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A CONSTRUO DA IMAGEM DO POLICIAL MILITAR
NO CENRIO CULTURAL BRASILEIRO CONTEMPORNEOARUAN BACCARO DE
FREITAS
RESUMO
A opinio pblica uma das mais fascinantes dimenses que a
sociedade moderna possui. Atravs dela, a legitimidade das
instituies democrticas auferida rotineiramente por meio da construo
de imagens pblicas destas, de modo a auxiliar o Estado na
compreenso e enfrentamento dos seus desafios, seus problemas. Este
artigo pretende analisar, sob uma perspectiva social, a construo
cultural, ideolgica e coletiva da opinio pblica, bem como alguns
dos problemas prpria construo social, jornalstica, artstica,
literria, televisiva e miditica da imagem do policial militar,
tendo-se como background a cultura nacional brasileira
contempornea. Abordando exemplos e explorando o conceito de
paradoxo da exposio miditica, mostrar-se- nesse diagnstico como
estamos imersos em um contexto cuja compreenso fundamental para se
refletir e intervir eficazmente na construo da credibilidade
institucional, modificando assim a imagem do policial militar
perante a sociedade brasileira.PALAVRAS CHAVEAnlise Cultural.
Imagem Institucional. Publicidade Policial. Gramscismo. Paradoxo da
Exposio Miditica. Imagem Policial. Opinio Pblica.Opinio Pblica:
dimenso estratgica de legitimao institucionalA opinio pblica , sem
dvida, uma das mais relevantes dimenses que colabora para a
construo da imagem social da Polcia Militar do Estado de So Paulo -
enquanto instituio pblica - e do policial militar - enquanto agente
dessa instituio e brao armado do Estado para a manuteno e preservao
da Tranquilidade, da Salubridade, da Paz; da Ordem Pblica, enfim.
Por meio daquela, os indivduos adquirem uma expresso denotadora de
uma determinada (porm impessoal) convico comum acerca de certos
temas, problemas, questes sociais, entidades, pessoas, grupos,
sociedades ou controvrsias. A importncia da opinio pblica,
cabalmente demonstrada na histria mais recente (considerando o
perodo que vai desde a Revoluo Francesa at hoje), sem dvida,
amplifica-se, abrangindo e inaugurando um perodo novo na
atualidade: um perodo cuja aceitabilidade de quaisquer instituies
recebe da opinio das massas a sua validade, num ambiente
scio-cultural no qual a credibilidade e a legitimidade das opinies
precisam da chancela de "democrtica" para se sustentarem como
eticamente aceitveis.
Por meio desse artigo, cuja pretenso no se limita seno a abordar
de maneira bastante ligeira a importncia certos aspectos
scio-culturais da sociedade brasileira na formao da imagem pblica
referente Polcia (com nfase na Polcia Militar), procurar-se- fazer
apenas uma introduo ao tema, sem a pretenso de esgotar o assunto;
porm, mesmo assim, uma apresentao necessria, que recoloca em
evidncia alguns aspectos pouco lembrados como edificadores de tal
imagem.Para tanto, necessrio esclarecer antes de tudo de qual
realidade tratamos ao lidar com o conceito "opinio pblica". A
palavra opinio, etimologicamente, alm de sua clara conotao de
subjetividade e mobilidade (do grego "doxa", contraposta ao
conhecimento rigorosamente elaborado, conhecimento verdadeiro -
"episteme"), enuncia uma realidade prpria daquilo que varivel. Da
Vi conceituar opinio da seguinte forma: Opinio conjunto de crenas a
respeito de temas controvertidos ou relacionados com interpretao
valorativa ou o significado moral de certos fatos. J a palavra
pblico refere-se a algo de mbito universalista, ou seja, no uma
coisa restrita aos ditames de uma existncia privada, particular,
secreta ou socialmente irrelevante: o pertinente a todos os membros
de um determinado corpo social.Opinio pblica , portanto, o
posicionamento subjetivo dos membros dum determinado corpo social
em relao a uma realidade, pessoa, ideia, problema ou questo
(usualmente controversa ou relevante para o aferidor da opinio
pblica).De acordo com Speier, o conceito genrico de opinio pblica
mais prximo daquele que possumos hoje data de pouco mais de 300
anos atrs, quando no sculo XVIII - perodo de desenvolvimento da
ideologia iluminista no Ocidente - o pensador Jean Jacques Rousseau
expor o tema como poucos em sua poca o fizeram. Com perspectiva
semelhante, afirma Childs:
"Rousseau(...) fez uma das mais claras anlises do conceito de
opinio pblica em sua poca. Aplicou sua teoria da infalibilidade
popular ao estado, proclamando que "o desejo mais generalizado
tambm o mais justo". Este ponto de vista tem sido freqentemente
repetido desde ento. Rousseau acreditava que mesmo o despotismo se
apoia na opinio pblica porque dizia ele, "o governo desptico
servil, mesmo quando fundamentado na opinio; pois voc depende do
preconceito daqueles a quem voc governa pelo preconceito."
Segundo Childs, h motivos se crer que teria sido Rousseau o
primeiro a usar a expresso "Opinio Pblica" ("lopinion publique"),
contribuindo tambm com valiosas consideraes sobre a influncia entre
essa e o Direito (o mbito por excelncia da legitimao scio-normativa
de um valor). "Afirmou que "quem quer que se dedique tarefa de
legislar para um povo deve saber como manejar as opinies, e atravs
delas governar as paixes dos homens".
No obstante diferentes consideraes historicamente documentadas
sobre a existncia e a importncia do consenso popular como fator
poltico digno de nota (o ditado popular medieval "vox populi vox
Dei" um exemplo) existiram antes, s mais recentemente com advento
da Revoluo Francesa tivemos claramente entronizada a opinio pblica
como um dos fatores de primeiro escalo em termos de relevncia para
a legitimao social e poltica, preparando as bases da democracia
moderna. Le Bon confirmar esse diagnstico em seu "A Psicologia das
Multides", afirmando - por volta de um sculo aps a Revoluo
Francesa:
"H apenas um sculo, a poltica tradicional dos Estados e as
rivalidades dos prncipes constituam os principais fatores dos
acontecimentos. Na maioria dos casos, a opinio das multides nada
contava. Hoje, so as tradies polticas, as tendncias pessoais dos
soberanos e as suas rivalidades que pouca importncia tm. A voz das
multides tornou-se preponderante. ela que dita aos reis a sua
conduta. Os destinos das naes no se jogam j nos conselhos dos
prncipes, mas sim na alma das multides."
Expondo outra perspectiva, o filsofo das cincias polticas John
Locke argumenta na esteira dos ideais iluministas, ilustrando a
mudana de paradigma poltico em favor da relevncia crescente da
opinio pblica, mas matiza-a considerando ser essa relevncia
subordinada a outros interesses e foras que no a mera coao moral
produzida pela imagem pblica existente de um indivduo ou grupo
social. Para ele, a opinio pblica no nada mais do que a "lei da
censura privada" (uma das trs leis que Locke considera regerem as
aes humanas, juntamente com a lei divina e a lei positiva), a qual
no seria nada seno o consenso dos homens privados os quais no
possuiriam autoridade o suficiente para promulgarem uma lei.
Mais contemporaneamente, porm, a percepo da importncia dessa
varivel aumenta consideravelmente aps fatos que demonstram haver
uma lgica distinta por detrs da explicao destes: o fim dos estados
coloniais na Amrica Latina, a queda das Monarquias e Imprios
tradicionalmente estabelecidos, o vertiginoso crescimento de
revolues sociais (unificaes territoriais, a criao dos estados-nao
modernos) com destaque para a revoluo socialista na Rssia, a
Propaganda de Guerra (tanto na 1 Guerra Mundial quanto na 2 Guerra
Mundial) e outros eventos nos quais a fora dos agentes histricos
envolvidos eram calcados no respaldo da opinio pblica impulsionaram
consideravelmente o interesse para os estudos dessa temtica.
Os estudos de Walter Lippmann sobre a opinio pblica so um marco
desse impulso renovado para a compreenso da opinio pblica,
exatamente por estabelecer uma relao inovadora desse conceito com
os meios de comunicao em massa.
Segundo o autor, no podemos dissociar a formao da opinio pblica
daquilo que so os principais instrumentos de informao apreensveis
pela percepo coletiva: os grandes meios de comunicao em massa.
Jornais, revistas, cartazes, panfletos, livros, peas de teatro,
peras, musicais, performances artsticas, pinturas, rdio e televiso:
todas esses meios de comunicao influenciam de tal maneira na criao
das notcias ofertadas aos cidados que o conjunto dessas mesmas
informaes apresenta uma verdadeira cosmoviso, a qual muitas vezes
(seno quase sempre) capaz de suplantar a realidade enquanto tal,
gerando um simulacro - uma terceira instncia entre o sujeito e
objeto do conhecimento, que favorece a insero de distores frente
realidade apresentada.
Em suma, no seria diretamente o fato objetivo e concreto que
seria apresentado aos cidados atravs das notcias: antes, seria um
ambiente construdo por meio dos recortes realizados pela parte
informante, um pseudo-ambiente, apenas mediatamente correspondente
aos fatos noticiados, o qual acabaria por manifestar,
acidentalmente, mais o posicionamento e os valores de quem noticia
do que a realidade prpria ao fato noticiado. Os tons e coloraes com
os quais se pintam uma cena, enfim, seriam mais a expresso da
identidade do pintor - no da paisagem retratada artisticamente.
Embora tal anlise seja inovadora quando explicita o papel
importantssimo da mdia na formao da opinio pblica, peca-se nesta
pela radicalidade de uma considerao excessivamente relativista,
psicologizante ou subjetivista. No admissvel que o fato enunciado -
mesmo sob matiz ideologicamente expressa - carea sempre de um cerne
de objetividade, ressalvadas as circunstncias nas quais a inteno do
emissor da informao de enganar. Caso contrrio, reinaria tal
arbitrariedade na mdia informativa que nenhuma credibilidade
poderia ser dada aos rgos de difuso de notcias, disseminando um
ambiente que tornaria invivel qualquer confiana nas informaes
circundantes nos meios de comunicao de massa, comprometendo-se a
sociabilidade humana quase ao nvel da experincia direta - situao
esta que tornaria nosso convvio social to invivel, catico e
desinformado que pouco diferiramos dos ajuntamentos de feras
selvagens - onde a nica fonte de coeso estaria em nveis
infra-racionais, ou seja, nos sentimentos e nos instintos.
Portanto, no se pode ignorar que a mdia possui um papel de peso na
formao da massa e da opinio pblica - mas no determina essa pauta de
maneira absoluta. Como afirma McCombs:
"(...) o pblico no um autmato coletivo que passivamente espera
ser programado pela mdia. O padro da cobertura da mdia para alguns
temas ressoa no pblico. Para outros temas, no h ressonncia".
Isso implica uma srie de consequncias - as quais, por sua vez,
demandam novas atitudes - pertinentes ao relacionamento com os
grandes meios de comunicao de massa. Se imagem pblica que da Polcia
construda incessantemente por meio da circulao das informaes merece
ser conhecida, igualmente necessrio desvelar outros fatores
(pertinentes s informaes) usualmente ignorados, que implicam numa
maior ressonncia do que objeto de notcia na opinio pblica com as
determinantes da formao da imagem pblica dos policiais. Esses
outros fatores se revelam ao entendermos ser a opinio pblica um
fruto do ambiente cultural no qual estamos imersos, de uma
cosmoviso cultural prpria ao povo brasileiro, sendo ela mesma (a
opinio pblica) parte dessa superestrutura complexa. Nesse sentido,
ensina Doob:
"Public Opinion (...) is affected by culture because it is a
part of culture. Only the background of public opinion can be
explained by culture. A more complete explanation is possible when
culture is viewed specificaly through socialization, leaders and
events. Public Opinion, moreover, is simply one kind of social
behavior whose over-all relation to culture is no different from
other behavior called criminal, insane, esthetic, religious,
political or economic. Behavior cannot be ripped out of the fabric
of social life and examined in isolation."
Complementando a necessidade de se entender como a cultura
brasileira tem um papel fundamental na formao da viso que a opinio
pblica possui sobre as instituies, entende-se porm que no seria a
finalidade deste trabalho oferecer uma retrospectiva intensiva da
identidade cultural histrica de nosso pas (diferentemente dos
estudos que apresentam oportunas introdues compreenso de nosso pas
sob uma perspectiva cultural, mas retrocedendo aos perodos do
Brasil Colnia, como faz Gomes), modestamente limitando o interesse
analtico deste artigo s manifestaes scio-culturais mais
contemporneas ilustrativas desses componentes construtores do
imaginrio coletivo sobre a Polcia.Mais ainda: o posicionamento
deste artigo claramente divergente de uma perspectiva
anti-sociolgica ou individualista, tal como aquela preconizada por
Childs que afirmar ser a opinio pblica uma ideia sempre referente a
um grupo de opinies individuais e, portanto, tambm defensora do
dever de colecionar opinies de indivduos. Longe disso, entendemos
que h dimenses transcendentes aos nveis meramente pessoais de
opinio, formando exatamente aquela realidade justificada pelo
axioma psico-sociolgico da Escola de Berlim, materializada pela
Psicologia Gestalt: O todo outro que no a mera soma das partes.A
Cultura Brasileira: do Jeitinho Crise da AutoridadeCulturalmente,
porm, como se v a ordem pblica, como se constri a figura do
policial no imaginrio dos cidados brasileiros? Especialmente, como
os seres sociais inseridos na cultura brasileira enxergam a Polcia?
No dia-a-dia, a maioria das pessoas no se apercebe conscientemente
da influncia desta cultura; se o fazem, tal se d muito remotamente;
mesmo assim, ela promove impresses profundas, sentimentos, ideias e
hbitos. E uma das caractersticas marcantes e mais facilmente
observveis de nossa cultura nacional uma constante sensao de
orfandade, um sentimento grupal de que a coisa pblica res publica
est entregue ao abandono, despreocupao das autoridades. Inclusive,
tal caracterstica est consagrada no famoso jeitinho brasileiro,
isto , a capacidade do sujeito de se virar (por meio da
informalidade, do improviso, da esperteza e da ao supletria frente
omisso das autoridades) para suprir as demandas que, teoricamente,
j deveriam estar sanadas por meio da interveno de quem competente
para tal.
Frente incompetncia prtica na prestao de servios essenciais ao
povo, frente aos graves deslizes ticos e as gravosas demonstraes de
improbidade, corrupo e parcialidade, o Estado brasileiro mngua em
credibilidade quando o assunto manuteno e preservao da ordem
pblica. E as foras policiais, sendo as principais responsveis (na
estrutura estatal) pela promoo da segurana e defesa social nas
unidades da federao brasileira contra a desordem e a criminalidade,
recebe do povo a mesma dose de desconfiana, quando no explcito
desprezo. Identificados legalmente como sendo a mais visvel e aguda
das instituies pblicas que exerce sua influncia diretamente na
populao, cobe e restringe direitos em favor do interesse social
(concretizando assim a mxima que preconiza a supremacia do
interesse social e pblico frente ao interesse individual e
privado), a imagem da Polcia sofre os efeitos dessa realidade,
tornando-nos herdeiros da omisso estatal.Lembremo-nos ainda que na
ltima metade do sculo XX, movimentos contestatrios assumiram uma
relevncia muito grande, colocando em xeque as tradicionais
instituies de exerccio de autoridade, atacando desde o ptrio poder
do pai at o exerccio da coero por parte do Estado, alienando-o
gradativamente da capacidade ordinria de promover a ordem e a coeso
social. O questionamento da autoridade termina por atingir nveis
quase patolgicos dentre os idelogos libertrios e esquerdistas mais
extremados, alterando o quadro de percepo e legitimao que antes os
governantes dispunham pelo mero fato de estarem investidos do cargo
governamental. Na viso de Mucchielli, quando se afirma que toda a
autoridade uma ordem externa que se impe (promovendo uma coisificao
dos cidados, transformando o ser humano num objeto), quando se ouve
que toda a autoridade baseada na fora (sendo, por conseguinte,
ilegtima porque heternoma e violadora da liberdade individual),
quando se diz que toda a autoridade impe a gradual dependncia dos
seres, quando se ensina enfim que toda a autoridade s obedecida em
razo de um arbitrrio reflexo condicionado aprendido desde a
infncia, o eco de tal enfraquecimento da figura da autoridade no
imaginrio do homem moderno apresenta-se com toda fora, tornando a
ideia de sensao de segurana advinda de uma autoridade (a saber, a
legtima autoridade policial) algo menos presente, diminudo ou pouco
palpvel e a imagem pblica do policial militar como agente estatal
partcipe dessa omisso, desse abandono.O Paradoxo da Exposio
Miditica e a imagem do PolicialPara alm da crise dos valores e das
figuras de autoridade fenmeno que verdadeiramente j lugar comum nas
crticas sobre a sociedade contempornea outro elemento marcantes se
desenvolve no ambiente das novas relaes tecnolgi-cas de produo da
informao: o paradoxo da exposio miditica.
O paradoxo da exposio miditica traz em seu bojo um problema para
a percepo do brasileiro acerca do que (ou no) normal em relao ao
policial, afetando diretamente nossa percepo sobre a segurana.
Graas a tal paradoxo, a imagem ordinria que as pessoas comuns
cultivam do policial , essencialmente, uma caricatura bem construda
durante dcadas de uma sociedade educada pelos grandes meios de
comunicao em massa, que possuem uma lgica prpria de exposio da
realidade quase incapaz de no distorcer os fatos.Entende-se esse
paradoxo da seguinte maneira: enquanto seres humanos, nossos
sentidos so feitos para captar tanto a semelhana quanto a diferena;
porm, nossa ateno com muito maior facilidade presa graas a uma nota
de diferena. Exemplificando: se vemos 100 pontos pretos
enfileirados e ordenados, no damos muita ateno ou relevncia a cada
um deles, seno uma genrica visualizao, sem foco particular. Porm,
vendo dentre 99 pontos pretos um s ponto vermelho disposto
aleatoriamente, dificilmente uma pessoa poder esquivar-se de focar
a ateno nesse nico ponto diferente, exatamente pelo fato dele ser
diferente.A batalha por nossa ateno rdua; centenas de milhares de
mdias procuram reter para elas nossos olhares, dado isso dar
audincia, tornando-as influentes, dando-lhes poder de barganha por
sobre empresas que almejam tambm desfrutar (mesmo que
acidentalmente) dessa exposio ao cliente em potencial - o
consumidor da sociedade de informao, tornando-se esse ltimo, tambm,
um potencial consumidor de outros produtos a serem propagandeados.
o advento do marketing que no vende apenas um produto: vende a
nossa ateno lateralizada, incidental.
Sabendo da propenso a notar sensorialmente aquilo que diferente,
extico ou escandaloso, os responsveis dos meios de comunicao tendem
seguindo essa estratgia de busca da reteno de nossa ateno, bem como
os benefcios que da podem advir aos referidos meios de comunicao em
massa ao enfoque nos pontos vermelhos, apresentando-os com uma
incomum e insistente constncia nos seus principais espaos de
publicidade, enquanto relegam o fato quotidiano, as atividades
corriqueiras e normais, a um segundo plano desinteressante ou pouco
merecedor dos nossos olhares.Mas, fazendo isso, o critrio de
normalidade no indivduo comum que no poucas vezes confia sua rgua
de anlise e compreenso da realidade s informaes dos grandes veculos
de informao alterado gradativamente conforme a agenda da exposio
miditica, passando a enxergar cada vez mais pontos vermelhos e cada
vez menos os pontos pretos, chegando-se em casos extremos ao nvel
absurdo de presumir que existam na verdade 99 pontos vermelhos e,
na realidade, apenas um s preto. O expectador, aturdido por tantas
referncias distorcidas, termina por inverter aos poucos seu senso
de propores, enxergando a realidade num sentido divergente daquele
que concretamente existe. O anormal torna-se, aos poucos, normal; o
extico se torna comum e habitual; o absurdo se torna corriqueiro; o
escandaloso torna-se, enfim, rotineiro. A mente mediana, que adota
(por meio dos grandes instrumentos de comunicao em massa) tal
criteriologia de anlise da realidade, moldando-se em razo das
prprias limitaes que a competio miditica impe, passa assim a
enxergar os escndalos, os crimes hediondos, as intrigas de homens
corruptos e o achincalhamento geral como sendo a regra do
comportamento humano no a exceo. Como isso no poderia afetar, pelo
menos a mdio e longo prazo, a percepo de segurana que as pessoas
possuem, se so bombardeadas constantemente com notcias
escandalosas, cuja volpia por desgraa no cessa seno quando
dessensibilizar totalmente a capacidade de indignao do cidado
comum, acostumando-o com aquilo que jamais deveria ser
acostumado?
Esse , em poucas palavras, o paradoxo da exposio miditica,
alimentado segundo a lgica mercadolgica da competio. Aplicar tal
paradoxo Polcia muito oportuno, dado que facilitar e complementar o
entendimento da argumentao c desenvolvida.
A facilidade com a qual produz-se uma inverso na percepo da
imagem pblica da Polcia e por conseguinte, na formao de valores
decorrente do paradoxo da exposio miditica pode no ser a nica fora
a limitar a credibilidade e, por conseguinte, a desestruturar a
autoridade moral da instituio Policial Militar, mas sem dvida
encontra a papel crucial. A imagem constantemente apresentada da
autoridade de Polcia como sendo uma entidade ignorante, estpida,
sem moral ou de moral distorcida, excessivamente violenta e
praticante de todo gnero de arbitrariedade legal distoro resultante
da forma de apresentao ordinria dos agentes policiais em diversos
veculos de informao evidencia isso.Desmerecer e desmoralizar o
policial uma norma e no a exceo em diferentes frentes culturais,
especialmente aquelas com determinado alinhamento poltico formal ou
informalmente comprometidos com a estratgia gramsciana para a
tomada do poder (conquista da hegemonia primeiro e, depois, do
poder poltico, como decorrncia lgica). Alis, basta olhar-se
rapidamente para diversas manifestaes representantes dessa tendncia
cultural a fim de notarmos como o policial sobremaneira mal
representado.Em jornais, especialmente considerando as de maior
circulao e vendagem no pas (Super Notcia, Folha do So Paulo, O
Estado de So Paulo, O Globo e Extra, respectivamente), o enfoque
crtico e contrrio construo de uma imagem positiva da Polcia Militar
notvel: uma das instituies prediletas a serem alvo de crticas
negativas por meio de cartoons e charges. Tal tendncia crtica chega
a exceder 90% do contedo das publicaes referentes aos policiais,
que lhes apresentam como sendo animais (sunos e ces so os mais
comuns), corruptos, violentos, ignorantes, imbecis, etc.Em msicas,
especialmente as do gnero rap e funk, h apologias descaradas ao
crime e crticas cruentas Polcia: No confio na Polcia, raa do
caralho dizem os Racionais MC's, na msica Homem na Estrada, que
igualmente reserva aos policiais outros eptetos como filhos da puta
e comedores de carnia. Matar os Polcia a nossa meta fala pra ns
quem o poder(sic) dizia o funk Apologia, do MC DaLeste (que
emplacava adjetivos como verme aos policiais, enquanto noutra msica
com louvores ao PCC intercalados a sons de metralhadoras atirando
diz aguardar autorizao do chefe para colecionar cabea de Polcia; o
PSTU, partido militante de esquerda, afirmou em propaganda poltica
televisionada que nunca se esqueceria da morte desse apologista da
criminalidade, intercalando com essa declarao uma exigncia pelo fim
da Polcia Militar). Marcelo D2, na cano Numa Cidade Muito Longe,
retrata que a populao Na brincadeira sinistra / De Polcia e ladro /
No sabe ao certo quem / Quem heri ou vilo. Mas essas manifestaes no
se resumem a esses gneros musicais: a MPB e o rock nacional tambm
trazem, consigo, exemplares de claro desmerecimento ao dos
policiais e consequente humanizao do criminoso, como a cano Acorda
Amor (Chame o ladro), de Chico Buarque de Holanda, e as msicas
Polcia e Fardado, do grupo Tits, que abusam da cacofonia, insinuaes
e por vezes de expresses ofensivas para criticar a Polcia.
Na cultura dita popular, novamente os militares e os policiais
so muito mais apresentados como indivduos asquerosos (quando no
francamente estpidos, cruis ou maus) do que como cidados de bem,
comuns, cumpridores de seus deveres. Expresso deveras interessante
dessa cultura est notavelmente bem representada em telenovelas e
seriados televisivos, nos quais esses esteretipos negativos se
revelam. Observem-se apenas trs exemplos paradigmticos desses
lugares-comuns nas telenovelas, para fins de ilustrao: a personagem
Sargento Xavier, da novela Morde e Assopra (Rede Globo) um sujeito
moleiro, abobalhado, incapaz de discernir entre uma mulher e um
travesti o Delegado Picasso, da novela Pecado Mortal (Rede Record)
uma autoridade corrupta que tem como hbito perseguir
injustificadamente o mocinho: um professor hippie de esprito
esquerdista e, por fim, o Policial Aranha, da novela Amor e Revoluo
(Rede SBT) um indivduo cruel, torturador, membro de grupos de
extermnio e cuja nica ambio matar os seus opositores polticos. Os
trs so expressos como seres humanos dignos de pena, seja pela
imaturidade idiota ou pueril, seja pela vileza. Os trs mostram-se
como exemplos de conduta a no serem seguidos, so tipos humanos que
no inspiram nenhuma admirao. Os trs, novamente, instigam claramente
o despertar de um sentimento de resistncia e desprezo pela figura
do policial.
J em shows teatrais e performances artsticas, a figura da
autoridade policial rotineiramente apresentada de maneira caricata:
seja o fetiche de policial fardado em uma msica tida como smbolo de
homossexuais (a cano YMCA, do grupo musical Village People,
apresenta o policial como sendo uma figura risvel e hoje, nas
pardica, faz-se questo de atualizar a farda da autoridade
representada para assemelhar-se figura do policial contemporneo);
seja o oficial burro, que no consegue sequer ter o domnio da lngua
portuguesa ou porque facilmente corruptvel por dinheiro, mesmo se
isso comprometa sua integridade fsica (Show Notcias Populares e
Melhores do Mundo Futebol Clube grupo Os Melhores do Mundo). No h,
praticamente, nenhuma apresentao razovel do policial como sendo um
trabalhador mediano, honesto e comum. O efeito acumulado dessa
farsa constantemente repetida avassalador para nossa credibilidade
institucional, prejudicando mais ainda a moral coletiva de nossa
corporao incrementando o descrdito da autoridade policial na mente
de nossas pessoas e fortalecendo uma imagem institucional negativa,
fazendo mesmo os prprios policiais, por vezes, aceitarem essa
carapua moldada inconvenientemente.O Gramscismo e a Glamourizao da
Criminalidade Como se no bastasse essa apresentar o policial de tal
modo distorcido, no se pode deixar de considerar como a construo da
imagem do criminoso, do fora-da-lei ou infrator penal, tambm passou
por transformaes culturais profundas nos ltimos tempos, servindo
como contraponto para a imagem do policial. H um verdadeiro
processo de propaganda ideolgica e cultural, travestida nas mais
diversas formas de difuso possveis: literatura, poesia, teatro,
cinema, rdio, televiso, jornais, apostilas escolares, msicas,
palestras, panfletos, comcios, etc.
Carvalho explica como essa tendncia tem mudado a imagem do
criminoso:
Entre as causas do banditismo (...), h uma que todo o mundo
conhece mas que jamais mencionada, porque se tornou tabu: h
sessenta anos os nossos escritores e artistas produzem uma cultura
de idealizao da malandragem, do vcio e do crime. Como isto poderia
deixar de contribuir, ao menos a longo prazo, para criar uma
atmosfera favorvel propagao do banditismo?
De Capites da Areia at a novela Guerra sem Fim, passando pelas
obras de Amando Fontes, Marques Rebelo, Joo Antnio, Ldo Ivo, pelo
teatro de Nelson Rodrigues e Chico Buarque, pelos filmes de Roberto
Farias, Nelson Pereira dos Santos, Carlos Diegues, Rogrio Sganzerla
e no-sei-mais-quantos, a palavra-de-ordem uma s, repetida em coro
de gerao em gerao: ladres e assassinos so essencialmente bons ou
pelo menos neutros, a Polcia e as classes superiores a que ela
serve so essencialmente ms.
De igual modo, encontra essa anlise eco na explicao do
pesquisador e militar General de Brigada Coutinho sobre o processo
de revoluo cultural gramsciana ao qual nosso pas tm sido submetido
nas ltimas dcadas. Segundo o autor, um dos enfoques dessa estratgia
desmerecer as instituies sociais bem estabelecidas, no intuito de
promover o descrdito e a relativizao delas para com isso fortalecer
os que almejam a utilizao do poder visando objetivos polticos. Para
tanto, usam-se idias-chave: no caso das instituies policiais,
afirmado de que a Polcia sempre ineficiente, truculenta, improba.
Sugerindo-se o fim do militarismo nas instituies policiais,
enfatizando-se a ocorrncia de escndalos, focando em excessos nas
aes repressivas (generalizando-as todas como violncia policial),
insistindo que ela corrupta, envolvida com o crime, pretende-se
atingir a desmoralizao necessria ao referido processo
revolucionrio.
Ao analisar a Literatura Brasileira, a opinio de Carvalho
confirma esse diagnstico, chegando a concluses semelhantes quelas
teorizadas por Coutinho:
No conheo um nico bom livro brasileiro no qual a Polcia tenha
razo, no qual se exaltem as virtudes da classe mdia ordeira e
pacata, no qual ladres e assassinos sejam apresentados como homens
piores do que os outros, sob qualquer aspecto que seja.(...)
Humanizar a imagem do delinqente, deformar, caricaturar at os
limites do grotesco e da animalidade o cidado de classe mdia e
alta, ou mesmo o homem pobre quando religioso e cumpridor dos seus
deveres que neste caso aparece como conformista desprezvel e
virtual traidor da classe , eis o mandamento que uma parcela
significativa dos nossos artistas tem seguido fielmente, e a que um
exrcito de socilogos, psiclogos e cientistas polticos d
discretamente, na retaguarda, um simulacro de respaldo "cientfico".
luz da "tica" da resultante, no existe mal no mundo seno a "moral
conservadora". Que um assalto, um estupro, um homicdio, perto da
maldade satnica que se oculta no corao de um pai de famlia que,
educando seus filhos no respeito lei e ordem, ajuda a manter o
status quo? O banditismo em suma, nessa cultura, ou o reflexo
passivo e inocente de uma sociedade injusta, ou a expresso ativa de
uma revolta popular fundamentalmente justa. Pouco importa que o
homicdio e o assalto sejam atos intencionais, que a manuteno da
ordem injusta no esteja nem de longe nos clculos do pai de famlia e
s resulte como somatria indesejada de milhes de aes e omisses
automatizadas da massa annima. A conexo universalmente admitida
entre inteno e culpa est revogada entre ns por um atavismo marxista
erigido em lei: pelo critrio "tico" da nossa intelectualidade, um
homem menos culpado pelos seus atos pessoais que pelos da classe a
que pertence. Isso falseia toda a escala de valores no julgamento
dos crimes. Quando um habitante da favela comete um crime de morte,
deve ser tratado com clemncia, porque pertence classe dos
inocentes. Quando um diretor de empresa sonega impostos, deve ser
punido com rigor, porque pertence classe culpada. Os mesmos que
pedem cadeia para deputados corruptos fazem campanha pela libertao
do chefe do Comando Vermelho.
Segundo ainda o mesmo autor, essa tendncia no uma mera
trivialidade ocasional, mas o produto deliberado de uma estratgia
de subverso cultural segundo o modelo de Antonio Gramsci, que ataca
diretamente as estruturas que preservam a Ordem Pblica e o Estado,
desmoralizando-as e desmobilizando-as em credibilidade, abrindo-se
espao para a conquista da hegemonia.
Gramsci estabeleceu uma distino, das mais importantes, entre
"poder" (ou, como ele prefere cham-lo, "controle") e "hegemonia". O
poder o domnio sobre o aparelho de Estado, sobre a administrao, o
exrcito e a Polcia. A hegemonia o domnio psicolgico sobre a
multido. A revoluo leninista tomava o poder para estabelecer a
hegemonia. O gramscismo conquista a hegemonia para ser levado ao
poder suavemente, imperceptivelmente. No preciso dizer que o poder,
fundado numa hegemonia prvia, poder absoluto e incontestvel: domina
ao mesmo tempo pela fora bruta e pelo consentimento popular aquela
forma profunda e irrevogvel de consentimento que se assenta na fora
do hbito, principalmente dos automatismos mentais adquiridos que
uma longa repetio torna inconscientes e coloca fora do alcance da
discusso e da crtica.
Na esteira dessa percepo, o ex-oficial de informao (especialista
em subverso social) Yuri Bezmenov afirma que o mesmo gnero de
crticas cidas, contrrias s instituies policiais, parte da estratgia
gramsciana (j aplicada desde muito tempo antes porm sem essa
designao referente ao terico comunista italiano pelo servio secreto
sovitico, a KGB) para a desmoralizao das instituies estabelecidas,
com a finalidade de criar desrespeito e desconsiderao para com a
autoridade. Isso aconteceria independentemente dos resultados
obtidos objetivamente atravs do esforo dos policiais, visando
sempre minimizar os sucessos deles, enquanto se maximizam escndalos
e desvios, capitalizando politicamente cada ao feita,
potencializando o efeito deletrio das intervenes policiais com
crticas exacerbadas violncia, truculncia, ao despreparo das
autoridades; ao mesmo tempo em que tudo isso acontece, so feitas
vistas grossas aos delitos de criminosos convictos, ampliando-lhes
os direitos e garantias, alm de concederem diversos tipos de
consideraes benvolas.
Essa gradativa estratgia tambm incorporada pelos legisladores,
juzes, promotores, ONG's e outros setores da sociedade organizada,
que terminam por favorecer e humanizar criminosos, enquanto
desproporcionalmente as restries, deveres e limitaes so lanados
quase exclusivamente aos agentes da Lei. Inegavelmente, dois pesos
e duas medidas esto sendo aplicados, e a populao brasileira
torna-se assim refm, vitimado por sua prpria simplicidade e
ignorncia perante um projeto deliberado de mudana da cosmoviso
coletiva. A formao da imagem do policial militar e a construo da
sensao de [in]segurana da decorrente acaba sendo ideologicamente
enviesada.
Realidade Cultural e Poltica Relacionada Segurana PblicaComo se
tudo isso no bastasse, nossa realidade histrica deveras mais
semelhante ao oposto da segurana do que com sua condio ideal.
Segundo os dados disponibilizados pela Agncia sobre Drogas e
Crime da ONU, que so congruentes com relatrios federais do
Ministrio da Defesa sobre violncia, mortalidade e criminalidade, os
brasileiros matavam em 2012 em torno de 40 mil pessoas por ano no
trnsito; mas mais ainda morriam em razo de crimes violentos:
segundo recentes pesquisas, mais de 50 mil pessoas morrem, por ano,
em nosso pas, vtimas de homicdios dolosos isso se deliberadamente
ignorarmos outros dados sobre os homicdios no-oficialmente
registrados, o que faria os dados subirem bastante. Levando-se em
considerao que nosso pas possui pouco mais de 203 milhes de
pessoas, a alta taxa de homicdios dolosos nos torna quase 6 vezes
mais violentos do que o segundo pas colocado neste macabro ranking,
a ndia. Seria inteligente, ou mesmo honesto, esperar uma sensao de
segurana mediana ou elevada numa nao aonde h a maior taxa absoluta
de assassinato dolosos por ano? Comparado com o mundo todo? Seria
razovel imaginar que a imagem dos responsveis pela segurana pblica
de um pas com tais ndices lhes fosse favorvel? No a toa, mais de
70% da populao brasileira teme intensamente ser morta por
criminosos.
H ainda a complicada condio de nossa educao pblica. Nossas
escolas pblicas de ensino fundamental e mdio so verdadeiros
fracassos. Nosso sistema escolar age no poucas vezes promovendo
indevidamente uma grande quantidade de analfabetos funcionais para
sries superiores, quando no acaba servindo de incubadora para
criminosos. J as nossas universidades tm tido um desempenho menos
do que medocre, quando comparadas com as 200 melhores universidades
do mundo (dentre as quais no h, lamentavelmente, nenhuma
brasileira). Boa parte de nossa produo acadmica especialmente na
rea de cincias humanas de uma irrelevncia supina, coisa comprovada
pela exgua quantidade de citaes internacionais de nossos
intelectuais e pelos desastrosos dados sobre a situao educacional
de nosso pas: mais de 75% da populao incapaz de ler ou escrever de
modo minimamente satisfatrio, enquanto 50% dos nossos estudantes
universitrios, tambm, infelizmente so analfabetos funcionais. Salvo
raras, isoladas e honorveis excees, os intelectuais brasileiros
ignoram as principais discusses e questes relevantes ao progresso
cultural do pas, transmitindo seu desconhecimento para a massa dos
brasileiros, ensinando-os a preocuparem-se com irrelevncias em
detrimento dos saberes relevantes.
Mais ainda: nossa relao cultural com a Lei problemtica o
legislador no Brasil muitas vezes no algum consciente do modo como
deve gerir, planejar e propor leis nas Assemblias Legislativas. O
legislador nacional usualmente um indivduo com duvidosa capacidade
de intervir positivamente no quadro da alterao legal e alguns
exemplares vistosos dessa nossa inaptido nacional podem ser vistos
no peculiar show de horrores presente a cada dois anos dentre nas
propagandas polticas dos candidatos a cargos eletivos do poder
Legislativo. Nosso ordenamento jurdico muito desestimulante:
excessivas leis, burocracia farta, imobilismo e lentido do Estado
tornam nossa relao com os agentes da lei um penoso, complicado e
pesado fardo aliviado por mecanismos como o j citado jeitinho
brasileiro. Para acrescentar mais dificuldades a esse diagnstico
pouco positivo, temos ainda de conviver com recentes linhas de
interpretao e hermenutica jurdica, tal como a que preza pelo
Direito achado nas ruas e outras vertentes menos importantes, cujo
resultado uma elasticidade interpretativa tamanha que, sem muita
dificuldade, pode-se fazer a letra da lei significar qualquer outra
coisa para alm do seu significado objetivo; com isso, se vai
instalando progressivamente a insegurana jurdica, transformando o
sentimento comum do popular perante a criminalidade em desnimo,
medo e incerteza, promovendo a impunidade. Sente-se que crime
compensa no na exceo, mas na regra, deformando progressivamente a
moralidade pblica, afetando gravemente a construo de uma imagem
positiva do policial militar.
Concluso: vale a pena preocupar-se com a Imagem do Policial
Militar?De posse dessas informaes, poderamos nos questionar se
realmente a opinio de uma populao com tal background [in]cultural
com uma imagem to enviesada, pessimista, caricatural e negativa da
Polcia; com uma educao enfraquecida em todos os nveis, incapaz
libertar seus usufruidores dos inmeros preconceitos histricos
contra a Polcia Militar apta a ser uma fonte credvel de informaes
acerca da realidade securitria nacional. Se um fator de relevncia
(como o a opinio pblica referente ao policial) brota de um to
parcial fundamento, ainda podemos seguramente nos valer desses
dados para melhorar nossos servios, enquanto policiais?
Responde-se a isso positivamente. Apesar de todas as distores
estruturais, culturais, ideolgicas, miditicas e histricas que
enfraquecem o valor dessa opinio, a promoo da sensao e da percepo
de segurana atravs da valorizao da imagem do policial militar na
populao um objetivo a ser atingido pelas nossa instituio, mesmo que
para tanto seja necessrio ainda rever-se tal varivel social de
maneira crtica, com menos imediatismo. Seria oportuno trat-la como
um dado bruto, ainda em depurao, a ser burilado atravs de pesquisas
mais adequadas que harmonizem a misso das instituies policiais com
os legtimos anseios de bem comum da sociedade, minimizando os atos
que representam excees negativas ao mximo. Atravs desse indicador,
as foras policiais possuem condies de avaliar melhor o grau de
confiabilidade concreta existente nos servios prestados, e com isso
pode-se planejar o incremento da sensao de segurana e
tranquilidade, aumentando a probabilidade de encontrarem-se
agremiaes simpticas aos projetos envolvendo a segurana pblica de
nossos estados, dispostas inclusive a auxiliar as Polcias a
atingirem bons resultados.
Promover um trabalho de desmistificao da imagem pblica do
policial importante, especialmente em razo de existirem
incongruncias entre a segurana realmente oferecida pelo trabalho da
Polcia e a sensao subjetiva que a populao tm da segurana pblica
(que proveniente em boa parte da imagem da Polcia que construda).
Essa deve ser uma atividade habitual. Acompanhando a produo
estratgica dos dados, sejam eles os divulgados pela Secretaria de
Segurana Pblica do Estado de So Paulo (SSP-SP), bem como os
produzidos por entidades pblicas de pesquisa (tais como os do
Instituto de Pesquisas Econmicas Aplicadas IPEA), se constata com
facilidade que nas regies com maiores ndices de criminalidade a
sensao de segurana menor; mas, ao mesmo tempo, tal correlao
demonstra-se no ser determinante quando se observa que mesmo em
regies de baixo ndice de criminalidade, a diferena na sensao de
segurana e da imagem da Polcia pequena o que aponta para outros
fatores determinantes. E esses outros fatores relevantes so,
fundamentalmente, tal como apresentamos no presente artigo, a
idiossincrasia cultural, miditica e ideolgica dos cidados
brasileiros perante a Polcia, em grande parte educada segundo uma
cartilha miditica escandalosa ou ideologicamente comprometida na
apresentao de uma imagem distorcida da Polcia Militar.Procurar
primeiro obter resultados em matria de promoo objetiva da segurana
pblica, sem dvida, mais importante do que dar ouvidos aos reclames
da opinio que diz ser a Polcia pouco confivel, truculenta, abusiva
de sua autoridade. Mas o segundo dever imediatamente posterior, aps
a reduo de indicadores criminais, indubitavelmente obter a confiana
da populao, fazendo-os sentirem-se amparados por uma fora policial
presente, atenta, amiga do cidado de bem e aliada deles contra toda
sorte de irregularidades e da criminalidade. At porque com um
reconhecimento positivo por parte da populao relativamente s
instituies Policial-Militares, pode-se traar uma estratgia conjunta
muito mais oportuna na soluo das dificuldades e desafios que as
nossas instituies de segurana e ordem pblica tm quanto conquista de
resultados na diminuio de ndices criminais, de ilegalidades, da
perturbao da ordem afinal.
Desenvolver e incentivar uma cultura que valorize a segurana
pblica, que mostre o policial sem exageros, sem farsas nem
floreios, dando azo a um olhar mais realista, favorecer a gerao de
uma percepo de segurana bem mais conforme os fatos, auxiliando
assim a Polcia Militar no cumprimento de sua funo legal, calcada na
Constituio: tal deve ser o enfoque estratgico dos que constroem
todos os dias a imagem do policial militar com seus atos e decises.
Com isso, a imagem institucional tender a aproximar-se no de uma
construo inapropriadamente caricatural, mas da realidade mesma da
corporao: uma sociedade clere, comprometida com os cidados,
composta de homens e mulheres consagrados ao exerccio do poder de
Polcia com a responsabilidade de manter, preservar e salvaguardar
os direitos humanos, a tranquilidade, a salubridade e a ordem
pblica de nosso Estado, na maior fidelidade Lei, Ordem e
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