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As AÇÕES DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA PROPOSTAS EM FACE DA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR PELO DECRETO ESTADUAL 10.251, DE 30-8-77 MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS Juiz do /I Tribunal de Alçada Civil de São Paulo O Estado de São Paulo, no exercício da competência legal que lhe é outorgada pelo art. do Código Florestal (Lei 4.771, de 15-9-65), editou, em 30 de agosto de 1977 o Decreto 10.251, com as seguintes motivações: Considerando que a Serra do Mar apresenta condições excepcionais para a criação de um Parque Estadual, por atender às finalidades culturais de preservação de recursos nativos, e exibir atributos de beleza exuberante; considerando que a flora que viceja constitui revestimento vegetal de grande valor cientifico e cultural, ostentando matas de formação subtropical, com variadíssima ocorrência de valiosas essências; considerando que a fauna silvestre encontra condições ideais de vida tranqüila, constituindo-se a Serra do Mar notável repositório de espécimes raros, decreta: Fica criado o Parque Estadual da Serra do Mar, com a finalidade de assegurar integral proteção à flora, à fauna, às Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos, n. 19, ago./nov. 1997
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Mar 22, 2021

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STITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

tos para Construção de tério da Justiça - Brasília

itenciária - Como tornar­Revista do Instituto dos

I, n° 47, p. 209,1974.

LO Jornal O Estado de São

Problema Penitenciário ito, ano 2 - n° 17, p. 14,

onal - Lei Complementar, Decreto n° 1.093, de 23 e

Carcerária e Tratamento n° 651, p. 247 e ss, 1990.

ura, Ed. Martins Fontes -

Humanismo: Um Estudio - BarraI Editores SIA -

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de Direito Penitenciário,

laS Penitenciários, Editora

!nir, Ed. Vozes, 8. ed., p.

As AÇÕES DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

PROPOSTAS EM FACE DA CRIAÇÃO DO

PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR

PELO DECRETO ESTADUAL

N° 10.251, DE 30-8-77

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Juiz do /I Tribunal de Alçada Civil de São Paulo

O Estado de São Paulo, no exercício da competência legal que lhe é outorgada pelo art. 5° do Código Florestal (Lei n° 4.771, de 15-9-65), editou, em 30 de agosto de 1977 o Decreto n° 10.251, com as seguintes motivações:

Considerando que a Serra do Mar apresenta condições excepcionais para a criação de um Parque Estadual, por atender às finalidades culturais de preservação de recursos nativos, e exibir atributos de beleza exuberante; considerando que a flora que aí viceja constitui revestimento vegetal de grande valor cientifico e cultural, ostentando matas de formação subtropical, com variadíssima ocorrência de valiosas essências; considerando que a fauna silvestre aí encontra condições ideais de vida tranqüila, constituindo-se a Serra do Mar notável repositório de espécimes raros, decreta: Fica criado o Parque Estadual da Serra do Mar, com a finalidade de assegurar integral proteção à flora, à fauna, às

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belezas naturais, bem como para garantir sua utilização a objetivos educacionais, recreativos e científicos. A seguir, no art. 2°, determina que o Parque Estadual da Serra do Mar constítuir-se-á de uma área de cerca de 315.000 hectares, dentro dos limites descritos no referido dispositivo legal. O art. 6° declarou como de utilidade pública, para fins de desapropriação, por via amigável ou judicial, as terras de domínio particular abrangidas pelo Parque criado.

Em 27 de agosto de 1982, foi editado o Decreto n° 19.448 que alterou a redação do art. 6° do primitivo decreto, estabelecendo o seguinte:

Verificada a existência de terras de domínio particular na área do Parque Estadual da Serra do Mar, será expedido, a cada propriedade, ato declaratório de utilidade pública, para sua oportuna desapropriação, após indicação e justificação, em processo regular, pelo Instituto Florestal, órgão da Secretaria da Agricultura e Abastecimento.

Ocorre que, com a edição do primitivo Decreto Estadual, milhares de ações de desapropriação indireta já haviam sido ajuizadas, pretendendo os proprietários de imóveis, situados nos limites do Parque Estadual da Serra do Mar a indenização total dos seus imóveis, sob o argumento de que os mesmos não poderiam mais ser explorados para fins agropastoris ou para loteamentos nas áreas praianas, perdendo totalmente o potencial econômico. Vale dizer, não tendo o Estado de São Paulo ajuizado as ações de desapropriação direta, os proprietários de terras, situadas no referido Parque Estadual, postularam a indenização derivada da alegada desapropriação indireta que, sob a ótica deles, decorreria da simples instituição do Parque Estadual.

A maioria das ações foi acolhida em primeiro grau e o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, bem como os Tribunais Superiores, inclusive o Supremo Tribunal Federal, firmaram entendimento jurisprudencial, no sentido de que, efetivamente, os proprietários dos imóveis abrangidos pelo Parque Estadual da Serra do Mar tinham direito à indenização total dos mesmos, os

MANOEL DE QUEIROZ PEREIR

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quais teriam perdido integralmente a possibilidade de serem explorados economicamente.

A maior parte dos julgados direcionou-se no sentido da indenizabilidade por desapropriação indireta dos imóveis situados no Parque Estadual, conforme se constata pelo exame das ementas a seguir elencadas, colhidas nos repertórios jurisprudenciais.

Desapropriação indireta. Criação de parque florestal pela Administração. Proibição de exploração de recursos naturais existentes na propriedade. Fato que não caracteriza simples limitação administrativa. Autores que tiveram anulado o exercício do direito de propriedade. Ação procedente. (Rel. Des. Dinio Garcia, RT. 611171 e RJTJESP, 103-146).

Indenização. Desapropriação indireta. Requisitos. Ocorrência. Hipótese de área de preservação permanente prevista no Código Florestal. Imposição ao proprietário de obrigação que altera a destinação do bem. Ação procedente. (Rel. Des. Nelson Hanada, RJTJESP 128/181).

Indenização. Desapropriação indireta. Configuração, em face de criação de parque estadual. Indenização devida pelo Estado e não pela União. Legitimidade passiva de parte daquele reconhecida. Recurso não provido. Votos vencedor e vencido. A legislação federal, criou, através do Código Florestal, determinadas restrições ao uso da propriedade, porém o ato administrativo do Estado que cria parque significa um apossamento administrativo. Cabe, pois, a ele e não à União responder pela ação de indenização. (Des. Itamar Gaino, RJTJESP, 1461217).

Desapropriação Indireta. Criação do Parque Estadual da Serra do Mar. Impossibilidade de exploração por proprietário dos recursos naturais existentes nas terras apossadas. Hipótese de possibilidade única de utilização do bem. Anulação do conteúdo essencial da propriedade. Desapropriação indireta caracterizada. Verba devida. Recurso provido para esse fim. (ReI. Des. Debatin Cardoso, Ap. n° 154.604-2, Cubatão, j. em 17-12-92).

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Desapropriação Indireta. Propriedade abrangida pelo Decreto Estadual n° 10.251177, que criou o Parque Estadual da Serra do mar. Alegada mera limitação administrativa. Inadmissibilidade. Hipótese de interdição de uso da propriedade. Ação procedente. Recurso não provido. Se o impedimento de construção ou de desmatamento atingir a maior parte da propriedade ou a sua totalidade, deixará de ser limitação para ser interdição de uso de propriedade. (Rei. Des. José Cardinale. Apelação Cível n° 216.461-2 - São Paulo, j. 10-8-93).

Desapropriação. Indenização. Apossamento adminis­trativo de áreas que compõem o Parque Estadual da Serra do Mar. Criação da Serra do Mar como patrimônio nacional (art. 225, § 4° da CR), que não tirou do particular a propriedade das terras que o compõem. Impossibilidade de caracterização de tais áreas como de domínio da União, eis que não incluídas no art. 20 da CR. Verba devida. Direito de propriedade (art. 5°, XXII, da CR), que veio ao ser aniquilado pelas restrições impostas. Recurso parcialmente provido. (Rei. Des. Marcus Vinicius, Apelação Cível n° 163.128-2, Ubatuba, j. em 11-12­90).

Desapropriação Indireta. Criação do Parque Estadual da Serra do Mar. Alegação de simples limitação administrativa. Inadim. Restrição imposta ao exercício das faculdades inerentes ao domínio, que o atinge substancialmente, a ponto de aniquilá-lo, configurando desapropriação. (Rei. Des. Acciolli Freire, Apelação Cível n° 143.697-2 - Paraibuna, j. 20-12-90).

o Egrégio Superior Tribunal de Justiça também proclamou a indenizabilidade das áreas de terras situadas nos limites dos parques estaduais.

Não é para confundir as limitações da Lei n° 4.771/65 com a proibição de desmatamento e uso de uma floresta que cobre totalmente a propriedade porque seria interdição de uso

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA C

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MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS 215

de propriedade", salvo indenização devida (ReI. Min. Garcia Vieira, in RSTJ. 211450).

Desapropriação indireta. Indenização. Não é negado ao Poder Público o direito de instituir parques nacionais, contanto que o faça respeitando o sagrado direito de propriedade, assegurado pela Constituição.

O Excelso Supremo Tribunal Federal também apreciou a questão, fazendo-o em aresto da lavra do Eminente Ministro Francisco Rezek, ementado da seguinte forma:

Desapropriação indireta. Mata de preservação permanente. Criação de parque pelo Dec. Estadual n° 10.251177. Paralisação de atividades de empresa agro-industrial. Direito à indenização. Recurso extraordinário não conhecido. Ementa Oficial: Desapropriação. Mata de preservação permanente. Indenizabilidade. As matas de preservação permanente são indenizáveis, visto que, embora proibida a derrubada pelo proprietário, persiste o seu valor econômico e ecológico. (RT 583/278).

Com o devido respeito ao entendimento majoritário das mais respeitadas Cortes de Justiça de nosso País, ou seja, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, entendo que a interpretação pretoriana a respeito das desapropriações indiretas, decorrentes da criação do Parque Estadual da Serra do Mar foi feita à luz do conceito do direito de propriedade que nos é outorgado pelo direito privado, o qual, em nosso sentir, não mais pode ser utilizado após a edição da Constituição Federal de 1988. Não bastasse isto, examinando­se as situações fáticas dos inúmeros processos de desapropriação indireta aforados, em virtude da criação do Parque Estadual da Serra do Mar, constata-se que a mera edição do referido decreto estadual não interferiu na exploração econômica dos imóveis situados nos respectivos limites geográficos, posto que, pela localização dos mesmos, impossível qualquer espécie de exploração lucrativa.

Examina-se, primeiramente a questão, sob o enfoque da Constituição Federal.

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o art. 5° da Constituição Federal, ao disciplinar os direitos e deveres individuais e coletivos, estabelece: I - É garantido o direito de propriedade; XXII - a propriedade atenderá à sua função social; XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.

O art. 170, que faz parte do capítulo que traça os princípios gerais da atividade econômica preceitua o seguinte: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III ­função social da propriedade; (omissis) VI - defesa do meio ambiente.

O constituinte, ao tratar da política agrícola e fundiária e da reforma agrária, preceitua no art. 185 que é insuscetível de desapropriação, para fins de reforma agrária a propriedade produtiva. A seguir, o art. 186 diz que a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente.

No capítulo que cuida do meio ambiente, a Constituição Federal estabelece, no art. 255: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. O § 1° impõe, em seu inc. 111, que para assegurar o direito ao meio ambiente, incumbe ao Poder Público, definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através da lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção. E, no inc. VII impõe o dever de proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as

MANOEL DE QUEIROZ PEREIR

práticas que coloquem, a extinção das espéci Finalmente, no § 4°, dei a Mata Atlântica, a Ser Zona Costeira são patr na forma da lei, dI preservação do meio recursos naturais.

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disciplinar os direitos e lece: I - É garantido o 'riedade atenderá à sua rá o procedimento para 'ilidade pública, ou por indenização em dinheiro, stituição.

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(adas, na forma da lei, as

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práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção das espécies e submetamos animais a crueldade. Finalmente, no § 4°, determina: A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Matogrossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

Analisando-se sistematicamente, e em conjunto, os dispositivos constitucionais acima referidos, constata-se que nossa atual Constituição Federal, ao disciplinar o direito de propriedade e mantê-lo no rol das garantias individuais, alterou profundamente o seu conteúdo, afastando-se nitidamente do clássico conceito de propriedade que nos é fornecido pelo direito privado. Assim é que o direito de propriedade garantido pela Constituição Federal é condicionado ao cumprimento da função social da propriedade.

O insigne constitucionalista José Afonso da Silva, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, pontifica que:

O regime jurídico da propriedade tem seu fundamento na Constituição. Esta garante o direito de propriedade, desde que atenda sua função social. Se diz: é garantido o direito de propriedade (art. 5°, XXII), a propriedade atenderá sua função social (art. 5°, XXII/), não há como escapar ao sentido de que só garante o direito da propriedade que atenda sua função social. A própria Constituição dá conseqüência a isso quando autoriza a desapropriação, com pagamento mediante título, de propriedade que não cumpra sua função social (arts. 182, § 4° e 184). Existem outras normas constitucionais que interferem com a propriedade mediante provisões especiais (arts. 5°, XXIV a XXX, 170, II e III, 176, 177 178, 182, 183, 184, 185, 186, 191 e 222).

Esse conjunto de normas constitucionais sobre a propriedade; denota que ela não pode mais ser considerada como um direito individual nem como instituição do Direito Privado. Por isso, deveria ser prevista apenas como uma instituição da ordem econômica, como instituição de relações econômicas, como nas

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Constituições da Itália (art. 42) e de Portugal (art. 62). É verdade que o art. 170 inscreve a propriedade privada e a sua função social como princípios da ordem econômica (incs. 11 e 111). Isso tem importância, porque, então, embora prevista entre os direitos individuais, ela não mais poderá ser considerada puro direito individual, relativando-se seu conceito e significado, especial­mente porque os princípios da ordem econômica são preordenados à vista da realização de seu fim: assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social. Se é assim, então a propriedade privada, que, ademais, tem que atender à sua função social, fica vinculada à consecução daquele princípio. É claro que, também, não é sem conseqüência o fato de estar inserida, no seu aspecto geral, entre as normas de previsão dos direitos individuais. É que, prevista como tal, fica assegurada a instituição, não mais, porém, na extensão que o individualismo reconheceu. Com as novas disposições a Constituição dá maior razão a Pontes de Miranda, quando escreve que, às leis é que compete regular o exercício e definir o conteúdo e os limites do direito de propriedade, pois que, no art. 5°, XXII, só se garante a instituição da propriedade, sendo suscetíveis de mudança por lei seu conteúdo e limites. (aut. cit., Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, ga ed., p. 244-245).

Houve, portanto, substancial alteração do direito de propriedade, que não mais tem a antiga conotação de direito absoluto, não se constituindo mais um instituto exclusivo do direito privado. Por tais razões, o direito de propriedade não pode mais ser aferido sob o enfoque de ser ele uma garantia individual constitucional, uma vez que a própria Carta Constitucional, ao inseri-lo com um dos direitos do indivíduo, condiciona-o ao cumprimento de sua função social. Portanto, o direito de propriedade que a Constituição Federal assegura é o direito da propriedade que cumpra sua função social, vale dizer, direito de propriedade relativo e não absoluto como anteriormente disciplinado no direito civil.

Não se pode mais, portanto, visualizar o direito de propriedade sob o vetusto enfoque privatístico, pois, inegavelmente, o instituto deixou de ser disciplinado no campo de direito civil e passou a ser

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA C

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MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS 219

regulado pelo direito público, especialmente o Direito Constitucional, estando inserido em novo contexto de normas de hierarquia superior, que lhe conferem o status de direito constitucional, cujos limites e conteúdo podem ser relativizados por normas infraconstitucionais.

Impende destacar, ainda, que as conhecidas limitações de polícia, de caráter administrativo, não se relacionam com a função social da propriedade, sendo esta princípio muito maior e abrangente, com significativos reflexos na conceituaçào e limites da propriedade.

O regime jurídico da propriedade tem que ser haurido no Direito Constitucional, sendo certo afirmar-se que o Direito Civil regula apenas as relações civis decorrentes do direito de propriedade, garantindo as faculdades de usar, gozar e dispor dos bens (art. 524, CC), a plenitude da propriedade (art. 525, CC), seu caráter exclusivo e ilimitado (art. 527).

O exame da extensão e profundidade do direito de propriedade, previsto no Código Civil, só pode ser realizado sob a ótica da Constituição Federal que, em síntese, coloca o atendimento à finalidade social da propriedade como pressuposto essencial ao reconhecimento daquele direito.

A par do novo conceito do direito de propriedade que nos é oferecido pela Constituição Federal, relativizado pela indispensabilidade da observância da função social, também se faz necessário relembrar existência das limitaçàes ao direito de propriedade, a fim de se aferir, com precisão, sobre a questão das desapropriações indiretas derivadas do Parque Estadual da Serra do Mar.

As limitações ao direito de propriedade estão previstas no Direito Privado e no Direito Público e condicionam o exercício daquele direito, sendo aquelas vinculadas aos direitos de vizinhança e estas relacionadas com a urbanística e a administração pública.

O saudoso Prof. Hely Lopes Meirel1es, nosso maior administrativista, ensinou que: O Estado, no uso de sua soberania interna, pode intervir na propriedade privada e nas atividades

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particulares por várias formas, a saber: pelas limitações administrativas gerais, e pelos meios especificos de intervenção na propriedade particular consistente na desapropriação, na servidão adminsitrativa, na requisição e na ocupação temporária. Todas elas são modalidades de expressão do domínio eminete que a Nação exerce sobre as pessoas e coisas existentes em seu território ... Como limitações de ordem pública são regidas pelo direito administrativo, diversamente das restrições civis, que permanecem reguladas pelo direito privado (Código Civil, arts. 554 e segs.).

Ensina ainda o eminente mestre que: limitação administrativa é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública, condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem estar social.

Por derradeiro, esclarece o festejado administrativista que: Vê­se, pois, que a limitação administrativa difere tanto da servidão adminsitrativa como da desapropriação. A limitação administrativa, por ser uma restrição geral e de interesse coletivo, não obriga o Poder Público a qualquer indenização. (aI. cit., Direito Administrativo Brasileiro, Ed. RT, 2a ed., p. 137-138­147).

No Brasil, desde a Lei das Sesmarias, o direito de propriedade, posse e uso da terra era condicionado às chamadas cláusulas sociais, incidindo limitações administrativas de ordem geral, que tinham por objetivo, inclusive, a proteção ambiental, sendo certo que se deve a tal legislação que já preservava a riqueza florestal a expressão madeira de lei.

Nosso primeiro Código Florestal, consubstanciado no Decreto Federal n° 23.793, de 23 de janeiro de 1934, afirmava em seu art. 1°: As florestas existentes no território nacional, consideradas em conjunto, constituem bem de interesse comum a todos os habitantes do país, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que as leis em geral, e especialmente este Código estabelecem.

O art. 8° determinava: Consideram-se de conservação perene, e são inalienáveis, salvo si o adquirente se obrigar, por si, seus

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herdeiros e sucessores, a as florestas protetoras e a. nacionais, estaduais ou públicos naturais, que pe. primitiva, trechos do paü merecem.

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herdeiros e sucessores, a mantê-las sob regime legal respectivo, as florestas protetoras e as remanescentes. E o art. 9°: Os parques nacionais, estaduais ou municipais, constituem monumentos públicos naturais, que perpetuam, em sua composição florística primitiva, trechos do país, que, por circunstâncias peculiares o merecem.

§ 1°: É rigorosamente proibido o exercício de qualquer espécie de atividade contra aflora e a fauna dos parques.

O atual Código Florestal (Lei n° 4.771, de 15-9-65), em seu art. 1° dispõe: As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidades às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.

Dentre as limitações previstas no referido Código Florestal avulta, dentre aquelas elencadas no art. 16, a instituição da reserva legal de 20% da área, na qual não é permitido o desmatamento, sendo certo que no art. 44 referida reserva legal para a região norte e parte da região centro-oeste é fixada em 50%, tendo sido editada Medida provisória sob n° 1511, de 27-7-96 que aumenta a reserva legal na Região Norte para 80%.

Verifica-se, portanto, que desde épocas imemoriais as florestas nativas de nosso país tiveram sua exploração subordinada a limitações administrativa, de caráter geral, que jamais ensejam a mais remota possibilidade de gerarem direito à indenização em relação ao Estado.

Assim, quando o Estado de São Paulo baixou o decreto que criou o Parque Estadual da Serra do Mar, não havia necessidade de ter declarado a respectiva área como de utilidade pública para fins expropriatórios, sendo suficiente que, nos termos do Código Florestal (art. 5°), instituísse o referido Parque e determinasse a observância das limitações da legislação federal.

No entanto, referido Decreto Estadual n° 10.251177, ao criar o Parque Estadual da Serra do Mar, com objetivos dos mais louváveis, declarou de utilidade pública os imóveis situados na

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Serra do Mar, o que levou seus proprietários a ajuizarem as ações de desapropriação indireta para obterem indenizações decorrentes daquele édito, sob a alegação de esvaziamento total de suas propriedades. Na verdade, segundo se sabe, poucas foram as ações de desapropriação direta aforadas pela Fazenda Estadual.

Relativamente às desapropriações movidas pelo Estado de São Paulo, evidentemente, objetivando-se a transferência do domínio particular dos imóveis para o domínio público, de rigor a concessão da indenização, esta apurada de forma a atender o comando constitucional que determina ajusta indenização.

No que concerne, porém, às desapropriações indiretas, entendo que o melhor posicionamento é o perfilhado pelos julgados que negam o direito à indenização perseguida, pois, o Estado de São Paulo não ocupou quaisquer dos imóveis situados na Serra do Mar, sendo evidente que não pode o particular pretender compelir o Estado a efetuar a desapropriação de seu imóvel, sob o argumento de que a simples edição do decreto estadual importou no exaurimento da potencialidade econômica do mesmo. A efetivação da desapropriação é ato próprio da soberania estatal, informado pelos princípios da conveniência e oportunidade.

Confesso que, inicialmente, ao passar a integrar o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, convocado como Juiz Substituto daquela Excelsa Corte, filiei-me à majoritária corrente pretoriana que concedia indenização ampla aos imóveis do Parque Estadual da Serra do Mar.

No entanto, ulteriormente, penitenciei-me do equívoco e passei a perfilhar o entendimento pioneiro do Eminente Desembargador Laerte Nordi, que só admitia a indenização se comprovado e efetivo prejuízo decorrente da impossibilidade do proprietário continuar a explorar economicamente a propriedade, anteriormente explorada, em face das restrições derivadas do decreto estadual.

Em aresto de sua relatoria oDes. Laerte Nordi, assim se pronunciou:

Por isso, entendia antes e continuo entendendo que o Decreto Estadual n° 10.251/77, que criou o Parque Estadual

MANOEL DE QUEIROZ PEREIR,

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da Serra do Mar, acabou sendo fonte de pedidos de vultuosas indenizações por proprietários que nunca exploraram seus imóveis, pelas notórias dificuldades e que passaram a reclamá-las, apoiados no esvaziamento econômico des uas propriedades, embora solitariamente, defendia e defendo a tese de que o alegado prejuízo há de ser efetivo, comprovado pela impossibilidade de continuar a exporação econômica preexistente, sobretudo porque restrições existiam desde a edição da Lei Federal n° 4.771/65, que instituiu o Código Florestal (Apelação Cível n° 93.364-2 São Paulo, j. em 11-8­94).

No mesmo sentido, o julgamento da Apelação Cível n° 255.650, relatado pelo Eminente Desembargador Pinheiro Franco, assim ementado: Direito de Propriedade. Limitação Administrativa. Indenização. Edição normativa de criação de Parque Estadual. Inexistência de efeito sobre direito dominial não impedindo a utilização do imóvel de acordo com a sua finalidade ou a sua disponibilidade. Verba indevida. declaração de votos. Ementa oficial: A simples edição normativa seja de criação do Parque Estadual, seja de um comando exproprietário, não tem efeito o direito dominial, não impedindo a utilização do imóvel de acordo com a sua função social ou a sua disponibilidade. Ação ordinária de indenização improcedente. (RT 717/151)

O ilustre Desembargador afirma o seguinte:

A hipótese não cuida de desapropriação indireta da área, mas tão-somente de algumas restrições perfeitamente legais, impostas pelo Poder Público, em decorrência da existência de Parque Estadual, para efeitos de preservação da vegetação, não tendo privado os autores da utilização da propriedade.

Verifica-se que a propriedade dos autores jamais veio a integrar jurídica ou faticamente, o patrimônio do Estado.

A prova dos autos é toda no sentido de inexistirem edificações estaduais ou qualquer ato de ocupação estatal na gleba litigiosa, deixando claro que a simples edição normativa,

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seja de criação do Parque Estadual, seja de um comando expropriatório, não tem efeito sobre o direito dominial, não impedindo a utilização do imóvel de acordo com a sua função social ou a sua disponibilidade.

Na realidade, as restrições alegadas, advém da legislação federal existente desde 1934, persistindo na Lei 4.771/65 (Código Florestal).

A verdade é que a prova dos autos também demonstra amplamente a absoluta impossibilidade de aproveitamento econômico da área, nem tanto pelas restrições administrativas impostas pela reserva Florestal, mas e preponderadamente, em razão da localidade do imóvel.

Da leitura dos autos, conclui-se que tanto o loteamento da área, como o aproveitamento comercial das matas, é simplesmente impraticável. As possibilidades de exploração do local são, pois. altamente problemáticas, ou melhor, absolutamente inviáveis. Não há uma probabilidade objetiva de que tal exploração venha efetivamente a ocorrer. E, desta feita, não pode o particular transferir o seu problema de venda de um bem, que está fora do mercado, para o Estado, não por culpa deste, mas sim, pela sua própria condição e localização.

No mesmo julgamento, integrando a douta Turma, proferi declaração de voto vencedor, observando que:

Não bastasse isto, a prova pericial evidencia que o imóvel dos autores não oferece qualquer possibilidade de ser explorado economicamente e isto não decorre das restrições administrativas, mas sim, em face da localização do imóvel, montanhas que não ensejam qualquer espécie de mecanização, seja para formação de pastagens, seja para a prática de agricultura. O próprio acesso ao imóvel é praticamente impossível de ser feito pelos meios normais de transporte. Trata-se de área que também não enseja a implementação de loteamento.

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As possibilidades de exploração do imóvel são nulas. Por isso o imóvel estava abandonado e evidentemente, cuida-se bem fora do mercado imobiliário, que não encontra interessados em explorar o inexplorável. A culpa de tal situação não é do Estado de São Paulo, nem das normas federais ou estaduais que regem a questão das áreas reservadas. A culpa é da situação do imóvel. Convém destacar que grande parte dos imóveis rurais do Brasil têm, compulsoriamente, por força de lei, de manter uma reserva de matas, cerrados ou campos naturais de 20% ou 50% de suas respectivas áreas. Nem por isso a União ou os Estados estão obrigados a indenizar os proprietários pela impossiblidade de se utilizarem de tais áreas, (reservas).

Dessarte, evidenciado nos autos que o Decreto Estadual que criou o Parque Estadual da Serra do Mar não impediu que os autores continuassem a exporar normalmente seu imóvel, porque o mesmo nunca foi explorado, já que, fisicamente enexplorável se torna o pedido indenizatório. (RT 717/154­155).

Na condição de Relator dos Embargos Infringentes n° 204.019­2/3-01, de São Sebastião, no Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferi voto, cuja ementa é a seguinte: Ação indenizatória por apossamento administrativo. Decreto Estadual n° 10.251, de 30-08-77, que criou o Parque Estadual da Serra do Mar e declarou o imóvel de utilidade pública para fins expropriatórios. Não efetivação da ação expropriatória. Limitações administrativas preexistentes e decorrentes do Código Florestal. Inexistência de esbulho possessório que impede o reconhecimento do apossamento administrativo. Simples edição do decreto estadual que cria "Parque Estadual" não é ato possessório. Não caracterizaçào do apossamento administrativo. Improcedência do pedido indenizatório. Embargos infringentes rejeitados. (l a Câmara de Férias Uan/93).

O Eminente Dr. José Carlos de Moraes Salles, em excelente trabalho publicado na Revista dos Tribunais, afirma o seguinte: Parece-me, portanto, que os acórdãos a que inicialmente me

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referi, determinadores do pagamento de indenização, sob o argumento de que haviam ocorrido ocupações e, por isso, desapropriações indiretas no Parque Estadual da Serra do Mar, não peifilharam o melhor entendimento sobre a matéria, estando a orientação mais adequada contida, a meu ver, nos arestos mais recentes do Tribunal de Justiça de São Paulo, a que também fizemos alusão, que negam indenização nesses casos, sob o fundamento de que não ocorreram ocupações por parte da Administração Pública Estadual e de que não pode haver desapropriação indireta sem que tenha havido, antes ocupação. (RT 714/315)

E, após admitir a possibilidade de ser devida indenização, acaso comprovado nos autos a ocorrência de interdição do uso da

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1.[ I econômico do imóvel, com base no princípio da solidariedade

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União Federal para a proteção de um patrimônio nacional, 'I proteção esta consagrada, hoje, em norma constitucional (art.

225, da CF). Parece-me, pois, que há de ser sob este ângulo que se .,1 deverá equacionar o grave problema das alegadas, mas não

ocorridas desapropriações indiretas no Parque Estadual em questão. de outra parte, não é lógico nem racional que se veja a Fazenda de São Paulo compelida a pagar vultuosas indenizações em virtude de desapropriações indiretas que não levou a efeito e pelo simples fato de proceder à fiscalização que lhe é imposta pela própria Constituição da República.

De se concluir, portanto, que, seja sob a ótica do direito de propriedade, condicionado pela Constituição federal à função social; seja pelo reconhecimento de que as limitações administrativas impostas pelo Código Florestal (anterior e atual) não geram direito à indenização; seja pelo reconhecimento de que a simples edição do Decreto Estadual n° 10.251177 que criou o Parque Estadual da Serra do Mar não se concretizou como ato caracterizador de apossamento administrativo (esbulho possessório); inviável o reconhecimento de desapropriação

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indireta para a conc imóveis situados na á do Mar. A indenizaçã o proprietário compn do imóvel antes da ed em face do aludido d sua propriedade.

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de indenização, sob o ocupações e, por isso, ~tadual da Serra do Mar, sobre a matéria, estando

meu ver, nos arestos mais 'lo Paulo, a que também 'ão nesses casos, sob o ')cupações por parte da re que não pode haver ! havido, antes ocupação.

ser devida indenização, ia de interdição do uso da e supressão do valor

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indireta para a concessão da indenização aos proprietários de imóveis situados na área abrangida pelo Parque Estadual da Serra do Mar. A indenização, em tais casos, só poderá ser concedida se o proprietário comprovar que realizava a exploração econômica do imóvel antes da edição do Decreto Estadual n° 10.251177 e que em face do aludido decreto sofreu o esvaziamento econômico de sua propriedade.

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