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A Qumica dos Chs
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Vol. 36, N 3, p. 168-175, AGOSTO 2014Qum. nova esc. So Paulo-SP,
BR.
Qumica e Sociedade
A seo Qumica e sociedade apresenta artigos que focalizam
inter-relaes entre Cincia e sociedade, analisando o potencial e as
limitaes da Cincia na tentativa de compreender e solucionar
problemas sociais.
Recebido em 24/04/2013, aceito em 02/01/2014
Mara Elisa Fortes Braibante, Denise da Silva, Hugo T. Schmitz
Braibante e Maurcius Selvero Pazinato
O hbito de beber ch est presente na sociedade h milhares de
anos. A qumica envolvida nesse processo importante de ser utilizada
como estratgia didtica para promover uma aprendizagem
contextualizada da qumica orgnica. Neste trabalho, apresentamos a
histria, a origem, a qumica envolvida e a interface dos chs com a
sociedade. Ainda propomos diferentes possibilidades de aplicao
dessa temtica no ensino mdio.
chs, qumica orgnica, ensino de qumica
A Qumica dos Chs
Atualmente o ch uma das bebidas mais consumidas do mundo.
Caractersticas como agradvel aroma e sabor contriburam para a
popularizao dessa bebida, mas devido s suas propriedades medicinais
que esta se es-palhou pelas diversas culturas. Essas propriedades
devem-se presena, em sua composio qumica, de compostos
bio-logicamente ativos como: flavonoides, catequinas, polifenis,
alcaloides, vitaminas e sais minerais (Schmitz et al., 2005).
Os chs so preparados por infuses de plantas, que pro-duzem em
seu metabolismo substncias com propriedades especficas, chamadas de
princpios ativos. Neste trabalho, apresentamos um breve histrico e
a origem dos chs, bem como alguns princpios ativos de plantas
popularmente utiliza-das na forma de infuso, abordando suas
estruturas qumicas e descrevendo suas propriedades medicinais, alm
de possi-bilidades para a abordagem desse tema no ensino de
qumica.
Breve histrico dos chs
H inmeras citaes e lendas a respeito da histria dos chs, todas
impregnadas de mistrios e fbulas. Apesar de no sabermos ao certo se
so verdicas, elas apresentam da-dos com respaldos histricos que nos
permitem compreender
a importncia dessa bebida desde a antiguidade. Uma das lendas
mais conhecidas data de 2737 a.C. e relata que um imperador chins
teria sido o primeiro a saborear o ch. Segundo essa lenda, o
imperador Shen Nung, que s bebia gua fervida por medidas de
higiene, em um de seus passeios, parou para descansar sombra de uma
rvore, quando algu-mas folhas caram no recipiente em que ele havia
colocado gua para ferver. Ele no as retirou, observou-as e notou
que a gua ficou colorida. Impressionado, decidiu provar e achou a
bebida saborosa e revitalizante. No existem registros histricos que
comprovem essa histria, mas sabemos que os chineses produzem e
utilizam o ch desde a antiguidade (Trevisanato; Kim, 2000; Senna,
2013).
Uma das primeiras referncias escritas sobre o ch foi no ano de
200 a.C., em que um livro chins sobre plantas medicinais menciona
os efeitos desintoxicantes das folhas do ch. Esse registro indica
que nessa poca j se explorava algumas propriedades medicinais dessa
bebida (Valenzuela, 2004). J na era crist, nos sculos IV e V, os
chs e suas propriedades se tornaram mais conhecidos. Nesse perodo,
existiam inmeras plantaes no vale do Rio Yangtze tam-bm chamado de
Rio Amarelo, localizado na China, o que proporcionou o cultivo de
uma grande variedade de chs, que iam desde os refinados, oferecidos
aos imperadores, at os populares, consumidos por todos (Pettigrew,
1999).
Junto com a popularizao de suas propriedades be-nficas, o ch foi
se espalhando pelo mundo de diferentes
http://dx.doi.org/10.5935/0104-8899.20140019
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maneiras. Durante a Idade Mdia, a Europa ocidental rece-beu
inmeros carregamentos de especiarias vindos da sia e, dentre eles,
o ch. medida que foi se difundindo pelos diversos pases europeus,
foi recebendo diferentes denomi-naes provenientes dos dialetos de
cada regio, mantendo o sotaque de sua origem. Assim, o t da regio
de Fujian virou o th francs, o te italiano, o tea ingls e o tee
alemo. Os portugueses adquiriam o ch em Macau, colnia portuguesa na
China, onde se falava o dialeto cantons, que se parece com o
mandarim e, assim, o tch falado por eles chegou ao Brasil e ficou
conhecido como ch (Rhomer, 2002).
A tradio mundialmente conhecida como ch das cin-co foi
introduzida na Inglaterra por Anna Russel, duquesa de Bedford, em
meados de 1800. No entanto, o hbito de consumir o ch nesse pas se
deve a Catarina de Bragana, portuguesa que se casou com Carlos II,
rei da Inglaterra, Esccia e Irlanda, em 1662. Catarina era uma
grande apreciadora dessa bebida em Portugal e fez com que esse
costume ganhasse importncia e fosse considerado elegante pela
nobreza (Costa; Silva, 2011).
O consumo do ch foi se consolidando e hoje apresenta grande
importncia socioeconmica, sendo que cerca de trs bilhes de
toneladas so produzidas anualmente no mundo (Khan; Mukhtar, 2007).
Entretanto, a produo mundial do ch tem aumentado mais do que o
consumo, o que vem provo-cando reduo do seu preo. Em especfico no
Brasil, o cultivo do ch se concentra no Vale do Ribeira, em So
Paulo (SP), sendo que quase toda produo exportada (Lima et al.,
2009).
A origem do ch: Camellia sinensis
Originalmente os chs so provenientes da Camellia si-nensis, um
arbusto nativo da China que se reproduz em zonas de alta umidade e
de temperaturas amenas, independente da altitude (Dufresne;
Farnworth, 2000; Duarte; Menarim, 2006). Atualmente a Camellia
sinensis cultivada em mais de 30 pases tropicais e subtropicais
(Lima et al., 2009) e o signifi-cado do seu nome cientfico em latim
camlia da China, j que possui flores parecidas com as das camlias
(Figura 1).
relevante ressaltar que um s tipo de planta, a Camellia
sinensis, apresenta uma complexidade em sua composio
qumica (polifenis, alcaloides, minerais etc.), o que con-fere
uma variedade de sabores e aromas dependendo das condies de
cultivo, coleta, preparo e acondicionamento das folhas (Reto et
al., 2008). Uma caracterstica impor-tante dos chs provenientes da
Camellia sinensis que todos apresentam cafena em sua composio
qumica. A cafena, que pertence classe dos alcaloides, considerada
um estimulante da atividade cardiovascular e da circulao sangunea,
possui efeito sobre a funo mental e comporta-mental, produz
excitao, euforia, reduo da sensao de fadiga, aumento da atividade
motora, alm de poder afetar na qualidade do sono (Saigg; Silva,
2009). Na Figura 2, est representada a estrutura qumica da cafena,
na qual podemos observar dois anis heterocclicos fundidos.
A concentrao de cafena no ch inferior encontrada no caf. Em
ambos os casos, essa concentrao depende de vrios fatores, incluindo
a espcie da semente do caf ou folha de ch, local de cultivo,
granulaes da amostra etc. No caso do ch, a localizao da folha na
planta afeta a sua concentrao de cafena, sendo descrito na
literatura ndices variveis (Brenelli, 2003). Em geral, uma xcara de
caf contm aproximadamente 25% de cafena, enquanto que uma xcara de
alguns tipos de ch pode conter at 6% (Valenzuela, 2004). Outro
estudo que analisou a concentrao de cafena nessas bebidas o de
Bortoline et al. (2010), cujos valores encontrados foram: 34,81%
para o caf e 15% para o ch preto. A diferena encontrada nos ndices
de cafena nessas pesquisas pode ser decorrente dos fatores
supracitados, mas pertinente ressaltar que corroboram com a
proposio de que uma xcara de ch contm menor quantidade de
cafena.
Na planta Camellia sinensis, esto presentes componentes qumicos
que so considerados potentes oxidantes. A principal diferena entre
os tipos de ch provenientes dessa planta est baseada nas reaes de
oxidao-reduo que ocorrem em suas folhas. Essas reaes so catalisadas
pelas enzimas polifenolo-xidases e peroxidases que so liberadas dos
vacolos celulares quando as folhas so picadas ou trituradas e,
posteriormente, para que a reao prossiga, so expostas ao oxignio do
ar (Matsubara; Amaya-Rodriguez, 2006; Dartora, 2010).
Aps o desenvolvimento de muitas pesquisas, os chs foram
classificados em quatro principais tipos: branco, verde, oolong e
preto. Dessa forma, pode-se afirmar que todos pos-suem a mesma
origem, provenientes da Camellia sinensis, mas se diferem na
modalidade de seu processamento. Sendo assim, o grau de oxidao o
que determina o tipo de ch que ser obtido.
Figura 2: Estrutura qumica da cafena.
Figura 1: Foto da Camellia sinensis (Brissago, 2013).
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O ch branco composto por folhas jovens da Camellia sinensis,
cujos botes so protegidos e no sofrem oxida-o (Dartora, 2010). No
ch verde, logo aps a colheita, o processo se inicia e as enzimas
foliares so inativadas pela exposio ao calor, evitando a oxidao
enzimtica. No ch oolong, as folhas so cortadas ou picadas e, por
efeito das enzimas presentes nessas mesmas folhas, ocor-re uma
oxidao parcial, mas essa reao mais branda que no ch preto, em que a
oxidao ocorre durante um perodo prolongado (Valenzuela, 2004; Lima
et al., 2009). Antigamente acreditava-se que o processo responsvel
pela produo dos diferentes tipos de ch era a fermentao. Com o
aprofundamento dos estudos nas tcnicas de obten-o dos chs,
percebeu-se que o processo no poderia ser considerado fermentativo,
pois no ocorre degradao por micro-organismos e no h formao de
produtos tpicos da fermentao como, por exemplo, o etanol.
Entretanto, ainda hoje encontramos muitos textos que relacionam a
produo dos chs aos processos de fermentao.
Apesar de os quatro distintos tipos de ch serem prove-nientes da
Camellia sinensis, eles apresentam diferenas em sua composio
qumica, que so responsveis pelos efeitos fisiolgicos atribudos a
cada um deles. O ch branco o menos processado dos quatro tipos,
consiste apenas na lava-gem e secagem das folhas e brotos
selecionados da Camellia sinensis. Os principais compostos
presentes nesse ch so os polifenis monomricos, caracterizados pelas
epicatequinas e seus derivados, bem como vrios cidos como glico e
cumrico, alm de alcaloides, representados principalmente pela
cafena (Rusak et al., 2008).
Conforme citado anteriormente, as folhas da Camellia sinensis so
constitudas principalmente de polifenis da classe dos flavonoides,
dentre os quais se destaca a presena das catequinas. Estas
correspondem a cerca de 30% do peso seco das folhas da Camellia
sinensis e so compostos incolores, solveis em gua, responsveis pelo
amargor e pela adstringncia principalmente do ch verde (Matsubara;
Rodriguez-Amaya, 2006; Camargo, 2011). Durante o processo de oxidao
para a produo dos chs oolong e preto, as catequinas entram em
contato com as enzimas polifenoloxidases e do origem s teaflavinas
(es-truturas dmeras). Sendo assim, a composio qumica dos chs verde,
oolong e preto constituda principalmente por esses compostos, mas
as concentraes so bem diferentes. Dessa forma, no ch verde,
encontramos uma alta concen-trao de catequinas e baixa de
teaflavinas, o ch oolong contm quantidades intermedirias desses
compostos, enquanto que o ch preto apresenta elevada concentrao de
teaflavinas e baixa de catequinas (Valenzuela, 2004). Na Figura 3,
esto representadas as estruturas qumicas das catequinas e
teaflavinas.
As diferentes concentraes das substncias da Figura 3 conferem
aspectos sensoriais (cor, aroma e sabor) e benef-cios sade
singulares para cada tipo de ch. O ch branco apresenta aspecto
incolor, pois como no processado, as folhas da Camellia sinensis
conservam seus pelos brancos
(Godin et al., 2010). O sabor adstringente e amargo do ch verde
devido principalmente alta concentrao de catequi-nas. O ch oolong,
como produto de uma oxidao parcial, apresenta colorao avermelhada,
o que consequncia da razovel quantidade de teaflavinas. Por fim, a
colorao mais escura e o sabor adstringente do ch preto devem-se
grande quantidade de teaflavinas (Matsubara; Rodriguez-Amaya, 2006;
Lima et al., 2009).
O hbito de bilhes de pessoas beberem ch pelo menos uma vez ao
dia no se deve apenas ao seu aroma e sabor. O motivo de essa bebida
ser a segunda mais consumida do mundo, perdendo apenas para a gua
(Valenzuela, 2004; Schwarcz, 2009), devido s suas propriedades
medicinais.
Figura 3: Estruturas qumicas das catequinas e teaflavinas.
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Muitos trabalhos mostram a relao inversa existente entre o
consumo de ch e a incidncia de doenas degenerativas como cncer e
doenas do corao. Apesar de essas pes-quisas estarem em andamento,
sem resultados conclusivos, vrias evidncias tm levado os
pesquisadores a atriburem ao ch esses efeitos benficos sade bem
como a muitos outros. Com base nessas pesquisas, no Quadro 1,
elenca-mos alguns dos benefcios sade relacionados com cada tipo de
ch.
Outras plantas que possuem sabor e propriedades dis-tintas da
Camellia sinensis podem produzir infuses. Como o processo de obteno
dessas bebidas o mesmo, ferver as plantas em gua, as infuses de
outras plantas tambm passaram a ser popularmente conhecidas como
ch, apesar de no apresentarem semelhana com a erva originria da
China. Devido grande popularidade dessas infuses, a se-guir,
apresentaremos algumas plantas, seus princpios ativos e as
principais finalidades para o seu uso.
Infuses produzidas a partir de outras plantas
A utilizao de plantas para tratamento, cura e preven-o de doenas
uma das mais antigas formas de prtica medicinal da humanidade.
Exemplos dessa prtica milenar so o emprego de plantas alucingenas
nos rituais pagos pelos amerndios e a utilizao de vegetais com
propriedades afrodisacas no preparo de poes desde os primrdios das
civilizaes (Barreiro; Fraga, 2001).
Com esse mesmo propsito, muitas plantas passaram
a ser utilizadas na forma de infuso e diversos benefcios sade
foram sendo observados. Desde ento, cada vez maior a diversidade de
plantas utilizadas na forma de infu-so para esse fim. Nesse
sentido, pode ser considerada uma planta medicinal o vegetal que
produz em seu metabolismo natural substncias em quantidade e
qualidade necessrias e suficientes para provocarem modificaes das
funes biolgicas, os chamados princpios ativos, sendo portanto usada
para fins teraputicos (Silva et al., 2000, p. 20). No Quadro 2,
apresentamos algumas plantas popularmente uti-lizadas no Brasil na
forma de infuso, seus princpios ativos e usos medicinais.
Os chs na sociedade
A atividade de beber ch nas diferentes partes do mundo (ou mesmo
infuses de plantas diferentes da Camellia si-nensis) envolve muito
mais que ingerir uma bebida, uma questo cultural. Na Inglaterra,
pas referncia quando se trata do consumo de ch, o tea break, que
significa pausa para o ch, um costume muito antigo e diariamente
faz parte dos hbitos da populao desse pas. J nos Estados Unidos da
Amrica, os colonizadores britnicos trouxeram o hbito de beber ch
para suas colnias, o que fez com que essa bebida estivesse presente
em um dos momentos mais importantes da histria desse pas. Em 1773,
a Festa do Ch de Boston foi um protesto executado pelos colonos
ingleses na Amrica contra os altos tributos de importao cobrados
pela metrpole, em que toneladas de ch provenientes dos navios da
Companhia foram lanadas ao mar pelos colo-nos. Esse fato foi um dos
desencadeadores da Revoluo Americana, que culminou na Independncia
dos Estados Unidos (Freitas Neto; Tasinafo, 2006).
No Brasil, alm do uso na medicina popular, os chs pos-suem
importante papel social. Com expressiva popularidade em todas as
regies do pas, essa bebida um pretexto para reunir pessoas como,
por exemplo, nos chamados ch de panela e ch de fraldas que tem o
costume de ocorrer antes do casamento e da maternidade,
respectivamente. Alm disso, muitas vezes, os chs so utilizados com
o intuito de adquirir fundos para instituies de caridades que,
nesse caso, so conhecidos como ch beneficente. Outro hbito
relacionado s infuses, muito popular na regio sul, principalmente
nos estados do Rio Grande do Sul (RS) e Santa Catarina (SC), o
chimarro. Essa bebida tem origem indgena das naes Guarani e Quchua,
que tinham o hbito de ingerir infuses das folhas de erva-mate (Ilex
paraguariensis), rvore ori-ginria da regio subtropical da Amrica do
Sul (Castro; Chemale, 1995; Dartora, 2010). Atualmente, o chimarro
considerado o ch oficial do RS e um dos smbolos que representa a
tradio desse estado.
Todas essas questes culturais e a presena diria dos chs no
cotidiano das pessoas justificam a abordagem dessa temtica no
ensino mdio. A seguir, apresentaremos algumas possibilidades para o
desenvolvimento dos contedos de qumica associados aos chs.
Quadro 1: Os tipos de ch e seus possveis benefcios a sade.
Tipo de ch Benefcios sade
Ch branco - antioxidante; - reduz a incidncia de doenas crnicas
como disfunes cardiovasculares e cncer; - antiobesidade.
Ch verde - reduz a incidncia de doenas crnicas como disfunes
cardiovasculares e cncer; - antioxidante; - antialrgico; -
antibacteriana.
Ch oolong - antioxidante; - antimutagnico; - antibacteriana.
Ch preto - anticarcinognico; - antimutagnico; - reduz a
incidncia de doenas crnicas como disfunes cardiovasculares e cncer;
- antioxidante; - melhoria da funo vasomotora; - reduo de peso e
circunferncia da cintura; - diminuio no colesterol total e
lipoprote-nas de baixa densidade.
Fonte: Morais, 2009; Saigg; Silva, 2009; Camargo, 2011.
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Os chs e o ensino de qumica
A insero de temticas no ensino vem sendo recomen-dada pelos
documentos oficiais (Brasil, 2006) e por diversos autores da rea de
ensino de Cincias (Marcondes, 2008; Delizoicov et al., 2009;
Braibante; Zappe, 2012; Pazinato et al., 2012). Por meio de
temticas como os chs, pretende-se promover o estudo de fatos,
fenmenos e objetos presentes no cotidiano dos estudantes,
contribuindo, dessa forma, para que estes possam interpretar as
situaes do seu dia a dia por meio dos contedos cientficos
envolvidos.
Considerando esses pressupostos, por intermdio dos
chs, possvel abordar vrios tpicos de qumica orgnica. A anlise
das estruturas qumicas dos componentes dos chs e dos princpios
ativos das infuses possibilita a abordagem de contedos como cadeias
carbnicas, nomenclatura, gru-pos funcionais, isomeria, reaes
qumicas e indicadores de pH.
Alm disso, atividades diferenciadas podem ser desen-volvidas a
partir dessa temtica. Algumas propostas so: pes-quisa sobre a
composio qumica dos chs mais populares de uma determinada cidade ou
regio, aula de degustao de chs e atividade experimental com os chs.
Em relao atividade experimental, os princpios ativos das
infuses
Quadro 2: Plantas popularmente utilizadas na forma de infuso,
seus princpios ativos e usos medicinais.
Denominao Princpio ativo Usos medicinais
Hortel (Mentha arvensis L.)
Mentol 2-isopropil-5-metilciclohexanol
Combate contrao muscular brusca (esposmoltica) e s afeces
estoma-
cais e intestinais.
Erva doce (Pimpinelle anisium L. Apiaceae)
Anetol 1-metoxi-4-(1-propenil)benzeno
Estimulante das funes digestivas e carminativo.
Capim-cidr (Cymbopogon citratus (DC) Stapf)
Citral 3,7dimetil-2,6-octadienal
Calmante, sedativo, problemas gastroin-testinais, repelente de
insetos, tratamento
de diabetes e lcera.
Camomila (Matricaria recutita L.)
Camazuleno 7-etil-1,4-dimetilazuleno
Ao interna: antiespasmdica, calman-te, carminativa.
Fonte: Morais, 2009; Franco; Fontana, 2007 (imagens).
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podem ser extrados e as funes orgnicas presentes em suas
estruturas qumicas podem ser identificadas por meio de reaes
clssicas. Para a realizao desse experimento, devem-se utilizar
amostras reais de chs que contenham em seus princpios ativos duplas
ligaes e os grupos funcionais lcool, aldedo e fenol como, por
exemplo, as infuses de hortel, capim-cidr, camomila e ch branco ou
verde. Para a identificao qualitativa da funo lcool, utiliza-se uma
soluo de Jones 2% (anidrido crmico em meio cido); para aldedos e
cetonas, a soluo de 2,4-dinitrofenil-hidrazina; para compostos que
contm insaturao, uma soluo de permanganato de potssio 1 M; e para
compostos fenlicos,
emprega-se a soluo de cloreto frrico aquoso 3%.Na estrutura do
mentol (1a), princpio ativo da hortel,
est presente a funo orgnica lcool, que oxidada pelo xido crmico
em meio cido (1b) e ocorre a formao da mentona (1c) e de um
precipitado verde de sulfato crmico (1d). Princpio ativo do
capim-cidr, o citral (2a) reage com a 2,4-dinitrofenil-hidrazina
(2b) em meio cido e obtm-se 2,4-dinitrofenil-hidrazona (2c),
precipitado de cor amarelo--avermelhada. No camazuleno (3a),
princpio ativo da ca-momila, que um composto aromtico, ocorre a
chamada reao de oxidao da cadeia lateral, que caracterstica de
sistemas aromticos ligados a grupos alquilas, desde que o
Figura 4: Reaes de identificao dos grupos funcionais.
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carbono benzlico no seja tercirio (Solomons, 1996). Como no
camazuleno os substituintes alquilas esto nas posies 1, 4 e 7 e
nenhum tercirio, ocorre a reao de oxidao com o permanganato de
potssio e forma o tricido carboxlico correspondente (3b) e dixido
de mangans (3c) de colorao castanha. As catequinas (4a), presentes
principalmente nos chs branco e verde, reagem com o cloreto frrico
3% e um dos possveis produtos um complexo de cor rosada (4b). Essa
reao caracteriza a presena da funo orgnica fenol.
Por intermdio da visualizao das diferentes coloraes resultantes
dos testes de identificao, os estudantes podem perceber a presena
das funes orgnicas nos princpios ativos estudados. Uma alternativa
para o desenvolvimento dessa atividade experimental de forma
demonstrativa a utilizao do retroprojetor como bancada de
laboratrio de qumica. Por meio dessa estratgia, as coloraes dos
testes so observadas na projeo resultante, o que possi-bilita a
realizao dessa atividade para um maior nmero de alunos, utilizando
microescala consequentemente pequenos volumes de reagente e, dessa
forma, reduzindo a quantidade de resduos gerados (Braibante et al.,
2010). Ainda se recomenda, nessa atividade, a realizao de teste
padro utilizando compostos de fcil aquisio como: etanol, acetona,
cicloexano e fenol.
Outra possibilidade da abordagem temtica dos conte-dos de qumica
a relao com as outras reas do conheci-mento. Considerando que as
prticas interdisciplinares ainda no so uma realidade na maioria das
escolas de educao bsica, torna-se cada vez mais necessrio propostas
de te-mas que necessitem de um estudo paralelo entre diferentes
disciplinas para o seu entendimento (Braibante et al., 2013). A
temtica chs proporciona a abordagem de tpicos de qumica
relacionados com estudos paralelos com a histria, geografia e
biologia, entre outras.
O nosso grupo de pesquisa Laboratrio de Ensino de Qumica/UFSM
(LAEQUI) http://w3.ufsm.br/laequi/ de-senvolveu um trabalho
utilizando a temtica chs. Nessa ocasio, foi realizado um estudo a
respeito da construo do conhecimento de qumica orgnica por
estudantes da 3 etapa da educao de jovens e adultos (EJA) de uma
escola pblica de cidade de Santa Maria (RS). A temtica foi
desenvolvida associada metodologia de ensino unidade de
aprendizagem, que compreende atividades diferenciadas que possuem
como base estrutural o conhecimento prvio e o cotidiano dos
estu-dantes. Os resultados foram satisfatrios e pde-se perceber a
evoluo dos conhecimentos dos alunos com relao qumica orgnica e
principalmente a relao desses conceitos com o cotidiano, sendo que
boa parte da turma era constituda por pessoas que tinham o hbito de
ingerir ch (Silva, 2011).
As sugestes propostas nesse trabalho foram feitas com o objetivo
de auxiliar os professores do ensino mdio na ela-borao de suas
aulas, contribuindo com ideias que possam viabilizar o entendimento
dos conceitos qumicos a partir do dia a dia dos estudantes.
Entretanto, o professor tem uma gama de possibilidades metodolgicas
para a abordagem da temtica chs, ficando a seu critrio a escolha da
proposio metodolgica mais adequada para a realidade de sua escola e
classe.
Consideraes finais
Desde a poca do imperador Shen Nung at os dias atuais, a
popularidade dos chs vem crescendo. A disseminao dessa bebida pelas
diversas culturas do mundo e sua utili-zao para inmeros fins devido
aos compostos que fazem parte da sua composio qumica. Considerando
que bilhes de pessoas possuem o hbito de beber ch regularmente
(Schwarcz, 2009), o estudo desse tema nas aulas de qumi-ca
proporciona aos estudantes o entendimento de aspectos do seu
cotidiano, utilizando a cincia como um importante instrumento para
a interpretao de sua realidade.
Entretanto, deve ficar claro que a abordagem de qualquer tema em
sala de aula no uma tarefa trivial, pois exige do professor um
planejamento e domnio sobre o assunto. Durante a abordagem da
temtica chs, vrios conceitos e informaes de outras disciplinas
devem ser desenvolvidos juntamente com os contedos de qumica. Essa
relao com as demais disciplinas essencial em um trabalho com temas,
pois proporciona a compreenso do assunto de forma mais integrada,
alm de dar significado aos conceitos.
Sendo assim, a abordagem dessa temtica contribui para a formao
humana, pois parte dos conhecimentos prvios dos estudantes e do seu
cotidiano, amplia os horizontes culturais e a sua autonomia no
exerccio da cidadania.
Mara Elisa Fortes Braibante ([email protected]), licenciada em
Qumica pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutora em
Cincias (Qumica Orgnica) pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), professora associado IV do Departamento de Qumica da
UFSM e coordenadora do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao
Docncia (PIBID) subprojeto Qumica UFSM. Santa Maria, RS BR. Denise
da Silva ([email protected]), licenciada em Qumica pela
UFSM, mestre em Educao em Cincias: Qumica da Vida e Sade pela UFSM,
doutoranda do Programa de Ps Graduao em Educao em Cincias Qumica da
Vida e Sade UFRGS, professora no Instituto Federal Farroupilha.
Alegrete, RS - BR. Hugo T. Schmitz Braibante
([email protected]), graduado em Qumica Industrial pela UFSM,
professor adjunto IV do Departamento de Qumica da UFSM, atua na rea
de sntese orgnica. Santa Maria, RS BR. Maurcius Selvero Pazinato
([email protected]), licenciado em Qumica pela UFSM,
mestre e doutorando do Programa de Ps-Graduao em Educao em Cincias:
Qumica da Vida e Sade/UFSM. Santa Maria, RS BR.
Referncias
BARREIRO, E.J.; FRAGA, C.A.M. Qumica medicinal: as bases
moleculares da ao dos frmacos. Porto Alegre: Artmed,
2001.BORTOLINE, K.; SICKA, P.; FOPPA, T. Determinao do
teor de cafena em bebidas estimulantes. Revista Sade, v. 4, n.
2, p. 23-27, 2010.
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A Qumica dos Chs
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Abstract: The Chemistry of teas. The habit of drinking tea has
been present in our society for thousands of years. The Chemistry
concerning this process is very interesting to be used as a
didactic strategy in order to promote a contextualized
apprenticeship of Organic Chemistry. In this paper we present the
history, the origin, the Chemistry involved and the interface of
teas with the society. Yet, we present different possibilities of
application of this theme in high school.Keywords: teas, theme,
Chemistry teaching.