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1 A PENA DE MORTE E A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
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Jul 07, 2018

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A PENA DE MORTE E A REDUÇÃO

DA MAIORIDADE PENAL

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MARCO FALCÃO CRITSINELIS

Juiz Federal Titular do 3º Juizado Especial Federal/RJ. Professor. Especialista em Políticas Públicas e de Governo pela Escola de Políticas Públicas/ UFRJ. Especialista em Integração Econômica da União Européia e Mercosul, pela Escola de Magistratura Federal – EMARF, UNIVERSO e Faculdade de Coimbra, Portugal. Diplomado pela Lewis & Clarck College – USA, em Direito Ambiental. Diplomado pela Academia de Polícia do Estado de Nova York – USA, em Justiça Criminal. Diplomado pelo National Center for State Courts – USA, em Sistema Judicial Americano.

A PENA DE MORTE E A REDUÇÃO DA MAIORIDADE

PENAL

Rio de Janeiro

2009

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em particular, à AJUFERSES que se dispôs a publicar

este estudo em sua página na internet(www.ajuferjes.org.br), na

pessoa de seu Execelentíssimo Presidente, o Juiz Federal Fabrício

Fernandes de Castro.

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NOTA DO AUTOR

A origem deste estudo teve como meta concorrer para os

debates sobre os temas da pena de morte e a redução da

maioridade penal e oferecer à sociedade, parlamentares, cientistas

políticos e juristas, modesta contribuição no intuito de mitigar o

problema da segurança pública.

As idéias esposadas neste estudo resumem, com as

atualizações e adaptações que se tornaram necessárias, nossa

opinião sobre o sistema punitivo nacional e as penas alternativas

lançadas no livro “O Poder Judiciário Municipal e a Aplicação

Social da Pena”, em co-autoria com o Desembargador Federal

aposentado, Ney Moreira da Fonseca, lançado pela Forense, em

meados de 1997.

O tema retorna às páginas dos jornais, junto com outros

temas de relevância nacional que estão sendo discutidos na

sociedade, principalmente após dois crimes bárbaros envolvendo

crianças(no interior de São Paulo, bandidos atearam fogo em um

carro e, no Rio de Janeiro, após um roubo a um carro, um menino

foi arrastado por quilômetros preso, do lado de fora da porta, ao

cinto de segurança).

Diante disso, não poderíamos deixar de tecer algumas

posições acerca de situações que circundam o combate à violência

e à criminalidade, com a reabertura de debates sobre PECs –

projetos de Emenda Constitucional, em especial, aqueles que

tratam da redução da imputabilidade penal.

No estudo passamos, como consequência, a abordar as

correntes políticas e doutrinárias que vêm acompanhando esse

processo de discussão sobre a pena de morte e a redução da

maioridade penal, a cada vez que crimes de relevância nacional

ocorrem. Não é a primeira vez que esses assuntos provocam

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polêmica. O que devemos estar atentos é em relação à urgência

com que são votados pelo Legislativo, açodadamente, como se o

Estado fizesse, por sua autoridade própria, a vingança de cada

ocorrência policial, em nome de uma soberania popular.

Não nos parece caminho mais aconselhável o

movimento anticriminalidade, capitaneado pela corrente que

imprime batalha na adoção, pelo conjunto sistêmico penal, da

redução da imputabilidade penal para os dezesseis anos, e até

menos, ao revés dos dezoito anos hoje predominante, ou mesmo a

idéia lançada pelo atual governador do Estado do Rio de Janeiro,

acerca da emaencipação judicial penal do infrator menor de idade,

pois o sistema prisional dos adultos, onde o menor emancipado

será albergado, não comporta fisicamente esse criminoso e o

sistema putinitivo não atende aos requisitos para a sua filosofia

político-penal de ressocializar.

Por isso, o Brasil será mais uma vez criticado por

violações a direitos humanos dos adultos e, também, dos menores

infratores. Essa é a idéia do político mencionado, sob a rubrica

“RESPOSTA À BARBÁRIE”( Jornal “O Globo”, 13 de fevereiro de

2007, página 11).

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Acreditamos que reformas setoriais e de urgência,

açodadas, por eventos sociais graves, não sejam potencialmente

hábeis a dar cabo da insatisfação da cidadania brasileira com o

problema punitivo, pois, em meio à discussão sobre repressão

maior, quer aumentando penas, quer reduzindo a idade da

responsabilidade penal, quer adotando-se a pena de morte, o país

não tem estrutura prisional para abrigar presos maiores ou internar

menores infratores.

A proporção de criminosos, adultos ou menores

segundo a legislação penal, está se equiparando. Se a situação

prisional dos adultos já é caótica há muito tempo, uma das piores

do mundo, por óbvio que o ingresso de novos membros no

sistema, por força da redução da maioridade penal, incentivará o

Judiciário a proferir mais decisões contrárias ao movimento de

recrudescimento, pois, de outra forma, o sistema explodirá em

termos populacionais.

Para tanto, trazemos à colação os seguintes dados

sobre os infratores menores:

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No quadro abaixo, como já tivemos oportunidade de

salientar por diversas vezes, o deficit de vagas nas unidades já é

grande e evidente tende a crescer. Vamos aos dados.

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Várias propostas, nesta ocasião, tramitam no

Congresso Nacional. A maioria delas setoriais e dirigidas ao

procedimento processual penal, com exceção da redução da idade

para a responsabilidade penal, que é constitucional, como se

verifica do informativo abaixo:

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Caminho democrático perigoso está sendo trilhado pelo

nosso país. Ao lado das discussões sobre os pacotes de segurança

pública, corre a idéia da realização de plebiscito para que a

sociedade brasileira decida sobre a redução da maioridade penal.

É claro que o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular de

leis são instrumentos consolidados para que o povo exerça seu

próprio governo, uniformizando condutas sociais para a

convivência pacífica. A divina vontade da maioria.

Entretanto, nem todas as matérias devem ser decididas pelo

povo. Existem situações sociais em que somente o Estado, como

instituto criado pela humanidade, deve deliberar. O Estado se

justifica por isso, evitando que os governados venham a tomar

decisões influenciados por inúmeros fatores e, também, pelo

desconhecimento de tantos outros. Aliás, sobre esses assuntos

monopolizados pelo Estado, nem os governantes têm o poder

decisório que eles imaginam ter.

O Estado tem a ciência de que as decisões dos governantes

são provisórias, porque transitório o poder que eles exercem. As

errôneas decisões, apesar dos estragos que normalmente fazem, são

passíveis de correção pelo tempo. Mas o Estado também sabe que

uma decisão, fruto da deliberação popular, tem outro peso e maior

dificuldade de reversão, por mais grotesca que seja, com malefícios

duradouros e profundos.

Por isso, governantes e governados colocam sob a proteção

do Estado as denominadas cláusulas pétreas, aquelas normas de

viver imunes ao poder dos homens de um dado tempo, de uma

sociedade específica e de um determinado local.

Quando os governantes tentam empurrar para a sociedade a

decisão sobre a redução da maioridade penal para a punição dos

menores dois alertas soam: o primeiro, se livram da culpa dos

insucessos da nova regra, pois sabem, de antemão, que o sistema

carcerário esgotou suas potencialidades de punir e de ressocializar

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tanto adultos, como também os menores deliquentes; segundo,

porque a ideologia da punição de menores confere mais poder de

dominação aos governantes, como instrumentos de salvação social,

apagando todas as lembranças nefastas dos nossos escândalos

diários de pequenas falsidades às grandes improbidades

administrativas.

É o medo social que se transforma em mito, que se

transforma em ideologia de salvação, que se transforma em poder,

em um processo natural e legítimo, sem assustar, nem oprimir,

como se fosse uma crença de que o serviço prestado pelos

dominadores fosse resultado de uma troca em que os benefícios são

distribuídos equanimemente entre todos.

Esse é o processo de manipular o poder.

Diante das inúmeras omissões do Estado, conceder ao povo o

poder de participar da decisão que acaba supostamente com o

crime, favorece o mito de que os dominados experimentam um

alento inconsciente contra a exclusão a que estão submetidos,

imaginando tomar parte no combate dos poderosos à violência e

aos violentos e partilhando, como os governantes e dominantes, da

crença na necessidade de um castigo exemplar, difundindo a

adesão à ideologia social de que sem o exemplo da punição não

existirá respeito e obediência às leis, às regras, aos costumes. A

aprovação é certa, dizem os sociólogos.

Essa é a prova dos nove que garante o resultado para uma

governabilidade perene e vitalícia, pois ninguém abre mão do poder

político, exceto para obter mais poder, mesmo que seja, apenas,

para ser reconhecido como o autor da emenda constitucional que se

propõe a reduzir a maioridade penal.

Resumidamente, sem prescindir de nossas posições,

apresentamos, para conhecimento, vários entendimentos de

aderência às propostas de reforma penal e, também, contrários a

ela, na forma em que está sendo veiculada pela mídia. Na verdade,

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para se discutir a punição é necessário passar pela análise de vários

outros problemas umbilicalmente a ela ligados, como a segurança

pública, violência, desemprego, sistema prisional, competências

federativas, bem como, as formas alternativas de punição.

Esperamos contribuir, por interesse social e por interesse

próprio, pois, como cidadão carioca, quero paz e meu direito civil

de ir e vir.

M.F.C.

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I - NOTAS PRELIMINARES

SUMÁRIO DOS TEMAS ABORDADOS NESTE CAPÍTULO.

1 Considerações sobre a pena. 2 As doutrinas de sua

justificação. 3 A natureza da pena. 4 A pena moral e a pena

criminal. 5 As penas e as medidas de segurança. 6 A falência

do sistema punitivo.

O sistema punitivo estatal tem como cerne três fatores

indissociáveis para a explicação do fundamento da pena como

delegação social ao Estado para atuar como instrumento de

proteção de relevantes bens e interesses: a retribuição, a prevenção

e a ressocialização.

Dos compêndios criminais que analisam

cientificamente a evolução histórica do instituto da pena, podemos

fazer remissão às doutrinas absoluta, relativas e unitárias, que

testificam precedentemente a tônica do confinamento prisional

incidente sobre o escarmento.

A pena, para a absoluta, que tinha como seguidores

Kant e Hegel, é a conseqüente exigência de justiça e como

imperativo categórico do malefício perpetrado à sociedade como

retribuição eqüitativa. Em suma, tem como fulcro a pena de talião

“olho por olho, dente por dente”1, na milenar codificação de

Hammurabi (Código de Hammurabi, nº. 40, § 196 “Se um awilum

destruiu o olho de um (outro) awilum: destruirão o seu olho.”; e

nº. 70, § 200: “Se um awilum arrancou o dente de um awilum

igual a ele: arrancarão o seu dente.”2

1 cf. Tb. Êx. 21, 23 e 25; LEV 24, 19-20; DT 19, 21.

2E. Bouzon, na obra de referência bibliográfica, 1ª ed., RJ: Editora Vozes, 1976, p. 87.

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O crime, sendo a negação do direito posto, deve ser

anulado pela pena para a própria negação do crime e, per viam

consequentiae, o restabelecimento da ordem jurídica violada.

Kant, em sua obra “Metaphysila der Sitten”,

radicalizava que quantos cometeram um assassinato, ou o

mandaram, ou com eles cooperaram, todos devem ser punidos

com a morte; assim o exige a justiça como idéia que regula o

poder judiciário segundo as leis universais a priori.

Essa corrente doutrinária extremista, teve como

precursora a filosofia aristotélica, que admitia o talião, entretanto,

pela proporcionalidade e não pela igualdade para validar, como

fator referencial, a punição: “O que mantém unidos os homens é o

Talião, baseado, não na igualdade, senão na proporção do

castigo à falta.” 1

A doutrina relativa, entende que a pena, como

necessidade inafastável de controle social, não é um fim em si

mesma, sendo possuidora de caráter preventivo, tanto no aspecto

geral - a intimação de possíveis infratores, e também no aspecto

especial circunscrito ao mundo individual do transgressor: a

inocuização, nos dizeres do saudoso professor Heleno Cláudio

Fragoso.

A teoria unitária pugna, por outro lado, pela soma das

diretrizes defendidas nas duas anteriores doutrinas, tendo a

punição caracteres retributivos e preventivos.

Durkhein e Foucault lançaram a tese da “função do

1 Ética a Nicômaco e Magna Ética.

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crime e do criminoso na manutenção da ordem social”. Para o

primeiro, “o crime deve deixar de ser concebido como um mal que

nunca é demais limitar; pelo contrário, em vez de felicitarmos

quando desce demasiado em relação ao nível habitual, podemos

estar certos de que este progresso aparente é ao mesmo tempo

enunciador e corolário de qualquer perturbação social.

Classificar crime como um fenômeno da sociologia normal... é

afirmar que é um fator de saúde pública, que é parte integrante de

qualquer sociedade sã.”1

Nesse mesmo texto, ele afirma que odeia o crime

enquanto tal, mas que é preciso renunciar ao hábito que consiste

em avaliar uma instituição, uma prática, uma máxima social ou

moral, como se fossem boas ou más por natureza e em si próprias,

indistintamente para todos os tipos sociais.

As ponderações começam a constituir-se plenamente

de sentido quando o autor define o crime como sendo um ato que

ofende sentimentos coletivos dotados de uma energia e de uma

clareza particulares. Não é o crime, é a cólera pública, despertada

por este, que reforça a vivacidade de sentimentos coletivos,

mantendo intacta a coesão social. O crime, desta forma, desperta a

noção de coletividade, de unanimidade. Desta forma a utilidade do

crime somente se completa na relação crime - pena.

Qual seria, então, para o filósofo a função da pena?

“Ela não serve, ou serve muito secundariamente para corrigir o

culpado ou para intimidar os seus imitadores possíveis(...)A sua

verdadeira função está em manter intacta a coesão social,

mantendo toda sua vitalidade à consciência comum(...) Pode-se,

1Emile-David Durkhein, em “As Regras do Método Sociológico”, série “Os Pensadores”, São Paulo:

1983, ed. Civita, p. 122.

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portanto, dizer sem paradoxo, que o castigo está sobretudo

destinado a atuar sobre as pessoas honestas.” 1

Foucault, coincidindo com o diagnóstico de Durkhein,

finaliza que “Deveríamos então supor que a prisão, e de uma

forma geral, sem dúvida, os castigos, não se destinam a suprimir

as infrações; mas antes a distingui-las, a distribuí-las, a utilizá-

las; que visam não tanto tornar dóceis os que estão prontos a

transgredir as leis, mas que tendem a organizar a transgressão às

leis numa tática geral das sujeições.”2

Assim, a utilidade do crime completa-se na relação

crime/pena. Também neste caso vemos que a pena dirige-se

principalmente aos homens honestos(não aos que estão prontos

para transgredir as leis), visando uma tática geral das sujeições,

que, em definitiva, garantiria a coesão social.3

Hodiernamente, resulta de um exame aprofundado das

legislações penais, dos estudos filosóficos e da realidade

penitenciária que a pena é retribuição, cuja justiça ou injustiça fica

subjetivamente ligada ao momento político da edição e

manutenção da norma sancionadora. “Com efeito, toda pena, pela

sua própria natureza, seja qual for a sua espécie (privativa de

liberdade, flagelação, morte, multa, suspensão ou restrição de

direitos, prestação de serviços à comunidade) encerra um

conteúdo, que se constitui, fundamentalmente, dum substrato

constituído de vários elementos, conforme o caso, a saber:

1Durkhein, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 128/129.

2Michel Foucault, em “Vigiar e Punir”, 9ª ed., Petrópolis: 1984, ed, Vozes, p. 240.

3Flávia Inês Scilling, mestre da faculdade de Educação Unicamp/SP e doutoranda do Depto. Sociologia/FFLCH/USP, trazido no articulado “Sobre Homens e Crimes: Construindo um Diálogo tenso entre Marx, Durkhein e Foucault”, publicado na Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 13, pp. 278/285.

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retribuição, castigo, corretivo, expiação, intimidação,

reeducação, prevenção, reprovação.”1

Com feito, necessariamente para o condenado, a pena

é sempre injusta e para a sociedade pode variar em razão de

classes sociais, culturais, raciais etc. A sua justeza, porém, cede à

inconcusa tese de sua necessidade inqüestionável.

A propósito, “o direito repressivo é injusto na sua

raiz. Descabe, mesmo imaginar que as medidas tendentes a

diminuir o encarceramento das pessoas represente uma atitute

humanitária e piedosa por parte da sociedade: os verdadeiros

motivos que os leva a adotá-los são egoístas e interesseiros, ainda

que apresentados através de racionalizações generosas.”2

A prevenção da pena é ínsita a sua própria existência e

à realidade humana, já que encarnada na coexistência entre os

homens desde priscas eras - Homo Homini Inpus.

Com a violação de algum bem ou interesse natural de

um homem ou de uma instituição, haverá a possibilidade latente

de ela sofrer repulsa. Este sentimento sempre será geral e, também,

individualizado.

Esta resistência é a relação de causa e efeito oriunda

do ato agressivo violador de um bem natural ou jurídico do

homem. De efeito, a agressão tem como pena in natura a

resistência. “A resistência se opõe como um contraponto, uma

reação, à violência empregada. Tanto o é que os antigos já

1Manzini, apud Orlando Soares, in “Fundamentos da Pena de Morte”, publicado na Revista Forense,

volume nº 333/106.

2Andrew T. Exull, “Decarcertions Prentice”. Hail Inc., New Jersey, 1977.

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anotavam: ‘Violentia non dicitur ubi non intervenit resistentia’

(não há violência onde não esteja presente a resistência). A

violência provoca, devido à coerção que exerce, um estado de

incapacidade de querer, não se podendo em regra, falar-se em

capacidade para resistir. Nesse estado de coerção se constata a

ausência de consciência.”1

Em arremate, continuou o escritor e jurista, “a

agressão segundo René Spitz, é o desenvolvimento do indivíduo e

de seu mecanismo psíquico, bem como a demonstração de que sua

capacidade seria impossível sem a agressão. A agressão se

apresenta sob as mais variadas formulações: por medo,

depredadora, por rivalidades, por inveja e vaidade, por ciúme,

instrumental. Tem-se, destarte, que agressividade se é um meio de

conservação da espécie, principalmente quando representa uma

reação a uma agressão sofrida, por outro lado, a agressividade

não tem só uma composição de origem biológica. A agressividade

é, muitas vezes, um procedimento hostil contra alguém ou alguma

coisa. Mas, mesmo assim, a agressividade tem origem em causas

biológicas e sócio-culturais, pois é uma componente do modo de

agir do ser humano.”2

Assim, a pena não é uma criação jurídica. A pena

criminal o é. Por isso, punição não tem a sua existência restrita ao

momento de sua regulação pelo Estado, razão pela qual não pode

ser revista por estudos centralizados somente no aspecto jurígeno

da penalogia.

A pena retrata um anseio social delegado ao Estado

1Valdir Sznick, CD ROOM - Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados, ano 1996: Editora

Juridi Vellenich Ltda., SP, 1ª ed.

2Idem, ibidem.

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para que, ante o seu poder intervencionista, seja aplicada. A pena é

a subjugação do homem ao homem, cônscio de sua natureza. É,

como dispõe, cum laude, a Exposição de Motivos do Projeto

Alternativo Alemão, de 1966, a amarga necessidade de uma

sociedade de seres imperfeitos.

Dessa forma, a pena, tal qual outros sentimentos

experimentados pelo homem, como o amor, a solidariedade, a

felicidade, a democracia, desenvolve-se naturalmente na espécie

humana com o sentido retributivo e preventivo, pois como se

anotou linhas atrás, ela é um consectário do estado patológico

inato do homem: a agressividade. “As razões de agressividade são

tão antigas, entrelaçadas, que se assemelham à própria história

da humanidade, que, em muitas passagens, mais se assemelha a

um elenco onde estão presentes a guerra, ódio, e lutas internas.

Criminologia. O homem - no dizer de Voltaire- assume a violência

quando assume a vida. O que isto significa ? Simplesmente que a

violência é uma característica inata ao ser humano. A violência e

a criminalidade têm correlação direta entre si a ponto de, em uma

imagem, poder ser consideradas frutos de uma mesma árvore: a

luta pela vida, pela sobrevivência, pelo pão nosso de cada dia. A

violência é tão antiga como o próprio homem. Não é preciso ir

muito longe, pois a Bíblia, em seu primeiro livro ‘O Gêneses’ nos

apresenta várias passagens onde está presente a violência. Assim,

tomando a Bíblia como referência, para encontrarmos exemplos.

Fiquemos, para não alongar, com dois deles, bastante

significativos: a figura do Anjo, com a espada na mão ( a imagem

que os pintores nos legaram), que após o pecado de Adão e Eva -

não se sabe bem qual foi, mas é certo que a soberba fazia parte -

expulsa os nossos pais do Paraíso. Não é isso um gesto de

violência ? Verdade que pode ser considerada como uma

violência justa: uma reação a uma ação, no caso uma ofensa a

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Deus. E o outro também nos causa assombro: o fratricídio de

Abel, vitimado por Caim, logo nos primeiros albores da História

da Humanidade, não denota, com clareza, a violência e a

agressividade com que é dotado o ser humano, por si só, sem

necessidade de contacto com outras pessoas, sem influência de

terceiros.”1

Por seu turno, para a atual ordem jurídico-social

implantada pelo sistema punitivo estatal, um novo sentido foi

acoplada às facetas da retribuição e da prevenção, justificando a

existência de um outro anseio social: a necessidade de

ressocializar um par, possibilitando-lhe o retorno ao convívio do

seio da sociedade, porque ela simplesmente também dele

necessita, pelos mesmos motivos que justificaram o contrato social

que substitui o estágio do homem em beligerância da selvageria

pré-histórica.

A recuperação, regeneração, readaptação ou a

reeducação, não importa a denominação, é meta a ser praticada

pela pena concomitantemente com o seu caráter puntivo e

preventico para tornar um criminoso em não-criminoso. Assim,

punição e tratamento devem ser vistos como extremos de uma

série contínua, com variações intermediárias, as diversas partes a

se imbricarem harmoniosamente, sem fraturas.2

De efeito, há aqui um divisor de águas. A pena como

punição vista pela norma ética e moral da sociedade e a pena

tratada pela ordem jurídica, como “sanção prevista em todos os

ramos do Direito, para quem infringe os seus mandamentos ou

1Valdir Sznick, obra citada na referência bibliográfica.

2David Dressler, “Readines in Criminology and Penology”, Columbia un. Press, 2ª ed., p. 55 - apud Augusto Thompson, obra cit. na referência bibliográfica, p. 4.

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proibições, sob as mais diversas formas - prisão, multa etc.”1

A importância desta separação consiste,

primordialmente, no fato de que o movimento social que reprime

as condutas agressivas ao consenso moral determinará os bens e

interesses que serão tutelados pelo Direito Penal. Uma é

antecedente e justificadora da outra.

Assim, o fundamento da pena, em primeiro estágio, é a

seleção procedida pelo legislador para os critérios de

criminalização, amparado pelas condutas refutadas pela sociedade,

com atenção, entretanto, ao princípio da intervenção mínima, já

que a punição penal é a ultima ratio do sistema.

A realização da conduta delituosa, ou seja, a prática

pelo transgressor de conduta (ação ou omissão) típica, antijurídica

e culpável, não é, em si, o fundamento da pena, mas o fato gerador

do ius persequendi in iudicio. É a conduta avaliada diante da

definição legal que, se positivada, fará incidir a norma abstrata

gerando o atributo da tipicidade, etapa necessária para a aferição

da antijuridicidade e culpabilidade. E, se não houver causas

excludentes, perfazendo-se por completo, por ocasião da sentença,

os pressupostos da imposição da regra jurídica, a pena será

imposta - poena praesuponit culpam.

É bem verdade que o caráter ressocializador da

punição fica mais evidente, pelo menos nas regras codificadas, no

momento de sua execução, onde preceitos e diretrizes de política

criminal determinam o escopo do sistema penitenciário.

A escritora Jesús-María Silva Sánchez1 nos traz

1 LeiB Soibelman, in “Dicionário Jurídico”, 3ª ed., RJ: Editora Rio, 1981, p. 269.

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excelente e valioso estudo sobre os modelos denominados de

discernimento e da necessidade de pena, como informadores dos

atuais sistemas jurídico-penais, na parte que tratam da pena como

objeto de aplicação estatal. Senão vejamos, verbis: “El nuevo

punto de vista determinará que el único criterio de legitimidad de

la pena sea sua necesidad, entendida, desde la perspectiva del

cumplimiento de los fines del derecho penal, como necesidad de

pena para cumplir las exigencias de prevención general(negativa

o positiva) o como necesidad de pena en términos de prevención

especial. La pena se revela necesaria desde un punto de vista de

prevención general negativa cuando haya que recurrir a ella para

obtener una intimidación suficiente en el colectivo de autores

potenciales del delito. Por lo que se refiere al punto de vista de la

prevención general positiva, la pena aparece necesaria cuando

haya que recurrir a ella para reforzar la confianza de la

población en el ordenamiento jurídico, para reforzar la vigencia

de las normas. Finalmente, la pena se hace necesaria desde un

punto de vista de prevención especial sólo cuando la reinserción

social del sujeto haga necesaria esa pena. Ahora bien, si la pena

se justifica únicamente por su necesidad preventiva, subdividade

en los aspectos mencionados, y no por la realización de una

justicia absoluta, la conclusión es que la pena se ha de imponer

únicamente cuando exista una auténtica necesidad, en términos

preventivos, de recurrir a ella y, por contra, no cabe en absoluto

imponerla si tal necesidad no existe. A todo se añade algo que

aquí es de importancia: dicha necesidad puede decidirse de módo

más general y no en virtud de juicios individuales de

discernimiento...” (os grifos são nossos, pela importância das

conclusões).

Ao lado das penas, apesar de inexistir diferença

1Doutrina internacional, Revista Brasileira de Ciências Criminais, Vol. 13, pp. 38/41.

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ontológica, surgiram as medidas de segurança que, ante a

insuficiência do sistema penal punitivo clássico e o

aprofundamento da exegese científica na esfera jurídica, médica e

social, acorreram para o afastamento do agente periculoso do meio

social como meio de prevenção da criminalidade, com natureza

assistencial, medicinal e pedagógica, com o fim precípuo de

recuperação e rompimento da progressão da personalidade

potencialmente criminosa.

No Brasil, em especial, as medidas de segurança

seguindo a mesma sorte das penas, sucumbiram e com elas o

sistema composto do duplo binário, já que o nomen iuris

diferentes não espelhavam a realidade aflitiva dessa modalidade

correcional, com assentamento na doutrina da verdadeira burla de

etiquetas (Kohlrausch), como anota Fragoso.

Em que pese a evolução doutrinária e legislativa do

sistema punitivo, em particular no Brasil, a verdade é que a

politização das instituições governamentais transformaram a pena

e os sistemas penitenciários no mais distorcido dilema social e

jurídico - causa cognoscitur ab effectus.

A pena e a prisão jamais respeitaram o fundamento de

sua existência, ou seja, isolar o transgressor, possibilitando sua

recuperação. Assim, mantém-se o cárcere praticado na época de

Ulpiano - carcer, enim, ad continendos homines non ad puniendos

haberi debet. A face bestial do homem criou, desenvolveu e

cultiva uma realidade prisional incompatível com a condição

humana.

Aviva-se, dia a dia, entretanto, em sentido contrário a

todas as teorias da criminologia com relação à punição

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criminológica, o efeito devastador do confinamento do homem

sem respeito às suas necessidades básicas e sem qualquer proteção

do Estado.

Em nosso país, os direitos à integridade física e moral

ínsitos aos seres humanos são sistematicamente violados, apesar

de serem dogmas constitucionais1 e dos diversos programas

defensores dos direitos humanos, o que no deixa, infelizmente,

mais longe do Estado de Direito há tanto perseguido. Não nos

esqueçamos que, segundo um grande filósofo italiano, a razão e a

função do direito é salvaguardar o valor do homem.2

O sistema carcerário, como é atualmente, reduzindo os

encarcerados, a qualquer título, a condições deploráveis,

prescindindo das mais peculiares e básicas necessidades,

condenando-os ao jugo (ou subjugo) de uma sociedade prisional

regida por valores outros que não aos do homem-cidadão, do

homem-natural, é, enfim, um sistema violentador do próprio

direito à vida de onde brotam todos os demais direitos, dever do

Estado de velar pela garantia indeclinável de sua incolumidade -

reo res sacra est. Norbertto Bobbio já colocara que sem direitos

do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia.

Ademais, o fenômeno da assimilação dos padrões

vigorantes na penitenciária, estabelecidos pelos internos mais

endurecidos, mais persistentes e menos tendentes à recuperação,

mormente na atitude sintomática de aquilatar as maestrias do

1Constituição do Brasil, art. 5º - “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,

garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; (...) XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; (...) XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade fisica e moral.”

2Carnelutti, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 22.

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criminoso habitual, desenvolvendo o perfil delinqüente e os

denominados fatores universais da prisionização, impingem a

situação paradoxal da ressocialização por intermédio da reclusão

carcerária. “Reformar criminoso pela prisão traduz uma falácia e

o aumento de recursos, destinados ao sistema prisional, seja

razoável, médio, grande ou imenso, não vai modificar a verdade

da assertiva.”1

A ilusão de que a pena de prisão pode ser reformativa,

mostra-se altamente perniciosa, pois, enquanto se permanece

gravitando em torno a essa falácia, a doutrina se abstém de

examinar seriamente outras viáveis soluções para o problema

penal. Essa é a opinião de Rupert Cross2, pois se a penitenciária

tem que atender às exigências de segurança e disciplina, deve ser

encarada como uma instituição custodial e não como uma

instituição reformativa, como registra Augusto Thompson.3

Heleno Fragoso4, traz à colação a elaboração da idéia

de Erwin Golfman5, que define os métodos correcionais punitivos:

a instituição total, como sendo aquela que domina e controla a

vida dos internos, em todos os momentos de sua existência,

transformando a prisão em subcultura de massa. Donald Clemmer

a denominou de prisonização6, com cúpula e códigos próprios (leis

1Gresham M. Sykes, citado por Augusto Thompson, idem obra na referência bibliográfica, p. 17.

2In “Punishment, Prison and the Public” , Stenens & Sons, 1971, p. 47.

3 idem, p. 93.

4 “Direitos dos Presos”, RJ: Forense, 1980; e “Alternativas da Pena Privativa da Liberdade”, RDP nº. 29/1980

5in “Asylums”, N.Y. Doubleday, 1961.

6“Entretanto, a experiência carcerária, via de regra, é fonte geradora de aspectos regressivos na conduta do preso, compromete sua saúde mental, tomando-se aqui saúde mental em seu sentido amplo, enquanto condição de bem-estar pessoal. Ao dizer isto, tenho plena consciência de que estou dizendo o óbvio, mas devo repetí-lo, para os propósitos desta explanação. O Relatório ‘Arquitetura e Prisões’, do Ministério da Justiça da França(1987), fala da constatação do grave problema desse processo regressivo a que está sujeita a

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da massa), desafiando, por vezes, a própria soberania do Estado

mantenedor do sistema prisional.

Confira-se para tanto os dizeres de Bernard Shaw 1:

“Para punir um homem retributivamente é preciso injuriá-lo.

Para reformá-lo, é preciso melhorá-lo. E os homens não são

melhores através de injúrias.”

O efeito paraestatal do mundo carcerário, aliás, foi

objeto de minudente estudo realizado por. Augusto Thompson,2

onde se utilizou dos grandes ensinamentos de Gresham M. Sykes,

lançado no opúsculo “The Society of Captives” 3 que qualificou o

sistema social da prisão, em todo o globo, como sistema de poder

de regime totalitário.

O teor sociológico das palavras do aludido estudioso

por si só refletem com clareza a sua assertiva. Confira-se: “O uso

generalizado da privação da liberdade humana, como forma

precípua da sanção criminal, deu lugar ao estabelecimento de

grande número de comunidades nas quais convivem de dezenas a

milhares de pessoas. Essa coexistência grupal, como é óbvio, teria

de dar origem a um sistema social. Não se subordinaria este,

porém, à ordem decretada pelas autoridades criadoras, mas,

personalidade do preso. Segundo Simone Buffard, citada pelo referido Relatório, entre os efeitos da prisionização, podemos situar o comprometimento da identificação sexual, da imagem viril, graças à privação sexual, e , graças à privação sensorial, ocorre um favorecimento da vida imaginativa ou mesmo alucinatória, em detrimento da atividade voluntária. Aliás, num trabalho que tive a oportunidade de apresentar em 1987 no II ENARPE - Encontro Nacional de Arquitetura Penal - intitulado ‘Arquitetura Carcerária e Tratamento Penal’, abordo o problema da influência negativa que o próprio espaço arquitetônico tem sobre a saúde do preso.”(Alvino Augusto de Sá, “A Recuperação dos Sentenciados e a Questão do Exame Criminológico versus Parecer das Comissões Técnicas de Classificação”, publicado na Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 13, pp. 203 e segs.).

1apud Rupert Cross, “Punishment, Prison and the Public”, Steven & Sons, 1971, p. 47

2in “A Questão Penitenciária”, 2ª ed., RJ: Forense, 1980, p. 19

3Princeton Un. Press, New Jersey, 1972

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como é comum, desenvolveria um regime interno próprio,

informal, resultante da interação concreta dos homens, diante dos

problemas postos pelo ambiente particular em que se viram

envolvidos. Compreendendo esse fato, fica fácil entendermos,

também, que o significado da vida carcerária não se resume a

mera questão de muros e grades, de celas e trancas: ele deve ser

buscado através da consideração de que a penitenciária é uma

sociedade dentro de uma sociedade, uma vez que nela foram

alteradas, drasticamente, numerosas feições da comunidade

livre.”

Do ponto de vista da psicologia, o isolamento e a

segregação humana produzem efeitos maléficos sobre a mente e o

comportamento, levando indivíduo à degeneração física e moral, à

degenerescência mental, daí porque a visão reservada que a

referida ciência tem do sistema prisional.

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II - AS PENAS E OS SISTEMAS PENITENCIÁRIOS

SUMÁRIO DOS TEMAS ABORDADOS NESTE CAPÍTULO.

1 A pena: conceito e justificação. 2 A pena: retribuição,

prevenção e ressocialização. 3 As penas históricas.

Inicialmente, para a elaboração de opinião a respeito

de determinado instituto jurídico, necessário se faz a apresentação

de um cotejo de conceitos doutrinários.

A pena é, nos dizeres de Heleno Fragoso1 a perda de

bens jurídicos, a vida, a liberdade e o patrimônio, imposta pelo

órgão da justiça a quem comete crime, atendendo-se aos princípios

da legalidade, personalidade e da inderrogabilidade, que são

erigidos à categoria de garantia individual da anterioridade da

imputação do fato em lei, formal e materialmente válida, da não

extensão da punição além da pessoa do delinqüente e da

indispensabilidade de sua aplicação.

Para o festejado Damásio E. de Jesus é “sanção

aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal ao acusado de

uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito,

consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar

novos delitos.”2

Soler,3 assevera que “pena es un mal amanazado

primeiro, y luego impuesto al violador de um precepto legal, como

retribuición, consistente en la disminución de un bien jurídico, y

cuyo fin es evitar los delitos.”

1 “Lições de Direito Penal”, parte geral, 10ª ed., RJ: Forense, 1986, p. 292.

2“Direito Penal”, vol. I, 11ª ed., SP: Saraiva, 1986, p. 455.

3 “Derecho Penal Argentino”, TEA, 1970, v. 2, p. 342, ed. 1978.

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Carrara fez uma famosa construção das forças do

delito e da pena. O crime como ato humano resulta de duas forças:

a força moral ou interna e a força física externa, cada uma tendo

um aspecto objetivo e subjetivo, o mesmo acontecendo com a

pena. A força física objetiva da pena é o sofrimento que ela causa

ao delinqüente. Força física subjetiva são os atos de cumprimento

da pena. Força moral objetiva da pena é a intimidação exemplar

que ela provoca. As forças da pena contrapõem-se às forças do

delito no restabelecimento do equilíbrio rompido pelo crime. 1

A pena, como já se anotou, de origem remota, sempre

teve o caráter expiativo, sendo denominada pena-castigo ou pena-

expiação ou, ainda, pena-vindicativa, considerada como um mal

que o autor do crime deve sofrer, para pagar ou purgar o mal que

fez. 2

Aliás, o homem sempre atribuiu à punição o caráter de

imposição divina para glorificá-la de imperiosidade,

indiscutibilidade e de submissão, sendo ele mero longa manus da

autoridade celestial e, de outro lado, obter do punido a redenção

necessária para a aceitação espontânea do sacrifício do bem

individual, objeto da expiação.

Nesse diapasão, indissociável da pena o caráter de

retribuição e de medida exemplar para uma sociedade sob o jugo

de um julgador maior - punitur quia peccatum est (pune-se porque

pecou) - punitur ut ne peccetur (pune-se para que não peque).

Só mais tarde, com os estudos científicos da

1Francesco Carrara, “ Programa do Curso de Direito Criminal”, vol. I, SP: Saraiva, 1956, parte geral.

2Leib Soibelman, ob. cit., 3ª ed., RJ: Editora Rio, 1981, p. 270.

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sociologia, da filosofia do direito criminal1 , surgiu a idéia da

ressocialização como escopo da pena e justificativa de sua própria

razão, partindo do foco central dos efeitos da punição - a

prisonização.2

Até então, o homem já se rendeu às mais variadas

formas de reprimenda, como nos informam os sentinelas da

história, a saber, dentre outras: penas infamante, vil, mutilante,

perpétua, de trabalhos forçados e, ainda: Pena aflitiva - Pena que

causa um mal ao condenado: prisão, morte, castigo corporal.

Opõe-se à pena infamante, que atinge o moral do réu. As penas

podem, todavia, ser aflitivas e infamantes ao mesmo tempo - 3Penas canônicas - Aquelas do direito canônico, ex: pena

espiritual; pena eclesiástica; pena eterna; pena latae sententia;

pena medicinal -4 Pena de Marca - consistia em marcar o

delinqüente mediante ferro em brasa, como forma de identificação;

Pena preservativa - Pena para inspirar terror a fim de prevenir

novos crimes; Pena de Knut - Chicote de fios de couro e bolas de

metal, usado para castigo de condenados na antiga Rússia, até

1845. 5Pena aberrante - No Oriente clássico (hebreus, egípcios,

babilônios, hititas etc) admitia o princípio de que pelo crime dos

pais fossem punidos os filhos e descendentes por várias gerações;

Pena capital - Para os romanos era capital não só a pena de morte

natural como a pena que privava o cidadão da liberbade, e, em

conseqüência, de todos os direitos civis, como ainda a pena que

privava alguém dos direitos civis mesmo sem perda da liberdade.

1 Penalística, estudo da teoria das penas, ou da aplicação da pena.

2 Encarceramento e a deformação da personalidade do preso pelos vícios do sistema penitenciário.

3Georges Vidas, “Cours de Droit Criminel”; ed. Arthur Rousseau, Paris, 1906.

4 LeiB Soibelman, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 269.

5LeiB Soibelman - ob. cit. na referência bibliográfica, pp. 476/477/478.

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Para eles ‘capital’ (caput) não se referia apenas à cabeça ou o

corpo, mas significava pena gravíssima - 1 Pena de fogo - Morte

pelo fogo. Queimar o réu até morrer; Pena honesta - é a que não é

vil, que não produz infâmia.

1Ferdinand Walter , “ Histoire du Droit Criminel Chez les Romanis”, ed. Durand, Paris.

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III - A PENA DE MORTE.

SUMÁRIO DOS TEMAS ABORDADOS NESTE CAPÍTULO.

1 Considerações. 2 Motivações. 3 A pena de morte e sua visão

constitucional. 4 A expiação capital na história brasileira. 5 A

nossa opinião.

Inauguramos esse tópico com os fundamentos da pena

de morte, considerando-se a análise do conjunto de valores

relacionados ao conhecimento insertos nessa área, levando-se em

consideração os fatores e valores históricos, culturais, econômicos,

políticos, religiosos.

Por escolha aleatória, optamos pela angulação

epistemológica, a saber, a análise de aspectos de natureza

biológica, política, jurídica, filosófica, sob o ponto de vista crítico

de seus princípios, hipóteses e consequências que permeam a

punição capital.

Nessa linha de raciocínio, como apontou Orlando

Soares1, Sigmund Freud lançou mão dos mais variados elementos

psicológicos para o embasamento de suas teorias acerca da

Psicanálise, dentro, entretanto, de um contexto econômico de

influência marcante em suas opiniões que refletem o caráter

sócio-político-econômico, inclusive, no tocante à problemática da

morte.

Como pólos distintos, o psicanalista arrumou, de um

lado, como fonte de inspiração, o princípio do personagem da

mitologia grega - Eros, Deus do amor, para expressar a energia da

libido e, de outro lado, o também mitológico Tanatos, Deus da

1 in "Filosofia geral e Filosofia do Direito".

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morte, para exprimir o impulso da morte e da destruição.1

Já na esfera da Psicologia Criminal, o homicídio, por

exemplo, desperta na humanidade o interesse no fato de o matar

ou de ser morto ferir suas fibras mais íntimas, com a situação

paradoxal de repulsa e atração que não se definem de maneira

completa, como capazes de diagnosticar a morbidez ou a

insanidade.2

De outra banda, pelo cotejo das lições religiosas,

constatou-se que a pena de morte era admitida e aceita em larga

escala pelas organizações tribais primitivas, como forma de

exclusão do malfeitor de ofensas divinas ou de comportamento

anti-social, ou ainda, como forma de elevação espiritual, por

intermédio de sacrifícios, para aplacar a cólera dos deuses por

ações humanas condenáveis.3

Com o cristianismo e as suas ramificações, o

maometismo e o protestanismo, foi endossada a pena de morte,

com catequese contrária, entretanto, para o suicídio e a eutanásia,

por força da crença da ressurreição, por concepção de Platão

(427?-347? a. C.), com arrimo na dualidade do corpo e da alma,

como entidades distintas, crença estranha, porém, para os judeus,

como lembra Orlando Soares.4

Tecendo comentários sobre o magistério da Igreja

Católica e dos teólogos acerca da pena de morte, sustenta Padre

1Daí a expressão TRILOGIA TANÁTICA, o homicídio, o suicídio e a eutanásia.

2 Hans von Hentig, em “Estudios de la Psicologia Criminal”, vol. II, ps. 9 e segs.

3Charles Hainchelin, em “As Origens das Religiões”,[ S.L.: s.n.], p. 85; Diakov e S. Kovaley, em “História da Antiguidade”, [S.L.:s.n.],p. 68.

4 “Filosofia Geral e Filosofia do Direito”, ps. 75 e segs.

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Emílio Silva Castro, no artigo “Pena de Morte Já”, que dentre

outros autores cristãos, na Antiguidade, segundo o testemunho de

Ermecke, “não se encontra um só que haja negado formalmente a

eticidade da pena capital.”1

Como observara Beccaria,2 se percorremos a História

iremos constatar que as leis, que deveriam constituir convenções

estabelecidas livremente entre os homens livres, quase sempre,

não formam mais do que o instrumento de minorias, ou fruto do

acaso e do momento, e jamais a obra de um prudente observador

da natureza humana, que tenha sabido orientar todas as ações da

sociedade com esta finalidade única: todo o bem-estar possível

para a maioria.

A instalação em uma determinada sociedade de um

ordenamento jurídico é fruto desses momentos mesquinhos e

tôrpes, sempre na deturpação do cerne do problema social, sem

que se tente encontrar resolução com aquela exatidão geométrica

que vence sobre a destreza dos sofismas, as dúvidas e as seduções

da eloquência.

Por isso, o imortal Conde de Bonesana já questionava:

qual a origem das penas e do direito de punir? A pena de morte

será, realmente útil, necessária, imprescindível para a segurança e

estabilidade social?

O poder-dever do Estado de decretar e executar as

penas, em especial a de morte, é consectário da antecedente cessão

de parcelas da liberdade social e da necessária limitação do

1apud Orlando Soares, in Revista Forense, vol. 333, p. 105.

2 “Dos Delitos e das Penas”, ed. Hemus, trad. Torrieri Guimarães,[19--], p. 11.

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depósito da liberdade sacrificada em favor do Estado, por força da

característica despótica do poder que traz consigo a irresistível

tendência à usurpação.

O direito de punir ofertado ao Estado tem uma base

concreta e delineada: a segurança da sociedade e todo o exercício

do poder que deste fundamento se afaste, constitui abuso e não

justiça, já que se trata de um poder de fato e não de direito,

passível, pois, de usurpação. No tocante à pena de morte, assim

escreveu Beccaria: “A pena de morte, pois, não se apoia em

nenhum direito. É a guerra que se declara a um cidadão pelo

país, que considera útil e necessária a eliminação desse

cidadão.”1

A pena de morte só se justifica em determinados

momentos, ou seja, com o caráter provisório latente, em que a

nação está na dependência de recuperar ou perder sua soberania,

períodos em que a confusão produz a substituição das leis pela

desordem, onde os atributos do Poder Soberano ficam

estremecidos tanto na ordem externa como na interna. “A

experiência”, como profetiza Beccaria, “de todos os séculos

demonstra que a pena de morte jamais deteve celerados com a

firme determinação de praticar o mal. Essa verdade está assente

no exemplo dos romanos e nos vinte anos em que reinou a

Imperatriz da Rússia, a benfeitora Isabel, que forneceu aos chefes

dos povos uma lição mais ilustre do que todas as mais brilhantes

conquistas que a nação apenas alcança ao preço do sangue de

seus filhos.O rigor do castigo faz menor efeito sobre o espírito do

homem do que a duração da pena, pois a nossa sensibilidade é

mais frágil e com mais constância atingida por uma impressão

ligeira, porém frequente, do que por abalo violento, porém

1 Idem na referência bibliográfica, p. 45.

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passageiro. Todo ser que tenha sensibilidade está dominado pelo

império do hábito; e, como é este que ensina o homem a falar, a

andar, a satisfazer as suas necessidades, também é ele quem

inscreve no coração humano as idéias morais através de

impressões reiteradas. O espetáculo atroz, porém momentâneo, da

morte de um criminoso, é um freio menos poderoso para o crime,

do que o exemplo de um homem a quem se tira a sua liberdade,

que fica até certo ponto como uma besta de carga e que paga com

trabalhos penosos o prejuízo que causou à sociedade. Essa íntima

reflexão do espectador: ‘Se eu praticasse um delito, estaria toda a

minha existência condenado a essa miserável condição’ - essa

idéia tétrica causaria mais assombro aos espíritos do que o temor

da morte, que se entreve apenas um momento numa obscura

distância que diminui o seu horror.”1

Kant, entretanto, aparteava Beccaria, que, a seu ver,

analisava a pena de morte de forma sofisticada e com o

sentimentalismo e humanitarismo afetados.

Mas, sopesando o racional e o sentimental, não temos

dúvida, com o apoio de Victor Hugo2 de que, em algum ponto

futuro, se hoje preferirmos a racionalidade para pautar nossa

conduta, o juiz dessa nossa ação será o sentimento e, de certo,

seremos condenados.

Como de conhecimento, os juristas de outrora tinham

uma visão totalmente diferente daqueles afetas aos estudiosos do

direito da atualidade.

1 idem, ibidem, p. 46.

2“Razões sentimentais, como dizem alguns desdenhosos que só aceitam a lógica das suas mentes ao nosso ver, são as melhores. Muitas vezes, preferimos as razões do sentimento às razão da razão. Aliás, as duas séries estão sempre ligadas, não nos esqueçamos...” ( ob. cit. na referência bibliográfica, p. 30)

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Eram poetas, com profundo senso de justiça e de

sociologia, apimentado com dose considerável de filosofia. Por

isso, o grande mérito de seus dizeres encontra-se no fato de

detectarem as causas nefastas de uma instituição jurídica e social e

de fornecerem soluções apropriadas, aplicáveis às bases dos

princípios jurígenos.

Essa é a melhor diretriz para se seguir na análise e na

perseguição das soluções do problema punitivo, pelo que se

espera, rogando pela filosofia dos grandes mestres da história, que

os Poderes Públicos absorvam a necessidade imperiosa de

investirem nos princípios regentes do sistema punitivo.

O legislador deve ainda, fazendo uso das palavras de

Beccaria, consequentemente, estabelecer fronteiras ao rigor das

penalidades que, para ser justa, precisa apenas ter o grau de rigor

suficiente para afastar os homens da senda do crime, propiciando-

lhe o retorno de sua intelectualidade criminosa para os ditames

morais e legítimos daqueles que vivem na redoma da moral ética e

jurídica da soberania de um Estado.1

No caso da pena capital pende em seu desfavor a sua

desproporcionalidade, pois que não há crime que se cometa capaz

de conceder ao Estado o direito de vida sobre um co-cidadão.

O direito de punir não pode ser a mola propulsora

capaz de transformar o Estado em cometedor de ação cuja ética e

1 “Este homem, este culpado que tem família, sequestrem-no. Na prisão ainda poderá trabalhar para

os seus. Mas como poderá sustentá-los do fundo do túmulo? Podem imaginar sem sentir arrepios o que será daqueles garotinhos, daquelas menininhas de que estão tirando o pai, isto é o pão? Será que estão contando com eles para abastecer daqui a 15 anos, eles os cárceres, elas os bordéis? Oh! pobres inocentes!” ( Victor Hugo, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 29).

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a moral reprovam e repudiam os cidadãos. Ademais, apesar da

natureza representativa da Casa Congressual, o Estado não pode

impor indiscriminada e genericamente a todos os cidadãos o ônus

de conviverem com o carma de serem o carrasco que executa a

morte de um homem. A democracia1 de representação tem limites

sociais.

A pena de morte, por isso, é prejudicial à sociedade,

pelas demonstrações de crueldade que apresenta aos demais

homens que nela convivem. “Qual é o sentimento da maioria

sobre a pena de morte? Está definido em caracteres indeléveis nos

movimentos de indignação e de desprezo que nos causa a visão do

carrasco, que não é senão o executor inocente da vontade do

povo, um cidadão honesto que contribui para o bem geral e

defende a segurança do Estado no interior, do mesmo modo que o

soldado cuida da sua defesa no exterior. Qual é, portanto, a

origem de tal contradição? E por que esse sentimento de horror

afronta todos os esforços da razão? É porque, em uma parte

abscôndita de nossa alma, onde os princípios naturais não

sofreram ainda alteração, achamos um sentimento que nos diz que

um homem não possui qualquer legítimo direito sobre a existência

de outro, e que apenas a necessidade, que por todos os recantos

estende seu cetro de ferro, pode dispor de nossa vida.” 2

De efeito, no Brasil, o sentimento da maioria é,

inegavelmente de repúdio ostensivo à pena de morte. Em eleição

presidencial passada, já sob a égide da Constituição vigente,

portanto não muito remota, o maior expoente da política nacional

em questão de pena capital como plataforma eletiva, foi o ex-

1Lembramos aqui as palavras de Churchill: “A democracia é a pior de todas as formas imagináveis de

governo, com exceção de todas as demais que já se experimentaram.”

2Beccaria, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 50.

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jornalista e Deputado Federal Amaral Neto que, entretanto, não

logrou êxito no sufrágio, derrota que amargou para os defensores

desta modalidade de pena o prêmio de assunto proibido,

confirmado pelo novo Texto Constitucional após a revisão de

1993.

Entretanto, se na política não mais se ouviu propostas

tendentes à implantação do sistema punitivo capital, na roda

jurídica, com argumentos muito mais subsistentes do que os

próprios e apelativos dos sufrágios, o foco de seguidores ainda

resiste.

Frise-se, por oportuno, que nessa época, parte

considerável da comunidade jurídica e de outros meios científicos

lotou os espaços de doutrina especializada, objeto de coletânea de

artigos sobre a pena de morte, publicada pela seccional da Ordem

dos Advogados do Brasil de São Paulo.

Trazemos à colação, exempli gratia, a opinião do

organizador da coletânea suso mencionada, João Roberto Egydio

Piza Fontes, lançada no artigo intitulado “Reflexões Sobre a Pena

de Morte”1, acerca da alteração da cláusula pétrea constitucional

que garante a não adoção da pena de morte2, que, àquela época,

1 OAB/SP, 1993.

2CF/88, art. 5º, inciso XLVI – “A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa. e) suspensão ou interdição de direitos;

CF/88, 5º, inciso XLVII - Não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra; b) de caráter perpétuo; c) de trabalho forçados; d) de banimento; e) cruéis.”

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em meados de 1993, estava sob o alvo da Reforma: “... o poder

constituinte originário afastou qualquer possibilidade da medida

legislativa que suprima direitos e garantias individuais, dentre os

quais o fundamental direito à vida. Os defensores das trevas,

todavia, não se constragem na tentativa de se igualar ao Criador,

único juiz da vida e da morte, magistrado supremo dos destinos

da humanidade.”

Em comunhão da opinião contrária à aplicação da pena

capital, também se manifestou o especialista em Direito Criminal,

o saudoso Evandro Lins e Silva, no sentido da impossibilidade de

tramitar Emenda Constitucional tendente a alterar a cláusula

garantidora em comento, por força do art. 60, parágrafo 4º1, da

nossa Constituição Federal, assim expressando sua ideologia2: “A

emenda estende a pena capital aos crimes de roubo, sequestro e

estrupo seguidos de morte, e usa de um sofisma, melhor diremos,

de uma esperteza, para evitar a proibição constitucional:-oferece

o que o velho Evaristo de Moraes chamava de um ‘bombonzinho

envenenado’, para situações semelhantes. Fingindo escrúpulos

hipócritas, a Emenda manda submeter o tema ao eleitorado,

através de plebiscito. Não vemos como se possa realizar uma

Emenda Constitucional mediante consulta popular...Há certas

matérias que não podem ser objeto de plebiscito, porque são

conquistas da humanidade e da civilização. Ninguém indagará se

o povo quer ou não quer determinado tipo de vacina, cuja

aplicação a ciência demonstrou ser a maneira de prevenir

doenças e epidemias. Nem é possível admitir a pergunta sob a

eliminação dos doentes terminais, portadores de moléstias con-

1CF/88, art. 60 – “A constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais.”

2Artigo de publicação da Secretaria de Estado de Justiça e da Cidadania do Paraná, com o título “ A MORTE NÃO VALE A PENA”, agosto de 1991, ps. 11-13.

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tagiosas, dos loucos incuráveis, dos deficientes inúteis e

irrecuperáveis, e assim por diante. A sociedade tem de conviver

com as suas desgraças, as suas chagas, as suas enfermidades, as

suas mazelas, entre as quais a criminalidade, que ela deve

combater e sobretudo prevenir, dando a todos condições de uma

vida digna e feliz.”.

Endossava essa repúdia também o insigne Nélson

Hungria ao sustentar que “não é necessária, nem mais exemplar

ou mais intimidativa que a longa privação da liberdade e que

ainda não se pode comprovar que a pena de morte seja mais

eficiente que a pena de encarceramento”, não deixando, porém, ao

comentar as disposições do art. 141, par. 31, da Carta Magna de

1946, que possuia texto equivalente ao que dispõe o art. 5º ,inciso

XLVII, letra “a” , da atual Carta, de advertir: “A pena de morte

pode, excepcionalmente, apresentar-se tão necessária quanto o

homicídio no campo de batalha. Não propriamente como castigo

ou como pena, mas como um meio premente de defesa social,

tornando-se, como tal, inquestionavelmente legítima. O caso que

considero excepcional é o crime organizado, que, em certo

momento, ferozmente militante, numa reiteração espantosa de

dramas de sangue, ponha em perigo efetivo a segurança coletiva.

Impõe-se, portanto, o extermínio do grupo fora da lei, do bando

de desenganados inimigos do gênero humano. Não como medida

de escarmento, mas como um gesto idêntico aos do que se

defendem de uma alcatéia de lobos esfaimados e furiosos. Quando

se tem em vista casos dessa ordem, embora de caráter

excepcionalíssimo, ou francamente anormal, é que se poderia

criticar tenha sido, no Brasil, erigido em preceito constitucional a

inaplicabilidade da pena de morte. Para emergências como a que

teve de enfrentar o país dos ianques é que a pena de morte

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poderia ser como uma espingarda atrás da porta.”1

Como evidente, essas posições sofreram acirradas

investidas dos defensores da pena de morte, principalmente, com

base nas exceções arguidas por Hungria que, se vivo ao tempo de

hoje, reinado de criminosos poderosos, de certo, a apoiaria.

Também invocam as palavras proferidas por Ruy Barbosa

proferidas no Discurso no Colégio Anchieta: “tudo no Direito é

mudar constante”, como meio necessário de proteção das relações

sociais e do equilíbiro Estatal para favorecer o bem estar social.

Alegam ainda que as denominadas cláusulas pétreas

não possuem a força que se pretende dar, a ponto de impedir a

alteração dos critérios acerca dos tipos de pena mais convenientes,

em função das circunstâncias sociais, políticas e econômicas de

cada momento histórico, já que essas situações são dinâmicas por

natureza e, portanto, suscetíveis de constante revisão, sob pena de

estratificação do direito2.

Nessa linha, Orlando Gomes, fervoroso defensor da

pena máxima, ofereceu ao Instituto dos Advogados Brasileiros a

Indicação nº 20/89, onde constam proposições acerca daquela

punição para certos crimes, com os fundamentos de que a pena de

morte extralegal já é utilizada em larga escala no Brasil pelos

denominados grupos de extermínio e esquadrões da morte, como

testificado por Emílio Silva.3

Aduz, ainda, que o crescimento progressivo da

1“Comentários ao Código Penal”, vol.I, tomo 2, ps. 454-462.

2 Orlando Soares, “Fundamentos da Pena de Morte”, Revista Forense, vol. 333, p. 112.

3 em “Extinção das Prisões e dos Hospitais Psiquiátricos”, pp. 79 e segs.

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criminalidade patrimonial violenta é fruto da opressão político-

econômica, da concentração da renda, do elitismo, da miséria e da

fome, circunstâncias que afligem a população brasileira, sobretudo

a partir de 1964, e que, somente uma nova ordem interna e

internacional, justa e fraterna, sem privilégios poderá reverter os

fatores criminógenos presentes na atualidade.1

Podemos extrair em resumo de suas idéias de que a

lembrança dolorosa e cruel do patíbulo (estrado da forca,

cadafalso), com toda a sua simbologia fúnebre, pois os martírios

dos condenados, tais como Jesus, Sócrates, Savonarola, Wyclíffe,

Huss, Giordano Bruno, Tiradentes e outros, defensores de ideais

políticos e filosóficos de relevante valor para a civilização, não

podem ser comparados com a morte de facínoras e criminosos,

cujo único ânimo é a torpeza.2

Injustificável também para o autor a argumentação,

aparentemente piedosa e complacente, de que é preferível a prisão

pérpetua do que a morte, eis que aquela é muito mais torturosa e

degradante ao ser humano, pois verdadeira casa de horrores, onde

os detentos estão sujeito a todo o tipo de violência física e sexual,

torturas, castigos, e ao final do cumprimento da expiação, são

1 Nesse sentido, o referido articulista já apresentou diversos trabalhos, dentre eles: “Causas de

Criminalidade e Fatores Criminógenos”, Rio, 1978; “Prevenção e Repreensão da Criminalidade”, Rio, 1988; “Relatório sobre a Criminalidade Patrimonial Violenta”, Rio, 1984; “Pena de Morte”, in Revista Forense, 306/117.

2Entretanto, disse Victor Hugo (ob. cit. na referência bibliográfica, p.28): “Ou o homem que estão castigando não tem família, parentes, nem agregados neste mundo e, neste caso, não recebeu nem educação, nem instrução, nem cuidados para a mente, nem cuidados para o coração; e então com que direito estão matando este órfão infeliz? Estão punindo-o porque sua infância rastejou no chão sem talo e nem tutor (o tutor

aqui pode ser entendido como o Estado-nossa observação) estão acusando-o do crime de isolamento no qual o deixaram! da sua infelicidade fazem um crime! ninguém o ensinou a saber o que ele estava fazendo. Este homem ignora. A culpa é de seu destino, não dele. Estão castigando um inocente.” Lembre-se ainda que o articulistas Orlando Soares asseverou que o criminoso é fruto da opressão político-econômica. Há algo de incoerente em suas palavras...!

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estigmatizados e execrados pela sociedade.1

No cumprimento da pena de morte, alega o autor, os

métodos atuais de execução, como, por exemplo, a injeção letal,

não produz qualquer alarde e sofrimento ao executado, com

manutenção, inclusive, da dignidade compatível com sua condição

de humano, não podendo a sociedade avocar como regra os casos

de execuções públicas, como ocorrem na China, onde o condenado

recebe um tiro na nuca. Nesse país, as execuções fazem parte de

uma grande campanha de repressão ao crime lançada pelo governo

chinês. Desde então, cerca de 2 mil pesssoas já foram executadas,

causando fortes críticas da opinião pública internacional, em

especial das organizações humanitárias e de juristas nacionais.2

Aliás, desde a década de 1960, cerca de 117 países

integrantes das Organizações das Nações unidas adotam a pena de

morte, dentre eles, com exceção de Hong Kong, além da China,

todos os demais Estados asiáticos e, também, os do Oriente Médio

- Egito, Irã, Iraque, Jordânia, Síria, Iêmen e a Arábia Saudita, onde

é seguida a Sharia, lei islâmica. São punidos com a pena capital,

entre outros crimes, o estupro, o homicídio e o tráfico de drogas.

Na Europa Ocidental, ao contrário, maciçamente abolicionista, não

há a adoção dela nos respectivos ordenamentos jurídicos dos

países que a compõe, como anota Antonio Beristain.3

1 “Os que julgam e condenam dizem a pena de morte necessária. Em primeiro lugar, porque é

importante eliminar da comunidade social um membro que já a prejudicou e que poderia prejudicá-la outra vez. Se se trata-se apenas disso, a prisão perpétua seria suficiente. Para que a morte? retrucam que se pode escapar de uma prisão? Melhorem as rondas? Se não têm confiança na solidez das grades, como ousam manter feras em cativeiros? Nada de carrasco onde basta o carcereiro.” (Victor Hugo, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 25). Além do mais, se as celas são cenários de horror, a condenação à morte de alguns criminosos não apagará o sofrimento de outros, de menores delitos que foram condenados à pena privativa de liberdade. Simples! Matem todos! é óbvio, a pena capital é, então, um prêmio.

2Reportagens do “Jornal do Brasil”, dos dias 25.11.93 e 10.08.96.

3“Hacia el Abolicionismo de La Sanción Capital en España”, em Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 98, ps. 169 e segs.

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Para alicerçar sua posição doutrinária, apesar de

discordarmos pelas razões que vêm sendo lançadas no bojo deste

escrito, Orlando Soares traz à colação o magistério da igreja

católica que alinha argumentos favoráveis à pena de morte,

citando para tanto o padre Emílio Silva Castro (“Pena de Morte

Já”), que elenca os seguintes tópicos: “a) consentimento universal

em relação à mesma, desde a Antigüidade;b) a pena capital é

admitida tanto no Antigo Testamento, quanto no Novo

Testamento;c) a Igreja Católica Apostólica Romana também

acolheu a pena de morte, se bem que algumas personalidades

eclesiásticas se manifestaram contra a participação dos cristãos

nas execuções, como Atenágoras, Orígenes e Lactâncio;d) no

Antigo Testamento (Êxodo), por exemplo, se lê: ‘Quem ferir um

homem, querendo matá-lo, será castigado com a morte’, o que é

u'a manisfestação do princípio do talião, em que se funda a pena

capital;e) da mesma forma no Levítico: ‘Quem ferir e matar um

homem, seja morto irremissivelmente’; f) por sua vez, o Novo

Testamento fala diversas vezes na pena de morte, sendo que Jesus,

no Sermão da Montanha, previne a multidão sobre a missão dele:

‘Não penseis que vim para ab-rogá-la, senão para aperfeiçoá-

la...’;g) disse Jesus a Pedro: ‘Embainha tua espada; porque todos

os que usarem a espada, pela espada morrerão.’”

Traz também a filosofia do monge medieval Tomás de

Aquino(1225-1274) lançada na obra “Suma Teológica”, para quem

a pena de morte é necessária à saúde do corpo social, como

exemplo, cabendo aplicá-la, assim como “é missão do médico

amputar o membro gangrenado para salvar o resto do

organismo”, corroborada pelo Sermão de São Paulo: “um pouco

de levedura corrompe toda a massa.”1

1“Tem que haver exemplos! tem que apavorar pelo espetáculo da morte, reservada aos criminosos,

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Em epílogo de sua exposição, o articulista e escritor

avoca o magistério do penalista Vicenzo Manzini que entende ser

a pena de morte compatível com qualquer sistema político,

mormente pelo fato de que, sendo ela força máxima para

intimidação do delito, as demais e menos implacáveis punições

estariam cumprindo sua função como consequência lógica, pois se

é possível estabelecer, em números, a quantidade de condenados à

morte, impossível saber-se quantos refutaram ao crime por sua

causa.

Manzini suporta suas experiências no exemplo dos

E.U.A., onde criminosos homicidas imigram para estados

federados onde não é adotada a pena capital. Cultua o princípio de

que “quem não serve para servir, não serve para viver”, ou seja,

quem não está disposto a espiritualizar-se para gozar da

convivência fraterna e solidária, não merece a existência.1

aqueles que poderiam cair na tentação de imitá-los! esta é quase textualmente a eterna frase cujas variações mais ou menos sonora ouvimos em todos os requisitórios dos quinhentos tribunais da França. Pois bem! primeiro, negamos que haja exemplo. Negamos que o espetáculos dos suplícios produza o efeito esperado. Longe de edificar o povo, desmoraliza-o e arruina dele qualquer sensibilidade, portanto qualquer virtude.” (Victor Hugo ob. cit. na referência bibliográfica, p. 26).

1“Se, apesar da experiência, fazem questão da teoria rotineira do exemplo, que nos devolvam então o século dezesseis, sejam verdadeiramente formidáveis, que nos devolvam a variedade dos suplícios, FARINACCI-JUIZ ROMANO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XVI, FAMOSO PELA SUA DESUMANIDADE-,que nos devolvam os atormentadores jurados, que nos devolvam a forca, a roda, a fogueira, a estrapada, o desorelhamento, o esquartejamento, a fossa de sepultar vivos, a cuba de escaldar vivos; devolvam-nos em cada esquina de Paris, como uma boutique a mais entre as outras, a hedionda banca do carrasco, sempre repleta de carne fresca. Que nos devolvam MontFaucom-localidade situada fora dos muros de Paris, entre La Villette e as Buttes-Chaumont onde era erguido um famoso cadafalso remanente do século XIII - e junto com os 16 mastros de pedra, os toscos fundamentos, os ossários subterrâneos, as travas, os ferros, as correntes, as fileiras de esqueletos, o relêvo de gesso pontilhado de corvos, as forcas anexas, e o cheiro de cadáver que o vento de noroeste espalha em generosas lufadas sobre todo o Faubourg Dutempler. Sim devolva-nos na sua permanência e sua potência esse gigantesco alpendre do carrasco de Paris. Agora sim! isto é que é exemplo! isto é que é pena de morte bem entendida. Eis um sisitema de suplícios de proporções respeitáveis. Isto sim é horrível, mas aterrorizante. Ou então façam como na Inglaterra. Na Inglaterra, país de comércio, pegam um contrabandista na costa de Douvres, pegam-no para o exemplo, para o exemplo deixam-no pendurado na forca; porém já que as intempéries do ar poderiam deteriorar o cadáver, ele é cuidadosamente embrulhado numa lona coberta de alcatrão, para ele não ter que ser trocado tão amiúde. oh! terra econômica! passam alcatrão nos enforcados! no entanto, não é desprovido de lógica. É a maneira mais humana de entender a teoria do exemplo.” (ob. cit. na referência bibliográfica, p. 26, Victor Hugo).

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De efeito, a Constituição Federal da República

Federativa do Brasil dispõe no artigo 5., inciso XLVII, letras “a” e

“e”, a respeito de penas não praticadas e inadmissíveis no Brasil,

aí incluídas a pena de morte, com ressalvas dos casos previstos na

legislação militar e em tempo de guerra (CF, art. 84, XIX),

dispositivos mantidos pela Revisão Constitucional de 1993.

Mas nem sempre foi assim. Historiadores nacionais

nos asseveram que a pena de morte vigorou no país em diversos

momentos, desde a época colonial, durante o Império e, também,

após a instalação da República, como modalidade de punição a

diferentes crimes, sem as excludentes atuais da legislação militar e

do tempo de beligerância.1

Nos idos da Constituição de 1824, ainda sob a

influência do liberalismo das Revoluções Americana e Francesa,

estava estabelecido, no seu art. 179, item 19 que “Desde já ficam

abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as

demais penas cruéis”. Em leitura perfunctória, engana-se o leitor

ao achar que a pena de morte havia sido expressamente abolida.

Ela continuava a existir na legislação ordinária e sua aplicação, é

verdade, era refreada ao extremo como corolário de sua fonte

inspiradora.2

Ainda sob o Império, depois de ocorrido um célebre

erro judiciário, ocorrido em 1855, que levou à forca o fazendeiro

fluminense Manuel Mota Coqueiro, Pedro II passou a comutar,

sistematicamente, a pena de morte na de galés - trabalhos forçados

e perpétuos, salvo nos casos de assassinato, praticado pelos

1“Direito Penal”, Orlando Soares, pp. 152 e segs.

2“Pena de Morte e Constituição”, Dirceia Moreira, Revista de Ciência Política, vol.13, pp. 72/73.

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escravos contra seus senhores, em atitude classista e

preconceituosa reinante e justificadora da própria escravidão,

conforme veredito dos historiadores.

O malsinado julgamento teve como origem a chacina

de um colono, Francisco Benedito e toda a sua família, que teriam

sido vítimas de vingança passional, sendo certo que,

posteriormente à execução, veio a descobrir-se que a verdadeira

autora do delito fora a mulher do condenado.1

Com efeito, em seus Comentários à Constituição

Brasileira, Carlos Maximiliano registra o fato da grande simpatia

popular a Pedro II, por certas práticas magnânime, carreadas por

decretos condenatórios benevolentes, com exceção de sua posição

firme e inflexível de eximir os escravos assassinos do benefício da

comutação da pena capital.

Na Carta Republicana de 1891 a pena de morte foi

abolida do cenário jurídico penal, restrita que ficou sua aplicação

na legislação militar e em tempo de guerra, tendo sido mantido a

abolição na Constituição de 1934, que sofreu alteração em 1935,

por força da intentona comunista, por três emendas aprovadas pelo

Decreto Legislativo nº 6, estendendo as exceções mencionadas

também para os casos de comoção interna grave, com finalidade

de subverter as instituições políticas e sociais.

A Constituição de 1937, no seu art. 122, § 13º,

rompendo com a tradição republicana, tornou aplicável a pena de

morte, fora da situação de guerra extrena ou interna; a crimes

contra a soberania da Nação; contra a unidade da federação; contra

1“O Ocaso de Um Mito”, René Ariel Dotti, in a Morte não Vale a Pena, publicação da Secretaria de

Estado da Justiça e da Cidadania do Paraná, 1991.

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a ordem social e política; de homicídio por motivo fútil ou

praticado com excesso de perversidade. Não houve nenhuma

execução.1

A tradição republicana foi restabelecida por ocasião da

promulgação da Constituição de 1946, com a inaplicabilidade da

pena de morte, exceto em situações extraordinárias.

Sob o regime militar, vigorante pós-1964, foi prevista

a pena de morte pelo Decreto-lei nº 898, de 29.09.69, para os casos

de crimes classificados como delitos contra a segurança nacional,

dentre outros, sabotagem; propoganda e ações consideradas

subversivas; espionagem; violência contra chefe de governo

estrangeiro, insurreição armada; guerra revolucionária; assalto a

banco com resultado morte.

Na verdade, diga-se em adendo, os termos “segurança

nacional” e “ações consideradas subversivas” eram conceitos

jurídicos inderterminados ou indetermináveis pelos cidadãos,

sujeitos à aferição e à determinação por órgãos políticos e não

jurídicos, o que trazia como consequência nefasta o fato de poder

ser aplicada a qualquer situação de conduta jurídica aceitável e

prevista, porém, recriminada por ser, para o Governo, anti-social.

Enfim, a pena de morte implantada no Brasil àquela

época ditatorial visava reprimir as ações daqueles que se opunham

ao arbítrio e à violência governamental, id est, eram considerados

agentes desses crimes os intelectuais progressistas, os religiosos

ligados aos movimentos populares, estudantes, operários e

políticos democratas ou de outras ideologias político-partidárias

contrárias àquelas desenvolvidas pelo Estado Ditatorial.

1 “Pena de Morte e Constituição”, Dirceia Moreira, idem na referência bibliográfica.

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Orlando Soares, no artigo “Fundamentos da Pena de

Morte”1 assim narrou a pena de morte no regime militar brasileiro

e a sua respectiva herança macabra para os dias atuais. Vejamos:

“O fato é que o regime militar representou, simbolicamente, uma

espécie de ventre maldito, estimulando ao máximo, pelos meios de

comunicação social, a erotização desenfreada e deletéria(como a

compensação emocional à opressão política e à alienação

cultural que provocou), mas gerando também a reação e a revolta

incontrolável por parte das forças progressivas do país.Quer

dizer, as ações acima indicadas, consideradas criminosas e

punidas com a pena de morte, na forma estabelecida pela

famigerada Lei de Segurança Nacional, representava na verdade

uma autêntica reação contra a natureza elitista, opressiva,

espoliativa, tendente à concentração de renda e contrária aos

interesses nacionais, segundo o modelo de desenvolvimento

econômico imposto pelo regime militar, como braço armado do

imperialismo norte-americano, que havia contribuído,

decisivamente, para a deposição do presidente João Goulart...A

propósito, convém lembrar que, na época da elaboração da Carta

Política de 1988, o País estava se libertando do regime militar,

implantado pós-1964, regime esse que vigorou cerca de 20 anos,

durante os quais foram postas em prática as mais execráveis

medidas, de natureza política, penal, sindical, estudantil, salarial,

de concentração de renda, de opressão intelectual, a ponto de se

considerar como inimigos internos aqueles que simplesmente

protestavam contra as arbitrariedades do regime vigorante, e

como tais punidos drasticamente, pelas nefandas leis de

segurança nacional, ocasião em que foi prevista, inclusive, a pena

de morte, autorizada pelo Ato Institucional nº 14, de 05.09.69, e

estabelecida no DL n. 898, de 29.09.69(define os crimes contra

1Publicado na Revista Forense, volume 333, pp. 109 e segs.

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a Segurança Nacional).Por sua vez, a denominada Emenda

Constitucional nº 1, de 17.10.69, outorgada pela Junta Militar que

então governava o País, também previu a pena de morte, para as

hipóteses de ‘guerra externa, psicológica adversa, ou

revolucionária ou subversiva, nos termos que a lei determinar’

(art. 153, parágrafo 11).”

Eis um breve relato da passagem da pena de morte no

Brasil.

De efeito, apesar de pouco tempo passado da negação,

pela sociedade brasileira, para a implantação da pena de morte em

nosso país, como se viu alhures, a população, principalmente nos

grandes centros urbanos, clama por segurança, força do

crescimento indiscriminado da guerrilha urbana.

Essa insegurança, levada que está a extremo, fez com

que alguns autores contrário à pena de morte, como Franck, citado

por Maurício Levy Junior,1 começassem a vê-la com os mesmos

princípios da legítima defesa, como se infere das palavras a seguir:

“Só existe a inviolabilidade nos limites de nossos direitos; cessa

desde que deste saiamos para atacarmos os de outrem. A

liberdade quando se torna instrumento de agressão, pode ser

suspensa; a vida do delinquente, quando vem a ser um perigo

para a do inocente, pode ser sacrificada.”

Nessa esteira, apesar de ser um direito fundamental,

asseveram os apoiadores que o direito à vida também sofre

limitações. Tem uma reserva direta quando a Constituição ressalva

a possibilidade de aplicação da pena de morte nos casos de guerra

declarada. Aparece, em seara ordinária penal, outra limitação,

1“Comentários a propósito da pena de morte”, Revista dos Tribunais, SP, n. 26, dez/87, p. 141.

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como, por exemplo, a legítima defesa e o estado de necessidade,

que permite o sacrifício do direito à vida, nos moldes

especificados nas respectivas normas.

O ponto fundamental,. Nessa visão, cinge-se aos

denominados limites imanentes que o direito à vida está

submetido. É certo que da vida tudo advém e que, prima facie,

nenhuma restrição poderia então sofrer. Porém, a vida é mais uma

peça no jogo constitucional, ainda que a mais importante, não

podendo furtar-se às regras como as demais.

Por isso, também Dirceia Moreira,1 apesar de olhar

com reservas à pena capital, como se depreende do intróito de seu

artigo, conclue que “a constitucionalidade se sustenta na

existência de limites ao direito à vida, explícitos e implícitos,

portanto, a previsão de pena de morte se justificaria pela

explicitação de limitação já existente ao direito à vida decorrente

da necessidade de realização de outros direitos fundamentais,

como o da segurança.”

Outro exemplo é a opinião de Manoel G. Ferreira

Filho,2 in verbis: “Eu quero dizer, em primeiro lugar que eu não

sou favorável à pena de morte e, em segundo lugar, eu não acho

que o plebiscito seja inconstitucional. A Constituição prevê o

direito à vida, mas nem por isso ela proíbe a legítima defesa.

Consequentemente, eu não vejo nenhuma inconstitucionalidade

em um plebiscito hoje sobre pena de morte, nem vejo

inconstitucionalidade na instauração da pena de morte no Brasil,

o que não significa, repito, que seja favorável à pena de morte. Eu

1Revista de Ciências Políticas, vol. 13, p. 78.

2Revisão Constitucional, Cadernos Liberais, Instituto Tancredo Neves, Brasília, vol. III/XCI, 1991, p. 29.

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estou examinando a questão do ângulo constitucional, não do

ângulo da aderênca.”

Toda essa questão mencionada pelos autores suso

citados tem arrimo na doutrina kelsiana do “ser” e do “dever-ser”,

da tensão existente entre o direito natural e o direito positivo. É a

idolatria da Constituição como ser supremo capaz de instituir um

direito fundamental e, como consectário, limitá-lo e restringí-lo.

Nesse diapasão limitativo, temos como representante o insigne JJ.

Gomes Canotilho,1 que assevera: “o direito garantido por uma

norma constitucional como direito, liberdade ou garantia

insuscetível de restrições é mesmo, prima facie, um direito sem

reserva de restrições. Todavia, a posteriori, através do jogo de

‘argumento e contra-argumento’, de ponderação de princípios

jurídico-constitucionais, pode chegar-se à necessidade de uma

optimização racional (que só é possível porque os princípios

transportam dimensões objetivas possibilitadora de uma

ponderação de bens jurídico-constitucionais efetuadas a partir da

própria Constituição), controlada, adequada e contextual, de

várias constelações de princípios jurídico-constitucionais.”

E arremata o ilustre e expoente constitucionalista: “...

as regras de direito constitucional de conflitos têm de construir-se

com base na harmonização de direitos, e, no caso de isso ser

necessário, na prevalência (ou na relação de prevalência) de um

direito ou bem em relação a outro, que só em face das

circunstâncias concretas se poderá elaborar, pois só nestas

condições é legítimo dizer que um direito tem mais peso do que o

outro; ou seja, um direito prefere ao outro em face das

circunstâncias do caso.”2

1“Direito Constitucional”, Coimbra, Almedina, 1991, p. 620.

2idem, ibidem, na referência bibliográfica p. 660.

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Canotilho1 traz a importância do texto da Carta Maior

para a existência própria dos direitos fundamentais pelas palavras

de Cruz Villalon, que assim traduz o que, para nós, se trata da

“coisificação” dos direitos naturais, in litteris: “Onde não existir

Constituição não haverá direitos fundamentais. Existirão outras

coisas, seguramente mais importantes, direitos humanos,

dignidade da pessoa, existirão coisas parecidas, igualmente

importante, como as liberdades públicas francesas, os direitos

subjetivos dos alemães; haverá enfim, coisas distintas como foros

e privilégios.”

Talvez, quem sabe, foro natural e privilégio de viver!

“La vida consiste en la compresencia, en la coexistencia del yo

con un mundo de un mundo conmigo, como elementos

inseparables, inescindibles, correlativos.”2

Sem maiores ilações acerca do aspecto constitucional,

certo é que, em nossa opinião, constitucionalizar direitos

fundamentais para justificar, em primeiro plano, a democracia e,

em segundo, o direito legalizado da sociedade em acolher a pena

de morte como se sua sobrevivência disso dependesse é, no

mínimo, antijurídico em essência e ilógico.

De efeito, as sociedades primitivas não estavam

tuteladas por ente estatal legitimado e com poder de império capaz

de defender o corpo social do criminoso, colocando, frente à

frente, a defesa do interesse público - a segurança, em confronto

com o malefício do delinquente, a justificar que a sociedade,

1idem, na referência bibliográfica p. 507.

2 Ortega y Casset, apud José Afonso da Silva, “Curso de Direito Constitucional Positivo” Malheiros,SP: 1992, p. 181.

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através de um de seus membros, executasse uma lei

consuetudinária e sua decorrente sentença, com a morte. Esta

situação não é confundível com a realidade incorporada pela

criação do Estado e nem com as excludentes de crime(legítima

defesa, aborto, estado de necessidade etc.).

No Brasil, por exemplo, em momento nenhum é

permitido a violação ao direito à vida. Este direito fundamental

não é limitado pela Constituição, sendo cláusula pétrea intocável,

por ser direito natural do homem e não uma conquista social,

somente. O fato de se permitir as excludentes mencionadas em

seara ordinária, não resulta na afirmação de que o povo, encontra-

se sob o jugo direto do malfeitor e na batalha de viver ou morrer,

como o era no estado selvagem dos primórdios da sociedade, para

autorizá-la a determinar a morte de um homem.

Atualmente, poderoso o Estado para legalizar as

condutas típicas afrontosas e subjugar o delinquente ao seu

proclamo político-judicial de privação da liberdade, por questão de

simples silogismo, data respecta, torna inexistente aquele cenário

confrontador de sobrevivência social, a redundar a aclamação da

segurança pública como bem público a ser sopesado com o crime

para se chegar à excludente da execução da vida do condenado,

pela legítima defesa ou estado de necessidade. Ausente, assim, os

requisitos objetivos dos permissivos: a capacidade de defesa da

sociedade ameaçada e a potencialidade da ameaça do crime e do

criminoso.

O Estado, é certo, em termos de amparar o cidadão

com o seu direito constitucional à segurança e a outros direitos

individuais e sociais, está à beira da bancarrota, totalmente falido

financeira e ideologicamente, não fornecendo o atual sistema

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punitivo o amparo capaz de suportarem-se as mazelas comuns da

criminalidade.

O “estado de criminalidade”, como agora

conceituamos, não é algo à margem da lei e da moral. É, na

verdade, uma instituição nacional. Porém, mesmo assim, não é

justificativa para a expiação capital.

Não falamos aqui, evidentemente, sobre a

criminalidade violenta somente. A corrupção nos órgãos públicos,

corroendo as estruturas basilares da administração pública no seu

próprio seio e na sua relação Estado versus Cidadão; a

impraticabilidade das garantias legais; a situação impotente a que

estão submetidos os pagadores de tributos de conviver, contínua e

diariamente, com escândalos apocalípticos nas mais altas cúpulas

governamentais , colocam o Brasil no front , na trincheira daquela

guerrilha comandada, patrocinada e estrelada pelo submundo

marginal.

Se necessário, esclarecemos. Na medida em que o

Estado paternal, provedor, protetor foi criado, exigindo-se para

tanto cessões de parcelas da liberdade, para primeiramente se

agruparem em pequenos projetos, módulos de sociedades com o

fito de resistirem aos estado de beligerância natural e, mais à

frente, para ususfruirem de proteção daquelas ainda inevitáveis

ameaças naturais e também dos outros módulos sociais já

existentes e mais poderosos pela força do grupo, o que sempre

permeou esse desenvolvimento social, além do seu próprio

florescer, foi a SEGURANÇA.

Assim, a segurança sempre foi o marco divisor entre a

sociedade e a guerra. Ao Estado, portanto, sempre foi imposta a

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obrigação maior de que manter a ordem, dentre outras atribuições

de igual relevância.

Atualmente, vive-se em sociedade e, apesar dos

milênios decorridos, a necessidade premente continua a ser vital

para o homem. À toda evidência, as características geográficas, a

fauna, a flora e os fatores globais não são semelhantes àqueles de

priscas eras, porém, a ameaça, o temor, a insegurança são

sentimentos indeléveis no homem, não sendo seu

desenvolvimento intelectual até a atualidade, suficiente para

deixarmos de afirmar que a segurança de sua integridade física

continua a figurar como a mais importante necessidade do

homem.

Ruinoso o Estado-Protetor, que separa e protege o

homem da realidade violenta e da ameaça externa, seja em que

época for, redunda na consciência de fragilidade do homem , que

não passa de um reles vertebrado, mortal como um pequeno e

indefeso inseto. Todo o problema reside nesta consciência.

Lembramos aqui de oportuna crítica de Freud:1 “No decurso do

desenvolvimento da civilização, o homem adquiriu uma posição

de predomínio sobre as criaturas companheiras do reino animal;

mas, não contente com tal supremacia, pôs-se a cavar um abismo

entre a sua natureza e a dos animais. Negou-lhes a posse e a

razão, atribuiu a si mesmo uma alma imortal e pretendeu arrogar-

se afoitamente uma origem divina; isto lhe permitiu romper o elo

de comunhão entre si e o reino animal... Todos sabem muito bem

que faz pouco mais de meio século as pesquisas de Charles

Darwin e dos seus colaboradores e precursores puseram fim a

esta presunção do homem. O homem não é um ser diferente dos

animais ou superior a eles; ele próprio descende dos animais e

1Apud Orlando Soares, idem retro, na referência bibliográfica, p. 106.

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possui uma afinidade mais estreita a alguma espécie e menos a

outra. Os progressos que o homem realizou não conseguiram

anular as provas da sua afinidade com essas espécies, tanto do

ponto de vista da estrutura física com também das disposições

psíquicas. Isto representa um golpe ulterior desferido contra o seu

narcisismo, o golpe biológico.”

Cônscio e acurralado, o ser humano, pelos seus dotes

de domínio da máquina e do poder, não reage simplesmente em

atos de fuga, de mera preservação da espécie.

Navegando pelos institutos sociais por ele criado, é

possível , se isso o ameaçar, exterminar tantos outros semelhantes

quanto suficientes para liberar-se daquele medo que o consome de

forma imediatista, fruto do temor mitológico de seus ancentrais.

O homem globalizado se vê nessa situação de

beligerância. A batalha travada, entretanto, não se resume a resistir

às ameaças de outros pares, mas à falência das instituições sociais.

Quando os Governos proclamam a adoção da pena de

morte, por exemplo, não se pretender eliminar um homem

marginal. Disse-nos antes sobre o nosso respeito a sentimentos

naturais de altruísmo, de solidariedade, de fraternidade e,

principalmente, do sentimento de culpa.

O sentimento de culpa é, por sua vez, antecedente e

preponderante sobre todos os demais, posto que é individualista,

egoísta. O sentir da culpa reage negativamente, de forma

centrípeta, enquanto os outros de forma centrífuga, porque

interage com o exterior. A culpa não. Ou seja, o sentimento de

culpa tende a irradiar efeitos para o interior do homem, enquanto

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que os demais meios de sentir (fraternidade, solidariedade) tendem

a aparentar demonstrações para o exterior, com relação causal com

terceiros.

Na verdade, a pena capital exsurge como uma vávula

de escape dos Governos e também de seus cidadãos em libertar-se

desse temor que corroem as suas vísceras: A INSEGURANÇA. A

pena máxima, tal qual a fé, não passa de uma forma de exorcizar

os medos e a impotência humana, pois o Estado é diretamente

incompetente para garantir a inexistência do crime ou banir do

seio social os criminosos virtuais. Os cidadãos, por sua vez,

indiretamente carregam a consciência desse fardo. A sociedade

não pode esperar a eliminação do crime, questionando sob a voz

social: quando ficaremos livres dos criminosos? O crime deve ser

repensado de maneira a com ele conviver-se, cientes de que é

inevitável, como o é o progresso.

O que se deve aspirar é revolver uma instituição

ineficiente para atender e satisfazer a necessidade humana, no

caso, um sistema punitivo que promova eficazmente a prevenção,

a retribuição e, se possível, a ressocialização do meliante.

Porém, o engodo do recrudescimento da punição é

latente. Essa solução é imediatista, porquanto é fruto da resistência

enfraquecida da sociedade em digladiar contra o terror da

insegurança, cujo fôlego já se expirou, gerando anseio de não

admitir postergações e remédios de solução a médio ou longo

prazo.

A revolução1 não deve ser voltada para a instituição

1Revolução é a ação ou efeito de revolucionar. Revolucionar é resolver, mexer de baixo para cima,

instigar à revolta, causar uma notável mudança. A revolução, nominalmente considerada, pode ser pacífica ou violenta, dependendo de seu processo e da sua natureza. Paulo Bonavides, in “Ciência Política”, Forense, RJ:

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punitiva, mas empenhada em dirigir-se ao obrigado à segurança,

ou seja, àquele que se atribuiu o ônus de divisor entre a sociedade

do bem e os seus filhos maléficos: O Estado. A ele cabe efetivar os

institutos sociais, jurídicos e políticos capazes de, pelo menos,

mitigar os efeitos deletérios ínsitos às sociedades humanas,

decorrentes das distorções existentes entre os homens e as classes

econômicas do capital e do trabalho.

Aliás, como apontou o então Deputado Federal pelo

PT de São Paulo, José Genoíno, ao se manifestar no dia da

comemoração dos Direitos Humanos, a ineficiência e a

morosidade da Justiça são as grandes fontes de violação dos

direitos humanos, pois sem justiça que funcione e garanta o

princípio de igualdade perante a lei, não há o ingresso no sistema

democrático. No Brasil, a violação dos direitos de cidadania, a

exclusão social, a existência de um aparato estatal e policial que

está a serviço dos mais ricos e que se volta contra os mais pobres

são fatores que representam uma situação de fato que anula o

Estado de direito formal e que a grande revolução que o Brasil

precisa fazer é diminuir a distância entre o Estado de direito

formal e os direitos reais dos cidadãos e, sem a consecução desse

movimento, que implica na realização de tarefas enormes e na

superação de desafios imensos, as portas do século XXI não se

abrirão para o nosso país pela entrada da civilização.1

1986, p. 627), selecionou três conceitos básicos: o histórico-cultural; o jurídico e o político. O primeiro aplica-se às grandes mudanças nas artes, ciências, técnicas, filosofia, praxis social, que representaram um novo período cultural, um novo desenvolvimento histórico. O segundo, aplica-se à quebra do princípio da legalidade vigente. A substituição de um ordenamento jurídico por outro, com o advento de novas instituições, pelo exercício originário do poder constituinte. O terceiro e último, aplica-se à substituição violenta de governos, de pessoal, de programas, de classes dominantes. Revolução, portanto, é toda mudança violenta nas instituições políticas de uma nação.

1Artigo publicado no jornal “O Globo”, do dia 10.12.96.

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Em interessante resenha1, Sérgio Salomão Shecaira

trouxe os apontamentos científicos do trabalho de autoria de

Alípio de Sousa Filho, docente do Departamento de Ciências

Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,

intitulado “Medos, Mitos e Castigos: notas sobre a pena de mor-

te”2, cujo teor, de alta relevância, não pode ser suprimido em

trabalho comprometido em anotar considerações sobre a pena

capital.

No opúsculo, o problema não é cuidado sob à

perspectiva jurídica, mas sob o enfoque humanitário, tão

necessário nestes tempos de dogmatismos supostamente neutros.

Na realidade, como asseverado na resenha, cuida-se de um estudo

antropológico e sociológico, para que se entenda o fantasma que se

esgueira por detrás da cortina de fumaça representada pela pena de

morte, com realce para o medo e seu papel de influência nas

sociedades, como mecanismo de controle social, intimamente

ligado ao poder. “O poder humano e social, ou não-humano e

sobrenatural, cria a idéia ao homem de que este deve obediência e

respeito únicos ao seu propagador. Todavia, pensar que o medo é

comportamento do homem arcaico é acreditar que o homem

moderno está totalmente liberado desta emoção, pela idéia de

que este pode contar com explicações lógicas cada vez que se

depara com fenômenos que desconhece. Dado interessante que se

articula com a idéia do medo é representado pela ideologia. Esta

se constitui em um meio de explicar como os indivíduos e os

grupos dominados podem ‘consentir espontanemente’ na sua

dominação. É preciso que esta dominação lhes pareça como algo

natural e legítimo, como se o serviço prestado pelos dominadores

fosse resultado de uma troca em que os benefícios são distribuídos

1 Revista Brasileira de Ciências Criminais, ano 4, nº 13, 1996, São Paulo, p. 406.

2 Coleção “Questões de Nossa Época”, Cortez Editora.

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equanimemente entre todos. Para Marilena Chauí, a ideologia

seria, principalmente, o trabalho de idéias com vistas a ocultar a

existência do Estado como órgão de poder destacado da

sociedade e órgão de dominação da classe econômica e

politicamente dominante. Assim, a ideologia permite criar a

ilusão de um direito e uma sociedade indivisiva, sendo prova

dessa coesão a própria existência de um único Estado. Se é

verdade que a sociedade hoje utiliza prioritariamente a ideologia

para atenuar o caminho da dominação, não é menos verdade que

esse caminho era trilhado no passado pelos mitos. A história de

todos os povos atesta a existência dos mitos como parte integrante

da vida social e como fundamental na função de legitimar a

realidade social existente. O mito pode ser entendido, em termos

gerais, como a narrativa de um acontecimento extraordinário, o

relato de um fato fabuloso, que se acredita verdadeiro e se supõe

acontecido num tempo muito afastado e impreciso. A narrativa

mitológica é sempre contada como história verdadeira, cercada

de mistérios e segredos, transmitida por meio de narrações

complexas ou de ritos caracterizados pela sacralidade e pela

magia. Os homens vêem-se perseguidos pelo sentimento de que

transgrediram a Ordem Natural das coisas: forma-se assim, pode-

se dizer, o arquétipo do temor à transgressão. A existência de

mitos sobre castigos em todas as culturas, atesta que as

sociedades humanas - mesmo as sociedades modernas - precisam

da adesão dos seus membros a uma crença: a crença de que sem o

exemplo da punição não existirá respeito e obediência às leis, às

regras, aos costumes etc. Nas sociedades cristãs são muitos os

mitos do castigo: o medo do dilúvio, de destruição igual à de

Sodoma e Gomorra, do Anticristo, das pestes dizimadoras etc.Os

homens passam, dentro desse contexto, a serem condicionados a

acreditar na necessidade de castigos, principalmente pelos meios

de comunicação de massas que manipulam fatos e imagens com

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esse objetivo. Os indivíduos acabam se tornando veiculadores da

opinião favorável à instituição de medidas repressivas fortes:

modo pelo qual se cria o mito da opinião pública. Este é um dos

mitos que mais serve à dominação nas sociedades

contemporâneas, pois é nele que o poder se apóia para dar maior

legitimidade às suas ações. Evidentemente, aos que interessam a

instituição da pena de morte, muito serve o mito da opinião

pública, uma vez que os próprios indivíduos chamados a se

manifestar respondem em favor da implantação da medida, e isto

não há como negar. Por essa via, o pensamento conservador e o

poder encontram a maneira de se afirmarem como corretos,

justos, democráticos e com juízo fundado na opinião da maioria.A

retirar pelas experiências recentes da vida nacional, é possível

concluir que as massas, caso viesse a ser realizado o plebiscito

proposto no Congresso Nacional, votariam a favor da pena de

morte. Não porque estejam ultrajadas, maltratadas, desesperadas,

mas porque partilham como os governadores e dominantes, da

crença na necessidade de um castigo exemplar. Trata-se de um

mito de muito força simbólica que levaria o povo a participar da

decisão que acaba (supostamente) com o crime. Os dominados

intentam uma desforra: num misto de alucinação e recusa

inconsciente da exclusão a que estão submetidos, imaginam tomar

parte no combate dos poderosos à violência e aos violentos, caso

contribuam para a tomada da decisão de condenação dos

culpados e participem nos rituais da execução dos réus.É o medo

que, permeado pela ideologia e pelos mitos, na sociedade de

excluídos, dominada firmemente por uma casta dominante, poderá

nos levar à aprovação da pena mais exemplar: a pena de morte.”

Ademais, entendemos que a crescente criminalidade,

que progride já acima dos tetos aceitáveis de qualquer sociedade,

não será contida pela adoção da pena capital, porque os

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movimentos políticos pretendem sua adoção como meio de

combater efeitos, e efeitos são sempre geradores de soluções

imediatistas. E então, mesmo embarcando no ataque aos efeitos,

preocupa-nos a indagação: e se, apesar da pena de morte os crimes

violentos aumentarem e a incidência de crimes não hediondos

generalizar-se? Nem se diga ser isso impossível ou possuir

pequena probabilidade, pois os criminosos de crimes bárbaros,

como o sequestro seguido de morte, nem teriam mais o direito ao

arrependimento, mas apenas o incentivo de sua folha de

antecedentes criminais elencando-o como integrante do grupo a

frequentar o corredor da morte. “Enquadro-me nos propensos

condenados à morte, quer por reincidências, quer por maus

antecedentes. Já serei condenado pelo que fiz, por que então não

continuar a arriscar e ir em frente?”, questionará o delinquente.

No tocante aos criminosos comuns, a tendência será

contrária à intimidação, pois inerente será o desprezo à cadeia ou

às penas alternativas, força do paradigma da pena de morte, ou

seja, a pena capital para os crimes hediondos ofuscará o caráter

retributivo das demais penas, incentivando os pequenos, mas já

numerosos pequenos delitos, pois “pelo menos não serei morto e

não estarei nunca dentro dos requisitos da reincidência que levam

à pena de morte”.(Devemos lembrar da regra geral: em todo crime

que, por sua natureza, deve com frequência ficar sem punição, o

castigo é um incentivo a mais. Ver Beccaria, ob. cit. , p. 82).

E então, não será a pena de morte suficiente! E então,

outro movimento político se levantará: a pena de morte ao

condenado hediondo e também extensiva a seus filhos, e depois a

seus ascendentes e assim por diante.

É só alterar a cláusula pétrea que garante aos cidadãos

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que nenhuma pena passará da pessoa do condenado! E a cadeia

condenatória, os ciclos de punição serão infindáveis no sentido

contrário às conquistas públicas, sociais e individuais.

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IV - O SISTEMA PUNITIVO NACIONAL

SUMÁRIO DOS TEMAS ABORDADOS NESTE CAPÍTULO.

1 As penas: classificações. 2 As espécies de pena no sistema

brasileiro. 3 As modalidades das penas. 4 Os regimes. 5

Características das penas nacionais. 6 O sistema punitivo: uma

visão. 7 Os sistemas penitenciários.

As penas são classificadas em sede doutrinária,

conforme elenco de Damásio de Jesus,1 da seguinte forma:

corporais; punitivas de liberdade; restritivas de liberdade;

pecuniárias e privativas e restritiva de direitos.

O atual sistema punitivo nacional recebeu

modificações profundas implantadas na parte geral do Código

Penal e nas execuções penais.

Para se ter a noção exata do teor da transição que se

operou entre a política criminal que vigorava a época do Código

Penal anterior e a adotada pelas atuais legislações, mister se faz

trazer ao bojo do presente capítulo os tópicos numerados e

realçados, constantes na Exposição de Motivos da Nova Parte

Geral do Código Penal2, que também alcançam as diretrizes da Lei

de Execuções Penais, dando ao leitor visão ampla da novel

estrutura do sistema punitivo brasileiro.

Elencam três categorias de punição, todas principais,

ad literam: as privativas de liberdade, subdivididas em reclusão e

detenção; as penas substitutivas da liberdade e restritivas de

direitos e a pena de multa.

1obra citada na referência bibliográfica, p. 456.

2E.M.0211, de 09/05/83.

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No que pertine às penas privativas de liberdade, apesar

de existirem duas modalidades - reclusão e detenção, cujo escopo

é repercutir na forma do regime penal a ser cumprido, a saber

fechado, aberto ou semi-aberto, na realidade, não possui aplicação

prática, já que dentro do complexo prisional indistinta é a massa

deletéria do cárcere.

Porém, verbis legis, o regime fechado é o executado

em penitenciária, em estabelecimento carcerário de segurança

máxima ou média. O regime semi-aberto, por sua vez, se executa

em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. O

regime aberto, por fim, tem como característica a execução da

expiação em casa própria de albergado ou outro estabelecimento

equivalente.

O codex penal estipula os critérios para o sentenciante

estabelecer o regime inicial executório pela aferição valorativa das

circunstâncias do desenvolver criminoso, a personalidade do

agente, a periculosidade, reincidência, respeitando, entretanto, o

critério objetivo do resultado da apenação, pois a pena superior a

08 (oito) anos impõe (vinculado) o regime fechado, enquanto na

imposição de pena igual a 04 (quatro) anos e não superior a 08

(oito) anos, o regime será semi-aberto e, abaixo daquele numeral,

o regime poderá ser o aberto (discricionários).

Para a execução das penas nos susos aludidos regimes,

a lei determina as providências específicas, peculiaridades e regras

de cada um, com relevo às garantias das custodiadas (sexo

feminino), inerentes às suas condições pessoais, bem como os

direitos previdenciários e garantias trabalhistas, além de os outros

não atingidos pela privação da liberdade e ínsitos ao ser humano.

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Com efeito, as penas restritivas de direitos, prestação

pecuniária, perda de bens e valores, impositivas de prestação de

serviços à comunidade ou a entidades públicas, ou interdição

temporária de direitos ou, ainda, limitação de fim de semana,

apesar de autônomas, têm caráter substitutivo às privativas de

liberdade, atendidas condições simultaneamente aferidas, sob pena

de conversão na punição substituída.

Prevê a lei penal, além das anteriores, a pena de multa

que será aplicada de forma alternativa ou cumulativa, ou

isoladamente, com a adoção do sistema escandinavo dos dias-

multa, que leva em consideração os rendimentos auferidos mensal

ou anualmente pelo condenado.

As medidas de segurança, como as penas, são formas

de sanção penal, porém diferenciadas pela natureza

eminentemente preventiva daquelas e, seu foco de ação objetiva, é

a correção da periculosidade real ou presumida do sujeito e irão

subexistir ou cessar diante do juízo de periculosidade que é, no

dizer de Soler “a potência, a capacidade, a aptidão ou a

idoneidade que um homem tem para converter-se em causa de

ações danosas.”1

No Brasil, de juri constituto, as medidas de segurança

cingem-se sua aplicação aos inimputáveis (salvos o de

menoridade penal) e aos semi-imputáveis, nas espécies detentiva e

restritiva, com internação em hospital de custódia e tratamento

psiquiátrico ou similar, ou submissão a tratamento ambulatorial,

com liberação sempre condicional.

1Soler, “Exposición y Crítica del Estado Peligioso” , 2ª ed., Buenos Aires, p. 21.

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Na medida de segurança foi adotado o sistema

vicariante na reforma penal, operada em 1984, em abandono ao

anterior sistema do duplo binário, não existindo a aplicação delas

para os imputáveis, em cumulação e/ou em sucessão à pena

privativa, como o previa a codificação de 1940.

O nosso conjunto normativo penal adotou as regras da

progressão e da remição, tanto por ocasião da prolação do decreto

condenatório, como já na fase executória, para impingir ao agente

a conscientização do valor da liberdade e, pelo processo de

reflexão, seu arrependimento, fazendo-o lutar por dias futuros

mais amenos, alçando por intermédio de seu mérito, regimes mais

brandos até o atingimento da soltura.

No direito das execuções existem três sistemas

penitenciários clássicos, o da Filadélfia; o de Auburn e o sistema

irlandês ou progressivo, advindo do sistema prisional da Irlanda

onde foi implantado por Walter Crofton, em adoção ao sistema

sugerido por Alexandre Maconoche na obra de 1838, intitulada

“Thoughts on Convict Management”, que tem como espinha

dorsal a idéia de relação causal entre a melhora gradativa da

situação prisional até a liberdade, avaliados pelo mérito e

comportamento do condenado.

Para alguns eminentes juristas, o sistema progressivo

acima e por último mencionado é denominado sistema inglês e não

irlandês, apesar de sua origem. “Há três sistemas principais: o de

Filadélfia, o de Auburn e o inglês ou progressivo. O primeiro foi

adotado na Pensilvânia e na Bélgica, motivo pelo qual é também

chamado sistema belga. Pelo Sistema Auburn, o condenado

trabalha em silêncio durante todo o dia juntamente com outros e

fica isolado à noite. Pelo sistema inglês, há um período inicial de

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isolamento celular, depois passa a trabalhar em comum,

posteriormente em colônia agrícola e depois é liberado

condicionalmente. Foi adotado inicialmente na Irlanda por

Crofton. É também chamado Sistema Irlandês ou de Crofton.”1

O instituto da suspensão condicional da pena foi

mantido em sua essência, somente sendo transposto para o novo

sistema com as alterações decorrentes das novas diretrizes

veiculadas para as penas e sua consequente aplicação.

A par disso, novos sistemas penitenciários estão se

desenvolvendo, com o aperfeiçoamento do sistema progressivo,

difundido e acatado pelas legislações modernas, tendo, inclusive, o

Brasil, adotado um sistema próprio de feições eminentemente

progressivas, posto que não atrelado unicamente ao mérito e bom

comportamento do condenado, mas também o seu atingimento

gradual ao desiderato da ressocialização. É preciso que a pena não

se protraia para além do tempo de condenação2, escopo máximo da

reeducação do penitente.

Informamos, com extrema atualidade, que o Conselho

Nacional de Justiça lançou, em 19 de março de 2007, banco de

dados nacional sobre a radiografia do sistema prisional – O

SISTEMA INTEGRADO DE POPULAÇÃO CARCERÁRIA(ver

www.stf.gov.br/noticias/ultimas/ler), oportunidade em que foi

firmado convênio com a FIESP para a ressocialização de presos.

1 Roberto Lyra, “Comentários ao C. Penal”, II, RJ: Forense, 1942.

2“Condenado, o acusado é recolhido ao cárcere, para cumprimento da pena que lhe foi imposta pela justiça. Ao aproximar-se do fim do perído prisional, aguarda o sentenciado, com alegria, a liberdade. Ao sentir-se livre das grades, contudo, sente o seu drama: não consegue emprego, em virtude de seus maus antecedentes. Nem o Estado e nem o particular lhe facilitam uma colocação. A pena, portanto, não termina para o sentenciado”, Carnelutti, ob. cit. na referência bibliográfica, p. 8.

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De acordo com a ministra Ellen Gracie, sob e quando

no exercício da presidência do STF e do CNJ, o Sistema Integrado

é uma intervenção incisiva no ciclo de violência, pois todas as

informações são on-line, com a individuialização dos presos de

todo o sistema carcerário.

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V – A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL E OUTRAS

TENDÊNCIAS SOBRE O SISTEMA PUNITIVO

SUMÁRIO DOS TEMAS ABORDADOS NESTE CAPÍTULO.

1 Intróito. 2 A Segurança Pública. 3 A Rigidez do Sistema. 4 A

Redução da Idade Penal. 5 As tendências para a adoção de

Penas Alternativas. 6 O Custo Prisional. 7 As opiniões dos

Juristas e da Sociedade Civil.

A reforma do sistema punitivo brasileiro é matéria em

voga nos mais diversos seguimentos sociais, ensejando um

crescente movimento, em especial nas raias dos meios jurídicos,

aonde ministros, juízes, professores vêm lançando opiniões das

mais variadas linhas, com o intuito primordial de sensibilizar o

Constituinte Reformador do fito de conceder tratamento prioritário

a esse problema, já agora de repercussões grandiosas.

É bem verdade que a questão penitenciária,

atualmente, teve como motivo mais relevante para a deflagração

da preocupação das autoridades governamentais, o episódio

ocorrido na penitenciária de Gôiania, onde Leonardo Pareja (morto

em 1996) foi protagonista de revolução prisional que trouxe à tona

o descalabro do sistema penitenciário no país, com transformação

pela mídia do aludido bandido em herói nacional.

Sem dúvida que o referido episódio trouxe à baila

facetas deploráveis: que a cadeia é um submundo à parte,

corrompido da direção ao faxineiro; a demonstração da falência da

instituição prisional, com homens vivendo à margem da sociedade,

pondo por terra qualquer pretensão de ressocialização; a aparição

do sentimento de descrédito do cidadão nas autoridades; a

necessidade, a carência e o anseio por parte da sociedade na

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aparição de mitos que sejam capazes de romper as barreiras da

hipocrisia instalada; a realidade apodrecida das instituições sociais

mantidas pelo Estado.

Com efeito, a punição do criminoso, entendido neste

vocábulo as fases que englobam a apresentação de projetos de lei e

sua edição ao final do trâmite legislativo, passando pela etapa da

condenação no processo penal e, por fim, como decorrência do

decreto condenatório, a submissão do condenado à execução da

expiação em estabelecimentos prisionais, tem a interferência direta

dos Poderes da República - Legislativo - Judiciário - Executivo,

que se contentam em manter o statu quo mesmo cônscios da

impraticabilidade filosófica e empírica do sistema.

O Legislativo não estuda a causa de falência do

sistema punitivo, com vista a eliminar problemas conjunturais e

estruturais, satisfazendo-se com soluções paliativas que, no fundo,

transformam mais impraticável o escopo da ressocialização.

É o caso, por exemplo, da lei de crimes hediondos que

vem, tão-só, atender a reclamos setoriais da sociedade, com o fito

de lhe dar uma satisfação imediata, com persistência do modelo

político-criminal de tendência “paleorepressiva”, cujas notas

marcantes são endurecimento das penas, a supressão dos direitos e

garantias individuais, tipificações novas e o agravamento da

execução penal.1

A mencionada legislação penal, todavia, é desprovida

de qualquer efetividade e segurança jurídica à coletividade, já que

editada em contexto social onde os seqüestros nos grandes centros

1Vide Damásio E. de Jesus, Boletim IBCCrim 33, p. 3.

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tomaram proporções inimagináveis, fixando penas pesadas e

obstando diversas prerrogativas processuais, inclusive violando a

Constituição Federal.1

A perspectiva é cruel, na medida em que se agrava o

modelo sócio-econômico, gerando acirrada demanda de políticas

criminais duras como correspondência do Poder Político na edição

de leis.

Agrava-se, também, o problema das organizações da

segurança em geral. Os organismos policiais federais, estaduais e

municipais deveriam existir, como pensa Miguel Reale2, como

corporações eminentemente policiais, atuando nas ruas, com

preparação de ensino técnico-qualificado e sem o “ranço”

militarista, com muitos de seus integrantes exercendo funções de

vigilante de repartições públicas.

Estruturalmente, na esteira do jurista citado, mister se

faz a revisão da filosofia das corporações policiais militares como

força auxiliar e reserva do exército, conforme hoje vem regulado

pelo art. 144, parágrafo 6º, da Constituição Federal, com reflexo,

inclusive, na competência exclusiva da União para legislar,

genericamente, sobre efetivos, convocação e mobilização das

polícias militares3, como também a competência residual

conferidas aos Municípios para, tão-só, constituirem guardas

municipais destinados à proteção de seus bens, serviços e

instalações, conforme disposição legal do art. 144, parágrafo 8º,

1 A insuscetibilidade da liberdade provisória prevista no art. 2º, inciso II, da Lei numerada em 8.072,

de 25/07/90, afronta o artigo quinto, inciso XLIII, CF/88.

2 “O Estado de São Paulo”, dia 24.08.96.

3Álvaro Lazzarini não entende assim: “A polícia militar não representa poder militar, como querem alguns, mesmo porque ela é subordinada aos governadores dos Estados e do Distrito Federal” - Suplemento Justiça do “O Estado de S. Paulo”, pp. 5 e 6, de 01.02.91.

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CF.1

O problema do Município, como ente federativo,

provido de autonomia financeira, administrativa e judicial foi

objeto de outro livro de autoria deste autor em parceria com o

então Desembargador Federal Ney Moreira da Fonseca, intitulado

“O PODER JUDICIAL MUNICIPAL E A APLICAÇÃO SOCIAL

DA PENA”, lançado pela Forense, ano 1997, como uma das

grandes armas a ser utilizada na reformulação da realidade atual,

para a criação de um sistema punitivo novo e comprometido com

as novas diretrizes sociais do nosso Estado Democrático, onde será

previsto o surgimento e o raio de ação das polícias militar e civil,

no âmbito da comuna, como órgãos fundamentais, junto,

evidentemente, com o Ministério Público e o Judiciário, na

prevenção e repreensão do crime e, ainda, para o fim de, nos

dizeres de Pimenta Bueno2 “rastrear e descobrir criminosos que

não puderam ser prevenidos, colher e transmitir às autoridades

competentes os índicios e a prova do crime, indagar quais sejam

os autores e co-agentes e, finalmente, concorrer com eficácia para

que sejam levados ao Tribunal.”

De efeito, como anotam Antonio Carlos de Castro

Machado e Carlos Alberto Marchi de Queiroz3 são as seguintes

facetas da nova organização policial, quando fazem alusão às

polícias da cidade de São Paulo: “O atual quadro político estadual

tem, como meta prioritária, o fortalecimento do binômio Polícia

1CF/88, art. 144 – “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é

exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:(...) § 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.”

2 “Apontamentos sobre o Processo Criminal Brasileiro”, [S.L.:s.n.], pp. 3/4, 2. ed. 1857.

3 “ Polícia e Direito”, Revista Brasileira de Ciências Criminais,vol. 13, pp. 239/240.

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Militar-Polícia Civil num sistema altamente competente de

prevenção do crime e à desordem, otimizando o policiamento

ostensivo da Polícia Militar em igualdade de condições com a

atuação especializada dos setores reestruturados da Polícia Civil,

sem se descuidar, por um só momento, do combate cerrado ao

crime organizado... Para tanto, além da indispensável ação

cívico-social de ambas Corporações co-irmãs, devemos adotar

mecanismos adequados de seleção e de capacitação de nossos

quadros, uma vez que em andamento a recuperação salarial e dos

meios de ação postos à disposição de policiais civis e

militares(...)Efetivamente, estudos de Polícia Comparada revelam

que, na Europa, corporações semelhantes às Polícias Militares

brasileiras, como a Gendarmerie Nationale, na França, a

Guardia di Pubblica Sicurezza e os Carabinieri, na Itália, a

Guarda Civil, na Espanha e a Guarda Nacional Republicana, em

Portugal, têm situações legais perfeitamente definidas em lei

ordinária, já que, em época de paz, operam no âmbito dos

respectivos Ministérios do Interior, instituições equivalentes a

nossas Secretarias de Segurança Pública. O quadro

constitucional brasileiro está muito próximo da realidade

européia, uma vez que o ideal de uma polícia unificada não

implica, necessariamente, na fusão dos organismos atualmente

existentes. Basta, tão-somente, vontade política do legislador para

solucionar de vez com inteira propriedade, a questão. A nova

Polícia surgirá, no Brasil, quando cumprido o espírito do

parágrafo 7º do artigo 144 da Constituição Federal que

preceitua: ‘A lei disciplinará a organização e o funcionamento

dos órgãos responsáveis pela segurança pública de maneira a

garantir a eficácia de suas atividades.’”

Aliás, urge necessária mudança na atuação da polícia,

pois, em pesquisa promovida pelo Instituto de Estudos

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Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo( IDESP), apurou-se

que 71% dos entrevistados entendem que o aludido órgão tem

maior grau de responsabilidade pelo mau funcionamento da

Justiça e, levando-se em consideração aquele percentual, 91%

acham que os obstáculos para uma melhor atuação está afeta à

falta de aparelhamento, e 88%, por mau desempenho de suas

funções1.

A manutenção desse statu quo resulta em que,

resumindo, a criminalidade não diminui, os crimes não são

apurados na sua totalidade (a autoria e a materialidade) e não se

aprisionam os culpados, e, se tal fato ocorresse, o sistema não

mudaria, pois se lançaria mais um condenado em um sistema de

irrecuperáveis, onde ele seria, por sua vez, o corruptor de outros

condenados praticantes de ilícitos de ínfima potencialidade, prática

comum nos seios carcerários.

A proporção calamitosa da ineficácia penal está

retratada nos dados trazidos pelo repórter Orlando Nóbrega2: 275

mil condenados, em nosso país, estando aprisionados, apenas, 126

mil, ou seja, menos da metade, segundo o censo penitenciário

federal. Lembrou, ironicamente, na reportagem, as palavras do

Des. Hellis Filgueiras lançadas por ocasião da inauguração da

primeira penitenciária no Brasil: “O imperador, surpreso ante o

inexpressivo grupo de presos perfilados em sua homenagem,

indagou a um deles o motivo, obtendo a seguinte resposta: Exa.,

nós só somos meros recrutas. Os batalhões de verdade estão lá

fora.”

Sob o título “Seis mil foragidos só no Rio”, o jornal

“O Globo”, edição de 19 de março de 2007, página 03, traçou um

1“Jornal do Brasil”, 27.09.96.

2 “Jornal do Commércio”, seção Direito e Justiça, dia 28.07.96.

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perfil dos presos do estado do Rio de Janeiro, por aplicação do

Sistema Integrado de População Carcerária e como parâmetro para

as devidas políticas públicas, conforme tabelas que se seguem:

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Há, entretanto, juristas que endossam, como solução,

o recrudescimento e maior rigidez das penas, inclusive pregando

pela eliminação de institutos penais, tais quais o indulto, a anistia

e a graça, entendendo “incompatíveis com o fascínio brasileiro

pelas soluções simplistas.”

É o caso de Waldyr de Abreu1, professor de Direito

Penal que assevera: “Se as decisões dos juízes togados são

passíveis de reparos, o que se poderá esperar de procedimentos

políticos, fazendo pretensa justiça por atacado, em repetidos

indultos, na melhor das hipóteses para confessadamente abrir

vagas à crescente onda de condenados à solta? É algo no mínimo

surrealista. Armando Falcão logrou reduzir drasticamente o

caráter punitivo do nosso Código Penal ora ainda vigente, com

profusa adoção das chamadas penas alternativas. Neste ensejo da

reforma constitucional, boa emenda seria eliminar todos estes

agraciamentos. Espera-se prevaleça o bom senso e o indulto não

se confirme, quando estamos acuados por criminalidade sem

precedentes e das mais impressionantes do mundo. Em

circunstâncias menos grave, em França, o novo Código Penal

timbra pelo acentuado rigor e prevê prisão perpétua para mais de

50 crimes. Nos EUA, lei federal ameaça também com prisão

perpétua todos os acusados já com duas condenações anteriores,

mesmo em infrações não hediondas. Noticia-se que em 1995 com

isso lograram uma queda de 15% na criminalidade em geral.”

Infelizmente, data respecta, a importação de soluções

1 Exposição veiculada no “Jornal do Commércio”, do dia 13/02/96.

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alienígenas não nos parece bom caminho.

Incomparável a situação de outros países com o Brasil,

em especial pela grandiosidade de seu território e de suas culturas

regionais, onde uma lei federal, tal qual a de crimes hediondos,

tem aplicação restrita a determinada região, porém com validade

sobre toda extensão de soberania no país, bem como as

particularidades da política nacional e as deficiências das

instituições estatais que chegam a estremecer o próprio poder de

império representado pelos Poderes Republicanos.

Por isso, nasce em discussão um novo pacto

federativo, com a reavaliação das competências constitucionais

sobre determinadas matérias, mormente aquelas que venham a

refletir na segurança pública. Como exemplo, temos a matéria do

Jornal “O Globo”, de 13 de fevereiro de 2007, na página 11,

atribuindo ao governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio

Cabral, a defesa da redução da maioridade penal, pois o estado

fluminense tem que ter penas mais severas e, como antecedente,

uma legislação penal própria, inclusive, com amparo nas sugestões

do juiz Carlos Borges, titular da vara de Execuções Penais, que

propõe que os menores possam ser declarados pela justiça

emancipados, tornando-se, assim, para efeitos penais, maiores,

dependendo do tipo de crime que tiverem cometido. O governador

também reafirmou naquela oportunidade que o pacto federativo

precisa ser revisto, para que os estados tenham maior autonomia,

já que o Brasil conta com 27 Estados, com realidades díspares.

Além do mais, a opinião do ilustre articulista tem

discutível veracidade. Essa assertiva encontra-se aventada em

réplica de Julita Lemgruber, socióloga e, na época, assessora

técnica da Secretaria de Justiça, que nos prestigiou com dados

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totalmente contrários àqueles mencionados por Waldir de Abreu.

Entendemos de alta relevância o teor do articulado por

escrito, principalmente pela autoridade de ser estudiosa, há mais

de vinte anos, do sistema de justiça criminal, além do exercício da

função de ex-diretora do Sistema Penitenciário do Estado do Rio

de Janeiro, responsável pelas unidades prisionais fluminenses.

Confira-se1: “... estou convencida de que a prisão, por seu alto

custo e ineficácia, deve ser reservada para quem comete crimes de

gravidade e violência e se constitui, de fato, em ameaça concreta

ao convívio social. Todos os outros infratores devem ser punidos

com penas alternativas à pena de prisão. Nossa legislação já

contempla as penas alternativas: para crimes punidos com até um

ano1 de prisão o juiz pode substituir a privação de liberdade por

uma pena alternativa, como a prestação de serviços à

comunidade. Na verdade, esta legislação precisa ser mais

utilizada e, até mesmo, ampliada para que o contribuinte não seja

punido. Trata-se, aqui, de discutir a relação de custo-benefício da

pena privativa de liberdade. Se a questão for analisada desse

ponto de vista, o contribuinte perceberá que o dinheiro dos seus

impostos está sendo muito mal gasto. Ao contrário do que o autor

do referido parece acreditar, a utilização ilimitada da pena

privativa de liberdade não influi no controle da criminalidade.

Inúmeros estudos científicos, em diversos países, já demonstraram

que o recrudescimento da legislação penal e a elevação do

contigente de presos e prisões não contribuem para a redução dos

índices de criminalidade. O melhor exemplo desses estudos é

aquele divulgado pelo National Council on Crime and

Delinquency relativo aos estados americanos de Wisconsin e

Minnesota, muito semelhantes sob o ponto de vista sócio-

1 Jornal “O Globo”, de 24.07.96.

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econômico e geográfico. Durante os anos 80 Wisconsin

deliberadamente investiu no recrudescimento de sua legislação

penal, o que provocou a duplicação do número de presos.

Minnesota manteve, no mesmo período, leis menos rígidas, pouco

aumentando seu efetivo carcerário. Após dez anos, o primeiro teve

um aumento de 59% em sua taxa de criminalidade violenta e

Minnesota viu seus índices subirem apenas 8%. Ou seja, os con-

tribuintes de Wisconsin sairam perdendo: passaram a gastar o

dobro com seus presos e não ganharam nada em termos de

segurança pública. As penas alternativas, tão duramente

criticadas, não são mais dispendiosas como afirma o articulista e

seus resultados são amplamente compensadores. Na Inglaterra,

por exemplo, um preso custa, no mínimo, 400 libras por semana e

um infrator submentido a pena alternativa, com controle

absolutamente rígido e eficaz, custa, no máximo, 150 libras por

igual período. Nos Estados Unidos, o custo médio anual de um

preso é de US$ 25 mil, enquanto que o infrator mantido em sua

comunidade e submetido a uma pena alternativa, custa, em média,

US$ 2 mil ao ano. Ademais, como revelam experiências em

diferentes países, os infratores punidos com penas alternativas,

como, por exemplo, a prestação de serviços à comunidade,

reincidem menos. Nunca é demais lembrar que na Inglaterra os

infratores submetidos a penas alternativas reincidem menos 15%,

se comparados àqueles condenados à pena de prisão e, em alguns

países, estes números são ainda mais significativos. Em

levantamento por mim realizado em 1995, constatei que 24,3%

dos presos do estado do Rio de Janeiro haviam cometidos crimes

menos graves e sem violência. No entanto, dos 11.647

condenados, em dezembro do mesmo ano, havia apenas 192

indivíduos prestando serviços à comunidade. Em 1994 havia 50

mil presos na Inglaterra e 54 mil infratores submetidos a penas

1 Atualmente, 4(quatro) anos, sem prejuízo dos crimes de menor potencial ofensivo sob a competência dos Juizados Especiais estadual e federal.

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alternativas. Nos Estados Unidos 68% dos condenados receberam

penas alternativas no mesmo ano. Em alguns países europeus

esses números são ainda mais altos. Na Alemanha, por exemplo,

80% dos infratores receberam penas de multa... Melhor

investirmos nossos recursos em saúde, educação, moradia

popular e saneamento básico. Assim, talvez muito dos 16 milhões

de miseráveis deste país ficarão mais distantes do fascínio do

dinheiro fácil que vem do crime.”

Não fosse isso suficiente para ver com certa reserva a

opinião de Waldir Abreu, sem qualquer conotação pessoal, a

verdade relativa ao benefício do indulto e da graça deve ser vista,

não como um favor político fomentador de crimes, mas como um

duplo julgamento, força de sua seletividade por vezes alcançada

sem um processo coerente e paritário para sua concessão.

Nesse diapasão, indultos editados pelo Presidente da

República, de caráter condicional, visando o atingimento de

relevante parcela carcerária, na verdade, retratam benefícios

ineficazes para minimizar os malefícios da prisionalização, com

efeitos positivos sobre a estrutura mental e psicológica dos

encarcerados.

Assim, sustenta-se que o condenado já foi alvo do

juízo de reprovação erigido pela sentença procedente da ação

penal, não podendo sê-lo novamente por ocasião do decreto anual

de indulto, pelo que deveria ser extensiva a todo o universo

carcerário, atendidos os requisitos objetivos para a aferição de seu

merecimento.

Ademais, a distinção na aplicação das penas impostas

a cada corpo de condenado existente nos complexos prisionais, por

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comportamentos desiguais e dessemelhantes, não poderia ser

repetida na aplicação dos benefícios excludentes, sob pena de

representarem duplo julgamento do réu.

Dessa forma, concluímos que, muitas das agruras da

prisão seriam suportadas em decorrência da perspectiva de

reconstrução do ser humano, pelos pequenos momentos de

liberdade.1

No tocante a questão do custo prisional e o encargo

pelo qual o preso onera a população, em especial a brasileira, cujo

índice salarial é um dos mais baixos do mundo, se não for a menor

renda per capita, levam notórios juristas e administradores a

realçar, sobremaneira, a adoção de penas alternativas como ao

longo se mostrará.2

O Censo Penitenciário Nacional, realizado em 1993,

apurou que, naquela data, haviam 126.152 presos no país, com

51.638 vagas em estabelecimentos prisionais, com a média

nacional de 2,5 presos/vaga, gerando um déficit de 74.533 vagas,

necessitando-se para suprir o vazio um custo orçamentário de US$

40.000, por vaga, para a construção de 130 complexos

penitenciários, com capacidade para 500 presos, a um orçamento

de 15 milhões de dólares, para absorver do Estado, após

instalados, um valor médio para a manutenção de cada preso no

1 A opinião retro lançada é de autoria do dr. Nélio Roberto Seidl Machado, advogado criminalista e

presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro.

2 Confira-se, de início, a Exposição de Motivos do Código Penal , parte geral, de 1984: "27. As críticas que em todos os países se têm feito às penas privativas da liberdade fundamentam-se em fatos de crescente importância social, tais como o tipo de tratamento penal frequentemente inadequado e quase sempre pernicioso, a inutilidade dos métodos até agora empregados no tratamento de delinquentes habituais e multireincidentes, os elevados custos da construção e manutenção dos estabelecimentos penais, as consequências maléficas para os infratores primários, ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação, sujeitos, na intimidade do cárcere, a sevícias, corrupção e perda paulatina da aptidão para o trabalho.”

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equivalente a 3,5 salários mínimos.

O ônus do crime é enorme, tanto no resultado, como

na mobilização do dinheiro público. É a IRRACIONALIDADE

DE CUSTO SOCIAL, QUE PARTES SUBSTANCIAIS DA

POPULAÇÃO NÃO CONSEGUEM ENTENDER.

A conclusão foi extraída de reportagem veiculada no

“The Economist” e alusivas aos Estados Unidos, perfeitamente

aplicável ao Brasil, já que o problema carcerário quanto ao seu

custo/benefício é questão de preocupação mundial, como dado

fenomênico da atualidade dos povos, dando, em suma, total razão

à socióloga Lemgruber.

Somos informados de tais acontecimentos pelo

escritor, na condição de articulista do jornal “Folha de São

Paulo”, Walter Ceneviva1, onde também assevera que uma

tentativa de compreensão se percebe que o esforço de enfrentar a

criminalidade não é o mesmo que combater a violência. Para

aquela, as soluções tentadas são muitas, no mundo. O aumento da

pena mínima, a prisão pérpetua para o criminoso triplicamente

reincidente no mesmo delito em Estados americanos, nem sempre

com resultado justo. Todavia, com o aumento das penas de prisão,

o sistema penitenciário faliu, esmagado pela superlotação, pois

não tem condição de acolher tantos presos. Lá, como cá . Outras

ciências são invocadas para explicar a violência. Políticos insistem

no argumento de que, quanto mais um criminoso seja mantido na

prisão, tanto mais seguros estarão os homens livres. Estatísticas

americanas demonstram que, em estados de sistemas penais

diferentes, os índices de aprisionamento não são proporcionais aos

de criminalidade. A estatística deixa evidente que mais prisões não

1 Matéria publicada no dia 06.07.96.

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diminuem nem criminalidade nem violência. Dos sistemas

existentes para lidar com criminosos, a prisão é o mais caro, e seu

preço recai sobre o povo. Além de tudo, é injusto em si mesmo.

Pune os pobres, mais que os ricos; os negros mais que os brancos.

Adota dosagens de pena que variam sem critério científico, mas

mudam frequentemente ao sabor de fatos isolados.

Os números do Censo Nacional já anteriormente

mencionado, trazem dados sobre o grau de instrução dos

penitentes, sendo que 74,55% são analfabetos ou possuem o

primeiro grau incompleto; 12,67% possuem o primeiro grau

completo; para 5,42% que possuem o 2º grau incompleto e 5,98%

completo, com apenas 1,38% na faixa do 3º grau, com a população

total de 95% de pobres. Coincidência mundial...?

Aliás, a injustiça das penas já foi alvo de advertência

pelo então Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro

Sepúlveda Pertence ao declarar à imprensa que o país pune com

rigor crimes violentos, mas deixam impunes crimes típicos das

classes mais altas e que a impunidade está nos crimes das classes

privilegiadas, pois, apesar de não serem violentos, afrontam tanto

quanto aqueloutros, pela utilização da astúcia, fraudes e outros

mecanismos tão deletérios e tão prejudicias à vida social.1

De pólo a outro, nem nos parece caminho mais

aconselhável o movimento anticriminalidade, capitaneado pela

corrente que imprime batalha na adoção, pelo conjunto sistêmico

penal, da redução da imputabilidade penal para os dezesseis anos,

e até menos, ao revés dos dezoito anos hoje predominante.

Importante evento social promovido pelo jornal

1 “Folha de São Paulo”, de 20.08.96.

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“Folha de São Paulo”, especialmente pelo fato de exprimir a

vontade popular, em manifestação de democracia pura1, trazido a

público em reportagem publicada no dia 16 de setembro de 1996,

foi debatido a “VIOLÊNCIA EM SÃO PAULO”, cujo tópico

principal foi a diminuição da idade de responsabilidade penal,

como uma das medidas para a diminuição da violência urbana.

Como exemplo de algumas opiniões a respeito

prolatadas por participantes, podemos mencionar a do Coronel

Luiz Gonzaga de Oliveira, na época, Coordenador da Guarda Civil

Metropolitana, e Albertina Café e Alves, naquele estágio, uma das

coordenadoras do movimento antiviolência “REAGE SÃO PAU-

LO”, que apresentaram posições favoráveis à diminuição. Maria

Ignês Bierrenbach, então Presidente do Conselho de Defesa dos

Direitos da Pessoa, e o Coronel José Vicente da Silva Filho, então

Coordenador de Análise e Planejamento da Secretaria de

Segurança Pública de São Paulo, se mostraram contrários,

alegando que sempre que ocorre algum tipo de comoção social, o

assunto volta à tona e que o Estatuto da Criança e do Adolescente

não é omisso em relação à punição do menor infrator.Segundo ela,

o estatuto prevê que o adolescente que comete um crime violento

deve ficar privado de liberdade e ser colocado em uma instituição

para reeducação.

Em outra interessante reportagem do mesmo periódico

acima apontado2, é informado que os advogados criminalistas de

São Paulo, vêm lançando apoio público à idéia da redução da

imputabilidade penal. Confira-se que a Acrimesp (Associação dos

Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo) encaminhou ao

1 Tal qual a Grécia antiga, onde os oradores do povo expressavam e decidiam as questões políticas da

plataforma do Ágora.

2 Matéria veiculada no dia 10.09.96.

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Ministério da Justiça e ao Congresso Nacional projeto de lei de

redução da idade de responsabilidade penal.

A proposta prevê a redução da responsabilidade

criminal de 18 anos para 16 anos, acreditando que, segundo o seu

presidente,Ademar Gomes, a certeza da impunidade está levando

menores à condição de chefes de quadrilha.

O argumento de Gomes é que o Estado já reconheceu a

“maioridade” de jovens de 16 anos conferindo-lhes o direito de

votar. A Acrimesp recomendou também a adoção de incentivos

fiscais para empresas que investirem em crianças e adolescentes

carentes, sugerindo ainda a criação de incentivos para famílias que

queiram adotar uma criança. Essas famílias, segundo a proposta,

receberiam dois salários mínimos para cada criança adotada, já

que o Estado gasta mais que isso com a internação de menores

infratores. Uma criança internada na Febem custa três salários

mínimos por mês.

No entanto, a redução da idade criminal não exime o

Estado de sua obrigação de investir na assistência de crianças

carentes, segundo o entendimento do Presidente da Associação.

Para o advogado, na condição de conselheiro da

OAB/SP, Luiz Antonio Sampaio Gouveia, a redução da

responsabilidade para os menores é uma hipocrisia social, pois

uma sociedade que não dá escola vai dar cadeias para as crianças.

Segundo ele, é um contra-senso. Há, na verdade, uma omissão do

Estado no tratamento do menor e na aplicação do ECA (Estatuto

da Criança e do Adolescente).

Outra importante manifestação popular foi levado a

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público 1 acerca da manifestação de entidade civil sobre a redução

da responsabilidade penal, por intermédio de “abaixo-assinado”

com 25 mil assinaturas, segundo o coordenador do grupo

“VALÉRIA FROTA”, de Goiânia, que foi enviado ao Congresso

pleiteando a diminuição da idade de imputabilidade de menores

infratores que, pela Constituição e pelo Código Penal, são

inimputáveis.

O projeto quer reduzir, genericamente, a idade

mínima para 16 anos e, para crimes hediondos, a idade mínima

passaria a ser 14 anos.

Autoridades de direitos humanos, entretanto,

discordam da mudança. Paulo Vitor Sapienza, coordenador do

SOS Criança de São Paulo, afirma que um levantamento da

instituição constatou que 52% das crianças de rua têm até 12 anos,

o que ensejaria diminuir a maioridade penal para 6 anos, para que

se alcançasse a intenção da tese dos militantes da redução.

Sapienza defende outras mudanças, como a alteração

do Estatuto da Criança e do Adolescente, com teto maior de

permanência do menor infrator na Febem até completar 18 anos,

quando responderia por seu crime na justiça comum.

Na capital paulista, maior centro populacional do país,

a proposta redutória é alvo de cerrado debate, como testificam os

informes populares. A Seccional da Ordem do Advogados do

Brasil de São Paulo foi totalmente contrária à proposta, com

incessantes manifestações de sua Comissão de Direitos

1 Publicada no mesmo periódico, em reportagem local do dia 29.08.96.

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Humanos1,com críticas a quem veja na redução da idade penal

uma medida poderosa para o fim da violência urbana, pois se o

Código Penal, válido para os maiores de idade, impedisse crimes,

ninguém iria cometê-los depois do 18º aniversário, segundo

argumenta o então presidente da Comissão, Jairo Fonseca,

advogado criminalísta.

Fonseca aponta outro problema: muitas gangues usam

menores apostando na impunidade. Com a redução da idade penal,

os criminosos passariam a recrutar crianças mais jovens. Também,

segundo ele, já virou senso comum a falsa premissa de que o

Estatuto da Criança e do Adolescente é omisso quanto à punição.

Neste ensejo, cabe um adendo com relação a formação

de gangues de menores e de adolescentes, uma das grandes causas

de violência urbana, sem discriminação da faixa social de seus

integrantes. O elemento propulsor de crimes por elas praticados

tem como cerne elemento sociológico: a disfunção moral e jurídica

da MASSA.

Nos Estados Unidos foi adotado o “TOQUE DE

RECOLHER” como medida governamental para coibir as gangues

de adolescentes, com o incondicional apoio do então Presidente

Bill Clinton e do candidato Republicano à Casa Branca Bob Dole,

que, através do Ministério da Justiça, divulgou relatório

recomendando a adoção de política nacional do toque de recolher,

nos moldes mais conservadores possíveis, já que estabelece o

horário de 20 horas, não aplicáveis, todavia, aos adolescentes

casados, acompanhados pelos pais ou que estejam retornando da

escola, do trabalho, de atividades religiosas, de emergência médica

ou de viagem.

1 Veja-se notícia do “Jornal do Commércio”, dia 07.09.96.

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Isso vencido, em continuação ao desenvolvimento das

discussões acerca da redução da responsabilidade penal, O

Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (CONANDA),

com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

(CNBB), travou relevante luta para obter apoio, por intermédio de

mobilização nacional, com o fim de pressionar o Congresso

Nacional a não aprovar projetos de lei que intentam alterar o

Estatuto da Criança e do Adolescente, reduzindo a idade penal de

18 para os 16 anos.

Em conclusão do encontro nacional promovido pelo

mencionado Conselho, certificou-se que nos estados-membros,

fora raríssimas exceções, como Roraima, Santa Catarina e Rio

Grande do Sul, pouco se fez para a adoção de medidas de

recuperação de menores, conforme prevê o E.C.A. Neste encontro,

todos os participantes repudiaram a proposta de redução da

responsabilidade criminal de autoria dos então Deputados Jair

Bolsonaro (PPB-RJ) e Pedro Abrão (PTB-GO), por meio de

Emenda Constitucional.

Em esboço de concordância com as pretensões do

Conselho, o Ministério da Justiça, presentado por seu então

secretário-executivo, Milton Seligman, aduziu que o governo, em

princípio, entende que o cumprimento dos ideais e diretrizes do

E.C.A., por si só, tem o condão de alcançar os objetivos

perseguidos pelas propostas de emenda à Constituição.

Aliás, essa orientação só vem expressar a opinião do

ex-ministro Nelson Jobim,1 ao afirmar que inexiste a possibilidade

de modificação do Estatuto da Criança para a redução da

1 Apresentada no “Jornal do Commércio”, dia 22.08.96.

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responsabilidade criminal, mas sim uma ação do governo para a

instalação de Conselhos Tutelares nos Estados.

Por isso, empenhado em dar condições aos governos

estaduais para o cumprimento do referido diploma legal, haverá

sempre a previsão de liberação de verbas de monte considerável,

principalmente para a implantação dos programas sócio-

educativos de liberdade assistida de menores infratores.

Um dos projetos é a construção de Centros de

Atendimento à Criança ( CAIs ), principalmente no Estado do Rio

de Janeiro, conforme anunciado em encontro realizado em

Brasília, onde encontravam-se presentes representantes dos

governos federal e estadual, além do Ministério Público, como

medida a curto prazo para minimizar a mescla ocorrente naquele

estado-membro de menores infratores de faixa etárias diferentes e

infrações diferenciadas, aglomerados em único complexo

prisional, por vezes na mesma cela, com previsão de mais verbas

para a ampliação do projeto.

A boa ação, entretanto, sofre de imediato empecilho.

Citamos como exemplo que boa parte das verbas liberadas pelo

Governo Federal àquele estado já tinham destino diverso: o

pagamento dos salários de 421 funcionários, que trabalham em 16

CRIAMs, que estão com seus vencimentos atrasados há dois

meses.1

De efeito, com razão aqueles que comungam contra a

redução da responsabilidade penal2, a começar com sua

1 “O Globo”, dia 24.08.96 - reportagem: “Verba federal para menor infrator será usada para

pagamento de pessoal.”

2Acresça-se acerca da incosntitucionalidade da proposta de redução: “O aumento da violência e da criminalidade gera o medo, o pânico, a desconfiança e a instabilidade. Tomadas pela emoção, as primeiras

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frontalização com a Lei Maior.

A atual Parte Geral do Código Penal Brasileiro, ainda

quando Projeto, teve como justificativa a manutenção de outrora

da inimputabilidade penal ao menor de dezoito anos, o

desenvolvimento biológico e social incompleto desses agentes,

como opção de política criminal. Confira-se a Exposição de

Motivos: “23. Manteve o Projeto a inimputabilidade penal ao menor de

18(dezoito) anos. Trata-se de opção apoiada em critérios de Política Criminal.

Os que preconizam a redução do limite, sob a justificativa da criminalidade

crescente, que a cada dia recruta maior número de menores, não consideram a

circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, e naturalmente anti-social

na medida em que não é socializado ou instruído. O reajustamento do processo

de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal. De

resto, com a legislação de menores recentemente editada1, dispõe o Estado dos

instrumentos necessários ao afastamento do jovem delinquente, menor de

18(dezoito) anos, do convívio social, sem sua necessária submissão ao

tratamento do delinquente adulto, expondo-o à contaminação carcerária.”

Assevera os “considerandos” da exposição de motivos

do Código Penal, com toda a obviosidade da razão, que as

possíveis deformações de caráter do menor infrator, contrárias ao

normal desenvolvimento do púbere só poderão sofrer

reajustamento pela educação e não pela pena criminal.

Como se depreende da interpretação histórica, a

reações buscam uma resposta imediata, que seja pronta, rápida e eficaz. É nesse cenário que hoje se propõe, como medida de combate à criminalidade, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Contudo, esta proposta peca, de início, pela sua inconstitucionalidade.(...) A ordem jurídica brasileira, em consonância com o Direito Internacional, em especial com a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança(ratificada pelo Brasil em 24 de setembro de 1990), consagra o direito a ser criança e o direito a ser adolescente como direitos fundamentais, que merecem plena e total observância, não podendo sofrer qualquer restrição. A esses direitos fundamentais se contrapõe a proposta de redução da maioridade penal que, em sua gênese, traz o vício insuperável da inconstitucionalidade.” ( Artigo de autoria dos Procuradores de Estado Flávia Piovesan, Maria Helena Marques Braceiro, Flávio Frasseto e Cyro Saadeh, publicado em 08.11.96, no jornal “O Estado de S. Paulo”.

1 Na época vigorava o Código de Menores( Lei nº 6.697, de 10.10.79), hoje substituído pelo Estatuto da Criança.

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vontade legislativa quando da edição da lei penal era atacar a

causa de deformação do menor infrator. E isso se faz claro e

evidente, pois “el fundamento de la presunción de inimputabilidad

para los niños es que éstos no son definidos como iguales y, por

tanto, no son competentes para desmentir la vigencia de la

norma.”1

Um questionamento se impõe: qual a modificação da

política criminal que se pretende atualmente, através da redução da

idade para a responsabilidade penal? Uma política que vise

deflagrar um processo de eliminação do crime? Isso seria absurdo

porque a instituição do crime, assim como outras que interagem

com o ser humano, tem vida própria e autônoma, em nada

podendo influir, comandar e determinar o homem, o poder ou a

sociedade, acerca de seu nascimento, desenvolvimento e destino.

Ou a pergunta correta, para se chegar a uma resposta

também correta, seria ditada no sentido de que as mesmas

circunstâncias que existiam e que arrimaram a manutenção da

idade de dezoito anos para a imputabilidade penal na reforma do

extinto Código Penal de 1940, em sua parte geral, subsistem

hodiernamente, nada tendo sido feito pelos órgãos estatais

responsável pela aplicação e execução da política criminal

determinada pelo atual codex?

Isso redunda em duas proposições com caminhos

totalmente opostos. No primeiro caso, ou seja, em razão da

resposta dada à pergunta inicial, o único meio de tentativa de

reparação e reorientação do crime, é a edição de leis cada vez mais

severas, reparadoras daquelas revogadas, com a criação de

1 Jakobs, Strafrecht AT, 2a. ed., Berlin 1991, p. 521, Rdn 1.

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arcabouço1 infindável para a impossível missão legiferante de

prever todas as relações criminosas entre o delinquente e a

sociedade, bem como as carcerárias consideradas entre si.

Vivemos assim em um sistema inflatório de regras do dever-ser.

Para o segundo questionamento, as diretrizes

governamentais devem perseguir a socialização e a educação do

menor infrator, como reflexo de uma reestruturação moral, ética e

jurídica da própria sociedade, com dignificação, principalmente,

dos valores naturais e básicos do homem.

Como em outros casos, em especial na criminalidade

dos adultos, a simples modificação legislativa, com imposição

rigorosa de penas, não é suficiente para o atendimento das

proposições axiológicas do instituto da punição.

Nem mesmo a criação de estabelecimentos prisionais e

de internato, com nomes variados, resolverá, porque não haverá

verba federal, estadual ou municipal capaz de atender ao povoado

de infratores, enquanto não se enveredar esforços para uma

1“Num sistema jurídico repleto de ‘leis de circunstâncias’ e ‘regulamentos de necessidade’

condicionado por conjunturas específicas e transitórias e por contextos heterogêneos, a generalidade da lei deixa de corresponder a uma equivalência das situações factuais a serem reguladas e a velocidade na produção normativa leva o Legislativo, Executivo e o Judiciário a perder a dimensão exata da importância jurídica das regras que ditam, dos comportamentos que regulam e dos casos que julgam, respectivamente. Condicionado por princípios conflitantes, os da legalidade e do primado da lei (típicos do Estado Liberal) e o da eficiência das políticas públicas nos campos social e econômico (típico do Estado-Providência), o Executivo passa a agir de modo paradoxal gerando, em nome da estabilização monetária e do combate à inflação econômica, uma corrosiva ‘inflação jurídica’. Esse tipo de inflação se traduz pelo crescimento desenfreado do número de normas, códigos e leis, de tal modo que a excessiva acumulação desses textos legais torna praticamente impossível sua aplicação de modo logicamente coerente e sistematicamente congruente, ocasionando, por consequência, a ‘desvalorização’ progressiva do direito positivo e o impedindo de exercer satisfatoriamente suas funções controladoras e reguladoras. Tal processo, em outras palavras, leva à própria anulação do sistema jurídico, uma vez que, quando os direitos se multiplicam, multiplicam-se na mesma proporção as obrigações; e estas, ao multiplicarem os créditos, multiplicam igualmente os devedores, num círculo vicioso cuja continuidade culminaria na absurda situação de existirem apenas devedores - todos, evidentemente, sem direito algum. ‘No limite da extensão do direito’, como afirma um arguto observador desse fenômeno, anuncia-se um regime de deveres legais sem que haja qualquer lugar para um direito(...); a inflação do direito traz em si a sua própria morte.” (José Eduardo Faria, “O Poder Judiciário no Brasil: Paradoxos, Desafios e Alternativas”, Brasília: C.E.J., 1995, p. 35).

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política nacional de redução de miséria, pobreza e de uma

aceitável distribuição de rendas.1

Iniciar-se uma diretriz pelos efeitos, desconsiderando a

causa, é condenar todas as edificações jurídicas, construções

jurisprudenciais e legislações em letras mortas ao longo do tempo,

colocando-as sob uma redoma intangível pelo aplicador do direito.

Leis eficientes são editadas, mas não são cumpridas,

pois esbarram no empecilho político de liberação de verbas, nos

interesses dos governantes locais em fomentar outras realizações

públicas mais aparentes e em outros infinitos fatores que

extrapolam a consciência comum daqueles que estão do outro lado

do poder.

O internato do menor, assim como o cárcere do

criminoso adulto, como se viu e se verá no transcorrer do trabalho,

como medida eficiente e vital para a redução da criminalidade e

da impunidade, é premissa falsa.

Entendemos por bem trazer à colação artigo crítico à

política criminal adotada pelo Código Penal Espanhol, de autoria

de Jesús-María Silva Sanchez2, onde está lançado valioso estudo

sobre os modelos provenientes do Direito Romano e da “Common

Law”, bem como relevante análise sobre a imputabilidade penal de

menores, aí abrangidas diversas idades, com estudos científicos

acerca da pena e suas finalidades sociais e políticas, com dados

comparativos de uma cultura européia, onde já se adota a punição

de púberes.

1 Não usamos a palavra “justa”, primeiro por que justiça é conceito subjetivo; segundo, não há qualquer

conotação política, pelo menos conscientemente; terceiro, porque o vocábulo “aceitável” é entendível por todas as acepções sociais, políticas, governamentais como um fato inexorável.

2 Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 13, pp. 38/53.

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Confira-se, a seguir, o artigo cujo aproveitamento

doutrinário para os estudiosos do direito penal e penitenciário é de

extremo proveito, como o é para o trabalho agora colocado a

público, verbis: “La discusión relativa a cuál debe ser la respuesta

jurídico-penal frente alos hechos antijurídicos cometidos por

sujetos menores de edad, pese a su permanente vigencia, parece

gozar en los últimos tiempos de renovada actualidad. Sin

embargo, es obvio que dicha discusión, para conducir a algún

resultado, debe enmarcarse, como cualquier otra propria del

Derecho penal, en los principios político-criminales que

legitimam el si y el cómo de la intervención de éste en la sociedad.

En efecto, como ha puesto de relieve Mir Puig(Derecho Penal PG,

3a. ed., Barcelona: 1990, p. 636), ‘la exención incondicionada de

pena hasta los dieciséis años se base en algo más que en la

presunción de inimputabilidad, a saber: en la moderna convicción

político-criminal de que los menores no deben ser castigados

como los mayores, ni ir a la cárcel como ellos...’. En definitiva, la

imposición de un pena a los sujetos de edad inferior a dieciséis

años carece de legitimidad, tanto desde el punto de vista de la

prevención especial, como de la prevención general negativa,

como, finalmente, de la prevención general positiva. Es cierto que

la ausencia de pena respecto al menor podría suponer una

disminución de la intimidación sobre el colectivo del menores

delincuentes potenciales, es decir, sobre aquellos menores de

dieciséis años que pudieran ser autores potenciales de delitos. Sin

duda, este aspecto es problemático. En efecto, la eficacia

intimidatoria del Derecho penal sobre el colectivo general de

autores potenciales de delitos, no sufre menoscabo relevante

porque la edad de dieciocho años constituye un punto esencial en

la valorización del sujeto como igual o diferente del sujeto adulto

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ordinario1. Asi, parece evidente que, frente a esta situación de

libertad de facto, la imposición de medidas de seguridad no

supone un minus, sino que supone un plus de interveción y, por lo

tanto, permite augurar una mayor eficacia preventiva en

general..Efectuadas estas consideraciones generales, se plantea la

cuestión de que configuración debe darse al sistema de reacciones

penales contra hechos antijurídicos cometidos por menores de

dieciocho años para satisfacer, por un lado, las necesidades de

resocialización; por otro lado, las de intimidación de los autores

potenciales, en general, y de los autores potenciales

pertenecientes a esa franja de edad, en particular; en tercer lugar,

las necesidades de confianza de la sociedad en el normal

funcionamiento del sistema jurídico; y en fin, las exigencias de

salvaguarda de los derechos individuales y las garantías del

sujeto.”

Por derradeiro, a ilustre autora arremata sua tese com

as razões e objetivos de uma reforma jurídico-penal cingida ao

sistema punitivo juvenil, perfilando os diversos fundamentos das

doutrinas por ela mencionadas, tanto do modelo de discernimento,

tanto daquele que tem como bandeira a necessidade da pena, cujos

conceitos encontram-se na introdução deste trabalho, mesclando

aspectos afetos à culpabilidade, para propôr um sistema de

configuração mixta, com prioridade às medidas educativas e

terapêuticas para o fim de ressocialização.

Acaso, apesar das medidas acima apontadas, o jovem

insista no caminho da delinquência, fazendo imprescindir a

punição privativa de sua liberdade, esta não poderá ser aquela

mesma aplicável aos adultos, com autenticidade própria. A esse

sistema proposto a autora denominou de sistema vicarial

1 Os grifos são nossos, força da relevância da assertiva da doutora.

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obrigatório para regular o sistema de menores entre os dezesseis e

dezoito anos, que tem como justificação a idoneidade das

instituições educativas, existindo sempre depois a possibilidade de

revogar a medida e executar unicamente a pena, acaso frustrada a

tentativa educacional

Estas são suas eloquentes palavras, verbis: “Expresado

en términos clásicos, hay buenas razones para situar en los

dieciocho años la frontera de la culpabilidad, como categoría

sistemática del Derecho penal, o mejor dicho, de la

responsabilidad penal a los efectos de la imposición de una pena

convencional de adultos. Ahora bien, situar en lo dieciocho años

la frontera de la responsabilidade penal plena, tiene obviamente

una serie de condiciones. En pimer lugar, que las medidas

aplicables a los sujetos de edad inferior a los dieciocho años, y en

particular aa los entre dieciséis y dieciocho años, han de ser unas

medidas adecuadas y adaptadasa las peculiaridades psicológicas

y criminológicas de esta franja.En segundo lugar, la prevención

general positiva, así como las garantías individuales, exigen que,

ante el fracaso de las medidas, ya sea por rechazo de las mismas,

ya sea por imposibilidad de conseguie las metas a las que las

mismas estaban dirigidas, se pueda imponer una pena diferente:

pena juvenil que, en los términos antes delineados, sería una pena

necesaria en términos preventivos y, por tanto, legítima. En tercer

lugar, la viabilidad de este sistema, basado en las nociones de

prevención y de garantías, determina que sea necesario adoptar

una postura contraria a las propuestas que desde alguns años

están de moda, orientadas a promover una desjudicialización y

una desformalización de la intervención sobre los sujetos de

edades inferiores a los dieciocho años. Las opciones en favor de

la desjudicialización y de desformalización, inspiradas en la

humana pretensión de desdramatizar la intervención sobre los

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sujetos autores de hechos antijurídicos em edades juveniles,

supone por el contrario, una importante disminución de garantías,

así como una significativa pérdida de los efectos de prevención

general positiva y negativa, que son fundamentales para la

vertebración del sistema.”

Não há dúvida de que o estudo científico proposto se

aparelha, em muito, com os ditames do Estatuto da Criança e do

Adolescente, a demonstrar, o que jamais negamos, a evolução

jurídica no tratamento da questão do menor infrator pela

legislação brasileira, que prevê em minúcias circunstanciais a

divisão dos fatos tidos como anti-sociais, bem como as medidas

sócio-educativas aplicáveis aos casos perfilados no Estatuto.

Os movimentos setoriais que valorizam a redução da

imputabilidade penal, bem como aqueles que pugnam por penas

mais rigorosa e maior criminalização de condutas antijurídicas,

cerram, entretanto, os olhos das autoridades e da sociedade para a

essência do problema e transformam a premissa falsa, ao final do

processo de silogismo, em verdade falsa.

O Conde de Beccaria, na sua obra célebre, advertira

acerca das falsas idéias de utilidade. Estas são suas verdadeiras

palavras: “As falsas idéias feita pelos legisladores a respeito da

utilidade são uma das fontes mais abundantes de erros e de

injustiças. Ter idéias falsas de utilidade é sacrificar mil vantagens

verdadeiras ao receio de uma desvantagem suposta ou pouco

importante.”1

Na avaliação das causas, citemos Miguel Reale2. O

1ob. cit. na referência bibliográfica, p. 85.

2 Artigo do Jornal “O Estado de São Paulo”, 24.08.96.

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insigne jurista atesta em suas eternas lições que uma das causas da

delinquência juvenil, se não a maior, principalmente dos crimes

hediondos, é representada pelas drogas, “a qual constitui uma das

pragas das sociedades contemporâneas, envolvendo crianças,

adolescentes e adultos, sob o jugo de organizações rivais na

conquista do tenebroso mercado.”

A droga, bem como a bebida alcóolica, conforme

relatos científicos da medicina, têm como agravante o fato de não

despertarem a violência em círculos sociais restritos, por não

serem ingeridas por etárias de idade específicas ou por classes

sociais determinadas, sendo elementos conclusivos e

preponderante na geração da agressividade, pelo simples motivo

da convivência das sociedades modernas, com problemas

globalizados, não restritos, tão-somente, a seu aspecto regional,

fruto das ditaduras políticas sociais impostas, por vezes, pelos

governos e pelos fatotes de sobrevivência no mercado

profissionalizante, tudo atrelado ao progresso galopante cujo

desenvolver vai deixando milhões de vítimas mentais de seu rolo

compressor. “Acresce notar que, mesmo pessoas calmas e tímidas

podem cometer atos de violência: a insegurança, como é sabido,

produz o medo e este, ampliado para outros indivíduos, acaba por

ocasionar o pânico, cuja reação é sempre representada por atos

violentos. Dentro da chamada subcultura, surge a subcultura

conflitiva (ou conflituosa): é a subcultura isolada, a do isolamento

que leva o indivíduo a se afastar dos demais, e se isolar, e esses

‘isolados’, agrupando-se, procuram estímulos na droga, nos

entorpecentes (cf. Valdir Sznick, Comentários à Lei de

Entorpecentes, Forense, 1991). A subcultura formada por

drogados acaba gerando a violência: quer pela procura de

drogas, quer pelos efeitos da substância entorpecente, - violência

que se apresenta de modo generalizada ou, em particular, nas

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‘quadrilhas’ e suas lutas.”1

O ilustre jurista e filósofo também coloca como causa,

com reservas entretanto, a funcionalidade entre o pauperismo e a

criminalidade, pois a crise social exacerba, com achatamento das

classes sociais, faz gerar o fenômeno criminal, obrigando o

desempregado ou subemprego a delinquir como forma de

sobrevivência.

Entende que a imputabilidade penal dos adolescentes

abaixo dos 18 anos tem os transformados em criminosos

perigosíssimos e gerado a utilização dos menores como meio de

manobras de astutos criminosos, motivo capaz de determinar a

redução da responsabilidade penal, à igualdade da capacidade

política, como meio, inclusive, para frear o comércio das drogas.

De efeito, em excelente trabalho de pesquisa popular, 2

o Centro de Coleta e Armazenamento de Dados

(INFORMESTADO) certificou que, das 217 pessoas escolhidas

aleatoriamente, todos moradores da cidade de São Paulo,

consultadas por telefone no dia 28.08.96, 93,1 % concordam,

também, com a redução da idade penal do Brasil.

Dos entrevistados, 46% sugerem que a maioridade

penal seja fixada aos 14 anos e não aos 18 anos; 41,1% querem

que seja aos 16 anos, e 12,9, aos 10 anos.

Para 98,2% dos entrevistados, os menores estão

cometendo mais crimes. As drogas, como anotado por Miguel

Reale linhas atrás, foram apontadas como causa do aumento da

1Valdir Sznick, obra citada na referência bibliográfica.

2Comunicado ao público no “Jornal da Tarde” do dia 04.09.96.

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criminalidade entre os menores por 23% das pessoas ouvidas. A

desagregação familiar foi citada por 16,9% e a impunidade, por

16%. Outros 15% culparam o desemprego; 13% a miséria; 7%, a

evasão escolar; 3%, a educação dada pelos pais e 2,3% o descaso

do Governo.1

Além das vozes populares, cruciais também as

manifestações de membros do Poder Judiciário responsáveis pelos

juizados de menores, mais especificamente pelo forum da criança

e da juventude, como profundos conhecedores da criminalidade

púbere e de suas causas e efeitos.

O então Juiz-Corregedor da Fundação Estadual do

Menor, Luiz Fernando Salles Rossi, acredita que criar a

expectativa na sociedade de que a redução penal diminuirá a

criminalidade é uma ilusão. Lembra o juiz que, de acordo com o

Estatuto da Criança e do Adolescente, o menor pode ficar

internado durante 3 anos, caso pratique, por exemplo o crime de

roubo. Pela lei comum ele seria condenado à pena de 5 anos e 4

meses e, sendo primário, cumpriria um sexto da expiação, ou onze

meses, e poderia, além disso, ser beneficiado com regime semi-

aberto ou aberto, o que transforma o aludido estatuto em diploma

preventivo e repressivo bastante eficaz.

Nesse diapasão, o então juiz da Vara da Infância e da

Juventude do Rio de Janeiro, Siro Darlan, criticou fortemente a

proposta de redução da idade para a responsabilização penal: a

uma, porque não há instituições, oficiais ou privadas, suficientes

para atender aos menores infratores; a duas, vez que o custo

dispendido pelas instituições de custódia de menores, infratores ou

1Como se os outros fatores atinentes aos percentuais mencionados, não fossem decorrentes do descaso e

da omissão constitucional do governo.

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não, gira em torno de três a quatro salários mínimos, a três, pelo

fato de a prisão ou internação suprimir do menor o convívio

familiar. Apesar da desagregação ter parcela de culpa na

marginalização, já que os pais têm o aval da miséria, o problema

deveria merecer atenção especial como raiz da pulverização

familiar.

O magistrado lança interessante proposta,

aproveitando a experiência realizada pelo governo de Brasília,

atualmente implantado pelo Governo Federal, o conhecido Bolsa-

Família, consubstanciada na criação de um auxílio, no valor de um

salário mínimo, para as famílias de baixa renda. Elas se

comprometem a manter os filhos na escola, evitando o ócio do

menor. Concedendo o aludido incentivo às famílias, propiciam os

programas sociais mantê-las mais pacientes, reduzindo, assim, a

violência familiar.

Também para o advogado Técio Lins e Silva, ex-

Secretário de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a crise no

sistema penal e na segurança pública é forte motivo para não se

reduzir a idade penal, pois o Estado não pode pensar em aumentar

a população carcerária, se não consegue sequer cumprir a

Constituição Federal que garante o direito à saúde, educação, lazer

e habitação para todos, pobres e adolescentes, inclusive. Deve, isso

sim, melhorar as suas instituições atuais e não criar outras que, em

pouco tempo, alcancem o descalabro generalizado das

organizações públicas já existentes.

De outro lado, entretanto, no entender de um juiz de

Menores da 1ª Vara Especial da Infância e da Juventude da

Comarca de São Paulo, David da Costa Ferreira, que apoiava,

quando opinou de seu cargo, a redução aos 16 anos, a ousadia e a

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periculosidade, nessa idade, já é fato notório, capacitando o agente

a responder criminalmente, por seus fatos antijurídicos.

Comungam dessa opinião ilustres representantes do

parquet paulista, como se depreende da opinião de um promotor

de justiça em ofício na Vara da Infância e Juventude, Osvaldo

Monteiro da Silva Neto. Ao seu ver, o atual Código Penal, com

seus 56 anos, não atende aos reclamos da evolução da sociedade e

que, ciente o menor de sua impunidade, como é atualmente, pende

em seu favor a proteção legal. Se houvesse previsão legal de sua

punição, entende, o infante pensaria duas vezes na hora de violar a

lei.

Para o também promotor Carlos Fartoni Júnior, pelo

menos na época, o marco de 15 anos para a redução penal viria a

atender a realidade da criminalidade da juventude.1

No Estado do Rio de Janeiro, a Promotoria de Justiça

Pública especializada nas varas da Infância e da Juventude,

passando ao largo das discussões sobre o E.C.A. e as propostas de

redução da imputabilidade penal, deflagram movimento contra o

governo estadual e, por vezes, contra juízes em exercício no

Juizado de menores, preocupados que estão com o despautério das

instituições atinentes à apuração dos fatos anti-sociais cometidos

pelos menores, bem assim com as técnicas de reprimenda dos

infratores utilizadas em estabelecimentos especializados e, ainda, a

ausência de programas de ressocialização e reeducação do menor,

como determina o Estatuto.

1 Os dados e as opiniões acima coletadas foram fruto de reportagens realizadas pelo jornal “O Estado

de São Paulo”, em variadas seções de seu caderno, no periódico do dia 05.09.96, de autoria da repórter Rosa Bastos.

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Em manifesto publicado 1 sob o título “O BERÇO DA

CRIMINALIDADE”, de autoria dos promotores de justiça Astério

Pereira dos Santos e Márcio Mothé Fernandes, está demonstrada a

gravidade do problema infato-juvenil no Estado do Rio de Janeiro.

“... As pessoas não mais suportam ser vítimas da galopante

delinquência juvenil e também já estão cansadas de ouvir

discussões inúteis ou assistir à propositada divulgação pela mídia

de projetos pessoais dissociados da realidade fática e, portanto,

estéreis. Como é sabido, a ausência de uma política social voltada

verdadeiramente para a criança dessasistida e a consequência

desta, o adolescente infrator, hoje, sem sombra de dúvidas, a

mão-de-obra indispensável à nefasta ação dos traficantes de

entorpecentes, representa o principal incremento à criminalidade

que atormenta os nossos lares. Para se ter uma idéia da

caoticidade do quadro e do alcance do limite insuportável do

problema, vale a pena citar alguns números, Em 1995, foram

vítimas de homicídio no Rio de Janeiro 596 adolescentes...Ainda

em 1995, dos 506 adolescentes internados na Escola João Luiz

Alves, 319 fugiram e retornaram para as ruas...Concomitante a

este quadro alarmante, na Comarca da Capital, as internações

provisórias previstas na lei, em até quarenta e cinco dias, não

duram mais que vinte dias e as internações definitvas que podem

chegar a três anos, quando aplicadas, geralmente não

ultrapassam três meses. Tais aspectos estimulam a impunidade e

corroboram para a desmoralização e falência total do sistema,

com reflexos negativos no combate à criminalidade... A estrema

gravidade alcançada pelo problema do adolescente infrator não

permite a adoção de soluções paliativas, nem muito menos da já

rotineira cultura do repasse, sintetizada na transferência de

responsabilidades. Já tarda a hora desses jovens assumirem

compromissos inerentes a uma cidadania responsável, iden-

1 Dia 22.08.96, no “Jornal do Brasil”.

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tificando a origem do problema, sem repassá-los. A sociedade

carioca não mais se conforma com a atual política liberal,

acobertada por eufemismos, advindos do Poder Público, que

detém a responsabilidade direta pela correta reeducação daqueles

que praticam atos infracionais e que, não obstante, preferem fazer

do Estatuto da Criança e do Adolescente uma ponte de acesso às

ambições pessoais, políticas e profissionais.”

Como se vê o Ministério Público do Estado do Rio de

Janeiro não esboça concordância com a situação atual do menor,

tanto pela atuação do Judiciário local, como também com a desídia

do governo estadual a respeito do problema.

No dia 23 de agosto de 1996, o então procurador-geral

de Justiça daquele Estado recebeu requerimentos expressos de

diversos representantes do parquet , no sentido de operalizar-se

correição extraordinária no Juizado da Infância e da Juventude.

A medida extrema teve como causa, ao ver dos

promotores, o tratamento, ao arrepio da lei, deferido aos menores

infratores, contribuindo, por decorrência, para a sensação de

impunidade e no estímulo da criminalidade, bem como o

estatisticamente comprovado aumento de índices de reincidência.

Dentre as irregularidades apontadas, está o pequeno

número de decretos de internação de menores que cometem atos

infracionais (primeiro semestre de 1996, foram 3.337 menores

infratores atendidos, para um total de 157 internados). Também

ocorrentes a realização de audiência judicial com os infratores,

sem a presença de representantes do Ministério Público. Aduzem

no manifesto que a aparente celeridade processual tem como alvo

os dados estatísticos da instituição para fins outros e o

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esvaziamento das unidades de internação, devolvendo às ruas

menores não qualificados para o processo de ressocialização.

Não fosse só o problema institucional, aludem a

instalação da selvageria nos próprios prédios de custódia, com

agressões a menores, a precariedade das celas de permanência e

internação provisória no interior do Juizado, onde diversos casos

de atentado violento ao pudor, fazem rotina nas ocorrências,

mazelas que levaram a uma ressureição da promotoria pública.1

É bom que se diga, acerca do episódio, que se no

Estado carioca, centro cultural de maior relevância do país, motivo

de atenção dos governos estrangeiros e de associações

internacionais compromissadas com o menor, o grau de dirupção é

decorrente da desídia estatal, apesar de incessante fiscalização dos

promotores públicos, de grupos não oficiais de proteção à vida e

de direitos humanos, nem ousamos imaginar qual o tratamento à

recuperação, reeducação e correção de menores em outros estados

federados de menor expressão.

Para tanto, trazemos à colação os seguintes dados

sobre os infratores menores:

1 “O Globo”, dia 24.08.96, reportagem de Angelina Nunes.

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No quadro abaixo, o deficit de vagas nas unidades já é

grande e evidente tende a crescer. Vamos aos dados.

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Toda as respostas aos anseios populares, tanto na

questão do menor quanto na análise do universo carcerário, ficam

cingidas ao aspecto político. Pior, politicagem.

Sabe-se , porque notório, que nas casas de custódia de

menores, nas ruas, nas delegacias especializadas, há um consenso

mudo e institucional de que o menor infrator, o menor

abandonado, o menor de rua, enfim, toda a criminalidade infantil

e adulta, em igualdade com as demais instituições brasileiras, é

fato consumado a caoticidade e a desesperança.

Governos e agentes, até os próprios cidadãos(inclusive

o autor), olham com um sentimento gélido para o desenvolvimento

dos fatos terríveis que circundam a sociedade. Sabe-se que o

mundo da criminalidade é composto de sociedades parciais

distintas, cuja distância é paradoxalmente curta, na medida em que

se convive diurnamente com ela, mas, de outro modo, longínqua,

força da ditadura social implantada por nossas instituições

políticas e pelo capitalismo selvagem regente da economia. É

preferível, ou melhor, cômodo permitir se fazer despercebido às

mortes, agressões, violações morais e as demais degenerações da

personalidade humana ocorrentes nos estabelecimentos. Algo

como, mutatis mutandi, equilíbrio ecológico (ou criminológico),

dentro da teoria darwiniana da luta das espécies.

Como se pretende, questionamos, impor maior

radicalismo na legislação do menor e do adolescente se a atual, o

ECA, sequer foi aplicada no plano da realidade para que se possa

assegurar o seu fracasso. Isso denota um fato comum no Brasil: o

poder legiferante e a realidade estão divorciados. As causas que

fazem exsurgir uma legislação revogadora não pode ter como

arrimo a mera e simplória alegação de que a criminalidade,

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estatisticamente, evoluiu.

Isso, id est, o positivismo dos dados da estatística,

pode até ser verdadeiro, mas não é suficiente para determinar-se a

revisão açodada da legislação. É necessária uma pesquisa mais

profunda, com os préstimos de fundações especializadas, de

juristas, advogados, juízes etc., principalmente, de pareceres de

especialistas em sociologia.1

Em excelente trabalho técnico de crítica, a Dra. Tânia

da Silva Pereira, advogada e professora universitária, lança

balizada opinião sobre a criminalização infantil, discordando

acerca do recrudescimento legislativo como fato impeditivo do

crescimento da criminalidade e como solução capaz de minimizar

o statu quo, de certa forma consectária às investidas lançadas por

nós, inclusive no tocante à omissão dos Poderes Políticos e à

forma perfunctória que cuidam do problema.2

1“A sociedade não poderia existir sem que houvesse em seus membros certa homogeneidade: a

educação a perpetua e a reforça fixando de antemão na alma da criança certas similitudes essenciais reclamadas pela vida coletiva(...) Por outro lado, a educação assegura a persistência dessa diversidade necessária diferenciando-se, ela própria, e permitindo especializações(...) O aspecto final do espírito e do caráter depende desta infinidade de pequenos fatos insensíveis ocorrentes a cada instante sem que lhes demos atenção(Durkhein). Se a sociologia ajudará a educação a traçar os seus fins, ‘posto que tanto mais conheçamos a sociedade, tanto melhor chegaremos a perceber o que se passa nesse microcosmo social que é a escola’(idem), a psicologia servirá de base para descobrir o método que permitirá chegar à alma da criança. Torna-se necessário constituir um saber sobre essa criança, um saber científico, estatístico, que permitirá reconhecer as regularidades e as exceções, os desvios e as normalidades. Vejamos o comentário foucaultiano a respeito: ‘num sistema de disciplina, a criança é mais individualizada que o adulto, o doente o é antes do homem são, o louco e o delinquente mais que o normal e o não delinquente... e quando se quer individualizar o adulto são, normal e legalista, agora é sempre perguntando-lhe o que ainda há nele de criança, que loucura secreta o habita, que crime fundamental ele quis cometer’.(Foucault).” ( Artigo da dra. Flávia Inês Schilling, “Sobre Homens e Crimes: Construindo Um Diálogo tenso Entre Marx, Durkhein e Foucault”, publicado na Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 13, p. 281).

2“Este é um dos maiores problemas hoje enfrentados pelo Judiciário: para que sejam plenamente eficazes, muitas de suas sentenças (e, por conseguinte, as normas e as leis em que elas se fundamentam) passam a depender tanto do empenho quanto da eficiência com que o Executivo cumpre suas obrigações, em matéria de políticas públicas; e na medida em que esse poder, em suas instâncias municipais, estaduais, federal, revela-se incapaz de formulá-las e implementá-las, ou, então, as executa com propósitos meramente eleitoreiros, populistas e demagógicos, o Judiciário acaba sendo reduzido a uma posição secundária - como se fosse uma instituição subordinada, e não soberana, autônoma e independente. Não são poucos os casos em que a Justiça, nas suas diferentes instâncias, mostra-se absolutamente impotente diante de normas e leis que, apesar de inovadoras em seus objetivos e modernas em suas concepções, como os já mencionados Estatuto da Criança e do Adolescente e Lei de Execuções Penais, não conseguem ser plenamente concretizadas por causa da omissão

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Aduz que nosso País retrata uma visível contradição

no que concerne à Lei de Execução Penal e ao Estatuto da Criança

e do Adolescente. Apesar dos aludidos textos legais merecerem, na

ordem internacional, referência como leis modernas e modelares ,

no entanto, somos conhecidos como o país onde o sistema

penitenciário é falido e onde, em relação aos direitos da população

infanto-juvenil (mais de setenta milhões de pessoas com menos de

18 anos) somos conhecidos como maiores violadores.

Assevera que, efetivamente, não se altera a sociedade a

toque de leis, apesar destas representarem um instrumento

importante de mudanças sociais. Ao analisar o crescente fenômeno

da violência, sobretudo nas grandes cidades, paralelo a uma crise

econômica incontestável e um êxodo rural indiscutível, questiona

se será possível, mais uma vez, culpar as leis por todos esses

problemas sociais e o que tem sido feito para a implantação dos

mencionados diplomas legais. Afirma que é no Estado do Rio de

Janeiro, o mais atrasado no país na implantação do Estatuto, onde

se encontra um dos maiores índices de criminalidade contra

crianças e jovens, como registrado pela edição “Mapa da Violência

dos Municípios Brasileiros e Mapa da Violência 2006 – Os Jovens

do Brasil”, de Julio Jacobo Waiselfisz, editado pela Organização

dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a

Cultura(OEI), trazido pelo jornal “O Globo”, de 28 de fevereiro de

2007, 2ª edição, no caderno “O PAÍS”.

de um outro poder igualmente autônomo, soberano e independente.”(José Eduardo Faria, “O Poder Judiciário no Brasil: Paradoxos, Desafios e Alternativas”, Brasília: Conselho da Justiça Federal, 1995,p.78).

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Traz no articulado o alerta do Des. Antônio Fernando

do Amaral e Silva, ilustre jurista da Santa Catarina, como

palestrante, em seminário de Direito Penal realizado no Rio de

Janeiro, onde chamou atenção para os atuais equívocos que

envolvem o tema e mostrou uma nova etapa legislativa, onde a Lei

nº 8.069/90 é marcada pela responsabilidade penal juvenil no

tratamento da delinquência praticada por adolescentes. Segundo

ele, a postura do Estatuto da Criança e do Adolescente deixa claro

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o caráter penal das medidas sócio-educativas, caracterizadas pela

predominante proposta pedagógica que não esconde a existência

do conflito; do dano; da necessidade de sua reparação; da

imprescindível resposta adequada e justa à delinquência juvenil.

Acentua o Desembargador Amaral Silva que a

responsabilidade penal juvenil, com os consectários da legalidade

(nulla poena sine lege); da proporcionalidade(individualização da

medida); da prévia mediação da vítima, nada afeta aos direitos do

adolescente. Ao contrário, surge como imprescindível ao

reconhecimento da dignidade do jovem, pessoa capaz de assumir

responsabilidades sociais e legais, e que, inclusive, goza do direito

de remissão e transação, incorporada pelo Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Atribuem-se, nos dizeres da doutora, geralmente, à Lei

nº 8.069/90, a culpa pela impunidade dos jovens marginais, em

prejuízo das vítimas da violência e que a polícia não se encontra

atrelada na ocorrência de efetuar a prisão porque o Estatuto não

permite.

Esclarece, inicialmente, que o art. 301 do Código de

Processo Penal1 autoriza, inclusive, a prisão de adolescentes.

Estes, todavia por sua condição, deverão ser encaminhados à

DPCA - Delegacia de Proteção da Criança e do Adolescente, onde

são tomadas as providências legais previstas expressamente no

E.C.A. Se os policiais e os cidadãos não o fazem, a culpa não é da

lei, arremata.

Se a finalidade da pena criminal aplicável aos maiores

1CPP, art. 301 – “Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender

quem quer que seja encontrado em flagrante delito.”

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de 18 anos é recuperar, ressocializar e emendar a conduta, estes

objetivos jamais foram atingidos. Enquanto isso, os menores desta

idade recebem, como pena de caráter punitivo pelos atos

infracionais praticados, as medidas sócio-educativas, desde que

tenham completado 12 anos. Entre estas medidas estão a liberdade

assistida e a prestação de serviços à comunidade(previstas para os

adultos na Lei de Execuções Penais) e a internação, privação de

liberdade aplicável pelo prazo máximo de três anos, atingindo o

adolescente, em determinadas situações, até alcançar 21 anos.

Autoriza o Estatuto, conforme sua explicação, a representação pela

prática do ato infracional do adolescente, independente de prova

pré-constituída da autoria e materialidade (art. 182, § 2º - ECA1),

enquanto para o adulto é necessário a existência de indícios

suficientes de autoria e materialidade.

Entende que é necessária a revisão, com espírito de

cidadania, dos argumentos utilizados pelos defensores da redução

da imputabilidade do adolescente prevista na Constituição Federal

e no art. 27 do Código Penal2.

Sem entrar no mérito da discussão dos fundamentos

destas propostas (precocidade da consciência ilícito, a contradição

entre o direito ao voto e a prática do ato delitual, entre outros) e

diante de nossa lamentável realidade prisional, incluir os

adolescentes infratores, a partir dos 16 anos, na população

carcerária dos adultos imputáveis, não representa solução a curto

ou médio prazo para a delinquência neste país, diz a jurista.

1E.C.A, art. 182 – “Se, por qualquer razão, o representante do Ministério Público não promover o arquivamento ou conceder a remissão, oferecerá representação à autoridade judiciária, propondo a instauração do procedimento para aplicação da medida sócio-educativa que se afigurar a mais adequada. § 2º - A representação independe de prova pré-constituída da autoria e materialidade.”

2CP, art. 27 – “Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.”

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Arremata ser imprescindível o investimento,

sobretudo, na instrumentalização do Judiciário para aplicação e

acompanhamento das medidas sócio-educativas, ressalvado o seu

caráter punitivo, pois elas devem ser, antes de tudo, pedagógicas,

exigindo preparo técnico dos aplicadores, numa mudança

definitiva na cultura do atendimento.

Urge, no que concordamos com a afirmativa da

articulista, que a sociedade brasileira renuncie a sua postura de

indiferença e readquira sua capacidade de indignação, exigindo a

implantação de medidas que modifiquem o contraditório cenário

da atualidade. O pior equívoco é dizer que estamos punindo o

efeito pela causa; na realidade não estamos enfrentando nenhum

dos dois. Fala-se dos desvios de conduta dos jovens e se omite a

violência estrutural. Não foi a lei que determinou o maior índice

de assassinatos de crianças e adolescentes nos últimos anos,

destacadamente, nos grandes centros. É sua louvável posição.

O doutor em menores, então juiz e vice-presidente da

Associação Internacional de Juízes de Menores, Alyrio Cavallieri

asseverou que, entre muitas exclamações de entusiasmo dos

autores do Estatuto do menor, eles se opuseram tenazmente a uma

avaliação que visasse torná-lo pelo menos exequível. O eminente

magistrado nos informa que a Associação Brasileira de

Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude,

em Congresso realizado em meados de 1993, em Curitiba, à

unanimidade, deliberou em seus anais que houvesse recomendação

ao governo federal para a promoção da avaliação do E.C.A.,

porém, efetivamente, nada foi providenciado.

Por iniciativa própria, força da inércia daquela

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agremiação, o ilustre juiz organizou e formulou, com a opinião de

dezenas de autoridades, 395 objeções à aludida lei.

Dentre as opiniões coligidas, temos a de Ib Teixeira,

advogado e economista da Fundação Getúlio Vargas que afirmou

o agravamento da situação do menino de rua, com considerável

acréscimo de assassinatos infantis e, de outro lado, o aumento da

criminalidade praticado por menores.

Entende que a falência do problema do menor no

Brasil não será resolvida pelo rebaixamento da responsabilidade

penal, pois se o Estatuto é ineficiente, o é por culpa do governo

que o desrespeita.

Atrela também àquela investida o fato de os

legisladores inserirem normas naquela lei que retiram atribuições

relevantes do Judiciário e do Executivo, transferindo-as para as

comunidades.

Sugere, por fim, comungando com nossa opinião, que

a cadeia e a diminuição da responsabilidade penal não são as

soluções efetivas do problema da violência, em especial da

juvenil. A melhora do atual Estatuto, já com tempo de vida

suficiente, deve sofrer um estudo acurado ante sua

impraticabilidade.1

É primordial que os legisladores se esforcem a editar

leis2 que atendam a essência dos problemas sociais.

1 Jornal “O Globo”, dia 23.08.96.

2Lei “é a regra jurídica escrita, instituída pelo legislador, no cumprimento de um mandato, que lhe é outorgado pelo povo.”(Plácido e Silva, em “Vocabulário Jurídico”); Para Iêdo Batista Neves, em “A Norma Jurídica”, é “a prescrição emanada da autoridade soberana de preceito oriundo do Poder Legislativo. Regra geral e justa e permanente, que exprime a vontade imperativa do Estado, a que todos estão submetidos.” E Miguel Reale assim se expressa(in “Lições Preliminares de Direito”): “é enunciativa de uma forma de

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Manifestações, até compreensíveis, como o do Grupo Valéria

Frota, há alguns anos atrás e da família de João Hélio hoje,

deturpam as necessidades que seriam da sociedade como um todo,

mas retratam apenas um anseio popular setorial de vindita, mágoa,

revolta e outros tantos motivos que não têm legitimidade social,

mas, tão-só, aparência pelo dissabor de mais uma tragédia

nacional. Assim, como cediço e legalmente aceitável para

legitimar os representantes públicos, interesses particulares devem,

inevitavelmente, ceder ao interesse coletivo, como é sabido em

seara publicista do direito. Então, tragédia coletiva, na verdade,

que deve merecer destaque e a posição de se sobrepor às demais

tragédias espalhadas em parciais segmentos sociais, é aquela que

trata do sistema punitivo como instituição governamental e social,

capaz de reprimir, prevenir e recuperar agentes violadores da

ordem pública, incorporadas nas legislações penais.

O ponto nodal da questão é muito mais profundo do

que a mera reflexão sobre a imposição de penas cada vez mais

severas e sua conseqüente repercussão nos dados da estatística

criminal.1

A implantação de penas caracterizadas pelo rigor,

organização ou de conduta, a qual deve ser seguida de maneira objetiva e obrigatória.”

1“Vetor indispensável na avaliação da escalada da violência e também meio de aferição do trabalho policial, a estatística criminal tem sido usada de forma casuística. Vez por outra, os responsáveis pela área da segurança fazem inserir na mídia somente a valorização dos índices referentes às ocorrências registradas, buscando amortecer a repercussão do impacto da criminalidade e também garimpar credibilidade para as organizações de combate ao crime. São casos não aparentes e portanto não computáveis, que no jargão estatístico ficam na zona cinzenta, nunca apurados. São números que carecem de exatidão, porque contaminados pelas condicionantes do medo, de descrença e, às vezes, até de dificuldades impostas na ocasião do registro. Portanto, conhecidas as condicionantes que afastam incontáveis vítimas de fazer o registro de ocorrência delituosa e avaliados em conjunto e em extensão os dados estatísticos coletados, verifica-se que o placar estatístico criminal está aquém da expectativa - fato preocupante, seja visto pelo enfoque preventivo, seja olhado pela marca repressiva. Não se constrói o aprimoramento da luta contra o crime, nem se consegue ganhar a necessária confiança, fazendo uso casuístico de índice isolado da conjuntura criminal.” Artigo “Estatística Criminal”, publicado no “O Globo”, dia 17.12.96, de autoria de Heraldo Gomes, Delegado de Polícia aposentado e ex-Secretário Estadual de Polícia Civil.

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atualmente adotada por alguns governos, como alhures dito, tem

como fulcro um suporte baseado na estabilidade da entidade

estatal e da sociedade civil, que propiciam a respeitabilidade das

decisões políticas e a consectária influência efetiva nos dados

criminológicos.

O magistrado Liborni Siqueira, ferrenho lutador das

causas do menor, porquanto contrário à redução da

responsabilidade que se cogita, aduziu na palestra sobre o tema “O

CRIME E O CRIMINOSO”, proferida por ocasião da reunião do

Conselho Empresarial de Segurança Pública, promovido pela

Associação Comercial do Rio de Janeiro, que atualmente a

sociedade volta suas atenções para o crime e deixa de lado o

criminoso, seguindo uma filosofia de inversão de valores.

Afirmou, com singular maestria: “dentro da relação de

causa e efeito, o país priorizou os efeitos e despreza as causas.”

Alertou sobre a necessidade emergente de mudança no

comportamento da sociedade que desconhece o que sejam direitos

humanos, que muito se fala, mas sem qualquer radiografia exata

do isso significa.

Finalizou sua exposição com a advertência de que

mais do que punir o criminoso, é preciso fazer com que ele se

recupere e se reabilite para o convívio social. Por intermédio do

poder intervencionista do Estado, imbuído de vontade política e de

um novel conceito de moralização pública, através de pesquisas

sociológicas para a investigação da patologia dos criminosos isso

será possível.

Para reforçarmos a opinião do magistrado do Rio de

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Janeiro, objetivando dar maior ênfase ao entendimento por ele

esposado, em análise da essência da relação marginal em si mesmo

considerada do crime e do criminoso, bem como aquela que é sua

defluente, ou seja, a relação travada entre eles e a sociedade, urge

trazer à colação os argumentos de autoridade de Pierre Cannat1:

“Luego de haber recorrido rapidamente algunos de los problemas

que plantea el tratamiento de los condenados, no hesitamos en

reconecer que métodos, sistemas, construcciones diversas, están

dominados por el aspecto espiritual, es decir, que en el sentido

más exacto del término pertenecen al espíritu.El êxito de uma

reforma penitenciaria exige antes una reforma de mentalidad: en

la cumbre, en todos los grados del personal y en el gran público.

Esto es ciertamente muy dificil de realizar. Los edificios vetustos

se rehacen más pronto que se modifica una manera de pensar.

Pero el propósito es mucho más vasto, porque en materia

penitenciaria el provenir no pertenece a los países que inventen

los mecanismos científicos más perfeccionados. El porvenir será

del país que mejor comprenda el inmenso problema de la pena;

aquel en que el hombre se muestre más comprensivo, más justo

frente a sus semejantes, más social, es decir más abierto a todas

las miserias de los otros y, por este hecho, más inclinado a tender

la mano, más decidido a no rechazar a priori a nadie, más

persuadido de que el ser, aun el más bajo, aun deshonrado,

pervertido, podrido por dentro y por fuera, todavía es una

maravillosa creación de la naturaleza, porque siempre lleva en sí

mismo, sin que se apague jamás, lo esencial de su rescate.”

Aliás, com a autoridade de sua toga, quando Ministro

1 In “Le Reforme Pénitentiaire”, Melún, Libraire du Reweil Sirey: 1949, p. 287. Proveitosa também a lição de Carnelutti: “Narra uma fabulazinha, que eu aprendi em uma revista na Argentina, que às queixas dos anjos para a criação deste ser absurdo, meio anjo e meio animal, que é o homem, o Criador respondeu: ‘el hombre non és cuestion para congresos de filosofia’; e teria acrescentado:’el hombre es cuestion de fé en el hombre’.” (extraído do livro “Misérias do Processo Penal”, p. 35. ).

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do STJ, Luiz Vicente Cernicchiaro, teve oportunidade de se

manifestar a respeito: “a mudança de sistema não se faz somente

com a modificação da lei; impõe-se modificar a cultura. Não é

exagero: a prisão está em crise. Não se evidencia útil como

resposta à delinqüência. É notório, os estabelecimentos penais

não conferem condições para a execução alcançar seu objetivo.

Não educa. Não reeduca, ao contrário, deseduca. Em primeiro

lugar, lembre-se, a pena atende ao interesse público. Há, pois,

que extrair-se vantagem para a coletividade. Impõe-se, via

legislação, ensejar ao magistrado formas alternativas adequadas

às características objetivas e subjetivas do caso concreto. Sem

perder as garantias da taxatividade, a sanção precisa conferir ao

julgador espaço para o poder de discricionariedade. Só assim far-

se-á adequação do delito com a pena, em função do agente. A

prisão pode e deve ser substituída. Por isso, transitoriamente,

talvez fosse útil e oportuno reservar as penas privativas de

liberdade a alguns casos, ou seja, àqueles que afrontam de modo

agressivo e injustificável os valores maiores da sociedade

mantendo-a insegura. Se a natureza não dá saltos, o mesmo

ocorre com a cultura. Politicamente será oportuno manter hoje,

como exceção, o que se deseja eliminar amanhã. Todavia,

enumerando as hipóteses extremas e destinadas unicamente a

quem, com injustificável comportamento, revela ser incapaz de

convivência.”1

De outro lado, uma visão restrita de uma instituição,

1 “Folha de São Paulo”, dia 28/10/95. Aliás, a extrema imprescindibilidade da pena privativa de

liberdade para os casos de reconhecida necessidade sempre foi a política criminal adotada pelas legislações ocidentais modernas, acatada, inclusive, pelo Brasil por ocasião da reforma penal de 1984. Confira-se a Exposição de Motivos: “26. Uma política criminal orientada no sentido de proteger a sociedade terá de restringir a pena privativa de liberdade aos casos de reconhecida necessidade, como meio eficaz de impedir a ação criminógena cada vez maior do cárcere. Esta filosofia importa obviamente na busca de sanções outras para delinquentes sem periculosidade ou crimes menos graves. Não se trata de combater ou condenar a pena privativa de liberdade como resposta penal básica ao delito. Tal como no Brasil, a pena de prisão se encontra no âmago dos sistemas penais de todo o mundo. O que por ora se discute é a sua limitação aos casos de reconhecida necessidade.”

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pode fecundar, também nesses casos, uma premissa falsa cujo

desenvolvimento desembocará inevitavelmente em uma solução

deturpada da realidade emergente e das proporções axiológicas do

instituto sócio-jurídico, em especial a pena.

Suporte falso de uma avaliação sócio-jurídica é a

persistência na atualidade falida do sistema punitivo, com apego à

bandeira da impunidade, tal qual comunga, data respecta, o

Desembargador paulista Alberto Marino Junior, tecendo assertivas

consubstanciadas na correta, a seu ver, postura de indiferença do

Judiciário acerca do sistema punitivo, colocando-o na posição

simplista de mero aplicador das leis, sem contestá-las,

sentenciando condenados e jogando-os para a tutela do Executivo,

sendo atribuição dele a solução do problema penitenciário.

Aduz o jurista paulista, para tanto, que não se pode

permitir, a pretexto de esvaziar os presídios, a consagração da

impunidade e de que “filósofos” venham com certas invenções

capazes de gerar a audácia dos maus e o sobressalto da sociedade.1

A mesma corrente linha-dura encontra-se na

manifestação do magistrado estadual paulista, Corrêa de Moraes,

que, por ocasião de julgamento criminal realizado pela 7a. Câmara

do Tribunal de Alçada , explicou a base da reação, como testifica o

editorialista Antonio Carlos Pereira2: “Se o aparelho judiciário

não se comover com tão pungente estatística e não souber dar

resposta punitiva adequada ao banditismo violento, será bem

apropriado acoimá-lo de insensível, pusilânime e inútil. Es-

candaliza e revolta ver como falsos humanistas, espicaçados por

1 Articulado publicado na “Folha de São Paulo”, em 28/10/95.

2 “O Estado de S. Paulo”, 01.10.96, artigo denominado de “A REAÇÃO DOS JUÍZES”.

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patológicos sentimentos de culpa ou acoroçoados por farisaica e

piegas comiserações por facínoras, se alvoroçam e se mobilizam,

sempre que, diante da crescente ousadia e expansiva analgesta

total dos assaltantes, surgem propostas de reforço de eficácia

intimidativa e dissuasória da pena. Obrando com a mais

desfaçada improbidade intelectual, os falsos humanistas põem nos

defensores de justiça penal austera tacha de reacionários,

retógrados, porque, em sua ótica desonesta, estariam em oposição

às ‘tendências do direito penal moderno’. Ora, isso é cavilação,

blefe.O que esses indivíduos refratários aos sofrimentos da

população ordeira consideram ‘tendência do direito penal

moderno’, não passa de cerebrinas elocubrações de uns poucos

nefelibatas, cientistas de gabinete, prisioneiros de delírios

quiméricos. Na verdade, o ordenamento repressivo no chamado

‘primeiro mundo’ é tendencialmente sempre mais e mais rigoroso.

Nos EUA, onde há três décadas as estatísticas atribuem a

crianças entre 9 e 14 anos a média de 100 assassinatos por ano,

em estados como o Texas, menores podem ser condenados a até

40 anos de cadeia. E a lei federal está apertando. Um pacote do

governo Clinton contra a violência manda julgar como adultos os

adolescentes que se metam em delitos à mão armada. Na

Inglaterra (...), John Venable e Robert Thompson, dois meninos

que mataram um bebê quando tinham dez anos, pegaram quinze

anos de prisão1. Na França, a legislação foi endurecida por causa

de um crime sádico. Em 1993, um estuprador de crianças

reincidente, Patrick Tessier, confessou ter assassinado uma de

suas vítimas, Karine, de 8 anos. O Código Penal foi revisto por

causa dele. Para crimes dessa gravidade, passou a ser prevista

pena mínima de 30 anos, sem reduções. Para a morte de menores

de 15 anos, acompanhada de estupro ou tortura, a pena é prisão

1 Marcos Sá Corrêa, Revista “VEJA”, de 21 de agosto de 1996.

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perpétua.1 Retógrado é quem, fomentando a debilitação da

atividade punitiva, desmoraliza o civilizado sistema de valores

corporificados na lei. Bárbaro e destituído de senso de civilidade

é aquele que, por qualquer meio levando o sistema repressivo e a

Justiça Penal ao descrédito, incita o emprego de abomináveis

soluções extralegais: linchamento, contratação de grupos de

extermínio (os impropriamente denominados ‘justiceiros’)...”

As palavras do ilustre sentenciador, sem dúvida, têm a

força da cultura, da experiência e de característico desabafo de um

Judiciário firme, cumpridor de seus deveres institucionais, porém

desacreditado pela sociedade. Criminosos são processados e

julgados dia-a-dia, em números de peso. Condenações são

prolatadas na mesma quantidade. Mas, assim como as leis, as

sentenças são desprovidas da imperiosidade necessária, pois falta

conjuntura organizacional administrativa capaz de efetivá-las.

As leis, cada vez mais e mais severas, são fruto da

consciência de repúdio crescente, espelhado pelo legiferante, aos

crimes tôrpes, hediondos por natureza (estuprar e matar uma

criança), pelo que total razão assiste às palavras do juiz suso

citado.

De igual acerto, as condenações dos criminosos à mão

de clava, firmes e justas à sociedade, com a aplicação de pesadas

penas a criminosos contumazes, reincidentes,

irrecuperáveis.Todavia, o problema não se encontra nessa atitude

endurecida do combate ao crime, cujo apoio é incondicional.

Uma resma de papel, onde estão inseridas leis

rigorosas e sentenças destituídas de qualquer sentimento de

1“O Estado de S. Paulo”, 21 de agosto de 1996.

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condescendência com os delinquentes, não passarão de papel. E,

no papel, pode-se colocar o que quiser. Prefere-se que se tenha

pouco, mas se tenha.

O que se discute, advirta-se aos desinformados, não é a

quantificação de pena por crime. O que se propõe é o

recrudescimento punitivo incrementado por política de eficiência

corretiva que filtrem condutas atípicas, cuja potencialidade violem

ou ameacem a segurança pública e que venha, ipso facto, a

reprimenda. Temos como fio de prumo entre o bem e o mal, as

palavras voantes ao século do filósofo Confuccio: “se pagares o

mal com o bem, com o que pagarás o bem.” É a ligação das

idéias que forma a base de todo o edifício da razão humana...Se há

a possibilidade de recuperação, prossiga-se. É dever do Estado.

As leis e as sentenças que possuam efetividade já

terão, por si só, a dureza capaz de gerar a prevenção pelo medo de

sua real aplicação e a retribuição capaz de comprovar à sociedade

que quem comete crimes é encarcerado. “Disse que a rapidez da

penalidade é útil; e é certo que, quanto mais tempo passar entre o

crime e a pena, tanto mais compenetrados ficarão os espíritos da

idéia de que não existe crime sem castigo; tanto mais se acos-

tumarão a julgar o crime como a causa da qual o castigo é o

efeito necessário e inelutável. É a ligação das idéias que forma a

base de todo o edifício da razão humana... Uma penalidade muito

retardada torna muito menos estreita a união dessas duas idéiais:

crime e punição...Como os homens não se entregam, de início, aos

maiores crimes, a grande parte dos que vêem o suplício de um

criminoso, acusado de algum crime monstruoso, não

experimentam qualquer sentimento de terror ao assistirem um

castigo que jamais supõem possam vir a merecer. Em vez disso, a

punição pública dos pequeno crimes mais corriqueiros lhes pro-

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vocará na alma uma impressão saudável que os afastará de

grandes crimes, antes de tudo desviando-os dos que o são

menores.”1

Acreditamos rídiculo, quimérico e todos os outros

adjetivos bem lançados pelo magistrado, a adoção da postura

legiferante de editar mais e mais leis paleorepressivas, propiciando

sentenças de idêntica ferocidade legal, somente para creditar a si

mesmo o status de exercente da política criminal firme e

altamente repressora, sem, no entanto, mostrar à sociedade e aos

criminosos que a reprimenda estatal é real.

No caso concreto ocorrido no estrangeiro, trazido

como exemplo pelo articulista, o dois meninos ingleses, em perícia

realizada na instrução do processo foi constatado anomalias em

suas personalidades. É possível generalizar? Não é pelo fato de o

povo americano ter feito que temos de fazê-lo, somente por fazer.

No Brasil, a política do recrudecimento das leis não vem

acertando. É hora de recuar. É hora de, como um estrategista, bater

em aparente retirada para que o inimigo abra o flanco.

O sistema punitivo, para tanto, tem de ser analisado e

considerado como um grande quebra-cabeças onde a inclusão,

alteração ou supressão de qualquer norma positiva de seu

aglomerado, ensejará o harmonioso entrelaçamento de suas

funções específicas, capazes de resultar, pelo menos, algo mais

próximo de seu escopo.

De efeito, não podemos tratar do sistema punitivo com

a visão contida, tão-somente, na questão penitenciária. Ele recebe

1 Beccaria, idem, ibidem, na referência bibliográfica, pp. 55-56.

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insights de todo o seio social e governamental, estremece todos os

Poderes da República e o Estado Democrático de Direito.

Por isso, como retro dito, acolher de olhos vendados

soluções específicas de outras culturas para aplicá-las

incondicionalmente aos problemas brasileiros não se apresenta

com feições inteligentes. O que se deve e pode fazer é aproveitar

experiências fracassadas ou vitoriosas, acrescida de institutos

sociais, políticos e jurídicos consolidados no extraneus para

adaptá-los à realidade expoente no Brasil.

Dessa forma, verbi gratia, um valioso instrumento

para o desiderato propugnado é a construction dos norte-

americanos, onde o jurista reúne e sintetiza o conjunto de normas

e, com a soma de seu espírito e conteúdo, forma um complexo

orgânico de onde extrairá o direito positivo lógico, aplicável à vida

real, pois analisa a norma dentro de seu conjunto e em relação

direta e de interação com a ciência, descobrindo e revelando o

Direito advindo do ius cogens, recompondo-o, compreendendo-o e

construindo-o com arrimo nos elementos extralegal e metalegal, de

natureza política e social, testificados por Cooley e Willougby,

além dos lógico-formais e históricos.

A construction é um processo hermenêutico mais

amplo do que a interpretação propriamente dita. Esta é matéria do

Direito enquanto aquela tem conotações também políticas, já que

autorizada a invocar o auxílio de considerações extrínsecas ao

texto escrito. É o que nos ensina Carlos Maximiliano.1

Por isso, imprescindível para a confecção de articulado

com consistência em sua fundamentação, possibilitando, na parte

1 In “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, 10ª ed., RJ, Forense: 1988, p. 40.

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dispositiva, concluir com posição pessoal capaz de oferecer

efetividade na seara jurídica e também social, trazer coleta de

opinião pública, através de selecionado trabalho jornalístico, onde

o sistema punitivo é alvo de atenção cotidiana, a demonstrar que o

anseio social também é compartilhado por outros segmentos, no

intuito de resolver a quaestio em comento.

Trazemos, como condutor da nova safra de

proposições do sistema punitivo, as declarações do ex-ministro da

justiça, Nelson A. Jobim, intitulada “Penas Alternativas: Pontos

para Reflexão”1, verbis: “Uma das preocupações das sociedades

modernas tem sido a superlotação dos presídios e os conseqüentes

custos de construção de novos estabelecimentos e de conservação

e manutenção dos existentes. Paralelamente, levantam-se as

pertinentes questões: seria a restrição da liberdade a única forma

de punição para infratores? Ou a forma ideal?Pesquisa realizada

nos Estados Unidos, em outubro de 1991 pela The Public Agenda

Foundation, constatou que os habitantes do estado de Delaware,

consultados sobre a aplicação de penas alternativas, a princípio

manifestaram-se contra, preferindo a tradicional prisão para a

punição de delinqüentes.Entretanto, após serem informados sobre

os problemas de segurança, da superlotação carcerária, dos

custos da prisão e da possibilidade de uma série de sanções

intermediárias ou alternativas, repensaram seus pontos de vista e

posicionaram-se francamente a favor da aplicação de penas

alternativas. Interessante observar que essa mudança de atitude

não se deveu, em princípio, ao conhecimento do alto custo

prisional, mas sim à visualização de outras formas de punição,

aliada ao entendimento de que o encarceramento não cumpria seu

papel de reabilitar o criminoso. Concordaram que a prisão se

fazia necessária para os casos de crimes violentos ou

1 Em opinião veiculada no jornal “O Globo”, periódico do dia 03/04/96.

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considerados hediondos, mas em nada contribuía para melhorar o

comportamento dos condenados por delitos de menor monta.

Preferiram que estes fossem sentenciados a trabalho em prol da

comunidade. Evidentemente, o fator custo também foi importante

para o público, mas tornou-se secundário em vista da

possibilidade de aplicação de programas efetivos que punissem,

reabilitando. Diversos países vêm adotando cada vez mais o

sistema de penas alternativas. Na Inglaterra - como nos Estados

Unidos - aplica-se com freqüência a probation. Os britânicos a

utilizam para punir infratores, colocando-os sob supervisão de um

agente responsável por um período de seis meses a três anos.A

probation tem como objetivos reabilitar o infrator; proteger o

público dos danos causados por ele; evitar reincidência. Sua

eficácia é especialmente comprovada em casos de problemas que

envolvam alterações de comportamento, motivação,

relacionamento humano, abuso de álcool ou drogas, que possam

ter influenciado o cometimento do crime. O sistema implica na

crença de que o infrator só deve receber uma pena de prisão

quando o mesmo se constitui um risco concreto ao convívio social.

Além de comprovarem a eficácia da probation, os britânicos

também valorizam a grande economia para os cofres públicos que

ela representa. Observa-se lá uma concreta preocupação com a

questão custo/benefício da pena privativa de liberdade. Douglas

Hurd, Ministro da Justiça durante o Governo Thatcher, dizia que

a prisão é uma maneira muito cara de tornar as pessoas piores.

Diante das evidentes vantagens do sistema, e lembrando o

resultado da pesquisa realizada em Delaware, poder-se-ia

indagar: como reagiriam os brasileiros se questionados sobre as

punições impostas aos criminosos?Embora fosse desejável

estabelecer nossos próprios parâmetros, não há aqui o costume de

se efetuarem aferições como a que se fez em Delaware, tanto por

seus custos elevados, como até mesmo por falta de tradição de

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nossa parte. Todavia, pode-se observar que a sociedade em geral

não se mostra particularmente interessada pela questão

carcerária. As pessoas parecem se sensibilizar apenas quando

ocorre rebelião prolongada. Pesquisas de opinião demonstram

que os brasileiros acham que o crime está crescendo,

principalmente por causa das drogas, e que a maior parte dos

infratores, sobretudo os traficantes e criminosos violentos, devem

ficar atrás das grades. Mas concordariam com a construção de

novas prisões, se isso significasse aumento de impostos ou corte

nos serviços ou obras públicas? Como, então, desafogar nossas

prisões, abrindo vagas para outros criminosos mais perigosos que

vagueiam impunemente pelo país? Como punir o pequeno infrator

sem transformá-lo em um peso financeiro para a sociedade?

Como educá-lo, em vez de expô-lo ao risco de contaminação pela

convivência com os verdadeiros bandidos, que cumprem longas

penas e, de dentro das próprias penitenciárias, ainda se articulam

com o submundo do crime lá fora? Como transformar esse

indivíduo em elemento novamente produtivo e útil à sociedade?

Há meios, sim, de puni-lo sem encarcerá-lo. O Código Penal

Brasileiro, em seu artigo 46, prevê penas alternativas à reclusão

do infrator, obrigando-o à prestação de serviços gratuitos junto a

entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros

estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou

estatais. Caberia, aqui, questionar: por que tais sanções são

pouco aplicadas pela Justiça?Deixam os juízes de sentenciá-las

mais amiúde porque não há quem supervisione o seu efetivo

cumprimento - eis a razão. Depara-se a Justiça Criminal com

números cada vez maiores de criminosos para punir e - como em

tantos campos de atividade no Brasil - com recursos cada vez

mais escassos para administrar o problema. Acresça-se a isso

outra questão de igual importância: a da impunidade. Devido

ainda a um ranço reinol e a inegáveis falhas do sistema, a regra

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geral no país tem sido deixar soltos os poderosos e encarcerar os

desprotegidos. Não obstante nosso esforço para ampliação do

número de vagas no sistema penitenciário, elas não serão

suficientes para abrigar todos os criminosos. Tampouco é

intenção do Governo dotar-se de uma indústria de hotelaria

carcerária, indústria essa que é cara e cuja principal finalidade -

a da reabilitação dos criminosos - está longe de ser atendida.

Mais do que nunca, nesta quadra histórica, em que o mundo

inteiro se defronta com o crescimento da violência e da

criminalidade e a conseqüente questão da superlotação

carcerária, ganham relevo os benefícios da aplicação de penas

alternativas como prática rotineira nos tribunais. Se o crime tem

um preço, combatê-lo também tem seu preço. Se a sociedade quer

mais segurança, mais escolas, mais hospitais - e menos medo -

temos de atacar o problema com coragem e determinação e esta é

a base da ação do Governo. É preciso implantar políticas que,

desde o início, objetivem manter o indivíduo na sociedade,

procurando corrigí-lo, em vez de excluí-lo, alienando-o do

convívio social. É preciso, sobretudo, aplicar os recursos onde

saibamos que terão retorno para a sociedade. A conclusão a que

se chega consiste na necessidade da evolução rápida da

dogmática penal tradicional brasileira para novas definições

doutrinárias que permitam uma maior atenção a aspectos

criminológicos do problema, identificando as causas do crime e

evitando que o infrator nele reincida, sob pena de prosseguirmos

no curso da história com a triste constatação que hoje nos assola

- no campo penal, o cidadão através do Estado investe cada vez

mais na sua própria insegurança.”

A reformulação do sistema punitivo no Brasil,

conforme opinião das mais altas personalidades do ramo jurídico,

tem como ponto basilar a adoção de penas alternativas, pelo

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menos como medida a curto prazo capaz de amenizar o problema

carcerário. Também discute-se formas de reavaliação do pacto

federativo, principalmente pela migração do crime para o interior,

deixando de ser um problema localizado dos grandes centros

urbanos.

Pugnando por esta alternativa, o saudoso advogado

criminalista Antônio Evaristo de Moraes Filho1, afirmando que a

criação de penas alternativas é uma boa solução para a

superlotação dos presídios incubadeira de criminosos, como já

advertira Nelson Hungria há mais de 30 anos, assim se manifestou,

in litteris: “O principal objetivo da adoção das penas alternativas

é evitar que condenados cuja permanência em liberdade não

represente grave risco para o corpo social venham a ser

contaminados pelos perniciosos germes do contágio carcerário. A

redução da população prisional é tão-só um excelente subproduto

das penas alternativas, mas não traduz seu alvo básico. Em

verdade, nos últimos decênios os penalistas de todo o mundo, de

forma quase unânime, concluíram ser a pena de prisão um

instrumento que só deve ser utilizado nos casos extremos, quando

o sentenciado representar um efetivo perigo para a comunidade.

O elevado índice de reincidência entre os egressos de

penitenciárias indica que o encarceramento muitas vezes é um

fator contraproducente, a realimentar a criminalidade, acabando

por perverter o recluso primário. Recentemente no Rio de Janeiro

foi promovido pela professora Julita Lemgruber um encontro

entre especialistas norte-americanos, ingleses e brasileiros, tendo

todos eles observado que boa parcela dos infratores que se

encontram no cárcere poderia estar cumprindo suas penas em

liberdade. Exatamente por essa razão no Criminal Justice Act

promulgado em 1991 na Inglaterra, ficou estabelecido uma

1 Ponderações no artigo da “Folha de São Paulo”, periódico de 20/10/95.

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diretriz para os magistrados no sentido de que ‘ninguém deve ser

enviado para a prisão, a menos que o juiz considere a infração

cometida tão séria que apenas a privação da liberdade seja capaz

de proteger o público do dano que poderia ser causado pelo

infrator’. No Brasil deve-se também alargar o campo de

aplicação das penas alternativas, beneficiando sobretudo os réus

primários que respondem por delitos praticados sem o emprego

de violência real. Com isso não só diminuiria o problema da

superpopulação carcerária como a sociedade ficaria melhor

protegida e não estaria pagando impostos a serem gastos em

prisões, verdadeiras incubadeiras de criminosos...”

Aliás, as penas alternativas são uma tendência mundial

pelo consenso da imprestabilidade do efeito reclusivo da prisão,

como reprimenda aplicável a crimes de qualquer natureza e sem

levar em consideração a sua potencialidade para a sociedade, tendo

os efeitos deletérios do sistema prisional fomentado a reincidência,

inclusive de condenados recuperáveis que são contaminados, por

mais selecionados que sejam dentro do complexo carcerário, pelo

vírus maléfico caracterizadores da “Instituição Total”.

Em estudo científico, com adoção de dados estatísticos

comparativos, a ONU - Organização das Nações Unidas - indica

que a reincidência dos egressos das prisões gira em torno de 80%,

percentual que despenca para 25% nos casos de condenados que

foram agraciados com penas alternativas de qualquer espécie, a

demonstrar que são capazes de promover a recuperação social do

delinqüente e satisfazer a necessidade inafastável da condenação e

prevenção, ou seja, a manutenção do tripé suportador da pena,

retribuição - prevenção - ressocialização.

Por isso, o movimento de reforma do sistema punitivo

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concentra suas proposições na adoção imediata de penas

alternativas, demonstrando a absorção da sociedade civil da idéia

de que o Estado é mau administrador; não tendo condições

estruturais de solver as mais básicas de suas funções, tais como

segurança pública, educação, saúde. O plano nacional de

privatizações é reflexo direto dessa consciência governamental,

que tem apoio incondicional nos mais nobres seguimentos sociais.

Um exemplo fica constatado na publicação1 do

resultado do debate promovido pela “Folha de São Paulo”, no dia

3 de junho, onde se fizeram presentes o então Diretor do

Departamento Penitenciário Nacional e Presidente do Conselho

Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da

Justiça, Paulo Tonet Camargo, o então Secretário da

Administração Penitenciária, João Benedicto de Azevedo

Marques, o então Vereador Paulo Roberto Faria Lima (PPB) e o

ex-Secretário de Justiça do Estado de São Paulo José Carlos Dias.

Os especialistas consideraram fundamental a adoção

de penas alternativas, porque o sistema penitenciário já se mostrou

ineficaz quanto à ressocialização do preso.

Segundo o então Diretor do Departamento

Penitenciário Nacional, o Estado de São Paulo, por ter a maior

população prisional do país e idêntica carência de vagas no

sistema penitenciário, é o local onde as questões são mais agudas e

graves.

Afirma ainda que é necessário retirar os presos das

penas privativas e colocá-los em serviços comunitários, o que

reduziria o custo do sistema. A pena não ajuda o preso a se

1 Em 24/06/96.

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ressocializar, finaliza.

Para o ex-Secretário da Administração Penitenciária, a

construção de presídios não vai resolver o problema. Segundo ele,

a adoção de penas alternativas reduz a reincidência criminal.

Marques também defendeu conselhos na comunidade para

participar e fiscalizar o processo penal, no que pertine à execução

da reprimenda alternativa imposta.

Para o ex-Secretário José Carlos Dias, a prisão não

serve para transformar o preso em homem bom, adaptado à

sociedade.

O articulista Fábio Bittecourt da Rosa, então

Corregedor-geral da Justiça Federal da 4a. Região1, traz à colação

um dos importantes efeitos psicológicos para o condenado na

adoção das penas alternativas, em especial a prestação de serviços

comunitários ou similar, i.e., o contato direto do delinqüente com

problemas sociais de profundidade incontestável, os quais farão

desabrochar seu sentimento de utilidade para a sociedade na

qualidade de bem-feitor, sensibilizando-o para os percalços das

vidas de outrem, amenizando a introspecção ao seu mundo

violento e marginalizado, despertando-o para o fato de que se o

problema vivencial de sua vida é nefasto, de certo há piores.

É, não há dúvida, caso de repugnante consolo

utilizarmos como paradigma a desgraça alheia, porém confortador

para a psicologia humana, em especial à da mente criminosa que

traz sobre seus ombros a maldição de ser um enjeitado social.

Assim, vivenciando o despautério da existência de

1 “Jornal do Commércio”, de 14.06.96.

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pessoas solitárias, carentes, deficientes e de crianças órfãs e

abandonadas ou privadas da convivência familiar por ato abusivo

dos pais, a extensão de sua cosmovisão da realidade alargar-se-á e

inquestionavelmente, a reciprocidade dos laços emocionais entre a

sua pessoa e os seus assistidos farão aflorar sentimentos

adormecidos no seu ser por força de sua realidade delinqüente.

Com efeito, aparecendo como exemplo de viabilidade

e de sucesso, a cadeia pública da cidade de Bragança Paulista, no

Estado de São Paulo, trazido a público pela “Folha de São Paulo”

na matéria desenvolvida pelo repórter Kennedy Alencar, alhures

mencionada, é uma realidade, apesar de inexistir, por enquanto,

permissivo constitucional e legislativa ordinária acerca da relação

conveniada.

Também no Rio de Janeiro, por meio de ação conjunta

encabeçada pela titularidade judiciária da Vara de Execuções

Penais, a cargo, à época, do Juiz José Carlos Maldonado de

Carvalho, da Direção do DESIPE/RJ (Departamento do Sistema

Penitenciário) e outras instituições, os convênios refletem a

tendência microcentralizadora da eficiência das penas alternativas.

Por ocasião de seminário realizado e promovido pela AMAERJ

(Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro), em

outubro de 1996, foi apresentado pela Dra. Edna Del Pomo de

Araújo, da UFF (Universidade Federal Fluminense), os resultados

práticos dessa aliança.

Naquela data estavam em vigor 36 (trinta e seis)

convênios e mais uma dezena em confecção, objetivando colocar

em prática os desideratos do direito-dever de punir estatal, dirigido

aos 11.500 detentos em penitenciárias e aos 1.000 em xadrezes

policiais, já em prática a colocação de 1.500 presos laborando em

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empresas públicas e privadas, outros 1.000 cursando o supletivo e

outros 74 na condição de vestibulandos, retratando a nova política

implementada na persecução de soluções.

Como projeto pioneiro no Estado, de relevo o trabalho

desenvolvido por Regina Brasil quando à frente da Escola

Alternativa Edgar Costa, com prolação de aulas para detentos,

ministradas por alunos voluntários da UFF, através do “Projeto a

Universidade e a Educação no Sistema Penal”, aprovado em

20/09/93 pelo C.N.P.C.P., propiciando a remição por cursos

realizados (um dia por 12 horas de presença efetiva), dentre outros

benesses, acompanhados todavia de sanções, conforme

regulamento do Sistema Penal do Estado Rio de Janeiro, que

normatiza a promoção de atividade educacional e

profissionalizante, nos moldes da Lei de Execuções Penais.

As experiências sub oculis podem reforçar a sugestão

de alguns que seguem a esteira da popular privatização do sistema

carcerário, onde o Estado seria mero fiscalizador, deixando a cargo

de entidades privadas a gestão e a administração dos presídios e

das casas de detenção em geral, com a utilização da mão-de-obra

prisional para auferir um mínimo de numerário capaz de mantê-la,

propiciando o pagamento de contraprestação ao condenado, com

possibilidade de subvenção estatal do saldo remanescente

constante em tabela de custo-benefício, a ser desenvolvido em

processo licitatório.

Privatização não seria o instituto jurídico próprio, pois

ela se dá quando o poder público aliena direito acionário de

empresas vinculadas à administração pública indireta. Correto

seria afirmar que o referido serviço público de administração

penitenciária, na forma do art. 175 da CFRB, poderia ser

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delegado(delegação) por contrato de concessão ou permissão, já

que o Estado concentra o monopólio dessa atividade, mantendo,

em qualquer caso, a titularidade, permitindo, apenas, que a

execução se faça por particulares.

Isso não quer dizer que o Estado não possa terceirizar

os serviços de administração dos presídios, como algumas

experiências bem sucedidas acontecem no Brasil e no mundo.

Assim, privatizar é alienar, transferir a propriedade, o

crédito, a participação acionária. Delegar é apenas repassar a

particulares a execução de serviços públicos para a coletividade,

sob a fiscalização do poder público. Terceirizar é o contrato

firmado entre o poder público e o particular para prestar serviços

para o próprio Estado.

A idéia privatista, entretanto, traz ares de vindita,

valendo conferir opinião de Nilo Batista, extraído do discurso

proferido por ocasião da abertura do XV Congresso Internacional

de Direito Penal, consubstanciada na assertiva de que a

privatização do processo de execução penal não passa de

emblemático retorno às normas e práticas do direito penal do

escravismo, sendo dever declarar, aos brados, que uma pena que se

afaste demasiadamente do Estado começa a chamar-se de

vingança.1

Podemos acrescer que, em plena entrada do séc. XXI,

1 “Mas, objetam eles,-é preciso que a sociedade se vingue, que a sociedade puna.-Nem uma coisa nem

outra. A vingança cabe ao indivíduo, a punição a Deus. A sociedade está entre os dois. O castigo está acima dela, a vingança abaixo. Nada tão grande nem tão pequeno lhe convém. Não deve ‘punir para vingar-se;deve corrigir para melhorar’”.(Victor Hugo, ob. cit., p. 25). Nesse sentido, Cobo/Vives – “Derecho Penal-Parte Geral”, Tirant lo Blanch, Valencia, 1991,p. 616: “A pena representa, sem dúvida, a inflição de um mal, a privação de um direito, de um bem jurídico. Este mal, todavia, é inflingido ao autor apenas porque é necessário para prevenir delitos e não como vindicta, como retribuição de um mal por outro mal.”

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no Brasil, cidadãos livres e no gozo de seus direitos

constitucionais são mantidos na condição análoga àquela imposta

ao escravo de outrora em diversos latifúndios no interior do país e

não há fiscalização, prevenção ou reprimenda do Poder Estatal,

impotente por suas deficiências que, de certo se repetiriam à

privatização carcerária.

Mesmo assim, nomes de peso a defendem. É o caso do

Dr. Luiz Flávio Borges D’Urso, professor de Direito Penal, então

Presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas

(ABRAC), do Conselho Estadual de Política Criminal e

Penitenciária de são Paulo, da Academia Brasileira de Direito

Criminal (ABDCRIM) e Membro do Conselho Nacional de

Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça

(CNPC/MJ), que lança sua tese1, cujo peso dos títulos e da

corrolária experiência merece atenção, verbis: “A prisão

historicamente faliu. Sua história é exatamente a sua crescente

abolição, pois a humanidade aprendeu a conviver com a pena

privativa de liberdade e conheceu sua amarga realidade. Todavia

há enorme esforço mundial, em reduzir sua aplicação,

substituindo-a por alternativas que possam representar a resposta

penal para aquele que delinqüiu, sem contudo remetê-lo ao

cárcere. Nesse contexto é que surge a proposta da chamada

privatização dos presídios, denominação inadequada, pois não se

trata de vender ações do Carandiru em bolsa, mas tão-somente

chamar e admitir a participação da sociedade, da iniciativa

privada, que viria colaborar com o Estado nessa importante e

arriscada função, a de gerir nossas unidades prisionais. Quanto à

constitucionalidade da proposta, partimos da premissa de que a

Lei Maior foi clara e o que ela não proibiu, permitiu. E mais, na

verdade não se está transferindo a função jurisdicional do Estado

1 Artigo constante na “Revista Literária de Direito”, ano II, nº. 8, nov/dez 95.

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para o empreendedor privado, que cuidará exclusivamente da

função material da execução penal, ou seja, o administrador

particular será responsável pela comida, pela limpeza, pelas

roupas, pela chamada hotelaria, enfim, por serviços que são

indispensáveis num presídio. Já a função jurisdicional,

inalienável, permanece nas mãos do Estado que, por meio o seu

órgão juiz, determinará quando um homem poderá ser preso,

quanto tempo assim ficará, quando e como ocorrerá punição e

quando o homem poderá sair da cadeia, numa preservação do

poder de império do Estado, que é o único titular legitimado para

o uso da força, dentro da observância da lei.”

Suas palavras esclarecem que a utilização do termo

“privatização” se presta apenas para dar relevo à idéia, mas sua

tese é de terceirização, como já explicado.

Outro movimento nasceu dessa realidade caótica,

denominado federalização de presídios, quarenta e cinco

entidades da sociedade civil de São Paulo, dentre elas a Comissão

de Justiça e Paz (da Arquidiocese de São Paulo), a Comissão de

Direitos Humanos da O.A.B./S.P., Comissão Teotônio Vilela e a

Associação de Juízes para a Democracia, lançaram documento, no

dia 21 de agosto de 1996, contra a violência, com onze propostas

concretas, entre elas a criação de presídios federais para abrigarem

os condenados praticantes de crimes hediondos, assim definidos

em lei.

Arrimam a proposta com o argumento de que, embora

o governo federal seja o responsável por estabelecer a política

penitenciária, não tem participação efetica em sua execução, ao

contrário do que ocorrem nos Estados Unidos. Naquele país, os

condenados por crimes violentos, como o sequestro, por exemplo,

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ficam recolhidos em presídios de segurança máxima de

responsabilidade do governo central.

O documento defende a criação de uma Secretaria

Nacional de Segurança Pública, ligada diretamente à Presidência

da República e direcionada por um civil, para a elabor e

supervisionar uma política nacional de segurança pública. As duas

propostas foram acatadas e colacadas, pelo menos parcialmente,

em prática pelo governo do Presidente Lula e pelo Ministro da

Justiça Márcio Thomas Bastos, com a implantação do Fundo

Nacional de Segurança Pública(FNSP) e o Fundo Penitenciário

Nacional(FUNPEN), com a construção de presídios federais nos

estados do Paraná e Mato Grosso do Sul, sem prejuízo da previsão

de outros, conforme regulamento do Decreto nº 6.049, de 27 de

fevereiro de 2007 e a Resolução nº 502, de 09 de maio de 2006,

revogada pela Resolução nº 557, de 08 de maio de 2007, do

Conselho da Justiça Federal(www.justiçafederal.gov.br).

As entidades coordenadoras são favoráveis à adoção

de penas alternativas para os crimes não-violentos, como forma de

reduzir a superlotação e o número de presídios e de delegacias,

complexos de grande e de pequeno porte que, instalados no meio

do perímetro urbano, são verdadeiros centros de preocupação

diária, pelas rebeliões e fugas.

Em suma, é evidente que todas as propostas vindicadas

têm a valoração pessoal de todos os proponentes, na medida de

suas vastas experiências nos ramos da política jurídica e

penitenciária, razão pela qual merecem créditos e reflexão.

O Brasil não pode ficar na pré-história da ciência

punitiva, sem se integrar no desenvolvimento que se opera no

mundo ocidental.

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Pior, entendemos que estremecerá o próprio ius

puniendi que fará a sociedade retornar ao estado perigoso da

beligerância recíproca, afastado desde remotas eras pelo consenso

do contexto social, cujas cotas de liberdade individual

integralizadas deram vida à soberania estatal.

A tradição brasileira impinge em afirmar que não há

um esforço preventivo em salvar as instituições, mas já quando

irreversivelmente caóticas, são lançadas medidas paleativas e

emergenciais de consertos pincelados através de leis consertadoras

de outras que precisam de outras subseqüentes para consertá-las.

Acresça-se que, nas referidas situações, as instituições

governamentais interagem de forma hipocritamente entorpecida,

pois, cientes de suas deficiências, recuam, no momento, de investir

nas atividades das demais, deixando o próprio organismo criar

soluções ao arrepio da legalidade.

De efeito, é certo que pretendemos regar sementes

plantadas pelas propostas veiculadas durante todo o desenvolver

do escrito, como mero esboço de uma reformulação institucional

da pena e do processo penal, a ser implantada no país, que

mereceria, com certeza, muito desenvolvimento para a

viabilização jurídica e prática da tentativa de solucionar e vencer a

luta digladiada com esse grande câncer social: a insegurança

pública.

Nem a pena de morte e nem a redução da maioridade

penal são instrumentos hábeis para que a sociedade brasileira

alcance algo próximo à paz social. Criminalidade é diferente de

violência. O Estado adotando as duas penas, ou uma delas, estraá

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combatendo, em tese, com a violência com a própria violência e

não a criminalidade que deve ser gerenciada pela instituição

segurança pública inteligente, apta, qualificada e mobilizada para

o enfrentamento em várias frentes de programas e por dinâmicas e

complexas políticas públicas interdependentes, como educação,

saúde, plano diretor etc.

Somos contra.

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FIM

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E OBRAS

CONSULTADAS COMO FONTES PRIMÁRIAS E

SECUNDÁRIAS.

1 - Jornal “O Globo”.

2 - Jornal “O Estado de S. Paulo”.

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ÍNDICE GERAL

Siglas Utilizadas -

Nota do Autor -

Capítulo I - Notas Preliminares -

Considerações sobre a pena. As doutrinas. A natureza da

pena. A pena moral e a pena criminal. As penas e as

medidas de segurança. A falência do sistema punitivo. -

Capítulo II - As Penas e os Sistemas Penitenciários -

A pena: justificação e conceito. A pena: retribuição,

prevenção e ressocialização. As penas históricas.

Capítulo III - A Pena de Morte -

Considerações. Motivações. A pena de morte e sua visão

constitucional. A expiação capital na história brasileira.-

Capítulo IV - O Sistema Punitivo Nacional -

As penas: classificações. As espécies de penas no sistema

punitivo brasileiro. As modalidades das penas. Os regimes.

Características das penas nacionais. O sistema punitivo:

uma visão. Os sistemas penitenciários. -

Capítulo V - A Redução da Maioridade Penal e Outras

Tendências Sobre o Sistema Punitivo -

Intróito. A segurança pública. A rigidez do sistema. A

redução da idade penal. As tendências para a adoção de

penas alternativas. O custo prisional. As opiniões dos

juristas e da sociedade civil. -