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Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1), Campinas, Jan./Jun.
2014
A ALOMORFIA DOS NOMES AGENTIVOSTERMINADOS EM -DOR/-OR EM
PORTUGUS
Magnun RoChel MadRuga1Iel/unICaMP
RESUMO: Este trabalho discute a mltipla alomorfia presente na
formao de nomes agentivos em portugus com terminaes em dor, or,
tor, sor, zor. A alomorfia dos agentivos uma questo aberta na
literatura e os trabalhos desenvolvidos preocuparam-se,
prioritariamente, com as questes semnticas e aspectuais. Para
tratar da alomorfia em especfico, elaborou-se um experimento em que
15 participantes tinham que gerar um novo agentivo a partir de
logatomas verbais em suas formas infinitivas e de particpio
apresentados em uma sentena. Os resultados sugerem que a formao de
nomes agentivos tem como base uma raiz e o tema verbal. Quando -dor
concatenado ao tema verbal o alomorfe dor superficializado; quando
-dor adjungido raiz, este, em funo do Princpio do Contorno
Obrigatrio, superficializa-se como -or. luz da Morfologia
Distribuda, prope-se que os sufixos alomorfes desse tipo de
agentivos em portugus sejam apenas -dor e -or. Palavras-Chaves:
Alomorfia; Agentivos; Morfologia Distribuda.
ABSTRACT: This paper discusses multiple allomorphy in agentive
nouns, which appears in words ending in dor, or, tor, sor, zor in
Portuguese. This allomorphy is an open question in the literature
and previous studies have only addressed aspectual and semantic
issues. In order to discuss the allomorphy, 15 participants were
tested in an experiment. They were supposed to generate a new
agentive from verbal nonwords in their infinitive and participle
forms presented in a sentence. The results suggest that the
formation of agentive nouns is based on a root and on a verbal
stem. When -dor is merged to the verbal stem, the alomorph -dor
goes to the surface; when -dor is adjoined to the root, it goes to
the surface after applying the Obligatory Contour Principle, which
generates or on the surface form. Based on the Distributed
Morphology approach, we propose that the allomorphs of such
agentive suffixes in Portuguese are just -dor and -or.Keywords:
allomorphy, agentives; Distributed Morphology.
INTRODUO
Neste trabalho, procuro discutir a mltipla alomorfia presente na
formao de nomes agentivos em Portugus, terminados em dor, or, tor,
sor e zor. Com esses sufixos derivacionais, formam-se substantivos
como treinador, cantor e transmissor e adjetivos como salvador e
enlouquecedor, por exemplo. h uma discusso na literatura quanto ao
status dos alomorfes e, em geral, considera-se
1 Doutorando em Lingustica da Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP).
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Madruga a formao de nomes agentivos em -Dor/-Or em portugus
-dor o morfema agentivo (OLIVEIRA, 2007, 2009; SAID ALI, 2001).
No h, ainda, nenhum trabalho sobre o portugus que se preocupe em
discutir a mltipla alomorfia desses sufixos, a fim de entender como
funcionam as formaes de nomes de agente no estgio atual da
lngua.
Entre as principais referncias sobre a formao de agentivos em
dor, tor, sor, zor e or esto os trabalhos de Oliveira (2007, 2009).
O objetivo dos dois trabalhos da autora, entretanto, compreender a
derivao desses nomes do ponto de vista sinttico-semntico e,
portanto, no se discute o status da mltipla alomorfia. Segundo a
autora, as formaes de nomes agentivos com -dor expressam os agentes
dos verbos internos s formaes e denotam eventualidades de nomeao ou
designao. Esse sufixo nominal tem origem nas formas do particpio
latino -(t)or, -(t)ris/-(s)or, -(s)ris, que, segundo Cunha(1986),
adjunge-se apenas a temas verbais, resultando em nomes agentivos,
nomes de instrumentos da ao designada pela base, bem como adjetivos
agentivos.
Segundo Said Ali (2001), os itens terminados em -or, de origem
verbal, introduziram-se na lngua portuguesa por via erudita, tendo
sido recebidos diretamente do latim, como nas palavras ator, autor,
leitor, eleitor, agressor, compositor, professor etc. Para esse
autor, o verdadeiro sufixo -or, pois as consoantes /d/, /t/ e /s/
presentes nas formas dos sufixos nominais pertencem originalmente
ao particpio passado latino. Oliveira (2009) no discute o status
dos alomorfes -tor/-sor/-or e, conforme Said Ali (2001), assume que
esses itens passaram diretamente do latim para o portugus sem
sofrer alteraes histricas pelas quais passaram as razes desses
verbos (OLIVEIRA, 2009, p. 194).
difcil, porm, apenas a partir dos acontecimentos histricos
contingentes lngua determinar as formas por ela escolhidas para
figurarem como seus morfemas. Para evitar esse caminho,
consequentemente, preciso que se faa uma anlise sincrnica a fim de
vislumbrar os tipos de relaes que esse sufixo estabelece em termos
de estrutura lingustica, bem como verificar a produtividade de uma
forma ou outra em um determinado estado da lngua. Em funo disso, no
presente estudo, fao uma discusso acerca do processo de alomorfia
desse sufixo, procurando estabelecer generalizaes para a formao de
palavras agentivas desse tipo no portugus.
A questo geral que norteia este trabalho refere-se compreenso do
status das consoantes /t, d, s, z/ e sua relao com a mltipla
alomorfia dos agentivos. Assim, estabelece-se como objetivo
verificar se essas consoantes fazem parte do sufixo, da raiz ou se
podem ser concebidas como consoantes epentticas na derivao. Com
isso, teremos condies de discutir no s a alomofia, mas tambm o
processo derivacional de uma forma geral. O trabalho ser
desenvolvido com vistas a responder s seguintes questes: a) a
formao de agentivos em -dor, -tor, -sor, -zor e -or se d a partir
de qual base?; b) qual a relao que eles estabelecem com a base?; c)
como a Morfologia Distribuda pode lidar com a alomorfia dos
agentivos em Portugus? A hiptese a ser testada na presente pesquisa
de que a mltipla alomorfia do morfema sufixal apenas aparente. A
alomorfia, seguindo esta hiptese, ocorreria somente entre -dor e
-or; e as consoantes /t/ e /s/ de -tor e -sor fariam parte da raiz
e no do sufixo. Nesse sentido, a formao de nomes de agentes
relacionar-se-ia, tambm, a um processo alomrfico de raiz.
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Cadernos de Estudos LingstiCos (56.1) Jan./Jun. 2014Para testar
essa hipstese, elaborou-se um experimento cuja tarefa dos
participantes era gerar um nome agentivo em dor, tor, sor, zor,
or a partir de dois estmulos verbais infinitivo e particpio dados
em uma sentena. Os resultados parecem sugerir que o alomorfe
produtivo em portugus seja, de fato, -dor. Com esses achados,
tem-se condies de sugerir uma nova proposta para o problema dessa
mltipla alomorfia no estgio atual da lngua portuguesa.
1. A MLTIPLA ALOMORFIA DOS AGENTIVOS NO PORTUGUS
No caso dos agentivos do Portugus, a alomorfia sufixal acontece
seguindo um paradigma que tem como base o tema verbal. Entretanto,
em alguns casos, a base do agentivo parece ser o particpio passado
irregular e, em outros, apresenta uma base incerta de derivao.
Tabela 2: Verbos e Particpio Passado com respectivos agentivos
do Portugus
Infinitivo Particpio Agentivo
treinar treinado treinador
contar contado contador
vender vendido vendedor
benzer benzido/bento benzedor
torcer torcido torcedorpolir polido polidor
instituir institudo instituidor
Os casos apresentados na Tabela 2 evidenciam que o sufixo
agentivo -dor tem como base o tema verbal. Tal aspecto pode ser
constatado a partir do que acontece com verbos benzer (regular),
torcer e vender, casos em que a forma derivada agentiva apresentou
a mesma forma da vogal temtica de segunda conjugao. Caso as formas
fossem derivadas do particpio passado, esperar-se-ia encontrar
formas como *benzidor, *torcidor, *vendidor para os casos com
morfema -dor.
Para os outros casos das terminaes em tor, sor, zor, or, as
relaes entre as terminaes e a base no so regulares, podendo estar
ligadas raiz, ao partcipio e at mesmo a uma base incerta. Vejamos o
paradigma a seguir:
Tabela 3: Verbos e Particpio Passado com respectivos agentivos e
base
Infinitivo Particpio Agentivo Base
pintar pintado pintor raiz
cantar cantado cantor raiz
confessar confessado confessor raiz
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Madruga a formao de nomes agentivos em -Dor/-Or em portugus
eleger elegido/eleito eleitor particpio irregular
suspender suspendido/suspenso suspensor particpio irregular
deter detido detentor incerta
proteger protegido protetor incerta
compor composto compositor incerta
opor oposto opositor incerta
transmitir transmitido transmissor incerta
Na Tabela 3, podemos ver que os agentivos formados pelos
alomorfes -tor, -sor e -or apresentam diferentes bases. importante
notar que em nenhum desses casos a base o tema verbal, tal como
acontece com -dor. Ao contrrio, os exemplos apresentam como base a
raiz, o particpio irregular e h ainda casos em que no possvel
determin-la. Todas essas formas possivelmente foram herdadas do
supino latino, cuja terminao era -tum e -sum, que naquela lngua
tinham estrutura idntica a dos nomes de ao (SAID ALI, 2001;
OLIVEIRA, 2009).
Tal fato nos permite perseguir a hiptese de o portugus ter
herdado essas formas do latim tal como esto dadas sincronicamente,
fazendo, entretanto, uma reanlise da base formadora de nomes de
agentivo do grupo -tor, -sor e -or. Se assim for, teramos dois
grupos bsicos nesse tipo de derivao: o primeiro cuja base o tema
verbal, e o segundo tendo como base uma raiz. Esse segundo grupo,
mais especfico, seria formado por formas especiais da lngua, no
sendo esse tipo de processo derivacional produtivo no estado atual
do sistema, o que no obsta, porm, de terem essas formas altas
frequncias de uso.
Antes de testarmos essa hiptese, convm apresentarmos a anlise de
Oliveira (2007) para a formao de agentivos com o sufixo -dor, -tor,
-sor, -zor, -or a fim de entendermos a necessidade de avanos nos
estudos sobre esse tipo de formao de palavras no portugus.
2. AGENTIVOS NO PORTUGUS: A ANLISE DE OLIVEIRA (2007, 2009)
Para Oliveira (2007, 2009), as formaes agentivas em dor, -tor,
-sor carregam um contedo durativo e possuem restries
semntico-aspectuais impostas pelas razes e pelo morfema nominal. As
razes verbais s quais o sufixo se adjunge referem-se a
aes-processos e denotam imperfectividade, o que, segundo a autora,
seria a razo de essas selecionarem o morfema [+agentivo/causativo]
com aspecto durativo. Nas formaes derivadas interagem, portanto, as
propriedades semntico-aspectuais da forma verbal e do morfema
derivacional (OLIVEIRA, 2007, p.11). O diagrama arbreo apresentado
pela autora demonstra tais propriedades desse tipo de derivao.
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Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014
Nos termos da autora, a derivao ocorre da seguinte maneira:
1) a raiz VEND- entra na derivao e concatenada ao morfema -ER,
inserido no ncleo funcional verbalizador v, formando vender, que
tem o trao aspectual [+ao-processo]; 2) o morfema -DOR, inserido no
ncleo funcional Asp, carrega o trao [+agentivo/causativo] e
semanticamente compatvel com o trao semntico [+ao/processo] da
raiz; 3) a raiz vender concatena-se ao morfema -dor, que preenche a
exigncia semntica de agentividade; 4) na parte fonolgica da
derivao, o ncleo funcional nominalizador n atrai a forma [vender +
-dor], que se move para incorporar-se a n, formando vendedor, que
tem o trao semntico [+agentivo] (OLIVEIRA, 2007, p. 7).
Em termos sintticos, conforme o estudo de Oliveira (2007), as
estruturas derivadas tm signifi cados predizveis a partir dos
signifi cados de suas partes, ou seja, denotam neste caso durao da
agentividade. Ainda, para ela, a variedade de categorias lexicais
revela que a [raiz + morfema verbalizador + -dor/-tor/-sor]
acategorial, j que aceita morfemas formadores de nomes (n) e de
adjetivos (a). Nesse sentido, a morfologia derivacional seria
sinttica e no lexical, embora deva desobedecer s restries semnticas
impostas pelas razes e pelos morfemas.
A anlise de Oliveira (2007) extremamente interessante para que
se incorpore a informao semntico-aspectual na derivao. No entanto,
a autora apega-se somente a esse aspecto para desenvolver sua
anlise. Outro ponto a ser levantado o fato de a autora no
considerar a alomorfi a sufi xal e afi rmar que a derivao na formao
de agentivos se d com a frmula [raiz + morfema verbalizador +
-dor/-tor/-sor]. Embora no seja esse o objetivo de sua pesquisa,
tal questionamento necessrio, visto que as formas-base envolvidas
em palavras com -tor/-sor (a autora no considera -or como uma outra
forma possvel) so totalmente distintas das formas com -dor.
ntido que as palavras terminadas em tor/-sor, e aqui inclumos
-or, tm diferentes bases de derivao e, nesses casos, no tm como
base o tema verbal. Se assim de fato for, no possvel fazer a
generalizao sugerida por Oliveira (2007); ao contrrio, necessrio
rediscutir esse tipo de formao no portugus. Antes disso, porm,
considero importante analisar como se d esse
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MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
tipo de derivao em uma outra lngua latina, o italiano, a fim de
investigar se a derivao desse tipo agentivo apresenta a mesma
regularidade que o portugus. Para isso, apresento na seo seguinte o
trabalho de Tucker (2000), cuja escolha para discusso aqui, dentre
os vrios que tratam o tema, deu-se pela metodologia experimental
empregada pela autora, a qual, embora diferente da que emprego
neste estudo, melhor se relaciona com a anlise que fao. Alm disso,
o trabalho da autora, por tratar de uma lngua da mesma famlia do
portugus, que envolve, aparentemente, as mesmas questes na formao
de agentivos, torna os resultados comparveis e permite se discutir
um aspecto que, possivelmente, uma caracterstica das lnguas
latinas, nesse caso em especfico, de formao de palavras.
3. FORMAO DE AGENTIVOS NO ITALIANO
Tal como acontece no portugus, a formao de nomes de agente no
italiano apresenta tambm uma face regular e previsvel e outra
irregular e imprevisvel. A tradio dos estudos sobre o italiano
considera que esse tipo de formao de palavras resultado da adjuno
do sufixo agentivo -ore raiz do particpio do verbo sem a marca
final de gnero -o. Para a maioria dos verbos em italiano, o
particpio passado fonologicamente previsvel, bem como a formao de
agentivos, que segue o seguinte paradigma.
Tabela 4: Verbos e Particpio Passado com respectivos agentivos e
base no italiano
Infinitivo Particpio Agentivo
lavorare lavorato lavoratore trabalhar
acquisire acquisito acquisitore adquirir Fonte: Tucker (2000, p.
7)
No entanto, alguns dos agentivos so construdos a partir do
particpio, como acontece nos exemplos a seguir:
difundir invadirdiffuso > diffusore invaso > invasore PART
AGENT PARTAGENT
Ainda conforme a autora, outros agentivos parecem aproveitar o
contedo fonolgico do infinitivo, como se v abaixo:
fundir suspender fondere > fonditore sospendere >
sospenditore INF AGENT INF AGENT
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Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014Vrios
estudos tentaram dar conta da formao de agentivos no italiano,
entre eles, destacam-se Dressler e Thornton (1991), Vogel
(1993), Burzio (1998) e Tucker (2000). A maioria afirma serem -ore
e -tore os morfemas agentivos. Enquanto -ore adjunge-se ao
particpio, o sufixo -tore concatena-se raiz do infinitivo. Vogel
(1993) e Burzio (1998) afirmam que a base do agentivo pode ser
tanto a raiz do particpio quanto a do infinitivo, enquanto Dressler
e Thornton (1991) afirmam ser apenas raiz do infinitivo sem a vogal
temtica a fonte para a formao do infinitivo. O estudo de Tucker
(2000) difere significativamente dos outros por seus achados e
metodologia experimental, e em funo disso ser mais bem
detalhado.
O trabalho de Tucker (2000) tem como objetivo determinar a
correta base da derivao de nomes de agente, cujo processo no
italiano envolve mltiplos alomorfes. Para isso, a autora realizou
um estudo experimental que contou com dois testes, um de produo dos
agentivos e outro de aceitabilidade. A tarefa do primeiro teste
feito por Tucker consistiu na produo de nomes de agente a partir de
verbos com particpio irregular. A lista contendo 107 verbos no
infinitivo foi apresentada aos sujeitos; 78 deles eram verbos com
particpio irregular e sem agentivos correspondentes; 29 verbos de
primeira e terceira conjugao com particpio regular e agentivos
totalmente predizveis. Aos participantes, foi pedido que
produzissem, para cada infinitivo, a forma agentiva terminada em
-ore. Os resultados desse primeiro experimento evidenciaram que a
base preferida advm do infinitivo, o qual representou por 62,7% das
produes dos participantes. Nomes de agente formados como base no
particpio resultaram em apenas 19,6% e, ainda, nos casos em que os
falantes produziram agentivos a partir do particpio, 11,7% foram
baseados em um agentivo pr-existente, j tambm derivado do particpio
e que com ele partilhava certa similaridade fonolgica. Dos 6%
restantes, 3,4% corresponderam a formas no derivadas nem do
infinitivo nem particpio e 2,6% foram dados ilegveis ou agentivos
no terminados em -ore.
No segundo experimento, os participantes julgaram a boa formao
dos nomes agentivos. Foi feito, ento, um teste de aceitabilidade em
que os verbos no infinitivo foram apresentados aos sujeitos
seguidos de duas ou mais formas agentivas admissveis no italiano. A
partir disso, eles julgaram a sua boa formao em uma escala de 1 a
7, sendo que o valor 1 indicava que a forma era completamente
inaceitvel e 7 completamente aceitvel, ou seja, uma total m-formao
ou total boa formao. Nesse teste, foram usados 87 verbos no
infinitivo, todos com particpio irregular, porm, 61 deles sem
agentivos atestados e 26 com agentivos j existentes. No julgamento
da aceitabilidade, os agentivos com scores mais altos foram aqueles
derivados do infinitivo. Esses obtiveram uma mdia de 4,87 na
escala, enquanto os derivados do particpio apresentaram mdia de
2,89. Os agentivos que tambm obtiveram melhor avaliao na
aceitabilidade foram aqueles que no possuam ambiguidade com a base,
ou seja, os que possuam similaridade com apenas uma forma, ou
infinitivo ou o particpio.
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MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
Os resultados obtidos pela autora indicaram que a base principal
para formao dos agentivos terminados em -ore no italiano o tema
verbal. Segundo ela, o tema verbal a correta base para a derivao
desse tipo de agentivo e o uso aparente de outras bases feito de
forma analgica, seja para agentivos gerados a partir de verbos com
os quais partilham certa similaridade fonolgica seja para formas
derivadas lexicalizadas que possuem bases no-infinitivas.
Com base nos achados de Tucker (2000), desenvolveu-se uma
metodologia experimental semelhante neste trabalho a fim de
compararmos, posteriormente, os resultados do portugus e do
italiano. Na seo seguinte, discorro sobre o mtodo.
4. MTODO
4.1. Experimento
Utilizamos no experimento 48 logatomas, todos trisslabos, que
seguiram a estrutura da formao verbal e foram, portanto, divididos
quanto sua conjugao. Para cada paradigma de conjugao foram criados
8 verbos, os quais foram divididos em dois grandes grupos (Grupos I
e II). No Grupo I, figuram os novos verbos e seus respectivos
particpios regulares, enquanto o Grupo II formado pelos novos
verbos e seus particpios irregulares. Essa diviso resultou em 48 (8
x 3 x 2 = 48) estmulos para cada grupo. Ao total, o experimento
contou com 96 estmulos (8 novos verbos x 3 conjugaes x 2 grupos x 2
particpios). Embora tenha-se trabalhado com um grupo controle para
que os participantes no captassem o objetivo do exeperimento,
faltou ainda um outro grupo de distratores, de modo a diminuir
qualquer possibilidade de generalizao desse tipo. Esse um problema
metodolgico que poder ser resolvido apenas em um trabalho
prximo.
Os logatomas verbais criados para o experimento foram todos
trisslabos e seguiram a estrutura /CVC.CV.C+[ar, er, ir]/ . A
primeira slaba foi fixada em CVC para que evitssemos uma densa
vizinhana lexical (NEWMAN et al, 1997; TALER et al, 2010). Assim,
evita-se que o participante faa associaes entre um verbo real da
lngua, como poderia acontecer, por exemplo, com o verbo carregar e
seu agentivo carregador; se por ventura, o estmulo fosse carremar,
o falante poderia, por associao lgica, gerar carremador.
Considerando que estrutura /CV.CV.CV/ altamente frequente em
portugus, poderamos obter resultados enviesados pela associao do
logatoma com uma verdadeira palavra da lngua.
Na seleo dos estmulos, controlou-se a consoante final da raiz.
Assim, dos oito verbos de cada conjugao, quatro sempre apresentavam
as consoantes /t, d, s, z/ no final da raiz. Os outros quatro
falsos verbos tiveram a funo de grupo controle. A incorporao dessa
varivel pareceu interessante porque, conforme constatamos no
portugus, muitos dos agentivos terminados em tor, sor e or esto
adjungidos a uma raiz cuja consoante da borda direita sempre uma
coronal, como nos exemplos (a), (b) e (c):
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Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014(a) (b)
(c)can[t]- > cantor transmi[t]- > transmi[s]or revi[z]- >
revizor RAIZ AGENT RAIZ AGENT RAIZ AGENT Sendo assim, a presena
dessa varivel foi pertinente para que investigssemos
o papel da consoante final da raiz. Os estmulos foram
apresentados aos participantes em sentenas como as que seguem:
(a) O ato de atirar almofadas para cima chamado de genfetar. Joo
Mrcio tem genfetado todos os dias quando chega em casa. Poderamos
dizer que ele um [resposta do participante].
(b) Paulo, de trs anos, tem genfetado todo dia quando chega em
sua creche. Ele gosta de genfetar porque acha divertido. Ele um
timo [resposta do participante]. O experimento baseia-se, portanto,
no processo de generalizao implicacional,
que se caracteriza pela induo de uma regra geral a partir de uma
implicao lgica entre dois conjuntos (HAMILTON, 1994;
IDESTAM-ALMQUIST, 1995). Com esse tipo de experimento, temos
condies de investigar qual base utilizada para a formao dos
agentivos, o infinitivo, particpio ou a raiz.
No experimento, como os participantes tinham acesso s duas
formas verbais, foi preciso controlar a ordem2 de apario do
infinitivo e do particpio. Desse modo, para cada grupo, em 48
sentenas, a ordem de apario dos logatomas foi Infinitivo-Particpio
e nas outras 48 a ordem foi Particpio-Infinitivo . Os estmulos
foram aleatorizados na elaborao do experimento, mas no puderam ser
aleatorizados por participante, dadas as condies da plataforma
experimental utilizada.
4.2. Materiais
O experimento foi elaborado na plataforma Online Pesquisa3 e foi
disponibilizado, via internet, para os participantes. A elaborao do
experimento seguiu o padro utilizado por Nevins e Rodrigues
(2012).
4.3. Participantes
Completaram esse experimento 15 sujeitos4, sendo 9 do sexo
masculino e 6 do sexo feminino. Quanto escolaridade, 3
participantes reportaram possuir
2 A importncia de se considerar a ordem dos novos verbos e
particpios na sentena crucial para se investigar um possvel efeito
de priming. o conceito de priming refere-se ativao de partes de
representaes particulares ou de associaes na memria antes de se
desempenhar uma ao ou tarefa (BUSNELLO, 2007). Priming pode ser
considerado um efeito em que se observa a influncia de um evento
anterior (prime) sobre o desempenho em uma situao posterior (alvo)
(BLANK, 2013).
3 O endereo eletrnico do site https://www.onlinepesquisa.com/4
No total, 75 sujeitos participaram da pesquisa, porm, como nem
todos os participantes
completaram o experimento, decidi utilizar somente os dados
daqueles que o finalizaram.
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MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
o ensino mdio completo, 4 possuam ensino superior incompleto, 6
tinham superior completo e 2 deles cursavam ps-graduao. O nico
critrio de excluso considerado foi o participante ser estudante de
cursos na rea da Linguagem, como Letras ou Lingustica.
4.4. Anlise Estatstica
A anlise estatstica dos dados foi realizada atravs do software
R, verso 3.0.2 (R CORE TEAM, 2013). Para todas as interaes entre as
variveis, os dados foram analisados com um teste de Qui-Quadrado,
corrigido, quando necessrio, pela correo de continuidade de Yates e
pelo Teste Exato de Fisher. Alm disso, adicionou-se uma medida de
tamanho de efeito para que pudssemos verificar a fora de associao
entre as variveis. A medida utilizada o V de Cramer, que se
expressa em uma escala de 0 a 1. Para que a associao seja
considerada aceitvel, o valor de V deve ser igual ou maior a 0,20.
Em casos de tabelas de contigncia 2x2, o V de Cramer equivale ao
Coeficiente Phi, que varia entre -1 e 1; neste caso, valores entre
-0,3 e +0,3 so consideradas associaes muito fracas ou
inexistentes.
5. DESCRIO E ANLISE DOS RESULTADOS
Com o experimento suprarreportado, objetivo investigar o modo
como os falantes de portugus constroem os nomes agentivos
terminados com o morfema -dor/-tor/-sor/-zor/-or. Ao melhor
entendermos o funcionamento da formao do agentivo, teremos condies
de entender como esses alomorfes se relacionam com a base a que se
adjugem.
A fim de analisarmos esse processo derivativo, consideramos os
seguintes fatores apresentados de (a) a (g). Os parentses
referem-se s siglas utilizadas nos grficos.
a) base do agentivo: raiz (R), infinitivo (I) ou particpio
(P);
b) ordem dos logatomas verbais: Particpio (P) Infinitivo (I) ou
Infinitivo (I) Particpio (P);
c) terminao da raiz: coronal (C) ou outra (O);
d) conjugao verbal: primeira (1), segunda (2) ou terceira (3)
conjugaes;
e) tipo de particpio: particpio irregular (I) ou regular
(R);
f) escolaridade: ensino mdio (EM), superior incompleto (SI),
superior completo (SC) ou ps-graduao (PG); e
g) gnero: masculino (M) ou feminino (F).
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Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014Tabela 5:
Frequncia Relativa das Respostas dos Participantes
Na Tabela 5, apresentam-se as frequncias relativas das respostas
dos participantes. As clulas com trao significam que no houve
nenhuma ocorrncia para aquela combinao. As categorias Outro Morfema
e Outra Classe foram inseridas porque, em alguns casos, os
participantes utilizaram um outro morfema agentivo ou mesmo outro
morfema no lugar de derivaes em -dor e -or. A categoria Outra
Classe foi utilizada para etiquetar as formas em que o participante
utilizou uma outra categoria nominal, como um adjetivo no agentivo,
por exemplo. Ao total, foram 898 respostas, porm, para a anlise
estatstica, foram utilizados 438 dados. Essa diminuio se d pelo
fato de que a combinao de alguns nveis no obteve nenhuma ocorrncia
e, tambm, porque foram eliminadas da anlise as ocorrncias dos nveis
Outra Classee Outro Morfema.
No que se refere associao com a base5, a forma de base escolhida
majoritariamente o infinitivo6, quando o morfema -dor; enquanto o
alomorfe -or adjunge-se preferencialmente a uma raiz. O teste de
Qui-Quadrado reportou uma associao significativa entre o agentivo e
o tipo de base a que ele se adjunge (2= 235,25, gl = 1, p <
0,001, = 0,74, N=438). No grfico mosaico, podemos perceber a
distribuio dos agentivos em funco da base.
Inf Incerta NSA Part Raiz Cor Outra 1 2 3DOR 0,56 0,07 0,01 0,05
0,02 0,34 0,38 0,3 0,21 0,2OutraClasse - - 0,13 - - 0,06 0,07 0,03
0,05 0,05OutroMorfema - - 0,1 - - 0,06 0,04 0,04 0,04 0,03OR 0,01 -
- - 0,4 0,04 0,01 0,01 0,02 0,03EM PG SC SI F M Irreg Reg I-P
P-IDOR 0,11 0,12 0,28 0,21 0,2 0,51 0,32 0,39 0,4 0,31OutraClasse
0,02 - 0,1 0,01 0,07 0,07 0,06 0,07 0,07 0,06OutroMorfema 0,03 0,01
0,04 0,03 0,04 0,06 0,04 0,06 0,06 0,05OR 0,01 - 0,02 0,02 0,01
0,04 0,04 0,02 0,02 0,03N = 898
TerminaoBase Conjugao
Escolaridade Genero TipoDeParticpio Ordem
5 Como todas as formas com -tor e -sor -zor, em nossos dados,
sempre ocorreram adjungidos raiz com terminao coronal /t, d, s, z/
decidiu-se reportar apenas como -or cujo status ser discutido
adiante.
6O particpio foi excludo da anlise, pois no houve ocorrncias com
-or.
-
76
MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
Figura 1: grfi cos mosaicos para frequncia absoluta dos morfemas
agentivosem funo da Base (painel direito) e da Terminaao da Raiz
(painel esquerdo).
Como podemos verifi car na Tabela 5 e tambm no grfi co mosaico
acima, o morfema -dor empregado com qualquer tipo de consoante na
borda direita da raiz. O mesmo, entretanto, no acontece para -or,
que preferencialmente se anexa a uma raiz coronal. Como possvel
depreender do painel direito da Figura 1, as terminaes -or
associaram-se de forma expressiva s razes, enquanto as formaes -dor
preservaram as vogais temticas. Essa relao da terminao da raiz com
os morfemas agentivos foi signifi cativa (2= 17,91, gl = 1, p <
0,001, = -0,21, N=438).
A conjugao dos novos verbos tambm foi uma varivel signifi cativa
(2= 24,41, gl = 2, p < 0,001, V=0,24, N=438) na formao dos nomes
agentivos. Os agentivos em -dor, embora distribudos quase
simetricamente nas trs conjugaes, apresentando uma pequena tendncia
primeira conjugao. O contrrio acontece com -or, cuja associao
preferencialmente as da segunda e terceira conjugaes.
Figura 2: grfi cos mosaicos para frequncia absoluta dos morfemas
agentivos emfuno da Conjugao (painel direito) e do Tipo de
Particpio (painel esquerdo).
-
77
Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014A varivel
tipo de particpio tambm se mostrou signifi cativa (2= 6,67, gl=
1, , = -0,13, p = 0,009). Os substantivos agentivos terminados
em -dor, como se pode inferir do grfi co, tm uma distribuio quase
simtrica para as sentenas do experimento com particpios regulares e
irregulares. Isso signifi ca, portanto, que, para as derivaes em
-dor, a existncia de um particpio regular ou irregular no
relevante, o que confi rma a constatao anterior sobre a relao entre
o morfema agentivo e a sua base. O alomorfe -or, entretanto, foi
sensvel ao particpio nos estmulos, e adjungiu-se raiz quando a
sentena do experimento apresentou um particpio irregular. Esse dado
refl ete o comportamento real da lngua, como se pode verifi car na
Tabela 3, em que os agentivos em -tor e -sor tm como base um
particpio irregular. A diferena aqui que a base no um partcipio
irregular, mas a existncia de um particpio irregular na sentena, o
que nos permite verifi car que a experincia do falante com lngua um
fator de extrema relevncia. Isso ainda corroborado, quando se testa
a varivel escolaridade, visto que -or aparece majoritariamente nas
respostas dos participantes com nvel superior completo e
incompleto.
A varivel escolaridade mostrou-se signifi cativa ( 2= 11.79, df
= 3, p = 0,008, V=0,16, N=438). A partir disso, ento, podemos
verifi car que -dor distribui-se consideravelmente entre os quatro
grupos (Ensino Mdio, Superior Incompleto, Superior Completo e
Ps-Graduao). J o alomorfe -or apresenta uma distribuio muito maior
nos grupos Superior Completo e Superior Incompleto, conforme
podemos ver no grfi co abaixo:
Figura 3: grfi co mosaico para frequncia absoluta dosmorfemas
agentivos em funo da Escolaridade.
A ordem dos logatomas verbais e particpios na sentena, PI ou IP,
no foi signifi cativa ( 2= 1,82, gl = 1, p = 0,17, N= 438). Assim,
pode-se dizer que um possvel efeito de priming no se mostrou
relevante, ou seja, a informao mais recente dada na sentena no infl
uenciou os participantes em suas resposta-alvo. E assim como a
ordem, o gnero dos participantes tambm no foi uma varivel signifi
cativa ( 2 = 3,27, gl = 1, p = 0,07, N=438).
-
78
MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
Em suma, as variveis significativas e com forte associao so
base, terminao da raiz e conjugao. As variveis tipo de particpio e
escolaridade, embora tenham apresentado significativas associaes
com a formao de agentivos, a fora de associao no foi forte, ficando
entre valores fracos e muito fracos. No caso da escolaridade, uma
das razes para isso pode ser o desequilbrio na distribuio dos
sujeitos entre as categorias. Quanto ao tipo de particpio, a
associao muito fraca esperada, tendo em vista que os alomorfes -dor
e -or, segundo nossa hiptese, adjugem-se ao tema verbal e raiz
respectivamente. Sendo assim, o tipo de partcipio no seria
relevante para a seleo da alomorfe.
Com base nesses resultados do experimento, na prxima seo,
analiso os achados desta pesquisa sob o escopo da Morfologia
Distribuda, com especial ateno proposta de Arad (2003). Esses
resultados parecem ir ao encontro da proposta de Marantz (2000) e
Arad (2003), segundo a qual formao de palavras pode ser formada de
dois modos bsicos: (i) a partir de uma raiz e (ii) a partir de uma
palavra, ou seja, de uma raiz j concatenada a um ncleo formador de
palavra.
Procuro, alm de discutir, propor um modelo de derivao que
diminui o nmero de sufixos alomorfes para apenas dois: -dor e
-or.
6. DISCUSSO E PROPOSTA LUz DA MORFOLOGIA DISTRIBUDA
Atravs de um trabalho experimental, tentei demonstrar a relao
que se estabelece entre o sufixo e as diferentes bases s quais ele
se adjunge. Assim, foi possvel constatar que, quando -dor
concatenado ao tema verbal, este se superficializa como alomorfe
-dor. Quando o morfema -dor adjungido raiz, o almorfe -or passa
estrutura de superfcie aps a aplicao do Princpio do Contorno
Obrigatrio (McCarthy, 1986). esta proposta ser mais bem discutida
no escopo da Morfologia Distribuda na seo que segue.
6.1. Uma proposta para os agentivos em -dor e -or no
Portugus
A Teoria da Morfologia Distribuda (HALLE & MARANTZ, 1993,
1994; HALLE, 1997; MARANTZ, 1997, 2000) uma teoria de arquitetura
da gramtica que possui como principais as seguintes caractersticas:
a insero tardia, que a insero de material fonolgico aps a derivao
sinttica; a subespecificao dos itens de vocabulrio, ou seja, as
estruturas fonolgicas no necessitam de especificao, somente os
morfemas, ns terminais da estrutura sinttica, so totalmente
especificados; e estrutura sinttica hierrquica em toda derivao, a
estrutura da derivao a mesma para processos sintticos e morfolgicos
e apresenta os mesmos tipos de constituintes.
Alm disso, antes de tudo, preciso notar a diferena quanto
especificao fonolgica dos morfemas abstratos (tambm chamados de
f-morfemas) e da raiz (l-morfemas), aspecto tal que ser importante
para se compreender
-
79
Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014a proposta
aqui empregada. Para Embick e Noyer (2001, 2004), o contedo de um
morfema abstrato ativo na sintaxe consiste de traos gramaticais e
semnticos, ou seja, no h especificao quanto ao contedo fonolgico. O
morfema abstrato composto exclusivamente de traos no-fonticos, tais
como [agente] ou [plural], por exemplo, que s recebero contedo
fonolgico aps a derivao sinttica. Para esses autores, a raiz, por
outro lado, constituda de representaes fonolgicas e nelas
incluem-se itens como PAT- ou PINT-, por exemplo, que nada mais so
que sequncias de feixes de traos fonolgicos e, em alguns casos, de
traos diacrticos (distintivos) no-fonolgicos, como os traos de
classe, ou de ndices abstratos para distinguir os homfonos (EMBICK
E HALLE 2004b, p. 2).
Neste trabalho, seguimos a proposta de Arad (2003). Para a
autora, h dois modos de formao de palavra, derivados,
consequentemente, na sintaxe. O primeiro, que a autora chama de
root-level, consiste na derivao de palavras a partir de razes, sem
material funcional; o segundo, word-level, a derivaao de palavras a
partir de palavras, isto , a partir de razes j categorizadas por
algum ncleo. Segunda a autora, um ncleo X pode adjungir-se a uma
raiz ou a uma palavra j existente (substantivo, verbo, adjetivo).
Assim, se um ncleo X adjungir-se a uma raiz, ele colaborar para a
atribuio de uma interpretao para essa raiz. Se adjungido a uma
palavra, nada acontecer, j que a interpretao da palavra foi fixada
pelo ncleo logo abaixo na estrutura e no pela raiz (ARAD, p.738,
2003).
a. b.
Os nossos dados parecem exibir esse comportamento. Como vimos,
os alomorfes -dor e -or apresentaram derivaes distintas, o que
sugere que o processo derivacional possui diferentes estruturas.
Com nossa proposta, conseguimos diminuir o nmero de alomorfes
formadores de nomes de agentes no portugus de quatro para apenas
dois, tais sejam: -dor e -or. Nesse sentindo, propomos que a formao
de nomes de agentes esteja dividida em dois grupos, , o grupo -dor
e o das derivaes em -or. a formao dessas palavras seguem as
seguintes derivaes representadas atravs de esquemas rboreos:
x
x
n, v, a...
n, v, a...
x
-
80
MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
a) Grupo -DOR
Nesses casos, o sufixo -dor no pode se adjungir raiz, pois o
siginificado desta j foi determinado quando houve a afixao da vogal
temtica verbal. A ele, est acessvel apenas o ltimo ncleo
verbalizador e no a raiz. As derivaes sufixais em -dor so,
portanto, word-level. Segundo Arad (2003), as formaes de palavras a
partir de palavra consistem da concatenao de um afixo a uma j ento
palavra, ou seja, a uma unidade lingustica categorizada; a
interpretao j est fixada em um dado ambiente. Esse tipo de formao,
segundo a autora, , semanticamente, transparente e produtiva. De
fato, o que parece acontecer no portugus, tendo em vista que -dor o
morfema mais produtivo nesse tipo de derivao. Conforme os dados de
nosso experimento, -dor o principal afixo, o mais produtivo e tem
como base o tema verbal.
Procendendo anlise de -or, assumimos que a formao dos nomes de
agente com esse alomorfe root-level. Desse modo, assume-se,
consequentemte, que as bases no apresentam categoria gramatical,
sendo a categorizao feita pelo ncleo que com ela ir ser
concatenado, que, no caso do agentivos, ser sempre um nome. Em
outras palavras, pode-se dizer que as razes so categorias neutras e
adquirem categoria morfossinttica quando a elas for adjungido um
ncleo categorizador (MARANTZ, 1997; EMBICK, 2000).
Nesse sentido, para o grupo -or, teramos a seguinte situao:
b) Grupo -OR
No exemplo acima, consideramos que a raiz /pint-/ torna-se nome.
Consequentemente, uma palavra, uma vez que concatenada com um ncleo
nominalizador. O morfema [+ agente] -dor adjunge-se diretamente
raiz /pint-/. A existncia de pintor bloqueia a formao de *pintador,
que agramatical. Segundo Embick e Marantz (2008), o bloqueio
acontece quando algumas formas tornam-se agramaticais pela
existncia de outra forma; essa competio tem lugar no nvel da
palavra, expresso ou frase. Assim, a existncia de pintor bloqueia o
sistema de gerar *pintador, j que as duas palavras teriam o mesmo
significado.
treinador n- [ ]
-dor-
- a -
treina - v[ ]
trein - x[ ]
pintor n- [ ]
-dor-pint - x[ ]
-
81
Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 2014Vale
ressaltar que na Morfologia Distribuda, h apenas contedo
fonolgico
na raiz, ou seja, o que vai contecanar-se raiz o conjunto de
traos que caracterizam o morfema. Neste caso, o trao [+agentivo]
estar especificado. O morfema s ganha forma fonolgica quando passa
para o mdulo da fonologia, situao em que as regras de reajustamento
fonolgico podem operar. Assim, quando dor passa para o spell-out
concatenado com a raiz, uma estrututa fonlgica no licenciada na
lngua ajustada por OCP, cuja ao, neste caso, probe coronais
adjacentes. A derivao teria os seguintes passos:
1) No componente morfolgico, a raiz print concatena-se com o
morfema [+ agentivo];
2) No mdulo fonolgico, o morfema ganha contedo e realiza-se como
-dor, surgindo ento a forma no-licenciada *pintdor. Alm de receber
acento, a palavra precisa satisfazer OCP, que proibir sequncias
*[cor]-[cor]. Aps a aplicao de OCP, surge ento a forma pintor, que
sofrer Spell-Out.
A prevalncia da consoante da raiz e no a do sufixo pode estar
relacionada manuteno da identidade da raiz sobre a identidade do
sufixo. Beckman (1998), numa abordagem otimalista, afirma que os
morfemas de raiz exibem comportamento privilegiado quando em
situaes de alternncia do contedo fonolgico. Isto , a preservao da
raiz mais bem aceita nas lnguas que a preservao do contedo dos
afixos. A autora afirma que esse tipo de preservao de estrutura de
um morfema em detrimento de outro um dos efeitos do que chamou de
Fidelidade Posicional.
Duas questes se colocam a partir da proposta que esboo neste
texto: 1) Se de fato o portugus apresenta apenas os alomorfes -dor
e -or (e no, -dor, -tor, -sor, -zor e -or), como a proposta lida
com palavras como protetor e detentor, cujo /t/ no est presente na
raiz, por exemplo?; 2) Como explicar a alta produtividade de -dor
se as derivaes em -or apresentam estruturas menos complexas e,
supostamente, mais econmicas?
Nos casos de palavras que apresentam uma base incerta de
derivao, como as palavras protetor, por exemplo, a proposta que
defendemos que essas palavras possuem alomorfia de raiz (EMBICK
& MARANTZ, 2008, MARANTZ, 2008). Vejamos:
* - [ ]prote edor n
protetor n- [ ]
protet x prote- [ ] -
- dor -
- e -- dor -
prote e v- [ ]
-
82
MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
A existncia do alomorfe -or d-se apenas na superfcie e
determinada pela raiz a que ele se adjunge, que tambm uma raiz
alomrfica. Consideramos que tanto /proteZ-/ quanto /protet-/ so
razes reais. A concatenao de /protet-/ com o morfema -dor resultado
do efeito de bloqueio de protegedor e , nesse sentido, uma relao
arbitrria. Conforme Embick e Marantz (2008), a alomorfia de um
ncelo [n] em nosso caso, o morfema agentivo anexado raiz,
determinada pelas propriedades da raiz, o que no acontece com este
mesmo ncleo que se adjunge a um domnio mais alto na estrutura, como
o caso de -dor. Para este, a relao de localidade com outro ncleo
[x] e no com a raiz; sendo assim, sua alomorfia no pode ser por ela
determinada.
O fato de -or surgir apenas quando adjungido a uma raiz com
termino em consoante coronal confirmado pelo experimento, conforme
j reportamos. O alomorfe -or s foi realizado quando o falante
considerou como base da derivao a raiz terminada com as consoantes
/t, d, s, z/. Conforme Arad (2003), esse tipo de formao de palavras
a partir da raiz tende a exibir idiossincrasias e , tambm, no
produtivo porque a relao entre o ncleo categorizador e a raiz uma
relao arbitrria.
Com isso, conseguimos explicar a segunda questo, ou seja, a alta
produtividade de -dor. O fato de nomes em -dor serem formados a
partir de palavras (nos termos de Arad, word-level) permite que
seus significados sejam mais predizveis, ao contrrio do nomes em
-or, cujos significados so determinados pela sua relao arbitrria
com a raiz. A estrutura das formaes em -or, por si s, nada revela,
se no entendermos a relao que a raiz faz com as derivaces a partir
dela e com os alomorfes. Essa arbitrariedade expressa na relao
entra a raiz e o alomorfe -or pode ser bem visualizada atravs das
derivaes em -dor, que apareceram mesmo quando a raiz terminava com
as coronais /t, d, s, z/. Quando o morfema empregado -dor, este no
tem mais acesso raiz e, portanto, a estrutura fonolgica no
representa qualquer impasse.
Assumindo que somente a raiz possui contedo fonolgico
especificado, a hiptese de uma restrio fonolgica para a derivao dos
agentivos em or parece ser plausvel e no configura um problema para
a anlise. A raiz, apesar de ser livre quanto ao seu contedo,
sujeita a condies de licenciamento dadas por seus licenciadores (os
morfemas abstratos ou f-morfemas) com os quais mantm relaes
estruturais, muitas vezes, arbitrrias.
A relao entre as estruturas propostas na anlise e os resultados
experimentais permitem confirmar que as formaes word-level so mais
produtivas nas lnguas (Arad, 2003). Esse tipo de estrutura permite
previsibilidade semntica, visto que seu contedo j est fixado quando
um novo afixo se adjunge, como o caso do -dor no portugus. Os
achados experimentais desse estudo, apesar de serem inciais,
instigam a discusso sobre o status do que se considera mltipla
alormofia no s no portugus como em lnguas da mesma famlia, que
apresentam formaes de agentivos semelhantes, como, por exemplo, o
italiano, discutido neste trabalho, e at mesmo o espanhol.
-
83
Cadernos de ESTUDOS LINGSTICOS (56.1) Jan./Jun. 20147.
CONSIDERAES FINAIS
No presente estudo, procurei discutir a formao de agentivos
terminados em -dor, -tor, -sor, -zor e -or. Embora a discusso que
aqui fao seja apenas uma aproximao inicial com o problema da
alomorfia nesse tipo de formao de palavras, procurei propor uma
alternativa para a alomorfia desses sufixos no processo de derivao.
A proposta reduziu de quatro alomorfes para apenas dois: -dor e -or
e considera que o morfema seja, de fato, -dor. A anlise realizada
neste trabalho uma tentativa de deixar mais econmica e preditiva a
formao de nomes de agente em portugus. Para isso, utilizei o quadro
terico da Morfologia Distribuda (HALLE & MARANTZ, 1993,
MARANTZ, 2000 e trabalhos subsequentes), especialmente, o trabalho
desenvolvido por Arad (2003).
Com o experimento empregado, sugeri que a derivao diferente para
casos em -dor e -or. No primeiro grupo, a derivao feita a partir de
uma palavra, que, nessa situao, sempre a forma infinitiva do verbo,
ou seja, o tema verbal. No segundo, a derivao feita a partir da
raiz, situao em que o morfema -dor concatenado raiz diretamente,
sem passar por uma categorizao. Argumento, seguindo Marantz (2000)
e Arad (2003), que a alomorfia ocorre somente entre -dor e -or,
sendo as consoantes /t/ e /s/ de -tor e -sor parte da raiz e no do
sufixo. O morfema produtivo -dor cuja base o tema verbal e,
portanto, o portugus segue a mesma tendncia do italiano para a
formao de nomes agentivos (cf. Tucker, 2000). A diferena crucial
desta proposta para a de Tucker (2000) reside no fato de que,
ainda, para o italiano a autora considera a mltipla alormorfia,
enquanto nesta proposta, considero que no portugus a mltipla
alomorfia apenas aparente. Caso no fosse, esperar-se-iam derivaes
em -tor e -sor com razes, que no apresentassem uma consoante
coronal em sua borda direita.
Parece que a alternativa mais preditiva manter duas razes e dois
alomorfes. Assim, tem-se apenas dois alomorfes com base em
derivaces distintas: a raiz, para -or, e para -dor, o tema verbal.
No primeiro caso, o alomorfe -or resultante na superfcie fruto da
operao do OCP no componente fonolgico, que um fenmeno operante nas
lnguas naturais. Portanto, uma anlise como esta parece no
comprometer a naturalidade da proposta.
Com o presente estudo, espero ter dado um passo incial
compreenso dos nomes agentivos em -dor e -or. A anlise ora
apresentada, claro, tem carter inicial e necessita consequentemente
de mais testes para que se possa afirmar com maior acurcia o modo
como os falantes de portugus derivam nomes agentivos com os sufixos
aqui investigados. Seria interessante ainda que se fizesse uma
discusso sobre o funcionamento desses agentivos em corpus de lngua
falada e escrita para que, assim, se pudesse investigar o fenmeno
em situaes menos controladas.
-
84
MadRuga A formao de nomes Agentivos em -Dor/-Or em portugus
8. AGRADECIMENTOS
Agradeo ao CNPq pela bolsa de doutorado concedida, processo
nmero 140280/2012-0. Agradeo tambm aos participantes desta pesquisa
e aos professores Filomena Sandalo, Luiz Carlos Schwindt e Andrew
Nevins, cujas sugestes foram imprenscidveis para o aprimoramento
das anlises aqui apresentadas. Agradeo tambm aos meus colegas que
contriburam com revises e sugestes nas vrias verses deste texto, so
eles: Carina Fragozo, Cristina Prim, Diego Jiquilin, Fernanda Reis,
Ivana Pereira Ivo e Maria Luisa Freitas.
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