1 UNIFOZ - FACULDADES UNIFICADAS DE FOZ DO IGUAÇU CURSO DE DIREITO TURMA: 10 DN A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM CRIMES TRIBUTÁRIOS MARCOS ANDRADE FOZ DO IGUAÇU 2007
1
UNIFOZ - FACULDADES UNIFICADAS DE FOZ DO IGUAÇU
CURSO DE DIREITO
TURMA: 10 DN
A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM CRIMES TRIBUTÁRIOS
MARCOS ANDRADE
FOZ DO IGUAÇU 2007
2
MARCOS ANDRADE
A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM CRIMES TRIBUTÁRIOS
Monografia de conclusão de Curso como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito das Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu, sob a orientação da Professora Maria Jacira Pereira.
FOZ DO IGUAÇU 2007
3
A Deus pela vida.
Á minha mãe Ilsi pela dedicação.
Ao meu pai David, pelo incentivo.
4
À minha noiva Lidiane, pelo apoio.
AGRADECIMENTOS
À UNIFOZ – Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu.
À minha orientadora Professora Maria Jacira, pela oportunidade de
desenvolver a monografia. Seu conhecimento, atenção e esforço foram primordiais
na elaboração deste trabalho.
Aos colegas de turma do curso de Direito da Unifoz, e especialmente os
colegas de curso da UNIPAR, campus de Toledo, que participaram de forma
interativa do meu sucesso acadêmico.
Ao sócio e amigo Nelso Caumo, pela motivação a desenvolver os estudos
e o aprimoramento profissional.
Ao meu pai e à minha mãe, pelo carinho e apoio nos momentos em que
precisei deles.
À Companheira, colaboradora, amiga e noiva Lidiane Fátima de Deus.
5
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................6
1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA DA PESQUISA .......................................................6
2. DIREITO PENAL: CONCEITOS FUNDAMENTAIS................................................8
2.1 TIPICIDADE ..........................................................................................................8
2.2 ILICITUDE .............................................................................................................9
2.3 CULPABILIDADE ..................................................................................................9
2.3.1 Elementos Subjetivos do Tipo ..........................................................................10
2.3.1.1. Culpa............................................................................................................10
2.3.1.2. Dolo ..............................................................................................................11
3. TUTELA PENAL DA ORDEM TRIBUTÁRIA........................................................12
3.1. DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO ..........................................................................12
3.1.1. Características e Institutos do Direito Penal Tributário....................................13
3.1.2. Ilícito Tributário e Ilícito Penal .........................................................................14
3.2. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO........................................................................17
3.2.1. Elisão Fiscal ....................................................................................................18
3.2.2. Evasão Fiscal: Fraude e Sonegação...............................................................19
3.3. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA ......................................................21
3.3.1. A Responsabilidade nos Crimes Tributários....................................................24
3.3.1.1 A Responsabilidade Objetiva nos Crimes Tributários ...................................25
3.4 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NOS CRIMES TRIBUTÁRIOS...........................27
3.4.1. Bem Jurídico Tutelado e Natureza Jurídica.....................................................28
3.5 CAUSAS DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM CRIMES TRIBUTÁRIOS ......28
3.5.1. Extinção da Punibilidade pela Denúncia Espontânea. ....................................29
3.5.2. Extinção da Punibilidade pelo Pagamento ......................................................30
3.5.3. Extinção da Punibilidade pelo Parcelamento dos Débitos...............................32
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................34
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................37
6
1. INTRODUÇÃO
1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA DA PESQUISA
No contexto desse início de terceiro milênio, o Estado brasileiro investe no
seu aparelhamento, no intuito de diminuir a sonegação fiscal e aumentar a
arrecadação. Assim, as pessoas vêem-se cada vez mais sujeitas ao respeito das leis
fiscais, e começa-se a sentir o peso dos encargos fiscais e tributários na vida
econômica do País.
Mesmo apesar do poder Estatal, ainda é considerável a parcela de
transações que ocorrem no chamado “mercado negro”, além do alcance do fisco.
Os crimes tributários são criados com o intuito de diminuir a existência da
sonegação fiscal, mas na formulação da lei, fica evidente que o legislador pretende
mais o produto da arrecadação do tributo, e menos a punição do sonegador. Isto fica
claramente demonstrado na denúncia espontânea, onde o contribuinte, mesmo
tendo sonegado, pode redimir-se e recolher o tributo, isentando-se da pena do crime
fiscal, se o fizer antes do início da ação fiscal.
Como bem define DENARDI e COSTA JÚNIOR (1.998, p. 21), a infração
tributária consiste “na violação das normas jurídicas que disciplinam o tributo, seu
fato gerador, suas alíquotas ou base de cálculo, bem como no descumprimento dos
deveres administrativos do contribuinte para com o Fisco, tendentes ao recolhimento
do tributo, aludindo-se, numa e noutra hipótese, às infrações tributárias materiais e
formais”.
Diante destas circunstâncias, busca-se com o presente estudo, evidenciar
o contexto dos crimes fiscais no ordenamento jurídico brasileiro, e sua inferência na
vida das pessoas, das empresas e o resultado na vida social e econômica do
contribuinte.
Com a estabilização econômica dos últimos anos, o Real tem se
valorizado em relação ao dólar, a taxa de juros básica está em declínio por meses
consecutivos, o câmbio flutuante possibilita o controle da inflação e a valorização da
moeda. Acresce-se a isto o aumento considerável de nossas exportações,
decorrentes de contínuos e planejados investimento das empresas em estrutura e
infra-estrutura, apesar da timidez do Estado em aplicar em infra-estrutura.
7
O Brasil está deixando para o passado as mazelas sociais e o salário
mínimo já possibilita um poder aquisitivo tão sonhado nas décadas de 80 e 90,
diminuindo o número de pessoas que vivem na linha da pobreza.
Com isto, o Estado busca uma sociedade mais igualitária e é normal que
se tente diminuir as diferenças econômicas entre as classes sociais e econômicas
existentes no País, conhecidos como classe baixa, classe média e classe alta,
subdivididas ainda em outras classificações.
A voracidade fiscal, decorrente da necessidade da manutenção da
estrutura estatal paquidérmica que evoluiu consideravelmente nos anos 80 e 90,
ainda é sentida no século XXI, impactando na geração de riquezas e na
competitividade do País no âmbito dos mercados globalizados, fruto do chamado
“custo Brasil”.
Com o advento de recursos, de tecnologia, de informação e de
conhecimento, o Estado aperfeiçoa sua máquina Estatal, principalmente seu órgão
arrecadador; a Super Receita.
Sendo assim, é relevante um estudo para o setor dos crimes fiscais, por
representarem um fator presente e cada vez mais ativo na vida econômica e social
do brasileiro, face o aparelhamento do Estado e a voracidade do Leão.
8
2. DIREITO PENAL: CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Para que se possa analisar a Extinção da Punibilidade em Crimes
tributários, é necessário o aprofundamento no estudo das condicionantes Penais
inseridas neste Instituto, que mistura elementos do Direito Penal e do Direito
Tributário, direcionando o estudo no sentido possível de se dissecar e entender o
Tipo Penal e mais à frente, a conseqüente Extinção da Punibilidade.
2.1 TIPICIDADE
Modernamente, a tipicidade é composta por quatro elementos; o tipo, a
conduta, o resultado e o nexo de causalidade. O tipo penal é desdobramento da
noção de legalidade, pois é através do tipo que o legislador vai positivar as condutas
atentatórias à ordem social. BRANDÃO (2003, p. 95) entende que “quando se diz
que o tipo é uma descrição, diz-se na verdade que ele é uma imagem conceitual, um
modelo da conduta incriminada”.
A tipicidade penal é a decorrência da admissão, entre nós do princípio da
legalidade como fundamental em nosso direito penal, o qual estabelece que "não há
crime sem lei anterior que o defina".
No direito penal o princípio da tipicidade exige que, para ser atendido o
princípio da legalidade, não basta a existência de uma lei incriminadora em sentido
vago, devendo o legislador, na previsão de delitos, determiná-los por meio de tipos
penais, descrevendo-os de modo certo e inconfundível.
Tipo penal é a descrição legal de uma conduta definida como crime. O
Tipo Penal é tratado no inciso II do art. 18 do Código Penal, in verbis:
Art. 18. Diz-se o crime:
I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia; Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.
A tipicidade, portanto, é um juízo de valor feito a respeito de um
determinado fato social, no intuito de enquadrar a conduta humana a uma situação
legal prevista na lei penal, é dizer, “tipicidade é uma relação da conduta humana e o
tipo penal” (BRANDÃO, 2003, p. 112).
9
Deste raciocínio lógico, QUEIROZ (2.005, p. 122) dia que, se a conduta
humana não estiver legalmente prevista como tipo penal, “ficando prejudicada, em
conseqüência, a análise de tudo o mais (antijuridicidade e culpabilidade). Declarar,
pois típica uma ação, é declará-la relevante jurídico-penalmente. Ao invés, afirmá-la
atípica é afirmá-la penalmente indiferente”.
2.2 ILICITUDE
Sendo a ação típica, cumpre averiguar se esta é contrária ao
ordenamento jurídico. Se, “embora típica, não for ilícita – isto é, for lícita, por
exemplo, se ficar provado que o agente matou em legítima defesa -, ficará,
obviamente, prejudicada a indagação sobre a culpabilidade” (QUEIROZ, 2005, p.
128).
Em certas hipóteses o direito reconhece que atos típicos estão, apesar
disso, em consonância com o direito, ou seja, não são antijurídicos, como esclarece
QUEIROZ (2.005, p. 131):
Diz-se, assim, antijurídica a ação – ou, mais precisamente, ilícita a ação – quando praticada contrariamente ao direito, é dizer, sem o amparo de causa de exclusão da ilicitude (ou causas de justificação), como a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal ou o exercício regular do direito ( CP, art. 23 ). Assim, não há crime de homicídio (mas homicídio simplesmente) quando, por exemplo, o agente mata outrem em legítima defesa de sua própria vida. Significa dizer que, embora típica a ação, visto coincidir com a descrição do art. 121 do Código Penal, ela não é considerada, porém, ilícita (antijurídica), uma vez que autorizada pelo direito. Ou seja, quem mata em legítima defesa mata legitimamente; atua dentro da legalidade.
Assim, pode-se definir a antijuridicidade “como a relação de contrariedade
do fato do homem com o comando que dispõe a norma do direito”. (BRANDÃO,
2.003, p. 98).
2.3 CULPABILIDADE
Tratando-se de uma ação típica e ilícita cumpre perquerir acerca da
culpabilidade do autor do fato, tendo-se, portanto, que a culpabilidade é o último
pressuposto da penalidade.
A culpabilidade é um juízo de reprovação que recai sobre um determinado
fato. Pode-se dizer que a culpabilidade representa um desdobramento da
10
proporcionalidade. Sendo a ilicitude um juízo de valor que diz respeito ao fato, a
culpabilidade é, pois, um juízo de valor sobre o autor do fato.
No entendimento de QUEIROZ (2005, p. 138) “a culpabilidade constitui,
em conseqüência, as condições subjetivas que devem concorrer para que o seu
autor seja punido, pois, do contrário, isto é, se não culpável, não sofrerá pena
alguma, sendo absolvido “.
Com a teoria finalista da ação não há mais elementos psicológicos no
conceito de culpabilidade. Têm-se, pois, um tripé: a imputabilidade, a potencial
consciência da ilicitude e a exigência de conduta diversa.
2.3.1 Elementos Subjetivos do Tipo
Os elementos subjetivos do tipo penal são a culpa e o dolo.
2.3.1.1. Culpa
Em direito, culpa é a violação ou inobservância de uma regra, que produz
dano aos direitos de outros, por negligência, imprudência ou imperícia, ou seja, em
razão da falta de cuidado objetivo. É o erro não-proposital.
No entendimento de CAPEZ (2.000, p. 106), culpa “é o elemento
normativo da conduta, porque sua existência decorre da comparação que se faz
entre o comportamento do agente no caso concreto e aquele previsto na norma, que
seria o ideal. Assim, se a conduta do agente afastar-se daquela prevista na norma,
haverá a quebra do dever objetivo de cuidado e, consequentemente, a culpa.”
Para TAVARES (1.985, p. 84), a culpa pode ser conceituada como “forma
de conduta humana que se caracteriza pela realização do tipo de uma lei penal,
através da lesão a um dever de cuidado, objetivamente necessário para proteger o
bem jurídico e onde a culpabilidade do agente se assenta no fato de não haver ele
evitado a realização do tipo, apesar de capaz e em condições de fazê-lo.”
Diferencia-se do dolo porque, neste, o agente tem a intenção de praticar o
fato e produzir determinado resultado: existe a má-fé. Na culpa, o agente não possui
a intenção de prejudicar o outro, ou produzir o resultado. Não há má-fé.
11
2.3.1.2. Dolo
Em Direito Penal, por sua vez, dolo é um elemento subjetivo dos tipos,
caracterizado pela vontade livre e consciente de praticar uma conduta descrita em
uma norma penal incriminadora. Uma ação dolosa, por si só, não pressupõe a
existência de um crime, pois faz-se necessária a constação de que a conduta era
ilícita e o agente culpável.
No conceito de CAPEZ (2.000, p. 104), dolo “é a vontade e a consciência
de realizar os elementos constantes do tipo legal. Mais amplamente, é a vontade
manifestada pela pessoa humana de realizar a conduta.”
Segundo a redação do artigo 18, inciso I, do Código Penal, é dolosa uma
ação quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.
A partir daí, observa-se a possibilidade de dividir o dolo em duas
modalidades; dolo direto e dolo enventual. O primeiro é o dolo propriamente dito,
compreendendo a primeira parte da norma supra mencionada.
Segundo PRADO e BITTENCOURT (1.995, p. 87), o dolo direto ou
imediato ocorre quando “o agente quer o resultado como fim de sua ação e o
considera unido a esta última, isto é, o resultado produz-se como consequência de
sua ação. A vontade se dirige à realização do fato típico, querido pelo autor”.
Já o dolo eventual é aquele em que o indivíduo, em seu agir, assume o
risco de produzir determinado resultado, anuindo com sua realização. A
diferenciação desta espécie de dolo com a chamada culpa consciente é sutil, não
sendo incomum a confusão dos conceitos. PRADO e BITTENCOURT (1.995, p. 93)
diferenciam o dolo eventual da culpa consciente:
Por assim dizer, existe um traço comum entre o dolo eventual e a culpa consciente: a previsão do resultado ilícito. No dolo eventual, o agente presta anuência, concorda com o advento do resultado, preferindo arriscar-se em produzi-lo, do que renunciar à ação. Ao contrário, na culpa consciente, o agente afasta ou repele, embora inconsideradamente, a hipótese de superveniência do evento e empreende a ação na esperança de que este não venha a ocorrer (prevê o resultado como possível, mas não o aceita, nem o consente).
Ademais, esta introdução ao estudo dos elementos de Direito penal
necessários à fundamentação empírica do estudo está pronta. A partir de agora, o
estudo será dirigido aos elementos da Tutela Penal da Ordem Tributária.
12
3. TUTELA PENAL DA ORDEM TRIBUTÁRIA
A tutela penal da ordem tributária passa, necessariamente, pela análise
das variantes penais e tributárias contextualizadas no ordenamento jurídico e na
aplicação da Lei penal tributária, e visa, essencialmente, manter a estabilidade e a
segurança jurídica, principalmente porque os crimes cometidos nesta seara do
Direito, envolvem quantias monetárias significativas, e seu conseqüente impacto
social, econômico, financeiro é relevante.
O esforço mais intenso do direito Penal na coerção de tipos penais e
eventos que descapitalizem o Estado e outras Entidades, deve ser garantido, à fim
de garantir a ordem econômica e, consequentemente, a ordem tributária.
Na delimitação do estudo da tutela da ordem tributária, há que se analisar
o Direito penal tributário, com fins à delimitação da área de estudo, qual seja, a
extinção da punibilidade em crimes tributários e os efeitos decorrentes deste
instituto.
3.1. DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO
O Direito Penal Tributário é classificação didática, que incorpora, no seu
conceito amplo, regramentos penais atinentes aos crimes tributários, estando estes
tipos penais insertos no Código Penal ou na legislação esparsa. No entendimento de
AMARO (2.002, p. 420), o conceito de Direito Penal Tributário é didático:
Numa visão didática, não há, talvez, maiores inconvenientes em agrupar-se o estudo dos crimes tributários sob o rótulo de direito penal tributário, já que essa designação conduz o estudioso para uma abordagem propositadamente circunscrita a um capítulo do direito penal, qual seja, aquele que tutela a arrecadação de tributos, delimitando, dessa forma, o campo de sua análise. O que se deve evitar são as miríficas visões autonomísticas que, centradas no particular, perdem a visão de conjunto, especialmente quando o particularismo esteja em circunstâncias tão frágeis como o fato de a norma figurar no próprio Código Penal, em lei extravagante, ou no corpo de normas que versem também sobre matéria não penal.
Para AMARAL (2002, p. 327), o Direito Penal Tributário se encarrega dos
ilícitos tributários mais graves: “A sanção jurídica como punição imposta pelo poder
do Estado possui várias graduações. A imposta pelo Direito Penal é a mais rigorosa
de todas. Só o Direito Penal, por exemplo, possui, como já dissemos, as penas de
reclusão e de detenção. Daí serem punidos os ilícitos jurídicos mais graves pela
severidade do Direito Penal...”.
13
3.1.1. Características e Institutos do Direito Penal Tributário
BARROS CARVALHO (2.002, p. 503), entende que os crimes fiscais
estão subordinados aos princípios, institutos e formas do Direito Penal, ao passo que
as infrações contidas em leis tributárias, de caráter não criminal, sujeitam-se aos
princípios gerais do Direito Administrativo. Sob este entendimento, são poucos os
crimes tributários no Brasil.
A sanção é o instrumento que o Direito Penal utiliza para produzir eficácia
à aplicação de seus institutos, e BARROS CARVALHO (2.002, p. 500) entende que
a sanção é projetada para reforçar a eficácia dos deveres jurídicos previstos em
outras normas, e são “norma jurídica em que o Estado-juiz intervém como sujeito
passivo da relação jurídica, sendo sujeito ativo a pessoa que postula a aplicação
coativa da prestação descumprida.”
É notável que a sanção exista como elemento essencial ao adimplemento
das obrigações, notadamente as tributárias. Desta forma, o não cumprimento de
obrigações tributárias origina uma sanção administrativa ou penal, decorrente de
ação ou omissão do obrigado.
Também AMARO (2.002, p. 423) corrobora a idéia de que “a infração
enseja a aplicação de remédios legais, que ora buscam repor a situação querida
pelo direito (mediante execução coercitiva da obrigação descumprida), ora reparar o
dano causado ao direito alheio, através da prestação indenizatória, ora punir o
comportamento ilícito, infringindo-se um castigo ao infrator.”
Neste sentido, AMARO (2.002, p. 421) busca identificar dois sistemas
legais sancionatórios através do Estado; “um o criminal, implementado segundo o
direito penal, através do processo legal, no juízo criminal; o outro, o administrativo,
aplicado segundo regras do direito administrativo, no procedimento administrativo,
pelas autoridades administrativas.”
O interesse deste Estado é justamente o viés criminal, em face da
conseqüência da atitude culposa ou dolosa do agente, em cometer o ilícito penal
tributário.
No direito penal, o rigor é maior, pois aqui a regra é uma conduta
infracional dolosa e a culpa admite-se apenas em situações específicas. O que se
deve entender, é que a sanção penal, que tipifica o fato criminoso, deve ter origem
14
dolosa, e em raros casos há crime culposo tributário, como entende o Supremo
Tribunal Federal, ao conceder a ordem de Habeas Corpus HC72584/RS, extraído do
site do STF (2.007):
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTARIA - ICMS - ALIQUOTAS DIFERENCIADAS - CREDITAMENTO - FRAUDE. A fraude pressupõe vontade livre e consciente. Longe fica de configurá-la, tal como tipificada no inciso II do artigo 1. da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o lançamento de crédito, considerada a diferença das alíquotas praticadas no Estado de destino e no de origem. Descabe confundir interpretação errônea de normas tributárias, passível de ocorrer quer por parte do contribuinte ou da Fazenda, com o ato penalmente glosado, em que sempre se presume o consentimento viciado e o objetivo de alcançar proveito sabidamente ilícito.HC72584/RS – HABEAS CORPUS. Relator Min. Mauricio Corrêa. Julgamento em 17/10/1995. órgão julgador 2ª. Turma. Publicação DJ 03/05/1996 pp-13900. PN1305, CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTARIA, FRAUDE, SONEGAÇÃO FISCAL, (ICMS), CREDITAMENTO, ALIQUOTA DIFERENCIADA, DOLO, INOCORRENCIA VOTAÇÃO: EMPATADA. RESULTADO: PROVIDO. A falta de caracterização e evidenciação do dolo, através da vontade livre,
dirigida e consciente de realizar o fato delituoso, fica mais evidente na tipificação do
crime de fraude e de sonegação, como bem evidenciado fica no recebimento do
Recurso em Habeas Corpus RHC66980/RJ, pelo Supremo Tribunal Federal,
extraído do site do STF:
Recurso de “habeas corpus'”. Acusação de descaminho. Apreensão de bagagem depois de normalmente liberada pela fiscalização fazendária. Fraude alegada que não se configura, pois em nenhum momento se caracterizou o dolo. Flagrante preparado, sem qualquer indício de que tenha sido iludido o pagamento de impostos acaso incidentes na liberação da mercadoria de ingresso não proibido no país. Recurso provido para trancar a ação penal. VOTAÇÃO: UNÂNIME. RESULTADO: PROVIDO. RHC66980 / RJ RELATOR (A): MIN. CARLOS MADEIRA. JULGAMENTO: 22/11/1988. ÓRGÃO JULGADOR: SEGUNDA TURMA DJ 10-03-1989 PP-03013. EMENT VOL-01533-03 PP-00413 Para reforçar este entendimento, da necessidade de se evidenciar o
animus do agente, BARROS CARVALHO (2.002, p. 502), acredita que é necessário
que esteja presente a culpa ou o dolo para caracterizar o tipo penal tributário: “Para
o direito penal, tem de haver a materialidade do evento, contrário aos desígnios da
ordem jurídica (antijuridicidade), e, além disso, a culpabilidade, isto é, a imputação
do resultado delituoso à participação volitiva do agente. Sem dolo ou culpa, numa de
suas gradações, não é punível a conduta que ocasionou o acontecimento típico e
antijurídico.”
3.1.2. Ilícito Tributário e Ilícito Penal
15
No âmbito dos crimes tributários, “estes estão subordinados aos
princípios, institutos e formas do Direito Penal.” (BARROS CARVALHO, 2.002, p.
503).
A diferença essencial entre ilícito penal e ilícito tributário está na
separação destes institutos de forma didática, onde seja possível identificar as
espécies de Ilícito próprias de cada um.
AMARO (2.002, p. 422), diz que no Direito Tributário, “a infração pode
acarretar diferentes conseqüências..., e fulmina: “... trata-se das multas ou
penalidades pecuniárias, encontradas não apenas no direito tributário, mas no
administrativo em geral, e também no direito privado. Em certas hipóteses, a
infração pode ensejar punição de ordem mais severa, quais sejam, as chamadas
penas criminais.”
AMARO (2.002, p. 435) apud Luiz Flávio Gomes, concorda que,
“ontologicamente, não há diferença entre o ilícito civil, administrativo, tributário, etc. e
o ilícito dito penal ou criminal: um mesmo fato pode, dependendo de circunstâncias
históricas ou geográficas, ser, em face de determinado ordenamento jurídico....” um
crime ou não. Neste mesmo raciocínio, o autor faz esclarecimentos sobre seu
entendimento dos Crimes Tributários:
Os crimes ditos tributários ou fiscais (assim designados porque atentam contra o interesse da administração fiscal) não se distinguem dos demais delitos a não ser por aspectos periféricos e acidentais. O fato do bem jurídico objeto da tutela penal se o recolhimento de tributo não dá à legislação que disciplina tais crimes a condição de ramo jurídico apartado do direito penal. Trata-se, pura e simplesmente, de um capítulo do direito penal, que visa à tutela de um específico bem jurídico, assim como outros capítulos do direito penal amparam diferentes bens jurídicos (a ordem econômica, os direitos do consumidor, do assalariado, do inquilino, do adquirente de lotes de terras, da família; a honra, os bons costumes, o patrimônio, etc.).
Uma antiga jurisprudência disciplina que não pode haver confusão entre o
ilícito fiscal e o ilícito penal:
Não há confundir o ilícito fiscal e o ilícito penal. Aquele já é objeto de minuciosa e rigorosa legislação. Por ele sujeitam-se os infratores à multa e sanções de caráter administrativo. Só quando, ultrapassando o campo civil, o agente, além da sonegação, pratica, com dolo específico, fato previsto como crime, é que se torna também, incurso nas sanções penais. (RT 289/57)
O parágrafo 5º do artigo 173, e parágrafo 3º do art. 225 de nossa Carta
Magna demonstram uma nova visão do legislador sobre a matéria aqui estudada,
pois disciplina que:
Art. 173, § 5º - "A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a as punições
16
compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular." Art. 225, § 3º - "As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."
Desta forma, a Constituição Federal de 1988 prevê a responsabilidade
das pessoas jurídicas, sujeitando-as a sanções penais e administrativas. E, no
direito tributário é comum o entendimento de que elas podem figurar como sujeitos
ativos dos delitos fiscais, embora a penalização das condutas delitivas praticadas
por elas são atribuídas às pessoas físicas que concorreram para a prática do delito,
proporcionalmente à culpabilidade de cada uma, nos termos dos artigos 131 à 138
do Código Tributário Nacional, que estudaremos adiante.
Já o Regulamento do IPI – Imposto Sobre Produtos Industrializados
define infração tributária no art. 438 e 439, evidenciando que pode ser tanto culposa
como dolosa, omissiva ou comissiva:
Art. 438. Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe em inobservância de preceitos estabelecidos ou disciplinados por este Regulamento ou pelos atos administrativos de caráter normativo destinados a complementá-lo (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 64). Parágrafo único. Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações independe da intenção do agente ou do responsável, e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato (Lei n.º 5.172, de 1966, art. 136). Art. 439. As infrações serão apuradas mediante processo administrativo fiscal (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 65).
Ademais, é pacífico na jurisprudência a necessidade de que seja exaurida
a esfera administrativa de investigação, para levantamento e apuração do Crédito
Tributário, com procedimento regulamentado pela Lei 9.430/96, para somente após
o encerramento desta esfera, possa ser iniciada a ação penal decorrente do
eventual ilícito penal. É o que entende o Superior Tribunal de Justiça, como se
depreende do acórdão prolatado no processo de Hábeas Corpus HC54248/PB, in
verbis:
Definitivo do crédito (condição objetiva de punibilidade). Esfera administrativa (Lei nº 9.430/96). Estelionato (inépcia formal). 1. A propósito da natureza e do conteúdo da norma inscrita no art. 83 da Lei nº 9.430/96, o prevalente entendimento é o de que a condição ali existente é condição objetiva de punibilidade. 2. Conseqüentemente, a ação penal pressupõe haja decisão final sobre a exigência do crédito tributário correspondente. 3. Notícia não há, no caso, de decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário, o qual se torna exigível somente após o lançamento definitivo do crédito. 4. É necessário, antes, que o procedimento seja unicamente administrativo-fiscal; evitando-se, com isso, que expedientes próprios da investigação criminal sejam indevidamente usados para a definição de créditos tributários. Em boa verdade, esse não é o propósito de tais expedientes, porquanto dispõe a administração de expedientes seus para a constituição desses créditos. Depois é que virá a ação penal, contanto que se apresentem condutas ilícitas em tese, por
17
exemplo, a omissão, a fraude, a falsificação. 5. É inepta formalmente a denúncia que não expõe, às claras, o fato criminoso – no caso, estelionato –, qual a descrição contida no art. 171 do Cód. Penal. 6. Habeas corpus concedido com extensão da ordem à co-ré. HC 54248 / PB - HABEAS CORPUS 2006/0029021-6. RELATOR: MINISTRO NILSON NAVES. ÓRGÃO JULGADOR: T6-SEXTA TURMA. DATA DO JULGAMENTO: 21/11/2006
3.2. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO
O liame em que vive a dicotomia: “Estado Arrecadador” e “contribuinte
pagador”, estabelece uma relação jurídica entre Fisco e contribuinte, que no mundo
fático das relações jurídicas, comerciais e fiscais, pode-se facilmente identificar
como um “conflito de interesses”, em temo lato. Esta relação jurídico-tributária, vista
por este viés, demonstra características como a dualidade de interesses, a
maximização de resultados dentro do conflito o uso de institutos e armas inerentes à
relação, seja de forma justa, lícita, eqüitativa e até mesmo ilícita. Passa-se ao estudo
destes institutos de ora em diante, sendo eles conhecidos como Sonegação, elisão,
evasão e Fraude.
A dualidade de interesses vislumbra-se pelo notável desejo do
contribuinte em ver sua carga tributária diminuída, o que facilitaria a concorrência,
principalmente no mercado externo, dos produtos brasileiros e de outro lado o
Estado que busca aumentar a arrecadação, o que possibilita aplicação de verbas em
programas sociais, educacionais, de segurança pública e de saúde; as eternas
prioridades estatais do Brasil.
De um lado, o Planejamento Tributário que busca alternativas lícitas
favoráveis ao contribuinte da relação tributária, com vistas à diminuição da carga
tributária através da não ocorrência do fato gerador do imposto, através do que se
conhece como elisão fiscal e de outro lado, a Sonegação e a Fraude, institutos
ilícitos de diminuição da carga tributária, conhecidos genericamente como “evasão
fiscal”.
Para AMARAL (2002, p. 288), a diferença entre evasão e elisão fiscal é
temporal:
Se surgiu uma obrigação tributária, ou seja, se aconteceu um fato gerador de obrigação tributária e o contribuinte busca esconde-lo, dizemos que houve uma evasão. Diferente da evasão é outra prática corrente chamada de elisão. Esta seria a prática do contribuinte que impede a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária, ou que o adia. Não nascendo a obrigação tributária, não há que se falar em qualquer tipo de ilícito.
18
É o contribuinte quem deve examinar a lei tributária, verificar que ao celebrar certo tipo de contrato, ao praticar determinado ato, vai surgir um tributo no qual ele não deseja incorrer.
3.2.1. Elisão Fiscal
Dentro das considerações preliminares sobre Elisão, MALERBI (1.984, p.
14) traz conceito no sentido de que elisão:
É a expressão empregada pela doutrina para designar a descrição tipológica de determinados comportamentos que os particulares manifestam perante a tributação, e que se fundam num ponto referencial comum a todos: comportamentos tendentes a evitar uma incidência tributária ou a obter uma incidência tributária menos onerosa, mediante a via jurídica lícita que lhe proporcione tal desiderato.
A Elisão caracteriza-se como medida preventiva, anterior e lícita à
ocorrência do fato gerador do Tributo. SANTOS (1.972, P. 108) observa que “antes
da ocorrência do fato gerador, pode o contribuinte adotar uma das seguintes
atitudes: a) escolher, para sua atividade, situações legais não oneradas ou menos
oneradas; b) escolher, para sua atividade, com apoio na lei, situações legais não
oneradas ou menos oneradas, embora o faça com abuso do direito ao uso das
formas jurídico-privadas.”
Deste último entendimento, pode-se inferir que há controvérsia na
questão da licitude do uso de qualquer dos institutos de diminuição da incidência
tributária, porque mesmo a Elisão pode ter como conseqüência o “abuso do direito
ao uso formas jurídico-privadas”, o que torna também este instituto uma forma ilícita
de Planejamento Tributário.
Fora desta divergência, cumpre lembrar que o Planejamento Tributário
não é um instituto seguro de diminuição da incidência tributária, face o esforço
legislativo em diminuir sua aplicabilidade, motivado principalmente pelo impacto na
arrecadação que a utilização desenfreada destes institutos causa ao Erário.
Segundo XAVIER (1.987, p. 18), “existiria elisão fiscal, se o contribuinte
pratica atos ou omissões tendentes a evitar ou retardar a própria constituição da
obrigação tributária, isto é, impedir o surgimento do fato gerador, ou a modelar este
fato gerador em termos que determinem uma prestação tributária inferior.”
19
Mas a melhor conceituação do tema é a de NOGUEIRA (1.995, p. 217),
apesar de conter muitos elementos subjetivos que causam profunda discórdia na
Doutrina, como a licitude ou ilicitude da elisão fiscal:
É a realização ou não do fato gerador. Já vimos que com a realização do fato gerador, nasce a obrigação e com o lançamento se constitui formalmente o crédito. Antes de ocorrer o fato gerador não existe sequer obrigação fiscal. Portanto a chamada “economia de imposto” é legítima por estar antes da ocorrência do fato gerador, quando o direito do fisco ao tributo ainda se encontra na fase abstrata, apenas em descrição hipotética na lei, não concretizada porque o fato gerador não ocorreu, nem individualizada em relação a um fato e a um contribuinte determinado. A realização do fato tributável é uma faculdade do contribuinte e, se ele não a realizar, não terá dado origem ao direito, daí a chamada economia de imposto ser legítima se o contribuinte não praticar ou realizar a situação prevista como imponível.
3.2.2. Evasão Fiscal: Fraude e Sonegação
Dentre os crimes Tributários ocasionados pela prática da Evasão fiscal, os
estudados a seguir são os tipificados na Lei brasileira. Os Crimes contra a ordem
Tributária derivam de alguns tipos penais já previstos no Código Penal, e outros são
criados com novas Leis e passam a integrar os Crimes Tributários.
Para ROSA JÚNIOR (1.997, p. 122), os crimes tributários tipificados no
Código Penal:
Podem ser divididos em dois grupos: a) crimes especificamente tributários: contrabando, descaminho e falsificação de papéis públicos; b) crimes que se relacionam indiretamente com a matéria tributária, que são os demais crimes: violação de segredo funcional, excesso de exação, prevaricação e falsidade. A fraude e a sonegação figuram entre as infrações dolosas mais comuns
previstas na legislação tributária brasileira, conforme pode-se verificar nas notícias
do dia-a-dia, como esta, extraída do site Yahoo! EDITORIAL. Disponível em
<www.yahoo.com/s/09092007/25/economia-sonega-impostos-equivale-30-pib.html>,
Acesso em 09/09/2007:
Sonegação de impostos equivale a 30% do PIB A sonegação de impostos no País tem quase a mesma proporção da carga tributária. Para uma carga que beira os 35% do Produto Interno Bruto (PIB), a sonegação é da ordem de 30%. A projeção é do professor de finanças públicas licenciado da Universidade de São Paulo e presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial - Etco, André Franco Montoro Filho. Para chegar a essa conclusão, ele considerou informações de cinco setores que integram o instituto - combustíveis, fumo, medicamentos, bebidas e tecnologia - e projetou os dados para a economia. Nesses setores, a sonegação chega a 30%. Um estudo da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo confirma a exuberância da sonegação. O levantamento revela que só em São Paulo, Estado que responde por quase um terço do PIB, o comércio varejista sonega, em média, 60% do que vende. São cerca de R$ 3,5 bilhões por ano, segundo o secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Mauro Ricardo Costa. A Federação do Comércio do Estado de São Paulo não comenta o estudo do governo, alegando que não tem pesquisas sobre sonegação. Se o País acabasse com a sonegação, diz Montoro Filho, a carga tributária poderia subir de 35% para 50% do PIB. Com isso, argumenta,
20
seria possível reduzir as alíquotas dos impostos em 20%, em média. Mesmo assim, a carga seria de 40% do PIB, maior que atual. "Todos pagariam menos imposto individualmente e o governo arrecadaria mais."
Também em relação à Fraude Fiscal, as manchetes destacam que a
fiscalização é acirrada e até exagera nas atitudes, como se vislumbra no comentário
extraído do portal UOL:
Essa questão das invasões de empresas em busca de provas de fraudes de natureza tributária vem ganhando as manchetes de jornais e revistas. O clima esquentou bastante com as invasões de escritórios de advocacia ligados às empresas sob investigação do fisco. Os ânimos se acirraram. Os advogados, com justa razão, indignados com a violação do sigilo profissional, resultante da apreensão indiscriminada de computadores, papéis e documentos pertinentes à atividade profissional; membros do Ministério Público e alguns magistrados reafirmando necessidades de buscas e apreensões e condenando a ação da OAB que vem agindo na defesa de prerrogativas de seus membros; os policiais alegando cumprimento de ordens judiciais e necessidade de utilização de algemas como regra geral, porque imprevisível a reação dos que devem ser presos.
A Fraude e a Sonegação são institutos que servem de base ao estudo
dos crimes contra a ordem tributária, principalmente porque, a partir da fraude e da
sonegação, é que decorrem quase todos os crimes contra a ordem tributária, como
passa-se a aprofundar de agora em diante.
O RIPI – regulamento do Imposto Sobre Produtos Industrializados trás
conceito de Sonegação, fraude e conluio, em seu artigo 453, 454 e 455 in verbis:
Art. 453. Sonegação é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 71): I - da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 71, inciso I); II - das condições pessoais do contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 71, inciso II). Art. 454. Fraude é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do imposto devido, ou a evitar ou diferir ou seu pagamento (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 72). Art. 455. Conluio é o ajuste doloso entre duas ou mais pessoas, naturais ou jurídicas, visando a qualquer dos efeitos referidos nos arts. 453 e 454 (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 73).
A sonegação é possível, inclusive, quando a origem do rendimento é
ilícito, tal qual obtido por meio de tráfico de drogas, conforme já entendeu o Supremo
Tribunal Federal no HC77530/RS:
PN1305, CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, FRAUDE, SONEGAÇÃO FISCAL, CARACTERIZAÇÃO, ATIVIDADE CRIMINOSA, ORIGEM, PRODUTO, IRRELEVÂNCIA. EMENTA: Sonegação fiscal de lucro advindo de atividade criminosa: "non olet". Drogas: tráfico de drogas, envolvendo sociedades comerciais organizadas, com lucros vultosos subtraídos à contabilização regular das empresas e subtraídos à declaração de rendimentos: caracterização, em tese, de crime de sonegação fiscal, a acarretar a competência da Justiça Federal e atrair pela conexão, o tráfico de entorpecentes: irrelevância da origem ilícita, mesmo quando criminal, da renda subtraída à tributação. A exoneração tributária dos resultados econômicos de fato criminoso - antes de ser
21
corolário do princípio da moralidade - constitui violação do princípio de isonomia fiscal, de manifesta inspiração ética. HC77530 / RS - RIO GRANDE DO SUL. Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. Julgamento: 25/08/1998 Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação Dj 18-09-1998 PP00007 EMENT VOL-01923-03 PP-0522 Por outro lado, a elisão fiscal, como método lícito de diminuir a carga
tributária não interessa ao presente estudo, tendo sua definição, mero interesse
didático-conceitual, para que se possa vislumbrar o cenário e contexto de existência
dos crimes tributários, que estudar-se-á mais detalhadamente a seguir.
3.3. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA
A tipificação de certas condutas foi uma das alternativas do Fisco para
diminuir a sonegação fiscal. Com vistas à exercer coerção sobre certos fatos, foi
criado a instituição da “sonegação fiscal”, objetivando o aumento da arrecadação via
criminalização do fato jurídico. Neste viés, o Estado busca solucionar problema
arrecadatório com a utilização de institutos do Direito Penal, como concorda AMARO
(2.002, p. 444), “... o único objetivo buscado pelo Estado com a edição de leis
tipificando delitos fiscais só pode ser o de minimizar eventuais déficits na
arrecadação em função da evasão fiscal – a prática de atos ilícitos tendentes a
ocultar o fato gerador ocorrido, ou a diminuir ilicitamente o impacto econômico do
tributo”.
Sabe-se que a coercibilidade é Princípio do Direito Penal, mas que
aplicado ao Direito Tributário, busca a eficiência da aplicação da Lei Tributária. Pelo
Princípio da coercibilidade, parece lógico concluir que as condutas sociais
dificilmente podem ser regradas e padronizadas, sem a imposição de ferramenta ou
meio coercitivo, principalmente para que haja intimidação das condutas que se quer
evitar ou produzir.
Discorrendo sobre a penalização dos ilícitos tributários, CORRÊA (1996,
p. 85), define este fator coercitivo do Direito Tributário como sanções tributárias
penais:
(...) surgem, portanto, em matéria tributária, sanções tributárias penais, que são as imposições pecuniárias e interdições de direito para exercer atividades mercantis ou de outra natureza, autorizadas pela Fazenda; e as sanções penais tributárias, que são imposições de pena corporal e pecuniária, de natureza penal, aos que infrinjam obrigações instituídas pelas leis tributárias.
22
Por sua vez, DENARDI e COSTA JUNIOR (1.998, p. 109) entendem que
a nomenclatura e o conceito devam ser diferentes, e conceituam que a infração
tributária consiste “na violação das normas jurídicas que disciplinam o tributo, seu
fato gerador, suas alíquotas ou base de cálculo, bem como no descumprimento dos
deveres administrativos do contribuinte para com o Fisco, tendentes ao recolhimento
do tributo, aludindo-se, numa e noutra hipótese, às infrações tributárias materiais e
formais”.
Esta miscelânea de institutos do direito Penal com o direito Tributário, é
possível em virtude da Sistematização do Ordenamento Jurídico, e a separação em
ramos do Direito se faz apenas para fins didáticos, pois na criação, interpretação e
aplicação da Norma, o Direito é sistêmico e deve ser interativo.
Também o direito Penal utiliza-se de institutos econômicos, como por
exemplo, a pena de multa, que é paga pelo acusado, como “castigo” pelo
cometimento de crime.
Uma das formas encontradas pelo Fisco para estimular os contribuintes a
cumprir com suas obrigações tributárias é a tipificação penal dessas condutas, ou
seja, a instituição dos chamados crimes de sonegação fiscal. No Brasil, a instituição
de tal delito deu com o advento da Lei nº. 4.729, de 14 de julho de 1.965, a qual
estabeleceu:
Art. 1º Constitui crime de sonegação fiscal: I - prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei; II - inserir elementos inexatos ou omitir, rendimentos ou operações de qualquer natureza em documentos ou livros exigidos pelas leis fiscais, com a intenção de exonerar-se do pagamento de tributos devidos à Fazenda Pública; III - alterar faturas e quaisquer documentos relativos a operações mercantis com o propósito de fraudar a Fazenda Pública; IV - fornecer ou emitir documentos graciosos ou alterar despesas, majorando-as, com o objetivo de obter dedução de tributos devidos à Fazenda Pública, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis. Pena: Detenção, de seis meses a dois anos, e multa de duas a cinco vezes o valor do tributo.
Esta Lei tipifica essencialmente o crime de sonegação fiscal, e foi
aperfeiçoado no início da década de 1.990, com o advento da Lei 8.137/90, que
muda inclusive, a nomenclatura anteriormente utilizada de “sonegação fiscal”, para
“crime contra a ordem tributária”, como se depreende dos artigos 1º e 2º da Lei nº.
8.137, de 27.12.1990:
23
Art. 1º. Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V. Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
A Lei 8.137/90 é mais abrangente que a anterior e busca classificar os
diferentes crimes contra a ordem tributária, incluindo crimes praticados pelos
contribuintes ou responsáveis pelo cumprimento de obrigações tributárias, bem
assim crimes praticados pelos agentes do fisco no exercício de seus misteres, sendo
eles omissivos, comissivos, de falsidade documental, corrupção ativa e passiva,
concussão e outros já tipificados no Código penal, mas que aqui passam a ter
tratamento diferenciado, especializado e específico.
O que antes era denominado simploriamente de sonegação fiscal, agora
passa a ter tratamento diferenciado num rol de crimes, que os diferenciam em
espécie e gênero.
Além destes crimes, há o crime de apropriação indébita previdenciária,
que foi definido inicialmente na Lei nº. 4.357, de 16.07.64. A Lei nº. 8.212, de
24.07.91, que dispõe sobre o plano de custeio da seguridade social, definia o crime
de apropriação indébita previdenciária. A partir da promulgação da Lei nº. 9.983, de
24
14.07.2000, contudo, o crime manteve a mesma denominação e foi tipificado no
artigo 168-A do Código Penal Brasileiro:
Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1o. Nas mesmas penas incorre quem deixar de: I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços; III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.
3.3.1. A Responsabilidade nos Crimes Tributários
No ramo do Direito Penal Tributário, a sanção penal é o assunto que mais
gera polêmica doutrinária. Sua importância está no fato de que, se comparadas com
as sanções administrativas, as decorrentes de ilícito tributário são as que mais
atingem o patrimônio dos infratores, gerando, dessa forma, maior receio entre os
destinatários das normas tipificadoras dos Crimes Tributários.
Para DENARDI e COSTA JUNIOR (1.998, p. 21), a infração tributária
consiste “na violação das normas jurídicas que disciplinam o tributo, seu fato
gerador, suas alíquotas ou base de cálculo, bem como no descumprimento dos
deveres administrativos do contribuinte para com o Fisco, tendentes ao recolhimento
do tributo, aludindo-se, numa e noutra hipótese, às infrações tributárias materiais e
formais”.
No entendimento de MACHADO (2.002, p. 429), "No sistema jurídico
penal brasileiro, como de resto acontece em todo o mundo civilizado, a
responsabilidade penal depende da culpa ou do dolo do agente. É, portanto, sempre
subjetiva e pessoal".
O Código Tributário Nacional delimita a responsabilidade tributária em: a)
substituição tributária; b) responsabilidade solidária; e c) responsabilidade
subsidiária.
Na responsabilidade por substituição, o responsável pela obrigação
tributária passa a ser o substituto tributário, desonerando o substituído totalmente,
conforme se percebe no artigo 128, CTN:
25
Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.
Na responsabilidade solidária, o contribuinte e o sucessor são
responsáveis em conjunto pela obrigação tributária. É o caso da responsabilidade
dos sucessores, elencada no artigo 129 e seguintes do CTN. O artigo 130, CTN bem
esclarece a matéria:
Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.
Na responsabilidade subsidiária, o contribuinte tem preferência no
pagamento da obrigação, e somente após o terceiro será responsabilizado pela
obrigação tributária. É o caso da responsabilidade de terceiros, elencada no artigo
134 e 135 do CTN:
Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: I – os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; II – os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; III – os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; IV – o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio; V – o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; VI – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício; VIII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
3.3.1.1 A Responsabilidade Objetiva nos Crimes Tributários
Mesmo classificando as infrações em crimes de dano (aqueles onde sua
configuração se dá com a obtenção do resultado) e crimes de mera conduta (cuja
configuração ocorre através do singelo procedimento, independente do resultado
perseguido), permanece a necessidade de apurar a intenção do agente.
26
Assim, as infrações penais capituladas na Lei 8.137/90 são todas de
dano, ou seja, é imperioso que se configure a existência de uma lesão aos cofres
públicos para que o crime possa estar presente, e que este resultado tenha sido
perseguido pelo agente. Ainda, cabe à Fazenda Pública o ônus da prova da conduta
dolosa do sujeito passivo da obrigação tributária.
Analisando-se a lei nº. 8.137/90, que define crimes contra a ordem
tributária, econômica e contra as relações de consumo, "não basta ao acusador
provar que em determinada empresa houve supressão ou redução de tributo ou de
contribuição social (esse é o resultado exigido pelo crime). É também fundamental
que a acusação comprove quem dolosamente causou esse resultado."
O Código Tributário Nacional dispõe em três artigos a responsabilidade
por infrações tributárias.
De acordo com o artigo 136 do Código Tributário Nacional, in verbis:
Art. 136. Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.
Através deste artigo, pode-se concluir que a responsabilidade por
infrações tributárias é objetiva, já que não é necessário a presença de elemento
subjetivo; o dolo ou a culpa, bem como da efetividade e efeitos do ato. Trata-se,
então, de responsabilidade objetiva, onde o elemento subjetivo é presumido, no
intuito de livrar o ônus da prova à Fazenda Pública.
Ocorre, porém, que o referido artigo é supletivo, ou seja, inicia a descrição
com os termos: “Salvo disposição de lei em contrário...”, o que acaba polemizando o
assunto, principalmente na doutrina, onde sua maioria entende que não seja
possível a responsabilidade objetiva em Crimes Tributários, e esta corrente parece
ser a mais lógica, pelo fato de que não se pode presumir a existência de elementos
essenciais caracterizados pelo Direito Penal.
A disposição legal contrária ao artigo 136 do CTN pode ser extraída do
artigo 11, caput, da Lei nº. 8.137, de 27/12/1990 que trata dos crimes contra as
relações de consumo: “Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa
jurídica, concorre para os crimes definidos nesta lei, incide nas penas a estes
cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Grifo meu.
27
Nesta polêmica, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ajuda a
desanuviar as incertezas, pregando uma segurança jurídica desejada pela Doutrina.
No sentido da responsabilidade subjetiva dos crimes tributários, posicionou-se o STF
no acórdão do Recurso ordinário em Habeas Corpus RHC 5068/RS:
RHC 5068 / RS.RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 1995/0060720-4. Recurso de "habeas corpus". Denúncia. Inépcia. Crime societário. Crimes contra o sistema financeiro e de sonegação fiscal. Concurso formal. Absorção. Matéria de prova. 1. denuncia que atribui a responsáveis pela empresa a pratica de delitos tributários minuciosamente descritos. Se o ministério público atribui a todos os acusados a autoria do fato, esta aberta a via da ampla defesa, já que ao acusador caberá provar que cada um dos denunciados efetivamente praticou a conduta incriminada. Se não o fizer, em relação a um ou a alguns, a absolvição será conseqüência lógica, por não se admitir em nosso sistema penal condenação sem culpa ou responsabilidade objetiva. Alegação de inépcia da denuncia rejeitada. 2. a absorção do crime-meio pelo crime-fim somente pode ser reconhecida em "habeas corpus" quanto os fatos evidenciarem, sem duvida alguma e independentemente de exame probatório, que aquele se exauriu neste, não sobejando qualquer potencialidade lesiva a outro bem protegido juridicamente. 3. hipótese em que os autos não autorizam de plano essa condenação. Matéria a ser deslindada com a sentença de mérito. 4. recurso ordinário improvido. Relator: Ministro ASSIS TOLEDO. Órgão julgador: T5 - QUINTA TURMA. Data do julgamento: 16/04/1996
Entretanto, pode-se entender que a tipificação de delitos fiscais com o
intuito de coibir o não-pagamento doloso de tributo atenta contra o princípio
constante no art. 5º, inc. LXVII, da Constituição Federal segundo o qual ninguém
será preso por dívida. A dívida referida no texto constitucional é obrigação de direito
privado, enquanto a obrigação tributária principal seria relação jurídica de direito
público, não se confundindo, portanto, com dívida. Esse é o entendimento da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 3ª Turma. Ementa: Penal. Sonegação fiscal. IPI. Prisão por dívida. Exclusão. I – A garantia constitucional da prisão por dívida decorre do inadimplemento da relação obrigacional situada no campo do Direito Privado. Já a sonegação fiscal situa-se no campo do Direito Público, alcançando seu objeto a própria política econômica, afetando o patrimônio público, repercutindo na arrecadação, com reflexo nas atividades do Estado, consoante abalizada orientação doutrinária. II – Apelação improvida. Decisão unânime. Apelação Criminal nº. 96.01.04926-6 – MG. Relator: Fernando Gonçalves. Data do julgamento: 15.06.1996. DJ de 19.08.1996.
3.4 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NOS CRIMES TRIBUTÁRIOS
A tipificação de crimes tributários serve muito mais como modo de
desestimular a evasão fiscal do que como norma penal sancionatória propriamente
dita, tanto que, a todo instante, o Fisco possibilita modos para que o tributo seja
pago que importem em extinção de punibilidade. Mais eficazes do que a mera
28
previsão legal de tipos penais têm sido as concessões de parcelamentos em
condições privilegiadas aos contribuintes.
Para DOTTI (2.001, p. 669), “As causas extintivas de punibilidade se
distinguem das causas de exclusão do crime, posto que nestas a conduta humana é
lícita, isto é, autorizada pelo Direito. Elas também não se confundem com as causas
de isenção de pena que impedem a aplicação da sanção penal apesar de
caracterizada a ilicitude da conduta.”
Já MIRABETE (1.997, p. 362), entende que, “originado o jus puniendi,
concretizado com a prática do crime, podem ocorrer causas que obstem a aplicação
das sanções penais pela renúncia do Estado em punir o autor do delito, falando-se,
então em causas de extinção da punibilidade.”
A punição não é elemento constitutivo do crime, mas sim conseqüência e
prolongamento da caracterização e configuração deste. A pena aplica-se como
reprimenda pelo Ilícito cometido, com vistas a garantir a segurança pública. Pensa
desta forma BITTENCOURT (2.004, p. 761), “a pena não é elemento do crime, mas
conseqüência deste. A punição é a conseqüência natural da realização da ação
típica, antijurídica e culpável. Porém, após a prática do fato delituoso podem ocorrer
causas que impeçam a aplicação ou execução da sanção respectiva. No entanto,
não é ação que se extingue, mas o jus puniendi do Estado.”
3.4.1. Bem Jurídico Tutelado e Natureza Jurídica
A natureza jurídica da extinção da punibilidade nos crimes tributários é
certamente arrecadatória, pois busca o Estado a satisfação do seu animus
arrecadador, deixando de ter interesse em questões onde o tributo seja pago.
O Bem jurídico tutelado é a Finança Pública, que desfalcada da
arrecadação, fica sem recursos para fazer frente às despesas públicas.
3.5 CAUSAS DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM CRIMES TRIBUTÁRIOS
As causas de extinção da punibilidade encontram-se expostas no art. 107
do Código Penal e também no Código de Processo Penal encontram-se outras. Mas
não é estas que se pretende estudar no momento. As causas extintivas de
29
punibilidade previstas na legislação tributária, aplicáveis exclusivamente aos crimes
tributários será o alvo de ilações.
As causas de extinção da punibilidade em crimes tributários existem no
mundo jurídico em decorrência de Lei Ordinária e são elas:
3.5.1. Extinção da Punibilidade pela Denúncia Espontânea.
A denúncia espontânea, tratada no artigo 138 do Código Tributário
Nacional, exclui a responsabilidade, acompanhada, se for o caso, do pagamento do
tributo devido e dos juros de mora. Aqui entra a discussão acerca da confusão que a
Lei faz entre o reconhecimento da dívida e o seu adimplemento.
O Superior Tribunal de Justiça no caso da denúncia espontânea,
juntamente com o pagamento parcelado seguia a orientação da Súmula 208, do
extinto Tribunal Federal de Recursos, que versa da seguinte maneira: "A simples
confissão da dívida, acompanhada do seu pedido de parcelamento, não configura
denúncia espontânea". A denúncia espontânea não é uma simples confissão de
dívida é a denúncia de uma infração tributária, seja ela com referência a obrigação
principal ou acessória. Entretanto, em algumas decisões o STJ começou a
desconsiderar a antiga orientação do extinto Tribunal Federal, como no caso do
Recurso Especial 181277/SC, de 03/04/2001:
Tributário Denúncia Espontânea. Multa Indevida Art. 138, CTN. 1. Sem antecedente procedimento administrativo descabe a imposição de multa. Exigi-la, seria desconsiderar o voluntário saneamento da falta, malferindo o fim inspirador da denúncia espontânea e animando o contribuinte a permanecer na indesejada via da impontualidade, comportamento prejudicial à arrecadação da receita tributária, principal objetivo da atividade fiscal. (...) 3. Precedentes reiterativos. 4. Recurso Provido.
Deve-se ponderar que a Denúncia Espontânea realizada de forma válida,
dentro dos ditames da Lei, já é suficiente para excluir a punibilidade e a
responsabilidade em matéria penal tributária. Caso o sujeito passivo reconheça o
débito tributário, declara-o ao fisco, já está realizado a exigência para que seja
excluída a punibilidade.
O pagamento ou não desta dívida declarada e reconhecida pelo sujeito
passivo, é questão de mero adimplemento ou inadimplemento civil, e não tem mais
relação com os crimes tributários. Assim é, porque não se pode incriminar por dívida
30
no Brasil, com exceção da dívida de alimentos, em face da adesão do País ao Pacto
de San Jose da Costa Rica.
O artigo 138 do CTN não reconhece essas ilações, porque prevê de forma
diferente:
Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de sua apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.
Por sua vez, AMARO (2002, p. 430), explica o que é espontaneidade da
denúncia e seus termos:
Para ter eficácia a denúncia, ela há de ser espontânea. Se se trata de infração conscientemente praticada, a denúncia é motivada pelo arrependimento do infrator (ainda que o arrependimento seja temperado pelo medo de vir a sofrer alguma sanção). Mas pode também ter ocorrido a infração de modo involuntário, vindo o infrator, posteriormente, a dar-se conta de que agiu em descordo com a lei; cabe, aqui, igualmente, a denúncia espontânea, embora não haja, no caso, lugar para falar-se em arrependimento.
Depois que o fiscal lavrou o termo de início de fiscalização, onde disse
que vai investigar tal ou qual coisa, isso já está fora da espontaneidade. Mas a lei
ordinária tem tratado este assunto diferentemente dos conceitos tradicionais da
Constituição e do Código Tributário Nacional.
MACHADO (2002, p. 135), também elucida o conceito e os elementos
constitutivos da denúncia espontânea, inclusive sobre a legalidade do instituto:
...Assim, o sujeito passivo que procura o fisco, espontaneamente, e confessa o cometimento de infração não será punido. Sua responsabilidade fica excluída pela denúncia espontânea da infração Mas se o cometimento da infração implicou o não pagamento de tributo, a denúncia há de ser acompanhada do pagamento do tributo devido. (...) O cumprimento de uma obrigação acessória fora do prazo legal configura nitidamente uma forma de denúncia espontânea da infração, e afasta, portanto, a responsabilidade do sujeito passivo. Assim, se alguém faz a sua declaração de rendimentos fora do prazo legal, mas o fez espontaneamente, porque antes de qualquer procedimento fiscal, nenhuma penalidade é cabível. Lei ordinária que estabelece o contrário é desprovida de validade, porque conflitante com o art. 138 do Código Tributário Nacional.
3.5.2. Extinção da Punibilidade pelo Pagamento
O Regulamento do IPI – RIPI, em seu artigo 459, prevê uma das
hipóteses de extinção da punibilidade pelo pagamento do imposto:
Art. 459. Não serão aplicadas penalidades:
31
I - aos que, antes de qualquer procedimento fiscal, anotarem, no livro Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrência, modelo 6, qualquer irregularidade ou falta praticada, ressalvadas as hipóteses previstas nos arts. 442, 443, 445, parágrafo único, inciso I, 463 e 483 (Lei n.º4.502, de 1964, art. 76, inciso I); II - aos que, enquanto prevalecer o entendimento, tiverem agido ou pago o imposto (Lei n.º4.502, de 1964, art. 76, inciso II): a) de acordo com interpretação fiscal constante de decisão irrecorrível de última instância administrativa, proferida em processo fiscal, inclusive de consulta, seja ou não parte o interessado (Lei n.º4.502, de 1964, art. 76, inciso II, alínea "a"); b) de acordo com interpretação fiscal constante de decisão, de primeira instância, proferida em processo fiscal, inclusive de consulta, em instância única, em que for parte o interessado (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 76, inciso II, alínea "b", e Lei n.º 9.430, de 1996, art. 48); c) de acordo com interpretação fiscal constante de atos normativos expedidos pelas autoridades fazendárias competentes dentro das respectivas jurisdições territoriais (Lei n.º 4.502, de 1964, art. 76, inciso II, alínea "c").
Mas é a lei 10.684/2003 em seu artigo 9º, que elenca as possibilidades de
extinção da punibilidade em crimes tributários, e são eles:
Art. 9º. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. § 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. § 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do
Recurso em Sentido Estrito 2006.51.06.000383-2, in Revista dos Tribunais (Março
2007, p. 736), entende que o pagamento do tributo extingue a punibilidade,
independentemente se este ocorrer antes ou depois do oferecimento da denúncia,
visto que a Lei 10.684/2003 é lei nova mais benéfica ao acusado, e retroage:
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE – Ocorrência – Apropriação indébita previdenciária – Quitação integral do débito proveniente da falta de recolhimento de contribuição previdenciária – Irrelevância se o pagamento se deu antes ou depois do recebimento da denúncia, tampouco se se trata de contribuições descontadas dos empregados ou de cunho patronal – Inteligência do art. 9º, Parágrafo 2º, da lei 10.684/2003. Ementa Oficial: Recurso em Sentido Estrito. Crime de apropriação indébita previdenciária. Pagamento integral do débito. Extinção da punibilidade. Art. 9º, parágrafo 2º, da lei 10.684/2003. Lei nova mais benéfica.
A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está firme, no sentido de
acatar o instituto da extinção da punibilidade pelo pagamento e parcelamento do
imposto, como descrito no Acórdão de Hábeas Corpus HC85452/SP:
HC85452 / SP - SÃO PAULO - HABEAS CORPUS. EMENTA: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DESCONTADAS DOS EMPREGADOS. PARCELAMENTO E QUITAÇÃO APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO
32
DA PUNIBILIDADE, POR FORÇA DA RETROAÇÃO DE LEI BENÉFICA. As regras referentes ao parcelamento são dirigidas à autoridade tributária. Se esta defere a faculdade de parcelar e quitar as contribuições descontadas dos empregados, e não repassadas ao INSS, e o paciente cumpre a respectiva obrigação, deve ser beneficiado pelo que dispõe o artigo 9º, § 2º, da citada Lei n. 10.684/03. Este preceito, que não faz distinção entre as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados e as patronais, limita-se a autorizar a extinção da punibilidade referente aos crimes ali relacionados. Nada importa se o parcelamento foi deferido antes ou depois da vigência das leis que o proíbe: se de qualquer forma ocorreu, deve incidir o mencionado artigo 9º. O paciente obteve o parcelamento e cumpriu a obrigação. Podia fazê-lo, à época, antes do recebimento da denúncia, mas assim não procedeu. A lei nova permite que o faça depois, sendo portanto, lex mitior, cuja retroação deve operar-se por força do artigo 5º, XL da Constituição do Brasil. Ordem deferida. Extensão a paciente que se encontra em situação idêntica. Decisão: A Turma deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. 1a. Turma, 17.05.2005. Relator (a): Min. EROS GRAU. Julgamento: 17/05/2005. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação DJ 03-06-2005 PP-00045 EMENT VOL-02194-02 PP-00418. RDDT n. 120, 2005, p. 221. RTJ VOL-00195-01 PP-00249
3.5.3. Extinção da Punibilidade pelo Parcelamento dos Débitos
O TRF – Tribunal Regional Federal da 5ª. Região, consoante
entendimento no julgamento do HC2466/PB (2006.05.00.024503-7), entende que a
suspensão punitiva do Estado ocorre com o parcelamento do débito tributário,
mesmo que este aconteça após o oferecimento da denúncia, extraído da Revista
dos Tribunais (Agosto 2.007, p. 725):
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA – suspensão da pretensão punitiva do Estado – Ocorrência – Parcelamento do débito tributário após o oferecimento da denúncia – Circunstância não alterada se procedimento administrativo, visando a exclusão da empresa de programa especial de parcelamento, não foi concluído – Inteligência do art. 9º. Da lei 10.684/2003. FALSIDADE IDEOLÓGICA – Princípio da consunção – Aplicabilidade –Falsum perpetrado em vista de sonegação fiscal – Conduta que deve ser absorvida pelo crime contra a ordem tributária. Ementa Oficial: Penal. Habeas Corpus. Art. 299 do CP. Art. 1º, I, da lei 8.137/90. Parcelamento de débito posterior ao recebimento da denúncia. Suspensão da pretensão punitiva estatal. Art. 9º da lei 10.684/2003. Absorção do falsum pelo ilícito tributário. Ordem concedida.
Apesar de assunto controvertido nos tribunais, a Extinção da punibilidade
pelo parcelamento de débitos, no início, seguiu a corrente de que somente é
possível extinguir a punibilidade pela denúncia espontânea ou pelo pagamento e
parcelamento do tributo, se esta ação ocorrer antes do início da ação fiscal.
Posteriormente, o entendimento passou a admitir a extinção da punibilidade no
período enquanto estava sendo discutido a matéria em âmbito administrativo,
porque somente após o encerramento do processo administrativo é que há o efetivo
33
reconhecimento e lançamento do tributo devido. Com o advento da Lei 9.249/95, e
seu art. 34, a exclusão da punibilidade foi aceita até o oferecimento da denúncia.
A Medida provisória 1.923 de 6 de outubro de 1.999, que trata do
Refinanciamento de dívidas tributárias, suspendeu a pretensão punitiva do Estado,
referente aos crimes contra a ordem tributária, durante o período em que a pessoa
jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no Refis, ou
aos parcelamentos alternativos, desde que a inclusão no referido Programa tivesse
ocorrido antes do recebimento da denúncia criminal.
Finalmente, a Lei 10.684/03, trouxe as regras atuais sobre a extinção da
punibilidade nos crimes tributários. Esta lei, de caráter ordinário, tem sido
interpretada além dos meandros preconizados pela lei complementar (CTN – Código
Tributário Nacional), hierarquicamente superior. Algumas decisões judiciais, como
visto, têm reconhecido o parcelamento e a anistia a todos e quaisquer débitos, sem
as distinções preconizadas pela lei complementar (CTN).
Destarte, abrigar fatos criminosos contra a ordem tributária no bojo da Lei
10.684/03 consiste em flagrante inconstitucionalidade. Isto porque, a lei ordinária
vem a dizer mais que a lei complementar (CTN), subvertendo a hierarquia das leis e
o processo legislativo como está estabelecido na Carta Magna em seus artigos 24,
§1º, e art. 59.
Ainda, deve-se atentar para o conteúdo do art. 111 do CTN, que
determina: "Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I –
suspensão ou exclusão do crédito tributário".
O parcelamento e a anistia são, respectivamente, casos de suspensão e
exclusão do crédito tributário, e como tais, não permitem que a interpretação fuja ao
preciso conteúdo dos vocábulos, isto é, quando a lei fala em parcelamento ou anistia
deste crédito, somente é aplicável àqueles casos não configuradores de atos
dolosos, fraudulentos ou simulados do contribuinte, nos quais se incluem os crimes
contra a ordem tributária.
34
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A extinção da punibilidade em crimes tributários é assunto atual, no
sentido de que, com o aperfeiçoamento do Estado buscando o aumento e a eficácia
da arrecadação, o sujeito passivo da obrigação tributária pode incorrer em crime
tributário, muitas vezes, na modalidade culposa, o que gera certa insegurança,
principalmente, quando os contribuintes/responsáveis não possuem orientação
profissional adequada nas questões atinentes ao reconhecimento de tributos.
Observa-se que, na aplicação da lei penal em crimes tributários, deve
estar presente o elemento subjetivo dolo, que é a vontade livre e consciente, de
realizar o ato ilícito. Ainda, cabe ao ente tributante, a prova deste elemento subjetivo,
visto que meras ilações ou a prova da existência do não pagamento ou declaração
do tributo, não produz o dolo, sendo necessário a comprovação efetiva desta
vontade do agente.
Pelo viés Estatal, a extinção da punibilidade é instituto utilizado na
denúncia espontânea, visto que o interesse é especificamente o recolhimento do
tributo e, em ocorrendo este, o Estado se desinteressa pela aplicação da lei penal.
Pode-se chamar este desinteresse em penalizar após o pagamento do tributo, de
pena criminal vinculada ao não reconhecimento ou declaração do tributo devido.
Como nossa legislação veda a prisão por dívida, pela incorporação do
pacto de San Jose da Costa Rica sobre os direitos humanos, o mais lógico para
enquadrar esta penalização em face do não pagamento de tributo, é que, o que o
instituto penalizador busca não é a penalização pelo não-pagamento, mas sim a
penalização pela sonegação ou fraude decorrente da não declaração do tributo
devido. Neste sentido, a falta de pagamento é mero ilícito civil que gera uma dívida
em mora e não pode nunca, gerar conseqüências criminais.
De modo geral, a extinção da penalidade em crimes tributários é válida
como instituto coercitivo à sonegação ou fraude fiscal, mas que não deve ser
utilizado para obrigar o pagamento do tributo, que, conforme exposto, é condição de
35
inscrição em dívida ativa e cobrança nos termos da lei civil, mas sim, para intimidar a
possibilidade de crimes tributários como fraude, sonegação e conluio.
O entendimento legal sobre a possibilidade da extinção da punibilidade
nos crimes tributários sofreu alterações no tempo, face a vigência de diferentes leis
ordinárias, e até mesmo Medidas Provisórias, que regulamentaram a matéria nos
últimos anos. Mesmo fugindo da boa técnica jurídica e legislativa para
regulamentação de assunto atinente à matéria de Lei Complementar, no caso o
Código Tributário Nacional, nossos Tribunais aceitaram a aplicação das leis
ordinárias, mesmo no que se contradizeram em relação á Lei Complementar.
Afora os questionamentos de técnica legislativa e jurídica no tratamento
da matéria por nossos legisladores e Tribunais, o assunto possui alguns aspectos
muito controvertidos, principalmente na Doutrina, no que tange ao Planejamento
Tributário e a elisão e evasão fiscal. Pontos de vistas diferentes, uns mais voltados à
ética, e outros direcionados à aplicação da lei no caso concreto, remetem a pesquisa
ao aprofundamento da jurisprudência e das leis, que atualmente, orientam os
Tribunais, essencialmente positivistas e políticos, na aplicação da lei.
Pretende-se, com esta afirmação, situalizar o estudo dos casos jurídicos
no Brasil, principalmente pela posição altamente política dos Tribunais Superiores,
que julgam a aplicação das leis, mesmo aquelas inconstitucionais, muito mais pela
manutenção de um status quo positivista e palpável, que determina a existência da
segurança jurídica do Estado, do que em função do direito objetivo do
contribuinte/responsável, que do lado inverso, mantém o equilíbrio econômico-
financeiro da sociedade.
Os Crimes Tributários, neste cenário, representam volumes monetários
consideráveis do PIB – Produto Interno Bruto do País, o que leva a exigir uma
contextualização mais clara e uniforme, que delimite até onde o Estado pretende a
aplicação da Lei Penal e da Lei Tributária sobre os contribuintes/responsáveis, o
que, sabidamente, tem produzido autos de infração de valores estratosféricos que,
muitas das vezes, torna inviável a continuidade do empreendimento ou atividade do
autuado. Num País com problemas sociais de geração de emprego, renda e riqueza,
cabe ao Estado sopezar até onde pretende aplacar a voracidade arrecadatória e
penalizadora das atividades negociais que burlam o pagamento do tributo.
36
Torna-se, então, premente a organização do planejamento estatal, no
sentido de, se por um lado, busca trazer à lume a correta aplicação da lei tributária e
penal, com conseqüente aumento da arrecadação estatal, que faça, do lado
contrário, um contra-balanceamento que diminua o peso da tributação sobre certos
setores da economia ou retorne à sociedade a aplicação dos recursos novos, à fim
de compensar o estrago que a aplicação rígida e tenaz da lei resulta.
É notório a força, a coercibilidade e o poder do Direito Tributário sobre a
sociedade, que amparado pelo controle social do Direito Penal, gera uma áurea de
temor à existência do crime e ao não-pagamento do tributo. Dois ramos do Direito
Público de maior força, aplicados na consecução de um objetivo estatal direto; a
arrecadação.
37
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues. Curso de direito tributário. São Paulo:
Celso Bastos editor, 2002.
2.AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2002.
3. BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito Penal, parte geral, volume I,
9. ed., São Paulo: Saraiva, 2.004.
4. BRANDÃO, Cláudio. Teoria jurídica do crime. Rio de Janeiro: Forense, 2.003.
5. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 14. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002.
6. CÓDIGO PENAL, Decreto-Lei 2.848 de 07/12/1940. Vade Mecum, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2.007.
7. CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL, Lei nº 5.172/66, Vade Mecum, São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2.007.
8. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, promulgada em 5
de outubro de 1988, Vade Mecum, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2.007
9. CORRÊA, Antonio. Dos Crimes Contra a Ordem Tributária. 2. ed., São Paulo:
Saraiva, 1996.
10. COSTA JR, Paulo José da. DENARDI, Zelmo. Infrações Tributárias e Delitos
Fiscais. 3. ed., São Paulo: Saraiva, 1998.
11. DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal, parte geral, Rio de Janeiro:
Forense, 2001.
12. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 20. ed., São Paulo:
Malheiros, 2002.
13. MALERBI, D.P.M. Elisão Tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1.984.
14. MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal, Parte Geral, Arts 1º a 120
do CP, 13. ed., São Paulo: Atlas, 1.997.
38
15. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de direito tributário. 10. ed., São Paulo:
Saraiva, 1990.
16. PRADO, Luiz Regis. BITTENCOURT, Cezar. Curso de Direito Penal brasileiro:
parte geral: arts. 1º a 120. v.1. 3.ed. ver., atual. e amp. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002.
17. QUEIROZ, Paulo de Souza. Direito penal: introdução crítica. São Paulo:
Saraiva, 2005.
18. REVISTA DOS TRIBUNAIS. Ano 96 – Março de 2007 – vol 857. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2.007.
19. REVISTA DOS TRIBUNAIS. Ano 96 – Agosto de 2007 – vol 862. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2.007.
20. SANTOS, M. dos. A elisão fiscal. Cadernos de Direito Tributário, São Paulo,
1.972.
21. XAVIER, A.S.P. Evasão e elisão fiscal e o art. 51 do pacote. In:Revista de
Direito Tributário, São Paulo, 1.987.
22. EDITORIAL. Disponível em <www.yahoo.com/s/09092007/25/economia-sonega-
impostos-equivale-30-pib.html> Acessado em 09/09/2007.
23. JURISPRUDÊNCIA STF. Disponível em <www.stf.gov.br> acessado em
24/09/2007.
24. JURISPRUDÊNCIA STJ. Disponível em<www.stj.gov.br> acessado em
24/09/2007.