FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS Maria Renata Fonseca Yarochewsky A EXIGIBILIDADE DO CHEQUE SUSTADO Nova Lima 2006
FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS
Maria Renata Fonseca Yarochewsky
A EXIGIBILIDADE DO CHEQUE SUSTADO
Nova Lima
2006
Maria Renata Fonseca Yarochewsky
A EXIGIBILIDADE DO CHEQUE SUSTADO
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Faculdade de Direito Milton Campos, na área de concentração em Direito Empresarial, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Wille Duarte Costa
Nova Lima
Faculdade de Direito Milton Campos
2005
Maria Renata Fonseca Yarochewsky
A exigibilidade do cheque sustado
Dissertação elaborada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito, na área de concentração em Direito Empresarial, ofertado pela Faculdade de Direito Milton Campos, sendo apresentada perante a banca examinadora composta pelos ilustres juristas abaixo relacionados, na cidade de Nova Lima, em 2006. __________________________________________________ Prof. Dr. Wille Duarte Costa (Orientador) - Milton Campos __________________________________________________ Primeiro Examinador - Milton Campos __________________________________________________ Segundo Examinador - Milton Campos
Agradeço a Deus que me dotou de
condições, várias, para chegar aonde cheguei.
No início, de nada dispunha. No entanto,
não me faltou apoio para o meu crescimento,
nem luz bastante para clarear minhas idéias.
Na certeza de ser ainda longo o meu
caminho na busca do conhecimento e da
sabedoria, continuo a agradecer, sempre.
“Os animais se salvam pela ignorância e
os anjos, pelo conhecimento; entre eles, o ser humano
vacila, pende,
hesita.” RUMI.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................................... 8
2 DO CHEQUE.................................................................................................................. 11
2.1 Definição e surgimento do crédito ............................................................................ 11
2.2 Origem histórica do cheque....................................................................................... 14
2.3 Conceito ....................................................................................................................... 17
2.4 Requisitos do cheque ................................................................................................. 19
2.5 Legislação aplicável ................................................................................................... 21
2.6 Espécies de cheque ................................................................................................... 22
2.6.1 Cheque visado ......................................................................................................... 22
2.6.2 Cheque administrativo............................................................................................. 23
2.6.3 Cheque cruzado....................................................................................................... 24
2.6.4 Cheque ao portador................................................................................................. 25
2.6.5 Cheque à ordem ...................................................................................................... 25
2.6.6 Cheque nominativo .................................................................................................. 26
2.7 Utilização prática e inadimplência no cheque ......................................................... 27
2.7.1 Cheque sem fundos................................................................................................. 27
2.7.2 Cheque pré-datado.................................................................................................. 28
3 DA FORMA E PROVA DO CHEQUE ........................................................................ 32
3.1 Rigor cambiariforme................................................................................................... 32
3.2 Declarações cambiais no cheque............................................................................. 36
3.3 Apresentação e acatamento da ordem de pagamento.......................................... 39
4 CONTRA-ORDEM E OPOSIÇÃO............................................................................... 45
4.1 Revogação ou contra-ordem ..................................................................................... 45
4.2 Eficácia temporal da revogação ............................................................................... 46
4.3 Oposição ou sustação................................................................................................ 47
4.4 Autonomia e independência x sustação: situação conflitante ............................... 49
4.5 Implicações da sustação de cheques....................................................................... 51
4.6 Aspectos comuns e confrontantes entre os institutos da contra-ordem e oposição 52
5 DECLARAÇÕES DE VONTADE NO TÍTULO E FORA DELE............................. 56
5.1 Teoria da vontade ....................................................................................................... 56
5.2 Emissão: declaração de vontade.............................................................................. 58
6 APLICABILIDADE DA SUSTAÇÃO.......................................................................... 63
6.1 Oposição no cheque administrativo.......................................................................... 63
6.2 Dívida de jogo.............................................................................................................. 64
6.3 Morte ou incapacidade do emitente ......................................................................... 66
7 DO NÃO PAGAMENTO DO TÍTULO......................................................................... 68
7.1 Ação cambial............................................................................................................... 68
7.2 Cheque prescrito ......................................................................................................... 72
7.3 Defesa do executado.................................................................................................. 75
8 A RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA.......................... 77
8.1 Responsabilidade civil - conceito.............................................................................. 77
8.1.1 Da responsabilidade subjetiva ............................................................................... 77
8.1.2 Da responsabilidade objetiva................................................................................. 78
8.2 Da responsabilidade dos estabelecimentos bancários......................................... 78
8.2.1 Prejuízo e dano......................................................................................................... 78
8.2.2 A ilicitude e a culpa.................................................................................................. 79
8.3 A atividade bancária à luz do CDC........................................................................... 84
8.4 Da responsabilidade pelo pagamento de cheque sustado................................... 86
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 90
REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 93
ANEXO A - Lei do Cheque n. 7357/85 (DOU 02/09/85) .............................................. 97
ANEXO B - Resolução 2.747/2000 (BACEN) ............................................................... 114
ANEXO C - Cheque sustado............................................................................................ 121
8
1 INTRODUÇÃO
A idéia de se dissertar sobre o presente tema nasceu de um questionamento
eivado de indignação tecido por um estagiário que, com dúvidas, me procurou
buscando auxílio e consolo frente à sua situação de impotência e incapacidade uma
vez que a despeito de ser portador de um cheque, (título executivo, como haviam lhe
ensinado) teria sido o mesmo, vítima do até então desconhecido golpe do não
pagamento por sustação. As dúvidas pairavam na legalidade do ato a ele praticado,
se seria costumeira tal prática, sobre a força executiva que teria tal título, se teria o
mesmo se transformado em apenas mais um papel sem qualquer valor, qual seria o
procedimento dali para frente, etc, etc, etc.
E foi na esteira daquela situação fática tão próxima, que julgando-a verdadeira
afronta não somente ao estagiário perdido mas a toda uma sociedade, é que tratei de
me debruçar sobre o assunto, buscando elucidar incertezas que descobri no meu
parco âmbito de conhecimentos jurídicos também habitarem.
Portanto, tem esta dissertação a função de se analisar, através de
questionamentos e exposições, as hipóteses e cabimentos de impedimento ao
pagamento de cheques, que é sabido poder este ocorrer através dos institutos da
oposição, vulgarmente conhecido por sustação ou da contra-ordem ou revogação, bem
como transcorrer sobre a eficácia do cheque sustado ou revogado, enquanto título
executivo em decorrência da possibilidade de haver se ordenado o não pagamento.
Nosso objetivo é elucidar, ou ao menos suscitar questões ainda por vezes
obscuras e construtoras de divergentes opiniões por parte de nossos doutrinadores e
9
juristas - quais seriam os motivos ensejadores da sustação ou revogação do
pagamento do cheque.
Muitos pontos são hoje pacíficos, mas muito ainda está por ser feito!
Desenvolveremos o tema, excursionando por antigas épocas, tão remotas,
onde só o que podemos é nos contentar em reter informações por vezes até
divergentes, no que diz respeito ao nascimento de um documento que há muito
incluíram na categoria de título de crédito e que então passaram a nomear como
Cheque. Citaremos seus requisitos de validade, seus tipos, sua finalidade e forma de
utilização e cobrança, levando sempre em boa conta que é o cheque grande propulsor
de negócios empresarias e econômicos de uma sociedade, principalmente face à sua
complexa circulação que guarda amparo na autonomia e literalidade inerentes.
Discutiremos as hipóteses possíveis, permitidas e proibidas para o não
pagamento, a autorização legal para o ato em si e, para tanto, nos esforçaremos em
destacar o que vem a ser a tão subjetiva relevante razão de direito, enquanto motivo
propício ao não pagamento, o que vem a ser a expressão da vontade e como esta se
manifesta e gera responsabilidades perante as partes e a terceiros. Estudaremos os
dois institutos, na medida em que ambos representam sob o prisma do banco sacado,
uma diligência de caráter urgente, que se reveste da necessidade premente de se
bloquear o pagamento, mas prescinde de outras conseqüências, evidenciando o
aspecto jurisdicional de uma demanda, cujo desfecho, sabemos depender de análise
minuciosa e comprovada de se ter ou não ocorrido um procedimento correto por parte
do sacador, que emitiu a ordem de pagamento.
Da análise das possibilidades de se impedir o não pagamento, certamente
caberá deixar evidente que tal ato não descaracteriza o título enquanto representação
10
de um crédito, que poderá, desta feita, ser cobrado em juízo.
Tudo com o intuito único de se demonstrar que a sustação, que nasceu para
tranqüilizar e assegurar direitos dos correntistas, em algum ponto de seu caminho, teve
sua finalidade desvirtuada, passando hoje a ser instrumento fácil e “seguro” de se
fraudar a lei, evitando-se, através de forma legal, seja o nome do emitente de cheques
sem fundos, inserido nos órgãos cadastrais de restrição ao crédito.
Não obstante a isso, acrescentamos ser problemática a situação da sustação
no pagamento do cheque, situação que se tornou corriqueira frente a facilidade da
prática do ato conferida pela lei e aderida pelas instituições bancárias, surgindo daí os
aspectos que ora apresentaremos pelo entrechoque na acirrada disputa entre a
vontade do cliente da instituição e a do portador legitimado do título, e na aferição da
responsabilidade da instituição bancária frente a ambos.
Dissertaremos sempre com o escopo de trabalhar o Direito como um todo; por
certo respeitando a especialização, mas acreditando que o Direito que se vê por um
todo é visto de uma maneira melhor do que aquele que se esforça para ser visto em
específico.
11
2 DO CHEQUE
2.1 Definição e surgimento do crédito
“Crédito. (Do lat. Creditu, pelo it. Credito) S.M. 1. Segurança de que alguma
coisa é verdadeira;confiança.... 7. Econ. Cessão de mercadoria, serviço ou
importância em dinheiro, para pagamento futuro”.1
Segundo Luiz Emydio F. da Rosa Jr., a doutrina elaborou alguns conceitos
econômicos de crédito e apresenta o citado autor alguns, citando então Charles Guide,
Stuart Mill e Werner Sombart. Vejamos: “a) crédito é a troca no tempo e não no espaço
(Charles Guide); b) crédito é a permissão de usar capital alheio (Stuart Mill); c)- crédito
confere poder de compra a quem não dispõe de recursos para realizá-lo (Werner
Sombart).”2
Quanto a sua origem etmológica, certo é que o termo crédito deriva do latim
creditum decorrente do italiano credere, que é confiar, acreditar, ter fé. Pode ainda o
termo ter outros significados como por exemplo o direito que alguém tem em receber
de outrem a prestação objeto de uma a obrigação, ou a confiança que uma pessoa
inspira em outra, baseada em seus atributos morais. Significado este último que
sabemos outrora ter sido tão largamente utilizado, quando outros eram os conceitos de
moralidade e honestidade cultuados e na maioria das vezes a palavra bastava. Sob
1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua
portuguesa. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 575. 2 ROSA JUNIOR, Luiz Emydio Franco da. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 1.
12
este prisma, o elemento confiança, se analisado objetivamente, poderia se dizer hoje
quase em extinção, já que as instituições financeiras, ao efetivarem operações de
crédito, exigem toda a sorte de garantias a serem prestadas pelo financiado. Curioso
é, o fato de tal elemento, ou seja, a confiança, em situação avessa, ser ainda praticado
na prática da agiotagem, onde por proibição legal, não se institucionaliza a agente
financeira, imperando portanto a confiança desta no financiado, sem nenhum respaldo.
O outro elemento, o tempo, insta dizer, corresponde ao período entre o
momento do cumprimento da prestação atual, por quem concede o crédito e o
momento da prestação futura a ser satisfeita por quem o recebeu. Desta feita, o prazo
decorre da própria noção de crédito.
Ao longo da história da civilização humana, o homem, vivendo em sociedade,
dotado de inteligência e guiado pelas suas necessidades, estabeleceu o conceito de
crédito e a forma de pagamento dos bens cuja aquisição se fazia necessária à sua
subsistência.
Por certo é que, nos idos tempos, o que se operava era o escambo, onde
cada indivíduo trazia à praça o que tinha em excesso e ali postulava o que necessitava.
Desta prática de troca, surgiram e fizeram riqueza os mercadores, que viviam da
comercialização destes excessos.
Contudo, com o tempo, descobriu-se ser o escambo meio impróprio de se
suprirem as necessidades, já que este limitava a troca, implicando, pois numa conexão
de necessidades. Ou seja, quem tinha sal e precisava de açúcar, podia não consegui-
lo, pois quem tinha açúcar poderia não querer sal.
Daí que, diante da instalada necessidade, uma vez mais dotado de
inteligência, de inventividade, descobriu o homem que determinadas mercadorias
13
eram de maior necessidade e, portanto de maior e mais fácil comercialização,
passando então a utilizarem-se destas como moeda de troca.
Fruto deste processo evolutivo de troca, surge a utilização do metal e das
elaboradas técnicas de sua fundição, surgem as moedas, cunhadas pelos ourives da
época. Sobre o tema, cita Othon Sidou:
Os trapezitae, gregos, e os argentari, romanos, netos dos fenícios primevos, cujas transações se estendiam à Arábia, à África Central, à Espanha, à Inglaterra e o mar do Norte, incumbiam-se, mais requintadamente, das remessas de dinheiro para as mais diversas e distantes praças, mercê das relações que mantinham com outros banqueiros nelas estabelecidos, e sobre os quais sacavam as somas que lhes eram confiadas. Praticavam contratos de câmbio, mas desconheciam títulos de câmbio.3
Neste momento, interessado, integra à relação o Estado, e a intervenção
Estatal passa a fazer parte direta da distribuição de riquezas, quando, nas cidades
italianas de Gênova e Veneza, os ourives, denominados (trapezitae e argentarii),
entregaram à administração pública suas funções. De posse e responsabilizado pela
confecção, guarda e circulação da moeda, passa então o Estado a fazer uso do papel
e lança à sociedade, notas ou bilhetes, primeiros símbolos do dinheiro. A respeito,
lembra o citado autor que, enquanto os romanos ainda manipulavam apenas o dinheiro
metálico, os assírios, os fenícios, os egípcios e sobre tudo os helenos, já utilizavam a
moeda-papel, sob a forma dos síngrafos, dos quirógrafos, dos bilhetes à ordem, dos
empréstimos a risco, que acabaram sendo absorvidos pelos próprios romanos nas
práticas mercantis em seu vasto império.
Desta feita, a troca, longe de ser instintiva, veio se manifestando como
expressão do raciocínio humano, de se verificar que, seja em forma de mercadorias
como sal, açúcar, especiarias, seja sob a forma de metal, ainda por nós utilizado, a
3 SIDOU, J. M. Othon. Do cheque: lei nacional combinada com a lei uniforme, jurisprudência. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 10.
14
unidade de valor encontrada foi fruto da sua evolução, e conseqüentemente, como
forma de extinção desta obrigação, surge o crédito e o pagamento.
2.2 Origem histórica do cheque
Antes de iniciarmos nosso estudo sobre o atual instituto do cheque, importante
é que façamos uma viagem aos tempos passados, mais precisamente à idade média,
nas pequenas cidades italianas onde nasceu a atividade mercantil.
Foi com o exercício em grande escala da atividade de mercancia naquelas
cidades que surgiu a necessidade de aquisição de bens para pagamento posterior,
necessidade esta que mais tarde chamariam de crédito. Palavra de origem latina, que
do italiano credere está em seu sentido ligada à idéia de acreditar, confiar, crer que o
pagamento prometido no presente será futuramente realizado. Da observância desta
necessidade de disponibilizar-se no presente, um valor futuro, a fim de que se pudesse
adquirir determinado bem, surgem os documentos escritos, que incorporavam o
crédito, fazendo-o não só garantir o negócio primário mas também possibilitando a
circulação deste crédito confiado.
Segundo a doutrina, os primeiros títulos de crédito foram a letra de câmbio e a
nota promissória, desenvolvidos nas cidades italianas, durante a baixa Idade Média.
Quanto à origem do próprio instituto do cheque, pouco se tem escrito em
nossas doutrinas. Todavia, acredita-se que o documento nasceu derivado da letra de
câmbio, há muito já utilizada, conforme acima citado. Historicamente a letra de câmbio
provém do contrato de câmbio, que era toda permuta, principalmente a de dinheiro. Os
negociantes de praças diferentes, quando da liquidação de suas operações, deviam
15
remeter o dinheiro e estavam sujeitos aos riscos de transporte, como a perda ou
roubo. Institui-se então, o hábito de encarregarem-se pessoas para realizar este
transporte por sua conta e risco. Lavrava-se com o notário, um documento que, como
observa Bonelli, “conteneva la menzione della moneta ricevuta e l’obbligo di pagarne
l’iquivalente nel luogo e tempo stabilito per più o personalmente o per mezzo di
mandatário, a colui Che diè il denaro o a um suo mandatário”4.
Era a troca de “pecúnia praesenti cum pecúnia absenti”.
Contudo, esta solução demonstrou-se insatisfatória porque se limitava a
transferir o risco da perda do remetente, ao transportador do dinheiro.
Surge então o câmbio trajetício, que consistia na troca de uma moeda
independentemente de seu transporte. Operava-se a troca à distância, através da
entrega da moeda pelo comprador em determinado local, para receber, em lugar
diverso, outro tipo de moeda. Nesta operação, quatro pessoas tomavam parte: o
devedor, o credor e dois depositários e realizava-se da seguinte maneira: o devedor
de quantia certa (de residência em lugar diverso da do credor) entregava em sua
cidade, a importância devida ao depositário, para efetuar o pagamento. Este, por sua
vez, autorizava o depositário da cidade em que morava o credor, e com quem possuía
dinheiro, a pagar-lhe o mencionado débito. Tal pagamento, naturalmente, deveria ser
feito na moeda do lugar em que morava o credor.
Tal operação, para muitos de nossos doutrinadores é nada mais nada menos
que o nosso cheque em período embrionário, por assim dizer.
Segundo registros históricos, na idade média, tais institutos, os chamados
4 BONELLI, Gustavo. Commentario al codice di commercio. Milão: Ed. Dott. Francesco Villardi,
1914. v. 3, p. 2.
16
mandatos de pagamento, eram utilizados pelo poder público, reis ingleses e
imperadores alemães e isto lhes imprimia segurança e poder. Neste período, com o
crescimento do comércio nas cidades italianas, os negociantes, para evitar os
inconvenientes sobrevindos com a guarda e transporte de dinheiro, passaram a
depositá-lo em estabelecimentos seguros, à semelhança de nossos bancos atuais. E
dizem que foi daí que, à medida que tais cidades se desenvolviam comercialmente,
ampliavam-se seus serviços bancários. Desta feita, os bancos lançavam em seus
livros os depósitos e os clientes poderiam deles lançar mão, ou diretamente,
comparecendo em pessoa para receber o dinheiro, ou indiretamente, por meio de
títulos emanados dos bancos ou mandatos diretos dos depositantes.
A despeito de terem sido identificadas origens remotas do cheque em outros
locais, acredita-se que a Inglaterra foi o primeiro país em que o cheque se generalizou,
motivo porque é apontado por muitos como pátria do cheque. Para grande parte dos
doutrinadores, foi a Inglaterra o local de nascimento do título da forma como hoje se
apresenta, com as chamadas Ordens de Pagamento dos Reis contra o Tesouro,
posteriormente denominadas bills of exchequer. Tem-se que a raiz britânica do
instituto evidencia-se por sua própria denominação, relacionada ao verbo inglês to
check, que significa verificar, controlar. Ainda alguns outros doutrinadores sustentam
que o termo cheque vem do francês ècheques, e que seria a França local de origem
do documento de crédito.
Roberto Barcellos de Magalhães, citando Muniz Barreto, assim ilustra: “O
instituto da compensação, como regulamento de liquidações bancárias, já tem longa
tradição da antiguidade, pois desde a Idade Média já desempenhava papel
17
considerável nas Feiras de Lyon”5.
Contudo e a despeito de serem vários os autores que discorrem sobre a
origem do título que com propriedade tivemos a oportunidade de pesquisar, insta
mencionar a respeitada opinião do Prof. Wille Duarte Costa, opinião esta da qual
comungamos, e que diz que “[...] na doutrina nada há que com segurança aponte com
exatidão a origem do cheque”6.
Portanto, ainda que não conheçamos com exatidão a origem do título,
reconhecemos sim que certamente este nasceu da necessidade de se transportar com
segurança a moeda da época, garantindo desta forma o pagamento/ recebimento de
um crédito futuro.
2.3 Conceito
Cheque é ordem de pagamento à vista, representada através de um título de crédito, sacada contra um banco e com base em suficiente provisão de fundos depositados pelo sacador em mãos do sacado ou decorrente de contrato de abertura de crédito entre ambos.
Na concepção da vigente lei, o cheque pode ser definido como uma “ordem de
pagamento á vista, dada contra banco, com base em suficiente provisão de fundos,
depositados pelo emitente ou provenientes de contrato de abertura de crédito”.
J. M. Othon Sidou, já propõe a seguinte definição descritiva de cheque:
5 MAGALHÃES, Roberto Barcellos de. Assinaturas falsas no cheque. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1982. p. 12. 6 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 325.
18
[...] é uma ordem emitida contra um banco, ou ente assemelhado, para que pague à pessoa, em favor de quem se emite, ou ao portador, importância certa em dinheiro, previamente posta à disposição do emitente e que será levada à sua conta. É rigorosamente um título cambial e subordina-se às regras do direito cambial, notadamente no que toca à transmissibilidade e se refere a seu aspecto autonômico.7
Da ordem contida no documento sempre destinada a um depositário dos
recursos do sacador, revela-se uma peculiaridade da natureza do cheque - a de que o
destinatário da ordem nele contida é o banco depositário que não assume, nem pode
assumir, qualquer obrigação cambial pelo pagamento dessa ordem perante o credor,
mas apenas o ônus de cumpri-la, se existirem fundos. Ou seja, a obrigação do
destinatário instituição bancária existe apenas em relação ao cliente emitente e não
face ao credor, que espera pelo pagamento. Por isso é que para muitos, o cheque
deixa de ser título de crédito próprio, já que não contém real operação de crédito.
Alguns outros autores atribuem ao cheque o caráter de ordem de pagamento à
vista, negando-lhe por isto, a natureza de título de crédito. Contudo, dentre as demais
evidências que adiante mais claramente falaremos, (endosso, aval, etc.) e que fazem
do cheque exemplo claro de título de crédito, temos por certo que se os atributos da
incorporação, da literalidade e da autonomia do direito são aplicáveis ao cheque, sua
natureza outra não é que a de título de crédito. Ademais, se o cheque é documento
necessário para o exercício do direito nele consignado, se perdido o cheque perdido
estará o direito, não há como se ver nisso uma mera forma de pagamento e não um
título de crédito!
Ilustra o entendimento, a citação do renomado Prof. João Eunápio Borges:
7 SIDOU, J. M. Othon. Do cheque: lei nacional combinada com a lei uniforme, jurisprudência. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 21.
19
Se porém o conteúdo do cheque é uma ordem cujo beneficiário a aceita, a título de pagamento, em dinheiro que lhe deve o emitente, se o cheque substitui - embora por prazo brevíssimo , mesmo que de horas ou minutos - o dinheiro devido, a qualquer título, pelo emitente; se se verificam, pois em relação ao cheque os dois elementos que caracterizam uma operação de crédito - a confiança e o prazo que intervem entre a promessa do devedor e a sua realização futura - é claro que o cheque, apesar de não passar normalmente de mero instrumento de retirada de fundos, ou de movimentação de conta bancária, é também um título de crédito.8
Dentre os respeitados doutrinadores comercialistas, dúvida alguma paira
acerca de ser o cheque verdadeiro título de crédito, dotados dos atributos da
incorporação, literalidade e autonomia do direito nele contido, em perfeita adequação
à definição de Vivante: “Título de Crédito é o documento necessário para o exercício
do direito literal e autônomo, nele mencionado”9.
2.4 Requisitos do cheque
Prova do formalismo de que se reveste o instituto ora em estudo, formalismo
este que mais adiante citaremos sob o título “rigor cambiariforme”, já em seu primeiro
artigo, preocupou-se a lei em elencar os requisitos essenciais à sua forma, sendo eles:
I-a denominação “cheque” inscrita no contexto do título e expressa na língua em que é
redigido; II - a ordem incondicional de pagar quantia determinada; III - o nome do banco
ou instituição financeira que deve pagar; IV - a indicação da data e do lugar de
emissão; VI - a assinatura do emitente ou de seu mandatário, com poderes especiais.
Sobre o emprego do termo “cheque” na cártula, comenta Othon Sidou:
O obrigatório emprego da expressão ‘cheque’ para personalizar o título, sine qua non de sua existência como tal, deriva dos princípios de escrúpulo do
8 BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. São Paulo: Malheiros Editores, 1971. p. 370. 9 VIVANTE, Cesare apud COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p.
23.
20
direito cambiário, cujas obrigações nascem para ter circulação ampla, envolvendo interesses de enésimas pessoas. Prevalece este princípio em todos os títulos cambiários. Nem a letra de câmbio nem a nota promissória vale como tal se no texto estiver omisso o designativo que lhe assegura reconhecimento instantâneo.10
Em relação à ordem de pagar determinada quantia, a lei também exige que
haja provisão de fundos em nome do emitente, em poder do sacado, sejam estes
fundos provenientes de soma de dinheiro depositado, seja através de crédito
concedido àquele, como exemplo o “cheque especial”. Mister esclarecer que não
basta a existência de fundos, mas sim que estes estejam disponíveis, hipótese que, a
ausência de fundos, a despeito de frustrar o pagamento, não descaracteriza o
documento, nem a ordem incondicional nele contida.
Quanto ao banco ou da instituição financeira que deve pagar, insta lembrar e
mais adiante trataremos sobre o tema responsabilidade, que a apresentação para
pagamento ao sacado, constitui o momento crucial da vida do cheque e, é para o
sacado, aquele momento em que se fixa a sua responsabilidade, seja por acolher uma
ordem de pagamento às vezes fraudulentamente emitida, seja por deixar de cumpri-la.
Já quanto a indicação do lugar do pagamento, a folha de cheque deve indicar
o lugar de pagamento do título, que poderá ser o local da agência onde o sacador
emitente possuir conta ou qualquer outra agência do sacado.
O art. 2º da Lei do Cheque esclarece que, na falta de indicação especial, é
considerado o lugar de pagamento o designado junto ao nome do sacado; se
designado vários lugares, o cheque é pagável no primeiro deles; não existindo
qualquer indicação, o cheque é pagável no local de sua emissão, portanto, de se
concluir ser o presente requisito suprível e não essencial.
10 SIDOU, J. M. Othon. Do cheque: lei nacional combinada com a lei uniforme, jurisprudência. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 24.
21
Dentre os mais importantes requisitos do cheque certo é que a data apresenta
papel relevante já que é ela marco inicial das contagens de prazos de apresentação do
cheque ao sacado, e conseqüentemente da prescrição da ação executiva.
Por fim, no que tange à assinatura do título, no nosso entendimento, a mais
pura manifestação da vontade do emitente, a exigência legal paira sobre a
competência para tal ato, uma vez que esta só poderá ser aposta por quem detenha
poderes para tanto.
Ainda quanto à forma que assume o título, tem-se que é o cheque um título de
crédito de modelo vinculado, ou seja, tem forma específica determinada por lei.
Portanto, um cheque só será tido como tal se lançado em formulário próprio fornecido,
por talão padronizado, pelo próprio banco sacado, atendendo as especificações do
Banco Central do Brasil (BACEN - Anexo B).
2.5 Legislação aplicável
A primeira referência oficial que se fez ao instituto do cheque no Brasil foi em
1845, cujo regulamento, aprovado pelo Decreto n. 438 estabelecia que um dos
objetivos do banco era receber gratuitamente o dinheiro de qualquer pessoa em conta
corrente e efetuar os respectivos pagamentos e transferências.
Não obstante o instituto cheque ter sido tratado e regulamentado através da
Lei n. 1083 em 1860, não com o nome cheque, mas mandato ao portador, foi em 1893
que se atribuiu ao título o nome de cheque.
Após algumas outras legislações esparsas, o cheque veio então a ser
22
oficialmente regulado pela Lei n. 2.591 de 1912, que vigorou até 1966, quando o
Decreto n. 57.595/66 incorporou a Lei Uniforme de Genebra sobre cheques, de 1931,
cuja efetiva vigência entre nós só foi aceita após decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF) de 1971.
Em setembro de 1985 foi promulgada a atual lei do cheque, Lei n. 7.357/85,
que substituiu a lei Uniforme e passou a disciplinar o instituto no Brasil, sendo certo
que tal lei, nos dizeres de Fran Martins “é na realidade uma consolidação dos
princípios da Lei Uniforme sobre o cheque e das leis que anteriormente regularam este
título”11.
Ou seja, a Lei Uniforme passou a ser fonte residual a ser aplicada e
interpretada em conjunto com a Lei do Cheque, que por sua vez, formou-se pela
orientação da norma de Genebra.
2.6 Espécies de cheque
2.6.1 Cheque visado
É a modalidade de cheque onde por um visto ou outra declaração equivalente,
o banco obriga-se a debitar na conta do emitente a quantia indicada no cheque e
reservá-la em benefício do portador durante o prazo de apresentação, sem que fiquem
exonerados o emitente, endossantes e demais coobrigados.
Importante aqui lembrarmos que o visamento do cheque apresenta-se como
11 MARTINS, Fran. Títulos de crédito. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. v. 2, p. 10.
23
mais uma forma de se assegurar o pagamento do título, sendo certo que, se o banco
deixar de proceder a esta obrigação legal de, mediante a manifestação do emitente,
verificar a existência de fundos e apinhar na cártula a sua chancela de modo a
bloquear a importância, que necessariamente fica desvinculada da conta corrente do
emitente e reservada, responderá este pelo pagamento do cheque ao credor. Isto não
significa entretanto, que o sacado tenha obrigação cambial e sim responsabilidade
decorrente da inobservância de determinação legal e não do título de crédito. A
obrigação do banco sacado no caso é contratual.
A legalização desta modalidade apresenta-nos tipificada e regulamentada na
Lei n. 7357/85 no seu art. 7º e respectivos parágrafos:
Art. 7º - Pode o sacado, a pedido do emitente ou do portador legitimado, lançar e assinar, no verso do cheque não ao portador e ainda não endossado, visto, certificação ou outra declaração equivalente, datada e por quantia igual à indicada no título.
§ 1º- A aposição de visto, certificação ou outra declaração equivalente obriga o sacado a debitar à conta do emitente a quantia indicada no cheque e a reserva-la em benefício do portador legitimado, durante o prazo de apresentação, sem que fiquem exonerados o emitente, endossantes e demais coobrigados.
§ 2º - O sacado creditará à conta do emitente a quantia reservada, uma vez vencido o prazo de apresentação; e, antes disso, se o cheque lhe for entregue para inutilização.
2.6.2 Cheque administrativo
É uma ordem de pagamento à vista que um banco emite contra qualquer um
de seus estabelecimentos, de pagamento assegurado e aceitação legalmente
obrigatória, onde sacador e sacado se identificam.
Deste modo, o correntista solicita à instituição financeira que emita o cheque
em seu nome ou seja, diretamente em favor da pessoa na qual irá efetuar o
24
pagamento. Na legislação, mais precisamente no Decreto 24.777/1934, assim
menciona-se:
Art. 1º - Os Bancos e firmas comerciais podem emitir cheques contra as próprias caixas, nas sedes ou nas filiais e agências.
Parágrafo único - Estes cheques não poderão ser ao portador, e regular-se-ão, em tudo o mais pela lei do cheque.
Inexiste, pois nesta modalidade de cheque, propriamente uma estrutura de
saque e de ordem de pagamento, posto que o título é emitido pela instituição
financeira contra a sua própria caixa.
2.6.3 Cheque cruzado
Descrito nos arts. 44 e 45 da Lei n. 7357/85, o cheque torna-se cruzado
quando o emitente ou portador apõem dois traços paralelos no anverso do título. Tem
este cheque a função de possibilitar, a qualquer tempo, a identificação da pessoa em
favor de quem foi o título liquidado, já que a sua compensação se dá através de
depósito em conta do favorecido.
Entre os traços transversais pode haver designação de determinado banco
(cruzamento em preto) ou não (cruzamento em branco). O cheque com cruzamento em
branco somente poderá ser pago mediante crédito em conta e o cheque com
cruzamento em preto somente poderá ser pago ao banco cujo nome conste no
cruzamento, ou sendo este também o sacado, a um cliente seu, mediante depósito em
conta. Desta forma, se o credor do cheque não for correntista do banco sacado,
deverá, necessariamente, proceder à liquidação do título (pagamento) mediante
depósito em banco que possua conta.
25
O cheque cruzado gera efeitos apenas perante o sacado, que não poderá
pagá-lo sem que sejam observadas tais regras.
2.6.4 Cheque ao portador
É aquele onde, no ato de criação o sacador preenche o espaço destinado ao
beneficiário com a expressão ao portador, ou qualquer outra equivalente, ou
simplesmente deixa em branco o espaço, (abrindo mão do direito de indicar
beneficiário).
A praxe de se emitir cheques ao portador sofreu alteração em virtude da Lei n.
8.021/90, que passou a estipular o pagamento ou resgate de qualquer título ou
aplicação a beneficiário não identificado. Contudo, acreditamos que a citada lei é
norma de caráter fiscal, e com o advento desta, não se teve uma proibição da emissão
do título sem a indicação do beneficiário, nem invalida o mesmo a sua ausência.
Apenas exige-se que para o pagamento do título, o campo do beneficiário esteja
preenchido, fazendo-se clara a identificação deste. Tal requisito, vale acrescentar,
deverá ser apurado na hora da apresentação, sendo lícito ao portador, até então,
preencher o campo vazio.
2.6.5 Cheque à ordem
O cheque emitido à ordem contém explicitado o seu beneficiário, ainda que
ausente na cártula a cláusula expressa à ordem, de acordo com o art. 8º, inciso I, da
Lei n. 7.357/85, sendo certo que não é necessário que a cártula contenha a
26
mencionada cláusula, pressupondo-a na ausência da cláusula não à ordem.
Na nomeação do beneficiário, é lícito ao emitente indicar pluralidade de
beneficiários, como bem nos ensina Fran Martins:
[...] ao invés de indicar o cheque apenas uma pessoa como beneficiária, pode fazer a indicação de várias, que agirão conjunta ou disjuntamente, de acordo com os termos da indicação. Assim, se o cheque traz a indicação de ‘pague-se a A, B, e C’, esses beneficiários, para receber ou fazer o cheque circular, agirão conjuntamente; se, entretanto, a indicação for ‘pague-se a A ou B’, qualquer um dos indicados como beneficiários poderá receber ou fazer circular o cheque, dada a disjuntiva ‘ou’ aposta na cláusula.12
Pode ainda a emissão ser feita à ordem do próprio sacador, conforme art. 9º
da Lei n. 7357/85. Em tais casos, o saque, mais do que criar um crédito, corresponde
a uma retirada de fundos depositados, o que lhe é lícito fazer, desde que exista saldo
suficiente para tanto.
2.6.6 Cheque nominativo
Por fim, tem-se o título nominativo, aquele que é sacado a favor de pessoa
nomeada, mas que se faz acompanhar da expressão não à ordem. Nessas
circunstâncias, além de no ato de emissão, o sacador nomear o beneficiário do título,
retira-se o cheque do regime de transferência cambial pelo endosso.
Ou seja, a mencionada cláusula não impede a transferência do crédito; apenas
impede que esta se faça pela forma simplificada do endosso, exigindo então das
partes interessadas na transmissão que utilizem ao procedimento de cessão de
crédito.
12 MARTINS, Fran. Títulos de crédito. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. v. 2, p. 53.
27
2.7 Utilização prática e inadimplência no cheque
Com propriedade, acerca da matéria em questão, comentou Celso Barbi
Filho dizendo que “o cheque é o título de crédito mais utilizado na vida comercial
brasileira”13. Contudo, e por ser assim tão utilizado, surge o inevitável problema da
inadimplência, notadamente acentuada em tempos economicamente recessivos, como
os atuais.
Tempos pelos quais, aliás, parece -nos nunca conseguimos nos ver livres.
Nesse contexto, como novamente bem asseverou o festejado doutrinador, os
problemas jurídicos da inadimplência no pagamento de cheques concentram-se em
situações principais, quais sejam - o cheque sem fundos, os cheques pré-datados, a
sustação e a revogação.
Reservamo-nos, portanto, o direito de primeiramente discorremos sobre as
duas primeiras e costumeiras hipóteses geradoras de problemas, deixando as outras
duas para serem tratadas em capítulo próprio, já que são as mesmas tema principal de
nosso trabalho. Vejamos:
2.7.1 Cheque sem fundos
Como já visto, é o cheque ordem de pagamento à vista dada contra banco
(sacado), que pressupõe depósito em conta. Constatando o banco depositário que
não existem fundos para cumprimento da ordem de pagamento que recebeu, deve
13 BARBI FILHO, Celso. Questões jurídicas sobre a inadimplência no pagamento do cheque. Revista
de Direito Mercantil, São Paulo, n. 115, s.d.
28
este devolver o título ao portador/ apresentante, com a comunicação deste fato.
De acordo com o art. 4º da Lei n. 7357/85, a inexistência de fundos
depositados ou de crédito aberto ao emitente não descaracteriza o documento como
cheque, o qual, constituindo título de crédito e portanto título executivo, viabiliza sua
cobrança judicial através de execução contra o emitente. Para esse fim, não há
nenhum requisito especial, não havendo necessidade deste (título) ser protestado e a
rigor, nem mesmo apresentado ao banco.
O protesto cambial do cheque, como veremos adiante, só se faz necessário
para o portador exercer seu eventual direito de regresso contra endossante
coobrigado. Mesmo assim, a providência será obrigatória apenas se o título não
houver sido apresentado ao banco dentro do prazo legal, na forma do art. 47, inciso II
da Lei. Em outras palavras, um cheque sem fundos deve ser protestado pelo credor, no
prazo fixado em lei para sua apresentação a pagamento para fins de conservação do
direito creditício contra os coobrigados. Para o exercício deste direito contra o
emitente e seu avalista, o protesto não é necessário.
2.7.2 Cheque pré-datado
O cheque pós-datado, vulgarmente denominado pré-datado, não possui
amparo legal em nossa legislação, sendo o cheque, conforme exaustivamente
mencionado, ordem de pagamento à vista, tendo como um de seus requisitos formais
a data de sua emissão, também necessária para efeitos de contagem de prazo de
prescrição.
Por outro lado, em razão do corrente uso comercial que se fez dos cheques
29
pós-datados, o que de sobremaneira propiciou uma maior circulação de riquezas no
comércio, ainda na vigência da lei Uniforme de Genebra, anterior à atual lei do cheque,
a jurisprudência pátria dominante, podendo-se quase dizer absoluta, há algumas
décadas firmou-se seguindo a doutrina, no sentido de que o cheque, ainda que emitido
com data futura, ou sem data, ou em branco, não se desnatura como título
cambiariforme que é, nem tampouco como título executivo extrajudicial. Está pacificado
que a pós-datação, mais conhecida como pré-datação do cheque, significa uma
convenção entre emitente e tomador, pela qual este se obriga a só apresentar o
cheque na data estipulada, a despeito de pela lei, poder fazê-lo a qualquer tempo.
Enxerga-se aqui o emprego claro e acentuado do elemento confiança, já no início
citado, no seu aspecto subjetivo, quando passa este a consistir na crença que o credor
deposita na pessoa do devedor de que este futuramente aplicará a sua capacidade
econômica no cumprimento da obrigação assumida.
No que diz respeito à matéria apresentação fora da data aprazada, os
tribunais vêm reiteradamente julgando que a devolução de cheque “pré-datado” por
sua apresentação antecipada enseja direito ao dano moral. Como nos casos de
inexistência de fundos na data de apresentação do cheque para pagamento, quando
então o título será devolvido ao portador chegando mesmo até ao encerramento da
conta do emitente e a inscrição do seu nome no Cadastro de Emitente de Cheques
sem Fundos, SERASA, etc.
Vale registrar, por outro lado, que, pela Súmula 246 do STF, não constitui
crime a emissão de cheque pré-datado devolvido sem fundos em decorrência de sua
apresentação prematura, descaracterizando a fraude, na medida em que o portador
sabia que naquela data, os fundos não existiam.
30
Em face de grande utilização desta espécie de cheque, pode-se até mesmo
dizer que na prática, o cheque é transformado de instrumento de ordem de pagamento
à vista em instrumento de promessa de pagamento. Nesta linha de raciocínio, mister
se faz atentar para o fato de que na maioria das vezes, quando o consumidor, por
exemplo, adquire uma mercadoria mediante a emissão de um ou mais cheques pós-
datados, está embutido no preço daquele bem um acréscimo referente aos juros
cobrados pelo vendedor, razão pela qual dentre outras, o beneficiário não deveria
poder descontar os títulos recebidos à vista.
Assim sendo, comungamos do entendimento de Roberta Nioac Prado,
quando diz que “não é correto concluir que apesar dos usos e costumes comerciais, do
acordo de vontade entre as partes e ainda da boa-fé do emitente, possa o beneficiário
descontar o cheque pós-datado antes do prazo convencionado”14.
O problema entretanto, reside em duas questões:
? Primeira: a de ser o nosso sistema jurídico essencialmente legal sobrepondo-se a
lei aos usos e costumes e à jurisprudência, a rigor dos dizeres do art. 5º inc. II da
Constituição Federal de 1988: “Art. 5º [...] II - ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Ainda nesta pauta, vale acrescentar que, a liberalidade na qual se investe o credor
de apresentar o cheque na data pactuada, e com firmeza acreditamos ser de fato
mera opção deste que, conseqüentemente gera uma atribuição de direito ao
emitente, não tem a característica de infirmar o título com a sua destipificação.
Imprescindível destacar, uma vez mais, que o cheque é pagável a vista e será
14 PRADO, Roberta Nioac. O cheque “pós-datado”: a realidade brasileira e a solução legal Argentina.
Revista de Direito Mercantil, São Paulo, n. 118, s.d. p. 139.
31
considerada não escrita qualquer menção em contrário, consoante se infere do art.
32 da Lei n. 7357/85.
? Segunda: para que o emitente possa se ressarcir dos danos sofridos em razão do
desconto prematuro do cheque pós-datado, deverá, com fundamento no art. 186,
do Código Civil provar, em juízo, que houve acordo entre as partes de pagamento
futuro, além do prejuízo sofrido, o que por vezes pode ser difícil, custoso e
demorado.
Desta feita, temos que, ainda que tanto na doutrina quanto na jurisprudência
exista entendimento de que o cheque, por sua natureza é sempre uma ordem de
pagamento à vista, não importando se a data nele consignada é anterior ou posterior à
data de sua real e efetiva criação, representando pois, dívida líquida, certa e exigível,
acreditamos que se o emitente realmente não quiser correr riscos e optar por comprar
a prazo, deverá garantir a sua dívida através de outros meios, que não de cheque pós-
datado ou pré-datado, como é conhecido. Isto porque o beneficiário do cheque pós-
datado (que pela abstração/circulabilidade do instituto nem sempre será este aquele
com quem o emitente contratou) tem amparo legal e doutrinário para desconta-lo
quando bem entender, ainda que em desrespeito ao que pessoalmente pactuou ou ao
que terceiros pactuaram. Resta-nos apenas tentar buscar por uma forma segura de se
fazer cumprir o acordo tácito de futura compensação e tal necessidade leva-nos a
indagar se a emissão de cheque nominativo não seria boa providencia para cercear a
circulabilidade do título, restringindo ao único beneficiário a responsabilidade pelo
cumprimento do avençado.
32
3 DA FORMA E PROVA DO CHEQUE
3.1 Rigor cambiariforme
Dentre nós, pode-se dizer que a forma do cheque conhece dois níveis de
tradução normativa: num primeiro nível, que é legal, apresenta-nos a Lei n. 7357/85, a
traduzir a adesão brasileira a uma convenção internacional uniformizadora; num
segundo nível, que passa então a ser o regulamentar, inserem-se diversas normas que
partem do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central do Brasil e que
têm aplicabilidade em todo o território brasileiro.
O instituto estudado, assim como os demais títulos de crédito, reveste-se de
verdadeiro formalismo cambial, que visa dar segurança à sociedade e ao mercado
financeiro, no sentido de serem estes títulos aceitos e de que com isso possam
cumprir com a sua finalidade de circular. Desta forma, tem-se que o preenchimento
adequado dos requisitos mínimos do cheque é segurança para o emitente, tanto
quanto o é para o (s) beneficiário(s), nomeados ou não, pois somente quando
adequadamente preenchidos estes requisitos que passamos a discorrer é que haverá
emissão válida. Exatamente como preleciona o art. 2º da Lei do Cheque: “Art. 2º - O
título a que falte qualquer dos requisitos enumerados no artigo precedente não
vale como cheque, salvo nos casos determinados a seguir [...]”.
São pois requisitos de validade do cheque:
I) denominação “cheque” inscrita no contexto do título e expressa na língua em que
este é regido;
33
A denominação no título representa a cláusula cambiária que dá publicidade
ao título face ao seu portador, que passa a conhecer o tipo de título com o qual opera e
se obriga, sendo importante ainda acrescentar que o rigor cambial exige que a palavra
esteja no texto da ordem de pagar.
II) a ordem incondicional de pagar quantia determinada;
Ou seja, o pagamento do cheque independe de qualquer condição estipulada
entre as partes.
III) o nome do banco ou instituição financeira que deve pagar (sacado).
Daí decorre a responsabilidade do banco quanto ao pagamento do título. A
relação de débito/crédito que nasce com a emissão do título vigora entre emitente e
portador do cheque, sendo certo que é o primeiro quem se obriga diretamente ao
pagamento do título, e não o banco sacado.
Portanto, se o banco ou instituição financeira designada se recusar a cumprir a
ordem de pagamento por qualquer motivo, justo ou não, é o emitente quem responde
diretamente pelo pagamento a ser feito ao portador, considerando-se não escrita
qualquer declaração pela qual se exima o emitente desta garantia, conforme reza o art.
15 da Lei do Cheque.
Contudo, na hipótese de recusa injustificada do pagamento pelo banco,
responde este perante o correntista emitente.
Do citado requisito, vale dizer que não existe relação jurídica alguma advinda
do cheque entre o banco sacado e o terceiro beneficiário do título, desde que não seja
este o correntista. O portador do cheque não traz consigo a qualidade de credor do
sacado, embora possa sê-lo do emitente. De tal modo, mesmo se observado o ato da
apresentação do título sob o aspecto da relação direta que momentaneamente se
34
forma entre portador e sacado, não é este quem responde diretamente pelo
pagamento. Portanto, não cabe discussão por parte do banco acerca da legitimidade
do portador em realmente ser o dono do título, se o portador é realmente o credor da
importância contida no cheque. Não se admite a possibilidade de deixar o banco de
pagar a quem apresentar o cheque, salvo por motivos que digam respeito à
regularidade formal do título, especialmente em atenção à assinatura de quem figura
como emitente. Nesta hipótese, sim, responderá este ao emitente caso venha a pagar
sem conferir a autenticidade da assinatura de seu cliente.
IV) a indicação do lugar de pagamento;
Não havendo qualquer indicação do lugar de pagamento, o cheque é pagável
no lugar da emissão, sendo este imprescindível para a validade do cheque.
V) a indicação da data e lugar da emissão;
A data, como anteriormente dito é um dos requisitos mais importantes do
cheque, uma vez que é a partir dela que se conta o prazo para apresentação da ordem
de pagamento ao sacado e conseqüentemente o prazo prescricional da ação para
execução do título. Deve a data ser verdadeira e completa, conforme palavras do
ilustre Prof. Wille Duarte.
O lugar da emissão, requisito suprível, mas essencial, serve para fixar o prazo
para a apresentação do cheque ao sacado, sendo de 30 dias se emitido na mesma
praça do pagamento e de 60 dias se emitido em praça diversa do local de pagamento,
segundo art. 33 da Lei n. 7357/85.
De expressiva relevância, ainda no que se refere ao requisito data, é a
hipótese da apresentação prematura do cheque pré-datado, questão já falada em
capítulo anterior e alvo de tantas discussões processuais.
35
VI) a assinatura do emitente (sacador) ou de seu mandatário, com poderes especiais.
Dentre a essencialidade de cada um dos requisitos, figura a assinatura do
emitente como o requisito mais importante para a validade do título, podendo esta ser
também fornecida através de chancela mecânica, que é um meio especial permitido
por lei (p.u. do art. 1º da Lei n. 7357/85) de obrigar-se no cheque através do uso de
máquinas. A chancela mecânica ocorre sob a autorização do Banco Central e só
justifica-se quando é grande o volume de cheques emitidos.
No que concerne à assinatura do cheque, certo é que, seja na hipótese de
ocorrência de assinaturas falsas, assinaturas de pessoas incapazes de se obrigar por
cheque, até mesmo assinaturas de pessoas fictícias, tal fato não onera as demais
obrigações válidas porventura já existentes no título.
Ainda sobre o tema e apenas a título de informação, vale aqui mencionar que
nos cheques de pequenos valores, os bancos já não conferem as assinaturas. Pagam
estes o cheque e assumem o risco de qualquer vício no mesmo, tamanho o volume de
títulos apresentados às câmaras de compensação.
Na falta de qualquer um destes requisitos, com exceção ao lugar de
pagamento, a cártula não produzirá efeitos como cheque; se incompleto algum dado,
existe a presunção de que pode o portador completá-lo, desde que isto ocorra dentro
do convencionado.
Importante ressaltar que se o cheque for completado com inobservância do
acordado com o emitente, tal fato não pode ser oposto ao portador, a não ser que este
tenha adquirido o cheque de má-fé.
36
3.2 Declarações cambiais no cheque
Com maestria conceitua o Prof. Wille Duarte Costa, o que são declarações
cambiais quando assim o diz: “declaração cambial é a manifestação de vontade do
signatário no sentido de criar, completar, garantir ou transferir o título de crédito”. E
acrescenta: “toda e qualquer declaração cambial encerra-se pela assinatura do
declarante que, por ela fica obrigado no título de crédito se tiver capacidade para
tanto”. Ainda: “sem assinatura não há obrigação cambial alguma e, conseqüentemente,
não haverá declaração cambial”15.
Assim como nas letras de câmbio, que são títulos cambiais típicos, no cheque,
também ocorrem as declarações cambiais de emissão, endosso, aval, excluído
somente a figura do aceite. Ainda que ocorra a aposição de visto na cártula, tal
procedimento não implica em aceitação por parte do banco sacado.
A emissão, comumente chamada de saque, é declaração através da qual dá-
se origem ao título, e é classificada como declaração cambial originária ou necessária,
onde, preenchidos os requisitos necessários à sua validade, se completa pela entrega
do mesmo ao beneficiário, ainda que tal entrega não seja voluntária, vale dizer.
De se concluir que de uma forma ou de outra, a princípio, responde o emitente
pelo pagamento do cheque. Tão forte é a manifestação do signatário no título, que
ainda nos casos onde ocorra a emissão involuntária, o emitente deve tomar as
providências cabíveis para que tal título não chegue às mãos de um terceiro de boa-fé,
já que este último não está obrigado a restituir o título se não o adquiriu de má-fé,
conforme elucida o art. 14 da Lei do Cheque.
15 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 131.
37
O endosso vem a ser declaração eventual, (ou seja, pode ou não ocorrer) e
sucessiva, (subentende-se a pré-existência de uma emissão), pela qual o signatário
transmite o título e todos os seus direitos dele advindos, a um terceiro, chamado então
de endossatário.
Ou seja, quanto ao portador, o cheque circula pela simples tradição. Mas
constando o nome de um beneficiário no título, já não mais poderá circular o cheque
pela simples tradição, mas só por meio de endosso.
Ao endossar um cheque, o endossante obriga-se como devedor de regresso,
respondendo pelo pagamento do cheque, desde que este tenha sido apresentado ao
banco em tempo hábil.
Com a aprovação da malfadada Lei n. 9311/1997, que instituiu a CPMF, a
qual ironicamente traduzimos por Contribuição Permanente (e não Provisória) sobre
Movimentação Financeira, já em vigor e sendo cobrada há 8 anos, estabeleceu-se em
seu art. 17, a proibição de mais de um endosso no título. Todavia, continua o cheque
sendo transferido a diversas pessoas (sucessivos endossatários) através do endosso
em branco.
Pode o endosso aparecer no título sob duas formas:
? endosso ao portador ou em branco, quando não há indicação do beneficiário;
? endosso nominativo ou em preto, quando se indica o beneficiário.
Como já dito anteriormente, salvo estipulação em contrário, o endossante
garante o pagamento do cheque, de forma que, se o endossante declarar pague-se a
fulano, sem garantia, ele não garante o pagamento a quem o título foi endossado,
exceto na hipótese de ser também o próprio emitente.
Enquanto no endosso sem garantia o endossante nada garante, na proibição
38
de novo endosso o endossante continua garantindo o pagamento do título, a não ser
que o cheque seja endossado a terceiro.
O aval é também obrigação eventual e sucessiva aposta no título, obrigação
esta que pode ser prestada por um terceiro ou mesmo por quem já obrigado no título,
na qual seu signatário, o avalista, garante o pagamento do cheque.
Há que se lembrar que não vale o aval prestado pelo banco sacado. Como
bem comenta Prof. Wille Duarte,
o visto que o funcionário geralmente dá no cheque, certificando a autenticidade da assinatura, não obriga o Banco e nem implica em reconhecimento do dever de pagar o cheque. Até mesmo o visto dado pelo gerente, a fim de que o cliente seja atendido de modo especial ou mais prontamente, não implica em qualquer responsabilidade para o Banco.16
O aval no cheque ocorre da mesma forma como nos demais títulos de crédito,
ou seja, letra de câmbio e nota promissória, persistindo até mesmo a figura do aval
parcial, que, a despeito da aventada possibilidade da existência, no título em estudo,
nos parece inócuo.
Se não, vejamos. Tem-se que a obrigação do aval parcial no cheque é
contraditória, uma vez que a própria Lei do Cheque, especificamente em seu art. 31,
determina que o avalista se obriga da mesma forma que o avalizado. Desta feita,
como pode perdurar o aval parcial no cheque se equiparado ao emitente está o
avalista, quando aquele se obriga por todo o valor do cheque? Em palavras mais
claras, responde o emitente pela soma total inserida no título. Se no caso, a
responsabilidade do avalista é a mesma daquela pertencente ao emitente, como pode
este avalista responder pelo crédito parcial?
Contudo, quando relacionamos a responsabilidade de um, comparada à do
16 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 327.
39
outro, é importante deixar claro que a obrigação do avalista (ainda que no valor total do
cheque, assim como a do emitente) é autônoma, ou seja, independe da obrigação do
emitente. Quando se diz que o avalista se obriga da mesma maneira que seu
avalizado, entende-se que a obrigação do avalista é da mesma espécie, do mesmo
nível da do avalizado.
E tanto assim o é que, para se entender melhor a autonomia desta obrigação
face àquela, certo é que obrigando-se o avalizado no título, a obrigação do avalista
(ainda que anterior a esta) passa a subsistir, ainda mesmo que nula a obrigação
garantida. Para tanto, pouco importa que a assinatura do avalizado seja de pessoa
incapaz de se obrigar por cheque, ou seja falsa a assinatura, ou que por qualquer outro
motivo não possa se obrigar o signatário.
Ainda, quanto a limitação do instituto do aval, há que se lembrar que sofrerá
este limitação da outorga uxória ou marital, na hipótese de ser o avalista casado.
3.3 Apresentação e acatamento da ordem de pagamento
Chama-se de apresentação o ato de levar a ordem de pagar, presumindo-se,
ou melhor, pretendendo-se seja esta ordem acatada e cumprida. Ordem esta dada
pelo emitente (sacador) para que se pague estipulada quantia a alguém (ele próprio o
sacador ou outrem), nomeado ou não no título. Aparece como destinatário da ordem o
Banco (sacado) onde o emitente mantenha conta com fundos suficientes para
responder ao pagamento da quantia especificada no título.
Contudo, a lei fixa prazo a esta apresentação para pagamento, sendo este de
30 dias (contados do dia da emissão) quando o local da emissão é o mesmo do lugar
40
do pagamento e de 60 dias quando distintos o lugar da emissão do título e a praça de
seu pagamento.
O acatamento da ordem ocorre quando, não havendo qualquer empecilho, o
sacado efetuará o pagamento, isto é, acatará a ordem de saque, entregando ao
portador do título a importância nele determinada e providenciando seu débito na
mesma conta do sacador. Atenção: independente da ordem e das datas em que forem
emitidos os cheques, seus pagamentos se farão na medida em que forem
apresentados ao Banco.
Ao mencionarmos que o título é levado a pagamento, devemos aqui também
esclarecer que este pagamento não obstante trazer à primeira lembrança um saque
(entrega de quantia em espécie), pode também ocorrer através de depósito e daí,
convém ainda que brevemente, trazer ao assunto a responsabilidade da instituição
financeira na guarda e conservação do título. Deve, pois o Banco, a despeito da sua
função de buscar pelo pagamento da cártula, (via compensação), ou pela devolução da
mesma face à recusa motivada de pagamento, guardar e conservar o título em
perfeitas condições, para que cumpra esta seu percurso procedimental, o que inclui a
possibilidade de devolução deste ao portador beneficiário, para que seja então
exercido o direito de ação contra emitente e demais coobrigados.
Pode ainda o Banco por qualquer outra razão que não a falta de fundos
disponíveis, deixar de liquidar o cheque, e então isto será questão a ser resolvida entre
ele Banco e seu cliente o correntista e não entre ele e o possuidor do título. Vale
lembrar que pode o Banco sacado deixar de liquidar o cheque até mesmo por alguma
razão particular.
Contudo, em qualquer hipótese, deve o portador do cheque agir contra o
41
emitente do cheque e não contra o banco sacado como já elucidamos, ainda que
posteriormente possível a ação de regresso. Algumas razões legais que permitem ou
ensejam o não pagamento do cheque: falta de apresentação do cheque ao sacado,
insuficiência ou inexistência de fundos disponíveis em poder do sacado, defeito de
forma do título, prescrição, revogação ou contra-ordem, oposição.
Na hipótese de não acatar a ordem de pagamento, deverá o banco indicar o
motivo de sua recusa, registrando, no verso do cheque e com declaração datada, o
código correspondente ao motivo da devolução, sendo certo que no caso de ser o título
apresentado ao caixa, o registro deve ser feito com anuência do beneficiário.
Pela lista elencada na Resolução n.1631/89/BACEN, o cheque poderá ser
devolvido pelos seguintes motivos:
? Cheque sem provisão de fundos:
11- cheque sem fundos - 1ª apresentação.
12- cheque sem fundos - 2ª apresentação.
13- conta encerrada.
14- prática espúria17.
? Impedimento ao pagamento:
20- folha de cheque cancelada por solicitação do correntista.
21- contra-ordem (ou revogação) ou oposição (ou sustação) ao pagamento pelo
emitente ou pelo portador.
22- divergência ou insuficiência de assinatura.
17 Prática espúria ocorre quando há a apresentação no mesmo dia, de mais de três cheques sem
fundos com o valor até o teto do compromisso de pronto acolhimento, que é compromisso que os bancos assumem perante o Banco Central e que pode ser revogável a qualquer tempo, e onde se compromete a não devolver por falta de fundos, cheques até determinado valor.
42
23- cheques emitidos por entidades e órgãos da Administração Pública Federal
Direta e Indireta, em desacordo com os requisitos constantes do art. 74, §2º do
Decreto-lei n. 200, de 25/02/1967.
24- bloqueio judicial ou determinação do Banco Central do Brasil.
25- cancelamento de talonário pelo banco sacado.
26- inoperância temporária de transporte.
27- feriado municipal não previsto.
28- contra-ordem (ou revogação) ou oposição (ou sustação) ao pagamento,
ocasionada por furto ou roubo, com apresentação do registro da ocorrência
policial.
29- cheque bloqueado por falta de confirmação do recebimento do talão de
cheques pelo correntista18.
30- furto ou roubo de malotes.
? Cheque com irregularidade:
31- erro formal (sem data de emissão, com o mês grafado numericamente,
ausência de assinatura, não registro do valor por extenso).
32- ausência ou irregularidade na aplicação do carimbo de compensação.
33- divergência de endosso.
34- cheque apresentado por estabelecimento bancário que não o indicado no
cruzamento em preto, sem o endosso-mandato.
35- cheque fraudado, emitido sem prévio controle ou responsabilidade do
estabelecimento bancário, ou ainda com adulteração da praça sacada.
18 Atente-se para o fato de que o Banco Central veda a devolução por falta de desbloqueio nos casos
onde a assinatura do correntista for constatada pelo banco sacado em qualquer cheque do talonário, que por certo confirmará haver o emitente recebido o talonário (Circular n. 2655/96/BACEN).
43
36- cheque emitido com mais de um endosso.
37- registro inconsistente - compensação eletrônica.
? Apresentação indevida:
40- moeda inválida.
41- cheque apresentado a banco que não o sacado.
42- cheque não compensável na sessão ou sistema de compensação em que
apresentado.
43- cheque devolvido anteriormente pelos motivos 21, 22, 23, 24, 31, não passível
de reapresentação em virtude de persistir o motivo da devolução.
44- cheque prescrito.
45- cheque emitido por entidade obrigada a realizar movimentação e utilização de
recursos financeiros do Tesouro Nacional mediante ordem bancária.
46- comunicação de remessa, quando o cheque correspondente não for entregue
ao banco sacado nos prazos estabelecidos.
47- comunicação de remessa com ausência ou inconsistência de dados
obrigatórios referentes ao cheque correspondente.
48- cheque de valor superior a R$ 100,00 (cem Reais), emitido sem a identificação
do beneficiário, acaso encaminhado ao SCCOP, devendo ser devolvido a
qualquer tempo.
49- remessa nula, caracterizada pela reapresentação de cheques devolvidos pelos
motivos 12, 13, 14, 20, 25, 28, 30, 35, 43, 44, 45, podendo sua devolução
ocorrer a qualquer tempo.
De se observar que a lista apresentada é exaustiva e que dela não faz parte a
hipótese de não acatamento do pagamento pela morte ou incapacidade do emitente,
44
ainda que venha esta a ocorrer após a emissão, nos exatos termos do art. 37 da Lei
do Cheque, e que adiante falaremos a respeito.
Quanto à apresentação como requisito da exigibilidade do título em juízo, e
mais adiante trataremos da matéria, alguns doutrinadores e julgadores entendem que
sendo o cheque uma ordem de pagamento dada ao banco, não teria este
executoriedade contra quem o emitiu sem anteriormente ter sido apresentado e após
devolvido pela instituição financeira. Neste sentido, o STF, pela Súmula 600,
consolidou o entendimento de que “cabe ação executiva contra o emitente e seus
avalistas, ainda que não apresentado o cheque ao sacado no prazo legal, desde que
não prescrita a ação cambiária”.
Para a execução do cheque não pago, portanto, é preciso apenas respeitar-se
o lapso prescricional de 6 (seis) meses, contados do término do prazo de
apresentação, conforme art. 59, da Lei do Cheque, valendo ainda lembrar que o direito
de regresso de um coobrigado contra outro, contra o devedor principal ou seu avalista
prescreve em seis meses contados do pagamento ou da distribuição da execução
judicial.
Cabe observar que, segundo entendimento jurisprudencial do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), se o cheque é apresentado no curso do prazo de
apresentação, a prescrição não irá contar-se do término desse prazo, mas sim da data
da apresentação. Decidiu o STJ mais de uma vez que “o termo inicial da prescrição,
previsto no art. 59 da Lei n. 7357/85, pressupõe que o cheque não haja sido
apresentado no prazo legal. Caso contrário, a prescrição passa a correr da data da
primeira apresentação.
Em última hipótese, como se verá, prescrito o cheque caberia ação monitória,
prevista no art. 1102 do CPC.
45
4 CONTRA-ORDEM E OPOSIÇÃO
4.1 Revogação ou contra-ordem
De início, é preciso bem compreender o conceito e a distinção legal entre o
instituto da revogação e o da oposição ou “sustação” de cheques.
A revogação, ou contra-ordem, está prevista no art. 35 da Lei n. 7357/85,
segundo o qual “o emitente do cheque pagável no Brasil pode revogá-lo, mercê de
contra-ordem dada por aviso epistolar, ou por via judicial ou extrajudicial, com as
razões motivadoras do ato”. Acrescenta o parágrafo único deste artigo que “a
revogação ou contra-ordem só produz efeito depois de expirado o prazo de
apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até que
decorra o prazo de prescrição”.
A restrição de que a revogação só possa ser feita após expirado o prazo de
apresentação que é de 30 ou 60 dias da data de emissão, conforme o local desta seja
ou não o mesmo do pagamento, é uma exigência que já constava da Lei Uniforme de
Genebra naquilo que se tratava sobre cheques, mas que foi objeto da reserva adotada
pelo Brasil.
Equivale a revogação a ato cambial que limita ao prazo de apresentação
previsto em lei, a eficácia do cheque como ordem de pagamento à vista. Ou seja, é ato
cambial que limita o pagamento do cheque ao prazo de apresentação, razão pela qual
só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação.
Revogação é, em outras palavras, um cancelamento junto ao banco
46
depositário, da ordem de pagamento que lhe fora dada por meio do cheque e o motivo
a ser alegado para que tal cancelamento ocorra diz respeito não ao pagamento em si,
mas à permissão de apresentação do cheque para além do prazo legal específico.
Tanto o é que alguns doutrinadores acreditam ser correto poder o emitente do cheque
fazer constar neste, a advertência de que se emitirá contra-ordem para que não haja
pagamento após decorrido o prazo legal para apresentação.
Bem nos esclarece Gladston Mamede quando discorre seu entendimento
sobre o real fundamento da contra-ordem quando assim diz:
[...] parece-me ser um direito do correntista, quando já expirado o prazo de apresentação dos cheques por ele emitidos, revogar os que ainda não foram apresentados para, então, encerrar sua conta bancária. Em verdade, não seria legítimo pretender que o portador, seja ele quem for, (o beneficiário da emissão originária ou um sucessor) pudesse, fugindo à obrigação de apresentar o título para pagamento no prazo legal, forçar o sacador a manter sua conta bancária por mais seis meses, mormente se consideramos que isso tem um custo (as tarifas de manutenção), que não é desprezível.19
4.2 Eficácia temporal da revogação
Como já antes mencionado, a contra-ordem somente experimenta padrão de
efetiva validade, a partir do momento o qual transcorreu o prazo legal destinado à
apresentação do cheque. Portanto, não fica o sacado vinculado à contra-ordem dentro
do regular prazo concernente à apresentação do respectivo título cambial, nem tão
pouco responde face ao pagamento realizado regularmente.
Se manifestação expressa e motivada do emitente, no sentido de não permitir
o pagamento do cheque, resta-nos, questionar entretanto, qual a duração dessa
19 MAMEDE, Gladston. Títulos de crédito: de acordo com o novo Código Civil, Lei 10.406 de
10/01/2002. São Paulo: Atlas, 2003. p. 285.
47
revogação, ou seja, vale por tempo indeterminado ou, contrario sensu, existe alguma
identificação que denote o lapso limitado da sustação do pagamento? Nada
pronunciou o legislador a esse respeito, e, portanto, acreditamos ser plausível que se
sustente que a contra-ordem deve perdurar pelo prazo restante, correspondente à
prescrição do cheque. Isto porque, atingido então o marco prescricional, não haveria
mais motivação para que o sacado mantivesse a contra-ordem dentro do seu controle
de fiscalização.
Perdurará, outrossim, a revogação enquanto não fluir o tempo regular atinente
à prescrição do cheque, de modo que compete ao beneficiário somente a via judicial
para o recebimento do pagamento.
Enfim, a revogação focaliza apenas um determinado problema em razão do
qual é impedido o pagamento, porém tem sua validade limitada, porque somente
traduz os seus efeitos após o decurso do prazo de apresentação do cheque e sua
eficácia subordina-se ao espaço de tempo que se coaduna com a prescrição do
próprio título.
Prazo de validade da revogação:
4.3 Oposição ou sustação
O outro instituto é o da chamada oposição, vulgarmente conhecida como
“sustação” do cheque, onde, mesmo durante o prazo de apresentação, o emitente ou o
portador legitimado pode sustar o pagamento do cheque, manifestando por escrito ao
Termino do prazo para apresentação do cheque
Prescrição do exercício do direito de ação executiva
48
banco, oposição fundada em relevante razão de direito, na forma do art. 36 da Lei n.
7357/85, razão esta, cuja relevância, cabe esclarecer, não cabe ao banco julgar. A
apresentação de relevante razão de direito é requisito próprio da sustação, já que na
revogação ou contra-ordem, exige-se do emitente apenas que este apresente as
razões motivadoras do ato.
O termo “sustação” do cheque apresenta-se inadequado já que o que se susta
não é o cheque, mas sim o seu pagamento. A oposição não invalida a ordem contida
no cheque, apenas suspende o seu cumprimento. Outrossim, produz efeitos a partir da
cientificação do banco sacado, desde que anterior à liquidação do título.
Muito se discute na doutrina quais seriam os demais motivos que porventura
justificassem a oposição ao pagamento do cheque, além das clássicas hipóteses de
extravio do título, falência ou incapacidade do portador. Há quem admita que o
desapossamento do título já emitido ou do talão de cheques, são motivos ensejadores
do pedido de oposição. Outros famosos doutrinadores, dentre eles Rubens Requião20,
admitem também o cancelamento do negócio que originou o cheque como causa
justificada para a oposição. Contudo, de forma contrária, a doutrina mais recente
demonstra que o descumprimento da obrigação pelo portador do cheque não autoriza
sua revogação ou sustação, se ele já circulou. Isso porque, sendo o cheque título de
crédito e possuindo este tal característica, já tendo entrado em circulação e estando
nas mãos de terceiro de boa-fé, vincula seu emitente pela declaração unilateral de
vontade que emitiu.
20 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. v. II, p. 136.
49
4.4 Autonomia e independência x sustação: situação conflitante
“Autonomia: (Do gr. autonomia). S.f. 1. Faculdade de se governar por si
mesmo. 2. Direito ou faculdade de se reger por leis próprias”.21
Ainda, citando Galvão Ramiz22, Gladston Mamede assim define autonomia:
“Nomós, em grego, traduz a idéia de norma, regra; autos corresponde à idéia de a si
próprio. Autonomia, portanto, como regulamento e governo próprio”23.
Importante característica do título de crédito, a autonomia é no cheque, a
qualidade que este possui de existir por si mesmo, de ser auto-suficiente, ou seja, de
contar este com as prerrogativas da validade e exigibilidade, independentemente do
negócio jurídico que o criou, que propiciou o seu nascimento.
Porém, não só autônomo é o cheque, já que as obrigações assumidas pelos
partícipes da relação cambiária, tais como sacador, avalista, endossante, sacado,
endossatário, soma-se o princípio da abstração, que afirma ser a cártula declaração
unilateral de crédito que independe do negócio que o gerou. Em outros termos, não se
cogita suscitar a causa debendi.
No entanto, apesar de ter o título cheque uma história, um lastro, de ser fruto de
uma transação, a cártula é, para todos os efeitos, melhor dizendo, para ‘quase’ todos
os efeitos, uma declaração autônoma do devedor, que, ao assinar o título e apostar ali
21 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua
portuguesa. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 236. 22 GALVÃO, Ramiz. Vocabulário etimológico, ortográfico e prosódico das palavras portuguesas
derivadas da língua grega . Rio de Janeiro: Garnier, 1994. 23 MAMEDE, Gladston. Títulos de crédito: de acordo com o novo Código Civil, Lei 10.406 de
10/01/2002. São Paulo: Atlas, 2003. p. 240.
50
a sua vontade, como já visto, se compromete, naquele ato, a solver a obrigação então
certificada.
Diz-se obrigação autônoma para quase todos os efeitos face à confusão
gerada pela própria Lei n. 7357/85, onde pela leitura dos artigos 13 e 15,
respectivamente, temos que: “as obrigações contraídas do cheque são autônomas e
independentes” e o “emitente garante o pagamento considerando-se não escrita a
declaração pela qual se exima desta garantia”.
Mais adiante, ainda na mesma citada Lei, rezam os artigos 35 e 36, ser
passível de revogação ou sustação o pagamento do cheque desde que o emitente
indique “as razões motivadoras do ato” e que se apóie a oposição “em relevante razão
de direito”.
Ou seja, o que se descortina é um conflito que advém da própria característica
da autonomia que talvez nem se poderia ser chamada como tal, já que o vocábulo
inspira, traduz idéia de permanência, de imutabilidade, de coisa pertencente a algo
para todo o sempre. Faceta esta que talvez não possa o cheque apresentar, já que por
um lado, o título em nada depende do negócio que o gerou, e por outro lado, o não
pagamento do mesmo título deve, ou melhor, só pode ser suscitado se esclarecidos o
porque da sua recusa, que certamente se funda no negócio por óbvio realizado entre
emitente e beneficiário.
Bem ilustra o contra-senso, já por vezes citado Gladston Mamede quando,
discorrendo sobre a questão faz menção ao julgado em
Recurso Especial 43.513/SP, que mereceu relatoria do Ministro Aldir Passarinho Júnior:’a autonomia e independência do cheque em relação à relação [sic] jurídica que o originou é presumida, porém não absoluta, sendo possível a investigação da causa debendi e o afastamento da cobrança, quando verificado que a obrigação subjacente claramente se ressente de embasamento legal’. Na mesma
51
direção o Recurso Especial 221.835/DF, no qual o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira afirmou que ‘a discussão da relação subjacente à emissão do cheque é permitida se houver sérios indícios de que a obrigação foi constituída em flagrante desrespeito à ordem jurídica ou se configurada a má-fé do possuidor do título’. Adiante, emendou o magistrado: ‘a falta de causa que justifique a exigência do título pode ser alegada e provada pelo devedor que participou diretamente do negócio jurídico realizado com o credor’. Acrescentou-se que ‘a demonstração da origem do crédito, exigida pelo art. 82 do DL 7661/45, deve ajustar-se à abstração e autonomia do cheque. Se, de um lado, o título representa, por si só o débito e já denota a obrigação do falido, de outra ponta, a verificação dos créditos, na falência, tem objetivo aferir a legitimidade dos mesmos, de modo a impedir fraudes e abusos’ .24 (grifo nosso).
4.5 Implicações da sustação de cheques
Na prática, a sustação do cheque deve ser feita pessoalmente na agência
bancária do correntista, por carta, e com uma cópia reprográfica do Boletim de
Ocorrência, se o motivo for decorrente de roubo, ainda que tal solicitação já tenha
ocorrido por via telefônica ou e-mail.
De preferência, a carta deve ser feita em duas vias, para que uma fique com o
banco e a outra, devidamente carimbada pelo funcionário, sirva como prova para o
emitente (Anexo C).
É importante frisar que a não confirmação por escrito da sustação do
pagamento faculta ao portador o direito de reapresentação do cheque, tendo curso
normal a sua compensação, onde o cheque poderá ser devolvido por qualquer dos
demais motivos (sem fundos, etc.). No caso de ter o emitente efetivamente confirmado
por escrito a sustação, o cheque deverá ser devolvido pelo motivo 43, que significa
“cheque devolvido anteriormente pelos motivos 21, 22, 23, 24 e 31, não passível de
24 MAMEDE, Gladston. Títulos de crédito: de acordo com o novo Código Civil, Lei 10.406 de
10/01/2002. São Paulo: Atlas, 2003. p. 262.
52
reapresentação em virtude de persistir o motivo da devolução”.
A isenção de responsabilidades decorrentes do título, passa então a valer a
partir da data de comunicação, sendo certo que o Banco, conforme já mencionamos, é
obrigado a acatar a ordem de sustação, ainda que nitidamente perceba a má-fé do
emitente. É o disposto no §1º art. 3º, da Resolução 2747 de 28/06/00 do Banco
Central: “[...] não cabendo à instituição examinar o mérito ou a relevância da
justificativa”.
Nos casos de roubo, essa medida não só isenta o emitente de
responsabilidades como também permite que ele tenha condições de defesa num
eventual caso de dívida protestada, processo ou inclusão de nome em órgãos de
proteção e restrição de crédito.
Contudo, se o motivo da sustação foi outro que não roubo, como por exemplo
uma compra não entregue, o emitente deve estar ciente de que corre riscos com a
efetiva sustação do pagamento, tendo a dívida executada e o nome sujo na praça. No
mesmo exemplo, e agora em sentido contrário, para o comerciante, que vendeu e não
recebeu porque o cheque foi sustado, tem este como providência a ser tomada a
cobrança judicial.
4.6 Aspectos comuns e confrontantes entre os institutos da contra-ordem e
oposição
Tanto a revogação ou contra-ordem quanto a oposição ou “sustação”
impedem que o banco cumpra a ordem de pagamento que lhe foi dada quando da
emissão do título. Por isso, elas se excluem. Uma vez praticada uma, a outra é
53
incabível, por inócua.
As diferenças entre a revogação e a sustação, resumem-se a quem pode
realiza-las, a forma de sua realização e o momento em que podem ser feitas, como
acima já elucidado, sendo certo que, por força do art. 3º § 3º da Resolução n. 2747/00
do BACEN (Anexo B) as solicitações de sustação e de contra-ordem subordinar-se-ão
à identificação do interessado, consignada mediante assinatura em documento
escrito, senha eletrônica ou dispositivo passível de ser utilizado como prova para fins
legais. O mesmo dispositivo, em seu § 4º, admite que as solicitações de sustação e de
contra-ordem sejam realizadas em caráter provisório, por comunicação telefônica ou
por meio eletrônico, hipótese em que seu acatamento será mantido pelo prazo máximo
de dois dias úteis, após o que, caso não confirmadas, deverão ser consideradas
inexistentes pela instituição financeira.
Em algumas hipóteses, segundo art. 3º § 5º da Resolução do BACEN já
citada, podem os cheques que porventura tenham sido devolvidos por motivo de
sustação e de contra-ordem, uma vez reapresentados, ter de volta seu curso normal.
São as seguintes hipóteses:
a) levantamento da sustação ou da contra-ordem por parte do oponente ou do
emitente;
b) não confirmação da solicitação provisória de sustação ou contra-ordem, realizadas
em caráter provisório, no prazo de dois dias úteis.
Outro aspecto relevante sobre revogação e oposição, como faz lembrar Celso
Barbi25, é o de que ambas produzem o mesmo efeito prático, embora tenham
25 BARBI FILHO, Celso. Questões jurídicas sobre a inadimplência no pagamento do cheque. Revista
de Direito Mercantil, São Paulo, n. 115, s.d.
54
requisitos de legitimação, forma e prazos distintos. Daí, há quem sustente na doutrina,
que o Banco deve acatar a revogação mesmo quando dada durante o prazo de
apresentação, pois seu efeito é o mesmo da sustação.
Portanto, certo é que, ao nosso ver, o efeito da suspensão do pagamento
ainda não recebeu dos estudiosos a necessária e imprescindível atenção, decorrendo
daí a ausência de divulgação destas técnicas, o que conseqüentemente faz nascer
problemas que interferem na compreensão dos institutos. Desde o fato motivador da
revogação/sustação do cheque até a formalidade que deve permear a conduta do
interessado, inclusive na fixação da responsabilidade nos casos onde inexistem
condições de procedibilidade do seu pedido, afloram pontos que merecem ser
explorados em análise cuidadosa.
A forma corriqueira com que vem sendo utilizado este instituto, atitude esta
acobertada pelas instituições bancárias que relaxaram na observância desses
preceitos, chegando até mesmo a admitir sustações por telefone, conforme permissão
do próprio Banco Central, nos leva a crer que se tornaram a revogação e a sustação
meios fáceis de se furtar ao cumprimento de uma obrigação assumida, de fraudar ao
pagamento devido, o que com certeza, gera grande preocupação dentre os
comerciantes, que recebem cheques em suas vendas, constituindo questão relevante
nas relações de consumo.
Em apertada síntese, a oposição e a contra-ordem, representam, sob o prisma
do Banco sacado, uma diligência de caráter urgente, revestida da necessidade de se
bloquear o pagamento, mas que prescinde de outras conseqüências, evidenciando o
aspecto jurisdicional de uma demanda, cujo deslinde dependerá da análise e exame
apurado da possibilidade de ter ou não ocorrido procedimento correto por parte do
sacador.
55
Todavia, há que se lembrar que a revogação e a oposição impedem apenas
que se efetive a ordem de pagamento contida no cheque, não o descaracterizando
como título de crédito, que pode ser normalmente cobrado em juízo, ocasião em que o
emitente poderá discutir a sua obrigação, ou melhor, o não cumprimento dela.
Importante frisar que a relevância da razão jurídica invocada pelo oponente não é
deixada ao julgamento do banco sacado, mas sim ao juiz. De se notar que, se
consideradas infundadas por decisão judicial, a revogação ou a oposição
caracterizam crime de estelionato previsto no art. 171, § 2º, inciso VI do Código Penal.
Por fim, em se tratando de análise final dos efeitos gerados pelos dois
institutos, inclusive face à instituição financeira, essencial é asseverar que a revogação
do título, pelo próprio prazo a ser respeitado, confere mera expectativa ao dador da
ordem, enquanto a oposição representa direito líquido e certo de que o pagamento não
será executado, sob pena de ser responsabilizado o Banco, comprovando-se a
desorganização deste, quando efetuado o desembolso preterindo a vontade
manifestada pelo correntista ou portador legitimado.
56
5 DECLARAÇÕES DE VONTADE NO TÍTULO E FORA DELE
5.1 Teoria da vontade
Na tentativa de traçarmos uma introdução a análise das diversas formas de
manifestação de vontade configuradas num título, optamos por discorrer, ainda que
brevemente, sobre a forma na qual e pela qual esta declaração surge e se apresenta
aos olhos do Direito e conseqüentemente da sociedade.
De acordo com a teoria subjetiva ou da vontade, o ao jurídico é, por sua
essência, um ato de vontade e assim se explica: quando, no exercício de sua
autonomia, constituem-se relações que à ordem jurídica interessam, a vontade é, pelo
Direito, realizada, já que dele recebe a força de produzir efeitos jurídicos de
conformidade com a norma atributiva.
Considerada em si apenas por meio do processo de sua formação, a vontade
é um fato interno, mero fato psíquico que efeitos só pode gerar em sendo por outrem
conhecido, exteriorizando-se. Deve, pois, a vontade, necessariamente, ser
manifestada ou declarada, para que dela, surtam os seus efeitos.
Contudo, se um conflito sobrevier entre a vontade e sua declaração, aquela,
por ser o elemento fundamental do ato jurídico, há que prevalecer sobre esta.
Sem dúvidas, somente quando a vontade é manifestada ou declarada,
tornado-se conhecida de outrem, torna-se capaz de gerar efeitos no mundo
jurídico. Mas do fato de a vontade não ter sido ainda exteriorizada, não se pode
deduzir obrigatoriamente a circunstância de não ser possível ao direito interessar-
57
se por ela.
Desta feita, mesmo tendo a teoria subjetiva ou para muitos, teoria da vontade,
sofrido inúmeras e justas críticas, bem como passado por uma série de reformulações
e embora não prevaleça nos dias atuais tal como fora concebida originalmente, ainda
existe a preocupação de se apurar a vontade real do declarante, sempre quando nos
defrontamos com a possibilidade de ter ocorrido algum dos vícios de consentimento.
Segundo seus defensores, o título de crédito se origina na manifestação da
declaração de vontade de seu criador, o emitente. Formalizado o título, preenchidos
pois seus requisitos, individualizado estará seu valor e passa a ser a cártula, fonte de
um direito de crédito, direito este cujo detentor será aquele que tenha o título sob seu
poder, o que obriga o subscritor do título ainda que nos casos de perda ou roubo
deste.
Em sua obra, a qual por vezes neste trabalho fazemos referência, o Prof. Wille
Duarte Costa, cita João Eunápio Borges que explica:
A simples redação do título é fonte de obrigação independente de qualquer acordo exigido pelos contratualistas. Porque - esclarece Valeri - a manutenção da declaração da res, no título, tem função semelhante à aceitação no campo do direito comum. Assim, a perfeição da obrigação depende somente da criação do título. Mas a sua eficácia depende de algo mais, ficando condicionado o nascimento do vínculo obrigatório - a relação de débito e crédito exige dois sujeitos determinados - à aquisição por alguém da propriedade do título, aquisição que é uma conditio juris da obrigação.26
Ou seja, a obrigação do emitente está incorporada ao título e o acompanha,
onde quer que este título esteja, seja nas mãos de pessoa legitimada (fechando o ciclo
obrigacional) ou não. A obrigação persiste ainda que ausente ou contra a vontade do
criador do título. Em síntese, para os adeptos da teoria da criação do título, grupo com
26 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 143.
58
o qual ousamos fazer parte, o que importa é a declaração firmada no título e não a real
vontade do subscritor em obrigar-se, podendo este vir a responder por esta obrigação
na hipótese de cair o título sob o domínio de possuidor de má-fé.Corrente esta que, por
outro lado, também vem assegurar direito de quem, de boa-fé seja portador do título,
uma vez que, reitera-se, pode o título já ter circulado.
5.2 Emissão: declaração de vontade
Dentre todos os demais requisitos dos títulos de crédito já apontados,
sobressai aquele que talvez seja, ao nosso sentir o de maior discussão enquanto
confrontado com os requisitos da validade e exigibilidade - o de que seja lícita a sua
emissão, ou seja, de que esta se opere dentro dos limites, dos parâmetros traçados
pelo Direito.
O advento do novo Código Civil (que ainda por hábito insistimos em assim
defini-lo), trouxe consigo relevantes modificações à aplicação do direito e dentre elas a
novidade de incorporar os atos privados a princípios de moralidade pública.
Vejamos. O art. 113 do citado diploma legal traduz que os negócios jurídicos
devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.
Mais adiante, o art. 122, dispõe que consideram-se ilícitas as condições dos atos
jurídicos que sejam contrários à lei, à ordem pública ou aos bons costumes, incluindo
pois aquelas condições que privarem de todo efeito o negócio jurídico (ainda sob a
anuência bilateral) ou o sujeitarem ao arbítrio de somente uma das partes.
No Capítulo dos Defeitos do Negócio Jurídico, examinando-se os artigos 138
e ss., o que se constata é que para a validade do negócio, faz-se necessária a
59
adequação entre a vontade do obrigado e o negócio no qual se obriga, tendo-se por
negócios anuláveis aqueles que sejam fruto de situações eivadas de erro ou
ignorância (arts.138 e ss), dolo (arts. 145 e ss.), coação (arts. 151 e ss.), estado de
perigo (arts. 156), lesão enorme ou lesão no contrato (art. 157) e fraude contra
credores (arts. 158 e ss.).
Com isso, o que se observa é que todo o poder atribuído aos particulares para
se obrigarem juridicamente, passa a conhecer novos limites, sendo portanto, nula a
obrigação quando o motivo gerador desta e comum a ambas as partes, for ilícito.
A princípio, tem-se então como não exigível a cártula que seja emitida para
representar negociação desacobertada pelo Direito, e como exemplo podemos citar
as dívidas de jogo ou de aposta que nesta linha traçada e com fulcro no art. 814 do
Código Civil, não obrigam ao pagamento.
É disposição do caput do citado artigo: “as dívidas de jogo ou de aposta não
obrigam a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia que voluntariamente se
pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito”.
E tal inexigibilidade alcança esfera maior quando, no art. 815 do diploma civil,
desobriga-se o pagamento ainda que tal quantia tenha se originado de empréstimo
feito por terceiro no ato de jogar ou apostar ou para jogo ou aposta.
Como mencionado no § 1º do art. 814, a regra estende-se a qualquer contrato
que encubra ou envolva reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo.
Contudo, tal nulidade não pode ser oposta ao terceiro de boa-fé, já que entre os títulos
de crédito e aqui em especial o cheque, tal reserva tem ainda maior repercussão, face
aos famosos princípios da autonomia, abstração e independência, já conhecidos.
Ainda no que tange à cobrança por dívida de jogo ou aposta, há que se
60
considerar para fins de estudo, a possibilidade de repetição do indébito, ressalvadas
as hipóteses de tal quantia haver sido obtida através de dolo ou se o perdedor
(pagador da quantia) for menor ou interditado, consequentemente incapaz para o ato
realizado.
De tudo, o que se extrai é que, procurou a lei proibir, coibir, o endividamento
pelo jogo e em gritante contra-senso, ao mesmo tempo, preservou o jogo realizado
ainda que em se tratando este de ilícito.
Para muitos doutrinadores, tal conflito de normas seria facilmente resolvido
pelo art. 166, II do Código Civil. No entanto, acreditamos ser tal antítese, ou seja, a
aceitação do ato ilícito já realizado, a mais pura demonstração e exemplo do que
também denota ser o novo Código - a valorização da declaração de vontade do
indivíduo, vontade esta livremente exercida e manifestada através do agir, e
conseqüentemente da aquisição naquele momento específico, de responsabilidades
advindas daquele ato que se sabia ser contrário ao Direito. E mais, nos atrevemos até
a declarar que a aplicabilidade de legislação nestes moldes, seria como atingir a
plenitude de um estado democrático de direito, inerente aos países avançados, onde a
cultura, a informação e os altos níveis de escolaridade, permitem que se atribua ao
cidadão a opção de agir sem a massiva intervenção estatal, infelizmente tão peculiar à
nossa realidade brasileira.
Tal disposição é, ao nosso sentir, a mais clara demonstração da intenção do
legislador em conferir direito ao exercício autônomo da vontade, da liberdade de agir
consciente. Ultrapassa os contornos do aclamado direito subjetivo, refletido no poder
que o ordenamento jurídico concede ao particular para que satisfaça interesse próprio,
ainda que tal direito venha a ferir sua função precípua, de respeitar e preservar sua
61
função social.
Portanto, excetuando os casos de envolvimento de incapaz, fica vedada a
repetição do indébito no caso em análise, ainda que tenha sido o título entregue pró-
soluto (pagamento realizado). Da mesma maneira, também ilícita a arguição de
oposição de pagamento ao credor, mormente nos casos em que tal título já tenha
chegado em mãos de terceiro de boa-fé, que se beneficia do princípio da
inoponibilidade das exceções pessoais.
Responde sim o emitente pelo ato praticado, pela subscrição do título. E
responde também aquele que emprestou quantia na realização do ato ilícito ou para a
realização do ato ilícito.
Ainda no que tange às declarações de vontade e em se tratando de ilicitude na
emissão do título (e na espécie a possibilidade da sua sustação), há que se atentar
para o fato de se avaliar de que ordem foi a intenção do emitente. Há que se averiguar
se utilizou este da licença legal para atingir fim ilícito e com isso usou de ardil para
aparentemente agir de forma lícita, quando, lá no seu íntimo, na verdade já tinha este
objetivo ilícito. Nestes casos, que não raros, muito antes pelo contrário, citamos como
exemplo a prática corriqueira de quem compra mercadoria e simula pagamento com
cheque pós-datado ou pré-datado e após a compra efetuada, susta ou revoga o
pagamento do título, e em verdadeiro descaramento, acaba por lesar o comerciante.
Sobre o exercício consciente da prática ilícita, encontramos preciosa citação
doutrinária do Prof. Gladston Mamede que de forma maravilhosa traduz a
essencialidade dos atos observados:
a distinção entre o ato contrário à lei e o ato que se destina a fraudar a lei é tratada, em lição já vetusta, por Paulo, no Digesto de Legibus (Livro 29), ao afirmar que ‘opera contra lei quem faz o que a lei proíbe, depois em fraude à lei quem, salvadas as palavras da lei, elude o sentido dela’ (‘contra legem
62
facit, qui id facit, quod lex prohibet: in fraudem vero, qui salvis verbis legis, setentiam eius circumvenit’).27
Contudo, mais precisa é, ao nosso ver, a citação que faz Ronaldo Brêtas Dias,
em sua obra, do grande mestre Carnelutti, quando então este, em poucas palavras nos
ensina a definição de fraude: “é atividade dirigida a iludir a lei, e se decompõe, por
conseguinte, em dois elementos, violação da lei e ocultação da violação”28.
27 MAMEDE, Gladston. A advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil. Porto Alegre: Síntese,
1999. p. 382. 28 DIAS, Ronaldo Brêtas de Carvalho. Fraude no processo civil. 2. ed. rev., atual. e ampl. Belo
Horizonte: Del Rey, 2000. p. 21.
63
6 APLICABILIDADE DA SUSTAÇÃO
6.1 Oposição no cheque administrativo
Três são as definições básicas do instituto cheque:
a) constitui, qualquer uma de suas modalidades, ordem de pagamento à vista,
incondicionada dada a um banco, por alguém que disponha de fundos disponíveis
no mesmo, em favor próprio ou de terceiro.
b) o emitente do cheque garante seu pagamento.
c) o cheque possui a função típica de um instrumento/promessa de pagamento.
Todavia, coisa diversa se verifica, quando se esteja diante do chamado
“cheque administrativo”, tendo em vista confundirem-se na mesma pessoa, as figuras
do emitente e do sacado do título, motivo pelo qual, grande parte dos doutrinadores
afasta a possibilidade de contra-ordem no cheque administrativo, já que impossível
ordem que dê uma pessoa a si mesma.
O entendimento majoritário é de que, ainda que tal ordem de revogação fosse
expedida por quem extraiu o cheque, a agência sacada não poderia atender tal
pedido, já que a contra-ordem só pode ser dada pelo emitente e este é o próprio
banco.
Descartada então a hipótese de contra-ordem de pagamento, pela própria
inadequação aos cheques administrativos, cumpre-nos analisar a possibilidade de
oposição ao pagamento deste tipo de cheque.
Com efeito, o caput do art. 36 da Lei n. 7357/85 dispõe que: “Mesmo durante o
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prazo de apresentação, o emitente e o portador legitimado podem fazer sustar o
pagamento, manifestando ao sacado, por escrito, oposição fundada em relevante
razão de direito”.
Pela leitura do dispositivo legal, como sacador e sacado confundem-se no
cheque administrativo, poder-se-ia, desde logo descartar a figura do emitente.
Todavia, o emitente pode fazer oposição ao pagamento de cheque administrativo em
face do portador de má-fé dele, tendo em vista que o artigo 25 da Lei do Cheque
expressamente excluiu do rol das exceções causais de que trata e veda a utilização,
aquela relativa ao portador do título que o adquiriu em consciente detrimento do
devedor, na hipótese em análise, a própria instituição financeira.
Neste sentido, ilustra tal entendimento, o acórdão do Tribunal de Alçada de
Minas Gerais, onde em Apelação Cível n. 0303551-0, proferida pela 6ª Câmara
Cível, tendo como Relator o Juiz Belisário de Lacerda, julgou possível a sustação
do pagamento pelo banco no caso de má-fé do portador.
Apelação cível - Execução por título extrajudicial - cheque administrativo -sustação do pagamento - fraude - falsificação de assinatura - embargos do devedor-prova pericial - fraude comprovada - exceção pessoal oposta pelo devedor - exceção de dolo. Se a causa ‘debendi’ provém de meios ilícitos ou inidôneos, desaparecem os motivos do rigorismo do direito cambial, em defesa da circulação dos títulos e do terceiro de boa-fé. (j. 31.8.2000) (grifo nosso).
6.2 Dívida de jogo
Expressa o artigo 814 do Código Civil que a dívida de jogo não obriga ao
pagamento, mas que uma vez efetuado o desembolso voluntário da quantia, exceto se
comprovado o dolo ou nas hipóteses que indiquem o desfavorecimento de menor ou
65
interdito, inocorre repetição.
Desta feita, aquele que paga uma dívida desta natureza, assim o faz por mera
liberalidade, e seu ato de pagar revela uma conduta intencional de por fim àquele
dever moral. É que para muitos, a obrigação natural vem sendo encarada como um
dever moral, ficando na consciência do responsável o seu cumprimento espontâneo.
Portanto, uma vez que se emite um cheque para pagamento de dívida desta
natureza, demonstrada está a intenção do devedor sacador em liquidar o débito e não
há que se cogitar ser possível a sustação do pagamento. Se em âmbito geral, a
emissão do cheque já traduz a clara manifestação da vontade do emitente que muitas
vezes é, por obrigação legal, compelido a pagar uma dívida, maior ainda será a
demonstração desta vontade, desta intenção, quando nascer esta para saldar dívida
que por meio judicial não se cobra, face à ausência do vinculum iures.
No caso, acreditamos que nem mesmo o argumento da ilicitude da causa que
deu origem à dívida não prospera, já que pela característica da abstração dos títulos
cambiais, o cheque não se vincula à sua causa.
Mister se lembrar que pelo princípio da circulabilidade, pode vir o título a cair
em mãos de terceiro de boa fé e neste caso, por proteção a este, seria defeso ao
emitente se opor ao pagamento.
Ou seja, só nos casos em que o título estiver na posse do beneficiário direto é
que poderia se questionar a origem da dívida que deu causa à emissão do cheque,
sendo certo que o onus probandi no sentido de caracterizar a inexigibilidade da dívida
de jogo, será do próprio sacador.
Ultrapassada a fase probatória que ficou a cargo do emitente, e uma vez
demonstrada a origem da dívida, há quem entenda que desobrigado se encontra o
66
mesmo de satisfazer o pagamento, já que nasceu este de ato ilícito, vedado pela
legislação em vigor e portanto carente estaria o interessado credor do elemento que
funciona como pressuposto indispensável ao exercício regular da ação.
Em síntese, contrariando os princípios da autonomia e abstração inerentes ao
título em estudo, a inexigibilidade do pagamento da dívida de jogo poderia ser
suscitada, conseqüentemente possibilitando a sustação do cheque.
Sobre o tema, comenta Carlos Henrique Abrão:
Defender tese em sentido diametralmente oposto além de revelar um completo non sense desemboca na perfeita contradição entre o princípio de ordem pública e outro de natureza privada, proveniente da relação jurídica entre os particulares, mormente no aspecto do pagamento que se descortina indevido.29
Contudo, seria aqui prudente, abordar os casos onde a destipificação criminal
se impõe, como no caso de cheque sem fundos emitido com base em causa ilícita.
Neste exemplo, quando o título vem especificando uma causa que por si só é
reprovável ante a ausência de critério normativo a permitir a exigibilidade prestacional
de cunho material, a destipificação se faz presente
6.3 Morte ou incapacidade do emitente
É taxativo o artigo 37 da Lei do Cheque, quando reza que a morte do emitente
ou a incapacidade superveniente à emissão não invalidam os efeitos do cheque;
portanto, a oposição ou sustação só poderá ocorrer nos casos legais previstos.
Diferentemente do sistema anglo-americano, o nosso continua a ter como
29 ABRÃO, Carlos Henrique. Contra-ordem e oposição no cheque . 3. ed. rev. ampl. e atual. São
Paulo: Editora de Direito, 1997. p. 80.
67
exigível o título cambiário, pelo que, sobrevindo o óbito do emitente, verificando-se a
existência de fundos disponíveis, deve o sacado realizar o pagamento de cheque que
lhe for apresentado. Ainda que ausentes os fundos disponíveis para a satisfação do
crédito, tal fato não desonera os herdeiros que possivelmente, nos limites de seus
quinhões, responderão pela dívida deixada pelo de cujus.
Ultrapassado então o prazo para apresentação do título, essencial que se
proceda à contra-ordem do pagamento, que poderá ser feita pelos herdeiros, através
do inventariante, todos estes legitimados para tal ato, em decorrência da substituição
legal.
Nem mesmo a incapacidade assumida após a emissão do título autoriza a
sustação do pagamento, e caso isso venha a ocorrer, responderá o curador perante o
credor.
Norma esta que se esforça por assegurar o melhor possível a proteção do
incapaz, sem contudo, deixar de atender e dar toda a garantia aos terceiros de boa-fé
que com ele tratam.
Quanto à averiguação das obrigações contraídas pelo incapaz, apenas a título
de ilustração, interessante é a normatização da matéria adotada pelo sistema francês,
onde em seu Código Civil, preleciona-se sobre a redução das obrigações excessivas
contratadas pelo incapaz. Naquele sistema, e em especial nos casos envolvendo
menores de idade, os tribunais têm que apreciar o caráter excessivo da obrigação,
levando em consideração não somente a fortuna do menor e o caráter da despesa,
mas também a boa ou má-fé das pessoas que com ele contratam, protegendo assim o
incapaz da má administração de seu representante.
68
7 DO NÃO PAGAMENTO DO TÍTULO
7.1 Ação cambial
Sidou distingue pagamento regular e não regular da seguinte maneira:
a despeito da apresentação perfazer-se regular, o pagamento pode ser obstaculizado por contra-ordem ou revogação do emitente ou oposição de terceiros, e pela emergente insuficiência de numerário disponível em mão do sacado.
Assim, o cheque infrutiferamente apresentado há de prosseguir seu iter iures, cabendo ao portador, ou defender-se se a oposição disser com sua conduta ou seu status, ou proceder contra os obrigados pelo título, no caso de insolvência do sacado. Triunfando na primeira hipótese e posteriormente embolsando o valor do saque, ou bem sucedido na segunda, com posterior ressarcimento obtido dos devedores solidários, o portador terá sido satisfeito mediante um pagamento não regular, distinguido do pagamento regular, qualificadamente o que é efetuado pelo sacado imediatamente após a apresentação.30
Na falta de pagamento do título, o art. 47 da Lei do Cheque, prevê a
possibilidade do portador do título, beneficiário direto ou não, ajuizar ação cambial,
podendo a mesma ser dirigida contra o emitente e seus avalistas, (ação direta), ou
contra o endossante e seus avalistas (ação de regresso).
Na hipótese de execução contra os endossantes e seus avalistas, que por
força do art. 21 da Lei n. 7357/85 são responsáveis pelo pagamento da dívida, faz-se
necessária a comprovação de que o cheque foi apresentado ao sacado, dentro do
prazo legal do art. 33 da citada lei, e que houve recusa no pagamento, recusa esta que
será comprovada pelo protesto.
30 SIDOU, J. M. Othon. Do cheque: lei nacional combinada com a lei uniforme, jurisprudência. 3. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 195.
69
Segundo art. 1º da Lei n. 9492/92, protesto é ato formal e solene pelo qual se
prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros
documentos de dívida. Desta feita, verifica-se que a importância central do protesto é a
realização de prova da apresentação para aceite ou, nos casos sob estudo, de não
pagamento. Neste contexto, é importante ressaltar que a prova da apresentação, com
o protesto, é inequívoca, absoluta, tendo a doutrina considerado a intimação de que o
protesto se realizará em três dias, como uma apresentação indireta do título devido.
Definindo protesto, Prof. Wille Duarte Costa assim o fez:
Protesto é antes de tudo, prova. Dentro das finalidades legais contidas na legislação que rege os títulos de crédito, ele é prova insubstituível da apresentação do título ao devedor. O resto é conseqüência. Em muitos casos, o devedor nem sabe em mão de quem se encontra o título, que, por isso, deve ser apresentado a ele, obrigatoriamente.31
Alguns doutrinadores entendem ser o protesto dispensável mesmo nas ações
executivas contra os endossantes, podendo apenas com a declaração do sacado no
título se fazer prova da recusa no pagamento. Embasam tal prerrogativa nos dizeres do
§1º do art. 47 da Lei n. 7357/85, que dispõe que as declarações emitidas pela
instituição financeira sacada, ou pela câmara de compensação, dispensam o protesto,
produzindo, para fins cambiários, os mesmos efeitos deste.
Contudo, a grande maioria vai contra a dispensa do protesto, e alguns, como
Restiffe e Neto, chegam mesmo a evidenciar a obrigatoriedade do mesmo em toda e
qualquer situação por ser este meio obrigatório imposto por lei para conservação do
direito de ação. O autor veementemente rechaça a ausência do instituto, alegando que
o que se verifica é a “subestimação ou amenização do rigor da exigência legal do
protesto como insubstituível meio de prova da mora e requisito máximo da
31 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 223.
70
conservação do direito de ação”32.
Contudo, enxergamos a dispensa e desnecessidade do protesto face ao
emitente e seu avalista muito mais como uma questão de valoração da
responsabilidade assumida na emissão do título que uma inobservância ao rigorismo
legal, como pretendeu o doutrinador citado alegar. É preciso, ainda que, e justamente
por se tratar de direito cambial, que se faça distinção entre a responsabilidade do
emitente e a do endossante, que por certo, como já vimos, não é da mesma ordem e,
portanto incabível tratamento equânime às partes.
A diferença entre as responsabilidades do emitente e dos endossantes,
reafirma-se, é de ordem de Direito Cambiário, ainda que com reflexos processuais,
talvez familiares. Portanto, se não há apresentação tempestiva e recusa no pagamento
do cheque, não há responsabilidade dos endossantes, que desta feita, tornam-se
partes ilegítimas à pretensão executiva. No entanto, a obrigação do emitente é
equiparada a esta a de seu avalista, é direta, resultado da emissão da cártula. E tal
obrigação nos faz lembrar as duras palavras de Rubens Requião, quando,
taxativamente diz que: “Quem não quiser pagar o cheque que não o emita”33.
Discorrendo sobre o assunto, Prof. Wille Duarte Costa34 nos ensina que em
ação cambial, o portador do cheque, pode exigir do demandado: a) a importância do
cheque não pago; b) os juros legais computados estes desde o dia da 1ª
apresentação; c) as despesas que fez; d) a compensação pela perda do valor
32 RESTIFFE, Paulo Sérgio; NETO, Paulo Restiffe. Lei do cheque : anotações à nova lei do cheque
nacional, conjugada com a lei uniforme de Genebra. 4. ed. rev., atual., e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 184.
33 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1992. v. II, p. 224. 34 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 276.
71
aquisitivo da moeda. Completa ainda o autor, dizendo que, quem paga pelo cheque,
não sendo o emitente, pode exigir de seus garantes: a) a importância integral que
pagou; b) os juros legais contados do dia do pagamento; c) as despesas feitas; d) a
compensação pelo valor aquisitivo da moeda.
A ação cambial ou executiva, como preferem denominar alguns autores reger-
se-á nos moldes do Livro II do Código de Processo Civil, artigos 566 e seguintes e tem
como objetivo, expropriar os bens do devedor, a fim de tornar imediata a satisfação do
direito do credor, sem que tenha este que discutir a causa da dívida.
Na hipótese de ser promovida ação cambial contra o próprio emitente e contra
seu avalista, se a apresentação do cheque ou seu pagamento, são obstados por fato
inimputável ao sacado a execução poderá ser instruída apenas com a cártula
preenchida com todos os seus requisitos, sendo portanto desnecessário que tenha
havido prévia apresentação ao banco, nem prévio protesto, não se fazendo no caso,
nem prova da inadimplência, nem da mora, mas apenas do direito representado na
cártula.
Pode também o protesto ser dispensado pelo próprio emitente ou endossante
e avalistas quando lançarem estes na cártula, a cláusula “sem despesa” ou “sem
protesto”, conforme reza o art. 51 da Lei do Cheque. Entretanto, tal dispensa
não exclui a necessidade de ser o cheque apresentado em tempo hábil nem
mesmo de ser a recusa do pagamento da ciência do emitente e do endossante.
Os efeitos desta dispensa, porém, surtirão de acordo com quem a realizou. Se
lançada na cártula a dispensa pelo emitente, esta produzirá efeitos em relação a todos
os obrigados no título. Mas se for lançada por endossante ou por avalista, esta só
alcança quem a lançou.
72
Importante deixar claro que ainda assim, poderá o portador da cártula
protestar o título sendo o proveito e a utilização da dispensa mera liberalidade sua,
podendo mesmo, se quiser, fazer sim prova da impontualidade do devedor.
O protesto, se analisado sob o ponto de vista de seus efeitos práticos, é ato
de suma importância e de relevantes conseqüências jurídicas já que se por acaso o
comerciante já tiver um título de crédito protestado, a partir daí, qualquer pessoa, com
base no mesmo, poderá requerer a falência do devedor.
Ainda em se tratando de protesto, e no que se refere ao seu tramitar, tem-se
que, recebido o título, o oficial intimará o devedor e coobrigados (se houver), para
aceitar, pagar ou justificar porque não o fez, lavrando o protesto em três dias úteis,
contados da protocolização do título no cartório. Lembrando-se que na contagem deste
prazo, há de se excluir o dia da protocolização e incluir o do vencimento, entendendo-
se por dias úteis aqueles em que houver expediente bancário com horário normal.
Demonstrada a responsabilidade do emitente ou do portador legitimado que,
ainda que ausente o motivo ou irrelevante a razão sustou o pagamento, fica este
obrigado a indenizar o prejuízo causado, de forma integral. Necessário também
esclarecer que, aquele que revogou ou sustou indevidamente o pagamento do cheque,
não terá direito a ação de regresso contra os coobrigados no tocante às perdas e
danos, uma vez que a indenização resulta exclusivamente de sua conduta irregular e
prejudicial ao credor.
7.2 Cheque prescrito
O artigo 189 do Diploma Civil, em alusão à pretensão de agir, de exercer tal
73
direito de ação, assim define prescrição: “ Violado o direito, nasce para o titular a
pretensão, a qual se extingue pela prescrição, [...]”.
É certo que o cheque traz em sua essência a característica primordial de um
título executivo extrajudicial - a de estar sujeito à executoriedade. Daí o porque de seu
prazo de apresentação, ser tão importante para o fim específico da contagem do lapso
prescricional, que é de 6 (seis) meses contados a partir da expiração deste. Prescrito
o título, deverá então o beneficiário ou portador legitimado, ingressar com ação própria
de cobrança visando compelir o obrigado principal e demais coobrigados à satisfação
do crédito de modo integral. O que se deve lembrar é que a prescrição do título,
enquanto declaração de vontade que é, (art. 59 Lei n. 7357/85) não traduz a prescrição
do crédito em si, ou seja, da faculdade que tem o credor de exigir o pagamento. Tem-
se assim, uma prescrição do título, mas não do crédito, o que reconhece-se pelos
dizeres do art. 61 da citada lei, onde prevista está a possibilidade de aforamento de
ação contra aquele (emitente) ou aqueles (emitente e coobrigados) que se
locupletaram injustamente com o não pagamento do cheque, ação esta que tem prazo
prescricional de dois anos contados do dia em que se consumar a prescrição do título.
Diante disso, não é mais o cheque, por si, a razão de ser do procedimento
judicial, mas o fato jurídico no qual foi emitido e, portanto, faz-se imprescindível a
descrição desse fato, passando a ser a cártula agora apenas prova documental desse
fato. Extrapola o objeto da ação o campo do Direito Cambiário e passa a fazer parte
do das Obrigações.
A ação de cobrança, comumente chamada de ação de locupletamento, deixa
então de ser procedimento executório, mas sim cognitivo, que visa formar com a
sentença, um título judicial.
74
Outrossim, pode se valer o credor do título de via mais célere, introduzida em
nosso ordenamento através da chamada ação monitória, que igualmente poderá ser
utilizada, servindo então o cheque como prova escrita, sem valor de título executivo
judicial.
Relatando o Recurso Especial 36.590/MG para a quarta Turma do
Superior Tribunal de justiça, o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira teceu
considerações acerca da diferenciação entre a chamada ação de locupletamento
prevista no art. 61 da Lei n. 7357/85, e a ação de cobrança, dizendo que
naquela, o credor cobra o cheque a favor do qual milita presunção iuris tantum de veracidade, estando o autor dispensado de outras provas, incumbindo ao réu abalar tal presunção. [...] na ação de cobrança, de outra parte o que persegue o autor é o cumprimento de uma obrigação, resultante de negócio jurídico bilateral. O cheque, nessa circunstância constitui mero começo de prova escrita, que deve ser reforçado pelo autor por outros meios a seu alcance. [Aduz ainda que:] a diferença fundamental entre ambas está no onus probandi. Enquanto na ação de locupletamento o próprio cheque basta como prova do fato constitutivo do direito do autor, incumbindo ao réu provar a falta de causa do título, na ação de cobrança, necessário se faz que comprove o autor o negócio jurídico gerador do crédito reclamado. Assim, a ação de locupletamento tem portanto, caráter diverso da ação de cobrança, visando aquela à constituição de título executivo judicial que restabeleça a força executiva do cheque, partindo de um locupletamento presumido. (grifo nosso).
Muito se discute (tanto na doutrina quanto nos julgados), sobre a necessidade
de ser apresentada a causa debendi quando da propositura da ação de cobrança.
Contudo, importa destacar que o cheque regularmente preenchido, por si só, dota o
seu portador da presunção juris tantum, sobre a certeza do respectivo crédito. O que
se observa é que a legislação se coloca favoravelmente ao portador da cártula,
minimizando os formalismos para efeito de cobrança, sem a necessidade de se
esmiuçar o negócio jurídico correspondente ao título, de modo a ser necessária a
comprovação documental deste negócio, posto que a cártula, por si só, oferece
condições de procedibilidade, servindo como pressuposto inafastável ao
75
reconhecimento do crédito nele inserido.
Também de relevante destaque, ainda sobre a cobrança de cheque não pago,
é a redação do § 3º do art. 47 da Lei n. 7357/85, que não deixa dúvidas acerca da
perda da via executória no caso de apresentação tardia do cheque, devendo-se
ressaltar o fato de que a insuficiência de fundos (se ocorrer), se verificou por
circunstância estranha à vontade do correntista. Ou seja, conseqüência lógica da falta
de fundos, no que se refere à apresentação extemporânea, é a não intencionalidade
do emitente para causar situação típica nas condições de frustrar o pagamento do
título.
Uma vez prescrito o cheque, desaparecem as relações cambiais acessórias,
que são as responsabilidades solidárias dos demais partícipes, avalistas e
endossatários preservando-se apenas a obrigação principal, que é a do emitente.
7.3 Defesa do executado
Justamente pela importância da autonomia do título, e da clareza do direito
nele representado, a Lei n. 7357/85 restringe a defesa permitida na ação cambial,
dizendo no seu art. 51 que: “Na ação cambial, somente é admissível defesa fundada no
direito pessoal do réu contra o autor, em defeito de forma do título e na falta de
requisito necessário ao exercício da ação”.
Assim, a ação cambial ou executiva, terá que ter por base um título perfeito,
preenchendo estes todos os requisitos extrínsecos e intrínsecos a que a lei condiciona
à sua natureza de cheque. Deve ainda o título ser exigível, isto é, necessário que esteja
vencido e não prescrito, e que conforme já mencionado, tenha sido oportunamente
76
protestado, caso se trate de ação de regresso.
Impago o cheque pelo sacado, seja por conta da contra-ordem seja pela
oposição, poderá o beneficiário do título diretamente se dirigir ao emitente, sendo
certo que no processo de execução, a despeito de conciso o art. 51 citado, nada obsta
que o prejudicado suscite matéria relacionada com a revogação ou sustação do
pagamento. A autorização do exame da quaestio iuris encontra respaldo no art. 745
do CPC: “Quando a execução se fundar em título extrajudicial, o devedor poderá
alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe
seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento”.
Art. 741, do Código de Processo Civil:
Na execução fundada em título judicial, os embargos só poderão versar sobre:
I - falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento, se a ação lhe ocorreu à revelia;
II - inexigibilidade do título;
III - ilegitimidade das partes;
IV - cumulação indevida de execuções;
V - excesso de execução ou nulidade desta até a penhora;
VI - qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação com execução aparelhada, transação ou prescrição, desde que supervenientes `a sentença;
VII - incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz.
77
8 A RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
8.1 Responsabilidade civil - conceito
Interessante é o conceito dado pelo doutrinador Vilson Rodrigues Alves35, onde
segundo ele, “responsabilidade civil é relação social”, ou seja, decorre desta, sendo
que o conceito jurídico da mesma pressupõe o conceito de personalidade, uma vez
que não se concebe a relação de responsabilidade sem a figuração da pessoa nos
pólos dessa mesma relação. Dentro do assunto, esclarece ainda o citado mestre que
“se a pressupõe, não a supõe”, porquanto há pessoas irresponsáveis civilmente, como
a exemplo os incapazes, mencionados no art. 3º e 4º do Código Civil brasileiro.
8.1.1 Da responsabilidade subjetiva
Nos termos do caput do art. 927 do Código Civil, aquele que, por ato ilícito
(arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repara-lo, sendo patente a
responsabilidade subjetiva como regra do atual diploma. Desta feita, em regra, fica
mantida a necessidade de comprovação da culpa para que o lesado possa assegurar
a condenação em juízo do causador do dano. Ou seja, para a responsabilização do
devedor, via de regra, deve ser comprovada a ocorrência do dano, a “culpa em sentido
amplo”, e verificado o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o evento danoso.
35 ALVES, Vilson Rodrigues. Responsabilidade civil dos estabelecimentos bancários. 2. ed.
Campinas: Bookseller, 1999. v. I.
78
8.1.2 Da responsabilidade objetiva
Ensina o Código Civil, no parágrafo único do artigo 927, que haverá obrigação
de reparar o dano, independente de culpa, na linha da responsabilidade objetiva:
a) nos casos especificados em lei; ou
b) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, riscos para o direito de outrem.
Quanto à primeira situação do parágrafo único do citado artigo, basta ao
intérprete procurar os casos de responsabilidade objetiva na legislação extravagante
infraconstitucional como por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (CDC, Lei
n. 8.078/90), onde sabido é que o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou
estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa,
pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de
projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou
acondicionamento de seus produtos bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua utilização e riscos (art. 12).
8.2 Da responsabilidade dos estabelecimentos bancários
8.2.1 Prejuízo e dano
Na responsabilidade civil dos estabelecimentos bancários, assim como nos
demais ramos do direito, é imprescindível a existência do prejuízo.
79
Dentre alguns doutrinadores, há entendimento respeitável de que o prejuízo
causado pelo agente é o dano. No entanto, para outros, tal entendimento mostra-se
incorreto, corrente com a qual concordamos e passamos à tentativa de explicar o
porque: o prejuízo implica alteração deficitária ao legitimado ativo, podendo no entanto,
haver prejuízo que não danifica. Desta feita, tem-se que os dois conceitos não são
coextensivos. O dano iminente ou com mais precisão a iminência do dano, é hipótese
típica de prejuízo sem dano. Nesta visão, o dano é algo a mais frente ao prejuízo. A
diferença exposta de dano e prejuízo é de grande sutileza, cabendo esclarecer para
melhor entendimento desta diferença, ser factível de ocorrer, situação onde se
responde civilmente por prejuízo causado, mas não se indeniza.
Segundo Vilson Rodrigues Alves em obra já citada, uma afirmação contrária a
tal entendimento implicaria tomar-se a expressão “responsabilidade civil” por
“indenização”, erronia que cumpre seja afastada.
8.2.2 A ilicitude e a culpa
Por sua vez, é imprescindível que no suporte fático de incidência das regras
jurídicas de responsabilização civil dos estabelecimentos financeiros, haja o dado da
ilicitude, sendo certo que esta só ocorre por que se agiu contrariamente a direito
(subjetivo ou não) ou a Direito (objetivo).
Se há ofensa por concretizar-se ou concretizada, tem de haver satisfação à
pretensão preventiva que impeça a sua concretização, ou à correspondente reparação,
o que gera cumprimento da função sócio adaptativa do Direito.
Em outros termos, a obrigação de indenizar como reflexo da
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responsabilização não existe, em regra, só porque o agente causador do dano
procedeu objetivamente mal. É essencial que ele tenha agido com culpa: por ação ou
omissão voluntária, por negligência ou imprudência, nos moldes do Código Civil. Agir
com culpa significa atuar o agente em termos de, pessoalmente merecer a censura ou
a reprovação do direito, sendo que tal circunstância só ocorre quando, em face das
circunstâncias concretas da situação, caiba a ele afirmar que podia e devia ter agido
de modo contrário.
O artigo 186 do Código Civil ao descrever a ocorrência do ato ilícito, define o
que se entende por ato culposo, do seguinte modo: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
No entanto, é consenso geral entre os doutrinadores pesquisados, que não se
pode prescindir dos elementos “previsibilidade” e comportamento do homo medius
para a correta e completa conceituação de culpa. Em outras palavras, só se pode
cogitar de culpa quando o evento é previsível, ainda que extremamente difícil a prova
de sua existência, como nos casos da mais nova modalidade de culpa, a chamada
culpa virtual, que vai além da esfera da culpa presumida. Modalidade, aliás já
largamente difundida dentre os tribunais europeus, e quase sempre aplicada aos
casos de lesão por erro médico.
De outra feita, se imprevisível o evento danoso, não há que se cogitar de culpa.
Como exemplo, tem-se as hipóteses de caso fortuito ou força maior, onde não se pode
conferir culpa a ninguém, já que a culpa existirá sempre que houver previsão do dano,
não importando se esta previsão foi grande, quase alcançando uma certeza ou se
sequer cogitada, mas já existia no plano cognitivo do agente.
81
O dolo consiste na vontade de cometer ato ilícito, de violar um direito. É a
violação intencional e, portanto, consciente, do dever jurídico. A modalidade de culpa
que mais se assemelha ao dolo é a culpa lata ou grave, sendo esta a falta imprópria ao
comum dos homens.
Culpa leve é a falta evitável, com atenção ordinária, que qualquer um teria e
culpa levíssima é a falta que só poderia ser evitada com atenção extraordinária, com
especial habilidade ou conhecimento específico e singular.
Não obstante a responsabilidade civil fundada na culpa em sentido restrito e
no dolo (culpa latu sensu), tenha persistido ao longo da evolução do pensamento
jurídico através do tempo, em qualquer de suas modalidades, entretanto, a culpa
implica a violação de um dever de diligência, ou, em outras palavras, a violação do
dever de previsão de certos fatos ilícitos e de adoção das medidas capazes de evita-
los.
Com ela, culpa, uma vez mais enfatizando, tem-se que há responsabilização
civil quando ocorrem condutas comissivas ou omissivas do agente, e a já famosa
proporcionalidade - prejuízo à vítima e nexo de causalidade entre a conduta culposa e
o prejuízo.
A responsabilidade subjetiva traz consigo a idéia da existência de culpa, ou
seja, a culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável.
Quando, porém, a lei impõe a certas pessoas, em determinadas situações a
reparação de um dano cometido sem culpa, (declarada sob o prisma da esfera
jurídica), a responsabilidade é chamada de objetiva.
Também chamada de teoria do risco, a teoria objetiva tem como postulado
que todo dano é indenizável e passível de reparação, por aquele a quem a ele se liga
82
pelo nexo de causalidade. Assume, pois, este nome a teoria objetiva uma vez que a
responsabilidade civil do agente se desloca da noção de culpa para a idéia de risco,
comumente chamado de “risco-proveito”, que se funda no princípio segundo o qual é
reparável o dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade realizada em
benefício do responsável, já que para esta teoria toda pessoa que exerce alguma
atividade cria um risco de dano para terceiro.
Ao fazer referência ao sujeito do ato ilícito, para fins de reparação do dano,
permaneceu o novo Código Civil silente, assim como o era no antigo art. 159. Isto é,
em caso de dano causado por um incapaz privado de discernimento, pela leitura do
artigo estaria este compelido ao pagamento de indenização ou a reparar o dano
causado? Alguns doutrinadores, entendem que deveria ser o incapaz
responsabilizado, já que o artigo 186 não faz distinção, mormente nos casos em que o
incapaz tem condições financeiras bem melhores que a vítima. De outro lado, é
entendimento majoritário que, ao citar o artigo, os elementos ação ou omissão
voluntária, ou quando se refere o legislador à ocorrência de negligência ou
imprudência, está claro e implícito o uso da vontade esclarecida para tanto, do
discernimento para a realização do ato ou no mínimo da previsão do dano, caso venha
este a se concretizar.
Ainda que dentro de capítulo diverso, mas em se falando de atribuição de
responsabilidades, vale a pena aqui de se cogitar acerca da verificação da
responsabilidade dos amentais, e dentre estes aqueles que ainda que
temporariamente possam ser classificados como tais.
A hipótese levantada nos traz a estudo a situação daqueles que fazem uso de
drogas, de tóxicos ou mesmo os alcoólatras, que não raras às vezes atingem o estado
de insanidade mental, ainda que transitório. E que neste estado, para adquirirem
83
substância a eles quase vital, tamanho os seus vícios, fazem uso da prática de furto ou
até do roubo e da falsificação de cheques, no intuito único de adquirir a droga ou a
bebida.
De se salientar que a jurisprudência tem se firmado no sentido de que pela
teoria da culpa anterior, muitos amentais podem e estão sendo responsabilizados. E
assim o estão não em virtude da culpa atual, mas em virtude de uma culpa remota, já
que os atuais insanos mentais teriam podido prever que o uso da droga os levaria para
tal estágio (alienação mental) e que por isso poderiam praticar atos danosos no futuro.
Quanto ao alvo de discussões de nossos tribunais, sobre a culpa presumida
pode-se afirmar que, ao longo dos tempos, a multiplicação das oportunidades e das
causas onde se reclamavam por danos, evidenciou-se que a responsabilidade
subjetiva mostrou-se inadequada para cobrir todos os casos de reparação. Verificou-
se, como se tem já esclarecido, que nem sempre o lado lesado consegue provar estes
elementos. Especialmente a desigualdade econômica, a capacidade organizacional
da empresa, as cautelas do juiz na aferição dos meios de prova que, trazidos ao
processo nem sempre logram convencer da existência da culpa. Em conseqüência
disso, a vítima remanesce não indenizada, ainda que se admita ter sido efetivamente
lesada.
Dentro desta realidade, um dos meios técnicos adotados para a resolução
dessas desigualdades na composição dos conflitos, foi a adoção da teoria da culpa
presumida, esta hoje já fazendo parte da nossa legislação.
Foi sem dúvida a melhor medida adotada, uma vez que com ela, a vítima não
mais se veria na contingência de ter de alegar e comprovar a culpa de seu ofensor.
Essa culpa seria aprioristicamente presumida, no sentido em que tal conduta culposa
84
de quem ao agir o fez com déficit à esfera jurídica alheia, em outras palavras feriu
direito alheio, incumbirá ao presumido culpado o ônus probandi em sentido contrário,
já que não se trata de presunção iures et de iure mas sim iures tantum.
Necessário aqui ressaltar que a invocação dessa teoria da culpa presumida,
por sua vez, por óbvio, não implica a mercê do ofendido, ou seja, somente cabe a sua
aplicação nas hipóteses previstas em lei ou naquelas em que a jurisprudência assenta
sua pertinência.
8.3 A atividade bancária à luz do CDC
O estudo dessa questão deve se iniciar com a busca dos fundamentos de
ordem constitucional de defesa do consumidor, que além de direito fundamental
coletivo, previsto no art. 5º, XXXII da Constituição Federal - erigem os consumidores à
categoria de titulares de direitos fundamentais - é princípio constitucional relativo à
ordem econômica (art. 170, inciso V da Constituição Federal), legitimando toda a
intervenção do Estado para assegurar esses ditames.
Como direito fundamental, a proteção do consumidor carrega caráter de
inalienabilidade, imprescritibilidade e irrenunciabilidade, que se traduz basicamente
nos dispositivos elencados no art. 1º do CDC, os quais afirmam tratarem-se de normas
de ordem pública e interesse social.
Desta feita, inaceitável é o não enquadramento dos bancos e demais
instituições financeiras no regime de proteção do CDC, pois são estes facilmente
reconhecidos na definição de fornecedor, de acordo com o conceito trazido pelo
diploma legal mencionado e a sua atividade tem, sem sombra de dúvida, natureza
85
empresarial.
A caracterização do banco ou instituição financeira como fornecedor sob a
incidência do CDC, há tanto já discutida, é hoje pacífica. Da mesma forma, em sendo
o consumidor destinatário final do serviço, é fácil reforçar a sua posição como tal,
como destinatário final de todos os contratos de depósito, de poupança e de
investimentos que firmar com os bancos.
Contudo, vencida a discussão do enquadramento também das pessoas
jurídicas como consumidoras do serviço bancário, a dificuldade está na caracterização
do consumidor nos contratos de empréstimo, onde há uma obrigação de dar, de
fornecer o dinheiro, que é bem juridicamente consumível. Além disso, haveria, nestes
casos, de se verificar se o tomador do empréstimo, ou seja, o contratante, seria
destinatário fático, não obstante o produto ser insumo para alguma outra atividade
profissional. Nessa hipótese, acreditamos não ser possível se recorrer à tutela do
Código de Defesa do Consumidor.
Porém, observamos, dentre os inúmeros julgados consultados nesta pesquisa,
que o sistema aberto, trabalha com a técnica de equiparação de pessoas à situação
de consumidor quando se constatar o desequilíbrio contratual e a vulnerabilidade da
pessoa que contrata com o fornecedor, seja esta vulnerabilidade técnica, jurídica ou
fática.
Em síntese, apesar das diversas posições contrárias e com o apoio da
doutrina, as operações bancárias no mercado, como um todo, foram consideradas
pela jurisprudência brasileira como submetidas às normas e ao novo espírito do CDC,
princípios estes da boa-fé obrigatória e do equilíbrio contratual.
86
8.4 Da responsabilidade pelo pagamento de cheque sustado
A teoria do risco profissional parte do pressuposto de que o banco, ao exercer
a sua atividade com fins de lucro, assume riscos que vier a causar. Neste
entendimento, a responsabilidade deve recair sobre aquele que aufere os lucros da
atividade. O risco profissional do banqueiro no pagamento dos cheques é explicado
pelos juristas pelo fato dos bancos, direta ou indiretamente, terem grandes lucros
graças ao sistema de cheques. A se notar que não se obtém um talão de cheques
senão mediante o depósito de fundos. E que mesmo assim, dependendo da
quantidade de talões contratados com a instituição, existe a cobrança por talonário
extra. Portanto pelo princípio da equidade, onde está o proveito, está o ônus.
Especialmente quando alguns fatores surgem como agravantes à evolução da
idéia do risco profissional, como por exemplo, o desconhecimento por parte do cliente
dos chamados “mecanismos bancários”, que geralmente ocasionam incontestável
situação de inferioridade do cliente em relação à instituição.
Existe ainda, a idéia por parte de alguns juristas, de que a atividade exercida
pelos bancos assemelha-se à dos concessionários dos serviços públicos, que
exercem função delegada do Estado. Para tais juristas, dentre eles podemos citar
Arnold Wald, que diz praticar o banco um verdadeiro serviço público de distribuição de
crédito. Tal idéia encontra fundamentação no texto expresso da lei da reforma
bancária, que define o sistema financeiro nacional, dele fazendo parte, além do
Conselho Monetário Nacional e dos demais bancos oficiais, as demais instituições
financeiras públicas e privadas (art. 1 , inciso V da Lei n. 4595/64).
Daí que, pela própria natureza dos serviços prestados pela instituição
87
financeira, entende-se que a esta se impõe à responsabilidade objetiva, pelos
mesmos motivos pelos quais se estabeleceu a do Estado, ou seja, justifica-se que a
instituição financeira responda objetivamente pelos danos causados com base na
teoria da culpa do serviço, consolidada e consagrada no campo do direito público.
No momento, no entanto, as diretrizes que norteiam a jurisprudência podem
ser resumidas desta forma:
a) quando o correntista não concorreu para o evento danoso, os prejuízos decorrentes
do pagamento do cheque fraudado devem ser pagos, ou melhor, “suportados” pelo
banco;
b) se, provada pelo banco a culpa do correntista na guarda do talonário, fica aquele
isento de culpa;
c) em caso de culpa concorrente (negligência do correntista na guarda de talonário -
culpa in vigilando, e do banco no pagamento do cheque com assinatura
grosseiramente falsificada), os prejuízos se repartem;
d) não provada a culpa do correntista, nem do banco, sobre este é que deve recair o
prejuízo (culpa objetiva).
Vale aqui ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor somente admite a
exclusão da responsabilidade do fornecedor em caso de culpa exclusiva do
consumidor ou de terceiro. Culpa exclusiva, e não concorrente, vale dizer.
A dominante orientação de nossos tribunais no que diz respeito à
responsabilidade contratual dos bancos e instituições afins nos casos de pagamento
de cheque falso ainda que ordenada a sustação é a de que: todas as vezes que um
falsário apresenta ao banco um saque com a assinatura falsificada, a vítima é o banco
e não o correntista, cuja assinatura falsificada é apenas um meio para a consecução
88
do fim. Quem recebe o cheque é o banco e não o correntista; quem o examina é o
banco; quem pode exigir ou dispensar provas de identidade é o banco. O correntista
está alheio a tudo, especialmente se não autorizou a sustação, e ignora que alguém se
apresenta com um cheque que, aparentemente, figura a sua assinatura. Nenhuma
providência pode tomar para evitar o êxito do criminoso. Se a falsidade for descoberta
oportunamente, nenhum prejuízo sofrerá o banco; se for bem sucedida é ele a vítima.
Ou seja, de um jeito ou de outro, há de ser o banco o responsável por arcar com o
prejuízo porventura existente.
O ilustre jurista Caio Mário36, em sua obra Responsabilidade Civil, entende
que o banco, ao acatar o cheque falso, efetua o pagamento com dinheiro seu. Assim, o
cheque falso é ato fraudulento montado contra o banco e, portanto, cabe a este
suportar-lhe as conseqüências.
Finalmente, para os fins de responsabilização e conseqüente indenização,
questões ainda de relevada importância devem ser aqui suscitadas. É necessário que
se faça lembrar que há de ser verificada, caso a caso, e que a incidência de caso
fortuito ou força maior não foi incluída no rol de excludentes de responsabilidades do
CDC, bem como uma vez ultrapassada a questão da responsabilidade, há de se fazer
prova do efetivo prejuízo sofrido pelo cliente. Neste caso, cumpre à parte que tem
interesse na demonstração do dano, ministrar-lhe a respectiva prova, já que aqui não
incide a aplicação do inciso VIII do art. 6º do CDC. Considera-se para fins probatórios,
a utilização de provas indiretas, como por exemplo, o bom nome, higidez e integridade
moral do cliente, seu nível e posição social que ocupa, etc, etc, etc.
Em síntese, certo é que a responsabilidade civil tratada no Código Civil
36 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
89
manteve as ponderações acerca da responsabilidade subjetiva, ampliando o rol dos
responsáveis pelos causadores de danos e acolhendo a teoria do risco e da
responsabilidade objetiva.
Neste sentido, de aplicarmos às instituições financeiras tal responsabilidade,
necessário faz-se a observância de conceitos básicos do que vem a ser consumidor,
de fornecedor, do que seria o produto em questão, bem como observar as situações
de má-fé, vulnerabilidade, de necessidade e até de ignorância, em face da
hipersuficiência econômica, situações estas sobrepujadas pelos interesses das partes
envolvidas, sejam estes individuais ou coletivos.
90
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho apresentado nasceu de nossa indignação frente a um caso
concreto de sustação do pagamento de um cheque onde, no exercício da fraude, o
emitente utilizou-se do modelo de cheque pré-datado, adquiriu mercadoria e sustou o
pagamento alegando ausência de fundos.
Pela certeza de que o caso que inspirou a pesquisa apresentada foi a
representação de apenas um em meio a milhões, é que nos debruçamos sobre o tema
na tentativa de demonstrar entendimentos legais e doutrinários, bem como o
comportamento dos juristas e julgadores frente a tal prática, que de maneira corriqueira
vem fazendo parte de nosso sistema.
Acreditamos piamente que deve a lei preservar seus olhos bem abertos, e
ouvidos bem atentos aos casos e casos onde se discute a possibilidade de sustação
no pagamento de cheques. Há que se atentar para as oportunidades, não raras, diga-
se de passagem, de quando apresentada a sustação a ser discutida em nossos
tribunais, poder-se aferir os casos onde tal ato foi premeditado, se foi este intencional,
se quando utilizando-se de meio lícito (possibilidade legal da sustação) procurou o
emitente realizar seu objetivo ilícito, consequentemente lesando comerciantes e
desestruturando a credibilidade no instituto do cheque enquanto aceitação que é como
meio de pagamento, como por vezes podemos observar cotidianamente nos
estabelecimentos comerciais. Seja na não aceitação de cheques oriundos de contas
recém abertas, seja na não aceitação de cheques de terceiro, cheques de outra praça,
cheque representando quantias acima deste ou daquele valor, etc. Restrições que
91
foram impostas ao consumidor e usuário do título que nasceu com o fito único de ser
facilitador de circulação de mercadorias e conseqüentemente gerador de riquezas,
mas que pela desatenção legal, vem sendo utilizado para consecução de projetos
ilícitos. Vale aqui citar a Lei n. 8002/90 que foi revogada pelo art. 92 da Lei n. 8884/94,
onde dispõe esta sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem
econômica, e que não reproduziu a vedação de recusa de pagamento mediante
cheque visado e bancário. Neste sentido o cheque não é papel de curso forçado
porque ninguém é obrigado a recebe-lo contra a sua vontade. A Lei n. 8002/90
considerava os cheques visados e bancários como moeda corrente.
Portanto, o que se sente é que latente se encontra a necessidade de se criar
mecanismos talvez mais rígidos ou mais práticos, no sentido de prevenir ou não se
podendo mais prevenir, de se punir a prática ilegal do uso da sustação, ainda que com
esta não perca o documento sua característica de dívida, podendo ser cobrado
judicialmente.
De outra feita, certo é que grande parte do ocorrido encontra abrigo no
momento econômico vivido. Momento onde o consumismo desenfreado dita as regras
do jogo, onde a todo e qualquer custo tudo o que se almeja é possuir, por sua vez
gerando descontrole nas finanças daqueles que não hesitam em cada vez mais ter na
ilusão de ser.
Também temos a certeza de que acoberta parcela considerável desta prática
ilegal, a situação particular e peculiar, porque não dizer, de nosso país. Já descrente,
chego mesmo a pensar ser tal situação não mais apenas um momento pelo qual se
atravessa (como quando pequenos ouvíamos assim dizer), mas sim uma característica
adotada e aceita - a de se permitir a corrupção, que descaradamente já se encontra
confortavelmente aqui instalada. Não mais hóspede de passagem, mas moradora fixa,
92
quase proprietária. Assim como vem tentando ser a imoralidade, que passa a ser
pressuposto para obtenção de vantagens, onde, a contrario senso, os meios justificam
os fins.
Por todo o quadro que se apresenta e que não aparece aqui nestas palavras
pela primeira vez, como inédito, é que se faz imprescindível a análise individualizada
de cada situação onde ocorre a sustação, porque também fruto deste triste quadro é o
roubo, a falsificação, o furto, onde passam a ser agora vítimas, os supostos emitentes
dos títulos, cujo pagamento se pretende sustar.
Estamos seguros de que a presente pesquisa foi gratificante, não só porque
nos acrescentou, mas também porque acreditamos ter encontrado aqui a oportunidade
de, ainda que de forma pequena, invocarmos pela justiça, pela responsabilização sem
embargos, da atitude assumida ao momento da emissão de um título, pela aceitação
da manifestação da vontade do indivíduo, ainda que sob a utopia de se alcançar um
perfeito Estado democrático de direito, onde o direito se reconhece certo e o dever se
pressupõe existir.
93
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96
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VIEIRA, Alexandre Letízio. Alguns aspectos atuais e polêmicos do Cheque. Revista de Direito Mercantil, São Paulo, n. 120, p. 250-256, 2000.
97
ANEXO A - Lei do Cheque n. 7357/85 (DOU 02/09/85)
Dispõe sobre o cheque e dá outras providências.
CAPÍTULO I - DA EMISSÃO E DA FORMA DO CHEQUE
Art. 1º. O cheque contém:
I - a denominação "cheque'' inscrita no contexto do título e expressa na língua em que
este é redigido;
II - a ordem incondicional de pagar quantia determinada;
III - o nome do banco ou da instituição financeira que deve pagar (sacado);
IV - a indicação do lugar de pagamento;
V - a indicação da data e do lugar da emissão;
VI - a assinatura do emitente (sacador), ou de seu mandatário com poderes especiais.
Parágrafo único. A assinatura do emitente ou a de seu mandatário com poderes
especiais pode ser constituída, na forma da legislação específica, por chancela
mecânica ou processo equivalente.
Art. 2º. O título a que falte qualquer dos requisitos enumerados no artigo precedente
não vale como cheque, salvo nos casos determinados a seguir:
I - na falta de indicação especial, é considerado lugar de pagamento o lugar designado
junto ao nome do sacado, se designados vários lugares, o cheque é pagável no
primeiro deles; não existindo qualquer indicação, o cheque é pagável no lugar de sua
emissão;
II - não indicado o lugar de emissão, considera-se emitido o cheque no lugar indicado
junto ao nome do emitente.
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Art. 3º. O cheque é emitido contra banco, ou instituição financeira que lhe seja
equiparada, sob pena de não valer como cheque.
Art. 4º. O emitente deve ter fundos disponíveis em poder do sacado e estar autorizado
a sobre eles emitir cheque, em virtude de contrato expresso ou tácito. A infração
desses preceitos não prejudica a validade do título como cheque.
§ 1º. A existência de fundos disponíveis é verificada no momento da apresentação do
cheque para pagamento.
§ 2º. Consideram-se fundos disponíveis:
a) os créditos constantes de conta corrente bancária não subordinados a termo;
b) o saldo exigível de conta corrente contratual;
c) a soma proveniente de abertura de crédito.
Art. 5º. (VETADO).
Art. 6º. O cheque não admite aceite, considerando-se não escrita qualquer declaração
com esse sentido.
Art. 7º. Pode o sacado, a pedido do emitente ou do portador legitimado, lançar e
assinar, no verso do cheque não ao portador e ainda não endossado, visto,
certificação ou outra declaração equivalente, datada e por quantia igual à indicada no
título.
§ 1º. A aposição de visto, certificação ou outra declaração equivalente obriga o sacado
a debitar à conta do emitente a quantia indicada no cheque e a reservá-la em benefício
do portador legitimado, durante o prazo de apresentação, sem que fiquem exonerados
o emitente, endossantes e demais coobrigados.
§ 2º. O sacado creditará à conta do emitente a quantia reservada, uma vez vencido o
prazo de apresentação; e, antes disso, se o cheque lhe for entregue para inutilização.
Art. 8º. Pode-se estipular no cheque que seu pagamento seja feito:
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I - a pessoa nomeada, com ou sem cláusula expressa "à ordem'';
II - a pessoa nomeada, com a cláusula "não à ordem'', ou outra equivalente;
III - ao portador.
Parágrafo único. Vale como cheque ao portador o que não contém indicação do
beneficiário e o emitido em favor de pessoa nomeada com a cláusula "ou ao portador'',
ou expressão equivalente.
Art. 9º. O cheque pode ser emitido:
I - à ordem do próprio sacador;
II - por conta de terceiro;
III - contra o próprio banco sacador, desde que não ao portador.
Art. 10. Considera-se não escrita a estipulação de juros inserida no cheque.
Art. 11. O cheque pode ser pagável no domicílio de terceiro, quer na localidade em que
o sacado tenha domicílio, quer em outra, desde que o terceiro seja banco.
Art. 12. Feita a indicação da quantia em algarismos, e por extenso, prevalece esta no
caso de divergência. Indicada a quantia mais de uma vez, quer por extenso, quer por
algarismos, prevalece, no caso de divergência, a indicação da menor quantia.
Art. 13. As obrigações contraídas no cheque são autônomas e independentes.
Parágrafo único. A assinatura de pessoa capaz cria obrigações para o signatário,
mesmo que o cheque contenha assinatura de pessoas incapazes de se obrigar por
cheque, ou assinaturas falsas, ou assinaturas de pessoas fictícias, ou assinaturas que,
por qualquer outra razão, não poderiam obrigar as pessoas que assinaram o cheque,
ou em nome das quais ele foi assinado.
Art. 14. Obriga-se pessoalmente quem assina cheque como mandatário ou
representante, sem ter poderes para tal, ou excedendo os que lhe foram conferidos.
Pagando o cheque, tem os mesmos direitos daquele em cujo nome assinou.
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Art. 15. O emitente garante o pagamento, considerando-se não escrita a declaração
pela qual se exima dessa garantia.
Art. 16. Se o cheque, incompleto no ato da emissão, for completado com
inobservância do convencionado com o emitente, tal fato não pode ser oposto ao
portador, a não ser que este tenha adquirido o cheque de má-fé.
CAPÍTULO II - DA TRANSMISSÃO
Art. 17. O cheque pagável a pessoa nomeada, com ou sem cláusula expressa "à
ordem'', é transmissível por via de endosso.
§ 1º. O cheque pagável a pessoa nomeada, com a cláusula "não à ordem'', ou outra
equivalente, só é transmissível pela forma e com os efeitos de cessão.
§ 2º. O endosso pode ser feito ao emitente, ou a outro obrigado, que podem
novamente endossar o cheque.
Art. 18. O endosso deve ser puro e simples, reputando-se não-escrita qualquer
condição a que seja subordinado.
§ 1º. São nulos o endosso parcial e o do sacado.
§ 2º. Vale como em branco o endosso ao portador. O endosso ao sacado vale apenas
como quitação, salvo no caso de o sacado ter vários estabelecimentos e o endosso
ser feito em favor de estabelecimento diverso daquele contra o qual o cheque foi
emitido.
Art. 19. O endosso deve ser lançado no cheque ou na folha de alongamento e assinado
pelo endossante, ou seu mandatário com poderes especiais
§ 1º. O endosso pode não designar o endossatário. Consistindo apenas na assinatura
do endossante (endosso em branco), só é válido quando lançado no verso do cheque
ou na folha de alongamento.
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§ 2º. A assinatura do endossante, ou a de seu mandatário com poderes especiais,
pode ser constituída, na forma de legislação específica, por chancela mecânica, ou
processo equivalente.
Art. 20. O endosso transmite todos os direitos resultantes do cheque. Se o endosso é
em branco pode o portador:
I - completá-lo com o seu nome ou com o de outra pessoa;
II - endossar novamente o cheque, em branco ou a outra pessoa;
III - transferir o cheque a um terceiro, sem completar o endosso e sem endossar.
Art. 21. Salvo estipulação em contrário, o endossante garante o pagamento.
Parágrafo único. Pode o endossante proibir novo endosso; neste caso, não garante o
pagamento a quem seja o cheque posteriormente endossado.
Art. 22. O detentor de cheque "à ordem'' é considerado portador legitimado, se provar
seu direito por uma série ininterrupta de endossos, mesmo que o último seja em
branco. Para esse efeito, os endossos cancelados são considerados não-escritos.
Parágrafo único. Quando um endosso em branco for seguido de outro, entende-se que
o signatário deste adquiriu o cheque pelo endosso em branco.
Art. 23. O endosso num cheque passado ao portador torna o endossante responsável,
nos termos das disposições que regulam o direito de ação, mas nem por isso converte
o título num cheque "à ordem''.
Art. 24. Desapossado alguém de um cheque, em virtude de qualquer evento, o novo
portador legitimado não está obrigado a restituí-lo, se não o adquiriu de má-fé.
Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto neste artigo, serão observadas, nos casos
de perda, extravio, furto, roubo ou apropriação indébita do cheque, as disposições
legais relativas à anulação e substituição de títulos ao portador, no que for aplicável.
Art. 25. Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao
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portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os
portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em detrimento
do devedor.
Art. 26. Quando o endosso contiver a cláusula "valor em cobrança'', "para cobrança'',
"por procuração'', ou qualquer outra que implique apenas mandato, o portador pode
exercer todos os direitos resultantes do cheque, mas só pode lançar no cheque
endosso-mandato. Neste caso, os obrigados somente podem invocar contra o
portador as exceções oponíveis ao endossante.
Parágrafo único. O mandato contido no endosso não se extingue por morte do
endossante ou por superveniência de sua incapacidade.
Art. 27. O endosso posterior ao protesto, ou declaração equivalente, ou à expiração do
prazo de apresentação produz apenas os efeitos de cessão. Salvo prova em contrário,
o endosso sem data presume-se anterior ao protesto, ou declaração equivalente, ou à
expiração do prazo de apresentação.
Art. 28. O endosso no cheque nominativo, pago pelo banco contra o qual foi sacado,
prova o recebimento da respectiva importância pela pessoa a favor da qual foi emitido,
e pelos endossantes subseqüentes.
Parágrafo único. Se o cheque indica a nota, fatura, conta cambial, imposto lançado ou
declaração a cujo pagamento se destina, ou outra causa da sua emissão, o endosso
pela pessoa a favor da qual foi emitido e a sua liquidação pelo banco sacado provam
a extinção da obrigação indicada.
CAPÍTULO III - DE AVAL
Art. 29. O pagamento do cheque pode ser garantido, no todo ou em parte, por aval
prestado por terceiro, exceto o sacado, ou mesmo por signatário do título.
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Art. 30. O aval é lançado no cheque ou na folha de alongamento. Exprime-se pelas
palavras "por aval'', ou fórmula equivalente, com a assinatura do avalista. Considera-se
como resultante da simples assinatura do avalista, aposta no anverso do cheque, salvo
quando se tratar da assinatura do emitente.
Parágrafo único. O aval deve indicar o avalizado. Na falta de indicação, considera-se
avalizado o emitente.
Art. 31. O avalista se obriga da mesma maneira que o avalizado. Subsiste sua
obrigação, ainda que nula a por ele garantida, salvo se a nulidade resultar de vício de
forma.
Parágrafo único. O avalista que paga o cheque adquire todos os direitos dele
resultantes contra o avalizado e contra os obrigados para com este em virtude do
cheque.
CAPÍTULO IV - DA APRESENTAÇÃO E DO PAGAMENTO
Art. 32. O cheque é pagável a vista. Considera-se não escrita qualquer menção em
contrário.
Parágrafo único. O cheque apresentado para pagamento antes do dia indicado como
data de emissão é pagável no dia da apresentação.
Art. 33. O cheque deve ser apresentado para pagamento, a contar do dia da emissão,
no prazo de 30 (trinta) dias, quando emitido no lugar onde houver de ser pago; e 60
(sessenta) dias, quando emitido em outro lugar do País ou no exterior.
Parágrafo único. Quando o cheque é emitido entre lugares com calendários diferentes,
considera-se como de emissão o dia correspondente do calendário do lugar de
pagamento.
Art. 34. A apresentação do cheque à câmara de compensação equivale à
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apresentação a pagamento.
Art. 35. O emitente do cheque pagável no Brasil pode revogá-lo mercê de contra-
ordem dada por aviso epistolar, ou por via judicial ou extrajudicial, com as razões
motivadoras do ato.
Parágrafo único. A revogação ou contra-ordem só produz efeito depois de expirado o
prazo de apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até
que decorra o prazo de prescrição, nos termos do art. 59 desta Lei.
Art. 36. Mesmo durante o prazo de apresentação, o emitente e o portador legitimado
podem fazer sustar o pagamento, manifestando ao sacado, por escrito, oposição
fundada em relevante razão de direito.
§ 1º. A aposição do emitente e a revogação ou contra-ordem se excluem
reciprocamente.
§ 2º. Não cabe ao sacado julgar da relevância da razão invocada pelo oponente.
Art. 37. A morte do emitente ou sua incapacidade superveniente à emissão não
invalidam os efeitos do cheque.
Art. 38. O sacado pode exigir, ao pagar o cheque, que este lhe seja entregue quitado
pelo portador.
Parágrafo único. O portador não pode recusar pagamento parcial, e, nesse caso, o
sacado pode exigir que esse pagamento conste do cheque e que o portador lhe dê a
respectiva quitação.
Art. 39. O sacado que paga cheque "à ordem'' é obrigado a verificar a regularidade da
série de endossos, mas não a autenticidade das assinaturas dos endossantes. A
mesma obrigação incumbe ao banco apresentante do cheque à câmara de
compensação.
Parágrafo único. Ressalvada a responsabilidade do apresentante, no caso da parte
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final deste artigo, o banco sacado responderá pelo pagamento do cheque falso,
falsificado ou alterado, salvo dolo ou culpa do correntista, do endossante ou do
beneficiário, dos quais poderá o sacado, no todo ou em parte, reaver o que pagou.
Art. 40. O pagamento se fará à medida em que forem apresentados os cheques e se 2
(dois) ou mais forem apresentados simultaneamente, sem que os fundos disponíveis
bastem para o pagamento de todos, terão preferência os de emissão mais antiga e,
se da mesma data, os de número inferior.
Art. 41. O sacado pode pedir explicações ou garantia para pagar cheque mutilado,
rasgado ou partido, ou que contenha borrões, emendas e dizeres que não pareçam
formalmente normais.
Art. 42. O cheque em moeda estrangeira é pago, no prazo de apresentação, em
moeda nacional ao câmbio do dia do pagamento obedecida a legislação especial.
Parágrafo único. Se o cheque não for pago no ato da apresentação, pode o portador
optar entre o câmbio do dia da apresentação e o do dia do pagamento para efeito de
conversão em moeda nacional.
Art. 43. (VETADO).
§ 1º. (VETADO).
§ 2º. (VETADO).
CAPÍTULO V - DO CHEQUE CRUZADO
Art. 44. O emitente ou o portador podem cruzar o cheque, mediante a aposição de dois
traços paralelos no anverso do título.
§ 1º. O cruzamento é geral se entre os dois traços não houver nenhuma indicação ou
existir apenas a indicação "banco'', ou outra equivalente, O cruzamento é especial se
entre os dois traços existir a indicação do nome do banco.
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§ 2º. O cruzamento geral pode ser convertido em especial, mas este não pode
converter-se naquele. A inutilização do cruzamento ou a do nome do banco é reputada
como não existente.
Art. 45. O cheque com cruzamento geral só pode ser pago pelo sacado a banco ou a
cliente do sacado, mediante crédito em conta. O cheque com cruzamento especial só
pode ser pago pelo sacado ao banco indicado, ou, se este for o sacado, a cliente seu,
mediante crédito em conta. Pode, entretanto, o banco designado incumbir outro da
cobrança.
§ 1º. O banco só pode adquirir cheque cruzado de cliente seu ou de outro banco. Só
pode cobrá-lo por conta de tais pessoas.
§ 2º. O cheque com vários cruzamentos especiais só pode ser pago pelo sacado no
caso de dois cruzamentos, um dos quais para cobrança por câmara de compensação.
§ 3º. Responde pelo dano, até a concorrência do montante do cheque, o sacado ou o
banco portador que não observar as disposições precedentes.
CAPÍTULO VI - DO CHEQUE PARA SER CREDITADO EM CONTA
Art. 46. O emitente ou o portador podem proibir que o cheque seja pago em dinheiro
mediante a inscrição transversal, no anverso do título, da cláusula "para ser creditado
em conta'', ou outra equivalente. Nesse caso, o sacado só pode proceder a
lançamento contábil (crédito em conta, transferência ou compensação), que vale como
pagamento. O depósito do cheque em conta de seu beneficiário dispensa o respectivo
endosso.
§ 1º. A inutilização da cláusula é considerada como não existente.
§ 2º. Responde pelo dano, até a concorrência do montante do cheque, o sacado que
não observar as disposições precedentes.
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CAPÍTULO VII - DA AÇÃO POR FALTA DE PAGAMENTO
Art. 47. Pode o portador promover a execução do cheque:
I - contra o emitente e seu avalista;
II - contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque é apresentado em tempo hábil
e a recusa do pagamento é comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado,
escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda,
por declaração escrita e datada por câmara de compensação.
§ 1º. Qualquer das declarações previstas neste artigo dispensa o protesto e produz os
efeitos deste.
§ 2º. Os signatários respondem pelos danos causados por declarações inexatas.
§ 3º. O portador que não apresentar o cheque em tempo hábil, ou não comprovar a
recusa de pagamento pela forma indicada neste artigo, perde o direito de execução
contra o emitente, se este tinha fundos disponíveis durante o prazo de apresentação e
os deixou de ter, em razão de fato que não lhe seja imputável.
§ 4º. A execução independe do protesto e das declarações previstas neste artigo, se a
apresentação ou o pagamento do cheque são obstados pelo fato de o sacado ter sido
submetido a intervenção, liquidação extrajudicial ou falência.
Art. 48. O protesto ou as declarações do artigo anterior devem fazer-se no primeiro dia
útil seguinte.
§ 1º. A entrega do cheque para protesto deve ser prenotada em livro especial e o
protesto tirado no prazo de 3 (três) dias úteis a contar do recebimento do título.
§ 2º. O instrumento do protesto, datado e assinado pelo oficial público competente,
contém:
a) a transcrição literal do cheque, com todas as declarações nele inseridas, na ordem
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em que se acham lançadas;
b) a certidão da intimação do emitente, de seu mandatário especial ou representante
legal, e as demais pessoas obrigadas no cheque;
c) a resposta dada pelos intimados ou a declarações da falta de resposta;
d) a certidão de não haverem sido encontrados ou de serem desconhecidos o
emitente ou os demais obrigados, realizada a intimação, nesse caso, pela imprensa.
§ 3º. O instrumento de protesto, depois de registrado em livro próprio, será entregue ao
portador legitimado ou àquele que houver efetuado o pagamento.
§ 4º. Pago o cheque depois do protesto, pode este ser cancelado, a pedido de
qualquer interessado, mediante arquivamento de cópia autenticada de quitação que
contenha perfeita identificação do título.
Art. 49. O portador deve dar aviso da falta de pagamento a seu endossante ao
emitente, nos 4 (quatro) dias úteis seguintes ao do protesto ou das declarações
previstas no art. 47 desta Lei ou, havendo cláusula "sem despesa'', ao da
apresentação.
§ 1º. Cada endossante deve, nos 2 (dois) dias úteis seguintes ao do recebimento do
aviso, comunicar seu teor ao endossante precedente, indicando os nomes e
endereços dos que deram os avisos anteriores, e assim por diante, até o emitente,
contando-se os prazos do recebimento do aviso precedente.
§ 2º. O aviso dado a um obrigado deve estender-se, no mesmo prazo, a seu avalista.
§ 3º. Se o endossante não houver indicado seu endereço, ou o tiver feito de forma
ilegível, basta o aviso ao endossante que o preceder.
§ 4º. O aviso pode ser dado por qualquer forma, até pela simples devolução do
cheque.
§ 5º. Aquele que estiver obrigado a aviso deverá provar que o deu no prazo estipulado.
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Considera-se observado o prazo se, dentro dele, houver sido posta no correio a carta
de aviso.
§ 6º. Não decai do direito de regresso o que deixa de dar o aviso no prazo
estabelecido. Responde, porém, pelo dano causado por sua negligência, sem que a
indenização exceda o valor do cheque.
Art. 50. O emitente, o endossante e o avalista podem, pela cláusula "sem despesa,
sem protesto'', ou outra equivalente, lançada no título e assinada, dispensar o portador,
para promover à execução do título, do protesto ou da declaração equivalente.
§ 1º. A cláusula não dispensa o portador da apresentação do cheque no prazo
estabelecido, nem dos avisos. Incumbe a quem alega a inobservância de prazo a
prova respectiva.
§ 2º. A cláusula lançada pelo emitente produz efeito em relação a todos os obrigados;
a lançada por endossante ou por avalista produz efeito somente em relação ao que
lançar.
§ 3º. Se, apesar da cláusula lançada pelo emitente, o portador promove o protesto, as
despesas correm por sua conta. Por elas respondem todos os obrigados, se a
cláusula é lançada por endossante ou avalista.
Art. 51. Todos os obrigados respondem solidariamente para com o portador do cheque.
§ 1º. O portador tem o direito de demandar todos os obrigados, individual ou
coletivamente, sem estar sujeito a observar a ordem em que se obrigaram. O mesmo
direito cabe ao obrigado que pagar o cheque.
§ 2º. A ação contra um dos obrigados não impede sejam os outros demandados,
mesmo que se tenham obrigado posteriormente àquele.
§ 3º. Regem-se pelas normas das obrigações solidárias as relações entre obrigados
do mesmo grau.
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Art. 52. O portador pode exigir do demandado:
I - a importância do cheque não pago;
II - os juros legais desde o dia da apresentação;
III - as despesas que fez;
IV - a compensação pela perda do valor aquisitivo da moeda, até o embolso das
importâncias mencionadas nos itens antecedentes.
Art. 53. Quem paga o cheque pode exigir de seus garantes:
I - a importância integral que pagou;
II - os juros legais, a contar do dia do pagamento;
III - as despesas que fez;
IV - a compensação pela perda do valor aquisitivo da moeda, até o embolso das
importâncias mencionada nos itens antecedentes.
Art. 54. O obrigado contra o qual se promova execução, ou que a esta esteja sujeito,
pode exigir, contra pagamento, a entrega do cheque, com o instrumento de protesto ou
da declaração equivalente e a conta de juros e despesas quitadas.
Parágrafo único. O endossante que pagou o cheque pode cancelar seu endosso e os
dos endossantes posteriores.
Art. 55. Quando disposição legal ou caso de força maior impedir a apresentação do
cheque, o protesto ou a declaração equivalente nos prazos estabelecidos, consideram-
se estes prorrogados.
§ 1º. O portador é obrigado a dar aviso imediato da ocorrência de força maior a seu
endossante e a fazer menção do aviso dado mediante declaração datada e assinada
por ele no cheque ou folha de alongamento. São aplicáveis, quanto ao mais, as
disposições do art. 40 e seus parágrafos desta Lei.
§ 2º. Cessado o impedimento, deve o portador, imediatamente, apresentar o cheque
111
para pagamento e, se couber, promover protesto ou a declaração equivalente.
§ 3º. Se o impedimento durar por mais de 15 (quinze) dias contados do dia em que o
portador, mesmo antes de findo o prazo de apresentação, comunicou a ocorrência de
força maior a seu endossante, poderá ser promovida a execução, sem necessidade
da apresentação do protesto ou declaração equivalente.
§ 4º. Não constituem casos de força maior os fatos puramente pessoais relativos ao
portador ou à pessoa por ele incumbida da apresentação do cheque, do protesto ou
da obtenção da declaração equivalente.
CAPÍTULO VIII - DA PLURALIDADE DE EXEMPLARES
Art. 56. Excetuado o cheque ao portador, qualquer cheque emitido em um país e
pagável em outro pode ser feito em vários exemplares idênticos, que devem ser
numerados no próprio texto do título, sob pena de cada exemplar ser considerado
cheque distinto.
Art. 57. O pagamento feito contra a apresentação de um exemplar é liberatório, ainda
que não estipulado que o pagamento torna sem efeito os outros exemplares.
Parágrafo único. O endossante que transferir os exemplares a diferentes pessoas e os
endossantes posteriores respondem por todos os exemplares que assinarem e que
não forem restituídos.
CAPÍTULO IX - DAS ALTERAÇÕES
Art. 58. No caso de alteração do texto do cheque, os signatários posteriores à
alteração respondem nos termos do texto alterado e os signatários anteriores, nos do
texto original.
Parágrafo único. Não sendo possível determinar se a firma foi aposta no título antes ou
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depois de sua alteração, presume-se que o tenha sido antes.
CAPÍTULO X - DA PRESCRIÇÃO
Art. 59. Prescrevem em 6 (seis) meses, contados da expiração do prazo de
apresentação, a ação que o art. 47 desta Lei assegura ao portador.
Parágrafo único. A ação de regresso de um obrigado ao pagamento do cheque contra
outro prescreve em 6 (seis) meses, contados do dia em que o obrigado pagou o
cheque ou do dia em que foi demandado.
Art. 60. A interrupção da prescrição produz efeito somente contra o obrigado em
relação ao qual foi promovido o ato interruptivo.
Art. 61. A ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados, que se
locupletaram injustamente com o não-pagamento do cheque, prescreve em 2 (dois)
anos, contados do dia em que se consumar a prescrição prevista no art. 59 e seu
parágrafo desta Lei.
Art. 62. Salvo prova de novação, a emissão ou a transferência do cheque não exclui a
ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento.
CAPÍTULO XI - DOS CONFLITOS DE LEIS EM MATÉRIAS
Art. 63. Os conflitos de leis em matéria de cheques serão resolvidos de acordo com as
normas constantes das Convenções aprovadas, promulgadas e mandadas aplicar no
Brasil, na forma prevista pela Constituição Federal.
CAPÍTULO XII - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 64. A apresentação do cheque, o protesto ou a declaração equivalente só podem
ser feitos ou exigidos em dia útil, durante o expediente dos estabelecimentos de
113
crédito, câmaras de compensação e cartórios de protestos.
Parágrafo único. O cômputo dos prazos estabelecidos nesta Lei obedece às
disposições do direito comum.
Art. 65. Os efeitos penais da emissão do cheque sem suficiente provisão de fundos, da
frustração do pagamento do cheque, da falsidade, da falsificação e da alteração do
cheque continuam regidos pela legislação criminal.
Art. 66. Os vales ou cheques postais, os cheques de poupança ou assemelhados, e os
cheques de viagem regem-se pelas disposições especiais a eles referentes.
Art. 67. A palavra "banco'', para os fins desta Lei, designa também a instituição
financeira contra a qual a lei admita a emissão de cheque.
Art. 68. Os bancos e casas bancárias poderão fazer prova aos seus depositantes dos
cheques por estes sacados, mediante apresentação de cópia fotográfica ou
micrográfica.
Art. 69. Fica ressalvada a competência do Conselho Monetário Nacional, nos termos e
nos limites da legislação específica, para expedir normas relativas à matéria bancária
relacionada com o cheque.
Parágrafo único. É da competência do Conselho Monetário Nacional:
a) a determinação das normas a que devem obedecer as contas de depósito para que
possam ser fornecidos os talões de cheques aos depositantes;
b) a determinação das conseqüências do uso indevido do cheque relativamente à
conta do depositante;
c) a disciplina das relações entre o sacado e o opoente, na hipótese do art. 36 desta
Lei.
Art. 70. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 71. Revogam-se as disposições em contrário.
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ANEXO B - Resolução 2.747/2000 (BACEN)
Altera normas relativas à abertura e ao encerramento de contas de depósitos, a
tarifas de serviços e ao cheque.
O BANCO CENTRAL DO BRASIL, na forma do art. 9º da Lei nº 4.595, de 31
de dezembro de 1964, torna público que o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, em
sessão realizada em 28 de junho de 2000, com base nos arts. 3º, inciso V, e 4º, incisos
VIII e IX, da referida Lei, e tendo em vista o disposto no art. 69 da Lei nº 7.357, de 2 de
fevereiro de 1985,
R E S O L V E U:
Art. 1º Alterar os arts. 1º, 2º e 12 da Resolução nº 2.025, de 24 de novembro de
1993, que passam a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 1º Para abertura de conta de depósitos é obrigatória a completa
identificação do depositante, mediante preenchimento de ficha-proposta
contendo, no mínimo, as seguintes informações, que deverão ser mantidas
atualizadas pela instituição financeira: (NR)
I - qualificação do depositante:
a) pessoas físicas: nome completo, filiação, nacionalidade, data e local do
nascimento, sexo, estado civil, nome do cônjuge, se casado, profissão,
documento de identificação (tipo, número, data de emissão e órgão expedidor) e
número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas - CPF;
b) pessoas jurídicas: razão social, atividade principal, forma e data de
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constituição, documentos, contendo as informações referidas na alínea anterior,
que qualifiquem e autorizem os representantes, mandatários ou prepostos a
movimentar a conta, número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa
Jurídica - CNPJ e atos constitutivos, devidamente registrados, na forma da lei, na
autoridade competente; (NR)
II - endereços residencial e comercial completos; (NR)
III - número do telefone e código DDD;
IV - fontes de referência consultadas;
V - data da abertura da conta e respectivo número;
VI - assinatura do depositante.
Parágrafo 1º Se a conta de depósitos for titulada por menor ou por pessoa
incapaz, além de sua qualificação, também deverá ser identificado o responsável
que o assistir ou o representar.
Parágrafo 2º Nos casos de isenção de CPF e de CNPJ previstos na
legislação em vigor, deverá esse fato ser registrado no campo da ficha-proposta
destinado a essas informações." (NR)
"Art. 2º A ficha-proposta relativa a conta de depósitos à vista deverá conter,
ainda, cláusulas tratando, entre outros, dos seguintes assuntos:
I - saldo exigido para manutenção da conta; (NR)
II - condições estipuladas para fornecimento de talonário de cheques;
III - revogado;
IV - obrigatoriedade de comunicação, devidamente formalizada pelo
depositante, sobre qualquer alteração nos dados cadastrais e nos documentos
referidos no art. 1º desta Resolução; (NR)
V - inclusão do nome do depositante no Cadastro de Emitentes de Cheques
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sem Fundos (CCF), nos termos da regulamentação em vigor, no caso de
emissão de cheques sem fundos, com a devolução dos cheques em poder do
depositante à instituição financeira; (NR)
VI - informação de que os cheques liquidados, uma vez micro-filmados,
poderão ser destruídos; (NR)
VII - procedimentos a serem observados com vistas ao encerramento da
conta de depósitos, respeitado o disposto no art. 12 desta Resolução. (NR)
Parágrafo único. Revogado."
"Art. 12. Cabe à instituição financeira esclarecer ao depositante acerca das
condições exigidas para a rescisão do contrato de conta de depósitos à vista por
iniciativa de qualquer das partes, devendo ser incluídas na ficha-proposta as
seguintes disposições mínimas: (NR)
I - comunicação prévia, por escrito, da intenção de rescindir o contrato; (NR)
II - prazo para adoção das providências relacionadas à rescisão do
contrato; (NR)
III - devolução, à instituição financeira, das folhas de cheque em poder do
correntista, ou de apresentação de declaração, por esse último, de que as
inutilizou; (NR)
IV - manutenção de fundos suficientes, por parte do correntista, para o
pagamento de compromissos assumidos com a instituição financeira ou
decorrentes de disposições legais; (NR)
V - expedição de aviso da instituição financeira ao correntista, admitida a
utilização de meio eletrônico, com a data do efetivo encerramento da conta de
depósitos à vista. (NR)
Parágrafo 1º A instituição financeira deve manter registro da ocorrência
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relativa ao encerramento da conta de depósitos à vista. (NR)
Parágrafo 2º O pedido de encerramento de conta de depósitos deve ser
acatado mesmo na hipótese de existência de cheques sustados, revogados ou
cancelados por qualquer causa, os quais, se apresentados dentro do prazo de
prescrição, deverão ser devolvidos pelos respectivos motivos, mesmo após o
encerramento da conta, não eximindo o emitente de suas obrigações legais."
(NR)
Parágrafo único. Fica estabelecido prazo, até 28 de setembro de 2000,
para adequação dos procedimentos relacionados à abertura, manutenção e
encerramento de contas de depósitos, em decorrência do disposto neste artigo.
Art. 2º Fica alterado o art. 1º da Resolução nº 2.303, de 25 de julho de 1996,
que passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 1º Vedar às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a
funcionar pelo Banco Central do Brasil a cobrança de remuneração pela
prestação dos seguintes serviços:
I - fornecimento de cartão magnético ou, alternativamente, a critério do
correntista, de um talonário de cheques com, pelo menos, dez folhas, por mês,
facultada à instituição financeira a prerrogativa de suspender o fornecimento de
novos talonários de cheques quando: (NR)
a) vinte ou mais folhas de cheque, já fornecidas ao correntista, ainda não
tiverem sido liquidadas; ou (NR)
b) não tiverem sido liquidadas 50% (cinqüenta por cento), no mínimo, das
folhas de cheque fornecidas ao correntista nos últimos três meses; (NR)
II - substituição do cartão magnético referido no inciso anterior, exceto nos
casos de pedidos de reposição formulados pelo correntista decorrentes de
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perda, roubo, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição emitente;
III - expedição de documentos destinados à liberação de garantias de
qualquer natureza, inclusive por parte de administradoras de consórcio; (NR)
IV - devolução de cheques pelo Serviço de Compensação de Cheques e
Outros Papéis (SCCOP), exceto por insuficiência de fundos, hipótese em que a
cobrança somente poderá recair sobre o emitente do cheque; (NR)
V - manutenção de contas de depósitos de poupança, à ordem do poder
judiciário, e de depósitos em consignação de pagamento de que trata a Lei nº
8.951, de 13 de dezembro de 1994; (NR)
VI - fornecimento de um extrato mensal contendo toda a movimentação do
mês.
Parágrafo 1º A vedação à cobrança de remuneração pela manutenção de
contas de poupança não se aplica àquelas:
I - cujo saldo seja igual ou inferior a R$20,00 (vinte reais); e
II - que não apresentem registros de depósitos ou saques, pelo período de
seis meses. (NR)
Parágrafo 2º Na ocorrência das hipóteses de que trata o Parágrafo 1º, a
cobrança de remuneração somente poderá ocorrer após o lançamento dos
rendimentos de cada período, limitada ao maior dos seguintes valores:
I - o correspondente a 30% (trinta por cento) do saldo existente em cada mês;
II - R$4,00 (quatro reais) ou o saldo existente, quando inferior a esse valor.
Parágrafo 3º Os serviços mencionados neste artigo são de caráter
obrigatório, observadas as características operacionais de cada tipo de instituição
financeira e, quanto ao fornecimento de talonário de cheques, as condições
estabelecidas na ficha-proposta relativa à conta de depósitos à vista." (NR)
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Art. 3º A sustação (oposição) e a contra-ordem (revogação) somente se
aplicam aos cheques com as características formais previstas em lei, não sendo
aplicáveis às folhas de cheques em branco roubadas, furtadas ou extraviadas, as
quais devem ser objeto de cancelamento por parte da instituição financeira.
Parágrafo 1º Para a efetivação de sustação e de contra-ordem
de cheques, as instituições financeiras que operam na captação de depósitos à
vista devem exigir, na forma da lei, solicitação escrita do interessado, com
justificativa fundada em relevante razão de direito, não cabendo à instituição
examinar o mérito ou a relevância da justificativa.
Parágrafo 2º Para a efetivação de cancelamento de cheques já entregues
ao correntista, a instituição financeira deve receber solicitação desse último, com
declaração do motivo.
Parágrafo 3º As solicitações de sustação, de contra-ordem e de
cancelamento de cheques devem subordinar-se à identificação do interessado,
consignada mediante assinatura em documento escrito, senha eletrônica ou
dispositivo passível de ser utilizado como prova para fins legais.
Parágrafo 4º Admite-se que as solicitações de sustação, de contra-ordem e
de cancelamento de cheques sejam realizadas em caráter provisório, por
comunicação telefônica ou por meio eletrônico, hipótese em que seu acatamento
será mantido pelo prazo máximo de dois dias úteis, após o que, caso não
confirmadas nos termos dos Parágrafos 1º a 3º, deverão ser consideradas
inexistentes pela instituição financeira.
Parágrafo 5º Os cheques devolvidos por motivos de sustação, de contra-
ordem e de cancelamento, uma vez reapresentados, devem ter curso normal,
verificadas, conforme o caso, as seguintes condições:
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I - levantamento da sustação ou da contra-ordem por parte do oponente ou
do emitente;
II - não-confirmação da solicitação provisória de sustação ou de contra-
ordem, nos termos do parágrafo 4º;
III - não-confirmação da solicitação provisória de cancelamento, nos termos
do parágrafo 4º, desde que comprovada a autenticidade da assinatura do
emitente.
Art. 4º É vedada a cobrança de tarifas a título de renovação de sustação, de
contra-ordem e de cancelamento de cheques, que, uma vez realizados, mediante
o correspondente pedido nos termos da legislação e regulamentação em vigor,
devem produzir os respectivos efeitos legais sem prazo predeterminado.
Art. 5º Fica o Banco Central do Brasil autorizado a baixar as normas e a
adotar as medidas necessárias à execução do disposto nesta Resolução.
Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 7º Fica revogado o art. 2º da Resolução nº 2.537, de 26 de agosto de
1998.
Brasília, 28 de junho de 2000
Luiz Fernando Figueiredo
Presidente Substituto
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ANEXO C - Cheque sustado