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Rodolfo A. M. Ambiel Ivan Sant’Ana Rabelo Sílvia Verônica Pacanaro Gisele Aparecida da Silva Alves Irene F. Almeida de Sá Leme (Orgs.) A v a lia ção  Psicológica Guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia Casa do Psicólogo*
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Ambiel, R. a. M. e Col. (2011). Avaliação Psicológica - Guia de Consulta Para Estudantes e Profissioanis de Psicologia

Oct 10, 2015

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  • Rodolfo A. M. Ambiel Ivan SantAna Rabelo

    Slvia Vernica Pacanaro Gisele Aparecida da Silva Alves

    Irene F. Almeida de S Leme (Orgs.)

    Avaliao PsicolgicaGuia de consulta para estudantes e

    profissionais de psicologia

    Casa do Psiclogo*

  • Avaliao Psicolgicaguia de consulta para estudantes

    e profissionais de psicologia

    Rodolfo A. M. Ambiel Ivan Sant'Ana Rabelo

    Slvia Vernica Pacanaro Gisele Aparecida da Silva Alves

    Irene F. Almeida de S Leme (Orgs.)

    Casa do Psiclogo So Paulo

    2011

    m%

    Casa do Psiclogo

  • 2011 Casapsi Livraria e Editora Ltda* proibida a reproduo total ou parcial desta publicao, para qualquer finalidade,

    sem autorizao por escrito dos editores.

    Ia Edio2011

    EditoresIngo Bernd Giintert e Ju liana de VillemorA. Gnlert

    Reviso TcnicaRodolfo A. M. Ambiel, Ivart San tAna Rabelo, Slvia Vernica Pacanaro,

    Gisele Aparecida da Silva Alves e Irene F. Almeida de S Leme

    PreparaoTssia Fernanda Alvarenga de Carvalho

    CapaM arina Takeda

    Projeto Grfico e Editorao Eletrnica* Fabio Alves Melo

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Avaliao psicolgica : guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia /'Rodolfo A. M. Ambiel...[et ai.| . So Paulo :Casa do Psiclogo, 2011.

    Outros organizadores: Ivan SantAna Rabelo, Slvia Vernica Pacanaro, Gisele Aparecida da Silva Alves, Irene F. Almeida de S Leme.

    Bibliografia.ISBN 978-85-8040-071 -7

    1. Avaliao psicolgica 2. Psicometria 3. Testes psicolgicos I. Ambiel, Rodolfo A. M. II. Rabelo, Ivan SantAna. III. Pacanaro, Slvia Vernica. IV. Alves, Gisele Aparecida da Silva. V. Leme, Irene F. Almeida de S.

    11-04584_____________________________________________ CDD-150.287

    ndices para catlogo sistemtico:1. Avaliao psicolgica 150.287

    Impresso no Brasil

    Reservados todos os direitos de publicao em lngua portuguesa

    Casapsi Livraria e Editora Ltda.Rua Santo Antnio, 1010 Jardim Mcxico CEP 13253-400

    S Itatiba/SP - BrasilTel. Fax: (11) 4524-6997 wwvv.casadopsieologo.com.br

  • Sumrio

    Prefcio pg. | 7

    Captulo 1 pg. | 11Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    Rodolfo A. M. Ambiel

    Silvia Vernica Pacanaro

    Captulo 2 pg. | 29Panorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011avia Vernica Pacanaro

    iisele Aparecida da Silva Alves I ' in Sant'Ana Rabelo

    in-ne F. Almeida de S Leme i: Molfo A. M. Ambiel

    Captulo 3 pg. | 49"E viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica! 'iolfoA. M. Ambiel mberg M ouia de Andrade

    ' .is de Francisco Carvalho

    f -nte Cassepp-Borges

    Captulo 4 pg. | 81l

  • Captulo 5 pg. | 109Validade e preciso de testes psicolgicos Gisele Aparecida da Silva Alves

    Mayra Silva de Souza

    Makilim Nunes Baptista

    Captulo 6 pg. | 129Padronizao e normatizao de testes psicolgicos: simplificando conceitos Ivan Sant'Ana Rabelo Leila Brito

    Mareia Gabriel da Mlva Rego

    Captulo 7 pg. | 163A tica no uso de testes no processo de Avaliao Psicolgica Maria Cristina Barros Maciel Pellini

    Irene F. Almeida de S Leme

    Sobre os autores pg. | 181

  • Prefcio

    O avano cientfico nas diferentes reas do saber pressupe avaliao, exigindo esta avaliao instrumentos apropriados para o efeito. A rplica da investigao em diferentes pases e em amostras alargadas pressupe instrumentos geis, precisos e vlidos. Neste sentido, em qualquer rea cientfica, funda' mental o esforo dos pesquisadores na construo e validao de novos instrumentos de medida. N a Psicologia, enquanto cincia e profisso com responsabilidades sociais, esta avaliao assume papel relevante na tomada de decises e, como tal, requer instrumentos de avaliao cientificamente aprovados. Em boa medida a qualidade da pesquisa e da prtica em psicologia, em ambos os casos sempre dependente da qualidade da informao ou dos resul- tados que so recolhidos, encontra-se muito associada prpria atualidade, qualidade, confiana e valor dos instrumentos usados. Assim, apesar das crticas relativamente freqentes e universais, algumas vezes justas, e outras vezes injustas, demasiadas vezes incompreensivelmente oriundas do seio da prpria psicologia, a consolidao da psicologia em termos de investigao e de exerccio profissional acompanha a emergncia e o fortalecimento do movimento e histria dos testes psicolgicos. No se podendo divinizar os testes, ou lhes dar um estatuto de exclusividade na avaliao psicolgica - at porque no precisam de tal estatuto -, os testes psicolgicos tiveram e continuam a ter um papel importante no reconhecimento cientfico e social da psicologia.

    Um dos problemas na psicologia, como nas demais reas, que ningum sem slida formao consegue realizar de forma

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    apropriada algo de tecnicamente complexo. Por muita psicologia que o psiclogo possa saber, isso no lhe garante por si s a competncia no uso dos testes psicolgicos. A psicometria como domnio de formao acadmica e profissional fundamental ao uso dos testes psicolgicos. Algumas das crticas ao mtodo dos testes decorrem da pouca formao por parte dos profissionais e dos prprios crticos. Em qualquer cincia e ramo de atividade, um instrumento apenas instrumento, e a qualidade de seu uso depende intensamente da sabedoria ou do grau de competncia do utilizador. Porque havemos de exigir dos testes psicolgicos aquilo que eles no podem dar? fundamental termos bons testes, contudo tambm verdade que um bom teste apenas se rentabiliza nas mos de um psiclogo competente!

    Uma primeira competncia por parte do psiclogo saber quando deve e quando no deve usar um determinado teste psicolgico. Esta competncia exige conhecer muito bem o teste e conhecer bem o contexto particular em que ele vai ser usado. O uso dos testes psicolgicos, por estas razes, exige muito dos psiclogos do ponto de vista tcnico e tico, sendo importante que associaes cientficas e profissionais da psicologia regulem essa utilizao. S com boa formao acadmica e prtica vai o psiclogo reunindo as competncias necessrias realizao de boa avaliao, recorrendo, entre outros meios, aos testes psicolgicos. Por tudo isto, importa destacar a edio deste livro, entendido como um manual atual na rea da psicometria nas mos de alunos, profissionais e acadmicos de psicologia. Para alm dos acadmicos que pesquisam em psicometria ou que conduzem estudos de validao de provas psicolgicas, este manual serve tambm aos alunos e aos utilizadores dos testes psicolgicos em geral. Tambm estes precisam conhecer

  • Prefcio

    os procedimentos bsicos de estatstica utilizados na construo e validao dos instrumentos. Neste livro, tais procedimentos aparecem devidamente enquadrados e justificados pelos conceitos psicomtricos de preciso, validade e normas, complementando metodologias clssicas e atuais (teoria da resposta ao item, por exemplo) de sua estimao. Da mesma forma, na organizao des- te livro atentou-se s consideraes ticas na avaliao psicolgica. Incluindo-se a avaliao psicolgica nos atos psicolgicos, seja na investigao, seja no exerccio profissional, importa acautelar-se sobre os limites dos instrumentos e da prpria avaliao, assim como saber acautelar os direitos dos indivduos e instituies envolvidos na avaliao.

    Pelas ligaes pessoais psicologia e aos psiclogos brasileiros, em particular tendo a avaliao psicolgica como um dos motivos dessa aproximao, afirmo o enorme prazer em prefaciar este manual. Felicito os seus autores pela clareza e pelas preocupaes pedaggicas colocadas na redao de seus captulos. Precisamos destes manuais para que alunos, profissionais e acadmicos ultrapassem as resistncias freqentes ao estudo aprofundado da psicome trial

    Leandro S. Almeida1

    1 Professor Catedrtico da Universidade do M inho. Doutorou-se em Psicologia pela U niver

    sidade do Porto, em 1987, tendo estagiado na U niversidade de Yale, Estados Unidos, e na Universidade C atlica de Lovaina, Blgica, durante a preparao do doutoram ento. Leciona

    e pesquisa sobre inteligncia, cognio e aprendizagem, incluindo a construo e validao de provas psicolgicas, sendo que algum as dessas provas so estudadas e esto validadas no

    Brasil. Entre estas destaca-se a Bateria de Provas de Raciocnio (BPR5), em coautoria com Ricardo Primi, editada pela C asa do Psiclogo.

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  • Captulo 1Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    Rodolfo A. M. Ambiel

    Slvia Vernica Pacanaro

    A palavra teste, tal como usada em portugus, originou-se do termo em latim testis, que significa testemunha, e, posteriormente, do ingls test, com o sentido de prova. Portanto, etimologica- mente, realizar um teste realizar uma prova e dar testemunho de alguma coisa. Nesse sentido, quando se trata de testes psicol' gicos, seu principal uso como ferramenta na tomada de decises que envolvem pessoas, a partir do desempenho ou do autorrelato em provas, questionrios ou escalas que avaliem caractersticas psicolgicas. Embora o surgimento dos testes psicolgicos tenha sido registrado no incio do sculo XX, muito antes disso j se fazia verificao e levantamento de caractersticas e habilidades

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    das pessoas, em diversas culturas e em diversos contextos, principalmente em situaes relacionadas a selecionar candidatos para algumas funes especficas (Urbina, 2007).

    Considerando a longa histria dos testes, suas contribuies para o desenvolvimento cientfico e da prtica profissional na psicologia, o presente captulo pretende fazer uma reviso histrica sobre as origens e as aplicaes da testagcm, destacando sua importncia no processo de reconhecimento da profisso. Em seguida, sero realizadas algumas reflexes sobre a testagem e a avaliao psicolgica especificamente no contexto brasileiro.

    As origens da testagem psicolgica

    H registros de que os procedimentos de avaliao variaram muito ao longo da histria, com influncias das crenas, das filosofias e das posies polticas prprias de cada poca e regio, desde o perodo neoltico, datando de 12.000 a.C., passando pelas culturas egpcias e sumria (10.000 a.C.) at os dias atuais (Barclay, 1991; Van Kolck, 1981; Urbina, 2007). Por exemplo, em 200 a.C., na China, eram realizados concursos pblicos, e as provas para seleo envolviam demonstraes de proficincia em msica, uso do arco, habilidades de montaria, exames escritos sobre temas relacionados a leis, agricultura e geografia (Urbina, 2007). Especificamente sobre a testagem psicolgica, os antecedentes da utilizao de procedimentos de avaliao clnica recaem principalmente sobre a psiquiatria, com estudos na Alemanha e na Frana no incio do sculo XIX, com foco no desenvolvimento de provas para avaliar o nvel do funcionamento cognitivo de pessoas com danos cerebrais e com outros transtornos (McReynolds, 1986).

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    Do ponto de vista do desenvolvimento cientfico, os testes tiveram grande importncia para a psicologia. Em meados do sculo XIX, os psicofsicos alemes Weber e Fechner deram os primeiros passos em direo ao reconhecimento da psicologia como disciplina cientfica, cujo grande precursor foi Wilhelm Wundt, com a criao do primeiro laboratrio dedicado pesquisa psicolgica, em Leipzig, na Alemanha. Com o crescimento deste e de outros laboratrios no final do sculo XIX, a psicologia desenvolveu-se cientificamente de forma acelerada, e sua expanso ocorreu com o treinamento de vrios pesquisadores de outros pases europeus e dos Estados Unidos. Dentre os pesquisadores, estava Francis Galton, que se interessou pela mensurao das funes psicolgicas, organizando um laboratrio antropomtrico em Londres, com o objetivo de coletar dados sobre caractersticas fsicas e psicolgicas das pessoas. A contribuio de Galton para a rea da testagem ocorreu de algumas formas, tais como a criao de testes para medida de discriminao sensorial (barras para medir a percepo de comprimento); apito para percepo de altura do tom; criao de escalas de atitudes (escala de pontos, questionrios e associao livre) e o desenvolvimento e a simplificao de mtodos estatsticos (Anastasi, 1977).

    No mesmo sentido, o psiclogo americano James M. Cattell, influenciado por Galton, acreditava que a chave para a compreenso do funcionamento da mente estava nos processos elementares, e, em seus estudos, deu nfase nas medidas sensoriais. Cattell elaborou uma bateria com testes que investigava reas relacionadas acuidade sensorial, ao tempo de reao, bisseo visual de linha e aos julgamentos sobre a durao de intervalos curtos de tempo, e, tambm, era aplicada em estudantes universitrios com

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia.

    o objetivo de predizer-lhes o sucesso acadmico (Logan, 2006). Contudo, foi em 1900 que Binet e Simon, na Frana, comearam a tecer uma srie de crticas aos testes at ento utilizados, afirmando que eram medidas exclusivamente sensoriais. O foco da crtica era sobre o fato de que, embora permitissem maior preciso nas medidas, os testes sensoriais no tinham relao importante com as funes intelectuais, fazendo somente referncias a habilidades muito especficas, quando deveriam ater-se s funes mais amplas como memria, imaginao, compreenso, entre outras.

    Cinco anos depois, os mesmos pesquisadores franceses publicaram o primeiro teste para a mensurao da capacidade cognitiva geral, a Escala Binet-Simon, constituda por trinta itens (dispostos em ordem crescente de dificuldade) com o objetivo de avaliar algumas funes como julgamento, compreenso e raciocnio, detectando, assim, o nvel de inteligncia em crianas das escolas de Paris. O teste foi desenvolvido a pedido do departamento de educao do governo francs, a fim de identificar as crianas com deficincia intelectual e compor um sistema diferenciado de educao para elas. Essa escala passou por reviso, ampliao e aperfeioamento em 1908 e em 1911, um ano antes de Wilhelm Stern propor o Quoeficiente Intelectual (QI), que viria a ser refinado por Lewis Terman, na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, em 1916. Para a obteno do QI, que exprime numericamente e de forma padronizada a capacidade intelectual dos avaliandos, Stern e Terman sugeriram um clculo que se baseava na diviso da idade mental (IM) pela idade cronolgica (IC) multiplicada por cem. Seus estudos sugeriram que, quando a idade mental ultrapassasse a idade cronolgica, a razo resultante levaria a um escore acima de cem. Por outro lado, quando a idade

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    cronolgica ultrapassasse a idade mental, levaria a um escore abaixo de cem (Sternberg, 2000).

    Os estudos de Terman, publicados em 1916, alm de terem proposto um avano para os estudos relacionados ao QI, tambm foram responsveis pela adaptao da escala francesa para os Estados Unidos, onde passou a se chamar Escala Stanford-Binet. Naquele momento histrico, outros instrumentos inspirados na Stanford-Binet foram construdos nos Estados Unidos, onde a avaliao cognitiva ganhou grande impulso por conta da Primeira Guerra Mundial, ocorrida entre 1914 e 1918 (Dubois, 1970).

    Nesse perodo, a demanda por instrumentos simples, rpidos, de aplicao coletiva e que pudessem captar diferenas de capacidade intelectual de recrutas foi bastante acentuada, o que levou os pesquisadores a desenvolverem o Army Alpha e, mais tarde, o Army Beta, que se instituiu como um instrumento no verbal de avaliao da inteligncia, ou seja, composto por provas que no exigiam leitura ou escrita dos respondentes, podendo ser utilizado com recrutas analfabetos e que no falassem a lngua inglesa (Fancher, 1985). Ao final da Primeira Guerra Mundial, os testes Army Alpha e Army Beta, que eram somente utilizados no exrcito, foram liberados para uso civil aps vrias revises e estudos com pessoas de diferentes faixas etrias e nveis de escolaridade (Anastasi, 1977).

    Com o desenvolvimento da testagem psicolgica, ocorrido durante o perodo da guerra, novos testes foram publicados, e houve uma melhora na qualidade dos instrumentos, nos procedimentos de administrao e nas pontuaes. No bojo desses avanos, a partir da dcada de 1920, a testagem educacional tambm ganhou campo e foram desenvolvidas provas para

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    avaliao de desempenho escolar e de habilidades escolares e acadmicas especficas, tais como o School Aptitude Test (SAT), o Graduate Record Exam (GRE), o Medical College Admission Test (MCAT) e o Law School Admission Test (LSA T).

    Como se pode perceber, at por volta de 1930 a testagem estava em plena expanso nos Estados Unidos, em grande parte devido sua cientificidade e s contribuies para a sociedade em diversos mbitos. Tambm se percebe que, at ento, o foco estava exclu- sivamente sobre as capacidades cognitivas c, no por acaso, foram os estudos sobre a inteligncia humana que obtiveram os maiores avanos metodolgicos, tericos e cientficos nessa poca.

    O ingls Charles Spearman, que realizou seu doutorado no laboratrio de Wundt, em Leipzig, foi um dos principais tericos da fase inicial da psicometria. Suas contribuies se deram ao aplicar modelos matemticos ao estudo do funcionamento mental, especialmente com o refinamnto do mtodo de correlao, previamente desenvolvido por Karl Pearson, e com o desenvolvimento da tcnica de anlise fatorial. Lanando mo dessas tcnicas estatsticas, Spearman desenvolveu estudos a partir dos quais sugeriu a teoria de que todas as habilidades cognitivas convergiam para uma capacidade geral, o chamado fator g. Por outro lado, Thurstone, em 1938, utilizando-se dos mtodos propostos anteriormente, sugeria a existncia de habilidades especficas e independentes que no se organizavam em torno de uma habilidade geral. De acordo com Ribeiro (1998), estava implcito nas teorias que o fator geral dependeria de uma energia mental essencialmente biolgica e inata, enquanto que os fatores especficos dependeriam da aprendizagem. Essas questes tericas foram discutidas ao longo de todo o sculo XX, por Cattell (1940; 1971),

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    Horn (1991) e, finalmente, por Carroll (1993), que apresentou uma proposta de integrao das teorias da inteligncia, por meio de um modelo hierrquico das habilidades.

    Assim, conforme exposto at aqui, alm do desenvolvimento tcnico que os testes ajudaram a implementar na psicologia, eles contriburam para avanos tericos importantes, uma vez que permitiam que as teorias fossem testadas na realidade. Esse perodo inicial de desenvolvimento da testagem psicolgica ocorreu na Europa e, principalmente, nos Estados Unidos. Na seo a seguir, sero abordados os avanos da rea e das prticas no Brasil.

    0 caminho dos testes no Brasil

    A testagem e a avaliao psicolgica no Brasil passaram por diversos avanos e dificuldades ao longo de sua histria. Pasquali e Alchieri (2001) destacam que a histria dos testes psicolgicos, no contexto brasileiro, teve um perodo inicial de grande empol- gao e uso indiscriminado, seguido por fases de crticas (e muitas vezes com sentido), para posterior organizao e regulamentao do uso, o que ainda est em processo na realidade brasileira.

    Pasquali e Alchieri (2001) destacam que o desenvolvimento da testagem e da avaliao psicolgica no Brasil passou por cinco grandes fases, tendo incio na primeira metade do sculo XIX.

    Tais perodos so: produo mdico-cientfica acadmica (1836- 1930); estabelecimento e difuso da psicologia no ensino nas universidades (1930-1962); criao dos cursos de graduao em psicologia (1962-1970); implantao dos cursos de ps-graduao (1970-1987); e emergncia dos laboratrios de pesquisa, de 1987

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    em diante. Nesta ltima fase consolidaram'se vrios eventos cientficos em avaliao psicolgica em virtude da preocupao de vrios grupos de pesquisadores quanto produo de instru- mentos mais srios e confiveis.

    Embora a psicologia tenha sido fundada oficialmente em 1879, por Wundt, na Alemanha, antes disso j havia profissionais interessados na compreenso de processos psicolgicos no Brasil, tanto que, ao longo do sculo XIX, era comum encontrar disci- plinas de psicologia em faculdades de medicina. Assim, a partir de um ponto de vista estritamente positivista, observa-se que, nas dcadas de 1830 e de 1840, duas teses em faculdades de medicina, versando sobre inteligncia, foram defendidas. No incio da dcada de 1900, foram fundados laboratrios de psicologia e adaptao para a realidade brasileira de alguns testes internacionais, tais como o Binet-Simon, realizada pelo mdico Isaias Alves, na Bahia. importante ressaltar que, assim- como ocorreu na Europa e nos Estados Unidos, o interesse inicial dos pesquisadores era conhecer os processos psicolgicos bsicos, relativos principalmente percepo, voltando, somente nos passos seguintes, o foco para funes cognitivas superiores (Amendola, 2011).

    As pesquisas iniciais e as possibilidades prticas do uso dos testes foram entusiasmantes e muito promissoras, tanto que o perodo compreendido entre 1930 a 1962 foi marcado pelo estabelecimento e pela difuso do ensino da psicologia nas universidades, fazendo parte da grade curricular de diversos cursos, tais como administrao, jornalismo, sociologia, medicina, direito, entre outros. Junto a isso, vrios laboratrios de pesquisa e institutos de psicologia aplicada, principalmente de seleo e orientao profissional e de condutores, foram fundados no Brasil, ajudando

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    a desenvolver a testagem, tanto do ponto de vista da pesquisa quanto da prtica. Por isso Andriola (1996) afirmou que, at aquele momento, tal perodo poderia ser considerado como a fase de ouro no que se refere produo cientfica e construo cie instrumentos de medida, com o desenvolvimento de testes especficos para a populao brasileira, embora ainda se recorresse prtica de usar instrumentos importados sem maiores esforos de adaptao para a realidade do pas.

    O ano de 1962 foi marcado pela oficializao da psicologia como profisso no Brasil, o que se deu pela aprovao da Lei nQ 4.119, de 27 de agosto daquele ano. E evidente que essa lei no aconteceu de repente; ao contrrio, foi fruto de uma srie de avanos ocorridos ao longo de vrios anos, os quais fizeram com que a psicologia deixasse de ser uma disciplina aplicada para ganhar um campo prprio (Pereira & Pereira Neto, 2003). A partir dessa Lei, que culminou com a criao do Conselho Federai de Psicologia e de suas sucursais regionais em 1974, os cursos de formao de psiclogos foram oficializados, tendo currculos mnimos estabelecendo os contedos bsicos a serem ensinados nas graduaes. Alm disso, organizaes como a Fundao Getlio Vargas e o Instituto de Seleo e Orientao Profissional (ISOP), sob a direo de Emilio Mira y Lpez, fortaleceram-se consideravelmente, junto com outros laboratrios e departamentos que foram fundados nas universidades.

    Apesar de ter sido um perodo produtivo dos pontos de vista cientfico e poltico, instalou-se uma crise de ordem ideolgica na rea, com crticas relacionadas ao uso indiscriminado de testes estrangeiros sem adaptao. Junto a isso, com o aparecimento c o fortalecimento de abordagens mais sociais e humanistas na

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    psicologia, uma forte oposio s prticas e s tcnicas positivistas se apresentou, fato que desencadeou alguns prejuzos relativos pesquisa e ao ensino dos testes (Padilha, Noronha & Fagan, 2007). E importante ressaltar que muitas das crticas que emergiram nesse momento tinham um fundamento lgico e prtico e, de fato, algumas questes trouxeram conseqncias importantes no s para a psicologia, mas tambm para as pessoas que se submetiam s avaliaes. Entretanto, como ressaltaram Noronha e cols. (2002), tais crticas careciam de fundamentos cientficos e partiam, por vezes, exclusivamente para argumentos polticos e at emocionais, com um discurso que perdurou ao longo de pelo menos duas dcadas.

    Como se percebe, em grande parte, tais crticas faziam sentido naquele momento, devido baixa qualidade da formao dos alunos em avaliao psicolgica, uma vez que nos cursos recm- -criados ainda no havia docentes especializados no assunto

    em contraposio grande procura dos alunos pelos cursos de graduao em psicologia. A esse propsito, o texto de Pasquali e Alchieri (2001) relata que, em dez anos de existncia da profisso, a quantidade de cursos oferecidos subiu de seis para 21, contando, em 1970, com oito mil alunos cursando.

    Dada a situao da formao dos profissionais e dos pesquisadores no Brasil, foram observadas algumas aes no sentido de promover cursos de ps-graduao em psicologia por diversas importantes universidades, tais como as Pontifcias Universidades Catlicas do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul e de So Paulo, a Universidade de Braslia e a Universidade de So Paulo. Entretanto, isso no foi suficiente para que os testes, que surgiram como ferramentas promissoras e rapidamente foram

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    difundidos em vrios mbitos, se aprimorassem tcnica e cientificamente; ao contrrio, com prticas de utilizao abusivas e sem as devidas reflexes e formao, os testes psicolgicos, em meados das dcadas de 1980 e de 1990, foram motivo de reportagens e manifestaes pblicas contrrias ao seu uso, expondo situaes vexatrias de atuaes de profissionais da psicologia, principalmente no mbito da seleo de pessoal. Infelizmente, havia muito de verdade no que foi veiculado. Contudo, chegar a tal situao fez com que a rea ganhasse um novo impulso, buscando garantir a qualidade da formao dos profissionais e dos docentes, por um lado, e dos instrumentos e dos testes, por outro.

    Uma das iniciativas tomadas nesse sentido foi a fundao do Instituto Brasileiro de Avaliao Psicolgica (IBAP), por parte de psiclogos pesquisadores que tinham em comum o fato de conduzirem estudos relacionados construo, adaptao e validao de testes psicolgicos no Brasil. Desde seu surgimento, o IBAP tem promovido aes em prol de uma melhor qualidade dos testes e da avaliao psicolgica no Brasil, por meio de publicao de uma revista cientfica (Revista Avaliao Psicolgica), bem como da promoo de congressos e eventos que fomentam a produo cientfica e a reunio de profissionais em torno do tema (Gomes, 2003; Hutz & Bandeira, 2003).

    Outra tendncia observada foi o oferecimento de linhas de pesquisa em avaliao psicolgica em cursos de ps-graduao stricto sensu, ou seja, mestrado e doutorado. Segundo Primi (2010), dos 65 programas existentes em universidades de psicologia no Brasil, h linhas de pesquisa na rea na Universidade Pederal de Minas Gerais (UFMG), na Universidade Federal de Uberlndia (UFU), na Universidade Federal do Rio Grande do

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Sul (UFRGS), na PUC-RS, na Universidade Federal de Santa Catarina (U FSC ), na USP (campi de Ribeiro Preto e So Paulo), na PUC de Campinas, na UnB e na Universidade So Francisco (USF), sendo que esta ltima foi a primeira instituio cuja rea de concentrao especfica em Avaliao psicolgica e desenvob vimento de testes.

    Na histria recente da avaliao psicolgica no Brasil, o fato que se destaca a publicao da resoluo 02/2003, que insti- tuiu critrios mnimos de qualidade para se considerar um teste psicolgico apto para o uso profissional. Basicamente, esses crit- rios dizem respeito fundamentao terica do teste, evidncias empricas, ou seja, obtidas a partir de pesquisas cientficas, da vali' dade e da preciso do teste (esses conceitos sero abordados no captulo 4 deste livro), dos sistemas de correo e interpretao dos resultados (veja o captulo 5) e da compilao de todas essas informaes em um livro chamado Manual Tcnico, que compe o material do teste.

    Essa resoluo foi importante por alguns motivos. Como j citado, at o incio da dcada de 2000, os instrumentos careciam fortemente de pesquisas que atualizassem seus contedos. possvel imaginar que, se o Conselho estabeleceu os critrios mnimos de qualidade citados anteriormente, muitos dos testes disponveis antes dessa data no apresentavam muitas dessas informaes. O leitor, ao estudar este livro na ntegra, vai perceber que bastante difcil (e arriscado) pensar no uso de testes psico' lgicos que no apresentem os requisitos mnimos para considerar um teste psicolgico aprovado.

    Dessa forma, a Resoluo 02/2003 disciplinou a construo e a adaptao de testes psicolgicos no Brasil, fornecendo diretrizes

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  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    claras aos pesquisadores. Isso fez com que muitos testes utilizados at aquele momento e que no se enquadravam no novo padro de qualidade fossem retirados do mercado, o que provocou uma srie de crticas por parte de profissionais que estavam perigosa- mente acostumados ao uso desses instrumentos. Por outro lado, conforme poder ser observado no prximo captulo, o aumento nas pesquisas a partir da resoluo foi considervel, e por um motivo muito simples: a partir daquele momento ou se fazia pesquisa com os instrumentos, de acordo com as novas diretrizes, ou no haveria mais instrumental disponvel para os psiclogos realizarem avaliao.

    Consideraes finais

    Como se pode observar, a histria da testagem e da avaliao psicolgica muito rica e legitima os investimentos atuais e os desenvolvimentos recentes, enquanto rea prtica de atuao do psiclogo. Porm, o desenvolvimento deve continuar e ainda h muito o que fazer. Nesse sentido, o ano de 2011 promete ser bastante produtivo, uma vez que o Conselho Federal de Psicologia o instituiu como o Ano Temtico da Avaliao Psicolgica.

    Nessa ao, o objetivo promover debates ao longo de todo o ano em eventos em todo o pas, abertos a todos os psiclogos interessados, que podero propor e discutir melhorias para rea. Para tanto, foram definidos trs eixos que organizaro os debates, quais sejam:

    23

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    1) Qualificao, que versa sobre a formao do psiclogo em avaliao psicolgica;

    2) Relaes institucionais, que visa a debater a insero da avaliao nos diversos mbitos de atuao da psicologia;

    3) E o terceiro eixo, que organizar as reflexes a respeito da relao entre os dois eixos anteriores.

    A partir de tais discusses, devero ser publicados documentos com os resultados e, talvez, at novas resolues.

    No possvel prever o futuro da avaliao psicolgica no Brasil, mas o estudo do passado certamente pode auxiliar a compreender o estado atual e a indicar alguns possveis passos futuros. Por exemplo, em acrscimo s contribuies de Pasquali e Alchieri (2001), no seria exagero propor mais um perodo para explicar a histria da rea, relacionando os fatos ocorridos desde 2003. O fato que a preocupao crescente com a formao na rea parece estar no cerne da continuidade dos desenvolvimentos at ento observados, considerando que profissionais bem formados podero optar por instrumentos e tcnicas de forma mais crtica, utiliz-los de forma mais responsvel e contribuir para que a psicologia como cincia e profisso continue desenvolvendo-se, tanto do ponto de vista tcnico quanto tico.

    24

  • Da testagem Avaliao Psicolgica: aspectos histricos e perspectivas futuras

    Questes

    1) Por que os testes psicolgicos foram importantes para o desenvolvimento cientfico da psicologia?

    2) Explique o conceito de quoeficiente intelectual (Q I).

    3) Por que houve o interesse inicial dos pesquisadores acerca dos processos psicolgicos bsicos?

    4) Descreva brevemente os critrios mnimos de qualidade de testes psicolgicos, segundo a Resoluo 02/2003.

    5) Por que pode ser perigosa a utilizao de testes que no se enquadrem nos critrios mnimos de qualidade?

    25

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Referncias

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  • aptulo 2Panorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    Slvia Vernica Pacanaro

    Gisele Aparecida da Silva Alves

    Ivan SantAna Rabelo

    Irene F. Almeida de S Leme

    Rodolfo A. M. Ambiel

    Sabe-se que o uso de testes psicolgicos, juntamente com a investigao de outros dados, integra o processo de avaliao psicolgica. Pasquali (2001) define os testes como um conjunto i lr tarefas predeterminadas que o sujeito precisa realizar em uma determinada situao, do qual resultam em alguma forma df medida. Posteriormente, Urbina (2007) descreveu os testes iitmo procedimentos para a obteno de amostras de comporta- im nios e respostas de indivduos com o objetivo de descrever e/ou mi-n.Mirar caractersticas e processos psicolgicos, compreendidos i ;ii Iu ionalmente nas reas emoo/afeto, cognio/inteligncia,

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    motivao, personalidade, psicomotricidade, ateno, memria, percepo, entre outras.

    Destaca-se que, nas primeiras cinco dcadas do sculo XX, os testes psicolgicos, independentemente do seu tipo, rapidamente atenderam s necessidades da sociedade na poca e foram inseridos nos contextos militar, industrial e institucional. Assim, pertinente lembrar que o progresso da cincia psicolgica e o fortalecimento dos pilares bsicos para o desenvolvimento dos testes colaboraram com a expanso cie seu uso. Nas dcadas de 1960 e 1970, houve largo descrdito na rea de testagem psicolgica, sendo que os instrumentos foram criticados e o seu uso diminudo e menosprezado na atuao do profissional de psicologia. Um dos motivos para esse movimento no Brasil foi a associao dos modelos de avaliao com a cultura tcnica norte-americana (Pasquali & Alchieri, 2001). No final dos anos oitenta, surgiram processos judiciais em decorrncia de decises referentes ao psicotcnico na rea da seleo, bem como a descrena da prtica de alguns psiclogos despreparados para a utilizao de testes psicolgicos.

    Desde ento, ocorreram alguns movimentos para que fossem criadas solues para a melhoria da qualidade dos servios relativos rea de avaliao psicolgica, como a criao da Comisso Nacional sobre Testes, em 1980, bem como sua segunda edio em 1986; o surgimento da Cmara Interinstitu- cional de Avaliao Psicolgica em 1997; e a criao do Manual para Avaliao Psicolgica de candidatos Carteira Nacional de Habilitao e condutores de veculos automotores em 2000; as resolues que regulamentaram a ao profissional no tocante aos laudos e aos instrumentos de avaliao psicolgica em 2001;

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  • IMnorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    c a Resoluo_CFP 002/2003, que divulgou os requisitos mnimos e obrigatrios que os instrumentos psicolgicos precisam ter parao uso profissional adequado (Noronha, Primi & Alchieri, 2004).

    Foi a partir da Resoluo N Q 002/2003 do Conselho Federal de Psicologia, que foram definidos com um pouco mais de clareza os requisitos mnimos e obrigatrios que os instrumentos psicolgicos precisam ter para o uso profissional adequado. Entre os

    principais requisitos, pode-se mencionar:

    Apresentao da fundamentao terica do instrumento, com especial nfase na definio do construto;

    Apresentao de evidncias empricas de validade e preciso das interpretaes propostas para os escores do teste, justificando os procedimentos especficos adotados na investigao;

    Apresentao de dados empricos sobre as propriedades psicomtricas dos itens do instrumento;

    Informaes sobre os procedimentos de correo e interpretao dos resultados, comunicando detalhadamente o procedimento e o sistema de interpretao no que se refere s normas brasileiras, relatando as caractersticas da amostra de padronizao de maneira clara e exaustiva, preferencialmente comparando com estimativas nacionais,o que possibilita o julgamento do nvel de representative dade do grupo de referncia usado para a transformao dos escores;

    Apresentao clara dos procedimentos de aplicao e correo, bem como das condies nas quais o teste deve ser

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    aplicado, para que haja a garantia da uniformidade dos procedimentos envolvidos na sua aplicao.

    Tambm em 2003, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) instituiu a Comisso Nacional de Avaliao Psicolgica, chamada de Sistema de Avaliao dos Testes Psicolgicos (SATEPSI), que, inicialmente, teve como objetivo central a anlise das principais dificuldades que o psiclogo enfrenta diante da avaliao psicolgica e da utilizao de testes (Pasquali & Alchieri, 2001). Essa Comisso integrada por psiclogos convidados, de reconhecido saber em testagem psicolgica, que analisam e emitem pareceres sobre os testes psicolgicos. importante salientar que todos os instrumentos considerados psicolgicos ou no, encaminhados para o Conselho Federal de Psicologia (CFP), passam por uma avaliao do SATEPSI.

    Aps o recebimento do instrumento por esta comisso, o trmite envolve alguns procedimentos internos, tais como o recebimento do material a ser analisado, a anlise propriamente dita, a avaliao, a comunicao da avaliao aos requerentes, com prazo para recurso, a anlise de recurso e a avaliao final. Segundo a Resoluo CFP 002/2003, um instrumento psicolgico recebe parecer favorvel quando, por deciso do Plenrio do CFPj o teste considerado em condies de uso, pois cumpriu os requisitos mnimos para a comercializao de um teste psicolgico; o parecer emitido ser desfavorvel quando a anlise indicar que o teste no apresenta as condies mnimas para uso. Nesse caso, o parecer dever especificar as razes da reprovao, bem como as orientaes futuras para mudanas e melhorias nos procedimentos para o uso do instrumento. Aps a reviso

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  • 1anorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    e a reformulao, o pesquisador poder reapresentar o material a qualquer tempo, e todos os procedimentos de anlise sero seguidos novamente.

    Quando o instrumento aprovado para publicao, comercializao e utilizao profissional, cabe observar que, segundo a Resoluo n.s 006/2004 do CFl^ os dados empricos das propriedades de um teste psicolgico devem ser revisados periodicamente. Para os dados referentes padronizao, o intervalo entre um estudo e outro no pode ultrapassar quinze anos e, para validade e preciso, o perodo deve ser de vinte anos. No sendo apresentadas as revises nos prazos estabelecidos, o teste psicolgico perder a condio de favorvel e ser excludo da relao de lestes em condies de comercializao e uso.

    Quanto quantidade de testes psicolgicos comercializados imalmente, o Burns Institute of Mental Measurements fornece aos profissionais interessados, por meio de sua pgina virtual, informaes acerca de testes publicados e comercializados disponveis em ingls. Essas informaes incluem rea de aplicao, dados da editora responsvel pela publicao e pela comercializao dos lestes, ano de publicao, autores, ttulo dos testes, acrnimos e i^vises disponveis. Noronha e Reppold (2010) relataram que, mi 2002, foi possvel identificar aproximadamente dois mil ttulos disponveis nesta base de dados. Atualmente, em 2011, a pgina iuit ial da base de dados relata mais de 3500 testes disponveis pitia consulta.

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Figura 1. Quantidade de testes ps ico lg icos em lngua inglesa com ercializados segundo o Burns Institute o f Mental Measurements (Noronha & Reppold, 2010).

    O Sistema de Avaliao dos Testes Psicolgicos1 (SATEPSI) consiste em um sistema brasileiro de certificao de instrumentos de avaliao psicolgica para uso profissional, o qual avalia e qualifica os instrumentos psicolgicos como aptos (pareceres favorveis) ou inaptos (pareceres desfavorveis) para uso. A lista completa dos testes informa ttulo, ano de publicao, requerente (quem submeteu o teste avaliao do CFP), datas de recepo, anlise, avaliao e recurso e avaliao final, que informa o resultado da apreciao. Na poca de sua criao, a lista contava com cerca de trinta instrumentos com pareceres favorveis para uso. Os resultados de um levantamento realizado no ms de abril de 2011 demonstraram que, at essa data, 121 instrumentos

    1 www2.pol.org.br/satepsi

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  • 1iinorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    psicolgicos aprovados constavam no sistema, sendo que um instrumento ainda mencionado como aprovado passou recentemente para a classificao desfavorvel.

    Figura 2. Quantidade de testes ps ico lg icos com parecer favorvel no llr.isil (consulta ao SATEPSI em abril/2011).

    Dos 120 aprovados, 33 so instrumentos para avaliao cognitiva, que contempla inteligncia, funes executivas e raciocnio; 27 para avaliao da personalidade; 16 instrumentos para avalia- t^io da ateno; 6 para memria; 6 instrumentos para avaliao df interesses profissionais; 4 para avaliao das habilidades so- tais; 4 para avaliao do estresse; 3 para o contexto familiar; t para criatividade; 2 para a avaliao da agressividade; 2 para i avaliao da depresso e 1 instrumento para cada tema refe- ifiu iado a seguir (categoria Outros): destreza, autoconceito,

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    autocontrole, assertividade, avaliao ocupacional, sade geral, expresso de raiva, lateralidade, avaliao visomotora, expectativa acerca do lcool, TDAH , ansiedade e ideao suicida.

    Agressividade 2%

    C riativ idade.3%

    Fam iliar.3%

    Estresse 3%

    Hab. Sociais 3%

    Orient. Profiss'. 5%

    M emria 5%

    Depresso2%

    Outros12% Inteligncia

    27%

    Ateno13%

    Personalidade22%

    Figura 3. Tipos de testes psicolgicos, segundo construto avaliado (consulta ao SATEPSI em abril/2011).

    Durante algum tempo, no Brasil, foi utilizada uma grande quantidade de instrumentos produzidos em outros pases, ocorrendo, em alguns casos, uma traduo sem os cuidados necessrios, sendo utilizadas as tabelas de normas estrangeiras que levavam a resultados e concluses errneos (Duarte, Miyazaki, Ciconelli & Sesso,2003). Com a implementao do SATEPSI, buscou-se mudar essa realidade por meio do estabelecimento de padres para os testes e, indiretamente, para a prtica em avaliao, ao impedir que instrumentos sem o devido reconhecimento cientfico fossem

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  • IMnorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    utilizados profissionalmente. Esse sistema, apesar de algumas con- irovrsias, estimulou o desenvolvimento de pesquisas, tanto por parte da comunidade de pesquisadores, quanto pelas editoras, que passaram a atender a uma srie de exigncias tcnicas antes de disponibilizarem instrumentos psicolgicos para comercializao.

    Primi e Nunes (2010) relatam que o SATEPSI, ao longo dos nove anos de existncia, foi gradativamente ganhando a acei- lao dos profissionais, e os psiclogos foram compreendendo as propostas e os objetivos desse sistema. Entre outros aspectos, o sistema tambm provocou o aumento na qualidade dos manuais de testes, que atualmente so bem mais completos e detalhados do que h dez anos.

    O Departamento de Pesquisa e Produo de Testes da Editora i lasa do Psiclogo realizou um levantamento referente a artigos publicados sobre o tema avaliao psicolgica, aps a Resoluo do CFP n 02/2003. Consultada a base de dados do PEPSIC (Peridicos Eletrnicos em Psicologia), mencionando a palavra-chave "avaliao psicolgica , foram registrados todos os artigos que lontinham essa informao. Do total, 148 registros no possuam0 estabelecimento do perodo e 139 publicaes foram realizadas .ips o ano de 2003. O ano de 2008 foi o que obteve mais publica-

    (N =35), seguido de 2007 (N =25) e 2006 (N = 24).

    Foi observado tambm que as revistas que mais publicaram ^lne o assunto foram a Revista Avaliao Psicolgica, que obteve tit.ior nmero de publicaes (N = 45), seguida da Revista Psico-1 l\l< (N = 28). Diante desse levantamento, pde constatar-se que,

    iips a resoluo do conselho de 2003, ocorreu um aumento nas publicaes relacionadas construo de instrumentos, a estudos dr evidncias de validade e a outras propriedades psicomtricas,

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    na busca de tornar os instrumentos mais seguros para a populao estudada, bem como relacionadas a atualizaes de pesquisas que realizem estudos para normas brasileiras.

    Com o propsito de analisar o conhecimento dos estudantes do curso de psicologia no que se refere aos contedos relacionados avaliao psicolgica, Noronha, Baldo, Barbin e Freitas (2003) realizaram um estudo com 180 alunos do primeiro ao quinto ano do curso de psicologia, de uma instituio particular de ensino do interior do estado de So Paulo. A idade dos participantes variou de dezessete a 51 anos (M = 23,8; DP = 7,2).

    A pesquisa consistiu na aplicao de um instrumento coiv tendo 45 itens, com questes dicotmicas, cujo objetivo era investigar quatro reas de conhecimento: conceito de avaliao; conceito de instrumento de avaliao; uso de instrumento; e aprendizagem de instrumentos. O instrumento foi aplicado cole- tivamente, com os seguintes resultados: os itens que faziam parte do instrumento que obtiveram boas porcentagens de acerto foramo item 8 - a aprendizagem de testes deveria acontecer apenas no ltimo ano do curso (97,2%); o item 45 - os testes no servem para nada (96,9%); o item 32 - os testes so realmente aprendi- dos na prtica clnica (96,6%); os itens 2 e 21, respectivamente- a avaliao psicolgica pode ser utilizada em muitos contextos de atuao profissional, e os testes psicolgicos so instrumentos pouco importantes na prtica profissional do psiclogo (94,9%);o item 20 - a entrevista e a observao so tcnicas de avaliao (93,9%); o item 41 - consigo aprender um teste pela leitura do manual (93,8%); o item 42 - o psiclogo no deve usar testes, pois eles reduzem o homem a nmeros (93,3%); e o item 12 - a avaliao um processo de coleta de dados (91,7%).

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  • Kmorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    Os dados revelaram um melhor desempenho dos alunos que cstavam no ltimo ano, quando comparados com os alunos do primeiro ano, que nunca tiveram nenhum contato de instruo formal de avaliao, havendo diferena significativa entre os grupos em quase metade dos itens do instrumento. Observa- se ainda que, entre os prprios estudantes de psicologia, h um

    desconhecimento da prtica e da importncia em se utilizar a avaliao psicolgica corretamente.

    Neste sentido, Paula, Pereira e Nascimento (2007) realizaram um levantamento por meio de um questionrio sobre a opinio dos alunos de psicologia a respeito da avaliao psicolgica, principalmente sobre a utilizao dos testes psicolgicos. Participaram 358 alunos de psicologia que cursavam o ltimo ano da graduao, pertencentes a quatro instituies, sendo uma pblica r t rs particulares da cidade de Belo Horizonte. Quanto idade ilos participantes, 59% deles tinham at 24 anos; 15%, entre 25 e /() anos; 25% tinham mais de 26 anos e 1% no relatou a idade.

    O questionrio era composto por dezenove itens que contemplaram as seguintes informaes: formao acadmica, iii lculao entre teoria e prtica na graduao e na identificao dos problemas mais freqentes no uso dos testes psicolgicos. No tjiie se refere aos instrumentos aprendidos durante a graduao,< pi mais citados foram a Escala de Inteligncia Wechsler para i lianas - W ISC (N = 259), seguida do Desenho da Figura I lumana - DFH (N = 204) e das Matrizes Progressivas de RavenI NI ~ 194), e os menos citados foram o Teste de Ateno Concen-II ai In - D2 (93), as Figuras Complexas de Rey (N = 9 5 ) e o Teste no verbal de inteligncia RI (N = 100). Os instrumentos W ISC e

    Mairizes Progressivas de Raven tambm foram os mais citados

    39

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    como utilizados nos estgios, bem como o HTP (casa, rvore e pessoa).

    Dos instrumentos informados como os mais citados, todos esto aprovados pelo CF} exceto o Teste do Desenho Wartegg eo DFH de Goodenough'Harris, o que indica que as universidades tambm procuram escolher instrumentos que contenham informaes relacionadas normatizao, padronizao, validade e preciso. Tambm foram verificadas informaes sobre os pontos positivos e negativos dos aspectos da formao acadmica na rea da avaliao psicolgica, sendo que os pontos positivos mais citados foram a capacitao profissional cios professores e o conhecimento sobre as tcnicas e os testes ensinados.

    Sobre os pontos negativos, os mais mencionados foram a insuficincia de informaes no contedo do ensino e nos nmeros de disciplinas ofertadas. No que se refere ao conhecimento dos alunos sobre a Resoluo NQ 002/2003 do CFI^ o estudo indicou que 83% dos alunos desconheciam essa resoluo, o que preo

    cupante, pois muitos deles j esto trabalhando em diversas reas

    da psicologia. Conclui-se, portanto, uma grande necessidade de

    aperfeioamento da formao acadmica do psiclogo, visando

    aquisio dc habilidades suficientes para capacit-lo ao exerccio profissional de melhor qualidade na rea em questo.

    Joly, Silva, Nunes e Sousa (2007) investigaram a produo cientfica de assuntos relacionados avaliao psicolgica, pesquisando os resumos de painis publicados nos Anais dos Congressos Brasileiros de Avaliao Psicolgica, nos anos de 2003, 2005 e 2007. Esses resumos estavam disponveis em CD, e a amostra foi composta por 934 resumos de diversas reas, sendo 264 do

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  • Panorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    primeiro congresso (2003), 322 do segundo (2005) e 348 do ter

    ceiro (2007).

    Os painis foram analisados com base em alguns critrios, a saber, tipo de estudo (psicomtrico, de aplicao e descritivo); tipo de pesquisa (documental, emprica, reviso bibliogrfica, estudo de levantamento, estudo de caso); quantidade e sexo dos autores; tipo de instituio s quais os autores estavam vinculados (universidades pblicas, particulares, institutos de pesquisa ou empresas); regio do pas na qual os autores atuam; procedimento de avaliao adotado (teste, entrevista, observao, misto); rea ile aplicao; nome do construto avaliado; tamanho da amostra, nixa etria e tipo de grupo (estudantes, profissionais ou pessoas institucionalizadas, com e sem distrbio psicolgico diagnosticado); nome; tipo do instrumento utilizado (projetivo, objetivo ou mais de um) e tipo de aplicao (lpis e papel, informatizada, relato verbal); incluem-se os seguintes estudos psicomtricos: validade (que tipo), preciso (que tipo), adaptao, normatizao v padronizao; e procedimento de anlise utilizado (qualitativo, quantitativo ou ambos). Destacam-se alguns itens relevantes e observa-se que, no ano de 2007, ocorreu um aumento nas publi-i .ies de 37,2%. Sobre os autores dos resumos, houve uma piedominncia na participao do gnero feminino, havendo um h it iil de 873 mulheres, em comparao com 492 homens.

    No que se refere s distribuies de estudos por regies e ano de< ongresso, percebeu-se uma maior participao da regio Sudeste ((.')%) em todos os anos avaliados. Observou-se tambm que os anos de 2005 e 2007 concentraram mais pesquisas envolvendo f i lh o s e crianas, com relevncia estatstica (22 [12] = 142,539;

    {> - 0,001).

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Foi observado que a utilizao de testes obteve uma grande prevalncia nas tcnicas utilizadas, e que, no ano de 2007, se optou por uma maior utilizao de instrumentos do Tipo Lpis e Papel, com 71,8%, quando comparado aos demais anos. Alm disso, observa-se que, em um nmero significativo de resumos do congresso de 2003 (34,5%), no constava essa informao, e que isso foi diminuindo ao longo dos outros anos.

    Houve diferenas altamente significativas entre os tipos dos instrumentos utilizados em funo dos anos dos congressos (^22 [10] = 193, 410; p < 0,001), de modo que ocorreu prevalncia pela utilizao de instrumentos objetivos em todos os anos do congresso, sendo que, em 2007, essa prevalncia foi de 78,4%. No que se refere aos instrumentos mais utilizados nas apresentaes dos painis, pode mencionar-se o Rorschach (N = 25), seguido do W ISC (n=12) e Bender ( N = l l ) , que avaliam respectivamente personalidade, inteligncia e psicomotricidade, como os mais citados nos resumos.

    Quanto a teses e dissertaes disponveis na Base de Dados da Biblioteca Virtual em Psicologia Brasil (BVS-Psi Brasil), Joly, Berberian, Andrade e Teixeira (2010) realizaram um levantamento utilizando as seguintes palavras-chaves: avaliao psicolgica, psicometria, validade, preciso e testes psicolgicos, sendo a busca realizada at setembro de 2007. Obteve-se um total de 141 resumos referentes pesquisa realizada. As anlises de frequncias dos resumos revelaram que 54,6% eram dissertaes de mestrado; 43,3%, teses de doutorado, e 2,1% eram teses de ps-doutorado, sendo que 19,15% dos estudos foram defendidos em universidades da regio sul do Pas; 80,14% no Sudeste, e 0,71%, no Nordeste.

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  • I'.morama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    No que se refere ao gnero das autorias desses trabalhos, observou-se que 88,9% eram do sexo feminino. Desses estudos, 66,7% foram realizados em universidades pblicas e 33,3%, em universidades privadas.

    Alm disso, foi verificado tambm o tipo de construto estudado, o que revelou que os construtos personalidade e inteligncia ainda permaneceram como os mais pesquisados, como destacado lambm na pesquisa anterior, sendo que a anlise de frequncia da rea de aplicao em que os instrumentos desenvolvidos ou utilizados podem ser empregados revelou que a rea clnica (26,3%) loi a que mais teve estudos direcionados, seguida pela rea de psicologia escolar e educacional (25,6%).

    Alves, Alchieri e Marques (2002) relatam uma crtica atual atribuda aos testes psicolgicos, a qual se refere funo de mtular o examinando durante o processo de avaliao. Diante disso, vale ressaltar o uso dos testes como ferramentas inte- n antes do processo de avaliao psicolgica e que nunca devem- r utilizados de forma isolada, bem como o fato de que os resultados oriundos da testagem so comparados a normas criadas para aquela populao e contexto especficos.

    Complementando, h a argumentao de Noronha e cols. t/003) sobre a escolha de um instrumento de avaliao. As autoras insistem na importncia de se respeitar a idade, o sexo e . 1 referncia a normas peculiares populao avaliada. Ao lado di'.so, para que os testes sejam teis e eficientes, devem passar loi processos que comprovem suas qualidades psicomtricas tambm atender a especificaes que garantam o reconheci- inrnto e a credibilidade por parte da sociedade e da comunidade

    vi

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Quanto expanso de pesquisas relacionadas testagem psicolgica, ela pode ser decorrente tambm da Resoluo nQ 002/2003, do Conselho Federal de Psicologia, pois h, a partir dela, a obrigatoriedade de estudos psicomtricos para os testes psicolgicos utilizados para fins profissionais. importante salientar que, durante as ltimas dcadas, so percebidos avanos importantes na rea, e, conforme destaca Gouveia (2009), no possvel mais pensar na rea de avaliao psicolgica como amadora, pois cada vez mais necessria a preparao de um material de testagem de melhor qualidade, possibilitando estudos cada vez mais representativos dos parmetros psicomtricos.

    Em acrscimo, destaca-se a necessidade de mostrar aos alunos ingressos no curso de psicologia das diversas universidades brasileiras a utilidade da rea de avaliao psicolgica e suas ramificaes, pois h um mercado promissor nesses campos. Dessa forma, faz-se necessrio um conhecimento tcnico e amplo a respeito da testagem e do processo de avaliao psicolgica por parte do psiclogo, o que nortear o profissional para a melhor forma de realizao de uma interveno.

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  • Panorama atual dos testes psicolgicos no Brasil de 2003 a 2011

    Questes

    1) Nas dcadas de 1960 e 1970, houve amplo descrdito na rea de testagem psicolgica; os instrumentos foram criticados e o seu uso diminudo e depreciado na atuao do profissional de psicologia. Aponte alguns motivos para esse movimento no Brasil.

    2) A partir da Resoluo N Q 002/2003 do Conselho Federal de Psicologia, foram definidos com um pouco mais de clareza os requisitos mnimos e obrigatrios que os instrumentos psicolgicos precisam ter para o uso profissional adequado. Descreva alguns desses principais requisitos.

    3) Tambm em 2003, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) instituiu a Comisso Nacional de Avaliao Psicolgica, chamada de Sistema de Avaliao dos Testes Psicolgicos (SATEPSI). Qual o objetivo principal dessa comisso?

    4) Sabendo-se que os dados empricos das propriedades de um teste psicolgico devem ser revisados periodicamente, indique o perodo (em anos) de regularidade de um teste quanto padronizao e validade/preciso.

    5) Algumas pesquisas relatam uma crtica atribuda aos testes psicolgicos no que se refere funo do rtulo que ser plantado no sujeito submetido ao processo de avaliao. Diante disso, explique quais cuidados podem ser tomados para uma avaliao psicolgica coesa.

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Referncias

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    C onselho Federal de Psicologia. (2004). Resoluo CFP n2 006/2004. Braslia, DF. Recuperado em 24 de outubro de 2010, de http://www.pol. org .b r/pol/export/si-tes/defau lt/po l/legislacao /IegislacaoD ocum en tos/ resolucao2003_02.pdf

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  • Captulo 3"E viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    Rodolfo A. M. Ambiel

    Josemberg Moura de Andrade

    Lucas de Francisco Carvalho

    Vicente Cassepp-Borges

    Ao escolher um curso de psicologia, inevitavelmente, o estu- ilnnic carrega consigo uma srie de interesses e expectativas, sendo i >mum encontrar neles gosto por atividades diretamente ligadas

    m ntato com as pessoas e a ajuda a elas, e, no por acaso, a l'irliTC*ncia por atuaes psicolgicas no contexto clnico quase iiii.iiume entre os estudantes ingressantes (Bueno, Lemos &.I.tnu*, 2004; Meira & Nunes, 2005; Noronha & Ambiel, 2008). A jilri.i de que a psicologia somente clnica, muito frequentemente M'tiipartilhada por pessoas leigas, tem sido flexibilizada, fazendo

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    com que outras reas tenham ganhado destaque, tais como a organizacional, a comunitria e a hospitalar. Considerando a finalidade deste livro, qual seja, de apresentar conceitos bsicos sobre avaliao e testes psicolgicos, importante grifar que, no bojo dessa expanso social da psicologia, desde o incio da dcada de 2000 a rea tambm tem crescido em credibilidade, eficincia e qualidade (CFR 2003).

    Entretanto, apesar do crescente interesse por outras reas e por novos mtodos psicolgicos, h uma ferramenta que parece ainda no ter cado nas graas de estudantes e profissionais, embora sua utilizao seja to antiga quanto a prpria psicologia enquanto cincia. Sim, aqui se est falando sobre a temida (e mal compreendida) estatstica!

    bastante comum ouvir nos corredores das faculdades de psicologia murmrios (e muitas vezes lamentaes) a respeito dos contedos matemticos que parecem no fazer sentido em meio a outras disciplinas especficas da psicologia. Por conseguinte, no raro, percebe-se uma certa associao de averses entre estatstica, testes psicolgicos e pesquisa em psicologia, como se tudo o que fizesse uso da estatstica fosse igualmente difcil e chato.

    Se voc est lendo este texto e identificando-se com tais afirmaes, concordando com a maioria delas, saiba que no o nico. Preocupados com as dificuldades dos alunos nesse assunto, vrios pesquisadores tm se empenhado em compreend-las.

    Por exemplo, Yunis (2006) pesquisou as principais dificuldades em estatstica de estudantes de psicologia egpcios e descobriu cinco principais fontes de dificuldade: (1) o contedo do curso, (2)o professor, (3) os exames, (4) o prprio estudante e (5) a distncia

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  • "I viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    tio material ensinado da realidade. Esse mesmo autor encontrou ilados mostrando que, quanto mais a estatstica causava ansiedade nos alunos, mais eles consideravam a matria difcil.

    No Brasil, Silva e Vendramini (2005) pesquisaram o autocon-i cito estatstico (uma varivel afetiva relacionada ao julgamento que a pessoa faz de si mesma em relao estatstica) de estudantes de psicologia e pedagogia. Entre os itens com os quais os estudantes concordaram mais estava este: Eu me sinto incapaz na aula de estatstica. Por outro lado, entre aqueles com mais discordncia estavam: Eu gosto de estudar estatstica em casa e T.u acredito que eu posso ser um estatstico ou um cientista futu- tamente. Em outro estudo, que avaliou a atitude de estudantesi Ir psicologia em relao estatstica, Vendramini, Silva e Dias (

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    compreendido as informaes, sem que isso lhe causasse nenhuma ansiedade ou lhe fizesse sentir-se em uma selva sem sada. E esse o objetivo deste captulo: apresentar conceitos estatsticos bsicos e essenciais para uma boa utilizao e compreenso de manuais e de testes psicolgicos de uma forma simples e clara.

    Contudo, antes de prosseguir, necessrio dar-se uma boa e uma m notcia. A m que, por maior que tenha sido o esforo, no foi possvel livrar voc, leitor, da apresentao de algumas frmulas. Mas no se preocupe. A boa notcia que voc no precisa fazer clculos ou grandes operaes matemticas para utilizar a estatstica no seu dia a dia de estudante de psicologia ou de pesquisador. Existem softwares que faro o trabalho por voc, tais como o Microsoft Excel ou o Statical Package for Social Sciences,o popular SPSS.

    A estatstica na psicologia

    A parceria entre psicologia e estatstica no nova. Historiadores apontam que no sculo XIX o caminho da psicologia rumo ao seu reconhecimento como cincia demandou a adoo de mtodos que viabilizassem a quantificao de caractersticas psicolgicas. Concomitantemente, os primeiros pesquisadores interessados em conhecer os processos psicofsicos das pessoas comearam a fazer uso de procedimentos estatsticos para atribuir validade cientfica aos seus achados (Sass, 2008).

    No momento histrico inicial da psicologia como cincia, um dos pesquisadores que melhor utilizaram a estatstica em seus estudos foi Galton. Em seus experimentos, ele, que era bilogo,

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  • I viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    cst udava as diferenas individuais das pessoas, com a preocupao dc* compreender como a hereditariedade e o ambiente poderiam mluenciar no desenvolvimento e na manifestao de traos ( aractersticos de cada um. Nessa empreitada, Galton teve a ajuda dc Cattell, que mais tarde viria a se tornar um dos principais cien- list as no campo da personalidade (Memria, 2004, Schultz & Srluiltz, 2007).

    No incio do sculo XX, surgiram os primeiros testes psicolgicos, tal como so conhecidos atualmente. Urbina (2007) afirma t|uc, nessa poca, as sociedades urbanas, industriais e democrticas comeavam a se consolidar e, em conseqncia desses novos t onceitos sociais, tornou-se imperativo tomar decises sobre prvssoas de forma justa e considerando suas caractersticas pessoais nu diversas reas, tais como nos contextos laborai, educacional e d.i sade.

    A partir desse avano inicial, ao longo do sculo XX as testagens psicolgica e educacional se desenvolveram sobremaneira, com u contribuio e o refinamento das anlises estatsticas (Urbina, /007). Alm disso, a necessidade de selecionar soldados para as gtaiides guerras mundiais e o surgimento de softwares e pacotes guiai sticos possibilitaram tornar os instrumentos de avaliao Cda vez mais vlidos e precisos.

    I Vssa forma, aps uma breve contextualizao histrica sobre fi u s o tia estatstica pela psicologia, alguns conceitos bsicos sero

    postos. importante notar que a inteno deste captulo, bem 4^'mo da disciplina de estatstica nas faculdades de psicologia, no $ lonnar estatsticos e, sim, instrumentalizar os estudantes e os l^itili.ssionais da psicologia para uma boa utilizao de manuais de

    s i r : , psicolgicos e aplicao em pesquisa.

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Populao e amostra

    A estatstica um ramo de conhecimento formado por um conjunto de mtodos matemticos que ajudam as pessoas a tomar decises. O termo derivado de status (estado) e pode ter duas interpretaes: estado, enquanto condio atual de determinada situao (por exemplo, meu estado financeiro atual est pssimo); ou Estado, enquanto administrao pblica, ou seja, mtodos adotados pelo Estado para monitorar o desenvolvimento de alguma caracterstica da populao (por exemplo, a renda per capita do brasileiro subiu 5% nos ltimos anos) (Memria, 2004).

    Ao trazer essa ideia para a psicologia, necessrio lembrar que geralmente se falar sobre pessoas. A esse respeito, importante entender que a estatstica, sendo um conjunto de mtodos, vai informar sobre os dados que estiverem disponveis, seja qual for a fonte da coleta. Por exemplo, em exames mdicos clnicos, a estatstica ajuda os mdicos a entender a condio de sade do examinado a partir de uma amostra de alguma substncia biolgica, como o sangue. Na psicologia, os dados dizem respeito a comportamentos coletados de uma parte da populao (Pasquali, 2010).

    Essa noo primordial para a compreenso dos prximos passos: dificilmente ser possvel para um psiclogo fazer uma pesquisa com toda uma populao e, por isso, seleciona-se uma amostra para a realizao da pesquisa. Portanto, uma amostra uma parte de uma populao, selecionada com base em algum critrio. Populao, por sua vez, o conjunto de todos os indivduos de uma determinada classe. Por exemplo, um pesquisador quer verificar os nveis do trao de personalidade Extroverso em estudantes

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  • I viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    do psicologia brasileiros; a populao em questo seria composta por todos os estudantes de psicologia do Brasil, de todas as universidades, de todas as cidades, de todos os estados brasileiros 1 1 0 momento da pesquisa. Como isso seria muito complicado e caro, > pesquisador seleciona uma amostra de estudantes de psicologia para realizar seu estudo, a qual pode ser uma turma, algumas turmas de uma universidade, algumas universidades de um estado ou, aleatoriamente, uma parte dos estudantes de psicologia do Brasil.

    claro que, quanto menos aleatria for a seleo da amostra, maior a possibilidade de tendenciosidade dos dados, ou seja, as informaes so relativas apenas quela pequena amostra, e o pesquisador no pode generalizar os dados. Por exemplo, seria1 1 rado que um estudo cujos dados foram coletados em apenas uma muna de psicologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), 1 1 1 ) Paran, conclusse que os resultados encontrados, naquela amostra, refletem as caractersticas dos estudantes de psicologia do Brasil. Alis, no possvel nem generalizar para os futuros p-.clogos do estado do Paran, qui nem mesmo da prpriaI fbL, mas apenas para as pessoas em questo (podendo ou no ser vridade para o restante da populao estudada).

    Afinal, quando se fala em seleo da amostra, deve ser consi- dnada a ideia de representatividade. Ou seja, j que em geral no ir inn dinheiro, tampouco tempo, para avaliar todos os repre- a r u iantes de uma certa populao, necessrio que a amostra srl* 1 innada (a) tenha uma quantidade de pessoas suficiente, (b) ft-*' im ha caractersticas prprias que a diferenciem do normal I < I < >piilao e (c) seja escolhida de maneira aleatria; desse modo, n pesquisador no deve escolher os sujeitos que interessam para fhe^ai ao resultado que deseja.

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    Medidas de tendncia central e variabilidade

    Basicamente, o uso da estatstica em psicologia tem a finalidade de descrever e resumir dados provindos de observaes de comportamento, que podem ser feitas de diferentes formas, como testes, questionrios e entrevistas. Tais descries e conjuntos de dados so realizados, especificamente, por meio de nmeros, que expressam e ajudam a entender o significado dos resultados. A funo de descrever e resumir resultados do domnio da estatstica descritiva. J a funo de interpretar resultados, especificamente quando se deseja generalizar os resultados de uma amostra de respondentes para a populao alvo, do domnio da estatstica inferencial (Glassman & Hadad, 2008; Urbina, 2007).

    Especificamente nesta seo, vamos concentrar-nos na estatstica descritiva. Podemos observar, nos vrios livros de estatstica disponveis, que a forma mais comum de estatstica descritiva so as medidas de tendncia central. Como assinalam Dancey e Reidy (2006), uma medida de tendncia central de um conjunto de dados fornece uma indicao do escore tpico (mais comum) deste conjunto de dados. Em outras palavras, uma maneira vantajosa dc caracterizar um grupo de sujeitos como um todo achar um nmero nico que represente o que mdio, ou tpico

    daquele conjunto de dados. Assim, podemos dizer, por exemplo,

    que o tempo mdio de realizao da prova de psicologia social da turma A do curso de psicologia de uma universidade qualquer foi de uma hora e dez minutos. Por outro lado, podemos dizer que a mdia de idade desses alunos de 23,5 anos. Embora as idades

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  • itios alunos do curso de psicologia variem, a mdia de idade de2 ,5 anos oferece uma noo geral das idades deles. As medidas de tendncia central comumente utilizadas para descrever dados so a moda, a mediana e a mdia, que sero discutidas a seguir.

    A medida de tendncia central mais simples de se obter a moda (Mo), que simplesmente o valor mais freqente, mais tpico ou mais comum em uma distribuio de dados. Suponha que dez candidatos fizeram uma prova de conhecimentos gerais para provimento de uma vaga de analista de sistemas em uma determinada empresa. Dois candidatos obtiveram a nota 6,0; trs candidatos, a nota 7,5; quatro candidatos, a nota 8,0 e um candidato, a nota 10. Qual seria a moda? O valor modal 8,0, j que quatro candidatos obtiveram essa nota. Em outras palavras, 8,0 a moda porque a nota que ocorre com maior frequncia. Algumas distribuies de frequncia podem conter duas ou mais modas; por exemplo, quando se tm duas modas, falamos que a distribuio hi modal.

    A moda a nica medida de tendncia central que podemos utilizar para representar variveis do tipo nominal. Nesse nvel de medida, os nmeros so utilizados de forma arbitrria, simplesmente como smbolos de identificao de grupos a que os elementos pertencem (Bunchaft & Cavas, 2002). Exemplos de variveis no nvel nominal so sexo (masculino e feminino), religio (catlica, evanglica, esprita, etc.) e curso universitrio (psicologia, medicina, direito, cinema, etc.). Vale ressaltar que a moda pode, entretanto, ser utilizada para descrever o escore mais

    "I viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    comum em qualquer distribuio, independentemente do nvel de mensurao1 (Levin & Fox, 2004).

    Uma segunda medida de tendncia central a mediana (Mdn), a qual diz respeito pontuao que est no meio da distribuio da frequncia. Quando uma distribuio de frequncias disposta em ordem de tamanho, toma-se possvel localizar a mediana, o ponto do meio de uma distribuio. A mediana encaradajconio uma medida,de tendncia central, pois separa a distribuio de frequncias em duas partes iguais (Levin & Fox, 2004). Considere a seguinte distribuio de frequncia: 12, 11, 18, 16, 15, 13 e 17. Quando se vai determinar a mediana, o primeiro passo ordenar os dados do menor para o maior, como segue: 11, 12, 13, 15, 16, 17 e 18. Cada valor tem um posto; por exemplo, o valor 11 assume o 1Q posto, o valor 12 assume o 22 posto e assim por diante. O posto do valor da mediana pode ser determinado por inspeo (valor do meio em uma distribuio de frequncia mpar) ou pela frmula: E l 1. Nesse caso, temos que resulta em 4. Assim, no posto 4, temos o valor da mediana igual a 15. No caso de uma distribuio de frequncias par, a mediana ser a mdia entre os dois valores centrais.

    Compreendidas a moda e a mediana, passaremos a explicar a mdia. A medida de tendncia central mais comum, intensa e extensivamente utilizada, a mdia aritmtica, geralmente denominada de mdia (M) (Ferreira, 2005). Para calcular-se a mdia, deve-se somar o escore de cada sujeito e dividir o resultado pelo nmero de sujeitos. A ttulo de informao, a frmula da mdia :

    na qual:

    1 Para m aiores informaes sobre nveis cie m ensurao, consultar Bunchaft e C avas (2002), H ogan (2006) ou Pasquali (2003).

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  • i viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    X = mdia (l-se X barra);

    X = soma (letra grega maiscula sigma);

    X = escore bruto em um conjunto de escores;

    N = nmero total de escores no conjunto (Levin & Fox,

    2004).

    Segundo Glassman e Hadad (2008), a mdia comumente

    utilizada devido a duas caractersticas ou vantagens. Primeiro, no necessrio dispor as pontuaes em uma ordem seqencial para

    t alcular a mdia; segundo, ao contrrio da mediana ou da moda,

    i mdia reflete todas as pontuaes, ou seja, se voc mudar uma

    pnntuao, a mdia tambm vai mudar. Um dos problemas da

    mfrlia que ela sensvel aos casos extremos, os famosos outliers

    no jargo da estatstica (Dancey & Reidy, 2007). Suponha que

    '-nc queira saber a mdia da renda mensal dos sujeitos da sua |m squisa e, por coincidncia, Bill Gates esteja na sua amostra.

    I vli-sse caso, a mdia da renda mensal ser maximizada. Em outro

    iso aherrante, voc quer saber a mdia de idade dos sujeitos da

    mui pesquisa, e o homem mais velho do mundo, certificado pelo

    li \ to dos recordes, est na sua amostra. Mais uma vez, o valor da

    media de idade ser maximizado. claro que esses exemplos so .igerados, mas servem para ilustrar que a mdia sofre influncias

    ! > outliers. Em casos similares, devemos utilizar a mediana em vez

    l.i mdia.

    lumhm no devemos utilizar a mdia quando a distribuio

    l Irrquncias no normal. A distribuio normal, ilustrada na

    I luma 1, tem a forma de uma curva simtrica que parece um sino

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    de perfil. Essa distribuio indica que os sujeitos da sua amostra se distribuem normalmente em tomo de um valor modal.

    Figura 1. Curva aproxim adam ente normal.

    Em uma distribuio perfeitamente normal, o ponto mais elevado ocorre no meio da distribuio, ou seja, a moda, a mediana e a mdia so iguais. Assim, em uma distribuio normal, no importa qual medida de tendncia central voc usar, porque todas produzem o mesmo resultado. Por outro lado, quando se tem uma distribuio assimtrica, improvvel que a mdia seja representativa da maioria das pontuaes. Nesses casos, a maioria dos pesquisadores prefere utilizar a mediana como uma maneira de descrever o resultado tpico (Glassman & Hadad, 2008). Alguns exemplos de variveis com distribuies assimtricas so renda mensal e nvel de escolaridade da populao.

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  • I viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    As medidas de tendncia central, todavia, nunca devem ser inilizadas sozinhas, pois, quando o so pelo pesquisador inexperiente, elas representam os dados de maneira incompleta. As medidas de variabilidade, por outro lado, nos informam o quanto asI * mtiiaes esto distribudas em torno do centro. Nesse sentido, uma medida de tendncia central deve vir sempre acompanhada di* alguma medida de variabilidade. As medidas de variabilidade mais utilizadas so a amplitude, a varincia e o desvio-padro, as quais sero discutidas a seguir.

    Um indicador simples da variabilidade a amplitude, que iiiida mais do que a diferena entre a pontuao mais alta e a pontuao mais baixa. Por exemplo, para calcular a amplitude l.i seguinte distribuio de dados 0, 12, 13, 14, 25, 30, 35, basta > .ileiilar 35 - 0 = 35, ou seja, o valor mais alto menos o valor mais li.iixo igual a 35. Como a amplitude s reflete as duas pontuaes mais extremas, apenas uma medida bruta da variabilidade (Glas- gnan & Hadad, 2008). Embora a amplitude fornea uma ideia da Viiiiao total dos valores, ela, de fato, no fornece uma ideia global da distribuio dos valores de uma amostra (Dancey & ! -tdy, 2004). Por esse motivo, devemos recorrer a outras medidas ilr variabilidade.

    I lina medida mais informativa da variabilidade dos dados o ilr^vio padro, caracterizado pela medida de quanto os valores 4a nossa amostra variam em torno da mdia. Para calcul-lo, tu 1 1 ssrio, antes, calcular a varincia da distribuio de dados,

    tiramos explicar aqui esses conceitos da forma mais intuitivat * - llVt1.

    1 V- forma simplificada, se subtrairmos a mdia de cada valor ivado, obteremos os desvios, que so uma indicao de quo

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  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    longe cada um desses valores est da mdia. Cada um dos desvios

    deve ser elevado ao quadrado para evitar valores negativos. Feito isso, pode calcular-se a mdia dos desvios ao quadrado para obter uma indicao da variabilidade do conjunto como um todo. Esse resultado conhecido como varincia e, embora seja usada de vrias maneiras pelos estatsticos, ela nos d um nmero inflado, pois baseada nos quadrados dos desvios, e no nos prprios desvios em si. Para obtermos uma medida compatvel com os valores originais das nossas variveis, utilizamos a raiz quadrada da varincia, que denominada desvio padro (Dancey & Reidy,2004). Considerados juntos, a mdia e o desvio padro nos dizem muito sobre o nosso conjunto de dados, pois, em geral, quanto maior o desvio padro, maior a variabilidade das respostas (Glas- sman & Hadad, 2008).

    Diferenas entre grupos

    Uma vez compreendido que as medidas de tendncia central servem para resumir e organizar um conjunto de dados, necessrio entender como isso funciona na vida real. No raro encontrar, nos diferentes estudos realizados em psicologia, perguntas tratando de diferenas entre grupos. Por exemplo, as mulheres so mais ciumentas do que os homens? Essa pergunta poderia ser apresen-

    tada, em termos de diferenas entre grupos, da seguinte maneira: Existem diferenas entre mulheres e homens em relao ao cime?

    Muitos so os delineamentos possveis para responder a essa

    pergunta, isto , podem-s utilizar distintas tcnicas e mtodos para responder a ela.

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  • i viveram felizes para sempre": a longa (e necessria) relao entre psicologia e estatstica

    Uma das possibilidades aplicar um instrumento (teste) que iiv.ilie o cime, em homens e mulheres, e, ento, comparar a pontuao que cada um dos grupos obteve no instrumento em i|iiesto. Contudo, para tornar possvel essa comparao, deve-se calcular a mdia de cada um desses grupos. S para relembrar, umio j foi explicado, a mdia nada mais do que a soma dos valores dividida pelo nmero de valores. Por exemplo, se o grupo dc mulheres era composto por 3 mulheres e cada uma obteve uma pontuao igual a 2 no teste de cime, ento teremos (2 + 2 +l ) / \ isto , a soma dos valores que cada mulher teve dividida pelo mi mero (quantidade) de valores. O resultado, no caso, seria 2.

    ii Outro exemplo, em um estudo realizado por Lopes e cols.) (^006), os pesquisadores buscaram verificar possveis diferenas

    Mure homens e mulheres em relao neofobia alimentar, que se n crc a uma relutncia em ingerir alimentos novos. Portanto, o objetivo do estudo foi verificar se homens apresentam mais relu- i'nida do que mulheres, ou vice-versa. No estudo, participaram J

  • Avaliao psicolgica: guia de consulta para estudantes e profissionais de psicologia

    desse procedimento estatstico, consideram-se diferenas intra- grupo, ou seja, quanto as respostas das pessoas de um dos grupos varia, diferenas entre grupos, isto , se h uma tendncia (mdia) para um grupo obter pontuaes (escores) inferiores ou superiores em relao ao outro grupo.

    Geralmente, dois grupos distintos no apresentaro mdias e variaes idnticas, por isso, na maior parte dos casos, existiro diferenas entre dois grupos. Contudo, ser que as diferenas entre os grupos so suficientes ou significativamente grandes do ponto de vista estatstico? E, se forem, qual a chance de sere