Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas 9 HIDROLOGIA DE SUPERFÍCIE: estimativa de vazões máximas 9.1 Introdução Dados de vazão em bacias hidrográficas são escassos no Brasil, existindo, na maior parte, monitoramento hidrológico em grandes bacias, normalmente conduzido por empresas de energia elétrica ou indústrias de grande porte. A disponibilidade de dados de precipitação é muito superior à de vazão, graças à grande quantidade de postos meteorológicos em funcionamento. Isto levou a geração de modelos que relacionam a precipitação à possível vazão ou escoamento superficial direto que esta proporciona. Deve-se ressaltar que grande parte dos modelos foram desenvolvidos para as condições fisiográficas, hidrológicas, pedológicas e climáticas dos EUA, havendo carência de informações específicas que possam ser utilizadas para aplicação segura destes modelos às condições brasileiras. No entanto, os modelos que serão apresentados neste tópico são os mais simples e práticos para se estimar a vazão para projetos hidráulicos, do ponto de vista de pequenas bacias hidrográficas. 9.2 Método Racional Este método leva o nome racional pela coerência na análise dimensional das variáveis, sendo o mais simples e mais usual em pequenas áreas. É um modelo empírico cujo objetivo é aplicar um redutor na precipitação intensa, significando um percentual do total precipitado que escoa, superficialmente sendo este redutor, influenciado pela cobertura vegetal, classe de solos, declividade e tempo de retorno da precipitação, existindo tabelas com valores propostos para este fator (Tabela 9.1). A forma geral do método é: A I C Q ⋅ ⋅ = (1) Em que Q é a vazão (L 3 T -1 ), I, a intensidade da precipitação (L T -1 ), A, área da bacia (L 2 ) e C, o fator de redução (adimensional), conhecido como coeficiente de escoamento superficial ou fator C. Observe que ao se multiplicar I por A, resulta na unidade de Q. Para se obter a vazão em m 3 s -1 , trabalhando com a intensidade de precipitação em mm h -1 e área em ha, a equação 1 fica: 360 A I C Q ⋅ ⋅ = (2)
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Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
9 HIDROLOGIA DE SUPERFÍCIE: estimativa de vazões máximas
9.1 Introdução
Dados de vazão em bacias hidrográficas são escassos no Brasil, existindo, na
maior parte, monitoramento hidrológico em grandes bacias, normalmente conduzido
por empresas de energia elétrica ou indústrias de grande porte.
A disponibilidade de dados de precipitação é muito superior à de vazão, graças
à grande quantidade de postos meteorológicos em funcionamento. Isto levou a
geração de modelos que relacionam a precipitação à possível vazão ou escoamento
superficial direto que esta proporciona. Deve-se ressaltar que grande parte dos
modelos foram desenvolvidos para as condições fisiográficas, hidrológicas,
pedológicas e climáticas dos EUA, havendo carência de informações específicas que
possam ser utilizadas para aplicação segura destes modelos às condições brasileiras.
No entanto, os modelos que serão apresentados neste tópico são os mais simples e
práticos para se estimar a vazão para projetos hidráulicos, do ponto de vista de
pequenas bacias hidrográficas.
9.2 Método Racional
Este método leva o nome racional pela coerência na análise dimensional das
variáveis, sendo o mais simples e mais usual em pequenas áreas. É um modelo
empírico cujo objetivo é aplicar um redutor na precipitação intensa, significando um
percentual do total precipitado que escoa, superficialmente sendo este redutor,
influenciado pela cobertura vegetal, classe de solos, declividade e tempo de retorno da
precipitação, existindo tabelas com valores propostos para este fator (Tabela 9.1). A
forma geral do método é:
AICQ ⋅⋅= (1)
Em que Q é a vazão (L3 T-1), I, a intensidade da precipitação (L T-1), A, área da
bacia (L2) e C, o fator de redução (adimensional), conhecido como coeficiente de
escoamento superficial ou fator C. Observe que ao se multiplicar I por A, resulta na
unidade de Q. Para se obter a vazão em m3 s-1, trabalhando com a intensidade de
precipitação em mm h-1 e área em ha, a equação 1 fica:
360
AICQ
⋅⋅= (2)
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
É importante observar que o método Racional transforma um processo
complexo, com muitas variáveis envolvidas, em algo bastante simples, resumindo toda
a complexidade apenas no fator C. Os principais problemas deste método, quando
aplicado a bacias hidrográficas, são:
- Não existir nenhuma consideração sobre variabilidade espacial e temporal
da precipitação na bacia, assim como de fatores físicos, em especial
cobertura vegetal, classe de solo e declividade, os quais interferem
decisivamente no processo;
- Não considera a forma da bacia, apenas a área total;
- Todo o processo de geração do escoamento, a partir da precipitação e
infiltração, é resumido apenas no fator C, que implica numa proporção
direta da chuva em deflúvio;
- Recomendado, com precauções, apenas para bacias menores que 8 km2.
Na Tabela 9.1 tem-se valores para o coeficiente de escoamento superficial de
acordo com vários tipos de cobertura da superfície, declividade e tempo de retorno do
projeto.
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Tabela 9.1 Valores de C para várias superfícies, declividade e tempo de retorno.
Utilizando-se a equação de Giandotti para cálculo de tc tem-se:
( )minutos 147,69horas 46,2
12880,0
6,55,104,124tc ==
⋅
⋅+⋅=
( )1
149,1
187,0
1 mmh17,4728,567,147
)50(*81,10224i −=
+=
( )1
005,1
179,0
2 mmh97,44817,337,147
)50.(341,4159i −=
+=
Considerando-se a média das chuvas intensas, tem-se I = 46,07 mm/h
c) Cálculo da vazão de projeto
5 4 011,01204*07,46*5432,0*0091,0Q =
Q = 26,93 m3/ s
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
9.4 Método Cypress-Creek
Esta metodologia foi desenvolvida especificamente para dimensionamento de
sistemas de drenagem superficial em áreas planas. É um método empírico,
desenvolvido com base em dados de monitoramento hidrológico de várias bacias
americanas com declividade menor que 0,45%, pertencentes a 4 regiões dos Estados
Unidos. Sua fórmula geral é:
KACQ ×= (21)
Em que Q é a vazão de projeto, em cfs (“pés cúbicos por segundo” – 1 pé ∼
30,5 cm), C é um coeficiente associado ao deflúvio, A é a área a ser drenada, em
milhas2 (1 milha ∼ 1,6 km) e K é igual a 5/6.
O coeficiente C para a região Sudeste dos EUA, representada pelo estado da
Flórida, pode ser calculado por:
Re75,1439,16C ×+= (22)
Em que Re é a chuva efetiva em polegadas. Uma das formas mais usuais de
obtenção da chuva efetiva é o método Curva-Número (CN-SCS) a ser detalhado no
próximo item.
Na realidade pode haver uma distorção entre o valor calculado para Q e o
original, quando a área de drenagem for maior que 100 ha. Assim, é necessário
calcular um coeficiente de distorção, para correção da vazão estimada pela equação
21:
( )ARe89,26
ARe75,1439,16 65
××××+=α (23)
Analisando-se as equações acima, observa-se que a vazão Q corresponde ao
produto de Re pela área dividido pelo tempo de duração da chuva, de onde aparece o
valor 26,89, uma vez que 1 polegada/24 horas = 26,89 cfs/mi2, considerando como
critério de projeto uma chuva de duração de 24 horas, valor este típico para projetos
desta natureza. O valor da chuva efetiva a ser aplicado na determinação de C deve
ser multiplicado por α.
9.5 Método Curva-Número - USDA/ARS (CN - SCS)
Este método foi desenvolvido pelo Serviço de Conservação de Solos do
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (SCS-USDA) e visa ao cálculo do
deflúvio total gerado em uma bacia ou área de contribuição, sendo bastante útil para
dimensionamento de terraços de infiltração e bacias de contenção, os quais
necessitam do volume total escoado. Além disto, é aplicado para determinação das
precipitações efetivas, as quais são aplicadas na estimativa da Hidrógrafa Unitária
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Sintética Triangular (HUT), a ser apresentada na seqüência. Na Figura 9.3 apresenta-
se um esquema geral do método e seus parâmetros.
Figura 9.3 Representação gráfica do método Curva Número (CN - SCS).
Desta Figura, tem-se que P é a precipitação acumulada total, Ia é a abstração
inicial, Pef é a precipitação efetiva (P – Ia), Q é o deflúvio; F é a infiltração acumulada
total (P – Q) e S é a infiltração potencial.
O embasamento físico deste método pode ser entendido da seguinte forma:
total ãoprecipitaçefetiva ãoprecipitaç
absorção de máxima capacidadeinfiltrado volume =
Na realidade, existem perdas iniciais no processo associadas à infiltração
inicial, retenção pelas depressões do terreno e cobertura vegetal, as quais são
denominadas abstrações iniciais. Assim, obtém-se a seguinte formulação:
PQ
IaSIaQP =
−−− (24)
Em que P é a precipitação total, Q, o deflúvio ou precipitação efetiva, S, é a
capacidade máxima de absorção de água e Ia, abstrações iniciais. Segundo os
Escoamento superficial potencial
Abstração Inicial (Ia)
Precipitação total (P)
Escoamento superficial atual
Infiltração atual (F)
Potencial de Infiltração (S)
(Escoamento superficial potencial – Escoamento
superficial atual)
Pre
cipi
taçã
o ef
etiv
a
Precipitação total
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
autores desta proposta, Ia corresponde a 20% de S. Sendo assim, a equação que
estima o deflúvio, fica:
( )S80,0P
S20,0PQ
2
⋅+⋅−= (25)
Todas as variáveis da equação 25 são trabalhadas em mm.
O método preconiza ainda que somente existirá escoamento quando P for
superior às abstrações iniciais, o que se observa pelo numerador da equação 25. A
capacidade máxima de absorção S é obtida com base na Curva Número (CN), de
acordo com a equação abaixo:
254CN
25400S −= (26)
Os valores para CN variam de 1 a 100 e estão associados a diversos
parâmetros fisiográficos como cobertura vegetal, umidade do solo antecedente ao
evento e classe de solo. Os solos foram agrupados em 4 categorias (grupos):
- Grupo A: são aqueles que produzem pequeno escoamento e alta infiltração,
caracterizados por altos teores de areia, pequenos teores de silte e argila e
profundos;
- Grupo B: menos permeáveis que os solos da categoria A, ainda sendo
arenosos, porém, menos profundos;
- Grupo C: solos que geram escoamento superficial superior ao solo B, com
capacidade de infiltração média a baixa, percentual mais elevado de argila
e pouco profundos;
- Grupo D: solos pouco profundos, com baixa capacidade de infiltração e
presença de argilas expansivas, com maior capacidade para geração do
escoamento.
Uma análise rápida deste agrupamento permite concluir que esta classificação
é bastante superficial, não sendo consistente com os vários aspectos de manejo e
solos, tais como compactação e intemperismo, sendo que este último, confere
atributos físico-químicos e mineralógicos marcantes em solos tropicais. Assim, por
exemplo, um solo com alto teor de argila (acima de 50%), com estrutura tipicamente
granular, conferida pela mineralogia mais oxídica, principalmente com elevados teores
de gibsita, como alguns Latossolos, seriam encaixados no grupo C ou D. No entanto,
são solos com alta capacidade de infiltração, ou seja, são argilosos, mas seu
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
comportamento hidrológico é tipicamente de solos arenosos, devendo ser
classificados aos grupos A ou B.
Este agrupamento de solos e seus atributos hidrológicos foram desenvolvidos
com base nas condições de clima temperado, com menor grau de intemperismo, onde
a textura tem maior influência no comportamento físico-hídrico dos solos, enquanto em
solos tropicais, a estrutura é o fator determinante. Essa abordagem simples mostra o
quanto é problemática a importação de modelos. Apesar das dificuldades levantadas,
na ausência de outras informações mais realistas, apresenta-se na Tabela 9.4, os
valores de CN para bacias rurais.
Tabela 9.4 Valores de CN para diversas situações de cobertura vegetal e tipos de
solos.
Uso do Solo Superfície Tipo de solo
A B C D
Solo lavrado - com sulcos retilíneos
- em fileiras retas
77
70
86
80
91
87
94
90
Plantações
regulares
- em curvas de nível
- terraceamento em nível
- em fileiras retas
67
64
64
77
76
76
83
84
84
87
88
88
Plantações de
cereais
- em curvas de nível
- terraceamento em nível
- em fileiras retas
62
60
62
74
71
75
82
79
83
85
82
87
Plantações de
legumes
- em curvas de nível
- terraceamento em nível
- pobres
- normais
- boas
60
57
68
49
39
72
70
79
69
61
81
78
86
79
74
84
89
89
94
80
Pastagens
- pobres, em nível
- normais, em nível
- boas, em nível
47
25
6
67
59
35
81
75
70
88
83
79
Campos
permanentes
- normais
- esparsos, baixa
transpiração
- normais
- densas, alta transpiração
30
45
36
25
58
66
60
55
71
77
73
70
78
83
79
77
Chacaras
Estradas de
terra
- Normais
- Más
- de superfície dura
56
72
74
75
82
84
86
87
90
91
89
92
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Florestas
- muito esparsas, baixa
transpiração
- esparsas
- densas, alta transpiração
- normais
56
46
26
36
75
68
52
60
86
78
62
70
91
84
69
76
Além disto, foi proposta uma correção dos valores de CN com base na
umidade antecedente, a qual possibilitou separar 3 situações distintas:
- Situação 1: solos secos, com precipitação acumulada nos últimos 5 dias
menor que 36 mm para estação de crescimento, e, em outro período,
menor que 13 mm;
- Situação 2: solos com umidade na capacidade de campo e os valores de
CN correspondem aos da Tabela 9.4;
- Situação 3: ocorreram precipitações nos últimos 5 dias, com o solo
saturado, considerando total precipitado maior que 53 mm para época de
crescimento, e em outro período, maior que 28 mm;
Na Tabela 9.5 constam valores de CN corrigidos para as situações 1 e 3,
tendo-se como referência, a situação 2.
Tabela 9.5 Valores de CN corrigidos conforme situação de umidade do solo
antecedente.
Valores médios
(situação 2)
Valores corrigidos
(situação 1)
Valores corrigidos
(situação 3)
100 100 100
95 87 98
90 78 96
85 70 94
80 63 91
75 57 88
70 51 85
65 45 82
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
60 40 78
55 35 74
50 31 70
45 26 65
40 22 60
35 18 55
30 15 50
25 12 43
20 9 37
15 6 30
10 4 22
5 2 13
Exemplo de Aplicação 9.4
Considere uma bacia hidrográfica com 1,5 ha de área, dividida em 0,75 ha
ocupados por eucalipto e solo com capacidade média de infiltração e textura média; os
outros 0,75 ha ocupados por pastagem, também em condições normais, e solo com
textura argilosa e baixa capacidade de infiltração. Para o hietograma abaixo,
determinar o deflúvio e a infiltração média na bacia para as situações de umidade do
solo 1, 2 e 3 do método CN-SCS.
a) Determinação dos valores de CN
- Área com eucalipto: o solo desta área pode ser enquadrado como
intermediário entre B e C. Adotando-se B (para se obter maior segurança),
pela Tabela 9.4, encontra-se CN igual a 60. Este valor é para situação de
10
30
16
12 10
8 4
Tempo (min)
IP (m
m/h
)
30 60 90 120 150 180 210
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
umidade 2. Para as demais situações, têm-se os valores 40 e 78,
respectivamente, de acordo com a Tabela 9.5.
- Área com pastagem: pode-se enquadrar o solo desta área no grupo C.
Assim, tem-se, para a situação 2, um valor de CN igual a 75 e para as
situações 1 e 3, 57 e 88, respectivamente.
b) Valor médio de CN, ponderado pelas áreas de ocupação de cada valor:
- situação 1: 5,485,1
5775,04075,0 =⋅+⋅
- situação 2: 67,5
- situação 3: 83
c) Cálculo de S e abstração inicial
- situação 1: 71,2692545,48
25400S =−= mm .: Ia = 0,2 x 269,71 = 53,94 mm
- situação 2: S = 122,3 mm .: Ia = 24,5 mm
- situação 3: S = 52,02 mm .: Ia = 10,4 mm
d) Cálculo do defúvio
- situação 1: Q = 0. O valor do total precipitado, que é de 45 mm, não supera
a abstração inicial (45<53,94). Isto ocorre devido ao fato de que a umidade
inicial do solo está muito baixa, havendo, portanto, maior potencial de
infiltração.
- situação 2: ( )( ) 94,2
3,12280,0455,2445
Q2
=⋅+
−= mm
- situação 3: Q = 13,82 mm. Esta situação implica num maior deflúvio, haja
vista a alta umidade inicial do solo, reduzindo o potencial de
armazenamento de água, aumentando o escoamento.
e) Cálculo da Infiltração Média
- Situação 1: I = 45 – 0 = 45 mm
- Situação 2: I = 45 – 2,94 = 42,06 mm
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
- Situação 3: I = 45 – 13,82 = 31,18 mm
9.6 Hidrógrafa Unitário Triangular (HUT)
9.6.1 Abordagem introdutória
A fim de reduzir as dificuldades na elaboração da hidrógrafa unitária de uma
bacia hidrográfica, tais como a existência de monitoramento de vazões, a dificuldade
de extrapolação do HU de uma bacia para outra e à maior complexidade matemática,
foi desenvolvido um modelo de HU que simplifica o processo de estimativa de vazões
e tempo de pico para uma hidrógrafa produzida por uma dada precipitação efetiva. A
principal aplicação deste método de estimativa do HU consiste na caracterização do
hidrograma de projeto, a ser apresentado na seqüência.
A idéia central é considerar a hidrógrafa com formato triangular (aproximando
as curvas de ascensão e recessão a uma reta), o que facilita o entendimento e o
cálculo da vazão de pico. O SCS-USDA propôs um modelo de HU com esta
aproximação, que ficou conhecido pela sigla HUT, associando os parâmetros da
hidrógrafa (vazão de pico e tempo de pico) às características físicas da bacia.
Ao se calcular a área deste triângulo, automaticamente se determina o volume
de deflúvio. Uma vez considerado unitário, esta área será igual à de uma precipitação
unitária. A Figura 9.4 ilustra uma hidrógrafa triangular e a seguir as idéias básicas
desenvolvidas por esta metodologia.
10
30
16
12 10
8 4
Tempo (min)
IP (m
m/h
)
30 60 90 120 150 180 210
Situação 2: 10,12 mm/h
Situação 3: 24,12 mm/h
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Figura 9.4 Representação de uma hidrógrafa triangular e seus parâmetros.
Por esta Figura, pode-se desenvolver o seguinte raciocínio, a partir do cálculo
da área da hidrógrafa:
Q2
teqp2
taqp =×+× (24)
Em que Q corresponde ao deflúvio unitário, qp é a vazão de pico unitária, ta o
tempo de ascensão da hidrógrafa, te, o tempo de recessão. Ainda na Figura 9.4, D
representa o tempo de duração da precipitação unitária, normalmente igual ao tempo
de monitoramento da precipitação para apenas 1 evento efetivo; tp representa o tempo
de pico da hidrógrafa. O valor de te é ajustado ao valor de ta como sendo:
taHte ×= (25)
A partir da análise de várias bacias norte-americanas, foi encontrado um valor
de 1,67 para H. Para uma precipitação efetiva unitária qualquer Pu (0,1 mm; 1,0 mm;
10,0 mm), tem-se valor de Q na equação 24 (Pu = Q). O desenvolvimento da equação
para cálculo da vazão de pico da hidrógrafa unitária está apresentado na seqüência.
( ) Pu2tetaqp ⋅=+⋅ (26)
Isolando qp:
D
te ta
Q
tempo
qp
tp
tb
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
teta
Pu2qp
+⋅= (27)
Substituindo a equação 25 na 27, considerando H = 1,67, obtém-se:
ta67,2
Pu2qp
⋅⋅= (28)
Ao se analisar as unidades da equação 28, observa-se que para Pu em mm e
ta, em horas, a vazão de pico (qp) será obtida em mm h-1 ou, em termos de análise
dimensional, LT-1. Para obter a vazão em unidades L3T-1, é necessário multiplicar a
equação 28 pela área da bacia, que possui unidade em L2:
AtaPu
67,22
qp ⋅⋅= (29)
Para estimar a vazão de pico unitária (qp) em m3 s-1, a partir da equação 29,
trabalhando-se com Pu em mm, A em km2 e ta em horas, é necessário multiplicar esta
equação por uma constante de transformação de unidades da seguinte forma:
- km2 para m2 = multiplica-se por 106 (no numerador da equação da 29);
- mm para m = dividi-se por 103 (no numerador da equação da 29);
- hora para segundo = multiplica-se por 3600 (no denominador da equação
29);
Assim, a constante será:
278,03600
1
10
103
6=⋅
Multiplicando-se a equação 29 por 0,278, obtém-se:
ta
APu208,0qp
⋅⋅= (30)
Em que, qp é a vazão de pico do HUT, em m3 s-1, Pu, a precipitação unitária,
em mm, A representa a área da bacia, em km2 e ta tempo de ascensão, em horas.
Esta equação é especialmente válida para bacias menores que 8 km2 (800 ha).
A determinação do tempo de pico (tp) do HUT é feita com base no tempo de
concentração da bacia. O SCS-USDA produz a seguinte equação empírica para este
cálculo, considerando as características fisiográficas da bacia, e o fato, observado em
várias bacias, de que, em média, tp = 0,60*tc:
50,0
70,080,0
X1900
14,25
SL6,2
tp⋅
��
���
� +⋅⋅= (31)
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Em que tp é obtido em horas, L é o comprimento hidráulico ou comprimento do
curso d’água principal (m), S, capacidade máxima de absorção de água na bacia (vide
método CN) e X, a declividade do curso d’água, em percentagem.
Observa-se ainda pela Figura 9.4 que:
2D
tpta += (32)
O valor de D a ser adotado pode variar de forma considerável. Para maior
segurança do dimensionamento, tem sido adotado D = tc. Alguns autores, porém,
sugerem um valor de D variando de 1/5 a 1/3 de tc. Para simulação da hidrógrafa de
projeto, D é igual ao intervalo de tempo de simulação.
Exemplo de Aplicação 9.5
Para uma bacia hidrográfica de 10 ha de área, calcular a vazão de pico do
hidrograma, considerando a umidade antecedente da situação 3*. O comprimento
hidráulico é de 1200 m e a declividade igual a 12,5%. Considere Pu = 10 mm, CN = 83
e precipitação total de 30 mm em 30 minutos.
1o) Cálculo do Deflúvio total
mm 02,52S254CN
25400S =�−=
( ) ( )mm 36,5
62,7140,1030
S8,0PS2,0P
Q22
=−=⋅+
⋅−=
2o) Cálculo de tp e ta
( )
( )245,0
5,121900
14,25
5212006,2
tp5,0
70,080,0
=⋅
��
���
� +⋅⋅= hora = 14,72 minutos
Como D é igual a 30 minutos, ta será igual a:
ta = 30/2 + 14,72 = 29,72 minutos = 0,50 hora
O valor da vazão de pico unitária será (área = 10 ha ou 0,1 km2):
416,050,0
10,010208,0qp =⋅⋅= m3 s-1
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Observe que este valor diz respeito à vazão de pico unitária, ou seja, para um
evento de 10 mm em 30 minutos. Recordando, do capítulo anterior que Q = P x q,
tem-se:
31030
P ==
Assim, a vazão de pico para este evento será:
s/m 25,1416,03Q 3=×=
Note que, para obtenção da vazão de pico final, que é o objetivo do exercício,
não faz diferença o valor de Pu adotado. Assim, por exemplo, se Pu for igual 1 mm, a
vazão de pico unitária seria 0,0416 m3 s-1. Porém, a relação entre a precipitação
efetiva e Pu seria igual a 30,0 e vazão final não mudaria.
Obs.: Com o deflúvio, calculado pelo método do número da curva (CN) e a vazão de
pico, com base no HUT, ficam definidas as condições necessárias para o
desenvolvimento de projetos hidráulicos, como terraços, bacias de contenção,
barragens e aplicação de modelos para estimativa da perda de solo em bacias
hidrográficas.
9.6.2 Geração do hidrograma de Projeto
O hidrograma de projeto determinado pela metodologia do SCS-USDA, baseia-
se nas premissas do HU e da chuva de projeto, sendo que esta última é trabalhada na
forma de intervalos de tempo menores que o tempo de concentração (tc). Na
realidade, tc é dividido em vários intervalos cumulativos de tempo. A partir das chuvas
intensas calculadas para cada intervalo de tempo acumulado, determina-se, pelo
método CN, a precipitação efetiva acumulada. Por diferença entre valores
consecutivos encontra-se a precipitação efetiva propriamente dita, a qual é aplicada
para determinação do hidrograma de projeto final.
O cálculo das coordenadas do hidrograma de projeto é feito por meio das
equações de convolução na forma matricial, ou seja:
[ ] [ ] [ ]PqQ ×= (33)
A matriz de valores [q] é obtida a partir do HUT, determinando-se as equações
das retas de ascensão e recessão do mesmo. Por meio destas equações, determina-
se a ordenada q para cada intervalo de tempo.
* Ocorreram precipitações nos últimos 5 dias, com o solo saturado, considerando o total precipitado maior que 53 mm, para a época de crescimento, e maior que 28 mm em outro período.
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
Exemplo de Aplicação 9.6
Determine o hidrograma de projeto considerando uma bacia hidrográfica com
tempo de concentração de 100 minutos e área de drenagem de 100ha. O tempo de
retorno para o projeto é de 50 anos e o CN médio para a bacia é igual a 70. A equação
de chuvas intensas a ser aplicada é:
708,0
151,0
)39,9t(
TR1,778i
+=
a) Determinação do intervalo de tempo de simulação ∆t, o qual deve ser múltiplo do
tempo de concentração ou do tempo de pico, ou seja, ≤ 1/5 tc ou ≤ 1/3 tp. A partir
deste intervalo, calculam-se as precipitações efetivas acumuladas pelo método CN. No
exemplo em questão, o intervalo de 10 minutos parece ser um bom valor. Assim,
subdivide-se tc em 10 intervalos acumulados de 10 minutos cada, calculando a
intensidade média máxima e a precipitação total multiplicando a intensidade pelo
respectivo tempo.
T (min) I (mm h-1) Ptotal CN S Pefetiva
acumulada ∆∆∆∆P
10 172.18 28.70 70.00 108.86 0.41 0.41
20 128.26 42.75 70.00 108.86 3.39 2.98
30 104.24 52.12 70.00 108.86 6.62 3.23
40 88.81 59.21 70.00 108.86 9.58 2.96
50 77.95 64.95 70.00 108.86 12.27 2.68
60 69.81 69.81 70.00 108.86 14.71 2.45
70 63.47 74.04 70.00 108.86 16.96 2.25
80 58.35 77.80 70.00 108.86 19.04 2.08
90 54.13 81.20 70.00 108.86 20.99 1.94
100 50.58 84.30 70.00 108.86 22.81 1.83
b) Determinação do HUT
Pu =1,0 mm
A = 1,0 km2
tc6,02td
ta +=
Considerando td = 10min:
min65100*6,02
10ta =+= = 1,0833 hora
13sm 192,00833,1
11208,0qp −=⋅⋅=
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
tr =108 min; tb = 175 min
Baseado na equação da reta tem-se:
002954,0)650(
)192,00(xy
1m =−
−=∆∆= :. t002954,0Q1 ⋅= (para t até 67 min)
001761,0)65174()192,00(
xy
m2 −=−
−=∆∆=
)175t(001761,0Q2 −−= :. 3065,0t001761,0Q2 +⋅−= (para t entre 65 e 175 min).
c) Obtenção das ordenadas do HU (substituição dos valores de t nas equações acima)
t q t q
0 0 95 0.139205
10 0.02954 105 0.121595
20 0.05908 115 0.103985
30 0.08862 125 0.086375
40 0.11816 135 0.068765
50 0.1477 145 0.051155
65 0.19201 155 0.033545
t
Q
Qp (65 ; 0,192)
(175;0)
1 2
(0,0)
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
75 0.174425 165 0.015935
85 0.156815 175 0
Capítulo 9 – Hidrologia de Superfície: estimativa de vazões máximas
d) Cálculo do número de ordenadas do hidrograma final e montagem das matrizes. nº valores q =18 .: [q]18x1 nº valores Pef=10 . : [P]27x18 Q =q + Pef - 1 = 27 . : [Q]27x1