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A HISTRIA NO LIVRO DIDTICO DE MATEMTICA
Lidiane Schimitz Lopes1
Antnio Maurcio Medeiros Alves2
Histria da Matemtica, histria da educao matemtica e cultura
Resumo: Esse trabalho apresenta a anlise do livro didtico de
Matemtica volume nico de Luiz Roberto Dante quanto abordagem da
Histria da Matemtica em seus captulos. O texto aborda inicialmente
alguns
aspectos sobre livros didticos e Histria da Matemtica, a fim de
salientar a importncia da fundamentao
histrica dos saberes matemticos em sala de aula, tornando essa
cincia mais humana e prxima dos alunos.
Atravs da anlise do livro didtico utilizado na maior escola
pblica de Ensino Mdio em Bag-RS, o objetivo
dessa pesquisa bibliogrfica verificar como a Histria da
Matemtica abordada ao longo dos captulos dessa
obra.
Palavras Chaves: Histria da Matemtica. Livro didtico.
Matemtica.
Introduo
O presente artigo surgiu do interesse em analisar a forma como a
Histria da
Matemtica abordada em livros didticos, pois conhecer a origem do
saber matemtico um
recurso para tornar a aprendizagem mais significativa.
Entende-se que os saberes matemticos no surgiram sistematizados,
como algoritmos
prontos que podem ser aplicados em situaes com ou sem
significado real, mas so
construes humanas originadas da necessidade de resolver uma
situao concreta. Assim,
acredito que o desenvolvimento desses conhecimentos ao longo do
tempo pode facilitar sua
compreenso e significao dentro do espao escolar.
Na atualidade h disponvel uma vasta literatura mostrando os
saberes matemticos
so construes humanas elaboradas ao longo de muito tempo.
1 Licenciada em Matemtica pela Universidade Federal do Pampa
(2010). Especialista em Estudos Matemticos
nfase em Educao Matemtica pela Universidade Federal de Pelotas
(2012). Acadmica do Programa de Ps-graduao em Ensino de Cincias e
Matemtica Mestrado Profissional na Universidade Federal de Pelotas.
Universidade Federal de Pelotas. [email protected]
2 Licenciado em Matemtica pela Universidade Catlica de Pelotas
(1996). Especialista em Educao
Matemtica pela Universidade Catlica de Pelotas (1997). Mestre em
Educao pela Universidade Federal de
Pelotas (2005). Doutorando do Curso de Ps-graduao em Educao pela
Universidade Federal de Pelotas.
Universidade Federal de Pelotas.
[email protected]
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Porm, com o passar dos anos e aps algumas transformaes, esses
conhecimentos
ensinados na escola perdem seu contexto e funcionalidade,
conforme DAmbrsio (2007,
p.29), a maior parte dos programas consiste de coisas acabadas,
mortas e absolutamente fora
do contexto moderno. Desta maneira, os alunos pensam que os
assuntos tratados em sala de
aula surgiram de pessoas que, segundo eles, no tinham outra
coisa para fazer o que torna
cada vez mais difcil motivar os alunos para uma cincia
cristalizada. No sem razo que a
histria vem aparecendo como um elemento motivador de grande
importncia
(DAMBRSIO, 2007, p.29).
Percebe-se assim que a Histria da Matemtica tem contribudo com a
superao dessa
condio, pois se o professor expe as origens de constituio de
saberes, o aluno tende a
perceber a Matemtica como criao humana, uma cincia prxima a ele.
Entende, tambm,
que alguns conhecimentos podem ser aplicados em seu cotidiano,
por exemplo, resolvendo
problemas similares aos de antigamente.
Como metodologia de ensino, a Histria da Matemtica pode tornar
as aulas mais
dinmicas e interessantes. Ao perceber a fundamentao histrica da
Matemtica, o professor
mostra o porqu de estudar determinados contedos e permite a
construo de um olhar
crtico sobre o assunto em questo, proporcionando reflexes acerca
das relaes entre a
histria e a matemtica.
Nessa perspectiva, esse estudo documental tem por objetivo
analisar a presena da
Histria da Matemtica no livro didtico Matemtica de Luiz Roberto
Dante, volume nico
publicado em 2009 pela Editora tica. Busca-se entender se o
livro didtico em questo d
apoio para os alunos compreenderem a Matemtica como criao
humana, sua evoluo e
relaes com outros saberes de outras reas de conhecimento.
O livro didtico
Definir Livro Didtico aparentemente simples: trata-se dos
materiais textuais
adquiridos, normalmente, no incio do ano letivo e utilizados
como no trabalho escolar.
Muitos desses livros so acompanhados de materiais de apoio como
cadernos de atividades,
CD-Rooms, solucionrios e folhetos destinados aos professores.
Nesse aspecto, Batista e
Galvo (2009, p.43) ressaltam que (...) um fator parece criar uma
homogeneidade para os
textos escolares: trata-se sempre, a um primeiro exame, de
material impresso, empregado para
o desenvolvimento de processos de ensino e de formao.
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Segundo Ossenbach e Somoza apud Bianchi (2006), h muitas
denominaes para os
livros escolares. No entanto, a mais utilizada atualmente na
Educao Bsica, no Brasil,
livro didtico. Funcionando como verdadeiros manuais, os livros
didticos orientam tambm
o planejamento e a prtica do professor, embora venha se
difundido, segundo Batista e Galvo
(2009):
Um forte discurso contrrio utilizao de livros didticos, [sendo
essa] vista como
um dos principais fatores responsveis pela desqualificao
profissional de
professores: os livros didticos criaram uma dissociao entre
aqueles que executam
o trabalho pedaggico os docentes e aqueles que os concebem,
planejam e estabelecem suas finalidades os autores de livros
didticos e as grandes editoras. (p.44)
Batista e Galvo (2009) classificam a produo didtica brasileira
ao longo do tempo
em quatro categorias:
i. Os manuais e seus satlites: so obras que funcionam como
suporte para o trabalho
em sala de aula. Em geral destinadas a uma disciplina em um nvel
especfico,
esses materiais se referem a um programa preciso, cuja progresso
significa
vencer todos os contedos necessrios para avanar ao nvel
seguinte. Os
satlites so objetos de apoio que gravitam em volta do livro
didtico (manual do
professor, cadernos de exerccios...). O livro selecionado como
objeto de estudo
da pesquisa pertence a essa categoria.
ii. As edies clssicas: edies de obras latinas, gregas,
estrangeiras ou em lngua
materna, escolhidas pelos professores de acordo com as aptides
de seus alunos e
seu prprio gosto.
iii. As obras de referncia: obras que podem ser utilizadas em
sala de aula ou em casa
e no se limitam a uma srie, mas sua utilizao se estende por um
ciclo ou grau
de ensino, como dicionrios e atlas.
iv. As obras paradidticas: auxiliares facultativos da
aprendizagem, cuja funo
resumir, aprofundar ou intensificar o contedo transmitido pela
escola.
A fim de garantir uma educao de qualidade, o Fundo Nacional de
Educao
(FNDE), segundo o Ministrio da Educao (MEC), financia e executa
aes na rea
educacional. Incluem-se no Programa do Livro de Didtico, mantido
pelo FNDE, o Programa
Nacional do Livro Didtico (PNLD), o Programa Nacional do Livro
para o Ensino Mdio
(PNLEM) e o Programa Nacional do Livro Didtico para a
Alfabetizao de Jovens e Adultos
(PNLA).
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Conforme Oliveira (2009), em 2004, iniciou-se o Programa
Nacional do Livro para o
Ensino Mdio visando universalizao de livros. Para serem
utilizados em 2007, foram
adquiridos 7,2 milhes de volumes distribudos a 6,9 milhes de
educandos. Nos livros
destinados s disciplinas de Matemtica, Lngua Portuguesa,
Biologia, Histria, Geografia,
Fsica, Qumica, Lngua Espanhola/Lngua Inglesa, Sociologia e
Filosofia, para o ano de
2009, foram investidos cerca de R$ 221 milhes.
Tanto pelo volume de recursos destinados distribuio de livros
didticos quanto
pela sua relevncia no contexto escolar, justifica-se a elaborao
de trabalhos que analisem
esses materiais.
A Histria da Matemtica
Assim como o homem, a Matemtica no se desenvolveu sozinha e
isolada ao longo
do tempo, estando sua constituio intimamente ligada cultura.
Mostrar as relaes entre a
Matemtica e o desenvolvimento social e econmico um caminho para
obter-se um pano de
fundo que facilite a compreenso dos conhecimentos matemticos do
passado e do presente.
Ao conhecer a Histria da Matemtica, o aluno a percebe como criao
humana, passvel de
erros e construda a partir de muitas tentativas em solucionar
problemas cotidianos. Nesse
sentido, Ferreira apud Santos (2009, p. 20) diz que a Histria da
Matemtica:
d a este aluno a noo exata dessa cincia, como uma cincia em
construo, com
erros e acertos e sem verdades universais. Contrariando a ideia
positivista de uma
cincia universal e com verdades absolutas, a Histria da
Matemtica tem este
grande valor de poder tambm contextualizar este saber, mostrar
que seus conceitos
so frutos de uma poca histrica, dentro de um contexto social e
poltico.
Tambm Miguel e Miorim (2004) destacam a importncia da histria da
Matemtica
como um estmulo a no-alienao do seu ensino. Para eles a forma
lgica e emplumada
atravs da qual o contedo matemtico normalmente exposto ao aluno,
no reflete o modo
como esse conhecimento foi historicamente produzido (p.52).
Um equvoco frequente ocorre ao utilizar-se a Histria da
Matemtica apenas como
ilustrao, presa a fatos isolados, nomes famosos e datas. Neste
aspecto, Vianna (1995)
discorda da didtica de abordar a origem de conhecimentos
matemticos como descobertas do
indivduo A ou B, pois so histrias fantasiosas que acabam
salientando que o saber
matemtico est destinado a poucos escolhidos.
Como recurso em sala de aula, os Parmetros Curriculares
Nacionais (BRASIL, 1997)
afirmam que a Histria da Matemtica contribui para a construo de
um olhar mais crtico
aos objetos de conhecimento. Mostrar a Matemtica como criao
humana auxilia na
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desmitificao dessa cincia, desenvolvendo atitudes e valores mais
favorveis do aluno
frente aos saberes matemticos.
Outro fator positivo acerca da abordagem histrica dos contedos
matemticos,
segundo Silva e Ferreira (2011), permitir ao docente a previso
dos possveis erros dos
alunos. Assim, estratgias e questionamentos podem ser preparados
antecipadamente pelo
professor, promovendo sua postura como mediador entre o saber e
o aluno.
Apesar das vantagens que a Histria da Matemtica como metodologia
de ensino traz
s aulas de Matemtica, deve-se evitar uma viso ingnua acerca de
sua aplicao. Nesse
sentido, Silva e Ferreira (2011) destacam que a Histria da
Matemtica sozinha, sem o
auxlio de outros recursos didticos, no suficiente para resolver
todos os problemas
pedaggicos que permeiam uma sala de aula (p. 1-2).
Procedimentos metodolgicos
Por se tratar de um processo investigativo onde o objeto de
anlise um livro didtico,
essa pesquisa classificada, segundo Fiorentini e Lorenzato
(2007), como pesquisa
bibliogrfica. Para esses autores, essa pesquisa:
aquela que se faz preferencialmente sobre documentao escrita.
(...) Esse tipo de
pesquisa tambm chamado de estudo documental. Os documentos para
estudo
apresentam-se estveis no tempo e ricos como fonte de informao,
pois incluem:
filmes, fotografias, livros, propostas curriculares, provas
(testes), cadernos de
alunos, autobiografias, revistas, jornais, pareceres, programas
de TV, listas de
contedos de ensino, planejamentos, dissertaes ou teses
acadmicas, dirios
pessoais, dirios de classe, entre outros documentos. (p.
102-103)
Buscando responder s questes sobre a abordagem da Histria da
Matemtica em um
livro didtico optou-se pelo estudo de um livro indicado no
PNLEM, utilizado no perodo
2009-2011, na maior escola estadual de Ensino Mdio no municpio
de Bag, Rio Grande do
Sul: Matemtica Volume nico de Luiz Roberto Dante, 1 edio, So
Paulo, Editora
tica, 2009.
Definida a metodologia empregada na seleo e anlise das fontes,
necessrio
delinear o tema e o problema da pesquisa, bem como seu
objetivo:
Tema da pesquisa: A presena da Histria da Matemtica no Livro
Didtico
Matemtica de Luiz Roberto Dante.
Problema de pesquisa: A Histria da Matemtica no livro didtico
estudado
apresenta-se como introduo, fundamentao ou leitura
complementar?
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Objetivo da pesquisa: Analisar a forma de apresentao da Histria
da Matemtica
no Livro Didtico Matemtica de Luiz Roberto Dante.
Para efeitos de anlise, sero realizadas trs leituras deste
material, de acordo com a
proposta de Silva e Menezes (2001).
1. Leitura de reconhecimento anlise textual: Com o objetivo de
localizar a
presena da Histria da Matemtica no livro, ser realizada uma
leitura de
reconhecimento. Destacaremos qualquer nota ou texto histrico
referente ao
contedo de cada captulo.
2. Leitura de reflexo anlise temtica: Para reconhecermos a forma
de abordagem
da Histria da Matemtica nos textos encontrados no material
realizaremos uma
leitura reflexiva guiada pelo problema de pesquisa.
3. Leitura interpretativa anlise interpretativa: Realizada com a
finalidade de
responder aos questionamentos levantados acerca da Histria da
Matemtica
presente nesse livro didtico. Buscaremos a argumentao histrica
apresentada
pelo autor, bem como a profundidade no tema em cada texto.
A anlise do material
O livro Matemtica com 504 pginas traz seus assuntos de maneira
que se
complementam, evidenciando uma qualidade do material. composto
por trinta e cinco
captulos organizados em oito unidades: lgebra I, Geometria
Plana, Trigonometria, lgebra
II, Estatstica e Matemtica Financeira, Geometria Espacial: de
posio e mtrica, Geometria
Analtica e lgebra III. Apresenta ao final do livro as respostas
dos exerccios.
Analisando as diferentes unidades, percebemos que nem todos os
captulos reportam
histria dos contedos, sendo essa citada em algumas situaes.
Entretanto, alm de citar a
Histria da Matemtica em alguns assuntos, o livro traz
curiosidades e aplicaes do tema
abordado em outras reas, uma contextualizao que aproxima a
Matemtica do mundo
real, relacionada ao cotidiano.
No geral, os textos que apresentam a Histria da Matemtica o
fazem ao final do
captulo, na categoria denominada Leitura(s). Nas trs vezes em
que a referncia Histria
da Matemtica est ao longo do captulo, o texto histrico aparece
destacado em caixas
sombreadas, antes da lista de exerccios. No livro analisado a
Histria da Matemtica aparece
em quinze textos de onze captulos.
Nos dois textos histricos apresentados na unidade lgebra I,
encontramos a relao
dos logaritmos com a Astronomia e a Navegao no sculo XVII. O
outro texto desta mesma
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unidade ressalta o quanto os logaritmos e a funo logartmica
facilitaram a vida de
matemticos e astrnomos, tanto no sculo XVII quanto atualmente.
As notas histricas
ressalvam tambm que, embora alguns conhecimentos matemticos
tenham surgido para
solucionar um determinado problema, suas contribuies so
percebidas nas mais diferentes
reas.
Percebemos que, ao fazer referncia tbua de logaritmos como
inveno de um
grupo de estudiosos, o autor apresenta o conhecimento matemtico
como descoberta de
poucos escolhidos. Sabemos que os matemticos valeram-se das
construes de estudiosos
que os precederam. Essa apropriao dos saberes conhecidos no
citada nesse texto
histrico, tornando-o uma ilustrao do contedo estudado.
Figura 1 Texto histrico da unidade lgebra I
Fonte: livro analisado (p. 133)
Na segunda unidade do livro (Geometria Plana) h duas notas
histricas. A primeira
est destacada em uma caixa sombreada, durante o captulo e faz
referncia obra Os
Elementos. Neste texto, o matemtico aparece como organizador dos
conhecimentos
geomtricos construdos at sua poca.
Figura 2 Texto histrico da unidade Geometria Plana
Fonte: livro analisado (p. 157)
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Esse texto deixa transparecer que, ao contrrio das duas notas
histricas anteriores,
Euclides organizou sistematicamente os conhecimentos de
Geometria construdos at sua
poca. Mesmo sendo conhecida como Geometria Euclidiana, essa
forma de apresentao da
Histria da Matemtica deixa claro que os saberes da obra Os
Elementos no so suas
invenes.
O segundo texto histrico dessa unidade, alocado na categoria
Leitura, faz referncia
linha do tempo da Geometria Euclidiana. A partir dos gregos,
passando pelo Renascimento
at os dias atuais, esse texto mostra os saberes geomtricos como
construes de povos
antigos, aperfeioados por matemticos renomados.
Essa nota histrica traz a contribuio da geometria na Astronomia,
pela curiosidade
em entender o universo que motivou esses estudos. O texto
salienta que os saberes
geomtricos estudados na escola so os mesmos que serviram de
alicerce para os estudiosos
do passado. Notamos esse texto, apresentado como leitura
complementar, como uma fonte
histrica para ilustrar o assunto abordado.
Outro ponto positivo apresentado nesta nota a referncia aos
contedos escolares
como base dos estudos de matemticos do passado. Assim, o aluno
percebe a presena da
Matemtica da sala de aula em seu cotidiano.
Figura 3 Imagens ilustrando o texto histrico da unidade
Geometria Plana
Fonte: livro analisado (p. 163)
Ao final da unidade trs (Trigonometria), dois textos ilustram o
contedo. Fazendo
referncia origem da Trigonometria, as notas destacam alguns
equvocos cometidos na
Histria, como a traduo da palavra seno do rabe para o latim.
Sinus a traduo latina da
palavra rabe jaib, que significa dobra, bolso ou prega de uma
vestimenta. A palavra rabe
adequada, que deveria ter sido traduzida, seria jiba, que
significa corda de um arco.
Quando apresenta algum equvoco cometido ao longo do tempo, o
professor estimula
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o senso crtico dos alunos mostrando que verdades ditas podem ser
questionadas. Essa
abordagem humaniza a Matemtica, passvel de erros.
Na categoria Leitura do captulo Determinantes (lgebra II), h um
texto histrico
sob o ttulo Matemticos que contriburam para a teoria dos
determinantes. Essa nota busca
esclarecer os nomes famosos apresentados na unidade: Sarrus,
Binet, Jacobi, Laplace e
Lagrange.
O objetivo desse texto esclarecer a pessoa por trs do saber
matemtico. Porm
essa postura contribui para a propagao de que a Matemtica uma
cincia para poucos
escolhidos.
Figura 4 Imagens ilustrando o texto histrico da unidade lgebra
II
Fonte: livro analisado (p. 265)
Ainda na unidade lgebra II, ao final do captulo Anlise
Combinatria, h referncia
ao Tringulo de Pascal. Segundo essa nota, o tringulo aritmtico
foi encontrado em estudos
datados de pocas anteriores a Cristo. No entanto, o matemtico
Blaise Pascal viveu no sculo
XVII. Assim, o aluno percebe que o nome famoso no contedo
estudado o de quem
sistematizou e formalizou o saber. E vale ressaltar que no fez
isso sozinho, mas a partir dos
conhecimentos construdos at sua poca.
O ltimo texto encontrado na unidade lgebra II apresenta a relao
entre o estudo de
probabilidades e os jogos de azar, com referncia a outros
matemticos que contriburam para
o desenvolvimento dessa rea. Tal linha do tempo ilustra que o
conhecimento matemtico
nessa rea desenvolveu-se com a contribuio de muitos
estudiosos.
O livro analisado no apresenta menes Histria da Matemtica nos
captulos da
unidade cinco Estatstica e Matemtica Financeira.
H trs notas histricas na unidade seis (Geometria Espacial). A
primeira encontra-se
ao final do captulo 28 Geometria Espacial de Posio: Uma introduo
intuitiva. Esse texto
apresenta a importncia da obra de Euclides na Geometria. Ao
final, o texto faz referncia a
matemticos que desenvolveram outras teorias, posteriormente
conhecidas como geometrias
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no-euclidianas. Essa nota mostra ao aluno que a Matemtica
permanece mutvel passvel de
outras teorias.
Figura 5 Texto histrico da unidade Geometria Espacial
Fonte: livro analisado (p. 359)
Ainda na unidade seis, ao longo do captulo 29 (Poliedros), h uma
nota
histrica destacada do texto em caixa sombreada esclarecendo quem
foi o
matemtico Bonaventura Francesco Cavalieri e o quanto seu
trabalho sofreu
duras crticas at se tornar a base do clculo integral a partir do
sculo XVII.
Figura 6 Texto histrico da unidade Geometria Espacial
Fonte: livro analisado (p. 359)
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Finalizando a unidade seis, o texto Plato e seus poliedros est
alocado na categoria
Leituras do captulo 29. Essa nota histrica conta a associao
feita pelo matemtico entre os
poliedros conhecidos e os elementos que compem o planeta: terra
estava associado o cubo;
ao fogo, o tetraedro; ao ar, o octaedro; e gua, o icosaedro.
Figura 7 Imagem ilustrando o texto histrico da unidade Geometria
Espacial
Fonte: livro analisado (p. 381)
Na unidade sete (Geometria Analtica), o texto histrico
contextualiza o contedo
estudado atravs das aplicaes das Leis de Kepler, apresentando,
tambm, sua biografia. Um
dos objetivos dessa nota apresentar a relao entre a Matemtica e
as outras cincias. Esse
texto aparece destacado do contedo abordado no captulo 33
(Geometria analtica: seces
cnicas) em uma caixa sombreada.
Na unidade oito (lgebra III) h duas notas histricas: uma
referente aos Nmeros
Complexos e outra referente s Equaes Algbricas. Nesses dois
textos percebemos uma
linha do tempo, demarcada pelos matemticos que contriburam
efetivamente para o
desenvolvimento destes saberes. Nessa forma de apresentao, a
Histria da Matemtica
aparece vinculada a nomes ilustres.
Resumindo a anlise, as notas histricas que encontramos no texto
podem ser
classificadas da seguinte maneira:
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Categoria Quantidade Localizao (pgina)
Introduo
0 0
Fundamentao
0 0
Leitura Complementar
(Ao longo do captulo)
3 157; 371; 426
Leitura Complementar
(Ao final do captulo)
12 133; 163; 201; 265; 298; 314;
359; 381; 443; 455
Tabela 1 Resumo sobre a presena da Histria da Matemtica no livro
analisado.
O primeiro fator que percebemos ao analisarmos o livro didtico a
presena
exclusiva de matemticos homens. Nesse ponto levantamos um
questionamento: no houve
estudiosas nessa rea ou elas no puderam registrar suas construes
em funo da cultura
dominante masculina?
Ao apresentar a Matemtica como construo de homens sem influncias
femininas, o
livro didtico materializa o currculo proposto pela classe
dominante de maneira implcita.
Nesse sentido, Silva (2011) nos diz que o currculo oculto
constitudo por todos aqueles
aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currculo
oficial, explcito, contribuem,
de forma implcita, para aprendizagens sociais relevantes (p.
78). Mostrando a Matemtica
como cincia masculina, o livro didtico contribui para a
fortificao da dicotomia entre os
sexos, pois mulheres se saem melhor em reas humanas, enquanto
que os homens se dedicam
s reas exatas.
Algumas consideraes
Vale ressaltar que no objetivo desse trabalho verificar a
validade das menes
Histria da Matemtica encontradas no livro analisado. Mas sim
analisar a forma como o
material em questo apresenta essas notas histricas.
Quanto distribuio das notas histricas no livro didtico,
percebemos que
encontram-se sempre destacadas, como leitura complementar,
faltando articulao com o
contedo em pauta. Em nenhum captulo so utilizados como
fundamento do contedo ou
como motivo de se estudar tal saber.
O fato do livro Matemtica no relacionar o saber matemtico com a
histria de sua
origem, mostra-o como algo morto, pronto e acabado. Aos alunos,
resta aprender/decorar o
que apresentado em sala de aula, pois o que se havia para
descobrir, j foi encontrado.
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Essa ideia de que tudo est pronto e surgiu da maneira que
conhecemos, no mnimo,
reduz e empobrece a Matemtica, pois descarta a sua utilidade no
passado e, at mesmo,
atualmente.
Conhecer a histria do contedo que se est ensinando tambm uma
forma de prever
erros e entender as dificuldades dos alunos. Por exemplo, se a
humanidade levou sculos para
construir o zero, como os alunos compreendero em uma aula?
Embora no seja fundamentao do contedo apresentado, as menes a
Histria da
Matemtica encontradas no livro didtico serviram para mostrar que
os conhecimentos
matemticos no foram descobertos ao acaso por uma pessoa
iluminada. A Matemtica foi
construda no decorrer do tempo, entrelaada aos conhecimentos e
necessidades da sociedade
em cada poca.
Ao percebermos a Matemtica como parte integral de uma herana
cultural
diversificada, entendemos a importncia de um estudo que analise
a forma como a Histria da
Matemtica est presente em livros didticos. Todavia, esse estudo
no se encerra em si
mesmo, propondo maiores discusses e sugestes quanto ao uso da
histria dos contedos
matemticos como metodologia de ensino.
Enfim, cabe ao professor recorrer Histria da Matemtica em suas
aulas da forma
que julgar mais apropriada.
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