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A ORIGEM HISTRICA DO SURSIS NO BRASIL
Sumrio: Introduo 1 Problemtica da priso e o sursis 2
Conceito do sursis 3 Natureza jurdica do instituto 4 Escoro
histrico do instituto 5 Sistemas 6 O sursis no Brasil:
origem
histrica 7 Decreto n 16.588, de 6 de setembro de 1924 - 8
Concluses Referncias.
INTRODUO
O tema sob anlise o instituto da suspenso condicional da
pena. Primeiramente, ser abordada a questo da priso e a sua
inaptido para ressocializar os criminosos, sobretudo os
condenados
primrios s penas privativas de liberdade de curta durao. Em
seguida, sero expostos o conceito, a natureza jurdica, o
escoro
histrico e os sistemas do sursis.
Por fim, haver a abordagem acerca do instituto no Brasil, no
apenas o seu histrico, como tambm alguns aspectos do
tratamento
que lhe foi dado por meio do primeiro diploma que tratou da
matria,
a saber: o Decreto n 16.588 de 1924.
1- A PROBLEMTICA DA PRISO E O SURSIS
Importa destacar que a priso sempre um tema incmodo
para os estudiosos do Direito Penal. Por um lado, muitos afirmam
ser
ela imprescindvel para a boa ordem social, por outro, alegam que
a
mesma se encontra em crise, em razo de uma srie de
inconvenientes j por todos sabidos.
Segundo Von Ihering, a histria da pena a histria de sua
constante abolio. Todavia, a histria da pena de priso no
parece
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estar associada sua progressiva abolio, mas sim sua reforma,
calcada na humanizao da represso.
Michel Foucault, em Vigiar e Punir, dedicou um de seus
captulos para o tratamento da mitigao das penas e preleciona
que os reformistas do sculo XVIII proferiram diversas crticas
pena
de priso, a exemplo de ser intil e at nociva sociedade.
Outrossim, ela cara, mantm os condenados na ociosidade e
multiplica-lhes os vcios. Outra desvantagem da recluso
apontada
por seus crticos consiste na sua escurido, assunto de
desconfiana
para os cidados, dado que supem serem nela cometidas grandes
injustias.[1]
No entanto, a deteno se tornou a forma essencial de
castigo.[2] Foucault aponta que, no Cdigo Penal francs de 1810,
a
priso ocupa quase todo o campo das punies possveis. [3]
Note-se que a substituio das diversas penas em priso no foi
privilgio da Frana. Foucault aduz que essa mudana tambm
ocorreu, da mesma forma, nos pases estrangeiros.
Cabe enaltecer a obra Dos delitos e das penas, de Cesare
Bonesana, mais conhecido como o Marqus de Beccaria, tendo em
vista a sua contribuio para o processo de humanizao das
penas.
Referida obra influenciou diversas legislaes estrangeiras, no
sentido
de as penas serem especficas e variadas, dependendo no da
simples vontade do legislador, mas da natureza das coisas.
Tal livro foi escrito h mais de dois sculos, mas nele j
se proclamavam e defendiam os direitos do homem.[4]
Beccaria apresentou alguns postulados em relao s penas.
Dentre eles, h a meno do contrato social, afirmando que os
cidados, por viverem em sociedade, cedem apenas uma parcela
de
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sua liberdade e direitos. Em razo disso, no se deveriam
aplicar
penas que atingissem direitos no cedidos, como ocorria nos casos
da
pena de morte e das sanes cruis.
Outrossim, Beccaria questionou as penas de confisco e as
infamantes, bem como indicou uma finalidade reformadora para
as
penas.
Houve outros pensadores de grande importncia na
reestruturao das prises, destacando-se John Howard e Jeremy
Bentham.
As ideias de Howard contriburam para o advento de uma linha
de inteleco que almeja a criao de estabelecimentos adequados
pena privativa de liberdade, conforme afirma Vladimir Brega
Filho[5],
em sua tese de doutorado:
As idias de Howard expostas no livro e nas
suas viagens, onde mantinha contato com reis governantes,
influenciou a criao de uma corrente
de pensamento que buscava criar estabelecimentos apropriados ao
cumprimento da
pena privativa de liberdade, tendo como base o isolamento, o
trabalho, a instruo.
Dentre as contribuies de Bentham, cumpre citar a sua
idealizao de um estabelecimento penitencirio com o nome de
panptico, no qual o diretor, situado no centro da construo e
sem
ser visto, poderia observar, ao mesmo tempo, todos os
presidirios.
Foucault descreve o panptico proposto por Bentham e
identifica os prisioneiros como atores e as celas como
pequenos
teatros, conforme vejamos:
O Panptico de Bentham a figura arquitetural dessa composio. O
princpio conhecido: na
periferia uma construo em anel; no centro, uma torre; esta
vazada de largas janelas que se
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abrem sobre a face interna do anel; a construo
perifrica dividida em celas; cada uma atravessando toda a
espessura da construo; elas
tm duas janelas, uma para o interior,
correspondendo s janelas da torre; outra, que d para o exterior,
permite que a luz atravesse a cela
de lado a lado. Basta ento colocar um vigia na torre central, e
em cada cela trancar um louco, um
doente, um condenado, um operrio ou um escolar. Pelo efeito da
contraluz, pode-se perceber
da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as
pequenas silhuetas cativas nas celas
da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que
cada ator est sozinho,
perfeitamente individualizado e constantemente visvel.
Alm disso, Bentham preocupou-se com a organizao do
trabalho, a educao profissional, a instruo moral e a religiosa
dos
reclusos.
Incumbe informar que o Livro V das Ordenaes Filipinas previu
a pena de morte para inmeras infraes. J o Cdigo Criminal de
1830 previu a pena de morte, mas sua aplicao foi reduzida
para
delitos de insurreio, homicdio agravado e latrocnio, sendo
tambm
suprimidas as penas corporais. A pena privativa de liberdade
passou
a ser a principal sano.[6]
O Cdigo Penal de 1890 aboliu a pena de morte e trouxe como
sano principal a pena privativa de liberdade, a qual possua
quatro
modalidades: priso celular, recluso, priso com trabalho
obrigatrio
e a priso disciplinar destinada aos menores de 21 anos.
Ademais, o Cdigo Penal da Repblica instituiu o limite para o
cumprimento da pena privativa de liberdade, que no poderia
exceder trinta anos, consoante se depreende do art. 41 do
referido
diploma.
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Destarte, verifica-se que a priso foi convertida no
principal
modelo de todo o sistema repressivo, considerada como a
melhor
soluo para a represso ao crime.
Todavia, o sistema penitencirio nunca foi capaz de readaptar
o
prisioneiro vida em sociedade. Essa inaptido para a
recuperao
dos criminosos fica mais manifesta quando se trata de
condenados
primrios s penas privativas de liberdade de curta durao, j
que
acabam sendo influenciados por presos mais perigosos.
Diante da necessidade de se evitar esse problema, desde o
ltimo quartel do sculo XIX, os penalistas e legisladores tm
se
preocupado em descobrir medidas substitutivas para a priso
curta.
Basileu Garcia[7] aduz que o sucedneo da priso que obteve
maior
simpatia dos doutrinadores e do prprio Direito objetivo foi
a
suspenso condicional da pena, tambm denominada condenao
condicional, ou sursis, conforme a consagrada expresso
francesa.
2 CONCEITO DO SURSIS
Chrysolito de Gusmo[8] apresenta, em seu livro Da
Suspenso Condicional da Pena[9], de 1926, uma ampla definio
da suspenso condicional da pena, conforme vejamos:
1. O substitutivo penal que se concretisa na
condemnao condicional ou no sursis (condicional
sobreestao da pena), o instituto jurdico pelo qual, deante dum
crime qualquer ou de certas figuras delictuosas, tendo-se em vista
as condies personalissimas do delinquente, em determinados
casos e de accordo com condies legaes genricas ou prefixas
determinadamente, pe-se em pratica,
por acto declaratrio e ordenatrio da autoridade jurisdiccional,
a condicional renuncia, total ou
parcial, por parte do Estado, do poder de punir, seja quanto ao
poder declaratrio da
imputabilidade e responsabilidade penal, seja quanto ao seu
jurdico conseqente a funco
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estatal de imposio e execuo das sances
penaes.
Anbal Bruno define o sursis nos seguintes termos:
Suspenso condicional da pena o ato pelo qual o juiz,
condenando o delinquente primrio, no perigoso, a pena
detentiva
de curta durao, suspende a execuo da mesma, ficando o
sentenciado em liberdade sob determinadas condies[10].
No obstante a relevncia de tais conceitos, pode-se
tambm definir o sursis como a suspenso condicional da execuo
da pena privativa de liberdade, por meio da qual o ru se
submete,
durante o perodo de prova, fiscalizao e ao cumprimento de
condies judicialmente estabelecidas.
3- NATUREZA JURDICA DO INSTITUTO
No que tange natureza jurdica do instituto sob apreo, h
inmeras posies doutrinrias, dentre as quais se destacam:[11]
a) Instituto de poltica criminal : trata-se de execuo
mitigada
da pena privativa de liberdade. O condenado cumpre a sano
que lhe foi imposta, mas de forma menos gravosa. Para essa
corrente, cuida-se de benefcio (art. 77, II, do Cdigo Penal
de
1940) e, tambm, de modalidade de satisfao da pena. Neste
sentido: Guilherme de Souza Nucci[12], Supremo Tribunal
Federal e Superior Tribunal de Justia. Essa parece ser a
melhor
posio, no nosso entendimento.
b) Pena : seria uma espcie de pena, embora no prevista no
Cdigo Penal. Posiciona-se neste sentido Jos Mendes[13].
c) Direito pblico subjetivo do condenado: consubstancia-se
em benefcio penal assegurado ao ru. O juiz tem liberdade
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para analisar a presena dos requisitos legais, os quais,
acaso
presentes, impem a concesso do sursis. Neste sentido: Jos
Frederico Marques, Magalhes Noronha, Heleno Cludio Fragoso
e Delmanto.[14]
4- ESCORO HISTRICO DO INSTITUTO
Alguns autores, como Chrysolito de Gusmo[15] e Hugo
Auler[16], consignam que o sursis possui afinidade com
institutos
aparentemente semelhantes que vigoraram no Direito Romano e
no
Direito Canonico, a exemplo da severa interlocutio. No
direito
romano, o pretor tinha a faculdade de substituir, nos crimes
de
incndio provocados por negligncia, a pena de fustigao pela
severa interlocutio, que consistia numa admoestao.
Ento, verifica-se que, na antiga Roma, j havia a preocupao
de se substituir a pena corporal. No entanto, foi no sculo XIX
que o
instituto em apreo adquiriu contornos mais precisos e prximos
da
disciplina atual.
Os doutrinadores divergem no que se refere s fontes do
instituto. Uns fazem-no remontar aos Estados Unidos da Amrica
do
Norte, na metade do sculo XIX. Mas os norte-americanos
adotaram
a suspenso da sentena e no da execuo da condenao, como se
d na nossa legislao.
O instituto, nos moldes do que possumos, surgiu na Frana
com o Projeto Brenger, de 26 de maio de 1884, que foi origem
do
sistema continental europeu, ao qual nos filiamos.
A Blgica transformou essa proposta em lei, em 31 de maio
1888, antecipando-se Frana, que s veio a adot-la em sua
legislao no ano de 26 de maro 1891. Dessa forma, o sistema
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passou a ser conhecido pelo nome de belgo-francs, franco-belga
ou
continental europeu.
5- SISTEMAS
Diante do exposto, verifica-se que h dois sistemas gerais
acerca do instituto da suspenso condicional da pena, a saber,
o
anglo-americano e o europeu continental, tambm chamado
belgo-
francs ou franco-belga.
a)Sistema anglo-americano ou probation system.
Na Inglaterra e nos Estados Unidos, a prtica nesse assunto
iniciou-se no mecanismo das leis assistenciais dos menores
infratores, estendendo-se, depois, ao Direito Penal comum,
como
medida de poltica criminal igualmente proveitosa para o
criminoso
adulto.
Segundo este sistema, o magistrado, sem aplicar pena,
reconhece a responsabilidade penal do ru, submetendo-lhe a
um
perodo de prova, no qual, em liberdade, deve ele
comportar-se
adequadamente. Se o acusado no agir de forma correta, o
julgamento retomado, com a conseqente prolao de sentena
condenatria e imposio de pena privativa de liberdade.[17]
b) Sistema franco-belga.
Neste sistema, o ru processado normalmente, e, com a
condenao, a ele atribuda uma pena privativa de liberdade. O
juiz, entretanto, levando em conta condies legalmente
previstas,
suspende a execuo da pena por determinado perodo, dentro do
qual o acusado deve revelar bom comportamento e atender as
condies impostas, pois, caso contrrio, dever cumprir a sano
penal.[18]
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Este foi o sistema adotado na nossa legislao, segundo
registram os penalistas. O Ministro Joo Lus Alves[19] esclareceu
os
motivos da opo pelo sistema francs:
Foi preferido o regime francs do sursis suspenso da condenao, ao
ingls da probation, suspenso do julgamento, por ser ste, na frase
de
douto tratadista, menos garantidor, quer em relao ao criminoso,
quer em relao
sociedade; no tendo o efeito jurdico de determinar a
reincidncia, o que inconveniente.
Insta mencionar que Basileu Garcia[20] e Whitaker[21]
entendem o sistema belgo-francs mais vantajoso do que o
anglo-
americano, uma vez que naquele no se suspende o processo,
mas
sim a execuo da pena, ou seja, h uma sentena condenatria
antes da suspenso. Os autores ressalvam que pode acontecer
de,
durante o processo, ser constatada a inocncia do imputado e,
no
sendo ele culpado, qualquer restrio sua liberdade seria
injusta.
H doutrinadores que ainda citam outros sistemas, a exemplo
do probation of first offenders act, segundo o qual o juiz
determina a
suspenso da ao penal, permitindo a liberdade do acusado,
sem,
contudo, declar-lo culpado. Durante a suspenso, o ru deve
apresentar boa conduta, sob pena de ser reiniciada a ao
penal.
Esse sistema foi acolhido, no Brasil, no tocante suspenso
condicional do processo, disposta no art. 89 da Lei
9099/95.[22]
No entanto, o acima citado sistema refere-se suspenso do
processo, e no da pena.
Hugo Auler[23] e Luiz Regis Prado[24] apresentam o sistema
alemo como o terceiro regime bsico do sursis, segundo o qual
se
determinava que a pena fosse fixada pelo magistrado, mas
afastava a
condenao do acusado. O tipo alemo uma variante dos tipos
franco-belga e anglo-saxo porque manda que o juiz apure a
autoria,
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determine a responsabilidade e fixe a pena correspondente, mas
no
profira a sentena.
6 - O SURSIS NO BRASIL: ORIGEM HISTRICA
Ressalte-se, primeiramente, que no houve previso do
instituto sob anlise no Livro V das Ordenaes Filipinas, no
Cdigo
Criminal de 1830 e nem no Cdigo Penal de 1890. Ele s surgiu
na
nossa legislao em 1924.
No Brasil, foi Esmeraldino Bandeira, deputado federal na
legislatura de 1906-1908, quem primeiro demonstrou preocupao
com o tema, dado que em 18 de julho de 1906 apresentou Cmara
dos Deputados um projeto de lei concernente suspenso
condicional
da pena. Segundo o prprio autor, no se tratava de ideia sua,
mas
simplesmente da traduo do texto de lei Brenger, tambm
conhecida como lei do sursis [25].
Em relao ao texto original, uma das modificaes feitas por
Bandeira foi a incluso de um requisito de ordem moral para a
concesso da suspenso da pena, que ordenava considerar os
motivos determinantes e as circunstncias do delito na avaliao
do
sursis. O benefcio no seria concedido se tais circunstncias
ou
motivos revelassem a perversidade ou corrupo do carter do
delinquente.[26]
Diante disso, percebe-se a adeso do autor do projeto teoria
positiva da responsabilidade penal, segundo a qual a ao
humana
decomposta por fatores fsico, biolgico e social, tratada por
Enrico
Ferri, em sua obra Sociologia Criminale.
Assim, o projeto de 1906 admitia o sursis, considerando-se
os
seguintes requisitos : a)condenao a uma pena de multa,
recluso,
priso com trabalho ou priso celular; b) no sendo a pena superior
a
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cinco anos; c)sendo o condenado primrio em crime comum; d) se
as
circunstncias e mveis do delito no revelassem perversidade
ou
corrupo de carter por parte do delinquente.
Concedida a suspenso, esta duraria por cinco anos e, no sendo
revogada neste perodo, considerava-se extinta a pena. Sendo, ao
contrrio, revogada a suspenso no perodo de prova, executar-se-ia
a condenao, somada a
uma eventual condenao por novo crime. A suspenso no isentaria o
ru do pagamento de
multa e do adimplemento das obrigaes decorrentes do delito, e
nem compreenderia as
penas acessrias e incapacidades resultantes da condenao;
tampouco impediria que se
considerasse reincidente o ru em caso de condenao
posterior.[27]
No entanto, tal proposta no se transformou em lei.
Posteriormente, Galdino Siqueira ensaiou a adoo do instituto
no art. 39 do seu Projeto de Cdigo Penal Brasileiro, que foi
dado em
1913 publicao.
Decorridos dezesseis anos da apresentao do projeto de
Esmeraldino Bandeira, o Congresso Nacional estava
hipertrofiado,
no conseguia realizar todo o seu trabalho com a devida
celeridade, e
por este motivo, delegou alguns assuntos para o Poder
Executivo[28].
Assim, o Congresso Nacional, sob o governo de Epitcio
Pessoa,
elaborou e votou lei autorizando amplamente o Poder Executivo
a
promover a reforma de todo o sistema penitencirio, tornar
efetivo o
livramento condicional e criar a suspenso da condenao, por
meio
do Decreto n 4.577, de 5 de setembro de 1922. Entretanto,
nenhuma lei a esse respeito foi criada durante seu governo.
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Epitcio Pessoa foi substitudo por Arthur da Silva Bernardes,
que escolheu para Ministro da Justia o civilista Joo Lus Alves
que,
valendo-se da autorizao legislativa, submeteu aprovao do
Presidente da Repblica o projeto de lei que se transformou
no
Decreto n 16.588, de 06 de setembro de 1924, o qual consagrou
a
adoo do instituto ento denominado de condemnao
condicional[29] em nossa legislao.
Chrysolito de Gusmo critica a demora de mais de dezoito anos
para a introduo do instituto na legislao brasileira, aduzindo
que
no se pode justific-la com a existncia de uma longa e penosa
elaborao legislativa, pois se o projeto de Esmeraldino Bandeira
foi
uma cpia da lei francesa, o Decreto que instituiu o sursis no
Brasil
uma transplantao, ligeiramente modificada[30].
Cumpre mencionar que todas as normas desta nova legislao
foram posteriormente codificadas no captulo V do ttulo XI do
Decreto n 16.751, de 31 de dezembro de 1924, que criou o
Cdigo
de Processo Penal, bem como nos artigos 51 e 52 da
Consolidao
das Leis Penais, organizada pelo desembargador Vicente Piragibe
e
aprovada pelo Dec. n 22.213, de 14 de dezembro de 1932.
7 Decreto n 16.588, de 6 de setembro de 1924
O Decreto n 16.588/1924 seguiu o sistema franco-belga. Isso
pelo motivo de que tal diploma visava estabelecer e definir
a
responsabilidade penal do ru, mas, ao mesmo tempo, evitar a
execuo da pena imposta, quando determinadas condies
atinentes
ao indivduo e espcie do crime se apresentavam.
Comentando o Decreto sob anlise, Whitaker[31] aduz que a lei
quer evitar o contato dos rus primrios e de bom carter com
outros
mais perigosos. Segundo o autor, as prises curtas so
inconvenientes, porque no tm o tempo preciso para a correo
dos
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criminosos e, entretanto, degradam, humilham e corrompem.
Alm
disso, a vigilncia judicial mera advertncia, pena moral, que
pode
provocar o arrependimento no criminoso. Por fim, o autor
aponta
como outro motivo do instituto a individualizao do castigo.
Assim, segundo ensina Whitaker, o fundamento do instituto no
somente o interesse do delinquente em no ter sua liberdade
suprimida, ainda que limitada, mas, sobretudo, o interesse
da
sociedade, que visa regenerar o criminoso.
Vale citar as finalidades do instituto sob anlise, apontadas
pelo
ento Ministro da Justia, Joo Luiz Alves, na Exposio de
Motivos
do Decreto n 16.588, de setembro de 1924:
1)No inutilizar, desde logo, pelo cumprimento da pena, o
criminoso primrio, no corrompido e
no perverso;
2) Evitar-lhe, com o contgio na priso, as
funestas e conhecidas conseqncias desse grave mal;
3)Diminuir o ndice da reincidncia, pelo receio
de que se torne efetiva a primeira condenao.[32]
Cabe ressalvar que nem todas as infraes penais possuam o
privilgio da suspenso. Os delitos militares foram excludos,
tal
como fizeram as legislaes da Blgica e da Frana. Argumentavam
tal excluso no sentido de que, alm da falta de autorizao
legal
para o instituto abranger as penas militares, o fundamento
do
contgio da priso no podia ser invocado para os militares, pois
as
prises realizavam-se em lugares onde habitualmente passavam
a
sua existncia profissional (praas de guerra, quartis, etc).
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Ressalte-se que, atualmente, o instituto do sursis aplicado
para os delitos militares e possui previso nos arts. 84 a 88
do
Cdigo Penal Militar.
Os requisitos exigidos pelo Decreto 16.588 para a suspenso
ser decretada, consoante o estatudo no art. 1, foram:
a) Condenao primria;
b) Pena de priso ou multa conversvel em priso, at um ano;
c) Carter no perverso ou corrompido do acusado.
No que se refere ao primeiro requisito, cumpre informar que
a
condenao anterior que impedia a suspenso a que tinha como
pena a priso e a multa conversvel. O decreto 16.588, em seu
art.
1 dispe em caso de primeira condemnao s penas de multa
conversvel em priso ou de priso de qualquer natureza. Assim,
a
condenao anterior somente interdio, suspenso ou perda de
emprego no servia de obstculo para a concesso do sursis.[33]
J no que tange ao segundo requisito, vale salientar que o
decreto se referia pena que fora imposta, e no pena
abstrata.
Outrossim, a priso podia ser de qualquer natureza, j que a o
decreto no apontava a sua espcie.
Quanto ao terceiro requisito, no apenas da natureza do
delito que se devia deduzir a existncia da perversidade ou
corrupo
do acusado, mas sim do exame das condies da pessoa (idade,
educao, meio em que vive, etc), das causas do delito e das
circunstncias que o cercaram, tal como versa o art. 1 do
decreto.
Destaca-se que no havia suspenso da execuo da pena nos
crimes contra a honra e boa fama, nem contra a segurana da
honra
e honestidade das famlias, por expressa proibio do art. 5 do
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aludido decreto. Esses delitos eram os de injria, calnia,
violncia
carnal, rapto, lenocnio e poligamia.
No tocante oportunidade da concesso do benefcio, podia ela
se dar tanto no momento de ser proferida a sentena
condenatria,
como depois de ter ela passado em julgado, em razo de o art. 1
do
decreto fazer meno expressa no apenas ao juiz, como tambm ao
tribunal.
A jurisprudncia da poca entendia, pacificamente, que podia
ser concedida a suspenso em qualquer tempo, at a final
execuo
da pena, e no apenas na ocasio de ser proferida a sentena
condenatria ou a apelao.[34]
O perodo de prova era de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, no caso
de crime, e de 1 (um) a 2 (dois) anos, na hiptese de
contraveno.
Por ltimo, impende mencionar que o decreto prev a
revogao da suspenso. Chrysolito de Gusmo afirmava que havia
duas hipteses de perecimento da condio resolutiva, quais
sejam,
decadncia e revogao do benefcio legal, dispostas nos 2 e 3
do art. 1 do Decreto regulador do instituto[35]. A
decadncia,
segundo o autor, dava-se quando, aps a concesso da suspenso
e
antes de se tornar inexistente a condenao, verificava-se a
prtica
de uma anterior infrao que deveria ter impedido a concesso
do
benefcio. J a revogao ocorria quando a prtica da infrao
fosse
posterior data da concesso da suspenso.
Nota-se, ento, que o decreto em testilha tratou apenas da
revogao obrigatria, em razo de outra condenao, seja por fato
anterior ou posterior concesso da suspenso condicional da
pena.
De acordo com o 3 do Decreto 16.588, j se entendia que,
com a revogao do sursis, o condenado deveria cumprir
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integralmente a pena que se encontrava suspensa, bem como
pela
outra punio, de forma sucessiva. Ressalte-se que,
atualmente,
tambm no se considera o tempo em que o condenado permaneceu
no perodo de prova, ainda que, nesse intervalo, tenha cumprido
as
condies impostas.
8 CONCLUSES
Ante o exposto, vale declarar que o instituto do sursis
benfico para o nosso sistema penal e penitencirio, j que evita
o
contato dos rus condenados por crime de pequena monta com
delinqentes mais perigosos. Inclusive, a sua adoo favoreceu at
a
certeza da punio, impedindo que juzes, com receio da
promiscuidade dos delinqentes, nas prises, absolvessem
frequentemente acusados de crimes leves e sem
periculosidade.
Tal instituto foi introduzido no nosso ordenamento jurdico em
6
de setembro de 1924, por meio do Decreto n 16.588. O prazo
mximo de durao da condenao para o seu cabimento era de
apenas um ano, diferentemente do Cdigo Penal atual, que exige
o
mximo de dois anos de condenao ou de quatro anos, caso se
trate
de condenado maior de setenta anos de idade ou por razes de
sade.
Alm disso, os perodos de prova do sursis no decreto de 1924
eram menores que os atualmente previstos. Havia dois perodos
de
prova, um para os crimes, outro para as contravenes. No
Cdigo
Penal atual, no h este critrio de distino, pois preferiu-se
adotar
um perodo de prova maior de acordo com a idade (sursis etrio)
ou
com problemas de sade (sursis humanitrio).
Outra distino que pode ser apontada, dentre as diversas
existentes, a de que o Decreto 16.588 previa apenas a
revogao
no caso de outra condenao, seja o fato anterior ou posterior
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17
suspenso e era ela obrigatria. Atualmente, h diversas causas
de
revogao e esta pode ser obrigatria ou facultativa, a depender
do
caso.
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GARCIA, Basileu. Instituies de Direito Penal. 7 ed. rev. e
atual.
So Paulo: Saraiva, 2008, v. I.
GRECO, Rogrio. Curso de Direito Penal. Parte Geral, v.I, 5 ed.
Rio de Janeiro: Impetus, 2005.
GUSMO, Chrysolito de. Da Suspenso Condicional da Pena. Rio de
Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926.
-
18
LINS E SILVA, Evandro. De Beccaria a Filippo Gramatica (uma
viso global da histria da pena), in Sistema Penal para o
terceiro milnio, Rio de Janeiro: Revan, 1991, p. 02.
MARQUES, Jos Frederico. Tratado de Direito Penal, vol.III, 1 ed.
atual. Campinas: Millennium, 1999.
MASSON, Cleber Rogrio. Direito Penal. Parte Geral.
Esquematizado. 2 ed., So Paulo: Mtodo, 2009.
NORONHA, Edgard Magalhes. Direito Penal, v.I, 32 ed, So
Paulo: Saraiva, 1997.
NUCCI, Guilherme de Souza. Individualizao da pena. 2. ed.rev.
atal. e ampl. So Paulo: RT, 2007.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Parte
Geral.7 ed., So Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Sursis e Livramento
Condicional,
1924-1940: a modernizao do direito penal brasileiro. Dissertao
de mestrado, sob orientao do professor associado Jos Reinaldo
de
Lima Lopes, Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo,
2005.
SIQUEIRA, Galdino. Tratado de Direito Penal Parte Geral. Rio de
Janeiro: Jos Konfino Editor, 1947.t.II
WHITAKER, Firmino. Condemnao criminal (sursis). Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1930.
[1] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir histria da violncia nas
prises. Petrpolis: Vozes, 2000, p.94-95.
[2] Idem, p. 95.
[3] Ibidem.
[4] LINS E SILVA, Evandro. De Beccaria a Filippo Gramatica
(uma
viso global da histria da pena), in Sistema Penal para o
terceiro
milnio, Rio de Janeiro: Revan, 1991, p. 02.
-
19
[5] BREGA FILHO, Vladimir. Suspenso Condicional da Pena e
Suspenso Condicional do Processo. Eficcia de cada um dos
institutos. Tese de doutorado, sob a orientao do Prof. Doutor
Dirceu
de Mello, PUC/SP, 2004, p.19.
[6]Idem.
[7] GARCIA, Basileu. Instituies de Direito Penal. 7 ed. rev.
e
atual. So Paulo: Saraiva, 2008, v. I, p. 171.
[8] GUSMO, Chrysolito de. Da Suspenso Condicional da Pena.
Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926, p.01.
[9] Ressalte-se que esta foi a primeira obra no Brasil acerca
do
referido instituto, apesar da rica literatura estrangeira
ento
existente.
[10] Bruno, Anbal. Direito Penal, parte geral, tomo III, 3
ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 1967, p. 169.
[11] Preferimos expor as trs posies apontadas por Cleber
Masson, j que so, ao nosso modo de pensar, as mais
relevantes:
MASSON, Cleber Rogrio. Direito Penal. Parte Geral.
Esquematizado.
2 ed., So Paulo: Mtodo, 2009, p.701.
[12] NUCCI, Guilherme de Souza. Individualizao da pena. 2.
ed.rev. atal. e ampl. So Paulo: RT, 2007, p.307.
[13] Jos Mendes, em 1908, defendeu sua dissertao de
mestrado em que advogava a implementao do instituto no
direito
brasileiro, bem como posicionou-se no sentido de que o sursis
possui
a natureza jurdica de pena, conforme apontado por Ren Ariel
Dotti,
em O Sursis e o Livramento Condicional nos Projetos de Reforma
do
Sistema, Justitia, So Paulo: p. 175-194, jan./mar., 1984.
-
20
[14] Cf PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro.
Parte Geral.7 ed., So Paulo: Revista dos Tribunais, 2007,
p.661.
[15] GUSMO, Chrysolito de. Da Suspenso Condicional da Pena.
Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926, p.02.
[16] AULER, Hugo. Suspenso Condicional da Execuo da Pena.
Rio de Janeiro: Forense, 1957, p. 5 e 6.
[17] MASSON, Cleber Rogrio. Direito Penal. Parte Geral.
Esquematizado. 2 ed., So Paulo: Mtodo, 2009, p.700.
[18] Idem.
[19] ALVES, Joo Luis. Dirio Oficial de 9 de setembro de
1924,
p. 19.746 apud AULER, Hugo. Suspenso Condicional da Execuo
da
Pena. Rio de Janeiro: Forense, 1957.
[20] GARCIA, Basileu. Instituies de Direito Penal. 7 ed. rev.
e
atual. So Paulo: Saraiva, 2008, v. I, p.176.
[21] WHITAKER, Firmino. Condenao criminal (sursis). Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1930, p. 11.
[22] Entende tal como sistema o autor Cleber Rogrio Masson,
Direito Penal. Parte Geral. Esquematizado. 2 ed., So Paulo:
Mtodo,
2009, p. 700.
[23] AULER, Hugo. Suspenso Condicional da Execuo da Pena.
Rio de Janeiro: Forense, 1957, p.90.
[24] PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro.
Parte
Geral.7 ed., So Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 663.
[25] Dirio do Congresso Nacional, 19/07/1906, p. 847 apud
QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Sursis e Livramento
Condicional,
-
21
1924-1940: a modernizao do direito penal brasileiro.
Dissertao
de mestrado, sob orientao do professor associado Jos Reinaldo
de
Lima Lopes, Faculdade de Direito da Universidade de So
Paulo,
2005, p. 185.
[26] QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Sursis e Livramento
Condicional, 1924-1940: a modernizao do direito penal
brasileiro.
Dissertao de mestrado, sob orientao do professor associado
Jos
Reinaldo de Lima Lopes, Faculdade de Direito da Universidade de
So
Paulo, 2005, p. 185.
[27] QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Sursis e Livramento
Condicional, 1924-1940: a modernizao do direito penal
brasileiro.
Dissertao de mestrado, sob orientao do professor associado
Jos
Reinaldo de Lima Lopes, Faculdade de Direito da Universidade de
So
Paulo, 2005, p. 186.
[28] MELLO, Dirceu de. Palestra ministrada em maio de 2005,
no
auditrio Jlio Fabbrini Mirabete, durante o 7. Curso de
Especializao em Direito Penal, promovido pela Escola Superior
do
Ministrio Pblico do Estado de So Paulo apud ALVES, Jamil
Chaim.
Ascenso e declnio do sursis no Brasil : uma anlise histrica.
Disponvel em http:www.lfg.com.br. 18 julho. 2008.
[29] Ressalte-se que alguns autores da poca tambm
denominavam o referido instituto de sobreestao condicional
da
pena, a exemplo de Chrysolito de Gusmo.
[30] GUSMO, Chrysolito de. Da Suspenso Condicional da Pena.
Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926, p. 69.
[31] WHITAKER, Firmino. Condenao criminal (sursis). Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1930, p. 9 e 10.
-
22
[32] SIQUEIRA, Galdino. Tratado de Direito Penal Parte
Geral.
Rio de Janeiro: Jos Konfino Editor, 1947.t.II, p. 863-864.
[33] Cf WHITAKER, Firmino. Condenao criminal (sursis). Rio
de
Janeiro: Freitas Bastos, 1930, p.27.
[34] Cf GUSMO, Chrysolito de. Da Suspenso Condicional da
Pena. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926, p.157 e
158.
[35] Vale notar que o referido decreto menciona apenas o
termo
revogao, e no decadncia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associao Brasileira de Normas
Tcnicas (ABNT), este texto cientfico publicado em peridico
eletrnico deve ser citado da seguinte forma: BRITO, Nayara
Graciela
Sales. A origem histrica do sursis no Brasil. Contedo Jurdico,
Braslia-DF: 09 dez. 2010. Disponvel em:
. Acesso em: 18 jun. 2015.