-se a atuao
do programa na faixa um, e na segunda na faixa dois. [9: importante
destacar que desse nmero total, 416 unidades esto localizadas nos
distritos Iguatemi e Floriano.]
Com relao s empresas proponentes, observa-se que, em Maring, de
um nmero total de 27 empreendimentos, em 13 (48,14%) deles so
proponentes as empresas locais, os outros 14 esto sendo construdos
por empresas de fora, sendo elas majoritariamente a MRV, da cidade
de Belo Horizonte/MG, e a Sial Construes, sediada em Curitiba/PR. J
em Londrina, as empresas locais so as responsveis pelo maior nmero
dos empreendimentos. De um nmero total de 42 empreendimentos, 25
(59,52%) deles foram ou esto sendo construdos por empresas da
cidade, enquanto os outros 17 subdividem-se entre a MRV, a Sial, e
a Terra Nova Rodobens, que de So Jos do Rio Preto/SP.O valor total
das operaes contratadas at dezembro de 2012 foi de R$
185.611.491,14, no caso da cidade de Maring. J em Londrina, esse
montante atingiu R$ 358.340.247,00, portanto 48,20% a mais que o
valor total contratado em Maring. Nas Tabelas 3 e 4 discriminamos
esses montantes por empresas, identificando o valor total das
operaes contratadas, a quantidade de obras sob a responsabilidade
de cada uma e seu local de origem.
Tabela 3 Maring. Obras contratadas por cada empresa no mbito do
PMCMV. 2012EmpresasObras sob-responsabilidadeValor das operaes
contratadas (R$)Local de origem da empresa
Hiten Ltda EPP12.241.176,13Maring
Joo Granado Const. e Imob. Ltda12.400.000,00Maring
Const. Errerias Ltda13.700.000,00Paiandu
MB7 Engenharia e Const. Civil Ltda14.774.500,00Maring
Brassul Construes Civis15.129.285,95Maring
Washi Emp19.551.700,00Maring
Provectum Eng. e Empreendimentos Ldta212.676.632,95Maring
CCII Colombo Const. e Incorp. de Imveis216.301.864,09Maring
CCP Engenharia de Obras Ltda323.159.042,28Maring
Sial Construes Civis Ltda429.772.400,00Curitiba
MRV Engenharia e Participaes S.A.1075.904.889,74Belo
Horizonte
Fonte: organizao prpria. Base de dados: Everaldo S. Melazzo -
MCTI/CNPq/MCidades, N 11/2012.
Tabela 4 Londrina. Obras contratadas por cada empresa no mbito
do PMCMV. 2012EmpresasObras sob-responsabilidadeValor das operaes
contratadas (R$)Local de origem da empresa
FETAEP*1249.600,00Londrina
Laff Construtora Ltda13.200.000,00Curitiba
Const. Almanary14.800.000,00Londrina
Bonora&Costa Const. e Incorp. Ltda721.361.529,88Londrina
Sial Construes Civis Ltda324.058.879,05Curitiba
Terra Nova Rodobens/Maraj Incorporadora e Imob.
Londrinense335.971.686,91So Jos do Rio Preto/Londrina
Protenge Engenharia340.059.656,57Londrina
Yticon Construo e Incorporao540.400.000,00Londrina
Artenge Construes Civis Ltda442.412.128,68Londrina
Terra Nova Eng. Ltda443.196.330,25Londrina
MRV Engenharia e Participaes S.A.10102.630.435,66Belo
Horizonte
*Federao dos Trabalhadores na Agricultura do Estado Paran. Obra
realizada no Distrito de Lerroville.Fonte: organizao prpria. Base
de dados: Everaldo S. Melazzo - MCTI/CNPq/MCidades, N 11/2012.
No que concerne tipologia dos empreendimentos, em Londrina, 26
deles so empreendimentos verticais, e 16 horizontais. Atinente sua
localizao, realizamos o mapeamento, diferenciando-os pelas trs
faixas citadas anteriormente, e neste aspecto residem
especificidades centrais nossa pesquisa, que dizem respeito ao
papel que a terra urbana ocupa no processo, e a anlise dos Mapas 2
e 3 possibilita essa interpretao.Apesar de na cidade de Londrina
existir um maior nmero de empreendimentos na faixa um do programa,
a localizao deles extremamente perifrica, do que decorrem agravos
de problemas correlatos segregao socioespacial, alm da disperso
territorial que reforam. Outro aspecto que merece destaque o fato
da maior parte dessas unidades habitacionais encontrarem-se num
nico empreendimento, o Residencial Vista Bela (Figura 2), situado a
noroeste no Mapa 2, que sozinho concentra 2.712 (36,90%) unidades
habitacionais, entre casas trreas e apartamentos. As construtoras
responsveis por este empreendimento so todas da cidade de Londrina,
sendo elas: a Artenge, a Terra Nova Engenharia e a Protenge
Engenharia.A atuao do PMCMV na cidade de Londrina demonstra uma
continuidade espacial com relao s inseres perifricas dos conjuntos
habitacionais propostos no perodo do BNH, sobretudo daqueles da
faixa um e da faixa dois, o que decorre da inobservncia da
problemtica socioespacial resultante, e da limitada implementao dos
instrumentos da poltica urbana na escala local.
Mapa 2 - Londrina. Localizao dos empreendimentos do PMCMV.
2012.
Fonte: Base cartogrfica: Tws (2010); dados do PMCMV: Everaldo S.
Melazzo.
Figura 2 - Londrina. Residencial Vista Bela (vista parcial).
2013.
Fonte: Wagner Vinicius Amorim. Arquivo pessoal.
Em Maring (Mapa 3), constata-se uma insero perifrica na malha
urbana, seja para os empreendimentos da faixa um ou da faixa dois,
o que diretamente reflete o alto preo da terra urbana, j que a
cidade teve o maior ndice de valorizao imobiliria registrado em
2010 entre as cidades paranaenses com mais de 300 mil habitantes
(SILVA, SILVA, 2013, p. 286). Silva e Silva (2013, p. 286) afirmam
que: [...] at abril de 2011, segundo a secretaria de habitao do
municpio, as moradias aprovadas do PMCMV iriam atender 13% do
dficit. O restante tem atendido a faixa de renda mais interessante
para o capital imobilirio. Silva e Silva (2013, p. 286) ainda
observam que, em Maring, [...] assiste-se, como em outras regies do
pas onde o PMCMV tem atuado, ao enfraquecimento do setor pblico
como promotor e o fortalecimento da proviso privada, tanto no
direcionamento dos produtos ofertados como na definio de
tipologias, custo, localizao e pblico alvo, os quais tem pouca ou
nenhuma correlao com os planos diretores e de habitao elaborados
nos ltimos anos (SILVA, SILVA, 2013, p. 285).O Mapa 3 coloca em
evidncia a localizao relativamente perifrica dos empreendimentos no
apenas da faixa um, mas tambm das demais faixas no contexto da
cidade de Maring, dos quais trs empreendimentos da faixa um foram
inseridos fora da cidade, nos distritos de Iguatemi e Floriano. H
uma descontinuidade com relao localizao dos conjuntos habitacionais
das dcadas de 1970 e 1980, muitos dos quais se encontram no
quadrante nordeste da cidade.
Mapa 3 - Maring. Localizao dos empreendimentos do PMCMV.
2012.
Fonte: Base cartogrfica: Tws (2010); dados do PMCMV: Everaldo S.
Melazzo.
Dos 27 empreendimentos construdos e/ou aprovados na cidade at
2012, 21 so empreendimentos verticais e apenas seis so
loteamentos[footnoteRef:10]. A preferncia por empreendimentos
verticais (apartamentos) demonstra o encarecimento dos custos com a
terra urbana, a ampliao da produo em escala e, quando localizados
em reas perifricas, incorrem nos problemas de insero territorial,
tal como a mobilidade urbana reduzida, o aumento dos custos com
disponibilizao de infraestrutura, servios e equipamentos pblicos em
geral. [10: Sendo que trs deles localizam-se nos distritos.]
A seguir, a Figura 3 apresenta uma vista parcial de um dos
empreendimentos residenciais perifricos da cidade de Maring, o
Residencial Dolores Duran I e II, loteamento situado na faixa dois
do programa, localizado no extremo sudeste da cidade. Possui um
nmero total de 148 unidades habitacionais, cada qual com tamanho de
43,75 m2, construdas pela Sial Construes Civis, de Curitiba/PR.
Figura 3 - Maring. Residencial Dolores Duran (em fase de
construo). 2011.
Fonte: http://www.panoramio.com/photo/67100738. Acessado em 13
de setembro de 2013.
A Tabela 5, a seguir, apresenta uma sinopse comparativa dos
nmeros do PMCMV nas duas cidades. A partir da anlise dessa tabela
constatamos que em Londrina foi construdo mais que o dobro da
quantidade de unidades habitacionais construdas na cidade de
Maring. Enquanto em Londrina mais da metade das unidades esto
situadas dentro da faixa um do PMCMV, em Maring na faixa dois em
que est situada mais da metade das unidades, embora nessa cidade,
69,68% do dficit esteja concentrado na faixa um, de zero a trs
salrios mnimos (Ministrio das Cidades, 2010). H uma predominncia
dos empreendimentos verticais nas duas cidades, o que demonstra uma
tendncia no setor, em funo de vrios fatores, sendo eles: minorar o
custo representado pela terra, aumentar os ganhos em produtividade,
minimizar custos com equipamentos pblicos uma vez que os mesmos j
existem no entorno dos empreendimentos etc. Em Londrina o maior
percentual de empreendimentos est localizado na Zona Norte da
cidade. J Maring, por sua vez, apresenta uma melhor distribuio
entre suas zonas, embora a Zona Leste aparea com o maior
percentual. Enquanto em Londrina a maior parte das operaes foi
contratada ainda na Fase 1 do programa, em Maring houve maior
contratao j na Fase 2.
Tabela 5 - Sinopse comparativa dos nmeros do PMCMV nas cidades
de Londrina e Maring. 2012.LondrinaMaring
Valor absolutoEm %Valor absolutoEm %
N de empreendimentos4210027100,00
N de unidades habitacionais7.3481002.963100,00
Faixa um3.77351,3484728,58
Faixa dois2.84238,671.61954,64
Faixa trs7339,9749716,77
Empreendimentos verticais2661,92177,70
Empreendimentos horizontais1638,09622,30
Zona Centro (empreendimentos)12,38311,11
Zona Leste (empreendimentos)614,28725,92
Zona Norte (empreendimentos)1945,23518,51
Zona Oeste (empreendimentos)511,9414,81
Zona Sul (empreendimentos)919,04518,51
Distritos (empreendimentos)24,76311,11
Fase 1 (empreendimentos)2764,281348,14
Fase 2 (empreendimentos)1535,711451,85
Fase 1 (unidades habitacionais)4.74264,531.41247,65
Fase 2 (unidades habitacionais)2.60635,461.55152,34
Dficit Habitacional Total em 201014.02810.587
Fonte: organizao prpria. Base de dados: Everaldo S. Melazzo -
MCTI/CNPq/MCidades, N 11/2012.
guisa de concluso desse trabalho, destacamos que o planejamento
urbano, a legislao municipal e a propriedade da terra, so centrais
na definio da localizao dos empreendimentos e da gravao das reas de
Habitao de Interesse Social nas cidades, da qual emana toda a sorte
de divergncias ou convergncias com relao construo de polticas de
contedo social e includente. Ainda, alguns casos especficos e
notrios, tal como o caso do Residencial Vista Bela em Londrina,
dentre outros, concernentes Habitao de Interesse Social (faixa um),
merecem anlises mais detalhadas, que problematizem a questo da
habitao/moradia em seus mltiplos contextos, que vo do poltico, ao
social, ao econmico, escala do cotidiano e morfologia urbana.
3. Consideraes finaisNestas consideraes procuraremos explorar de
modo sinttico os impactos resultantes da forma como tm sido
implantados alguns empreendimentos e dos expedientes do PMCMV nas
duas cidades, voltando nossa ateno Habitao de Interesse
Social.Apesar de na cidade de Londrina existir um maior nmero de
empreendimentos na faixa um, a localizao deles extremamente
perifrica, do que decorrem agravos de problemas correlatos segregao
socioespacial e disperso territorial acentuada, e um deles chama
ateno, o Residencial Vista Bela, construdo no extremo noroeste da
cidade. O Residencial Vista Bela, concludo em 2011, foi, na poca, o
maior canteiro de obras do PMCMV no pas, possuindo 2.712 unidades
habitacionais, entre casas e apartamentos. Agora ele enseja uma
srie de velhas e novas problemticas relativas segregao
socioespacial, tais como: precrio acesso aos equipamentos e servios
pblicos e meios de consumo coletivos, cujo planejamento inadequado
j resulta na necessidade de medidas curativas e de interveno pblica
a fim de que os moradores tenham seus direitos mais bsicos e
constitucionais atendidos.Em Maring, de acordo com a sociloga Ana
Lcia Rodrigues, os pressupostos de uma cidade cuja vocao histrica
est na segregao[footnoteRef:11] (LINJARDI, 2010), refora a
necessidade de se compreender a fora com que a produo e a valorizao
imobiliria condicionam o planejamento da poltica habitacional de
interesse social, obrigando-a a inserir-se de modo cativo aos
ditames do mercado imobilirio local e, apesar da aprovao das
inmeras emendas municipais relativas s ZEIS, os empreendimentos so
implantados em reas totalmente dispersas, como consequncia do alto
preo da terra. Alm disso, as tipologias habitacionais verticais
produzidas em escala, segundo a ingerncia e o fortalecimento da
proviso privada na localizao e definio dos produtos ofertados,
incorrem nos conhecidos problemas de insero territorial dispersa,
tal como a mobilidade urbana reduzida, aumento dos custos com
disponibilizao de infraestrutura, servios e equipamentos pblicos em
geral, enfim, problemas tributrios e fomentadores da condio
socioespacial. [11: Ver: Valor dos terrenos inibe Minha Casa Minha
Vida. Disponvel em O Dirio do Norte do Paran, de 26 de janeiro de
2010:
http://maringa.odiario.com/imoveis/noticia/234743/valor-dos-terrenos-inibe-039minha-casa-minha-vida039/.
Acessado em 15 de jan. de 2015.]
Outro problema que revive o desencontro da poltica habitacional
com a realidade local decorre de que muitos empreendimentos da
faixa um, que compreende a Habitao de Interesse Social, comearam a
ser construdos, em Maring e em Londrina, to logo da aprovao e
contratao junto ao PMCMV, no entanto, sem a existncia de um Plano
Local de Habitao de Interesse Social (PLHIS), resultando em decises
no pactuadas participativa e coletivamente luz do diagnstico e das
recomendaes dos PLHIS, que somente ficaram prontos entre 2010 e
2011. Em Maring, entre os anos de 2009 e 2012, dentre as seis
contrataes dentro da faixa um, quatro foram assinadas em 2010, e
somente duas em 2012, ou seja, aps o efetivo diagnstico do PLHIS,
que ficou pronto em dezembro de 2010. J em Londrina, das 21
contrataes na faixa um, 13 foram assinadas em 2009, seis em 2010, e
apenas duas em 2012, aps a elaborao e aprovao do PLHIS, concludo em
2011.Aqui vale mencionar que a conjuntura da elaborao dos PLHIS no
pas todo foi marcada pela proeminncia do PMCMV, cuja adeso pelos
municpios se deu antes da elaborao e dos diagnsticos dos PLHIS. Se
por um lado, a atuao massiva do PMCMV to logo nos seus primeiros
anos de existncia evidencia a preocupao da agenda governamental com
os nmeros do programa, por outro, a morosidade na elaborao dos
PLHIS chama ateno aos interesses econmicos e polticos locais, e
menos com o planejamento participativo para a tomada de decises
referente ao desenho e implementao local do SNHIS.Apenas o PLHIS
por si s no significa necessariamente a garantia da alocao equnime,
pactuada, eficiente, transparente e democrtica dos recursos
destinados HIS, porm ele diagnostica a situao habitacional local e
recomenda os instrumentos e recursos destinados a tal fim. Por
exemplo, indicando ao plano diretor local a gravao, na zona urbana,
de reas aptas ao interesse social (como o caso das ZEIS), dentre
outros instrumentos redistributivos e de gesto social da valorizao
da terra. Mas este fulcro s possvel pelas vias de sua construo
processual, participativa, monitorada e contnua.Malgrado as
experincias histricas acumuladas nas duas cidades e no pas, o
PMCMV, em seu formato atual, consiste ainda num desafio prpria
construo escalar de uma eficiente e genuna poltica habitacional de
interesse social. A emergncia e urgncia com que se coloca a poltica
habitacional, sobretudo em sua face voltada Habitao de Interesse
Social, denuncia sua apropriao pelo mercado, cujos agentes,
cenrios, estruturas e instituies substantivam a mercantilizao da
habitao ao construir o discurso do planejamento em defesa da cidade
pelas vias do mercado, silenciando e omitindo as contradies e a
dissonncia das vozes excludas do direito cidade e do exerccio da
cidadania e da participao.Assim, reiterou-se, mais uma vez na
histria da habitao social no Brasil, a pouca importncia atribuda ao
planejamento das aes com base em diagnsticos rigorosos da situao
local, cujas recomendaes ensejariam o desenvolvimento de aes
planejadas e socialmente pactuadas, evitando prejuzos e problemas
no dimensionados adequadamente, como, por exemplo, j se pode
constatar em alguns conjuntos habitacionais construdos recentemente
em Maring e em Londrina, a comear pelos de grandes dimenses.A
poltica habitacional, em seu atual padro hegemnico, organizao
institucional e em seu processo de implementao local, engendra e
exprime ao mesmo tempo em que degenera as possibilidades escalares
de uma participao cidad e efetiva. A anlise abrangente e
aprofundada do papel do poder pblico e dos agentes locais, no
tocante elaborao dos planos locais nas duas cidades, bem como da
implementao efetiva do PMCMV, suscitam e revivem velhos e
conhecidos processos, dinmicas e problemticas, j muito comuns
realidade urbana brasileira das ltimas dcadas e, em nosso ver,
reinsere o rol das cidades mdias como pauta analtica e poltica que
reclama mais ateno.
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