Notas de aula de análise de demonstrações contábeis UFPE – Professor Gutembergue Leal de Mesquita Semestre 2013.1 Estatísticas no auxílio à análise de demonstrações contábeis (texto em elaboração) Introdução Tenho ouvido, em períodos recentes, reclamações generalizadas de alunos que gostariam de ver o uso da estatística no âmbito da contabilidade. Muito dessas reclamações procedem, pois os alunos viam exemplos de estatísticas com algo próximo do que poderia se ver em empresas (média de idade de trabalhadores, proporção de trabalhadores por sexo, salários médios e salários máximo e mínimo dos trabalhadores da empresa etc.), sem contudo, ver exemplos direcionados a questões contábeis. Ainda para reforçar o estado de coisas narrado, a disciplina de estatística coincide com a fase inicial do curso, aliada a pouca vivência que alguns professores teriam com a matéria contábil. Tais fatos podem ter sido o formadores de um ambiente propício para a geração de insatisfação ou desencanto com o uso da matéria. No âmbito da UFPE, sempre procurei falar com professores que vinham lecionar estatística no curso de ciências contábeis, para que eles trouxessem os exemplos para o contexto empresarial, e quando possível utilizassem alguma mensuração contábil. Com a reforma curricular foram introduzidas as disciplinas de métodos quantitativos e contabilometria (parafraseando econometria). A primeira consolidaria assuntos de matemática de ensino médio, com cálculo infinitesimal com ênfase na abordagem funcional, fazendo algumas introduções ao mundo da estatística. A segunda daria mais ênfase estudos que se
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Notas de aula de análise de demonstrações contábeisUFPE – Professor Gutembergue Leal de MesquitaSemestre 2013.1
Estatísticas no auxílio à análise de demonstrações contábeis (texto em elaboração)
Introdução
Tenho ouvido, em períodos recentes, reclamações generalizadas de alunos que gostariam de ver o uso da estatística no âmbito da contabilidade. Muito dessas reclamações procedem, pois os alunos viam exemplos de estatísticas com algo próximo do que poderia se ver em empresas (média de idade de trabalhadores, proporção de trabalhadores por sexo, salários médios e salários máximo e mínimo dos trabalhadores da empresa etc.), sem contudo, ver exemplos direcionados a questões contábeis.
Ainda para reforçar o estado de coisas narrado, a disciplina de estatística coincide com a fase inicial do curso, aliada a pouca vivência que alguns professores teriam com a matéria contábil. Tais fatos podem ter sido o formadores de um ambiente propício para a geração de insatisfação ou desencanto com o uso da matéria.
No âmbito da UFPE, sempre procurei falar com professores que vinham lecionar estatística no curso de ciências contábeis, para que eles trouxessem os exemplos para o contexto empresarial, e quando possível utilizassem alguma mensuração contábil.
Com a reforma curricular foram introduzidas as disciplinas de métodos quantitativos e contabilometria (parafraseando econometria). A primeira consolidaria assuntos de matemática de ensino médio, com cálculo infinitesimal com ênfase na abordagem funcional, fazendo algumas introduções ao mundo da estatística. A segunda daria mais ênfase estudos que se voltassem para análise de dados, com regressões simples e múltiplas.
Esta reforma, fez com que se consolidasse a disciplina de contabilometria, que a meu ver deveria se chamar CONTABILMETRIA, fazendo com que disciplinas como análise de demonstrações contábeis e análise de custos pudessem ser ministradas com maior ênfase em conhecimentos estatísticos, o que de fato viria a acontecer. Aqui no Brasil alguns autores, por volta dos idos da década de 80 tentaram fazer uso da estatística em seus livros de contabilidade gerencial, a exemplo do livro do Professor Sérgio de Iudícibus com o título Contabilidade Gerencial, editado pela ATLAS em 1983. Nele já havia aplicações de regressões para estimativa de custos, programação linear para escolha de mix ótimo na produção e cálculo de tamanho de amostra para fins de auditoria.
Ademais podemos informar aos alunos que muito se tem escrito sobre uso da estatística no auxílio à tomada de decisão e na área de finanças. Isto já acontece há alguns anos e muitas das publicações vêm com os textos voltados para economia, contabilidade e administração. No mundo das finanças a estatística é bem utilizada para mensuração de risco ou retorno, dentre outras aplicações.
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Usamos estatística desde a simples criações de tabelas e gráficos com informações contábeis, como cálculos de medidas de posição e dispersão até uso de modelos para testar hipóteses e fazer previsões sobre comportamento de variáveis estudadas. Em auditoria o profissional pode fazer uso do cálculo do tamanho da amostra, ideal para possibilitar ao auditor fazer seus testes de conformidade.
Investigações estatísticas podem auxiliar o processo decisório, não só com o simples conteúdo informacional da estatística descritiva, bem como da estatística inferencial.
O analista com dados de um grupo de empresas é capaz de calcular medidas simples como a média, a moda, a mediana, o desvio-padrão, outras separatrizes como decís, percentís etc., estatísticas estas inseridas no mundo da estatística descritiva.
Com dados amostrais, é possível também se fazer algumas inferências estatísticas, comparando comportamento de dados de empresas ao longo do tempo, ou fazendo-se um corte de indicadores de grupos de empresas ao longo de dois intervalos de tempo, ou fazendo uso de análise discriminante entre dois grupos de empresas, como as solventes e insolventes.
Separatrizes e algumas medidas de posição
As separatrizes, como o próprio nome dar uma idéia, estuda como um rol de dados estatísticos pode ser mensurado em partes (separadas), ou melhor, como esses dados ao serem ordenados podem ser separados para dar informações a respeito da posição de um deles em relação ao conjunto (rol).
Em análise de demonstrações contábeis podemos utilizar essas medidas para ordenar posições de indicadores contábeis como índice de liquidez corrente, índice de rentabilidade do patrimônio líquido, tentando investigar qual a posição de um desses indicadores em relação ao conjunto de indicadores de empresas selecionadas numa dada amostra estatística.
Se tivéssemos a informação da população de empresas, tal estatística (separatrizes) também poderia ser utilizada.
Exemplo:
Considere os dados de parte das empresas pesquisadas por um grupo de alunos do semestre 2011.2 desta disciplina. Na tabela do lado esquerdo estão apresentados os dados brutos e de forma desordenada, e na tabela do lado direito, tais dados já aparecem num rol, do maior índice de liquidez corrente ao menor índice de liquidez corrente daquele grupo de empresas.
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A formatação da tabela do lado direito foi gerada automaticamente pelo EXCEL a partir dos comandos de análise de dados, que automaticamente abre um leque de opções onde o aluno deverá procurar em ferramentas de análise a opção “ordem e percentil”, clicando OK.
Posteriormente deverá marcar o vetor ($B$2:$B$22) que forma essa ordem e percentil, como mostrado na figura a seguir, escrevendo o intervalo de dados e clicando em “rótulos
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na primeira linha” para garantir que saia na tabela gerada pelo EXCEL o tipo de variável que se está querendo ordenar.
Do resultado podemos constatar que a Souza Cruz S/A (Ponto 1 na tabela do lado direito com um índice de 1,442) apresentou um índice de liquidez em 2010 menor que a mediana 1,8025 do grupo de empresas selecionadas aleatoriamente, ou dizer que seu índice de
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liquidez corrente está no 5º percentil, ou seja, está entre os 40% e 50% maiores índices de liquidez das empresas daquele grupo.
A mediana que nós havíamos falado era a posição do índice de liquidez que dividiria aquela lista de índices, devidamente ordenados, em 50%, ou seja, [(1,861+1,744)/2 = 1,8025]. Esta medida, a mediana, poderia ter sido escolhida como uma medida de posição selecionar empresas, cujo critério seria descartar investimento em ações de empresas que não apresentassem índices de liquidez superior ao da mediana. Isto poderia servir de exemplo, não querendo se afirmar aqui que este seja um critério ideal. O mesmo poderia ser feito com a média aritmética.
O uso de outras estatísticas como o desvio-padrão e o coeficiente de variação também servem para explicar o grau de dispersão dos indicadores que compõem a amostra que serve para analisar o indicador da empresa frente a seus congêneres ou da carteira selecionada.
Análise discriminante
Na análise discriminante se tenciona discriminar, segregar grupos de empresas com dada situação, normalmente situações opostas. Um caso clássico é o da segregação entre empresas solventes e insolventes.
Alguns livros mais antigos traziam termômetros para medir a capacidade de solvência ou insolvência de empresas a partir de dados extraídos de suas demonstrações contábeis. Desses podemos destacar o Termômetro de Kanitz, o Indicador de Insolvência de ALTMAN, o Modelo de Pereira, dentre outros.
A análise discriminante pode fazer uso de regressão múltipla para calcular coeficientes que multiplicados por variáveis eleitas (índices de liquidez ou endividamento que compõem o modelo) calcular escores discriminantes capaz de selecionar o estado de determinada empresa perante o modelo.
Os autores citados anteriormente, propuseram os seguintes modelos:
Se o Fator de Insolvência estiver entre 0 e 7, a empresa estará na área de solvência, se entre 0 e -3, estará na área de penumbra (área de indefinição) e por último se entre -3 e -7, estará na zona de insolvência.
Edward I. Altman com mais dois professores da PUC-RJ (1979)2
X1 = (AC – PC) / ATX2 = (PL – Capital Social Aportado) / ATX3 = (Lucro antes dos juros e impostos) / ATX4 = PL / (PC + PñC)X5 = Vendas / AT
A faixa crítica está entre -0,34 e 0,20, ou seja, empresas onde não é possível identificar claramente se estão ou não com problemas. Acima de 0,20 estão as empresas sem problemas financeiros e abaixo de -0,34 estão as empresas com problemas financeiros.
Imagine agora que queiramos identificar um modelo para separar empresas com bom nível de rentabilidade e empresas com nível de rentabilidade não aceito pelo critério de escolha
2 O trabalho pioneiro de Altman data de 1968 com empresas americanas. Aqui só apresentamos o modelo Z1 e com ajustes terminológicos efetuados pelo Professor.3 Para prevê insolvência de empresas industrial no ano imediatamente seguinte ao ano dos indicadores utilizados.
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do analista. O critério seria: acima de 10% de retorno sobre o patrimônio líquido médio, seria aceito; abaixo dos 10%, seria rejeitado.
Contudo, chamamos a atenção para algumas empresas que poderia ter um indicador acima dos 10%, e no conjunto, quando analisado com outros indicadores (composição do endividamento e índice de liquidez), não conduzir a uma escolha satisfatória.
Utilizando a análise discriminante4 poderemos melhor selecionar as empresas. O trabalho poderia ser obtido com um conjunto de indicadores que nem os propostos pelos autores Kanitz, Altman e Pereira.
Exemplo:
Considere a tabela a seguir com dados5 de empresas onde, segregou-se entre empresas que esperava-se apresentar um bom indicador de retorno e outras não (>= 10%, bom indicador, grupo 2):
10 109,037 2,410 2,241 abaixo 111 43,591 2,949 14,377 acima 212 116,163 2,584 10,316 acima 213 160,849 1,258 -19,748 abaixo 114 2,144 2,353 3,999 abaixo 115 44,095 3,296 8,207 abaixo 116 403,185 1,088 92,783 acima 217 15,829 3,712 20,061 acima 218 1088,447 1,744 9,796 abaixo 119 66,474 2,069 15,260 acima 220 248,306 0,941 15,856 acima 2
4 Modernamente se aconselha utilizar modelos de análise multivariada para selecionar os componentes principais para compor tal modelo.5 Neste trabalho não se fez a seleção dos indicadores com alguma técnica estatística, a exemplo de análise de componentes principais.
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Elegemos 2 para empresas que apresentassem índice de rentabilidade do patrimônio líquido acima de 10% e 1 para aquelas que não preenchessem tal exigência.
Através de uma análise de regressão múltipla construiremos um modelo para estimar se outras empresas apresentariam condições ideais ou não de atender o retorno exigido a partir do modelo preditivo desenvolvido.
O modelo após o cálculo de uma regressão múltipla conduziu a seguinte equação:
Substituindo-se os indicadores de outras empresas no modelo acima, espera-se obter uma estimativa de retorno para os investimentos mensurados pelo conceito LL/PLm.
Para cada empresa em pauta, o escore já está calculado. A média dos escores e desvios-padrão estão apresentados na tabela a seguir:
Como então identificar se uma empresa está num ou noutro nível de exigência de retorno?
Primeiro precisamos compreender como a coluna ESCORE foi elaborada. Fizemos uma regressão múltipla das variáveis independentes CT/PL, AC/PC e LL/PLm na variável dependente Classificação.
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Fazendo uso do EXCEL, selecionamos na sequência: Dados/Análise de Dados/Regressão
Preenchemos os campos relativos as variáveis: dependente, que é a coluna que contém a classificação1 ou 2, aqui representado pelo vetor $K$28:$K$48 e as independentes, aqui representado pela matriz $H$28:$J$48. Marcando Rótulos para identificar que tanto na matriz quanto no vetor constam os rótulos, ou cabeçalho contendo o nome das variáveis.
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Ao clicar em OK, obtemos a ANOVA, conforme ilustrado a seguir:
Substituindo as variáveis de cada linha da matriz, se obtém o escore Y, tal como o que faremos para a primeira linha do exemplo.
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Y = 1,2706129 – 0,000404 x 162,234 + 0,07633909 x 1,442 + 0,01228389 x 69,660 = 2,170847109
Após o cálculo de todos os escores, calculamos a média e o desvio-padrão para as duas distribuições de empresas – retorno igual ou acima de 10% e retorno abaixo de 10%. Elegemos a média das médias como a média que caracterizará o ponto de corte, no caso 1,530015.
A primeira distribuição, a das empresas que têm retorno abaixo de 10%, tem média igual a 1,330 e desvio-padrão 0,186071, que se adicionado ou deduzido a média nos fornece os pontos 1,143929 e 1,516071 (vide gráfico).
Já a segunda distribuição, a das empresas que têm retorno igual ou acima de 10%, tem média igual a 1,730 e desvio-padrão igual a 0,282215, que se adicionado ou deduzido a média nos fornece os pontos da distribuição abaixo desenhada, ou seja, 1,447785 e 2,012215.
1,14 1,33 1,52 1,45 1,73 2,01
O escore discriminante seria assim tabulado:a) Abaixo de 1,52, retorno menor que 105;b) Entre 1,52 e 1,45, área de indefinição;c) Acima de 1,45, retorno acima de 10%.