-
1
Gabriel Delanne A Evoluo Anmica
CAPITULO I A VIDA
SUMRIO: Estudo da vida. - Destruio orgnica. - Criao org-
nica. - Propriedades gerais dos seres vivos. - Condies gerais de
manuteno da vida. - A umidade. - O ar. - O calor. - Condies qumicas
do meio. - A fora vital. - Por que se morre. - A utilidade
fisiolgica do perisprito. - A idia diretriz. - O funcionamento do
organismo. - O papel psicolgico do perisprito. - A identidade. - O
sistema nervoso e a fora nervosa ou psquica. - Resumo.
CAPTULO II A ALMA ANIMAL
SUMARIO: Os selvagens. - Identidade corporal. - Estudo das
faculdades Intelectuais e morais dos animais. - A curiosidade. -
O amor-prprio. - A imitao inteligente. - A abstrao. - A linguagem.
- A Idiotia. - Amor conjugal. - Amor materno. - Amor do prximo. - O
sentimento esttico. - A gradao dos seres. - A luta pela vida.
Resumo.
CAPITULO III COMO O PERISPIRITO PODE ADQUIRIR PROPRIEDADES
FUNCIONAIS
-
2
SUMARIO: A evoluo anmica. - Teoria celular. - Nos
organismos, mesmo rudimentares, preciso a presena do elemento
perispiritual - Diferenciao das clulas originariamente idnticas
desde a sua formao. - Movimentos que se fixam no invlucro. -
Nascimento e desenvolvimento dos instintos. - A ao reflexa, o seu
papel, Inconscincia e conscincia. - Progresso paralela do sistema
nervoso e da Inteligncia. - Resumo.
CAPITULO IV A MEMORIA E AS PERSONALIDADES MOLTIPLAS
SUMARIO: A antiga e a nova psicologia. - Sensao e percepo. -
O Inconsciente psquico. - Condies da percepo. - Estudo da
memria.- A memria orgnica ou inconsciente fisiolgico. A memria
psquica. - A memria propriamente dita. - Os aspectos mltiplos da
personalidade. - A personalidade. - As alteraes da memria pela
enfermidade. - Personalidade dupla. - Histria de Flida. - Histria
da senhorita R. L. - O sonambulismos provocado. - Os diferentes
graus do sonambulismo. - O esquecimento das existncias anteriores.
- Resumo.
CAPTULO V O PAPEL DA ALMA DO PONTO DE VISTA DA
ENCARNAO, DA HEREDITARIEDADE E DA LOUCURA
SUMRIO: A fora vital. - O nascimento. - A hereditariedade. -
Pangnese. - A hereditariedade fisiolgica. - A hereditariedade
psicolgica. - A obsesso e a loucura. - Resumo.
CAPITULO VI O UNIVERSO
-
3
SUMARIO: A matria e o esprito. - A evoluo csmica. - A
evoluo terrestre.
CONCLUSO
NOTAS DE RODAP
INTRODUO
Constitui-se o Espiritismo de um conjunto de doutrinas
filosficas,
reveladas pelos Espritos, isto , por inteligncias que viveram na
Terra. Seu estudo pode dividir-se em duas partes distintas, a
saber:
1 - Anlise dos fatos concernentes ao estabelecimento de
comunicasses entre os vivos e os impropriamente chamados
mortos;
2 - Exame das teorias elaboradas por esses ditos mortos. A
caracterstica deste nosso fim de sculo , no h neg-lo, uma
evoluo radical de idias. Partindo do materialismo, homens de
alta envergadura cientfica
lograram convencer-se de que o niilismo intelectual a mais
balofa das
-
4
utopias. Hiptese contraditria de quantos conhecimentos se ho
adquirido a respeito da alma, ela, de fato, nada explica da
natureza e s produz um profundo desnimo e abastardamento das
inteligncias, em face do nada. As velhas crenas imortalistas,
apoiadas no ensino religioso, dir-se-ia estarem quase
desaparecidas; e, da, a evidncia de conseqncias lamentveis a que
assistimos, como resultantes da falta de um ideal coletivo.
mais que chegado o tempo de reagir, vigorosamente, contra os
sofismas dos pseudo-sbios que, orgulhosamente, decretaram a
incognoscibilidade da morte. preciso quebrar todas as resistncias
arbitrrias, impostas perquirio do alm, to certo como o podermos
afirmar hoje que a sobrevivncia e a imortalidade do ser pensante so
verdades demonstradas com evidncia inconfundvel.
O Espiritismo chegou justo na sua hora. Diante das negaes de um
grosseiro cepticismo, a alma afirmou-se viva depois da morte, merc
de manifestaes tangveis, que a ningum j fora licito contestar, sob
pena de incidir na pecha, alis justa, de ignorante ou
preconceituoso.
Debalde tentaram, em comeo, combater pelo sarcasmo a nova
doutrina. Todos os ridculos foram incuos, de vez que a verdade traz
consigo o selo da certeza, dificilmente irreconhecvel. Mudaram,
ento, de ttica os negativistas, e pretenderam triunfar da nova
cincia, organizando-lhe em torno conjurao do silncio.
A despeito das numerosas investigaes tentadas por fsicos e
qumicas emritos, a cincia oficial fechou, obstinada, ouvidos e
olhos aos fatos, que davam brilhante desmentido s suas asseres, e
fez constar que o Espiritismo estava morto. Mas, essa uma iluso que
importa desfazer, pois que o Espiritismo, ao presente, afirma-se
mais do que nunca florescente. Iniciado com as mesas girantes, o
fenmeno atingiu propores verdadeiramente extraordinrias,
respondendo a todas as crticas contra ele lanadas, mediante fatos
peremptrios e demonstrativos da falsidade de quantas hipteses
imaginavam para explic-lo.
A teoria dos movimentos espontneos e inconscientes, preconizada
por autoridades quais Babinet, Chevreul, Faraday, os Espritos
opuseram o movimento de objetos inanimados a se deslocarem sem
contacto visvel aos observadores, assim como o atesta o relatrio da
Sociedade Dialtica de Londres.
-
5
A negao de uma fora emanante do mdium, responde William Crookes
com a construo de um aparelho destinado a medir matematicamente a
ao da fora psquica, a distancia. (1)
Para destruir o argumento predileto dos incrdulos - a alucinao
-, as entidades do espao consentiram em fotografar-se,
demonstrando, destarte, e de maneira inconteste, a sua
objetividade.
Possvel, tambm, foram obterem-se moldes dos membros de um corpo
fludico temporariamente formado, e logo desaparecido; e essas
impresses materiais subsistem, como documentao autntica da
realidade das aparies.
Entrementes, dava os Espritos medida do seu poder sobre a
matria, produzindo a escrita revelia de todos os meios conhecidos e
transportando, sem dificuldade, atravs de paredes, em ambientes
fechados, objetos materiais. Davam prova, enfim, de sua inteligncia
e personalidade, tendentes a demonstrar que tiveram existncia real
na Terra.
De fato, muito se tem dito e escrito contra o Espiritismo; mas,
todos que ho tentado destru-lo s conseguiram revigor-lo e
engrandece-lo no batismo da crtica.
Todos os antemas, todas as negaes tendenciosas houveram de
retrair-se e desaparecer, diante da avalancha de documentos
acumulados pela tenacidade dos investigadores. O fato esprita
conquistou adeptos em todas as classes sociais.
Legisladores, magistrados, professores, mdicos, engenheiros, no
temeram proclamar a nova f, resultante de um exame atento, quarto
de uma longa experimentao.
Faltando apenas a essas manifestaes o beneplcito das cincias,
eis que obtiveram-nas pela voz de seus mais renomados expoentes. Na
Frana, Alemanha, Inglaterra, Rssia, Itlia, Amrica do Norte, sbios
ilustres deram a essas pesquisas um carter to rigorosamente
positivo que j se no pode hoje recusar a autoridade de suas
afirmaes, mil vezes repetidas. Longa e porfiosa foram luta, de vez
que os espiritistas tiveram de combater os materialistas, cujas
teorias se aniquilam em face de tais experincias, e, de contrapeso,
as religies, que sentem oscilar os seus dogmas seculares, ao embate
irresistvel dos desencarnados.
Em obra precedente (2), expusemos metodicamente o magnfico surto
que a experimentao atingiu. Discutimos, ponto por ponto, todas as
objees dos incrdulos, estabelecemos a inanidade das teorias
imaginadas para
-
6
explicar os fenmenos, seja mediante as leis fsicas atualmente
conhecidas, seja pela sugesto ou alucinao, e, do nosso imparcial
exame, o que resultou foi a inabalvel certeza de que esses fenmenos
precedem dos seres humanos que aqui viveram.
Na hora atual, nenhuma escola filosfica pode fornecer explicao
adequada aos fatos, fora do Espiritismo.
Os tesofos, os ocultistas, os magos e evocadores outros de
antanho, em vo tentaram explicar os fenmenos, atribuindo-os a
entidades imaginrias, ditas - Elementais ou Elementares, cascas
astrais ou inconsciente inferior: tudo hipteses, irresistveis a um
exame srio, de vez que no abrangem todas as experincias e s
complicam a questo, sem necessidade. Tambm, por isso, nenhum desses
sistemas pde propagar-se, e eclipsaram-se todos, to prestes quanto
abrolharam.
A sobrevivncia do ser pensante imps-se, desprendida de todas as
escrias, magnficas em seu esplendor; o grande problema do destino
humano est resolvido; rasgou-se o vu da morte, e, atravs da ogiva
aberta para o infinito, vemos irradiar na imortalidade os entes
queridos, todos os afetos que acreditvamos extintos por todo o
sempre.
No vamos, pois, reexaminar aqui todas as provas que possumos da
sobrevivncia, no pressuposto deita estar a sua demonstrao.
Nosso objetivo, nesta obra, estudar o Esprito encarnado, tendo
em vista os to lgicos ensinos do Espiritismo e as ultimas
descobertas da cincia.
Os conhecimentos novos, devidos s inteligncias extraterrenas,
ajudam-nos a compreender toda uma categoria de fenmenos fisiolgicos
e psquicos, que, de outro modo, se tornam inexplicveis.
Os materialistas, com o negarem a existncia da alma, privam-se,
voluntariamente, de noes indispensveis compreenso dos fenmenos
vitais do ser animado; e os filsofos espiritualistas, por sua vez,
empregando o senso ntimo como Instrumento nico de investigao, no
conheceram a verdadeira natureza da alma; de sorte que, at agora,
no lhes foi possvel conciliar, numa explicao comum, os fenmenos
fsicos e os mentais O Espiritismo, facultando o conhecimento da
composio do Esprito, tornando, por assim dizer, tangvel a parte
fludica de ns mesmos, projetou viva luz nesses meandros
aparentemente inabordveis, de vez que permite abarcar em uma vasta
sntese todos os fatos da vida corporal e intelectual, e mostram-nos
as relaes entre uma e outra, at aqui desconhecidas.
-
7
A fim de tornar mais compreensvel o nosso pensamento, convm
lembrar, em poucas palavras, as noes novas que da alma temos
adquirido, e que serviro para fixar em alto-relevo a originalidade
e grandeza da nova doutrina.
O ensino dos Espritos foi, como sabemos, coordenado com
superioridade de vistas marcante e lgica irrefragvel, por Allan
Kardec (3). Filsofo profundo, ele exps metodicamente uma srie de
problemas relativos existncia de Deus, da alma, da constituio do
Universo. Deu soluo clara e racional maior parte dessas questes
difceis, tendo o cuidado de forrar-se de raciocnios metafsicos. Da,
o tomarmo-lo por guia neste sucinto resumo.
A alma, ou Esprito, o princpio inteligente do Universo.
Indestrutvel, ao mesmo ttulo que a fora e a matria, no lhe
conhecemos a essncia ntima, mas somos obrigados a reconhecer-lhe
existncia distinta, uma vez que as suas faculdades diferenciam-no
de quanto existe. O princpio inteligente, do qual emanam todas as
almas, inseparvel do fluido universal (4), ou por outra da matria
sob a sua forma original, primordial, o que vale dizer, em seu
estado mais puros.
Todos os Espritos, qualquer que seja o grau de seu progresso,
so, portanto, revestidos de uns invlucros invisveis, intangveis e
imponderveis. Perisprito como se denomina esse corpo fludico.
Com isso, o Espiritismo acarreta vistas novas e um novo ensino.
Contrariamente opinio comum, ele demonstra que a alma no uma pura
essncia, uma como abstrao ideolgicas, uma entidade vaga, qual a cr
os espiritualistas; mas, contrrio, um ser concreto, dono de um
organismo fsico feitamente delimitado.
Se, no estado normal, a alma invisvel, pode, contudo, aparecer
mediante condies determinadas, e com especificidade capaz de
impressionar nossos sentidos.
Os mdiuns vem-na no espao, sob a forma que retinha na Terra. Por
vezes, ela chega a materializar-se de maneira a deixar lembrana
duradoura de sua interveno; e, neste caso, podemos, em resumo,
dizer que, em se esquivando aos nossos sentidos, no deixa de ser,
por isso, real e operante quanto o homem terrestre.
No decurso deste estudo veremos que, apesar da sua
materialidade, o perisprito to eterizado que a alma no poderia
atuar sobre a matria sem o concurso de uma fora, a que s conveio em
chamar fluido vital.
-
8
A finalidade da alma o desenvolvimento de todas as faculdades a
ela inerentes. Para consegui-lo, ela obrigada a encarnar grande
nmero de vezes, na Terra, a fim de acendrar suas faculdades morais
e intelectuais, enquanto aprende a senhorear e governar a matria.
mediante uma evoluo ininterrupta, a partir das formas de vida mais
rudimentares, at condio humana, que o princpio pensante conquista,
lentamente, a sua individualidade. Chegado a esse estgio,
cumpre-lhe fazer eclodir a sua espiritualidade, dominando os
instintos remanescentes da sua passagem pelas formas inferiores, a
fim de elevar-se, na srie das transformaes, para destinos sempre
mais altos.
As reencarnaes constituem, destarte, uma necessidade inelutvel
do progresso espiritual. Cada existncia corprea no comporta mais do
que uma parcela de esforos determinados, aps os quais a alma se
encontra exausta. A morte representa, ento, um repouso, uma etapa
na longa rota-- da eternidade. Depois, a reencarnao novamente, a
valer um como rejuvenescimento para o Esprito em marcha. A cada
renascimento, as guas do Letes propiciam alma uma nova virgindade:
desvanecem-se os erros, prejuzos, as supersties do passado. Paixes
antigas, ignomnias, remorsos, desaparecem, o esquecimento cria um
novo ser, que se atira cheio de ardor e entusiasmo, no percurso da
nova estrada. Cada esforo redunda num progresso e cada progresso
num poder sempre maior. Essas aquisies sucessivas vo alteando a
alma nos inumerveis degraus da perfeio.
Revelaes so essas que nos fazem entrever as perspectivas do
infinito. Mostram-nos a eternidade da existncia a desenvolverem-se
nos esplendores do cosmo; permitem-nos melhor compreender a justia
e bondade do imortal autor de todos os seres e de todas as
coisas.
Criados iguais, todos temos as mesmas dificuldades a vencer, as
mesmas lutas a sustentar, o mesmo ideal a atingir a felicidade
perfeita. Nenhum poder arbitrrio a predestinar uns beatitude,
outros a tormentos sem fim. Unidos, s o somos de prpria conscincia,
pois ela quem, ao retornarmos ao espao, nos aponta as faltas
cometidas e os meios de as repararmos.
Somos, assim, o rbitro soberano de nossos destinos; cada
encarnao condiciona a que lhe sucede e, mal grado a lentido da
marcha ascendente, eis a gravitar incessantemente para alturas
radiosas, onde sentimos palpitar coraes fraternais, e entrarmos em
comunho sempre mais e mais ntima com a grande alma universal - A
Potncia Suprema.
-
9
Para dar a esses ensinos toda a autoridade que eles comportam,
preciso mostrar que os Espritos que no-los ditaram no se enganaram.
preciso verificar-lhes as afirmaes, pass-las ao crivo da razo, e,
sempre que possvel, ver se concordam com os modernos dados
cientficos.
No intuito de nos submetermos a esse programa e proceder com
mtodo, comearemos por estudar o papel da alma durante a
encarnao.
Mostraremos a importncia funcional do novo rgo denominado
perisprito, e grato nos ser constatar que a fisiologia e a
psicologia se beneficiam de claridades novas, quando, no mecanismo
da sua fenomenalidade, intermitimos o Esprito revestido do seu
envoltrio.
Preliminarmente, ensaiaremos determinar a natureza e as funes do
perisprito. Bem conhecidas uma e outras, estudaremos, ento, alguns
problemas at hoje no resolvidos.
Interrogada a Cincia, no que diz respeito evoluo vital dos seres
vivos, s nos d, quando muito, vagas respostas, antes escapatrias.
Por que se morre? Por que as mesmas foras que conduzem um organismo
a completo desenvolvimento se tornam impotentes para mant-lo nesse
estado?
Por outro lado: - de onde provm fixidez individual e tpica dos
seres vivos, no obstante o fluxo permanente de matria que renova o
organismo a cada instante?
Tais as primeiras questes que nos propomos resolver,
intermitindo o perisprito em nossas pesquisas.
A seguir, tentaremos evidenciar que os fenmenos da vida
vegetativa e orgnica necessitam, a seu turno, da presena de uma
fora agente e incessante, a fim de coordenar as aes reflexas do
sistema nervoso, s quais so eles devidos.
Ressaltaremos, com toda a possvel clareza, a caracterstica
psquica desses atos, por demonstrar que todos eles tm uma
finalidade inteligente, no sentido de concorrncia para a conservao
do indivduo.
Da, encaminhar-nos-emos ao estudo das faculdades propriamente
ditas. No h quem ignore as inextricveis dificuldades em que se
debatem os
filsofos, quando e sempre que se trata de explicar a ao do fsico
sobre o moral, ou da alma sobre o corpo. Pois o conhecimento do
perisprito elide, radicalmente, o problema. E o faz porque lana
sobre os processos da vida mental intensa claridade, permitindo
compreender, nitidamente, a formao e conservao do inconsciente,
fisiolgico ou psquico.
-
10
Em mostrar os matizes progressivos, que religam e retraam o
instinto e a inteligncia, expem ao vivo o mecanismo' das aes
cerebrais e as conexes recprocas, existentes; explica por que a
alma conserva unidade e identidade atravs de encarnaes sucessivas,
e d, sobre as condies em que se verificam e completam esses
renascimentos, as indicaes mais precisas.
Finalmente, o perisprito revela-se o instrumento indispensvel
para compreendermos a ao dos desencarnados nas manifestaes
espritas.
Por a se v que esta nossa obra tem um duplo objetivo. Em
primeiro lugar, visa demonstrar que a doutrina est concorde com
as
modernas teorias cientficas; e, em segundo, coluna tornar
conhecido o papel fsico de um rgo essencial vida do corpo e da
alma, cuja existncia o pblico mal poderia suspeitar, por ignorada
at agora; e, finalmente, objetiva evidenciar a importncia
considervel dessa descoberta.
A prpria natureza das nossas investigaes obriga-nos a respigar
copiosamente em trabalhos recentssimos de cientistas contemporneos,
e, fazendo-o, apraz-nos reconhecer que os esforos desses
experimentadores, com a sua metodologia rigorosa, muito adiantaram
aos nossos conhecimentos. A determinao, cada vez mais exata, do
funcionamento vital dos seres animados, fornece preciosos
apontamentos para o nosso estudo, e se, na verdade, desprezamos as
concluses materialistas desses mesmos sbios, que temos tambm, por
nossa parte, fatos irrefutveis que demonstram, com certeza, a
erronia das suas dedues.
O Espiritismo d-nos a conhecer a alma; a Cincia nos descobre as
leis da matria viva. Trata-se, portanto, para ns, de conjugar os
dois ensinos, mostrar que eles mutuamente se auxiliam, se
completam, tornam-se mesmo inseparveis e indispensveis compreenso
dos fenmenos da vida fsica e intelectual, por isso que de tal
concordncia resulta, para o ser humano, a mais esplndida de quantas
certezas lhe seja facultado adquirir na Terra.
No deixamos de reconhecer a prpria incapacidade nossa face de
semelhante escopo, mas, por imperfeito que nos saia o esboo
apresentado, esperamos alcanar que um verdadeiro cientista o retome
e lhe d, por si, todo o valor que ele comporta.
O essencial a estabelecer que no existe incompatibilidade
qualquer entre as novas descobertas e a realidade dos Espritos, ou,
por outra - que nada h de sobrenatural; que a existncia de
criaturas revestidas de um invlucro material pode conceber-se
naturalmente, e que a influncia dessas
-
11
criaturas sobre o organismo conseqncia lgica de sua mesma
constituio.
No ignoramos que as teorias aqui defendidas deveriam escorar-se
em demonstraes experimentais, para tornarem-se absolutamente
irrefutveis. Entretanto, certo estamos de que essas experincias
viro a seu tempo. Que nos baste, por agora, apresentar hipteses
lgicas que no colidam com os ensinos cientficos, explicando todos
os fenmenos e mostrando a grandiosidade da sntese exeqvel, quando e
sempre que se conjuguem os conhecimentos humanos com as revelaes
espirituais. No dizer que baste o s concurso da fsica, da qumica,
da mecnica e da biologia para explicar os fatos espritas, pois
essas manifestaes, aparentemente to simples, exigem, para serem
compreendidas, o emprego de todos os conhecimentos humanos. Assim
que, estudando o funcionamento cerebral do mdium em comunicao com
os desencarnados, o Espiritismo afeta os problemas mais rduos da
fisiologia e da psicologia.
A natureza particular das foras em jogo nas materializaes
torna-se objeto de profundas elucubraes para o sbio, de vez que o
processo de atuao sobre a matria, por parte dos invisveis, difere
radicalmente de tudo o que at agora conhecemos.
No dia em que a Cincia persuadir-se da veracidade da nossa
doutrina, dar-se- legtima revoluo nos mtodos at aqui utilizados.
Pesquisas que apenas colimam a matria elevar-se-o para a alma. E o
mundo ver entreabrir-se uma Era Nova; a Humanidade, regenerada por
uma f racional, avanara na conquista de todos os progressos que at
hoje mal tem podido lobrigar.
Muito tempo defluir, certo, antes que essas esperanas se
realizem. Que importa? Nosso dever aplainar o caminho aos psteros.
Tentemos, portanto, aproveitar as modernas descobertas,
adaptando-as Doutrina. Penetremos as profundezas do ser humano, em
conexo com a fisiologia e aclarados pelo Espiritismo. Tornemos, por
assim dizer, palpvel a influncia da alma, ora em estado consciente,
ora em estado inconsciente, sobre todos os fenmenos vitais.
Escrutemos, minuciosos, as relaes to delicadas, quo importantes,
do fsico com o moral. Tentemos determinar as conexes da vida
psquica com os fenmenos orgnicos. Procuremos no homem o elemento
que subsiste e identifica o ser, bem como a sede das faculdades da
alma.
-
12
Por fim, resumindo todas as observaes, ensaiemos conciliar, numa
viso de conjunto, tudo o que afete corpo e alma com as concluses a
que houvermos chegado.
Essas as condies que nos guiaram na feitura deste livro. No
temos a pretenso de haver aclarado completamente todas as questes,
mas acreditamos concorrer ao debate com documentos novos, e
apresentar, sob mais compreensvel prisma, fatos at agora obscuros e
inexplicados. Esperamos, sobretudo, que deste nosso trabalho
ressalte a convico de que o Espiritismo , positivamente, uma
verdade, de vez que nos faculta a chave daquilo que a cincia humana
impotente para descobrir.
Gray, 10 de agosto de 1895.
minha estimada tia ANNETTE DELANNE, Dedico este livro como
testemunho do meu amor, e como prova do meu reconhecimento pela
ternura com que povoou minha infncia.
CAPITULO I A VIDA
SUMRIO: Estudo da vida. - Destruio orgnica. - Criao org-nica. -
Propriedades gerais dos seres vivos. - Condies gerais de manuteno
da vida. - A umidade. - O ar. - O calor. - Condies qumicas do meio.
- A fora vital. - Por que se morre. - A utilidade fisiolgica do
perisprito. - A idia diretriz. - O funcionamento do organismo. - O
papel psicolgico do perisprito. - A identidade. - O sistema nervoso
e a fora nervosa ou psquica. - Resumo.
-
13
Ao iniciar este estudo, convm entendermo-nos sobre a acepo
do
vocbulo - vida assaz tomado em sentidos diversos. s vezes,
confere-se-lhe uma significao genrica, abstrata, para designar o
conjunto de coisas existentes, quando se fala da vida universal;
outras vezes, e mais comumente, empregamo-lo para caracterizar os
seres animados.
Em fisiologia, por exemplo, a palavra vida corresponde a
qualquer coisa de objetivo, como seja, para o ser animado, a
faculdade de responder, por movimentos, a uma excitao exterior. Os
filsofos, porm, que discorrem sobre a vida da alma, referem ao
vocbulo uma significao inteiramente diversa, pretendendo com ele
definir a espontaneidade da mesma vida, em contradita definio
precedente.
A fim de evitar toda e qualquer confuso, vamos estabelecer uma
distino essencial entre as manifestaes da alma, no estado de
encarnao, e as que ela prodigaliza e acusa na sua existncia
incorprea. As faculdades do Esprito, digamo-lo desde logo, so
sempre as mesmas; mas, na Terra, elas tm exerccio subordinado a
condies orgnicas, por sua vez ligado ao e dependentes do meio
exterior, tal como havemos de comprovar o breve trecho, ao passo
que, no plano etreo, nenhum entrave lhe restringe o jogo das
faculdades psquicas.
A vida ser, logo, para ns, a caracterstica dos seres organizados
que nascem, vivem e morrem. Atribumo-la a uma modificao especial da
energia: - as foras vitais, cuja natureza teremos o cuidado de bem
definir, e cuja presena haveremos de reconhecer com os
fisiologistas, sempre que verificarmos num ser o movimento reativo
de excitao externa, ou seja, o fato de que esse ser irritvel.
Segundo a nossa forma de ver, a vida s existe em funo da matria
organizada, e impossvel fora descobri-Ia alhures, podendo dizer-se,
sem paradoxo, que a alma no vivente por que seja mais e melhor: -
tem "existncia integral", visto que, no sendo organizada, no se
submete morte.
A vida, em seus aspectos multifrios, jamais deixou de ser um
problema fascinante para todos os pensadores.
As diversas escolas filosficas em desfile pelo mundo, cada qual
por sua vez, procuraram investir a questo, e, consoante as idias em
curso de ocasio, deram-lhe solues muito dispares. Mas, foi, a bem
dizer, do ltimo
-
14
sculo a esta parte que os progressos alcanados em todos os
setores do conhecimento humano permitiram abordar o problema a
srio, e determinar-lhe os limites. Uma visada rpida das condies
necessrias manuteno e ao desenvolvimento da vida impe-se-nos, a fim
de podermos saber se ela devida a um princpio especial, ou se no
passa de resultante das foras naturais, em ao permanente no
mundo.
Estudo da vida
Vamos resumir os trabalhos mais recentes sobre o assunto (5).
Para
todos os seres, a vida resulta das relaes existentes entre a sua
constituio fsica e o mundo exterior. O organismo preestabelecido,
pois que provm dos ancestrais, por filiao.
A ao das leis fsico-qumicas, ao contrrio, varia segundo as
circunstncias. A essa oposio de foras, Claude Bernard denomina
conflito vital. (6)
"No - diz ele - por uma luta contra as condies csmicas que o
organismo se mantm e se desenvolve, mas, muito ao contrrio, por uma
"adaptao", um acordo. O ser vivo no constitui exceo grande harmonia
natural, que faz que as coisas se adaptem umas s outras. Ele, o ser
vivo, no rompe nenhum acordo, no est nem em contradio nem em luta
com as foras csmicas. Muito pelo contrrio, ele faz parte do
concerto universal, e a vida do animal, por exemplo, no passa de
fragmento da vida total do Universo."
Esse conflito vital origina duas espcies de fenmenos: 1-Fenmenos
de destruio orgnica, isto , de desorganizao ou
desassimilao; 2-Fenmenos de criao orgnica, indiferentemente
chamados
organizao, sntese orgnica ou assimilao.
Destruio orgnica
-
15
Coisa curiosa so os fatos de destruio, porque so os mais
aparentes,
aos quais, geralmente, se liga idia de vida. A destruio orgnica
, com efeito, determinada pela funo do ser vivente. Quando, no
homem ou no animal, sobrevm um movimento, uma parte da substncia
ativa do msculo se destri ou se queima; quando sensibilidade e
vontade se manifestam, h um desgaste de nervos; quando se utiliza o
pensamento, poro de crebro que se consome. Poder-se-, ento, dizer
que jamais a mesma matria serve duas vezes vida. Realizado um ato,
a matria que lhe serviu produo deixa de existir. Reaparea o
fenmeno, matria nova que a ele concorre.
A usura molecular sempre proporcional intensidade das
manifestaes vitais. A alterao material ser tanto mais profunda ou
considervel, quanto mais ativa se mostre vida.
A desassimilao expulsa das profundezas do organismo substncias
tanto mais oxidadas pela combusto vital, quanto mais enrgico se
verifique o funcionamento dos rgos. Essas oxidaes, ou combustes,
engendram o calor animal, produzem o cido carbnico que se exala
pelos pulmes, alm de outros produtos eliminados por diferentes
glndulas da economia. O corpo se gasta e sofre consumao e perda de
peso, que traduzem e medem a intensidade das funes. Por toda parte,
a bem dizer, a destruio fsico-qumica liga-se atividade funcional, e
ns podemos encarar como axioma. fisiolgico a seguinte proposio:
toda manifestao de um fenmeno vital liga-se, necessariamente, a uma
destruio orgnica." (7)
Essa destruio sempre devida a uma combusto, ou a uma
fermentao.
Criao orgnica
Os fenmenos de criao orgnica so atos plsticos, que se
completam
nos rgos em repouso, e os regeneram. A sntese assimiladora rene
os materiais e as reservas que o funcionamento deve despender. um
trabalho intimo, silencioso, nada havendo que o possa trair
exteriormente.
A viveza com que se nos apresentam, externamente, os efeitos da
destruio orgnica, ilude-nos a ponto de lhes chamarmos fenmenos
vitais,
-
16
quando, na realidade, so letais, por isso que se engendram
destruindo tecidos.
No somos impressionados pelos fenmenos da vida. A reparao de
rgos e tecidos opera-se ntima, silenciosamente, fora de nossas
vistas. S o embriogenista, acompanhando o desenvolvimento do ser
vivo, apreende permutas e fases reveladoras desse trabalho surdo.
aqui, um depsito de matria; ali, uma formao de invlucro, ou ncleo;
acol, uma diviso, uma multiplicao, uma renovao.
"Muito pelo contrrio, os fenmenos de destruio, ou de morte
vital, saltam-nos vista e por eles, alis, que costumamos
caracterizar a vida. Entretanto, quando se opera um movimento e um
msculo se contrai; quando vontade e sensibilidade se manifestam;
quando o pensamento se exerce; quando a glndula segrega, o que se d
consumo de substncia muscular, nervosa, cerebral: portanto,
fenmenos de destruio e morte." (8)
Em todo o curso da existncia, essas destruies e criaes so
simultneas, conexas, inseparveis. Ouamos sempre o eminente
fisiologista:
"As duas ordens de fenmenos de destruio e criao, apenas se
concebem separveis e divisveis, espiritualmente falando. Por
natureza, elas se encontram estreitamente ligadas e cooperam em
todo o ser vivente numa entrosagem que jamais se poderia romper. As
duas operatrias so absolutamente conexas e inseparveis, no sentido
de que a destruio condicional imprescindvel da renovao. Os atos
destrutivos so os precursores e instigadores daqueles por que as
partes se restauram e renascem, ou seja, dos de renovao orgnica.
Dos dois tipos de fenmenos, o que se poderia dizer o mais vital, o
fenmeno de criao orgnica, est, portanto, de algum modo subordinado
ao fenmeno fsico-qumico da destruio."
Propriedades gerais dos seres vivos
As propriedades gerais dos seres vivos, as que os distinguem da
matria
bruta dos corpos inorgnicos, contam-se por quatro: organizao,
gerao, nutrio e evoluo.
-
17
Dessas quatro propriedades fundamentais, a Cincia no explica
claramente mais do que uma - a nutrio, se bem que, ainda aqui, o
fenmeno mediante o qual as clulas selecionam, no sangue, os
materiais que lhes so teis, no est bem estudado.
Veremos dentro em breve que organizao e evoluo no podem ser
compreendidas s pelo jogo das leis fsico-qumicas.
E, quanto reproduo, se certo que lhe conhecemos o mecanismo, a
causa continua sendo um mistrio.
Condies gerais de manuteno da vida
Todos os seres vivos tm necessidade, para manifestarem sua
existncia, das mesmas condies exteriores, e nada h que melhor
demonstre a unidade vital, a identidade da vida nos seres
organizados, vegetais ou animais, do que a carncia das quatro
seguintes condies: 1.a umidade, 2.a calor, 3.a ar, 4.a uma
determinada composio qumica do ambiente.
A umidade
Indispensvel a gua na constituio do meio em que evolui o ser
vivente. Como princpio constituinte, entra ela na composio dos
tecidos, e, ao demais, serve para dissolver grande nmero de
substncias, sem as quais as reaes qumicas incessantes, de que
laboratrio o corpo, no poderiam efetuar-se. A utilidade funcional
da gua evidencia-se, o bastante, pelos clebres jejuadores Merlatti,
Succi e o Dr. Tanner, que puderam vingar longos perodos de 30 a 40
dias sem comer, mas, bebendo,gua destilada. Experincias feitas com
ces mostraram que eles resistiam durante 30 dias privao de
alimento, desde que se lhes dessa gua. A subtrao deste elemento
ocasional, em certos roteiros, curiosos fenmenos de vida latente:
esses animais, convenientemente privados de gua, perdem todas as
propriedades vitais, ao menos na aparncia, e podem assim permanecer
anos
-
18
a fio. Desde, porm, que se lhes restitua um pouco de gua,
recomeam a viver como antes, dado que a privao no tenha
ultrapassado certos limites. No homem, o coeficiente de gua contida
no corpo de 90%, o que s por si representa o seu alto valor
substancial na economia orgnica.
O ar
O ar, ou melhor, o oxignio que lhe compe a parte respirvel,
necessrio maioria dos seres vivos, mesmo aos inferiores, quais
as leveduras ou micodermas. Pasteur mostrou que os microrganismos
originam fermentaes, em se apropriando do oxignio. Experincias
feitas em coelhos evidenciaram que o animal sucumbe quando a
proporo do oxignio, de 21/104, diminui de 3 a 5/100.
O calor
o terceiro dos elementos que entretm os corpos vivos. Sabemos
que a
vida dos vegetais se mantm em correlao ntima com a temperatura
ambiente. O frio intenso congela os lquidos do organismo e
desmancha os tecidos. H, mesmo, para cada animal, uma temperatura
mdia, correspondente ao mximo de vida. Os elementos do corpo, nos
animais superiores, so assaz delicados, e os limites extremos,
entre os quais a vida pode manter-se, so, a seu turno, convizinho.
No pode a temperatura interna do organismo descer abaixo de 20
graus nem se elevar acima de 45 graus, para os humanos, e de 50
graus, para as aves. Assim, nos animais superiores h uma
temperatura mdia, que se mantm constante, graas a um conjunto de
mecanismos governados pelo sistema nervoso. Sem essa fixidez, a
funo vital jamais poderia executar-se.
Condies qumicas do meio
-
19
Para bem compreendermos o alcance dessa condio, preciso no
esquecer que denominamos organismo vivo tanto clula componente
dos tecidos vegetais e animais, como a esses mesmos vegetais e
animais. De fato, a clula bem um ser vivo: organiza-se, reproduz,
alimenta-se e evolui, tal como o animal superior.
Aps os trabalhos de Schleiden, em 1838, de Schwann, em 1839, de
Prvost e Dumas, em 1842, de Kolliker, em 1844 e, mais tarde, de Max
Schultze, sabe-se que, a partir da clula livre e nica, por Haeckel
chamada "plastdio", at o homem, todos os corpos vivos no passam de
associaes de clulas, idnticas em natureza e composio, mas gozando
de propriedades diferentes, conforme o lugar ocupado no
organismo.
Assim, os mais variados tecidos do corpo: ossos, nervos,
msculos, pele, unhas, cabelos, crnea ocular, etc., formam-se de
agregados celulares.
A seguir, veremos que a natureza oferece todos os graus de
complexidade na reunio desses elementos orgnicos primrios,
peculiares a todo ser vivente. Isto posto, voltemos quarta condio.
Alm de calor, ar e gua, torna-se indispensvel que o meio liquido
que banha as clulas contenha certas substncias indispensveis sua
nutrio. Durante muito tempo se acreditou que tal meio variava
conforme a natureza do ser. Investigaes contemporneas permitiram,
porm, verificar que o meio era uniforme para todos os organismos
vivos, devendo conter:
1. - Substncias azotadas, nas quais entram azoto, carbono,
oxignio e hidrognio.
2. - Substncias ternrias, ou seja compostas dos trs elementos -
carbono, oxignio e hidrognio.
3. - Substncias minerais, como sejam os fosfatos, a cal, o sal,
etc. Uma circunstncia, a bem fixar, que essas trs espcies de
substncias,
quaisquer que sejam as formas de que se revistam, so
indispensveis ao entretenimento da vida. Com essas matrias-primas
fabricam os organismos tudo o que lhes aproveita vida do corpo.
Essas condies aqui estudadas devem realizar-se na esfera de
contacto e influncia imediata sobre a partcula vivente, entrando
com ela em conflito.
Somos, ento, levados a distinguir dois meios, a saber:
-
20
1. - O meio csmico ambiente, ou exterior, com o qual esto em
relao todos os seres elementares.
2. - O meio interior, que serve de intermedirio entre o mundo
exterior e a substncia viva.
Se quisermos bem considerar as partes verdadeiramente vivas dos
tecidos, isto , as clulas, notaro que elas se resguardam das
influncias ambientes; que se banha num liquido interior que as
isola, protege e que serve de intermedirio entre elas e o meio
csmico. Esse meio interior o sangue.
No, diga-se, o sangue in totum, mas o plasma sangneo, ou seja
aquela parte fluida que compreende todos os lquidos intersticiais,
fonte e confluente de todas as permutas endosmoticas
Absurdo no fora, ento, dizer-se que o pssaro no vive no ar
atmosfrico, nem o peixe na gua, nem a minhoca na terra.
Ar, gua e terra so, por assim dizer, um segundo envoltrio do
corpo, sendo o sangue o primeiro, visto ser ele que envolve
imediatamente os genunos elementos vitais - as clulas.
No , pois, de modo direto que o exterior influencia esses seres
complexos, que so os animais superiores, qual se d com os corpos
brutos ou com os seres vivos mais simples.
H um intermedirio forado que se interpe entre o agente fsico e o
elemento anatmico. (9)
O que acabamos de ver, basta para mostrar que a vida fsica est
na dependncia do meio exterior, e que o velho adgio - mens sana in
corpore sano - de uma veridicidade absoluta. Para que a alma possa
manifestar as suas faculdades, sem constrangimento, preciso se lhe
faz a integridade da substncia corporal.
Similitude do funcionamento vital em todos os seres viventes
Como haveremos de ver que o princpio inteligente tem,
provavelmente,
percorrido todos os organismos at atingir o humano, urge
patentear desde logo a grande lei de unidades das manifestaes
vitais em toda a Natureza.
-
21
No podemos, aqui, estudar os fenmenos de destruio e reconstituio
dos tecidos orgnicos, mas devemos assinalar que as aes fsicas ou
qumicas em jogo so as mesmas que operam na natureza inorgnica. Por
muito tempo se acreditou que os corpos vivos gozavam, neste
particular, de um privilgio especial. Hoje, porm, sabemos que tal
no se d, e que, fsicos ou qumicos, os fenmenos so idnticos,
trate-se da matria bruta ou de corpos orgnicos. O que varia so os
processos postos em ao. Os resultados so contudo, os mesmos.
Pode-se, tambm, afirmar que, em todos os graus da escala dos seres
vivos, as operaes da digesto e da respirao so as mesmas, e que o
que difere so os aparelhos convocados a produzir tais resultados.
Tambm idnticos o modo de reproduo de todos os seres vivos, e essa
notvel similitude de funcionamento orgnico prende-se circunstncia
de deverem todas as suas propriedades a um elemento comum - o
protoplasma.
Assim se denomina o contedo vivo da clula, o que constitui a sua
parte essencial, o que nela verdadeiramente vive. S no protoplasma,
portanto, importa procurar a razo das propriedades de todos os
tecidos. Nele residem todas as modalidades possveis, conservadas em
estado latente, quando isolado sob a forma primitiva da monera.
diferenciando, separando-lhe as propriedades, que as vamos
reencontrar isoladas nos seres superiores.
O protoplasma o agente de todas as reconstituies orgnicas, isto
, de todos os fenmenos ntimos de nutrio. Alm disso, o protoplasma
contrai-se sob a ao dos excitantes, e preside, assim, aos fenmenos
da vida de relao.
Pode-se, ainda, assinalar o sono como necessidade imposta a
todos os seres vivos. Dorme a planta, como dorme o animal, e assim
como no animal se completam as funes respiratrias, circulatrias,
assimilatrias, enquanto ele dorme, o mesmo sucede com os vegetais,
quando dormitam.
O sexo e o casamento so as condies que presidem reproduo no
mundo vegetal. So os estames, os rgos masculinos, e o pistilo, o
feminino; e o ovrio, o rgo onde se formam as sementes.
Finalmente, os anestsicos, que atuam to poderosamente nos
animam, produzem nas plantas os mesmos efeitos, como a provarem a
existncia de um princpio rudimentar de sensibilidade nos
vegetais.
Todos estes fatos demonstram, evidncia, o grande plano unitrio
da Natureza. Sua divisa : unidade na diversidade, de sorte que, do
emprego dos mesmos processos fundamentais resulta umas variaes
infinitas, que
-
22
estabelece a fecundidade inesgotvel das suas concepes, de par
com a unidade da vida.
A fora vital
At aqui s temos estudado o funcionamento da vida, a maneira
pela
qual o organismo vivo entra em conflito com o seu meio ambiente,
mas nada sabemos ainda da natureza mesma dessa vida. Compreendem-se
como, por exemplo, se exercem as funes digestivas, cumpre notar que
num aparelho vivo que elas se operam, isto , num organismo que
produziu, por processos peculiarmente seus, as matrias necessrias a
essa combinao qumica; e, se as leis de afinidade so as mesmas no
laboratrio vivo como no mundo exterior, no deixa de ser por
processos particulares, inteiramente diferentes dos que agem sobre
a matria bruta, que a vida opera.
Eis, a propsito, o que diz Claude Bernard, juiz competente
nestes assuntos:
"Posto que os fenmenos orgnicos, manifestados pelos elementos
dos tecidos, estejam todos submetidos s leis gerais da
fsico-qumica, no deixam, contudo, de completar-se com o concurso de
processos vitais peculiares matria organizada, e, neste sentido,
diferem, constantemente, dos processos minerais que produzem os
mesmos fenmenos nos corpos brutos. Esta ltima proposio fisiolgica,
tem-a como fundamental. O erro dos fsico-quimistas procede de no
haverem feito essa distino e acreditarem preciso religar os
fenmenos apresentados por seres viventes, no apenas s mesmas leis,
mas tambm aos mesmos processos e formas pertinentes aos corpos
brutos." (10)
Tem, pois, a vida uns modos especiais, viventes, de proceder,
para manter o seu funcionamento; existe no ser organizado algo
inexistente nos corpos inorgnicos, algo operante por mtodos
particulares, sui generis, e que no s fabrica, como repara os rgos.
A esse algo chamamos fora vital.
Essa observao tem sido feita por muitos naturalistas. Stah1
imaginou, para explicar a vida, uma fora vital extrnseca matria
viva, seja uma espcie de substncia imaterial - a alma - (11), causa
fundamental da vida e dos movimentos que se lhe prendem. Foi
partindo da falsa idia de que as
-
23
foras naturais esto em antagonismo com o corpo vivo que ele
acreditou residir nessa fora anmica faculdade de resistncia s
influncias destrutivas. Nada obstante haverem Descartes e Van
Helmont sustentado doutrinas anlogas, Stahl desenvolveu e levou to
longe a sua teoria que deve ser olhado como o fundador do animismo
em fisiologia.
Stahl estabelecera uma diferena radical entre os fenmenos da
natureza bruta e os da natureza viva. Conservaram esse fato
interessante, mas abandonaram a teoria da alma. No houve como
deixar de recorrer a uma outra fora fundamental, da qual dependem
todas as manifestaes de vida, nos vegetais como nos animais,
designada por fora ou princpio vital.
Essa fora; que rege todos os fenmenos vitais, d irritabilidade s
partes contrteis de animais e plantas, ou seja, como vimos, a
propriedade de serem afetadas pelos irritantes exteriores.
Admitiam, nos animais, a alma de Stahl, que, combinada ao
princpio vital, presidia aos fenmenos intelectuais. Essa teoria
teve como principais defensores, na Frana, Barthez; e, na Alemanha,
Hufeland e Blumenbach.
A fora vital de que falamos liga-se a esta ltima forma de ver,
pois, de fato, cremos que haja uma fora de natureza especial, que
prov a matria organizada do que inexiste na matria bruta: - a
irritabilidade; ela diverge, porm, desde logo, porque ns no vemos
nessa fora mais do que uma modificao da energia, ainda
desconhecida, modalidade da fora universal, quais o calor, a
eletricidade, a luz. No fazemos dessa fora umas entidades
imateriais, surgidas ao acaso, sem antecedentes, ou melhor, uma
criao sobrenatural.
Diferimos tambm dos vitalistas em no vermos entre os animais e o
homem mais do que uma diferena de grau, no de natureza. Tudo o que
existe na Terra provm de inumerveis modificaes da fora e da matria.
A fora vital deve entrar no quadro das leis gerais, e a ns compete
evidenciar a sua presena nos seres vivos.
Flourens parece compartilhar dessa opinio quando escreve: "Acima
de todas as propriedades particulares e determinadas, h uma fora,
uns princpios gerais, comuns, que todas as propriedades
particulares implicam e de que se fazem presumidas, e o qual,
sucessivamente, pode ser isolado, destacado de cada uma, sem deixar
de existir. Que principio ser esse? Seja qual for, essencialmente
uno. H uma fora geral e una, da qual todas as foras particulares
mais no so que expresses ou modalidades." (12)
-
24
Por que se morre?
Com Claude Bernard, temos constatado a originalidade de
processos da matria organizada para fabricao das substncias
necessrias ao funcionamento vital, atribuindo essas propriedades
aos rgos dotados de uma virtude especial, inencontrvel nos corpos
brutos. A existncia de uma fora animante do organismo torna-se,
porm, mais evidente ainda, ao exami-narmos a evoluo de todos os
seres vivos.
Tudo o que tem vida nasce, cresce e morre. fato geral que quase
no padece exceo (13). Mas, por. que morrer? Excetuando-se os casos
de acidentes, ou de enfermidades que destroem irremediavelmente os
tecidos, como se d que, mantendo constantes as mesmas condies
gerais, indispensveis ao entretenimento da vida, isto , a gua, o
ar, o calor e os alimentos, o ser deperea at dissociao total?
Dizer que os rgos se gastam indicar apenas uma fase da evoluo,
demonstrar um fato. Neste caso, pergunta-se: mas, por que se gastam
os rgos, e por que se mantm perfeitos na idade viril, do mesmo
passo que aumentam de energia na juventude?
So interrogativas diante das quais a cincia materialista
emudece. Sem embargo, uma explicao se oferece e ns vamos expor.
Desde que admitamos na clula fecundada uma certa quantidade de
fora vital, tudo se torna compreensvel.
A vida total de um indivduo o resultado de um trabalho a
completar-se, trabalho esse mensurvel pelas incessantes
reconstituies da matria desgastada pela funo vital, e a fora para
isso necessria pode considerar-se como uma funo contnua, que
aumenta, atinge um mximo e baixa a zero.
Projetam-se no ar uma pedra, comunicamos pedra a fora dos nossos
msculos. A pedra eleva-se rpida, a despeito da atrao centrpeta, at
que as duas foras contrrias se equilibrem. Depois, a atrao
predomina, a pedra cai, e, quando chega a ponto de partida, toda a
energia a ela comunicada tem desaparecido.
Pode conceber-se que algo de analgico se passe com os seres
vivos. O reservatrio de energia potencial, proveniente dos
genitores, e que se encontra na clula original, transforma-se em
energia natural, medida que
-
25
organiza a matria. De comeo, a ao assaz enrgica, a assimilao, o
agrupamento das molculas, ultrapassam a desassimilao, o indivduo
cres-ce; a seguir, vem o equilbrio de perdas e ganhos: a
maturidade, a estabilidade do corpo, at que, chegada senectude,
esgotada a fora vital, no mais suficientemente alimentados os
tecidos, a morte sobrevm, o organismo desagrega-se, a matria
retorna ao mundo inorgnico.
Assim, pois, acreditamos haja uma certa quantidade de fora vital
distribuda por toda criatura que surge na Terra; e, como a gerao
espontnea no existe em nossa poca (14), por filiao que se transmite
essa fora, alis, s manifesta nos seres animados.
Mas, no s na matria e no seu condicionamento residem as
propriedades da vida orgnica. H que lhe presumir, ainda, uma fora
vital renovadora, ou seja, refletiva das partes destrudas. Da, o
absoluto erro dos sbios, que imaginam surpreender o segredo da vida
em promovendo a sntese da matria orgnica. Suponhamos que, em
conseqncia de manipu-laes qumicas, to sbias e complicadas quanto as
possamos imaginar, e movimentando todos os agentes fsicos - calor,
eletricidade, presso, etc. -, chegssemos a fabricar protoplasma
artificial...
Mas... a vida? T-la-ia tal produto? No, certo, porque o que
caracteriza a vida a nutrio reparadora do dispndio. Essa massa
protoplsmica h de ser inerte, insensvel s excitaes exteriores, qual
se no d com a massa viva. Mas, ainda supondo que assim no fora, s
pudramos justific-lo em detrimento da estrutura ntima,
destruindo-se. Essa massa artificial poderia subsistir a ttulo
precrio, mas, uma vez exausta, no haveria como se reproduzir, no
viveria mais.
Citamos o protoplasma porque ele representa a matria ?simples
por excelncia; mas, se tomssemos uma clula, a complicao aumentaria,
visto que a clula tem forma determinada e a Cincia absolutamente
incapaz de explicar essa forma, como veremos dentro em breve.
Aqui, importa definir precisamente o que pensamos, para que
fique bem clara a nossa concepo.
Mquina delicada e complexa o corpo humano; os tecidos que o
formam originam-se de combinaes qumicas muito instveis, devido aos
seus componentes; e ns no ignoramos que as mesmas leis que regem o
mundo inorgnico regem os seres organizados. Assim, sabemos que, num
organismo vivo, o trabalho mecnico de um msculo pode traduzir-se
em
-
26
equivalente de calor; que a fora despendida no criada pelo ser,
e lhe provm de uma fonte exterior, que o prov de alimentos.
A utilidade fisiolgica do perisprito
Estabelecemos de princpio, por experimentaes espirticas, que
os
Espritos conservam a forma humana, e isto no s por se
apresentarem tipicamente assim, como tambm porque o perisprito
encerra todo um organismo fludico-modelo, pelo qual a matria se h
de organizar, no condicionamento do corpo fsico.
Vamos consolidar essa grande verdade estudando o desenvolvimento
uniforme de cada ser, segundo o seu tipo particular, e mostrando,
depois, a necessidade do duplo fludico para hierarquizar a matria e
diferenciar-lhe as propriedades, segundo as necessidades dos
diferentes rgos.
Em primeiro lugar, vejamos a fora que modela a matria.
Idia diretriz
Em cada ser, desde a sua origem, pode comprovar-se a existncia
de
uma fora que atua na direo fixa e invarivel, segundo a qual se
edificar o plano escultural do recm vindo, ao mesmo tempo em que o
seu tipo funcional.
Na formao da criatura vivente, a vida no fornece como
contingente seno a matria irritvel do protoplasma, matria amorfa,
na qual impossvel distinguir que mnimo rudimento de organizao, mais
insignificante indcio do que venha a ser o indivduo. A clula
primitiva absolutamente idntica em todos os vertebrados. Nada se
lhe encontra que indique o nascimento de um ser que no outro, de
vez que a composio sempre uma e nica para todos.
E foroso admitir, portanto, a interveno de um novo fator que
determine as condies construtivas do edifcio vital.
-
27
Precisamos recorrer ao perisprito, pois ele que contm o desenho
prvio, a lei onipotente que servir de regra inflexvel ao novo
organismo, e que lhe assinar o lugar na escala morfolgica, segundo
o grau de sua evoluo no embrio que se executa essa ao diretiva. Eis
aqui, com efeito, a marcha do fenmeno, na opinio de Cl.
Bernard:
Quando consideramos a evoluo completa de um ser, vemos
claramente que sua existncia resultante de uma lei orgnica que
preexiste numa idia preconcebida e se transmite por tradio orgnica
de um a outro ser. No estudo experimental dos fenmenos de
histognese e organizao, poder-se-ia encontrar justificativa s
palavras de Goethe comparando a natureza a um grande artista. , na
verdade, que a natureza e o artista procedem por maneira idntica na
manifestao da idia criadora. No desenvolvimento do embrio vemos,
antes de tudo, um simples esboo, precedente a toda e qualquer
organizao. Os contornos do corpo e dos rgos so, antes, simples
lineamentos, a comearem pelos aprestos orgnicos provisrios que ho
de servir de aparelhos temporrios ao feto. Nenhum tecido ainda se
distingue. Toda a massa apenas se constitui de clulas plasmticas e
embrionrias. Entretanto, nesse bosquejo est traado o desenho ideal
de um organismo ainda invisvel, e que tem assinado a cada. partcula
e a cada elemento o seu lugar, a sua estrutura e as suas atribuies.
L onde hajam de estar vasos sangneos, nervos, msculos, ossos, etc.,
as clulas embrionrias se transformam em glbulos de sangue, em
tecidos arteriais, venosos, musculares, nervosos, sseos."
Ento, o ilustre fisiologista define, assim, o que pensa: "O que
diz essencialmente com o domnio da vida e no pertence
qumica, nem fsica, nem ao que mais possamos imaginar, a idia
diretriz dessa atuao vital. Em todo o grmen vivo h uma idia
dirigente a manifestar-se e a desenvolver-se na sua organizao.
Depois, no curso de toda a sua vida, o ser permanece sob a
influncia dessa fora criadora, at que morre quando ela no mais se
pode efetivar. sempre o mesmo princpio de conservao do ser que lhe
reconstitui as partes vivas, desorganizadas pelo exerccio, por
acidentes ou enfermidades." (15)
Tomemos, por exemplo, vrias sementes de espcies diferentes.
Analisando-as quimicamente, no poderemos encontrar a menor diferena
em sua composio: temo-Ias absolutamente iguais.
Plantemo-las, aps, no mesmo terreno, e veremos cada qual
submetida a uma idia diretiva -especial, diferente da de sua
convizinha. Durante a vida
-
28
da planta, essa idia diretriz conservar a forma caracterstica da
planta, renovar-lhe- os tecidos segundo o plano preconcebido, e
conforme ao tipo que lhe foi de origem assinado.
Sendo a matria primria idntica para todas as plantas, como
idntica a fora vital para todos os indivduos, importa exista uma
outra fora que origine e mantenha a forma. Ao perisprito atribumos
esse papel, no reino vegetal, como no animal.
Essa idia diretriz ns a encontramos tangivelmente realizada no
invlucro fludico da alma. Ela que corporifica a matria, vela pela
reparao das partes destrudas, preside s funes gerais e mantm a
ordem e a harmonia no turbilho das permutas incessantemente
renovadas.
O funcionamento orgnico
Chamamos mui particularmente a ateno do leitor para este
ponto,
talvez um tanto abstrato, mas de capital importncia para a nossa
teoria. Se, precedendo vida fetal, comprovamos a necessidade do
perisprito
para modelar a matria, melhor ainda lhe compreendemos a
importncia, ao examinarmos o conjunto das funes do organismo
animal, sua autonomia, e a solidariedade que as rene - todas - em
sinergia de esforos tendentes conservao do ser.
A irritabilidade, sinal distintivo da vida, pertence ao
protoplasma celular. Na srie dos seres que se ho escalonado da
maneira ao homem, a clula primitiva diversificou-se,
especificou-se, por maneira que cada tecido evidenciou uma das
propriedades desse protoplasma. Entretanto, os atos e as funes
vitais no pertencem seno a rgos e aparelhos, ou seja o conjunto de
partes anatmicas. A funo uma srie de atos ou fenmenos agrupados,
harmonizados, colimando um resultado.
A digesto, por exemplo, requer interveno de uria srie de rgos,
tais como a boca, o esfago, o estmago, o intestino, etc., postos
sucessivamente em atividade para transformar os alimentos.
Vemos, portanto, que, para desempenho da funo, intervm
atividades inmeras de elementos anatmicos; mas, a funo no a soma
bruta das atividades elementares de clulas justapostas, porque se
compem e
-
29
perpetuam uma pelas outras, harmonizadas e entrosadas de molde a
concorrerem para um resultado comum.
O resultado entrevista pelo Esprito constitui o lao e a unidade.
ele quem promove a funo.
Esta, a funo, , pois, algo de abstrato e intelectual, de modo
algum representado, materialmente, por qualquer das propriedades
elementares.
H uma funo respiratria, uma funo circulatria, mas no h, nos
elementos mltiplos que nelas concorrem, uma propriedade respiratria
ou circulatria. Tem a laringe uma funo vocal, mas no h nos msculos
propriedades vocais, e assim por diante.
O corpo de um animal superior organismo complexo, formado por um
agregado de clulas diversamente reunidas, no qual as condies vitais
de cada elemento so respeitadas, mas cujo funcionamento
subordina-se ao conjunto. como se dissemos - independncia
individual, mas obediente vida total.
Cada rgo tem sua vida prpria, sua autonomia, pode desenvolver-se
e reproduzir, independente de outros tecidos. Autnomo, no sentido
de no apropriar, nem dos tecidos vizinhos, nem do conjunto, as
condies essenciais de sua vida, porque estas, ele as possui em si
mesmo, por sua natureza protoplsmicas. Por outro lado, liga-se ao
conjunto por sua funo, ou pelo produto desta.
Uma simples comparao far-nos- melhor compreender esse duplo
carter dos rgos.
Figuremos o ser complexo, animal ou planta, qual uma cidade com
a sua fisionomia especial, que a distingue de todas as outras. Os
habitantes dessa cidade representam os elementos antomo-orgnicos:
todos esses habitantes vivem, respiram, alimentam-se do mesmo modo
e possuem as mesmas faculdades gerais do homem - (autonomia dos
rgos, quanto as condies essenciais vida).
Entretanto, cada qual tem seu ofcio, sua indstria, aptides ou
talentos, mediante os quais compartilha da vida social e dela,
depende - (subordinao de cada rgo ao conjunto, par seu
funcionamento) .
O pedreiro, o padeiro, o aougueiro, o industrial, o arteso,
fornecem produtos tanto mais variados e copiosos, quanto mais alto
for o grau de progresso da sociedade em apreo.
E o que se d com o animal complexo.
-
30
O organismo, a exemplo da sociedade, de tal modo construdo que
as condies da vida elementar, ou individual, sejam respeitadas.
Tais condies so as mesmas para todos, mas, sem embargo, cada membro
depende, at um certo limite, por sua funo, do lugar que ocupa no
organismo, no grupo social. A vida , pois, comum a todos, e s as
funes so distintas.
Essas funes to variadas, que se harmonizam para concorrer vida
total , so necessariamente dirigidas por uma fora consciente do fim
a realizar. No o acaso que preside a essa to sbia multiplicidade, a
essa coordenao, pois os mesmos rgos, as glndulas por exemplo, no
obstante constitutivamente semelhantes entre si, fornecem secrees
variadas, conforme o lugar que ocupam no organismo.
Ha, portanto, uma hierarquia nesses aparelhos, uma ordem
preestabelecida e rigorosamente mantida no curso da vida.
Ora, esse estatuto vital no est impresso na matria mutvel,
permutvel, incessantemente renovada; antes, reside nessa estrutura
fixa, invarivel, que denominamos duplo fludico.
Esse perisprito, cuja realidade a experincia tem demonstrado,
indispensvel estabilidade do ser vivente, no meio de toda essa
complexidade das aes vitais, dessa efervescncia perptua e
resultante da cadeia_ de decomposies e recomposies qumicas
ininterruptas na trama, enfim, de nervos, msculos, glndulas a se
entrecruzarem, a circularem, a se interpenetrarem de lquidos e
gases, em desordem aparente, mas da qual sair, contudo, a mais
estupenda regularidade.
As Grande operaes de digesto, da respirao, das secrees; as aes
to variadas dos sistemas nervos-motores, sensitivos, ganglionares,
no sero perturbadas. Cooperando, sem trguas, para entreter o meio
orgnico, elas lhe fornecem os materiais da sntese assimiladora, e
todas essas aes to multiplicadas, to diversas, e, todavia, to
constantes, se completam, a despeito da renovao ininterrupta de
todas as molculas que formam esses variados rgos.
As matrias novas, carreadas pelos alimentos, parecem dar
testemunho de uma inteligncia perfeita quanto aos fins colimados;
mas, quando consideramos que todas essas molculas so passivas,
desprovidas de qualquer espontaneidade, somos necessariamente
levados a indagar da fora que dirige esses inumerveis produtos
qumicos, utilizando as suas propriedades peculiares na manufatura
grandiosa da harmonia vital.
-
31
Retomando o exemplo anterior, como se cada indivduo - pedreiro,
padeiro, etc. - sucumbisse depois de haver feito uma s vez a sua
tarefa, e fosse imediatamente substitudo por um homem qualquer.
Haveria necessidade de algum que indicasse ao substituto o que
lhe cumpria fazer, o gnero de trabalho a ele destinado. Isso que,
no plano social, s poderia conseguir-se mediante prvia educao, a
natureza o realiza de improviso.
Todas as molculas orgnicas, semelhantes entre si, vo realizar
tarefas diferentes, segundo a colocao que tiverem no organismo.
que a funo pertence a um conjunto e no s unidades que o compem.
Esse conjunto resulta de uma lei que se liga sua prpria estrutura,
mantida esta pela idia diretriz que conformou, externa e
internamente, o indivduo, pelo perisprito.
Uma circunstncia capital, que jamais devemos esquecer, que, real
e positivamente, todas as partes do corpo se transmudam sem cessar.
No h no ser humano a mais insignificante partcula de tecido que no
seja passvel de substituio e renascimento perptuo.
J dissemos que a mesma matria jamais aproveita duas vezes
manifestao vital, e que, ao fim de poucos anos, toda a matria foi
integralmente renovada. Nem uma s molcula antiga subsiste, todos os
membros dessa repblica cederam o lugar aos sucessores, e, sem
embargo, as funes jamais se interromperam, a vida continuou a
engendrar, na mesma ordem imperturbvel, os fenmenos de sua evoluo,
de vez que a sua lei orgnica. reside no corpo incorruptvel e
impondervel - o perisprito.
Deveras surpreendente o pauperismo das concluses a que chegam
inteligncias robustas, quando afrontam esses fenmenos, cuia
explicao se lhes torna impossvel, para ficarem adstritos a idias
preconcebidas. Aqui temos um, no dos menores, Maudsley, ao esbarrar
de frente com a identidade pessoal, persistente atravs do turbilho
vital. Vejamos como ele se safa da dificuldade:
Se me viessem assegurar que no h uma s partcula do meu corpo de
h trinta anos; que a sua massa mudou radicalmente e que absurdo ,
neste caso, falar de identidade, tornando-se imprescindvel presumir
o corpo habitado por uma entidade imaterial, que lhe mantenha a
identidade pessoal atravs das mudanas perptuas e dos acasos
estruturais - eu responderia que as pessoas que me conheceram, dos
tempos de moo at hoje, no tm, mais do que eu mesmo, a certeza
consciente da minha identidade e, todavia, dela
-
32
esto convencidos, quanto eu mesmo, ainda que me tivessem pelo
maior mentiroso deste mundo, e no acreditassem em uma s palavra do
meu testemunho subjetivo. Diria, mais, que essas pessoas esto
igualmente convictas da identidade pessoal dos seus ces ou dos seus
cavalos, cujo testemunho subjetivo nulo na espcie, e, finalmente,
que, atribuindo-me uma substncia imaterial, foroso admitir tenha
ela sofrido tantas mudanas que me deixam inseguro de que algo lhe
reste do. que. fora a trinta anos, de sorte que, na melhor das
intenes, no vejo a necessidade, ou o benefcio, a tirar da suposta
identidade, ao meu ver suprfluas."
O benefcio? - mas, justamente o de explicar o que sem ela se
torna incompreensvel.
E comum esta objeo: se todo o organismo radicalmente destrudo
para dar lugar a outro, o segundo ser semelhante, mas no idntico ao
primeiro. E, neste caso, a persistncia mnemnica, por exemplo,
inexplicvel. O nosso filsofo responde que, uma vez que os outros o
reconhecem, que ele no mudou. a famosa histria da faca de Janot, a
que tiraram sucessivamente a lmina e o cabo, e ficou sendo a mesma
para quantos a contemplavam, posto que radicalmente mudada.
Maudsley diz, simplesmente, na espcie: "todo o mundo reconhece a
faca de Janot, logo, quanto basta para que seja ela mesma".
Confessemos que, para um filsofo, esse raciocnio no l grande
coisa e que ele poderia ter encontrado algo melhor. Depois, aquela
premissa de que, existente a alma, j no poderia ser a mesma... Mas,
em suma, por que no? No o diz, nenhuma explicao nos fornece a
respeito. So simples afir-mativas que em nada afetam o problema e,
antes, evidenciam a impotncia em que se encontram os materialistas,
quando abordam as questes inerentes alma e ao seu papel no corpo
humano.
De fato, como no compreender a necessidade de um organismo
fludico, no submetido s mutaes materiais, a fim de conservar e
aplicar as leis orgnicas, cuja continuidade necessrias est em
oposio mobilidade e instabilidade caractersticas das aes
vitais?
Por que prodgio se manteria o tipo individual? Em que parte do
corpo se guardariam tradies raciais, hereditrias? Em que recanto
misterioso do mvel edifcio haveriam de refugiar-se os caracteres,
to constantes e inalterveis, que diferenciam os seres entre si,
tanto do ponto de vista individual como do zoolgico?
-
33
O perisprito no concepo filosfica imaginada para dar conta dos
fatos; um rgo indispensvel vida fsica, reconhecvel pela
experimentao. Foi no estudo da materializao dos Espritos que o seu
papel se revelou, pondo em destaque as suas propriedades
funcionais. Essa descoberta explica fenmenos que a cincia
registrava apenas, sem poder justific-los.
Esse esboo do ser, preexistente a toda organizao, essa reparao
perptua dos tecidos, mediante regras fixas, essa ordem que se no
altera, apesar dos sucessivos afluxos de elementos novos, essa
evoluo cuja lei domina, em todo o curso da vida, o conjunto das
trocas materiais, de modo a modific-las profundamente conforme a
idade; tudo isso se torna compreensvel com a teoria esprita. Sem
ela, ao invs, indecifrvel obscuridade se estende sobre todos os
fenmenos que de to perto nos tocam. Admita-se a existncia do
perisprito, e tudo se esclarece e se compreende; a lgica dos fatos
torna-se evidente uma explicao racional no lugar do mistrio,
descoberta que nos leva a dar um passo a mais no conhecimento to
difcil de ns mesmos.
At aqui, no encaramos seno o lado material da questo, mas, do
ponto de vista anmico, a necessidade do papel do perisprito
insinua-se com tal autoridade, que no haveria como recus-lo. uma
convico de brecha fcil, desde que estudemos a vida. intelectual do
homem.
O papel psicolgico do perisprito. - A identidade
A vida psquica de todo ser pensante apresenta uma
continuidade
assecuratria de sua identidade. por no sentirmos lacuna em nossa
vida mental, que nos certificamos de ser a mesma, sempre, a
individualidade em ns residente. A memria religa, de forma
ininterrupta, todos os estados de conscincia, da infncia velhice.
Sob a forma de lembranas, podemos evocar eventos do passado,
dar-lhes vida fictcia, julgar-lhes as fases, dar-nos conta de que,
mal grado todas as vicissitudes, lutas, abalos morais,
desfalecimentos ou triunfos da vontade, sempre o mesmo eu que odiou
ou amou, gozou ou sofreu. Numa palavra: - que somos idnticos.
Enfim que parte do ser reside essa identidade?
-
34
Evidentemente, no esprito, pois ele que sente e quer. Na Terra,
as faculdades intelectuais esto ligadas, em suas manifestaes, a um
certo estado do corpo, e o crebro o rgo pelo qual o pensamento se
transmite ao exterior. O crebro, porm, muda perpetuamente, as
clulas dos seus tecidos so incessantemente agitadas, modificadas,
destrudas por sensaes vindas do interior e do exterior. Mais do que
as outras, essas clulas submetem-se a uma desagregao rpida, e, num
perodo assaz curto, so integralmente substitudas.
Como conceber, ento, a conservao da memria, e, com esta, a
identidade?
De nossa parte, no hesitamos em crer que o perisprito, ainda
aqui, representa um grande papel, evidenciando a sua necessidade,
visto como os argumentos que validamos, para o mecanismo
fisiolgico, melhor ainda se aplicam ao funcionamento intelectual,
bem mais intenso e variado que as aes da vida vegetativa ou animal.
Dessas duas ordens de fatos, bem comprovados, resulta: a renovao
incessante das molculas e a conservao da lembrana, que as sensaes e
os pensamentos registrados no o so apenas no corpo fsico, mas tambm
no que imutvel - no invlucro fludico da alma. Eis como se pode
representar o fenmeno.
Todo o mundo sabe que para termos uma sensao faz-se preciso que
um dos rgos dos sentidos seja excitado por um movimento vibratrio,
capaz de irritar o nervo correspondente.
O choque recebido propaga-se at ao crebro, onde a alma toma
conhecimento dele, por um fenmeno dito de percepo, Mas, ns sabemos
que, entre o crebro e a alma, est o perisprito, que aquele choque
deve atravessar, deixando-lhe um trao.
Com efeito, ao mesmo tempo em que percebida a sensao - o que se
d no instante em que a clula cerebral entra a vibrar -, o
perisprito, que transmitiu ao esprito o movimento, registrou-a.
A clula pode, ento, desaparecer, cumprida a sua tarefa. A que
lhe deva suceder ser formada pelo perisprito, que lhe imprimir os
mesmos movimentos vibratrios que recebera. Destarte, a sensao ser
conservada e apta a reaparecer, quando o queira o esprito.
Importa, necessariamente, assim seja, pois a certeza do trabalho
molecular do crebro absoluta. Pode-se at medir a intensidade da
atividade intelectual pela elevao de temperatura das camadas
corticais, e pelas perdas excrementosas conseqentes.
-
35
O substrato material incessantemente destrudo e reconstituindo.
No fosse o perisprito uma espcie de fongrafo natural, a
registrar
sensaes para reproduzi-Ias mais tarde, impossvel se tornaria
adquirir conhecimentos, pois o novo ser, aquele que incessantemente
substitui o antigo, nada conhece do passado.
Lgico , pois, admitir que o perisprito tem grande importncia do
ponto de vista psquico, e nada h nisso que nos deva surpreender,
por isso que, em suma, ele faz parte da alma e lhe serve de agente
junto matria.
O sistema nervoso e a fora nervosa ou psquica
Temos assinalado a existncia, no homem, de enorme quantidade
de
aes vitais, completando-se simultaneamente, e trabalhando cada
rgo com autonomia prpria, mas fiis comodidade e solidrias no
conjunto de que so partes.
Tal coordenao de elementos to diversos obtida mediante os
diferentes sistemas nervosos, cuja rede abarca todo o corpo.
Intil lembrar, longamente, que todos os rgos da vida, vegetativa
- corao, vasos, pulmes, canal intestinal, fgado, etc. -, por
estranhos que sejam uns aos outros e por absorvidos que paream em
suas necessidades peculiares, esto, contudo, jungidos a estreita
solidariedade, devida aos sistemas grande-simptico e ganglionrio,
cuja ao regular escapa vontade.
Para que as funes se completem, sem trguas, importa exista uma
estabilidade que mal se ajusta mobilidade caracterstica dos atos
voluntrios.
Entretanto, este sistema no fica isolado no ser; revela-se ao
esprito por sensaes de bem ou mal-estar, quais a fome e a sede, e,
s vezes, por impresses mais ntidas, quando a enfermidade atinge um
rgo.
Os fenmenos gerais da vida orgnica tm como regulador o sistema
nervoso crebro-espinhal, isto , os nervos sensitivos, os motores, a
coluna vertebral e o crebro.
A fisiologia tem estudado e demonstrado as respectivas funes
desses rgos. Chegou-se a isol-los por diferentes processos,
reconhecendo-se que
-
36
a vida psquica tem um territrio bem determinado. Onde situar a
sede da atividade psquica?
A experincia fornece-nos, a propsito, indicaes precisas. Tomemos
qualquer vertebrado inferior, uma r por exemplo. Vemo-la saltar,
coaxar, tentar fugir; sua atividade cerebral, por mais restrita que
a suponhamos, se exerce por movimento de luta e defesa, numa agitao
incessante.
Pois bem: - podemos, de chofre, suprimir todas essas
manifestaes, bastando destruir, a estilete, o sistema nervoso
central. (16)
Muda-se logo a cena. O animal que gritava, saltava, debatia-se,
defendia-se, tornou-se massa inerte, que nenhuma excitao pode
revelar. No mais movimentos, nem espontneos nem reflexos.
Entretanto, o corao continua a bater, e os nervos e msculos
motores so excitveis pela eletricidade: - todos os aparelhos, todos
os tecidos esto vivos, salvo o aparelho central destrudo.
Suprimiu-se o aparelho adequado s manifestaes intelectuais, o
princpio inteligente no mais pode utiliza os fenmenos psquicos
desapareceram.
O nervo motor que pe em relao crebro e msculos devem conduzir
algo da clula central a esse msculo que se contrai sua influncia.
Por idntica maneira, a sensao, carreada pela fibra nervosa sensvel,
deve ser transmitida por algo que modifica o estado da clula
central.
Podemos-nos determinar a natureza desse algo e dizer o que ele
seja? Questo posta tantas vezes, ainda no pde ser deslindada. No
intuito de forrar-se a embaraos, comumente se apela para a ao do
nervo. Mas, quem diz ao nervosa no aclara grande coisa quanto
natureza dessa tal ao.
Os fsicos pretenderam, contudo, reduzir essa influncia a um
agente fsico outro, e era, ento, a eletricidade que se apresentava
naturalmente, de vez que, quando se subtrai um msculo influncia da
vontade transmissvel pelo nervo motor, pode-se, perfeitamente,
substituir esta ao pela eletri-cidade.
Entretanto, essa teoria indemonstrvel no estado atual da cincia
(17). Interrompido o filete nervoso, por seccionamento, a corrente
eltrica ainda continuar pelas partes condutoras convizinhas, ao
passo que a menor leso, fisiolgica ou anatmica, impede a influncia
nervosa de transmitir-se ao msculo.
A influncia nervosa , pois, uma ao especial, um agente
fisiolgico distinto de qualquer outro. Difere da fora vital, como
vimos na experincia
-
37
da r, cuja vida vegetativa e movimentos automticos persistem,
apesar da supresso da influncia neuropsquica, tal como sucede aos
membros paralisados que continuam vivos, no obstante subtrados
influncia da vontade.
Os recentes trabalhos de Crookes e de Rochas demonstraram,
experimentalmente, a existncia dessa fora nervosa.
O clebre fsico ingls publicou as investigaes feitas com Honre.
(18) Utilizando instrumentos de mensurao, exatos quo delicados,
ele
mediu essa fora atuante sobre objetos inanimados sem contacto
visvel. Com A. de Rochas, vimos como essa fora pode
exteriorizar-se,
confirmando, assim, as experincias de Crookes. H, portanto, uma
notvel progresso entre a evoluo do principio
inteligente e as foras que lhe servem para manifestar-se no
organismo vivo. Nos seres inferiores, nos quais no h funes
diferenciadas, s a fora
vital se revela; mas, com o desenvolvimento do organismo e a
especificao das propriedades protoplsmicas, aparece o regulador, o
coordenador das aes vitais: o sistema neuroganglionar, sempre
acionado pela fora vital. Finalmente, prosseguindo a evoluo, os
fenmenos da vida psquica assumem importncia mais a mais crescente,
o sistema crebro-espinhal organiza-se e surge uma diferenciao
especial da energia: - a fora nervosa, que afetar especialmente a
vida intelectual.
Mais tarde, veremos o papel que ela representa na vida psquica,
e como as suas modificaes determinam os estados sonamblicos e as
alteraes outras na personalidade.
Resumo
Dos estudos parcialmente feitos neste captulo, resulta que,
consoante a
frase enrgica dos telogos, a alma que condiciona o corpo, isto ,
que o modela sob um plano preconcebido, tanto quanto o dirige por
meio do perisprito.
A forma humana, ressalvadas as alteraes prprias da idade,
conserva o seu tipo, apesar do afluxo incessante de matria que
passa pelo corpo. Destarte, assemelha-se a uma rede, entre cujas
malhas se insinuam as
-
38
molculas. Esse retculo fludico contm, igualmente, as leis do
mecanismo vital, e fica estvel atravs do turbilho das aes
fsico-qumicas, que des-troem e reconstroem, incessantemente, o
edifcio orgnico.
Compe-se, portanto, o ser humano de trs elementos distintos: a
alma com o seu perisprito, a fora vital, e a matria.
A fora vital representa aqui um duplo papel: d ao protoplasma
suas propriedades gerais, e ao perisprito o grau de materialidade
necessria para que ele possa manifestar as leis que oculta, enfim,
fazendo-as passar da virtualidade ao ato.
A grande autoridade de Claude Bernard, a quem consultamos muitas
vezes, vem, ainda neste ponto, confirmar a nossa forma de ver. Eis
como ele se exprime em seu livro - Investigaes sobre os problemas
da Fisiologia:
H - diz - como que um desenho vital, que traa o plano de cada
ser e de cada rgo; de sorte que, considerado isoladamente, cada
fenmeno orgnico tributrio das foras gerais da natureza, a revelarem
como que um lao especial, parecendo dirigidos por alguma condio
invisvel na rota que perseguem, na ordem que as encadeia.
Assim que as aes qumico-sintticas da organizao e da nutrio se
manifestam como se fossem animadas por uma fora impulsiva
governando a matria; fazendo uma qumica apropriada a um fim, e
pondo em jogo os reativos cegos dos laboratrios, maneira dos
prprios qumicos.
"E essa potncia de evoluo, imanente no vulo, que nos limitamos a
enunciar aqui, que constituiria, s por si, o quid proprium da vida;
pois claro que essa propriedade do ovo, a produzir um mamfero, uma
ave, ou um peixe, no nem fsica, nem qumica."
A vida resulta, portanto, evidente da unio da fora vital com o
perisprito, dando aquela a vida, propriamente dita, e este as leis
orgnicas, concorrendo alma com a vida psquica.
Destes trs fatores, s um sempre e por toda parte identifico - a
vida. O Esprito, transitando pela matria vivente, e as primitivas
eras do mundo, conseguiram, paulatinamente, a transformao
progressiva e aperfeioada. Cremos seja ele o agente de evoluo das
formas orgnicas e, da, a razo do rito, conservando-lhe as leis. Nem
foi seno lentssima e progressivamente que essas leis se lhe
incrustaram na contextura.
Havemos de ver de que modo um movimento, voluntrio de incio,
pode tornar-se habitual, maquinal, e, por fim, automtico e
inconsciente . . . Este o lado fisiolgico. A mesma coisa ocorre com
as manifestaes intelectuais,
-
39
dado o paralelismo das duas evolues. e difcil, em primeiro
lugar, representam umas matrias fludicas, invisveis, imponderveis,
agindo sobre a matria, para orden-la mediante leis; nada obstante,
podemos encontrar analogias que permitem fazer uma idia, assaz
aproximada, dessa espcie de ao.
Conhecemos em fsica um instrumento chamado eletrom, que nos vai
servir de comparao. Compe-se ele, principalmente, de um cilindro de
ferro destemperado e dobrado em forma de ferradura, volta do qual
se enrola, direita e esquerda dos respectivos ramos, um longo fio
de cobre isolado. As extremidades de ferro chamam plos do
eletrom.
Fazendo passar uma corrente eltrica no fio de cobre, o ferro se
imanta e conserva essa propriedade por tanto tempo quanto dure a ao
eltrica. Se voltarmos o aparelho de modo a ficarem os plos no ar,
colocando por cima um carto delgado e polvilhado com limalha de
ferro, veremos que esta se ordena espontaneamente em linhas
regulares, a formar desenhos variveis e correspondentes forma dos
plos. A essas figuras deu-se o nome de fantasma ou espectro
magntico, e s aglomeraes de limalha chamaram-se linhas de fora, por
isso que traduzem objetivamente a ao ds foras magnticas.
Temos, assim, um exemplo material do que ocorre com todo ser
animado.
Umas foras invisveis, imponderveis - o magnetismo - agindo sem
contacto sobre a matria - a limalha. Em nosso tempo, a eletricidade
representa o papel da fora vital, o eletrom o do perisprito, e a
limalha representam as molculas componentes dos tecidos
orgnicos.
Podem formar-se no m plos secundrios, chamados pontos
conseqentes, de sorte que tambm eles produzem espectro secundrios,
que, misturando-se aos primeiros, originam as mais complicadas
figuras.
O magnetismo bem uma fora impondervel, pois que um m capaz de
elevar um peso vinte e trs vezes maior que o seu, nem por isso pesa
mais do que antes de ser imantado.
Comparando-se a ao do perisprito sobre a matria do eletrom sobre
a limalha, podemos fazer uma idia do seu modo operatrio. Concebe-se
que lhe seja possvel modelar a substncia do ser embrionrio, de feio
a imprimir-lhe a forma exterior, fadada ao tipo especfico, ao mesmo
tempo em que facetar os rgos interiores: - pulmes, corao, fgado,
crebro, etc., propiciados s funes vitais.
-
40
O espectro magntico no forma seno um desenho no carto, desenho
que figura um agregado feito na esfera da influncia magntica;
entretanto, se pudssemos dispor, em torno dos plos e em forma de
leque, uma srie de cartes, veria o espectro magntico a estender-se
e a formar um campo mag-ntico em todas as direes. o que se d com o
perisprito, com a s diferena de serem internas as suas linhas de
fora, ou, por melhor comparar: - o corpo fsico o espectro magntico
do perisprito.
So simples os desenhos formados pelos plos do eletrom, porque
simples o movimento molecular do ferro. No envoltrio fludico, esse
movimento muito complexo, e, da, uma grande diversidade nos seres
vivos. Da mesma forma que a ao magntica se mantm enquanto a
corrente eltrica circula no fio de cobre, mantm-se vivo o corpo
enquanto haja fora vital animando o perisprito.
Podemos levar ainda mais longe a analogia. As propriedades
magnticas do ferro brando permanecem latentes, enquanto
eletricidade no as desperta, orientando as molculas metlicas.
Assim, dormitam, tambm, as propriedades organognicas do
perisprito, por assim dizer, enquanto a alma pervaga no espao e no
se tornam ativas seno sob a influncia da fora vim. A razo a est de
poderem os Espritos, em suas manifestaes, reconstituir um corpo
temporrio, acionando o mecanismos perispiritual, desde que um mdium
lhes fornea a fora vital e a matria indispensvel a essa operao.
Temos, em suma, que uma fora impondervel - a eletricidade -
determina, por induo, o nascimento de outra fora impondervel - o
magnetismo -, que tem ao diretiva sobre a matria bruta. No ser
vivente, a fora vital age sobre o perisprito e este pode, ento,
desenvolver suas propriedades, que so, qual o vimos, a formao e
reparao do corpo fsico.
Como o perisprito matria, tem forma bem determinada e
indestrutvel, podemos conceber-lhe modificaes sucessivas de
movimento atmico, correspondendo a modificaes e complicaes cada vez
maiores no seu modus operandi. Por outras palavras, vale dizer que,
comeando por organizar formas rudimentar, pde, aps longa evoluo de
milhes de anos e de inumerveis reencarnaes, dirigir organismos mais
e mais delicados e aperfeioados, at chegar aos humanos. Alma e
perisprito forma um todo indivisvel, constituindo, no conjunto, as
partes ativa e passiva, as duas faces do princpio pensante. O
invlucro as partes materiais, a que tem por funo reter todos os
estados de conscincia, de sensibilidade ou de vontade; o
-
41
reservatrio de todos os conhecimentos, e, como nada se perde na
natureza, sendo o invlucro indestrutvel, a alma tem memria integral
quando se encontra no espao.
O perisprito a idia diretora, o plano impondervel da estrutura
orgnica. ele que armazena, registra, conserva todas as percepes,
todas as volies e idias da alma. E no somente incrusta na substncia
todos os estados anmicos determinados pelo mundo exterior, como se
constitui a testemunha imutvel, o detentor indefectvel dos mais
fugidios pensamentos, dos sonhos apenas entrevistos e
formulados.
E, enfim, o guardio fiel, o acervo imperecvel do nosso passado.
Em sua substncia incorruptvel, fixaram-se as leis do nosso
desenvolvimento, tornando-o, por excelncia, o conservador, de nossa
personalidade, por isso que nele que reside a memria.
A alma jamais abandona o invlucro, sua tnica de Nesso, mas
blsamo consolador tambm.
Desde perodos multimilenares em que a alma iniciou as
peregrinaes terrestres, sob as formas mais nfimas da criao, at
elevar-se gradativamente s mais perfeitas, o perisprito no cessou
de assimilar, por maneira indelvel, as leis que regem a matria,
pois medida que o progresso se realiza as criaes multifrias do
pensamento formam bagagem crescente, qual tesouro incessantemente
abastecido. Nada se destri, tudo se acumula nesse perisprito to
imperecvel e incorruptvel como a fora ou a matria de que saiu. Os
espetculos maravilhosos que nossa alma contempla, as harmonias
sublimes que se dilatam nos espaos infinitos, os esplendores da
arte, tudo se fixou em ns, e ns para sempre possumos o que pudemos
adquirir. O mnimo esforo levado mecanicamente ao nosso ativo, nada
se perde, e assim que lenta, mas seguramente, galgamos a escada do
progresso.
Com a morte do homem, quando o despojo mortal se lhe decompe;
quando os elementos que o conformaram entram no laboratrio
universal, a alma subsiste integral, completa, conservando o que
fez sua personalidade, isto , a memria, e, o que mais : - no apenas
a da ltima encarnao, porque a de todas as que tenha
experimentado.
Panorama imponente e severo que se lhe desenrola vista, no qual
ela pode ler os ensinamentos do passado e discernir os deveres do
futuro.
-
42
Agora, queremos estabelecer como pde o perisprito adquirir as
suas propriedades funcionais, passando e repassando em sucessivas
reencarnaes pelo tamis da animalidade.
Preciso , portanto, demonstrarmos a unidade do princpio pensante
no homem e no animal, e estabelecermos que no h transies bruscas
entre um e outro; que a lei de continuidade no se interrompe, que o
homem no constitui um reino parte no seio da natureza, e que s
mediante uma evoluo contnua, por esforos consecutivos, chega a
atingir o ponto culminante na criao.
CAPTULO II A ALMA ANIMAL
SUMARIO: Os selvagens. - Identidade corporal. - Estudo das
faculdades Intelectuais e morais dos animais. - A curiosidade. - O
amor-prprio. - A imitao inteligente. - A abstrao. - A linguagem. -
A Idiotia. - Amor conjugal. - Amor materno. - Amor do prximo. - O
sentimento esttico. - A gradao dos seres. - A luta pela vida. -
Resumo,
O problema da origem do homem um dos mais difceis de abordar
aqui
na Terra. Colocados, como nos encontramos, num estgio de
civilizao avanada, temos a impresso de que um abismo nos separa dos
outros seres. Tem o homem, de fato, conquistado o cetro do mundo:
submeteu sua vontade toda a natureza, p~ ando montanhas, unindo
mares, secando pntanos, desviando rios, dirigindo a vegetao em
sentido mais til ou agradvel s suas convenincias, domando os
animais aproveitveis - ele, o
-
43
homem, soube utilizar todas as foras vivas .e capazes de lhe
aumentarem o bem-estar.
Os caminhos de ferro transportam-no longe, sem fadiga; a
eletricidade conduz-lhe o pensamento aos confins do globo e
adapta-se' a todos os usos domsticos; o balo permite-lhe explorar
altas camadas atmosfricas, ao mesmo passo que mergulha,.pela
minerao, nas entranhas do solo. (19)
Diante de resultados que tais, atingidos pelo seu gnio, propende
o homem a crer-se formado de essncia diversa e superior dos
animais, havidos por incapazes de qualquer progresso. (20)
As religies, que no passam, em ltima anlise, de quimeras
antropomorfas, tm estimulado, ingenuamente, essas tendncias,
fazendo do homem a imagem material da divindade, e da alma um
principio, uma causa especial, completamente diferente de quanto
existe no mundo.
Entretanto, examinada de mais perto, essa magnfica
inteligncia.est bem longe de ser perfeita, e faz-se preciso certa
parcela de parcialidade e de orgulho para imaginar que criaturas
que se massacram ferozmente em combates sangrentos, sem outro ideal
que o de semear desolao e morte entre vizinhos, representem a
Inteligncia infinita que governa o cosmo.
O esplendor de nossos progressos materiais no deve obscurecer
nossa modesta origem. Os ensinos da Histria a esto para mostrar que
o desenvolvimento intelectual foi, sobretudo, obra dos sculos.
A noite morna da Idade Mdia de h muito cessou, para que no
deslembremos o passado e, ao demais, se certo que uma frao da
Humanidade avanou, menos no o que muitos de nossos semelhantes
ainda jazem embotados na ignorncia, vtimas de paixes bestiais, como
a mostrar-nos o percurso da evoluo humana.
Os selvagens
Ao lado da civilizao, vegetam seres degradados que mal
poderemos
chamar homens (21). Entre essas tribos caracterizadas por