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A DINÂMICA SOCIOECONÔMICA DAS COMUNIDADES RURAIS AMAZÔNICAS: O CASO DA COMUNIDADE DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO – PARINTINS – AM. Lindomar de Jesus de Sousa Silva 1 Gilmar Antonio Meneghetti 2 José Olenilson C. Pinheiro 3 Rosangela dos Reis Guimarães 4 Grupo de Pesquisa: Agricultura familiar e ruralidade (7) Resumo No Brasil, os modelos e referências adotados para o fortalecimento das unidades de produção familiar visando o desenvolvimento das comunidades rurais, com base na sustentabilidade, em especial, na Amazônia, precisam de uma melhor investigação em vários aspectos, dentre os quais, a identificação de parâmetros que sejam mais representativos das realidades locais, e que possam subsidiar a elaboração de programas e políticas públicas voltadas para o desenvolvimento rural. O presente trabalho visa contribuir na construção de parâmetros que sirvam de base para a introdução de tecnologias adequadas em comunidades rurais amazônicas, considerando a estrutura social e agrária, bem como a produção e a organização, com a finalidade de compreender melhor as realidades locais. A comunidade de Nossa Senhora do Rosário no município de Parintins (AM) foi escolhida para estudo, e através da aplicação de questionários e entrevistas foi possível analisar sua dinâmica socioeconômica. O levantamento exploratório realizado com agricultores familiares da referida comunidade permitiu algumas reflexões, tais como: necessidade de reformular o olhar sobre as comunidades e a geração de tecnologias adequadas para o ambiente em estudo; a heterogeneidade entre comunidades e unidades de produção, impossibilita a participação de todos os agricultores na lógica de mercado propagada na sociedade; a comunidade de nossa Senhora do Rosário, assim como outras comunidades amazônicas evidencia a necessidade de se desafiar para a geração de tecnologias adequadas à agricultura familiar da Amazônia, que aumente a produtividade e reduza a “penosidade” do trabalho. Palavras-chave: agricultura familiar; dinâmica socioeconômica; desenvolvimento rural. 1 Sociólogo, M.Sc.,Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 CEP 69010-970 Manaus AM. [email protected] 2 Agrônomo, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 CEP 69010-970 Manaus AM. [email protected] 3 Economista, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM. [email protected] 4 Agrônoma, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM. [email protected]
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Nov 10, 2018

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A DINÂMICA SOCIOECONÔMICA DAS COMUNIDADES RURAIS AMAZÔNICAS: O CASO DA COMUNIDADE DE NOSSA SENHORA DO

ROSÁRIO – PARINTINS – AM.

Lindomar de Jesus de Sousa Silva1 Gilmar Antonio Meneghetti2 José Olenilson C. Pinheiro3

Rosangela dos Reis Guimarães4

Grupo de Pesquisa: Agricultura familiar e ruralidade (7) Resumo No Brasil, os modelos e referências adotados para o fortalecimento das unidades de produção familiar visando o desenvolvimento das comunidades rurais, com base na sustentabilidade, em especial, na Amazônia, precisam de uma melhor investigação em vários aspectos, dentre os quais, a identificação de parâmetros que sejam mais representativos das realidades locais, e que possam subsidiar a elaboração de programas e políticas públicas voltadas para o desenvolvimento rural. O presente trabalho visa contribuir na construção de parâmetros que sirvam de base para a introdução de tecnologias adequadas em comunidades rurais amazônicas, considerando a estrutura social e agrária, bem como a produção e a organização, com a finalidade de compreender melhor as realidades locais. A comunidade de Nossa Senhora do Rosário no município de Parintins (AM) foi escolhida para estudo, e através da aplicação de questionários e entrevistas foi possível analisar sua dinâmica socioeconômica. O levantamento exploratório realizado com agricultores familiares da referida comunidade permitiu algumas reflexões, tais como: necessidade de reformular o olhar sobre as comunidades e a geração de tecnologias adequadas para o ambiente em estudo; a heterogeneidade entre comunidades e unidades de produção, impossibilita a participação de todos os agricultores na lógica de mercado propagada na sociedade; a comunidade de nossa Senhora do Rosário, assim como outras comunidades amazônicas evidencia a necessidade de se desafiar para a geração de tecnologias adequadas à agricultura familiar da Amazônia, que aumente a produtividade e reduza a “penosidade” do trabalho. Palavras-chave: agricultura familiar; dinâmica socioeconômica; desenvolvimento rural.

1 Sociólogo, M.Sc.,Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM. [email protected] 2 Agrônomo, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM. [email protected] 3 Economista, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29 – Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM. [email protected] 4 Agrônoma, M.Sc., Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA. Rodovia AM 010 – Km 29

– Estrada Manaus/Itacoatiara, Caixa Postal 319 – CEP 69010-970 – Manaus – AM.

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Abstract In Brazil, the models and references adopted for strengthening family production units for the development of rural communities based on sustainability, particularly in the Amazon need better research in several aspects, among which, the identification of parameters that are more representative of local realities, and can support the development of programs aimed at rural development policies. The present work aims to contribute to building parameters as a basis for the introduction of appropriate technologies in rural Amazonian communities, considering the social and agrarian structure as well as the production and organization, in order to better understand local realities. The community of Nossa Senhora do Rosário in the city of Parintins (AM) was chosen for study, and through the use of questionnaires and interviews it was possible to analyze their socio-economic dynamics. The exploratory survey of farmers of that community allowed some thoughts such as: need to redesign the look on communities and generating suitable for the environment in study technology; heterogeneity among communities and production units, precludes the participation of all farmers in the market logic propagated in society; the community of Nossa Senhora do Rosário, as well as other Amazonian communities highlights the need to challenge for generating suitable technologies for family farming in the Amazon, which increase productivity and reduce the "painfulness" of work. Keywords: family farming; socioeconomic dynamics; rural development.

1.Introdução

As estratégias de desenvolvimento das comunidades amazônicas com base na sustentabilidade consistem em um grande desafio para as instituições públicas e privadas, que ao longo do tempo apresentaram a essas comunidades, modelos e referências construídos em lugares distantes e contextos diferentes do existente na Amazônia. Com isso, muitas iniciativas tornaram-se inviáveis ao fortalecimento das unidades de produção familiar. O presente trabalho visa contribuir na construção de parâmetros que sirvam de base para a introdução de tecnologias adequadas em comunidades rurais amazônicas. Esses parâmetros devem considerar a estrutura social e agrária da comunidade, a produção e a organização, com a finalidade de compreender melhor as realidades locais. Assim sendo, busca-se adequar e qualificar a intervenção a ser realizada. Esta tentativa de compreensão da realidade foi desenvolvida na comunidade Nossa Senhora do Rosário, Vila Amazônia, assentamento situado no município de Parintins, no Estado do Amazonas. No diagnóstico realizado, fica evidente que a diversidade na agricultura familiar decorrente de um processo histórico e a introdução de fatores relacionados à contemporaneidade influenciam diretamente na adoção de tecnologias. As informações apresentadas são fruto de uma pesquisa realizada com 25% dos moradores da comunidade Nossa Senhora do Rosário, usando como técnica a coleta de informações através de questionários e entrevistas. Com isso, foram obtidos dados que permitem uma leitura da dinâmica socioeconômica apresentada pela comunidade em questão. Entre as considerações que podem ser trazidas a partir da pesquisa, citamos a tendência ao envelhecimento da comunidade, a importância da produção de mandioca e banana para o autoconsumo e comercialização, a contribuição econômica extrativa para os

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estabelecimentos rurais familiares, que muitas vezes é relegada a segundo plano pelas instituições públicas e privadas. Assim sendo, verificou-se que há necessidade de se estabelecer novos parâmetros e novas propostas de desenvolvimento para as comunidade amazônicas, tendo a clareza que é preciso pensar em estratégias de produção articulando o potencial das unidade de produção, a segurança alimentar e o abastecimento de pequenos mercados locais num perspectiva de sustentabilidade e desenvolvimento, voltados a evitar o aumento dos passivos ambientais e sociais. 1.1. Contextualização: o assentamento Vila Amazônia As terras do assentamento Vila Amazônia são habitadas por gerações que ocupam as áreas de terra firme e várzea, formando comunidades rurais alicerçadas na relação de parentesco e vizinhança. Essa formação favoreceu a superação de limitações econômicas e de trabalho com a organização de estratégia coletiva como o puxirum5, a propagação de valores e mitos enraizada no habitat natural da região. No campo da produção, essas famílias desenvolveram a pesca, caça, coleta e agricultura com mão de obra familiar, tendo como base a estreita relação com floresta. A Vila Amazônia foi o local escolhido para o assentamento e instalação de colonos japoneses, que desenvolveram o cultivo de arroz e outras culturas agrícolas, porém, a cultura de maior destaque foi a juta. Nesse período, segundo Saunier (2003), a Vila Amazônia criou uma infraestrutura voltada a auxiliar a colônia japonesa, além de um templo para as reuniões, olarias, serrarias, armazéns e casas para os trabalhadores. Com a juta, o porto tornou-se importante para a região amazônica (Souza, 1998). A interrupção desse processo ocorreu com a segunda grande guerra, quando o Japão se aliou à Alemanha e à Itália, forçando os japoneses a se retirarem do Brasil. Tais aspectos produziu um grande impacto negativo na economia do município de Parintins-AM. O governo federal através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA criou o Projeto de Assentamento (PA) Vila Amazônia visando atender 1.800 famílias de agricultores tradicionais na área do projeto da colonização japonesa. Os lotes no assentamento tinham a mesma dimensão do projeto de colonização japonesa, aproximadamente 25 hectares por lote (PRA:2005-2007/MDA-INCRA, 2007). A dimensão socioeconômica e cultural dos habitantes das terras do assentamento Vila Amazônia, em especial a comunidade Nossa Senhora do Rosário, está profundamente relacionada a um processo histórico marcado pela presença de povos indígenas na região como os Mundurucus, assim como, comunidades remanescente de quilombos e descendentes de nordestinos, transplantados para região no período do auge da borracha, do final do século XIX até 1914, e durante a Segundo Guerra Mundial6

A comunidade Nossa Senhora do Rosário está localizada no Projeto de Assentamento de Vila Amazônia do INCRA, situado no município de Parintins-AM, com

5 A palavra puxirum remete à língua nhengatu falada no Brasil até hoje por tribos indígenas e que significa

“reunião de esforços em prol de um objetivo comum” (RUSSO, 2007, p.199). Nas comunidades o puxirum é uma expressão de ação coletiva, de ligação com as comunidades, para a diferenciação e a busca de superação de necessidade e do individualismo. Os comunitários constantemente destacam o puxirum como uma estratégia coletiva de superação das limitações. 6 Com a decadência da economia gomífera, muito nordestinos ficaram na região amazônica, ocupando pequenos extensões de terra onde passaram a desenvolver atividades extrativistas como a coleta da castanha, a extração de pau-rosa e a produção agrícola, principalmente, a mandioca.

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uma composição de aproximadamente 70 famílias com forte enraizamento na agricultura familiar, no extrativismo e na pesca.

Para Serra e Andrade (2013, p.8), há pouco registro relacionado ao surgimento da comunidade de Nossa Senhora do Rosário, porém a narrativa dos “moradores mais antigos” diz que a mesma existe a mais de 100 anos. Na sua formação, a comunidade no decorrer do tempo, agregou imigrantes oriundos do Estado do Pará e da região do nordeste brasileiro7.

Mesmo de origens geográficas diversas, a população em suas diferentes gerações, constrói uma identidade e uma cultura amazônica no modo de vida, na forma de produzir para o consumo ou para a comercialização. Embora haja uma identidade enquanto categoria “agricultores familiares,” nota-se uma heterogeneidade acentuada entre as unidades de produção, seja ela nas estratégias de reprodução social, de tentativa de inserção nos mercados ou, simplesmente, buscando manter o modo e o estilo de vida. Pensar as comunidades a partir de suas peculiaridades e compreendê-las, exige uma postura inicial capaz de entender o potencial sociocultural e econômico dessas comunidades construídas em íntima relação com o meio ambiente. Nesse aspecto, é preciso pensar não somente no crescimento, na acumulação e no mercado concorrencial e monetarizado. Tal procedimento requer um novo parâmetro de mensuração de impactos baseados não somente em dados quantitativos, na ampliação de renda e no capital. Tem que ser capaz de compreender elementos como o bem estar psicológico, bem estar ecológico e padrão de vida (saúde, educação, cultura, uso do tempo, vitalidade comunitária e boa governança). 1.2. O lugar como conceito para pensar estratégias de desenvolvimento das comunidades rurais na Amazônia. O lugar tem sido resgatado por autores como Escobar (2005) a partir de uma perspectiva da ecologia política8. Tal abordagem vem adquirindo grande relevância nas reflexões contemporâneas relacionadas ao lugar, conhecimento local, questão ambiental,

7 As primeiras famílias, segundo relatos de antigos moradores, foram as de Francisco Eleutério, Maria Giroca, José Rodrigues. Acompanhado pelas primeiras famílias migrantes dos senhores Esmerindo Soares Barbosa (cearense), Antônia Ferreira de Matos (paraense), Manoel Oliveira e dona Zuleide, Maria Ramos e Davi Assis, Filomena Barbosa, Fulgêncio José Ramos e Balbina Figueira Ramos, Isabel Mourão e Raimundo Mourão, Antonio Assis, Raimunda Leal, entre outras famílias não destacadas, que iniciaram o processo de povoamento e posteriormente o surgimento da comunidade Nossa Senhora do Rosário do Lago do Máximo

(SERRA E ANDRADE, 2013, p.8).

8 A ecologia política constitui um campo capaz de articular discussões teóricas e políticas que analisam os

conflitos ecológicos distributivos, ou conflitos socioambientais. Este campo nasceu a partir dos estudos de caso locais pela geografia e antropologia, porém ultrapassa os problemas locais e tem se estendido a níveis nacionais e internacionais. Para Martínez-Alier (2007, p.113) “O campo da ecologia política está agora se movimentando para além das situações rurais locais, na direção de um mundo mais amplo. A ecologia política estuda os conflitos ecológicos distributivos. Por distribuição ecológica são entendidos os padrões sociais, espaciais e temporais de acesso aos benefícios obtidos dos recursos naturais e aos serviços proporcionados pelo ambiente como um sistema de suporte da vida. Os determinantes da distribuição ecológica são em alguns casos naturais, como o clima, topografia, padrões pluviométricos, jazidas de minerais e a qualidade do solo. No entanto, também são claramente sociais, culturais, econômicos, políticos e tecnológicos”.

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desenvolvimento capitalista e outros9. A produção teórica de Escobar tem possibilitado o retorno de aspectos marginalizados e ausentes com a prevalência do desenvolvimento capitalista e a globalização. Para o autor, “desaparecimento do lugar está claramente vinculado à invisibilidade dos modelos culturalmente específicos da natureza e da construção dos ecossistemas. Somente nos últimos anos é que percebemos este fato”. Escobar (2005, p.69) em sua análise retoma o conceito de “lugar”10, enquanto “experiência de uma localidade específica com algum grau de enraizamento, com conexão com a vida diária, mesmo que sua identidade seja construída e nunca fixa–continua sendo importante na vida da maioria das pessoas, talvez para todas”. Sendo assim, “a reafirmação do lugar, o não capitalismo, e a cultura local oposto ao domínio do espaço, o capital e a modernidade, os quais são centrais no discurso da globalização, deve resultar em teorias que tornem viáveis as possibilidades para reconceber e reconstruir o mundo a partir de uma perspectiva de práticas baseadas no lugar”. O lugar como aspecto presente na reflexão de Escobar se aproxima das abordagens realizadas por Santos (1988, p.15) para quem o lugar é um conceito que garante uma abordagem mais próxima das individualidades e as vivências, servindo como norteador para as reflexões. No lugar é possível resgatar a expressão singular dos fenômenos globais que influenciam a sociedade, sendo possível com a sua análise tornar viável a expressão mais especifica11.

[...] um cotidiano compartilhado entre as mais diversas pessoas, firmas e instituições - cooperação e conflito são à base da vida em comum. Porque cada qual exerce uma ação própria, a vida social se individualiza; e porque a contiguidade é criadora de comunhão, a política se territorializa, com o confronto entre organização e espontaneidade. O lugar é o quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vêm solicitações e ordens precisas de ações condicionadas, mas é também o teatro insubstituível das paixões humanas, responsáveis, através da ação comunicativa, pelas mais diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade.

Para Suertegaray (2000), o lugar é composto fundamentalmente pelos sentimentos de pertenciamento ou não do indivíduo em relação ao espaço, produzido a partir da afetividade, da sensação de pertencimento, do modo como nos adaptamos e nos

9 Escobar (2005, p.18) diz que a ecologia política constitui um campo de conhecimento que busca figurar sobre uma questão da natureza, que tem de se constituir como uma das principais questões dos primórdios aos dias atuais e de difícil solução. Segundo o autor, no final do século XX a questão da natureza permanece não resolvida em qualquer ordem social ou epistemológica moderna. Com isso eu me refiro não somente à inabilidade dos povos modernos em encontrar meios para lidar com a natureza sem destruí-la, mas também ao fato de que as respostas dadas por formas modernas de conhecimento para “a questão da natureza”– das ciências naturais às ciências humanas – provaram-se insuficientes para a tarefa, apesar do avanço reconhecível que parece ter sido dado nas últimas décadas. 10 Para Escobar (2005, p.136) é preciso ter cuidado para não essencializar o lugar. “Os lugares são criações históricas, que devem ser explicados, não assumidos, e esta explicação deve levar em conta as maneiras pelas quais a circulação global do capital, o conhecimento e os meios configuram a experiência da localidade”. 11 Na análise de Aigner (2006, p.211) é importante compreender que o “[...] o dia-a-dia dos lugares entra em contradição com este mundo globalizado, que, na realidade, é apenas economicamente e competitivamente globalizado, mas não integrado.” Esse contato, faz com que as particularidades sejam influenciadas pela rede global, o que influencia diretamente na forma da própria identidade. Da interação do global com o local se tem a organização do lugar, que reflete a experiência do indivíduo com o mundo – isso envolve as dimensões naturais e sociais.

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apropriamos das realidades globais que se introduzem no local, que dão sentido à própria distribuição objetiva das coisas e das pessoas nessa porção do espaço geográfico12. Relph (1979) diz que o lugar é produto da experiência humana, o que significa que o mesmo assume um sentido maior que o sentido geográfico de localização. Sendo assim, o lugar não se refere a objetos e atributos das localizações. Tuan (1975) diz que o lugar é um centro de significados construídos pela experiência, isto é, trata-se na realidade de referenciais afetivos desenvolvidos ao longo de nossas vidas na convivência com o lugar e com o outro. Mello (1990) diz que os lugares são carregados de sensações emotivas principalmente porque nos sentimos seguros e protegidos. Buttimer (1985, p.228) diz que “lugar é o somatório das dimensões simbólicas, emocionais, culturais, políticas e biológicas”. Tuan (1995) diz que o lugar é criado pelos seres humanos para os propósitos humanos, o mesmo autor diz ainda que há uma estreita relação entre experiência e tempo, na medida em que o senso de lugar raramente é adquirido pelo simples ato de passarmos por ele. O lugar permite uma compreensão da especificidade que tem como base os processos históricos, linguísticos e culturais e certa especificidade do lugar. Sendo assim, a etnografia, a documentação destes conjuntos de significados/usos devem estar situados nos contextos mais amplos de poder e articulação e em geral com outros regimes de natureza e forças globais. No âmbito da presente abordagem o lugar surge como aspectos a ser considerado na construção de tecnologias voltadas a possibilitarem um aperfeiçoamento das práticas e conhecimento de comunidades rurais na Amazônia, voltada a garantir a desenvolvimento e a sustentabilidade visando a redução do passivo ambiental e social. 2. Metodologia

O presente estudo sistematiza as informações obtidas na comunidade Nossa Senhora do Rosário, localizada na área de abrangência do Projeto de Assentamento de Vila Amazônia, município de Parintins. As informações foram obtidas por meio de entrevistas realizadas com 25% dos responsáveis pelas unidades de produção familiar da comunidade, buscando entender a dinâmica socioeconômica e produtiva das unidades. As informações sobre a comunidade de Nossa Senhora do Rosário fazem parte de um projeto maior, que visa estabelecer o perfil socioeconômico de 10 comunidades do assentamento, prospectando a adequação de tecnologias para atender os agricultores familiares de Parintins.

O procedimento de pesquisa adotado neste trabalho foi o estudo de caso que, segundo Gil (1999, p.73), é caracterizado pelo “estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir conhecimentos amplos e detalhados do mesmo, tarefa praticamente impossível, a outros tipos de delineamentos considerados”. Como instrumento para coleta de dados em campo, foram utilizados questionários, cujos dados posteriormente foram tabulados, analisados e deles derivaram os resultados. Os questionários foram distribuídos aleatoriamente nas unidades de produção familiar. As

12 Nessa perspectiva Bachelard (1989, p. 19) diz que “nossas investigações mereceriam o nome de topofilia. Visam determinar o valor humano dos espaços de posse, dos espaços defendidos contra forças adversas, dos espaços amados”. Com isso, em um mesmo local pode ser construído diversos lugares, já que as dimensões da subjetividade e dos significados atribuídos, vão promover uma lógica própria para a organização e vivência desse local.

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entrevistas foram realizadas com algumas lideranças da comunidade e produtores familiares.

Foram investigados, também, dados secundários disponíveis. Na perspectiva de alcançar os objetivos, os dados foram analisados a partir de uma visão sistêmica para que propiciasse absorver as especificidades da realidade da comunidade, uma vez que os fatos sociais não podem ser entendidos, quando considerados isolados dos contextos político, econômico, ambiental, cultural e social. A natureza da pesquisa teve um cunho quantitativo e qualitativo.

3. Informações e discussões iniciais A pesquisa procurou medir alguns elementos presentes na vida da comunidade e

que contribuem para a dinâmica econômica e social da mesma. Um deles diz respeito à idade das pessoas que moram no local (figura 1). A propósito do tema, buscou-se saber sobre a idade dos responsáveis pelas unidades de produção familiar (upf). As informações dão conta de que 75% dos responsáveis pelos estabelecimentos estão numa faixa etária entre 30 e 50 anos, 13% entre 51 e 60 anos e, apenas 6% tem entre 15 a 29 anos, mesma porcentagem para os que possuem mais de 60 anos. Esses dados mostram que a comunidade segue a tendência nacional de envelhecimento dos agricultores familiar, de acordo com o IBGE, 2010.

Ao analisar o meio rural, observa-se que a estratificação dos responsáveis pelos

estabelecimentos em faixas etárias permite analisar a disponibilidade de unidades de trabalho para as atividades, e o potencial de investimentos na infraestrutura produtiva da propriedade. A faixa dos 15 aos 29 anos coloca a necessidade de estruturas organizacionais ligadas à educação e ao lazer na comunidade. Talvez se possa afirmar que esta é a faixa de idade mais susceptível aos ”encantos” da vida urbana. Outro aspecto da estratificação é a possibilidade de se fazer projeção da dinâmica econômica e social da comunidade e a continuidade da mesma ao longo do tempo. A idade dos responsáveis pelos estabelecimentos impacta sobre o sistema produtivo da unidade de produção.

As atividades rurais estão atreladas à idade e disponibilidade de mão de obra. Pessoas jovens no estabelecimento significa a possibilidade de sucessão na condução da unidade de produção. Os investimentos, independentemente do tamanho, estão atrelados ao fator idade e à disponibilidade de mão de obra na agricultura familiar. Dificilmente, alguém com mais de 50 anos de idade faz investimentos produtivos, com retorno projetado para o médio e longo prazos, a menos que tenha um sucessor no estabelecimento. A discussão do desenvolvimento local também passa necessariamente pela análise do perfil das pessoas que desenvolvem as atividades no local, principalmente quando se trata de unidades de produção familiar.

Figura 1: Idade do responsável pela unidade

de produção familiar

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Um segundo aspecto pesquisado foi a estrutura fundiária (figura 2). A pesquisa evidencia que a 56% dos estabelecimentos da comunidade possuem entre 20 a 30 hectares de terra na comunidade. O fator terra é um dos recursos mais importantes no processo produtivo.

A disponibilidade de terra nos estabelecimentos pesquisados na comunidade é maior que a média dos estabelecimentos do Estado do Amazonas como se pode observar na comparação dos gráficos.

A figura 3 mostra a estrutura fundiária no Estado do Amazonas feita a partir dos dados do IBGE, censo agropecuário 2005 e 2006. Evidenciando a elevada heterogeneidade em termos de tamanho de áreas, variando desde famílias que não tem terra para cultivo até estabelecimentos rurais com mais de 2.500 hectares de terra.

Apesar da maior disponibilidade de terra para as famílias no assentamento de Vila Amazônia – Parintins – AM e mais especificamente na comunidade de Nossa Senhora do Rosário, as observações dão conta que não há uma maior produção de alimento na comunidade, seja para consumo da família ou para o mercado, quando comparado a outras comunidades de igual estrutura fundiária ou maior. Na comunidade o tamanho médio de área por estabelecimento familiar situa-se em 25 ha, sendo que o uso da mesma para as atividades não ultrapassa os 12% do total da área.

Nas unidades de produção familiar há uma predominância do cultivo da mandioca e da banana como fonte de alimento para a família e também para a geração de renda, porém,

Figura 2: Estratos de área e percentual de

estabelecimentos na comunidade de Nossa

Senhora do Rosário, Parintins (AM)

Fonte: IBGE, 2006. Figura 3: Extrato de áreas do Amazonas e percentual sobre o total, IBGE(2006).

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uma parte significativa das unidades de produção realiza atividades extrativas incluindo aqui a coleta de frutos e produtos florestais não madeiráveis como a andiroba e a copaíba para extração do óleo.

A pesquisa apontou que a principal atividade agrícola da comunidade é a produção de mandioca, seguida da banana, extrativismo, que inclui o cupuaçu, pupunha, abacate e castanha. Há produtores de feijão, macaxeira, abacaxi e limão, culturas que ainda são muito incipientes na comunidade (figura 4). A mandioca e a macaxeira estão presentes em metade dos estabelecimentos pesquisados. É a base da dieta energética da população amazonense e da comunidade.

As unidades de produção familiar podem

extrair da floresta uma gama imensa de produtos. Há uma diversidade grande de frutas e de produtos da floresta que são naturalmente encontrados na Amazônia (figura 5). A atividade extrativa faz parte do modo de vida amazônico contribuindo para a geração de renda e alimentos para a família e para os mercados locais. A pesquisa mostrou que são encontradas nas unidades de produção mais de 23 espécies de frutos, além de outras culturas. Cabe ressaltar que essa variedade de espécies “úteis” pode ser muito maior.

Algumas espécies florestais entram na geração de renda na comunidade de forma complementar. A grande diversidade de espécies propicia a geração de renda diversificada ao longo do ano. Entre essas espécies estão: andiroba presente em 28% dos estabelecimentos, a Castanha-do-Brasil em 17%, o açaí em 31%, a copaíba em 14%, Pau-Rosa em 10% e o Cedro em 9% (figura 6). É importante considerar que essas espécies compõem uma rica e diversificada fauna e que, talvez haja um número bem maior, que não foi relatado no presente levantamento, por não ser o foco do estudo.

As atividades que são propostas para melhorar a produção, a renda e a dieta dos comunitários precisa considerar a possibilidade do acesso dos agricultores à tecnologia. Neste aspecto é notório o quanto ainda é necessário evoluir. O trabalho de campo mostrou que há uma grande maioria de agricultores que

Figura 4: Atividades agrícolas em

Nossa Senhora do Rosário, Parintins

(AM), 2013.

Figura 5: Produção de frutas, Nossa Senhora do

Rosário, Parintins (AM), 2013.

Figura 6: Espécies florestais

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somente dispõem da enxada e do terçado para o desenvolvimento de suas atividades produtivas (figura 7).

A limitação tecnológica aliada às dificuldades decorrentes do envelhecimento da população, o abandono e o desprezo pela agricultura por parte dos jovens pode ser um elemento que contribui para a diminuição da produção agrícola, principalmente para a redução da diversificação produtiva nas unidades

familiares.

A melhoria da produtividade e a redução da “penosidade” do trabalho são fatores

possivelmente decisivos para a permanência dos jovens no meio rural. A tecnificação e mecanização que em meados do século passado foram causas do êxodo rural, hoje a presença delas pode definir a continuidade da produção e da dinâmica produtiva da unidade de produção familiar.

Em relação a composição da renda, o levantamento mostra que 56% dos agricultores tem acesso aos programas de transferência da renda como o bolsa família e a aposentadoria e, 38% relatam ter somente renda de atividades agrícolas (figura 8).

Outro aspecto que precisa ser considerado é a organização da comunidade. Os relatos históricos mostram que sempre existiu na comunidade uma pré-disposição em participar de ações coletivas. Na região do baixo-amazonas, em cidades como Juruti, Maués e Parintins é comum os relatos de puxiruns (mutirão) como estratégia coletiva de superação das limitações econômicas e físicas.

Esta predisposição à participação e busca de bem estar coletivo, pelas informações colhidas na comunidade não se configura da mesma forma para todas as famílias, já que, apesar de todos os entrevistados serem filiados a cooperativa, 56 % participam das atividades, 31% não participam e 13 % não responderam (figura 9).

Figura 8: Composição da renda dos agricultores

familiraes

Figura 7: Equipamentos disponíveis nas

atividades agrícolas

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Este quadro relacionando a participação coloca o desafio de repensar a estrutura organizativa da comunidade as limitações das estruturas de cooperação e associação. Para isso evidentemente é necessário antes aprofundar e concluir o diagnóstico. Para Maneschy et al. (2008) em estudos realizados em comunidade no Estado do Pará, muitas vezes o insucesso das organizações formadas nas comunidades estava relacionado ao fato de serem criadas visando o acesso a recursos financeiros, o que muitas vezes devido a estrutura burocrática e divergente da lógica comunitária, acabava levando ao fracasso da organização e ao endividamento dos associados, além de considerar o fato de que os agricultores não estavam habituados aos procedimentos burocráticos exigidos pela legislação que rege esse modelo institucional no Brasil.

No relatório da audiência pública realizada em Parintins, em 2010, a respeito do setor primário diz que o “baixo índice de produtividade é um obstáculo enfrentado pela ATER no fomento ao cooperativismo e ao associativismo, haja vista que, nas constituições dessas tiveram como objetivo a busca de créditos sem, realmente, estarem voltadas às suas finalidades principais”.

A construção de parâmetros voltados à sustentabilidade em comunidades amazônicas, precisa compreender que a natureza é uma fonte de vida material e imaterial, com indivisível relação entre os mundos humanos, material e espiritual (Escobar, 1995). O grande desafio consiste em desenvolver tecnologias capazes de servir aos distintos modos de vida e às diferentes culturas, favorecendo a preservação da biodiversidade. Em síntese, é preciso a construção de estratégias compatíveis com as condições ecológicas e capazes de incorporar as identidades étnicas e valores culturais. Os resultados obtidos com a pesquisa na comunidade Nosso Senhora do Rosário mostra que a limitação técnica, econômica e organizacional dificultam a produção das unidades familiares, principalmente dentro da lógica competitiva do mercado. Sendo assim, fica o desafio de se construir um parâmetro capaz de incluir pequenos agricultores, em uma lógica que atenda a geração de renda, a segurança alimentar e a sustentabilidade evitando a “exclusão” dos agricultores e o aumento do passivo ambiental e social. Através da pesquisa evidencia-se uma demanda tecnológica da comunidade voltada a atender os interesses dos agricultores, que tem dificuldades em absorver um pacote tecnológico pautado em múltiplos procedimentos racionais, técnicos, com forte prevalência de aplicação de insumos externos ao estabelecimento e que, paradoxalmente, possuem em suas unidades de produção uma diversificação de recursos naturais, relacionados à fauna e à flora. 4. Considerações finais

O levantamento exploratório realizado com agricultores familiares da comunidade de Nossa Senhora do Rosário, no assentamento Vila Amazônia, município de Parintins –

Figura 9: Participação dos agricultores em

cooperativas

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AM, traz informações que permitem algumas reflexões. A primeira delas é que precisa ser considerada a diversidade econômica, sociocultural e produtiva existente nas unidades de produção familiar. Este aspecto requer a reformulação do olhar sobre as comunidades e a geração de tecnologias adequadas para este ambiente.

Outra consideração a partir do estudo, é que há um grau de heterogeneidade entre comunidades e unidades de produção, e que impossibilita a participação de todos os agricultores na lógica de mercado propagada na sociedade. Entretanto, é possível construir um modelo de desenvolvimento com estas comunidades, que privilegie a segurança alimentar, a sustentabilidade e a inserção em mercados locais, com produção diversificada pautada no potencial endógeno de cada comunidade.

A comunidade de nossa Senhora do Rosário, assim como outras comunidades amazônicas evidencia a necessidade de se desafiar para a geração de tecnologias adequadas à agricultura familiar da Amazônia, que aumente a produtividade e reduza a “penosidade” do trabalho. Isso humaniza o trabalho dos que permanecem no campo e possibilita a inserção e permanência dos jovens nas unidades de produção familiar.

As informações obtidas nas pesquisa mostram a necessidade de se estabelecer metodologias e procedimentos capazes de absorver o saber local na geração, transferência e inovação de tecnologias para a agricultura familiar. Isso permite construir um desenvolvimento alicerçado na dinâmica específica das comunidade amazônicas.

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