33º ENCONTRO ANUAL DA APHES “Economia, sociedade e mercados num mundo global” Intenções urgentes x passos lentos: um confronto entre políticas econômicas da Primeira República e a rotina produtiva da fronteira agrícola no Estado de São Paulo – Brasil (1889-1930). Lélio Luiz de Oliveira Departamento de Economia FEA-RP - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto USP – Universidade de São Paulo BRASIL [email protected]Com a proclamação da república e os encantos oriundos do movimento político pregava-se a dissolução da velha ordem imperial. Esta vista, naquela altura, como um marasmo da economia. Era preciso esquecer o escravismo e disseminar com maior vigor o trabalho assalariado, notadamente através da mão de obra imigrante. (BRITO, 2004). Segundo boa parte dos integrantes do movimento republicano o Brasil precisava participar da ordem econômica internacional vigente à época, beneficiar-se da circulação de capitais, absorver novas tecnologias e industrializar-se. (BARBOSA, 1892) As políticas a serem adotadas originavam-se de ideias econômicas que seriam parte do comportamento integrante da modernidade. Entretanto, no Brasil, permaneciam as controvérsias entre valorização e estabilidade da moeda versus câmbio flutuante. Este era o centro do debate sobre os entraves para o desenvolvimento. Na prática, em 1890, transcorria a desregrada ampliação do crédito e das emissões de moeda. Tudo aos solavancos. Às decisões intempestivas do novo governo, geradoras de especulações financeiras, somavam-se as crises cíclicas internacionais. Em 1891, diante da piora do contexto econômico internacional, o capital estrangeiro antes fluente tornou-se escasso nas praças brasileiras. “A brusca redução das entradas de capitais no Brasil está bem documentada e seus efeitos sobre a crise cambial de 1891 parecem indiscutíveis, de modo que é legítima a dúvida se o país viu-se
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33º ENCONTRO ANUAL DA APHES “Economia, sociedade e mercados num mundo global” Intenções urgentes x passos lentos: um confronto entre políticas econômicas da Primeira República e a rotina produtiva da fronteira agrícola no Estado de São Paulo – Brasil (1889-1930).
Lélio Luiz de Oliveira Departamento de Economia
FEA-RP - Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade de Ribeirão Preto USP – Universidade de São Paulo
Com a proclamação da república e os encantos oriundos do movimento político
pregava-se a dissolução da velha ordem imperial. Esta vista, naquela altura, como um
marasmo da economia. Era preciso esquecer o escravismo e disseminar com maior
vigor o trabalho assalariado, notadamente através da mão de obra imigrante. (BRITO,
2004). Segundo boa parte dos integrantes do movimento republicano o Brasil precisava
participar da ordem econômica internacional vigente à época, beneficiar-se da
circulação de capitais, absorver novas tecnologias e industrializar-se. (BARBOSA,
1892)
As políticas a serem adotadas originavam-se de ideias econômicas que seriam
parte do comportamento integrante da modernidade. Entretanto, no Brasil, permaneciam
as controvérsias entre valorização e estabilidade da moeda versus câmbio flutuante. Este
era o centro do debate sobre os entraves para o desenvolvimento. Na prática, em 1890,
transcorria a desregrada ampliação do crédito e das emissões de moeda. Tudo aos
solavancos. Às decisões intempestivas do novo governo, geradoras de especulações
financeiras, somavam-se as crises cíclicas internacionais. Em 1891, diante da piora do
contexto econômico internacional, o capital estrangeiro antes fluente tornou-se escasso
nas praças brasileiras.
“A brusca redução das entradas de capitais no Brasil está bem
documentada e seus efeitos sobre a crise cambial de 1891 parecem
indiscutíveis, de modo que é legítima a dúvida se o país viu-se
abandonado por volúveis capitais estrangeiros assustados com eventos
ocorridos em outros países (...) ou se a crise foi exclusivamente
causada por seus próprios excessos.” (FRANCO, 2012:183)
As políticas econômicas adotadas na primeira década da jovem república
resultaram em um imbróglio composto de tudo um pouco: emissões desenfreadas da
moeda, crédito frouxo, inflação, mexidas no câmbio, quebradeiras e salvamento de
empresas e bancos, agravamento fiscal (TAUNAY, 1971), empréstimos internacionais
(Fundig loan) e, mais adiante na virada do século, tentativas de adoção da ortodoxia
econômica. Tudo parecia muito complexo no círculo do poder, na cúpula da oligarquia
cafeicultora e mais ainda nos livros contábeis. Um país que pretendia ser moderno
continuava dependente da exportação de produtos primários, notadamente o café,
evidenciando o frágil controle da balança comercial. (FURTADO, 1985) O dito
“marasmo” e as possíveis “certezas” das ações econômicas do Império tinham mesmo
ficado para trás, o tempo parecia correr com agilidade num zigue-zague contínuo, sobre
o qual frutificavam as críticas apuradas nos periódicos do Rio de Janeiro. (FRANCO,
2008)
Por outro lado, nas fronteiras agrícolas da região sudeste, o cotidiano econômico
do interior do país era regido – ao mesmo tempo – pelas atividades de subsistência, de
abastecimento dos mercados internos e de produtos tropicais de exportação. Um
exemplo é o município de Franca, situado no nordeste do Estado de São Paulo, ao norte
do rio Sapucaí, muito próximo das fronteiras de Minas Gerais (Figura 1), cujo ritmo
econômico parcialmente destoava dos centros de decisão do país.
A região de Franca, durante boa parte do século XIX sustentada na produção de
alimentos para o mercado interno, era tida como fronteira e às vezes aceiro aos avanços
da cafeicultura. No município francano, a chegada da ferrovia – Companhia Mogiana –,
em 1887, impulsionou os proprietários de terras a plantarem lavouras de café em escala
maior do que até então era comum. Alguns produtores, daí em diante, formaram suas
lavouras não somente para atender o consumo da população local, mas direcionavam os
excedentes à exportação. (TOSI, 2003) No nordeste paulista, nos últimos anos do
império aos primeiros da república a cafeicultura vai além do gasto da população –
como era dito – e passou a ocupar os vagões da ferrovia a caminho da exportação. A
dinâmica da cafeicultura ligou a região ao mercado externo, e, ao mesmo tempo,
promoveu a retroalimentação dos setores destinados ao abastecimento interno, como a
pecuária e a agricultura de alimentos. (OLIVEIRA, 2006)
O ingresso gradativo do município de Franca ao complexo cafeeiro deveu-se,
entre outros fatores, aos preços crescentes da rubiácea no mercado internacional nos
primeiros anos da república (DELFIM NETO, 2009), aos custos menores do transporte
(MATOS, 1974; MILLIET, 1941), somados à disponibilidade de terras. Além disso,
deve-se levar em conta o crescimento vegetativo da população (basicamente rural) e a
agregação de estrangeiros. (OLIVEIRA, 2006:172-214; FALEIROS, 2009)
Foi somente a partir de 1870 que as notícias sobre o café ganharam espaço nos
jornais da cidade (LIMA, 1973), bem como as anotações nos inventários post-mortem.
Na década de 1880, os maiores proprietários de terras ainda não tinham se aventurado a
plantar grandes lavouras de café, mantendo a pecuária como atividade principal
(somando-se os derivados e a agricultura).
Os fazendeiros francanos preservavam, em boa medida, o perfil tradicional das
propriedades. A habitual auto-suficiência das fazendas, que trazia segurança aos
proprietários, teria sido importante fator da manutenção das práticas econômicas
arraigadas. Houve resistência dos fazendeiros em fazer investimentos vultosos em uma
nova lavoura – o café -, cujos resultados dependiam: das oscilações dos preços
internacionais, das políticas governamentais (incluindo as manipulações do câmbio) e
das espertezas dos atacadistas e comissários. Assim sendo, foram miúdos os passos
dados em direção à cafeicultura, se comparado ao município vizinho de Ribeirão Preto
(MARCONDES, 2007; LOPES, 2008).
Nos inventários post-mortem do município de Franca, entre 1890-1900, foram
quantificados de 188.199 pés de café, o que resulta em uma média de 8.179 pés por
inventário (moda e mediana: 4.000 pés) (Tabela 1). Caso típico é o de Ana Ludovina da
Assunção. Em 1897, consta no seu inventário 9.700 pés de café, que representava 10%
do valor de seus bens, enquanto os animais (bovinos, equinos e suínos) correspondiam a
7,72% e as terras e benfeitorias constituíam a parte mais representativa da riqueza
(82,28%, totalizando 155:089$000 (cento e cinquenta e cinco contos e oitenta e nove
réis).1
A Tabela 2 demonstra os principais cafeicultores da última década do século
XIX (1890-1890). Uma grande lavoura – considerando a região – somava 210.000 pés
de café, o que certamente era uma exceção. As demais variavam em torno da média
acima citada. Percebe-se que os investimentos seguiram crescendo, haja vista as
quantidades de arrobas embarcadas na ferrovia2 (Tabela 7). Mas, os passos eram dados
com certa parcimônia, diante da conjuntura propícia os preços da exportação e da
disponibilidade de créditos. Isso tudo sem prejuízo da saída – também via ferrovia – dos
produtos destinados ao mercado interno (alimentos, animais, toucinho, fumo: ver
Tabelas 8, 9, 10 e 11).
Na virada do século XIX para o XX eram paupáveis os danos (e os bônus
menos visíveis) decorrentes das estripulias implementadas pelos republicanos. “O
panorama econômico do novo regime, especialmente em vista dos sonhos e promessas
que havia produzido, parecia trazer apenas perplexidade e desalento”. (FRANCO,
2012:182)
“... a situação geral da economia não era nada boa, sobretudo em
São Paulo (...): o excesso de crescimento no plantio de café expandia
demasiadamente a oferta e fazia cair os preços, com isso depreciando
ainda mais o câmbio e fazendo crescer a inflação. A produção de café
tinha aumentado de uma média de cerca de 2,8 milhões de sacas em
1890-1896 para 6 milhões entre 1897 e 1900, deixando evidente que
havia um desequilíbrio ‘estrutural’ no mercado de café, com uma
tendência à superprodução apenas agravada pela depreciação
progressiva do mil-réis.” (FRANCO, 2012:183)
Havia um desequilíbrio entre a crescente oferta do café brasileiro e a capacidade
de absorção do mercando internacional. Somado a isso a adoção de políticas
governamentais (influenciadas pela miopia da elite cafeeira), entre elas as depreciações
1 AHMF – INV. – Inventariado: Ana Ludovina da Assunção. Inventariante: João Diogo Garcia Martins. Processo 68, 1º Ofício, 1897. 2 Os dados referentes aos carregamentos da ferrovia – Companhia Mogiana – foram gentilmente cedidos pelo Prof. Dr. Pedro Geraldo Tosi, docente da UNESP-Universidade Estadual Paulista.
exageradas do câmbio, visando a manutenção das exportações. Na prática incentivava
novos investimentos no complexo cafeeiro.
“A coincidência de uma queda mais rápida do câmbio do que dos
preços do café criou condições para a expansão da cultura cafeeira
quando o mercado já não podia absorver a quantidade de café
produzida a não ser a níveis ínfimos de preços. (...) Se tomarmos a
média da produção entre as safras de 1900-01 e 1903-04, quando
todo o cafezal se tornou adulto, encontraremos 12,7 milhões de sacas.
A elevação dos preços havia, portanto, dobrado a produção brasileira
em menos de 10 anos.” (DELFIM NETO, 2009:35)
Era preciso um ajuste no sistema bancário, no controle inflação (vista aqui como
o aumento dos preços dos importados decorrentes das desvalorizações do mil-réis), do
problema fiscal, tudo somado à superprodução cafeeira que derrubava os preços deste
importante produto de exportação. Resultado: adoção de uma política deflacionária e
saneamento das finanças pelos ministros da Fazenda Rodrigues Alves e Joaquim
Murtinho, a partir dos diagnósticos:
“(...) conforme trechos clássicos de relatórios da Fazenda [de
Joaquim Murtinho], [os problemas] tinham a ver com o ‘excesso de
emissões’, que produziu ‘uma pseudoabandância de capitais’ e, como
resultado disso, o ‘estabelecimento de indústrias artificiais e a
organização agrícola para a produção exagerada de café.”(LUZ,
1980:21 apud FRANCO, 2012:190)
As possíveis soluções viriam do chamado “darwinismo econômico”:
“tratava-se de deixar perecer essas indústrias e de operar uma
redução na produção de café, de modo a promover ‘a concorrência
entre os diversos lavradores, produzindo por meio de liquidações a
seleção natural, manifestada pelo desaparecimento dos inferiores e
pela permanência dos superiores.” (LUZ, 1980:21 apud FRANCO,
2012:190)
Juntamente com os ajustes parcialmente alcançados com a política recessiva
calhou a melhora do contexto internacional entre 1902-1906 – Rodrigues Alves
presidente e Leopoldo Bulhões ministro da fazenda – facilitando a captação de
empréstimos e investimentos externos. Mas, ampliavam os desafios da cafeicultura,
resultando no famoso Convênio de Taubaté (1906) – “política de aquisição financiada
e retenção de estoques excedentes de café, visando a sustentação dos preços”.
(FRANCO, 2012:194) Flagrante contradição entre a política ortodoxa do governo e o
poder dos cafeicultores. Destarte as polêmicas e análises econômicas e históricas sobre
o Convênio, fato é que até 1913 os preços do café exportado foram crescentes.
As grandes negociatas que visavam a proteção da cafeicultura, nas duas décadas
iniciais do século XX – 1900-1920 -, influenciaram de forma parcial os investimentos
na fronteira agrícola. No município de Franca, os investimentos continuaram gradativos
(e não desenfreados), sendo que os principais cafeicultores não faziam frente aos
grandes produtores de outros municípios do estado, como Ribeirão Preto, Sertãozinho
(ver Tabela 6) e Casa Branca (FONTANARI, 2012).
Em Franca, na década de 1901-1910, constatava-se 340.858 cafeeiros
registrados em inventários post-mortem. Nesse período, a média de pós por inventário,
passou para 13.109 unidades (lembrando que na década de 1890-1900 a média era de
8.179 pés) (Tabela 1). Maria Baldasari era uma cafeicultura de padrão médio nos anos
1901-1910. Possuía 14.000 pés de café, avaliados em 3:500$000, que correspondia a
18,45% do total de seus bens. O restante era composto de imóveis (13:863$000),
benfeitorias (400$000), estoques de café e cereais (1:099$470) e objetos pessoais
(100$000).3
Na outra década -1911-1920 – o total de pés de café registrados nos inventários
aumentou para 1.870.270 unidades. No entanto, a média de pés de café por inventário
passou a ser de 30.165.
Um produtor com lavoura corresponde à média, entre 1911-1920, era Theodoro
Martinês Tristão que possuía 31.423 cafeeiros, avaliados em 35:000$000. Além da
lavoura possuía em suas propriedades 50 bovinos e 2 equinos (5:475$000). Contudo, o
valor dos seus bens concentrava-se em imóveis rurais e urbanos, que somavam
3 AHMF – INV. – Inventariada: Maria Baldassari. Proc. 779, 2º Ofício, 1908.
127:900$000. O proprietário também possuía 12:100$000 em dinheiro. Os cafezais
tinham o peso de 19,33% no total da riqueza.4
Há que se considerar havia alguns poucos proprietários rurais concentravam boa
parte das lavouras o que certamente destorce os valores médios. A realidade era que a
predominância das lavouras – cálculo da moda – ficava em torno de 4.000 pés, e a
mediana 4.500 (Tabela 1). Conforme a Tabela 5, no período 1890-1920 a maioria dos
proprietários (53,12%) eram pequenos plantadores de café, que possuíam até 5.000 pés.
Em contrapartida, alguns poucos produtores concentravam as grandes lavouras: 5,4%
tinham entre 100.000 e 400.000 pés. Percebe-se, então, uma pulverização não equitativa
do número de pés de café entre pequenos, médios e grandes proprietários. E mesmo
entre os grandes donos de terras os investimentos não eram focados somente na
rubiácea. Ou seja, a continuidade da produção de alimentos para o mercado interno
permaneceu frequente, conforme os dados da ferrovia até 1918 (Tabelas 7 a 11).
Ao retornar à conjuntura, após o fim da Primeira Guerra a economia brasileira
sofreu um vai-e-vem de situações entre expectativas favoráveis e necessidades de
ajustes frente o novo panorama internacional que visava a estabilização e a
modernização dos setores financeiros e produtivos. Ora a prioridade era a continuidade
da proteção da cafeicultura mesmo diante de safras cada vez maiores, o que tornava um
círculo vicioso: novos empréstimos internacionais para financiar estoques e a chegada
de safras volumosas que requeriam a ampliação desta política. Ora “empreender
soluções possíveis na ausência de apoio externo [como] uma violenta contração de
crédito, especialmente durante 1925 e 1926, apenas comparável à empreendida por
Joaquim Murtinho na virada do século.” (FRANCO, 2012:216)
Conforme as estatísticas do governo do estado de São Paulo sobre o número de
cafeeiros produzindo na década de 1920 (Tabela 6) – comparando-se com outros
municípios – no caso de Franca o crescimento foi gradativo a exemplo das décadas
anteriores. Muito provavelmente grande parte das lavouras de café já estavam formadas
e os novos investimentos não teriam sido muito vultosos, mesmo ainda havendo terras
disponíveis. A “concorrência” com os investimentos tradicionais e o comedimento dos
proprietários fazia da região um aceiro à expansão desregrada da cafeicultura paulista
4 AHMF – INV. – Inventariado: Theodoro Martinês Tristão. Inventariante: Maris Christina de Jesus. Proc. 969, 2º Ofício, 1919.
(infelizmente aqui faltam comparações com estudos sobre o lado mineiro da fronteira –
Minas Gerais).
Pelo exposto, é notório que, durante o período tratado 1889-1930, a cafeicultura
ganhou importância considerável no município de Franca. Mas, os proprietários
continuaram a partilhar suas terras em investimentos diferenciados, como sempre
fizeram desde longa data. Os negócios com o gado bovino, ramo mais tradicional ao
norte do rio Sapucaí (Município de Franca e arredores), servia como uma atividade mais
segura diante dos possíveis reveses do mercado. A produção de cereais abastecia as
famílias dos proprietários, dos empregados (agregados, colonos) e gerava lucros com os
excedentes. O café servia como uma atividade rentável, porém, sensível às variações de
preços e de produção decorrentes do clima como as geadas. Dois exemplos típicos
podem dar boa noção sobre as estratégias adotadas pelos proprietários de terras.
O primeiro exemplo, a fazenda Sapucahy (Tabela 12), que em 1916, pertencia a
Dominiciano José da Silva e dona Maria Hipólita Nogueira, localizada no município de
Patrocínio Paulista (divisa com Franca), à oeste da Serra da Cubiça – Latitude 20º e
Longitude 47º - era uma vasta extensão de terras, sendo 160 alqueires de cultura e 1ª
sorte, 1.284 alqueires de 2ª sorte, 210 alqueires de 3ª sorte, e, mais 300 alqueires de
João de Faria (Dr.) Cândido Cyrino de Oliveira Hygino de Oliveira Caleiro Brandão & Irmão João T. Pinto de Carvalho Affonso de Lima Guimarães José Alves Guimarães Júnior (Dr.) João M. Alves Nepomuceno Leopoldo Pilares Martiniano Francisco da Costa Manuel Dias do Prado Vicente de Carvalho (Dr.) Gastão de Souza Mesquita (Dr.) André Martins & Andrade Vilella Antonio Flávio Martins Ferreira Francisco Ultramar Vallim Joaquim Garcia Lopes da Silva José Pereira Leite da Silva Antônio da Costa Valle Andrade Silva & Cia. Aristides da Silva Belém Candido Ramos Ferreira de Abreu Elias Antonio Elizeu Moreira Francisco Gomes dos Reis Gabriel A. Costa & Irmão Luciano Vieira Santiago José Christiano Barreto José Diniz de Medeiros
Total 2.044.000 Fonte: M. Franco (org.). Almanach da Franca (1902). p. 177-84.
Tabela 4 Maiores produtores de café de Ribeirão Preto(SP) - 1914
Ordem Cafeicultor Pés de café Arrobas 1 Cel. Francisco Schimidt(*) 6.075.500 405.700 2 Cia. Agrícola Dumont(*) 3.999.990 301.000 3 Dr. Martinho Prado Júnior (herdeiros) 2.112.700 160.000 4 D. Francisca do Val 977.000 60.000 5 Cel. Manoel Maximiano Junqueira 696.000 50.000 6 D. Iria Alves Ferreira 693.000 48.000 7 Cel. Joaquim da Cunha Diniz Junqueira 650.000 50.000 8 Cel. Joaquim Firmino Diniz Junqueira 634.400 50.000 9 Cel. Francisco Maximiano Junqueira 624.859 43.000 10 Macedo & Cia. 600.000 42.000 11 Uchôa & Irmão 500.000 40.000
Total 17.563.449 1.258.700 (*) inclui Sertãozinho. Fonte: Almanach Ilustrado de Ribeirão Preto. Ribeirão Preto: Sá Manaia & Cia, 1914 apud Luciana Suarez Galvão Pinto. Ribeirão Preto: a dinâmica da economia cafeeira de 1870 a 1930, p.84.
Tabela 5 Distribuição do número de pés de café por inventário
1890-1920 Pés de café Número de inventários % de inventários 30 - 1.000 17 15,31
1.001 a 2.000 17 15,31 2.001 a 3.000 09 8,10 3.001 a 4.000 07 6,30 4.001 a 5.000 09 8,10 5.001 a 10.000 19 17,11
10.001 a 15.000 10 9,00 15.001 a 20.000 03 2,70 20.001 a 30.000 05 4,50 30.001 a 40.000 03 2,70 40.001 a 50.000 02 1,80
50.001 a 100.000 04 3,60 100.001 a 200.000 04 3,60 200.001 a 300.000 01 0,90 300.001 a 400.000 01 0,90
Totais 111 100,00 Fonte: AHMF - Arquivo Histórico Municipal de Franca HMF – Inventários post-mortem.
Tabela 6 Número de cafeeiros produzindo –
Nordeste do Estado de São Paulo - 1909-1930
Anos/Municípios Franca Patrocínio Pta. Batatais Ribeirão Preto Sertãozinho
1928-1929 15.265.400 2.392.250 9.253.360 31.202.345 15.260.500 FONTE: SECRETARIA DA AGRICULTURA, INDÚSTRIA E COMMÉRCIO DO ESTADO DE SÃO PAULO. DIRECTORIA DE INDÚSTRIA E COMMÉRCIO. O CAFÉ. ESTATÍSTICA DE PRODUÇÃO E COMÉRCIO, 1929. SÃO PAULO: Escolas Profissionais do Lyceu Corações de Jesus, 1930.
Tabela 7 Taxa de crescimento – Café embarcado na Mogiana (Estação Franca) – Ton.
1890-1917 – (Ano 1890 = base 100) Período Tonelada % Tx. Crescimento
Fonte: RCM – Relatórios da Diretoria da Companhia Mogyana de Estradas de Ferro.
Tabela 12 Fazenda Sapucay (Cubiça) – 1916
Alqueires Hectares Qualidade da terra Valor (1.000 réis) 170 441.40.00 Cultura de 1ª sorte 51:600$000
1.284 3.107.28.00 Terras de 2ª sorte 60:480$000 210 508.20.00 Terras de 3ª sorte 16:800$000 300 726.00.00 Serrado 9:000$000
6 14.52.00 ? 450$000 3 7.26.00 Terras de campo 200$000 ? ? Uma gleba de terras 3:000$000
Nº de pés de café Condições do cafezal Valor (em 1.000 réis) 41.000 Pés de café de 2 anos 16:800$000 40.000 Pés de café formados 32:000$000 66.000 Pés de café de 1 ano e meio 17:200$000 50.000 Pés de café formados em bom estado 40:000$000
Gado 60 Bois de carro 4:800$000
250 Vacas criadeiras 12:000$000 190 Bezerros 3:040$000 440 Garrotes de 2 a 3 anos 17:600$000
45 Burros 5:400$000 4 Poltros (em amansamento) 320$000
Fonte: AHMF – INV.
Tabela 13 FAZENDAS Santa Amélia, Jaguarão e Buritys
Fazendas Sta. Amélia 30 72.60.00 Terras de cultura 6:000$000 Sta. Amélia 2 4.84.00 Terra de cultura (arados) 500$000 Sta. Amélia 7,5 19.36.00 Terras emparelhadas 1:125$000 Sta. Amélia 18 43.56.00 Terras de cultura em pasto 1:440$000 Sta. Amélia 44 106.48.00 Terras de campo (em campim
gordura) 2:200$000
Sta. Amélia 20 48.40.00 Terras de campo (em capim gordura)
500$000
Jaguarão 155 193.60.00 Terras de cultura 21:550$000 Jaguarão 80 193.60.00 Terras de campo 4:000$000 Jaguarão 3 7.26.00 Terras c/benfeitorias 3:500$000 Buritys 50 121.00.00 Terras de cultura 4:500$000 Buritys
350 847.00.00 Terras de campo 11:250$000
760 1.839.20.00 56:565$000 Fazenda Nº pés de café Condições do cafezal Valor (1.000 réis) Faz. Sta. Amélia 95.000 Pés de café 85:500$000 Faz. Sta. Amélia 19.000 Pés de café com 2 anos 3.800$000 Faz. Sta. Amélia 60.000 Pés de café c/terreno 42:000$000 Faz. Sta. Amélia 19.000 Pés de café c/ terreno 2:850$000
GADO 68 Bois de carro 6:120$000 15 Bois velhos 1:050$000 2 Touros 140$000
SECRETARIA DA AGRICULTURA, INDÚSTRIA E COMMÉRCIO DO ESTADO DE SÃO PAULO.
DIRECTORIA DE INDÚSTRIA E COMMÉRCIO. O CAFÉ. ESTATÍSTICA DE PRODUÇÃO E
COMÉRCIO, 1929. SÃO PAULO: Escolas Profissionais do Lyceu Corações de Jesus, 1930.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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